SEMANA DE ARTE MODERNA
Ocorreu na cidade de São Paulo entre os dias 11 e 18
de fevereiro de 1922. Tendo como palco o Teatro
Municipal de São Paulo;
Marco inicial do modernismo no Brasil.
“ Foi como se esperava, um notável fracasso a récita
de ontem na pomposa Semana de Arte Moderna,
que melhor e mais acertadamente deveria chamar-
se Semana de Mal – às artes’’.
Jornal Folha da Noite
fevereiro de 1922
“ As colunas da secção livre deste jornal estão à
disposição de todos aqueles que, atacando a
Semana de Arte Moderna, defendam o nosso
patrimônio artístico’’.
Jornal O Estado de São Paulo
fevereiro de 1922
“ É preciso que se saiba que nos manicômios
se produzem poemas, partituras, quadros e
estátuas, e que essa arte de doidos tem o
mesmo característico da arte dos futuristas
e cubistas que andam soltos por aí ’’.
Jornal do Comércio
fevereiro de 1922
Capa de
Di Cavalcanti
para o Catálogo da
Exposição.
Um dos cartazes
colocados no
Teatro Municipal
de São Paulo,
anunciando a
Semana de Arte
Moderna.
FERNANDO PESSOA
Fernando António Nogueira Pessoa mais
conhecido como Fernando Pessoa, foi um poeta e
escritor português. É considerado um dos maiores
poetas da Língua Portuguesa, e da Literatura
Universal, muitas vezes comparado com Luís de
Camões. O crítico literário Harold Bloom considerou
a sua obra um "legado da língua portuguesa ao
mundo".
Das quatro obras que publicou em vida, três são
na língua inglesa. Fernando Pessoa traduziu várias
obras inglesas para português e obras portuguesas
(nomeadamente de Antônio Botto e Almada
Negreiros) para inglês.
Ao longo da vida trabalhou em várias firmas
comerciais de Lisboa como correspondente de
língua inglesa e francesa. Foi também empresário,
editor, crítico literário, jornalista, comentador
político, tradutor, inventor, astrólogo e publicitário,
ao mesmo tempo que produzia a sua
obra literária em verso e em prosa.
OSWALD DE ANDRADE
Oswald de Andrade (1890-1954) foi o mais
transgressor e experimental dos modernistas,
autor de irônicos discursos e artigos de ataque
aos “passadistas”, nos meses próximos à
Semana de 1922, da qual foi um dos
idealizadores. “A alegria é a prova dos nove”,
declarou no “Manifesto Antropófago” de 1928,
que defendia de forma poética uma língua
brasileira e a metáfora do canibalismo do índio
que deglute o estrangeiro. Era a ideia de
antropofagia como caminho para a cultura
brasileira, reaproriada pela Tropicália nos anos
1960. Esse projeto construtivo de um
modernismo ligado à brasilidade já tinha se
anunciado no “Manifesto da Poesia Pau-Brasil”,
de 1924, que deu origem ao livro “Pau-Brasil”,
publicado no ano seguinte.
ANITA MALFATTI
Em 1917, depois de estudar pintura em Berlim
— onde teve contato com o expressionismo
alemão — e Nova York, Anita Malfatti
(1889-1964) fez a primeira exposição no país a
se autodenominar “moderna”. A mostra entrou
para a História pela crítica feroz de Monteiro
Lobato, que condenou sua “arte caricatural”
tipicamente europeia, vinculando-a à
perturbação mental. Já para Oswald de
Andrade, sua pintura causava “impressão de
originalidade e de diferente visão”. Cinco anos
depois, Anita foi uma das principais atrações
da exposição que abriu a Semana de Arte
Moderna, com telas como “O homem amarelo”,
“A estudante russa” e “A ventania”. A maior
parte dessas obras, no entanto, era de anos
anteriores, porque em 1922 Anita já tinha
voltado à pintar de forma mais convencional.
MÁRIO DE ANDRADE
Um dos principais articuladores da
Semana, Mário de Andrade
(1893-1945) foi um teórico central do
modernismo brasileiro. O prefácio de
“Pauliceia desvairada”, publicado pouco
depois da Semana, inspirou a fase
inicial do movimento. A pesquisa
folclórica e a linguagem inventiva de
“Macunaíma” (1928) definiram o lugar
que o modernismo ocupa até hoje no
imaginário nacional. Nas décadas
seguintes, foi interlocutor de autores
das novas gerações, como Drummond e
Sabino, e publicou trabalhos
importantes sobre música tradicional
brasileira.
MENOTTI DEL PICCHIA
Publicado em 1917, o poema “Juca
Mulato”, de Menotti del Picchia
(1892-1988) chamou atenção por
mesclar formas clássicas, disposição
gráfica ousada e temas nacionais. Em
1922, teve atuação incendiária na
Semana, com uma palestra sobre
estética modernista que recebeu
aplausos entusiasmados e vaias
indignadas. Mais tarde, alinhou-se a um
ramo nacionalista do movimento, o
“verde-amarelismo”, com Cassiano
Ricardo e Plinio Salgado (que também
participou da Semana e, em 1932,
fundou a Ação Integralista Brasileira,
de extrema-direita).
HEITOR VILLA-LOBOS
Se a Semana de 1922 foi um evento de São
Paulo, sua grande estrela foi um carioca.
Convocado pelos modernistas paulistas em
viagem ao Rio, Heitor Villa-Lobos
(1887-1959) teve 20 composições
interpretadas nos três dias de programação,
e um dia todo dedicado a ele, único
compositor brasileiro na Semana. Foi
aplaudido e também vaiado, pela estranheza
causada pelos tambores e instrumentos
populares de congado incorporados à
orquestra. Mais do que a participação
intensiva na semana, a importância do
maestro para o modernismo brasileiro está
na criação de uma linguagem própria na
música nacional, unindo elementos de
músicas folclóricas e indígenas já no fim dos
anos 1910.
MANUEL BANDEIRA
O pernambucano Manuel Bandeira
(1886-1968) já era um poeta estabelecido
na época da Semana. Na década
anterior, difundira o verso livre em
textos críticos e em obras como
“Carnaval”, de 1919. Doente, não pôde ir
a São Paulo para o evento, mas os
modernistas escolheram seu poema “Os
sapos” como uma espécie de declaração
de princípios. Publicou algumas das
principais obras da poesia brasileira da
primeira metade do século XX, como
“Libertinagem” (1930) e “Estrela da
Manhã” (1936).
RONALD DE CARVALHO
Poeta hoje pouco lido, Ronald de
Carvalho (1893-1935) costuma ser
mais lembrado por seu papel algo
insólito na Semana de 22. Com a
ausência de Manuel Bandeira,
doente, coube a ele receber as vaias
pela leitura do poema “Os sapos”. Foi
um dos poucos brasileiros a manter
contato com o modernismo
português, participando do 1 número
da revista “Orpheu” (1915), que
publicou poemas vanguardistas de
Fernando Pessoa.
OS SAPOS
Enfunando os papos,
Saem da penumbra,
Aos pulos, os sapos.
A luz os deslumbra.
Em ronco que aterra,
Berra o sapo-boi:
- "Meu pai foi à guerra!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
O sapo-tanoeiro,
Parnasiano aguado,
Diz: - "Meu cancioneiro
É bem martelado.
Vede como primo
Em comer os hiatos!
Que arte! E nunca rimo
Os termos cognatos.
O meu verso é bom
Frumento sem joio.
Faço rimas com
Consoantes de apoio.
Vai por cinquüenta anos
Que lhes dei a norma:
Reduzi sem danos
A fôrmas a forma.
Clame a saparia
Em críticas céticas:
Não há mais poesia,
Mas há artes poéticas..."
Urra o sapo-boi:
- "Meu pai foi rei!"- "Foi!"
- "Não foi!" - "Foi!" - "Não foi!".
Brada em um assomo
O sapo-tanoeiro:
- A grande arte é como
Lavor de joalheiro.
Ou bem de estatuário.
Tudo quanto é belo,
Tudo quanto é vário,
Canta no martelo".
Outros, sapos-pipas
(Um mal em si cabe),
Falam pelas tripas,
- "Sei!" - "Não sabe!" - "Sabe!".
Longe dessa grita,
Lá onde mais densa
A noite infinita
Veste a sombra imensa;
Lá, fugido ao mundo,
Sem glória, sem fé,
No perau profundo
E solitário, é
Que soluças tu,
Transido de frio,
Sapo-cururu
Da beira do rio...
Manuel Bandeira
PAULO PRADO
Homem de negócios apaixonado pelas
artes, milionário que se julgava de
esquerda, historiador amador que se
sentiu à vontade entre os jovens
modernistas, Paulo Prado (1869-1943) é
um personagem essencial e pouco
lembrado do modernismo. Rico
cafeicultor, foi o principal mecenas da
Semana de 22 e um interlocutor
fundamental para seus integrantes:
assinou o prefácio de “Pau-Brasil”, de
Oswald de Andrade, e colaborou tanto
com a concepção de “Macunaíma” que
Mário de Andrade dedicou o romance a
ele.
DI CAVALCANTI
Foi de Emiliano Di Cavalcanti (1897-1976) a
ideia da realização de uma Semana de Arte
Moderna em São Paulo — é o que conta a maior
parte das versões de uma história repleta delas.
Naquele momento, ele era um artista diferente
daquele que se tornaria célebre com a pintura de
paisagens brasileiras, retratos de mulatas e
preocupação social. Di Cavalcanti apresentou
sobretudo desenhos e pastéis na exposição da
Semana de 1922, além de ter sido o autor de seu
cartaz e da capa do catálogo com a programação.
Em seus anos mais experimentais, Di criou
ilustrações para revistas modernistas como a
“Klaxon” e para livros como “Carnaval”, obra de
Manuel Bandeira cujo poema “Os sapos” foi lido
durante a Semana e chocou parte da plateia.
VICTOR BRECHERET
Nascido Vittorio em Farnese, na Itália, Victor
Brecheret (1894-1955) foi adotado pelo grupo
modernista como o “Rodin brasileiro”, o
representante da escultura na exposição da
Semana de Arte Moderna de 1922. Na década de
1910, Brecheret estudou artes no Liceu de Artes
e Ofícios, orgulho da São Paulo que se
modernizava, e depois em Roma. De volta à
capital paulista, o artista se destacou num
ambiente de poucas experimentações na
escultura. Em 1954, o desbravamento do país
pelos bandeirantes, tão valorizado pelos
modernistas paulistas, foi retratado por
Brecheret na obra “Monumento às bandeiras”, no
Parque do Ibirapuera, nas comemorações dos 400
anos de São Paulo.
ARTES Anita Malfatti foi um dos nomes centrais da exposição
que abriu a Semana de 1922. Grande parte de suas
obras já tinha sido exibida na polêmica mostra de 1917,
PLÁSTICAS a pintura “O homem Andrade, comprador da
como
gargalhadas em Mário de
amarelo”, que provocou
pintura. Outros nomes importantes da exposição
foram Victor Brecheret — chamado pelos
modernistas de “Rodin brasileiro” — e Di
Cavalcanti, que começava a transitar dos desenhos
para a pintura, e ainda não retratava as mulheres e
paisagens brasileiras que se tornariam uma de suas
marcas. A presença de Oswaldo Goeldi na Semana foi
anunciada em jornais, mas, ao que tudo indica, ele não
participou.Goeldi representa uma outra vertente do
modernismo brasileiro, de forte influência
expressionista — assim como Lasar Segall. Hoje, a
historiografia revê o papel de artistas como Timóteo
da Costa, Belmiro de Almeida e Eliseu Visconti,
radicados no Rio e considerados “passadistas” pelos
modernistas. Na exposição “Modernidade
antecipada”, em cartaz até 26 de fevereiro na
Pinacoteca de São Paulo, o curador Rafael Cardoso
evidencia a importância de Visconti para a arte do
início do século XX. Entre todos os
modernistas, Tarsila do Amaral talvez seja a mais
recorrente no imaginário popular. Ela ganha uma
exposição no Centro Cultural do Banco do Brasil do Rio,
que será aberta dia 13, com telas
como “Antropofagia” (1929) — mas não
o“Abaporu” (1928).
Na Semana de 1922, o espanto foi causado por “Os
LIVROS sapos”, poema do livro “Carnaval” (1919), de Manuel
Bandeira. “Pauliceia desvairada” , no entanto, entrou
para a História como o livro central da poesia
modernista, em que Mário de Andrade defende a
liberdade e a polifonia. Seis anos depois, já a partir de
suas pesquisas sobre o folclore, Mário escreve
“Macunaíma, o herói sem nenhum caráter”, em que a
polifonia se evidencia na linguagem e na narrativa, na
busca do que o escritor denominava “entidade
nacional”. Nas leituras da obra ao longo dos anos, o
anti-herói — interpretado por Grande Otelo e Paulo
José no filme homônimo de Joaquim Pedro de
Andrade (1969) — se tornou, de forma caricata,
retrato do brasileiro malandro.
Três anos depois de “Pauliceia desvairada”, Oswald de
Andrade publicava “Pau-Brasil”. O livro foi um
desdobramento de seu “Manifesto da Poesia Pau-
Brasil”, que chamava os modernistas à criação de uma
“poesia de exportação”, em 1924 (ano em que Oswald
também escreveu “Memórias sentimentais de João
Miramar”). Ali já se proclamava um afastamento da
importação de tendências culturais, na elaboração de
um projeto de brasilidade que se reforçaria no
“Manifesto Antropófago”, de 1928. A perspectiva
“antropofágica” também está presente em “Cobra
Norato”, escrito por Raul Bopp em 1921, mas
publicado dez anos depois.