O consumo responsável consiste na escolha de bens, que durante a sua produção, distribuição e venda tiveram cuidados sociais e ambientais especiais para com as presentes e futuras gerações: todos os processos não envolveram a exploração de seres humanos, trabalho infantil, sofrimento animal, esgotamento dos recursos e não provocaram danos ambientais. Não colocaram o lucro à frente das pessoas e do ambiente. Também implica que o consumidor siga a política dos 3R+1 – Reduzir o consumo; Reutilizar bens ainda funcionais, reparados ou disponibilizados para troca ou aquisição de baixo custo; Reciclar tudo o que é possível e adquirir de preferência produtos que incorporem elementos reciclados. Por fim, Repensar a aquisição de
determinado bem, refletindo sobre a sua real necessidade.
A Ciência (que) quer salvar a Humanidade – porque em breve será tarde demais
Consumo responsável
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Consumo Responsável
Mais de três quartos das florestas do mundo foram devastadas para alimentar o nosso
consumismo, e ainda assim não há um fim. Vamos para a guerra para assegurarmos reservas
de petróleo e outros recursos naturais, de forma a podermos continuar a consumir. E agora
apenas desejamos encontrar uma tecnologia miraculosa qualquer que permita contornar as
consequências do nosso consumismo. Mas o consumismo livre de consequências é uma ideia
que não existe.
Satish Kumar
Texto_Jorge Moreira [Ambientalista]
Fotos_Ana Clara
Mercado de Olhão
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garantir esses bens e serviços, apareceram
empresas produtoras e distribuidoras que,
na sua maioria, têm como principal objeti-
vo, não a satisfação das necessidades dos
clientes, mas aproveitarem esse ensejo para
obterem o lucro próprio que advém do ser-
viço prestado. Supostamente, quanto mais
produzirem ou venderem, mais lucram.
Mas o lucro também poderá resultar de ou-
tros fatores: vender mais caro quando não
existe concorrência ou introduzir técnicas
que aumentam a produtividade e diminuem
as perdas. Entre as últimas, encontram-se
por exemplo a utilização de agentes tóxicos
e a substituição da mão de obra, com
consequências socioambientais graves.
Quando uma produtora de cereais utiliza
sistemas de monocultura de organismos
geneticamente modificados, com a utiliza-
ção de fertilizantes e pesticidas químicos
e substitui os colaboradores qualificados
por mão de obra barata ou mecanizada, o
objetivo da empresa é o lucro a todo o cus-
to, independentemente da saúde pública,
dos danos ambientais ou dos problemas
sociais derivados do desemprego ou do
emprego precário. Os problemas provoca-
dos podem ser mais graves do que apa-
rentam se forem analisados numa escala
temporal alargada. Carcinomas e doenças
genéticas que aparecem em indivíduos
ou em famílias mais tarde e sem causa
aparente podem ter sido provocados pelo
consumo de OGM ou pelo contato com os
agrotóxicos. Quando uma empresa deste
calibre tem leis do Estado que permitem
estas técnicas abusivas, poderá pensar-se
que a classe política que legisla é ignorante
ou está comprometida com a empresa em
questão. Paralelamente, muitas empresas
similares vendem os seus produtos como
o pináculo da perfeição, recorrendo à pu-
blicidade, comprometendo investigadores
ou adquirindo meios de informação. As
massas são inundadas com imagens-força
sobre a suposta felicidade obtida através
da aquisição de determinados produtos,
que ajudam a engordar os cofres das em-
presas e dos seus donos. O cúmulo que
existe hoje é a situação invertida: políticas
que dão mais importância às empresas e
ao lucro, em nome de uma economia irreal,
do que às necessidades das pessoas ou
do Planeta.
Na segunda edição do CIDADEMAIS, um
evento dedicado às questões ambientais
realizado em julho último no Porto, teve
como tema central o consumo respon-
sável. Numa sociedade marcada pelo
consumismo e pelas consequências
socioambientais inerentes, o tema esco-
lhido pela organização não podia ser mais
pertinente. O CIDADEMAIS debate-se pelo
desenvolvimento sustentável, com especial
atenção à realidade citadina, onde o pro-
blema é potenciado, promovendo a ado-
ção de comportamentos e atitudes mais
responsáveis, envolvendo a cooperação
entre cidadãos, empresas e instituições,
integrando ideias, propostas alternativas e
projetos concretos que rumem à transição
necessária.
O consumo consiste na aquisição de bens
ou serviços que satisfaçam determinadas
necessidades ou desejos especiais. Para
O consumismo surgiu como o graal da
economia vigente. Mas o consumo não
é consumismo nem o lucro deve ser o
objetivo principal das empresas. Também
não precisamos de cair no extremo de
adquirir só o indiscutivelmente necessário
para suster uma vida ou que as empresas
não precisam de obterem lucro. Existe um
caminho do meio. O lucro q.b. pode ser im-
portante para melhorar alguns aspetos da
empresa, como a ecoeficiência, melhores
condições para os seus colaboradores e
comunidades locais e as pessoas também
necessitam de cultura, de se divertirem, de
viajarem, de viverem uma vida plena.Tudo
isto é possível através de uma conduta
socioambiental mais responsável. Como
clientes, basta fazermos escolhas cons-
cientes, eticamente coerentes e sustentá-
veis, ou seja, consumir responsavelmente.
O que é o consumo
responsável?
O consumo responsável consiste na esco-
lha de bens, que durante a sua produção,
distribuição e venda tiveram cuidados
sociais e ambientais especiais para com
as presentes e futuras gerações: todos os
processos não envolveram a exploração de
seres humanos, trabalho infantil, sofrimento
animal, esgotamento dos recursos e não
provocaram danos ambientais. Não colo-
caram o lucro à frente das pessoas e do
ambiente. Também implica que o consu-
midor siga a política dos 3R+1 – Reduzir o
consumo; Reutilizar bens ainda funcionais,
reparados ou disponibilizados para troca
ou aquisição de baixo custo; Reciclar tudo
o que é possível e adquirir de preferência
produtos que incorporem elementos reci-
clados. Por fim, Repensar a aquisição de
determinado bem, refletindo sobre a sua
real necessidade.
Como devemos proceder?
Vários movimentos têm surgido como uma
contracorrente hegemónica que abraçam
o consumo responsável. Movimentos de
transição, decrescimento, simple living,
slow living, permacultura, vegetarianos,
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escolhas por produtos locais e da época,
facilmente disponíveis em mercados tradi-
cionais - não estamos só a ajudar a eco-
nomia local, muitas vezes de subsistência,
como a contribuir para minorar os impactes
ambientais provenientes do transporte,
conservação e armazenamento necessário
de bens transacionados à escala global. De
preferência, optarmos sempre que possível
por produtos de origem biológica e de
comércio justo. Teremos mais garantias da
qualidade do bem, dos cuidados sociais e
ambientais tidos em conta durante a sua
produção e da justeza do preço.
Da mesma forma, bens que incluem o eco-
design serviços certificados com chancelas
ambientais ou procedentes de economias
solidárias, responsáveis e verde devem ser
sempre preferidas no ato da aquisição.
Se tivermos um pequeno espaço ao ar
livre, mesmo sendo um jardim, podemos
plantar árvores de fruto e adaptar parte do
espaço à plantação hortícola. São imensos
os testemunhos positivos de pessoas que
produzem parte dos alimentos que con-
somem, ora como terapia contra o stress,
ora por saberem a qualidade e o cuidado
despendido daquilo que comem. Simulta-
neamente, deixam de comprar os produtos
que produzem. Quem não tem espaço
pode optar pelas hortas comunitárias, tão
em moda, ou aproveitar janelas e varandas
para plantaram em vasos ervas aromáti-
cas, alfaces, tomateiros, etc., até onde a
imaginação, a arte e a natureza permitam.
O que devemos sempre
evitar?
Os problemas ambientais, como a emissão
maciça de poluentes e gases com efeito de
estufa, bem como a destruição da natureza
silvestre, têm origem no fornecimento dos
bens e serviços que sustêm a sociedade
contemporânea. Como a sociedade somos
nós, há um caminho esperançoso capaz de
mudar este panorama doentio. Podemos
ecosóficos e alguns espiritualistas, optam
por uma vida mais simples, livre do consu-
mismo e desprendida do culto da posse.
Uma vida redirecionada para o ser, para
os valores, para o respeito e o cuidado
por todos os seres, para a vivência de
experiências mais reais, no contato com
os outros e a natureza, para a partilha de
saberes, bens e serviços, para a comu-
nhão com os elementos da Vida. Muitas
ecocomunidades vivem esse espírito e são
laboratórios na arte de viver.
Independentemente da importância dos
movimentos existentes para a sustentabi-
lidade, muitos deles exigem uma mudança
tão radical nas nossas vidas, que torna
impossível conciliá-la com determinados
compromissos familiares. Todavia, cada
um de nós pode realizar compras de forma
mais consciente. Ficar alerta perante as
promoções que as grandes superfícies ofe-
recem e não cair na armadilha de comprar
produtos que têm pouca ou nenhuma utili-
dade para nós. Devemos orientar as nossas
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sociedade. Os resultados mais visíveis são
o esgotamento dos recursos naturais e a
dissolução do mundo natural. Mas não é só
a natureza que sofre as inferências de uma
economia sem ética. A destruição dos sonhos
das pessoas de poderem viver uma vida mais
livre para passarem a reféns de um sistema
que engorda gestores egocentrados, não é
só desumana, como é eticamente reprovável.
Quase ninguém consegue fugir ao sistema.
Não há espaço para os livres-viver ou para
a natureza selvagem. As poucas reservas
naturais que ainda subsistem são azo de
ganância por parte das grandes corporações,
que olham para elas exclusivamente de
forma utilitária, como redutos ainda a serem
domados. O panorama agrava-se diariamente
com a perpetuação das políticas neoliberais e
educativas vigentes, o controlo dos media e o
aumento da população mundial.
Um cidadão consciente e sensível é aquele
que consegue contrariar esta tendência de
mercantilizar tudo. Que não olha para as
outras entidades humanas e naturais como
máquinas de lucro, mas com cuidado, res-
peito e valor intrínseco. Que tem a norteá-lo
princípios éticos fundamentais que se tra-
duzem em escolhas responsáveis no seu
dia-a-dia. Sejamos esse cidadão e possa-
mos ainda diminuir a tralha que nos rodeia
e absorve parte da nossa vida e economia,
optando por uma vida mais simples e
autêntica. Abrandar o nosso ritmo de vida,
para sentir o momento na sua plenitude, o
raio de sol que beija a nossa face, o aroma
embelezado que se solta da flor, o bailado
sonoro do canto dos pássaros. Será um
pouco difícil, senão impossível usufruir
destes momentos num shopping ou com
uma mente absorta de objetos desejados.
Sejamos a mudança.
Paz a todos os seres.
evitar ou diminuir o consumo de produtos
que contribuem amplamente para as
alterações climáticas, e.g., agropecuários,
processados, de origem longínqua ou
relacionados com os combustíveis fósseis.
Também é possível acautelar a origem de
bens e serviços que pretendemos adquirir,
rejeitando aqueles que se encontram rela-
cionados com o esgotamento dos stocks,
a diminuição da biodiversidade, a extinção
de espécies, a introdução de exóticas ou
que contenham OGM e químicos nocivos.
Por último, devemos boicotar qualquer
atividade ligada à exploração humana e
animal, à insegurança alimentar e que não
respeite os direitos dos consumidores.
A velha ideia de uma economia de cres-
cimento infinito num planeta de recursos
finitos, fornecida por uma academia alienada
da realidade e alimentada por uma classe
política predatória, continua a perpetuar na
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