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  1. 1. ~ ~ GOD OF WAR: RAGNARÖK GOD OF WAR: RAGNARÖK Junte-se a Kratos em Junte-se a Kratos em Tormenta20 Tormenta20! ! TOOLBOX TOOLBOX Como manter seus herois motivados Como manter seus herois motivados MONSTERCHEFE MONSTERCHEFE A festa acabou de começar! A festa acabou de começar! DRAGAO DRAGAO BRASIL CONTO CONTO A Ilha dos Demônios, A Ilha dos Demônios, de de Rafaela S. Polanczyk Rafaela S. Polanczyk PEQUENAS AVENTURAS PEQUENAS AVENTURAS Abrigue-se no crânio de gigantes Abrigue-se no crânio de gigantes Desvende Desvende Bielefeld neste Bielefeld neste grande preview grande preview do do Atlas de Arton Atlas de Arton! ! ANO 18 • EDIÇÃO 186 CHEFE DE FASE CHEFE DE FASE NAMOR, O PRÍNCIPE SUBMARINO NAMOR, O PRÍNCIPE SUBMARINO BREVES JORNADAS BREVES JORNADAS ALCANCE O TOPO DA TORRE PIRATA, SE FOR CAPAZ! ALCANCE O TOPO DA TORRE PIRATA, SE FOR CAPAZ! RESENHAS RESENHAS INTERVIEW WITH THE VAMPIRE INTERVIEW WITH THE VAMPIRE • • A ARTE DE ABATER ANCIÕES A ARTE DE ABATER ANCIÕES • • GOW: RAGNARÖK GOW: RAGNARÖK O REINO DOS CAVALEIROS O REINO DOS CAVALEIROS
  2. 2. CHEFE DE FASE CHEFE DE FASE NAMOR, O PRÍNCIPE SUBMARINO NAMOR, O PRÍNCIPE SUBMARINO BREVES JORNADAS BREVES JORNADAS ALCANCE O TOPO DA TORRE PIRATA, SE FOR CAPAZ! ALCANCE O TOPO DA TORRE PIRATA, SE FOR CAPAZ! RESENHAS RESENHAS INTERVIEW WITH THE VAMPIRE INTERVIEW WITH THE VAMPIRE • • A ARTE DE ABATER ANCIÕES A ARTE DE ABATER ANCIÕES • • GOW: RAGNARÖK GOW: RAGNARÖK BIELEFELD BIELEFELD O Reino dos Cavaleiros O Reino dos Cavaleiros TOOLBOX TOOLBOX Como manter seus herois motivados Como manter seus herois motivados MONSTERCHEFE MONSTERCHEFE A festa acabou de começar! A festa acabou de começar! CONTO CONTO A Ilha dos Demônios, A Ilha dos Demônios, de de Rafaela S. Polanczyk Rafaela S. Polanczyk PEQUENAS AVENTURAS PEQUENAS AVENTURAS Abrigue-se no crânio de gigantes Abrigue-se no crânio de gigantes DRAGAO DRAGAO ANO 18 • EDIÇÃO 186 GOD OF WAR: RAGNARÖK GOD OF WAR: RAGNARÖK BRASIL ~ ~ Junte-se a Kratos Junte-se a Kratos em uma jornada em uma jornada nórdica em nórdica em Tormenta20 Tormenta20! !
  3. 3. O que ainda há para ser dito sobre Samuel Marcelino, autor da capa deste mês? Não sei, mas é bom pensarmos logo, porque ele não vai embora tão cedo! Nosso Cavaleiro da Mantícora, que vaga pelo reino de Bielefeld, é uma boa prova disso! A CAPA A CAPA 46 46 Gazeta do Reinado Gazeta do Reinado Conheça o novo reitor da Academia Arcana 48 48 Caverna do Saber Caverna do Saber Distinções: o lendário Cavaleiro Silvestre 52 52 Conto Conto A Ilha dos Demônios, por Rafaela S. Polanczyk 72 72 Breves Jornadas Breves Jornadas Em busca do tesouro da Torre Pirata! 78 78 Monster Chefe Monster Chefe O inimigo da festa chegou 82 82 Bielefeld Bielefeld Uma prévia quentinha do Atlas de Arton 98 98 Gloriosos Diários Gloriosos Diários Fim dos Tempos direto da CCXP 100 100 Pequenas Aventuras Pequenas Aventuras Nesta edição, faça escolhas de quebrar a cabeça 102 102 Chefe de Fase Chefe de Fase O Príncipe Submarino invade o RPG 106 106 Liga dos Defensores Liga dos Defensores Evoluindo e aprendendo em 3DeT Victory! 4 4 Notícias do Bardo Notícias do Bardo Ghanor RPG e tudo que aconteceu na CCXP 2022! 8 8 Resenhas Resenhas Interview with the Vampire, A arte de abater anciões, God of War: Ragnarök 11 11 Sir Holand Sir Holand Metas de ano novo nem sempre são fáceis 12 12 Supremo Tribunal Regreiro Supremo Tribunal Regreiro Todos de pé! Confira a súmula de dezembro de 2022 16 16 Dicas de Mestre Dicas de Mestre Enganações que gostamos 19 19 Calabouço Tranquilo Calabouço Tranquilo Ah... os milagres do Natal 20 20 Arquivos Secretos Arquivos Secretos O terror de Stephen King direto para sua mesa 26 26 God of War: Ragnarök God of War: Ragnarök Reinos, raças e origens para Tormenta20! 38 38 Toolbox Toolbox Por que os heróis fazem o que fazem? Editora-Chefe Karen Soarele Editor-Executivo J.M. Trevisan Colunistas Felipe Della Corte Leonel Caldela Rafael Dei Svaldi Thiago Rosa Colaboradores Textos: Ana Carolina Gonçalves, Bruno Schlatter, Daniel Duran, Dan Ramos, Davide Di Benedetto, Glauco Lessa, João Paulo “Moreau do Bode”Pereira, Marcelo Cassaro, Marlon Teske, Rafael Dei Svaldi, Rafaela S. Polanczyk, Vinicius Mendes Arte: Cássia Bellmann, Edh Muller, Eduardo Medeiros, Enrico Tomasetti, Leonel Domingos, Samuel Marcelino, Sandro Zambi, Vitor Louzada Diagramação: Cássia Bellmann Revisão: Elisa Guimarães, Guilherme e Rafael Dei Svaldi, Vinicius Mendes Extras Edição do podcast: Adonias Marques Fundo de tela: Samuel Marcelino HQ: Ricardo Mango Mapa de batalha: Filipe Borin D DR RA AG GAO AO BRASIL ~ ~ Toda vez que eu começo a escrever um editorial, tento seguir algumas diretrizes. Duas delas são: ser sincero no que eu digo e não me repetir demais nos temas. Nesta edição de dezembro, entretanto, vai ser difícil não quebrar a segunda regra. Porque é quase impossível, se não injusto, chegar em dezembro e não fazer um editorial de agradecimento. Não é novidade para ninguém que os últimos anos foram difíceis, porque eles foram difíceis para todo mundo (ok, existe uma parcela muito pequena da sociedade que com certeza sofreu menos, mas isso não é assunto para esta página). Foi difícil para o consumidor, mas foi difícil para quem produz também. Atravessar o lamaçal destes dois (ou quatro) anos sem demissões, sem queda de qualidade, mantendo a chegada de novos produtos exigiu, sem falsa modéstia, muita habilidade, jogo de cintura e a capacidade de manter a fidelidade de todos vocês. Cada leitor precisou fazer escolhas difíceis quando o cinto apertou. Aos que decidiram ficar com a gente, muito obrigado. Aos que abriram mão com aperto no peito por necessidade, meu obrigado também. Todo mundo já esteve do outro lado e sabe como é. Depois de um fim de ano alucinante em termos de lançamentos, esperamos ainda mais de 2023. Só a dupla Atlas de Arton e Ameaças de Arton já é o suficiente para fazer todo mundo salivar. E, mais uma vez, como foi em Tormenta20, vamos precisar da ajuda da comunidade. Mas com certeza não vamos parar por aí. A Jambô é cada vez mais uma editora organizada e preparada para manter o posto que conquistou com muito esforço: o de maior editora de RPG do Brasil. E esse não é nem o fim da nossa Jornada Heróica pessoal. Ainda há muito o que conquistar. Em janeiro saio de férias com a tarefa de trabalhar na pré-produção do curta de Tormenta (e descansar um pouco, porque não sou de ferro). Recebam bem o Thiago Rosa na edição do mês que vem! Mais uma vez, muito obrigado a toda a equipe da editora e aos leitores pelo ano incrível! Nos vemos em 2023! PS. Daqui a um ano estaremos perigosamente perto da Dragão Brasil 200! OBRIGADO! Dragão Brasil é © 2016-22 Jambô Editora. Apoie a Dragão Brasil Siga a Jambô Editora E D I T O R I A L S U M Á R I O
  4. 4. Agora você pode viver suas aventuras no jogo de interpretação oficial do Nerdcast RPG: A Lenda de Ghanor RPG é um manual completo para criar personagens, narrar aventuras e explorar os Sete Reinos. Estude tradições arcanas, governe seu próprio feudo e, se ousar, enfrente um novo Devorador de Mundos: este RPG inclui 7 raças, 11 classes, 30 origens, 60 monstros e mais de 100 itens mágicos, todos inspirados no Nerdcast RPG: Medieval e no universo de A Lenda de Ruff Ghanor, criados por Jovem Nerd, Azaghal e Leonel Caldela. Além disso, Ghanor RPG tem um sistema totalmente compatível com Tormenta20: Edição Jogo do Ano, o que permite que os jogadores usem os dois livros em conjunto. E não para por aí: você pode expandir a sua jogatina com a Caixa de Luxo, que inclui um conjunto de dados excluivos, mapas de batalhas, escudo do mestre, marca-páginas com regras adicionais e um pingente metálico em edição limitada de Ruff Ghanor! Saiba mais em ghanor.com.br. 4 O DESTINO DE GHANOR O DESTINO DE GHANOR ESTÁ EM SUAS MÃOS ESTÁ EM SUAS MÃOS N O T Í C I A S D O B A R D O JAMBÔ NA CCXP! JAMBÔ NA CCXP! 4 5 N O T Í C I A S D O B A R D O
  5. 5. 6 7 N O T Í C I A S D O B A R D O N O T Í C I A S D O B A R D O
  6. 6. A série do clássico Entre- vista com o Vampiro, livro de Anne Rice que moderni- zou os chupadores de san- gue a partir dos anos 70, não é tão fiel ao material original, e talvez esse seja o maior indício de que o entendeu muito bem. Adaptar uma obra renomada sempre é um campo minado: se for fiel demais, perde o potencial da mídia nova e pode acabar com um resultado truncado. Se desviar demais, pode irritar fãs apaixonados que vão se incomodar porque a roupa do personagem era pra ser verme- lho sangue, não vermelho vinho. Nesse sentido, Interview chuta o balde: muda etnias, período histó- rico e até alguns acontecimentos essenciais da narrativa. Louis, antes um latifundiário escravocrata do final do século XVIII, agora é um rapaz negro, que construiu fortuna em atividades questionáveis no começo do século XX. Seu entrevistador, um jovem jornalista ingênuo, agora idoso passando por uma doença terminal, está fazendo sua segunda entrevista com o vampiro. Os fãs mais puristas podem torcer o nariz a princípio, mas a bem da verdade, as intervenções elevam a obra. Louis ganha complexidade quando entra o elemento racial (e poderes de leitura de mente). Daniel Malloy cria dinâmicas mais interessantes como jornalista experiente. No mais, o que temos é uma mistura de história de terror fantástico, com uma história de terror real, no caso, o relacionamento abusivo entre Louis e Lestat. E ao contrário do que ocorreu no antigo filme com Tom Cruise e Brad Pitt, aqui eles são oficialmente um casal disfuncional que tenta resolver seus problemas adotando uma criança. A produção visual da série é belíssima e a direção não se leva mais a sério do que deveria. Há referências ao cinema de horror gótico e obras clássicas sobre vampiros sem nunca cair no pastiche. Há nojeira e efeitos práticos com partes de corpo e sangue falso. E para além disso, os pontos realmente altos: roteiro, direção e um elenco fenomenal. Jacob Anderson deixa fácil se encantar com Louis, facilmente um dos protagonistas mais chatos da literatura. Eric Bogosian é um Daniel amargo e mordaz, o tempo todo encurralando Louis em suas contradições. Bailey Bass é uma Cláudia que alia monstruosidade e ingenuidade de uma forma perturbadoramente carismática. Mas quem leu Anne Rice, sabe: a grande estrela de sua obra é Lestat, e Sam Reid brilha no papel. O personagem consegue ser sedutor e amedron- tador em igual medida, indo do encanto à violência extrema em questões de segundos. Anne Rice’s Interview with the Vampire é uma daquelas adaptações que deixam bem claro que às vezes a melhor forma de ser fiel ao espírito do material original, é se afastando dele, e com a primeira temporada acabando em mais um gan- cho que modifica o original, seria mentira dizer que não estou empolgado para ver onde essa versão das criaturas das trevas vai me levar. VINICIUS MENDES Só uma mordidinha! INTERVIEW WITH THE VAMPIRE Apesar do título chei- rando a horror cósmico, imagine uma coletânea de contos fantásticos que pa- recem escritos por Ray Bra- dbury — o lendário autor de Fahrenheit 451 e Crônicas Marcianas — caso ele tives- se levantado da cova. Está tudo lá: o sentimento nos- tálgico e agridoce, aplicado aos mais diversos gêneros. Ficção científica. Realismo mágico. Surrealismo. Fábio Ochôa é um autor que pouca gente fora da cena brasileira de quadrinhos reco- nhece, mas conta com segui- dores fiéis. Quem lê, respeita. Tanto pela produção em escala industrial de ficção-curta, quanto pelas análises enciclopédicas de cultura pop. Esta antologia co- letou, pela primeira vez, contos escritos por ele ao longo de mais de trinta anos, espalhados em sites nerds e literários. É a obra de um samurai da blogosfera na Era Meiji das redes sociais. Ochôa ganha o leitor logo de cara. Tanto pela qualidade de sua prosa cirúr- gico-telegráfica, quanto pela força bruta de ideias nascidas a partir da mente de alguém forjado na energia cocainômana de mil redações publicitárias. Aqui você encontrará de tudo, mesmo. Por exemplo, a história de um professor embarcando no trem errado na estação ferroviária. O homem vai parar em uma aldeia onde o sol nasce Evento da literatura underground A ARTE DE ABATER ANCIÕES na forma dos olhos incandescentes de um lobo gigante, mas esta fera imortal precisa ser abatida todos os dias pelos guerreiros locais para trazer o anoite- cer. Há também o relato de um policial do BOPE deparando-se com um portal do tempo, e resolvendo utilizá-lo para a desova dos cadáveres de pessoas executadas. Ou ainda a resposta para a pergunta: o que aconteceu em Nova Iorque após King Kong despencar do alto do Empire Estate? Porém, apesar de lembrar o modelo “antológico” repopula- rizado em tempos recentes por séries de tevê como Black Mirror, O Gabinete de Curiosidades e Love Death + Robots, este não é um simples aglomerado de historietas avulsas. Não apenas os melhores contos ochoanianos foram selecionados, como pas- saram por ímpar trabalho de edição do próprio autor, artesa- nalmente costurados dentro de um multiverso. Nenhuma novidade, mas isto é realizado com competên- cia mestra. A costura é quase invisível, com padrõezinhos, temas e personagens que vão se repetindo ao longo das tra- mas. Um efeito cumulativo que vai crescendo em intensidade, culminando no conto que dá nome a compilação, tal qual um quebra-cabeças montado até a última peça. Há pecadilhos. Meia dúzia de frases aqui e ali escritas em tradutorês, ou um personagem carioca que bebe cerveja gaúcha. De resto, é um evento em forma de livro. E pode não ser o equivalente li- terário de um grande festival internacional de música, é claro. Está mais para o show daquela banda que ninguém conhece e só você gosta… Mas, caramba, como tocam bem! DAVIDE DI BENEDETTO 8 9 R E S E N H A R E S E N H A
  7. 7. Depois de uma longa espera, a franquia God of War apresenta a conti- nuação dos perrengues de Kratos e Atreus pelos Nove Reinos enquanto lidam com os caprichos e os planos maquiavélicos dos deuses nórdicos. Usando todo o ar- senal gráfico do PlayStation 5, Kratos tem que lidar com um filho mais rebelde e com deuses mais poderosos… God of War: Ragnarök nos leva de volta ao mundo nórdico que Kratos aprendeu a chamar de lar. Com o conhecimento de uma profecia mórbida, a dupla de pai e filho agora tem que lidar com o olhar cada vez mais atento de Odin a seus passos. Os gráficos continuam maravilhosos, ainda mais potentes com o hardware da nova geração; os combates seguem bem animados e extre- mamente sanguinolentos, além de mais desafiadores; e os diálogos permanecem como um dos pontos mais fortes dessa nova fase da franquia. Há muitos momentos entre Kratos e Atreus, mas Ragnarök vai além e apre- senta novos companheiros de batalha em certas situações. A continuação é um prato ainda mais cheio para quem gosta dos contos da mitologia nórdica. Mundos ainda desconhecidos do primeiro jogo marcam presença no segundo, tanto geográfica quanto narrativamente. Ainda há tempo de visitar cenários familiares, como a fria Midgard. Seguindo a onda de jogos AAA com exploração por meio de missões principais e secundárias, God of War Ragnarök apre- senta algumas sidequests bem interessantes que aprofundam o passado dos persona- gens e revelam mais dos Nove Reinos. No entanto, ainda há algumas missões bem dispensáveis, úteis apenas para os jogadores que caçam troféus e querem platinar o jogo. Já as principais são as responsáveis por fazer a história do jogo brilhar — quem se surpreendeu com as revelações do primeiro jogo pode esperar por mais reviravoltas impressionantes. Como o título indica bem, a trama gira em torno — bem lite- ralmente — da inevitabilidade das profecias, e o quanto é possível controlar e mudar o próprio des- tino. Kratos já enfrentou deuses e lidou até com as Fúrias, mas dessa vez quer apenas proteger o próprio filho de uma guerra sem sentido, em vez de causar uma. Isso o leva a se abrir mais com os outros per- sonagens e contar acontecimentos de jogos mais antigos, quando se tornou um deus da guerra e cha- cinou um panteão inteiro. Apenas em Ragnarök os companheiros de Kratos ganham total dimensão das marcas e arrependimentos que o espartano carrega, e como isso o torna tão avesso a guerras e con- frontos contra outros deuses. Personagens queridos como Mimir e Freya também confron- tam os demônios do próprio passado, inevitavelmente lidando com as consequências de suas ações. Personagens novos cativantes adicionam ainda mais tensão e risco à trama. Se no primeiro jogo dessa nova fase os inimigos não eram tão óbvios, em Ragnarök os vilões são ainda mais ambíguos e misteriosos. God of War Ragnarök aproveita tudo que deu mais certo no primeiro jogo, sem buscar reinventar a roda, mas aprimoran- do toda a experiência e proporcionando um jogo melhor que o anterior em todos os sentidos. GLAUCO LESSA Eu me desenvolvo e evoluo com meu filho… GOD OF WAR: RAGNARÖK 10 R E S E N H A
  8. 8. 1) Qual é a explicação da ação de “reempunhar um arco longo”? Por regra ela existe, mas a cena em si é meio estranha, já que você segura um arco apenas com uma mão e a outra está livre, afinal você está sem- pre a usando para puxar flechas, o que exige muito movimento da outra mão. Do jeito que está, se alguém usar essa outra mão para pegar uma poção, depois precisa “reempunhar” o arco de alguma forma. É até difícil narrar uma cena assim, afinal a mão que vai ser reempunhada está tão livre que você consegue usá-la para puxar uma flecha e depois a colocar no arco. Todos em pé! Os Exmos. Ministros do STR avaliaram as petições enviadas pelos conselheiros da Dragão Brasil e estão prontos para dar seus pareceres. Apresentamos extraordinariamente uma mudança de cadeiras nesta seção. Esta súmula ainda contém respostas debatidas, deliberadas e formuladas por todos os participantes do Supremo Tribunal Regreiro, mas agora elas serão redigidas aqui pelos Exmos. Ministros Thiago Rosa Moreira, presidente do Sindicato Furtivo, e Rafael Dei Svaldi, fundador e presidente do Magistério Monstrográfico. Caso você seja um conselheiro da revista, procure pelo post fixo no grupo fechado dos conselheiros no Facebook para redigir sua petição. Caso não seja, considere tornar-se um, mudando seu nível de apoio para ter suas súplicas atendidas neste tribunal. SÚMULA DE DEZEMBRO / 2022 2) Uma criatura Média pode agarrar uma criatura Colossal? Como os valores de ataque sobem muito, é bem comum em nível alto alguém agarrar um colosso su- premo ou algo assim, mas é uma cena um tanto estranha, afinal a pessoa agarra um dedo do pé do colosso, e ele para. Pior ainda, um lutador usando Imobilizar em um Colosso Supremo. — Cons. Julio Cesar Excelentíssimo conselheiro Julio Ce- sar, muito obrigado pela sua missiva! Sem mais delongas, vamos direto para suas respostas. 1) Empunhar uma arma não significa apenas segurá-la, mas sim assumir uma postura adequada para seu uso. Caso a mão seja usada para pegar outros itens ou até mesmo empunhar outras armas, essa postura fica comprometida. O uso da ação de movimento para reempunhar representa esse ajuste. Lembre-se, porém, que caso seja possível sacar a arma como ação livre (por exemplo, através do poder Saque Rápido) a ação de reempunhar também é feita como ação livre. 2) Sim, apesar de que o mestre pode proibir a ação caso a ache sem cabi- mento. Personagens de tamanho humano agarrando e imobilizando monstros gigantescos é algo comum em histórias lendárias, figurando entre os feitos de heróis como Hércules. • • • Os poderes de paladino Aura de Cura e Cura Pelas Mãos podem curar um companheiro osteon? — Cons. Paulo Vinicius Paladiníssimo conselheiro Paulo Vi- nicius, a resposta é sim e não. Aura de Cura não é um efeito de luz e, portanto, pode afetar osteons. Cura Pelas Mãos, porém, é um efeito de luz e portanto não pode curar osteons. • • • 1) A magia Mão Poderosa de Talude cria uma mão flutuante entre o conjurador e um oponen- te. Essa mão pode realizar certas atividades de acordo com a von- tade do conjurador, mas uma em especial gerou uma dúvida em uma discussão com amigos: a ação “agarrar”. Diferente da des- crição da ação “empurrar”, que deixa claro que a mão empurra o oponente até o alcance máxi- mo da magia, não é dito se esse oponente deve estar adjacente ao conjurador ou se a ação agarrar pode ser feita à distância. Além disso, também não é dito se a mão orbita o conjurador ou se é materializada em um espaço vazio e nem é dado para ela um valor de deslocamento, Vocês poderiam esclarecer esses pontos, por favor? 2) Gostaria de saber como fun- ciona um Campo Antimagia com armas de ataque a distância. No FAQ 1.2 foi informado que conju- radores podem lançar magias para fora de seu Campo Antimagia, mas e se o jogador atirar de dentro de um Campo Antimagia contra um alvo que esteja fora do campo usando uma arma mágica de dis- paro? E se ele atirar contra um alvo que esteja dentro de um Campo Antimagia usando a mesma arma enquanto está do lado de fora? — Cons. Gilmar Burato Arcaníssimo conselheiro Gilmar, va- mos às suas respostas! 1) A mão é conjurada em um espaço a escolha do conjurador, dentro do al- cance da magia e entre o conjurador e um oponente escolhido pelo conjurador. Dentro destes limites, ela pode tanto agarrar quanto empurrar o oponente escolhido dentro do alcance da magia, por isso ela não necessita de um valor de deslocamento. Na prática, com uma ação de movimento o conjurador faz com que a mão alcance o oponente em qualquer lugar (novamente, dentro do alcance da magia). Por fim, quando faz a ação empurrar, a mão não está limitada por seu deslocamento; ela empurra o oponente tanto quanto o resultado de seu teste permitir, até o alcance máximo da magia. 2) Recentemente, os membros do STR optaram por uma nova interpre- tação do texto de Campo Antimagia, que será incorporada à nova versão do FAQ. Com essa nova interpretação, um conjurador não pode lançar magias dentro do Campo. Quanto a armas de disparo, o poder de itens mágicos é apenas suprimido pelo campo. Ou seja, um alvo fora do campo é afetado pelos encantamentos, um alvo dentro do campo não é afetado por eles. A critério do mestre, inclusive, qualquer efeito que afete testes de ataque não se aplicaria se o atirador estiver dentro do campo antimagia. • • • Qual seria a ação necessária para trocar a empunhadura de uma arma adaptável? Por exemplo, para trocar entre empunhar uma espada bastarda com uma mão para empunhar a mesma espada bastarda com as duas mãos? — Cons. Lucas Waterkemper Alberton Marcialíssimo conselheiro Lucas, a ação necessária é uma ação de movi- mento, de forma similar a reempunhar uma arma de duas mãos (T20 página 142). Porém, caso a arma em questão possa ser sacada como uma ação livre (por exemplo, caso o usuário tenha o poder Saque Rápido), a empunhadura pode ser trocada como uma ação livre. • • • Algumas dúvidas que surgiram em uma mesa que mestro: 1) A ativação dos poderes Ar- madilha e Marca da Presa, ambos de Caçador, é considerada uma ação chamativa para efeitos de Furtividade? 2) Uma criatura sob efeito de Marca da Presa que caia em uma armadilha de espinhos recebe o dano extra da Marca da Presa? — Cons. Everton Vieira Martins Excelentíssimo arapuqueiro e conse- lheiro Everton, vamos às suas respostas! 1) A perícia Furtividade indica que “Esconder-se é uma ação livre que você só pode fazer no final do seu turno e apenas se terminar seu turno em um lugar onde seja possível se esconder. (...) Se tiver atacado ou feito outra ação muito chamativa, sofre –20.” A definição de ações muito chamativas é deixada em aberto justamente para dar margem aos mestres para tomar decisões em situações específicas. A resposta final desse tipo de 12 13
  9. 9. pergunta sempre caberá primariamente ao mestre da mesa em questão. Porém, Marca da Presa é uma ação que depende exclusivamente do caçador e não exige gestos nem palavras. Parece bem razoável considerá-la uma ação mais discreta. Os poderes de Armadilha, por outro lado, en- volvem uso de vários artifícios com grande potencial para fazer barulho. É razoável considerá-los uma ação muito chamativa. Porém, lembre-se que você sempre pode argumentar com seu mestre — talvez o seu caçador tenha pedido ajuda ao inventor do grupo para lubrificar as peças, tornan- do sua armadilha menos barulhenta. 2) Sim. Marca da Presa se aplica a todas as rolagens de dano contra a criatura afetada. • • • Olá, venho tirar outra dúvida e já deixo minha gratidão pela resposta. Como efeitos de teleporte inte- ragem com a condição agarrado? Um arcanista agarrado é capaz de se teleportar, ou mesmo passando nos dois testes ele ainda seria in- capaz de sair dessa situação? — Cons. Fagner Ferreira Excelentíssimo conselheiro Fagner, sua pergunta é capaz de fazer Noturno dos X-Men fazer BAMF e deixar para trás uma pequena nuvem de enxofre! Antes de mais nada, lembre-se que estar agarrado é considerado uma con- dição terrível para lançar magias (T20 página 171). Ou seja, o arcanista do exemplo precisa ter sucesso em um teste de Vontade com CD 20 + custo em PM da magia de teleporte para poder lançar a magia. Caso tenha sucesso, porém, escapa da condição agarrado. 14
  10. 10. D I C A S D E M E S T R E Nem tudo Nem tudo precisa ser precisa ser verdade dentro verdade dentro do mundo de jogo! do mundo de jogo! Muito tenho ouvido, em minhas incursões no Reinado, de um fabuloso país no extremo leste de Arton governado, com garras de ferro, por um imenso dragão vermelho. Veja, não se trata de força de expressão. Vez por outra registra-se suas visitas à capital de Deheon em forma élfica, mas se tem em certeza de que se trata do Dragão-Rei Sckhar, em carne, osso e fogo vulcânico, tendo inclusive o reino sido derivado de seu nome. Pois eu digo, sem sombra de dúvida: tal coisa não existe. Veja: dragões, por mais inteligentes e ardilosos que sejam, ainda não passam de feras gananciosas e individualistas demais para governar seres vivos, ainda que lhes trate como gado de abate. Mesmo assim, um dragão jamais se preocu- paria em cuidar de suas manadas, ao invés de apenas lhes dar caça. Sei que há, pelas vastidões dessa terra, criaturas deste tipo que ativamente são chamadas de Dragão-Rei… mas é apenas uma classificação taxonômica, e a correlação filosófica desse termo é apenas um disparate. Imagino, com certa irreverência, por quanto tempo um dragão suportaria a política e intriga do jogo dos tronos antes de cozinhar viva a corte com seu sopro de fogo. Dizem que a criatura vê a nação como seu tesouro pessoal de covil, mas é absurdo sequer cogitar que Sckhar admitisse não controlar pessoalmente cada moeda de ouro em que deita em cima… afinal, não pode jamais enxergar toda a extensão de seu reino em um mero virar de pescoço. O mais provável é que, assim como os reis de antiga- mente, este tirano de linhagem antiga, muito possivelmente um mago fugido de Lenórienn, tenha se apossado de uma forma divina metafórica. Outrossim, não é incomum que humanos e demais raças inferiores se refiram a seus senhores feudais como animais graças às criaturas representadas em sua heráldica, especialmente os mais nobres e lendários. Portanto, senhores, até o dia em que eu testemunhar tais escamas régias com meus próprios olhos, afirmarei catego- ricamente que essa não passa de mais uma das fantasias imaginativas vindas dos recantos distantes. – Relatório de campo n. XXIII do Ano de Tauron de 14XX, pela mão do Coronel de Campo Darrakis do Sexto Batalhão de Subterfúgio Raízes da Oliveira Vivemos em um mundo repleto de lendas, superstições e tradições. Desde os tempos mais primórdios, o ser humano aprendeu a criar explicações sobrenaturais para o que não entendia e, nos períodos históricos que inspiram a fantasia medieval, lendas e fábulas eram parte do cotidiano. Fenômenos estranhos ainda inexplicáveis para a ciência, doenças estranhas à medicina contemporânea, entre outros. Tudo ganhava contornos fantasiosos: vampiros se escon- diam na escuridão dos becos. Demônios podiam entrar pela sua janela. Trolls espreitavam sob as pontes. Certas doenças eram obras de fadas. A noite é escura e cheia de terrores, como diria uma certa senhora de Game of Thrones. No livro Devoradores de Mortos, o navio dos protagonistas confronta um monstro marinho grotesco (nada mais que uma baleia). Povos atribuíam características sobrenaturais ou mitológicas a pessoas de lugares distantes, fósseis de dinossauros deram origem aos dragões e um sem número de animais fantásti- cos surgiram de descrições exageradas ou inventadas por viajantes. Isso sem falar nas sociedades inseparáveis de sua mitologia, como a greco-romana e a escandinava. A fantasia medieval literária e do RPG é, em maior ou menor grau, a solidificação desses medos e lendas. Temos gente que realmente solta fogo pelas mãos. A floresta está mesmo cheia de monstros. O fantasma da casa mal-assom- brada pode muito bem ser… um fantasma, ou alguma outra criatura horripilante. Costumamos considerar verídico tudo que é descrito nos cenários de campanha porque eles são quase sempre a “versão verdadeira” das coisas para a pessoa que vai mestrar não se perder. Mesmo se algo é deixado vago, mal explicado ou como parte de lendas e boatos, o público costuma pedir a explicação real. Quem não queria saber de onde veio a Tormenta? A internet está entupida de teorias sobre as Grandes Verdades™ de obras como Dragon Age e The Witcher (sem falar nas que já foram reveladas). Em Castelo Falkenstein, Sherlock Holmes coexiste com seu criador Sir Arthur Conan Doyle, e o Japão é governado por dragões imperadores. Sim, no RPG, o mundo é seu e você muda o que quiser. Eu sei. Mas muitos de vocês se sentem presos ao cânone do cenário, especialmente se ele tem bastante suporte. Minha proposta aqui é te ajudar a se rebelar, mas sem deixar seu jogo desatualizado! 17 DENTRO DA FANTASIA A FANTASIA
  11. 11. D I C A S D E M E S T R E Com o tempo, porém, fui percebendo que na verdade eu podia ter a liberdade que quisesse dentro de qualquer cenário de campanha ao considerar minhas alterações o meu headcanon (termo que indica uma crença pessoal sobre a história que não foi demonstrada oficialmente; ou seja, algo que acontece apenas na cabeça do fã), mantendo as versões oficiais das coisas sempre como uma das muitas possibilidades de verdade. Meio confuso, eu sei, mas me deixa explicar. Como dito anteriormente, mesmo em um mundo de fantasia, ainda podemos deixar algumas coisas como fruto de exageros de uma história que passa por muita gente (seja por distâncias ou através de gerações). Lendas e mitologia podem ser parte de um povo, histórias para ensinar crianças e formar valores. Fantasia ainda pode ser criada para desinformar inimigos, esconder verdades ou alguma outra forma de propaganda… igualzinho no mundo real. Em Dragonlance, cada raça do cenário tem sua própria versão de como o mundo foi criado. Quem está certo? Não importa. Em Game of Thrones, como não há eventos mági- cos e criaturas fantásticas há muito tempo, as pessoas passaram a dizer que dragões, magia, snarks e gra- mequins são como contos de fada (sim, a memória do povo é curta). Ao longo da história, obviamente descobrimos que a coisa não era bem assim. E ainda há o costume de chamar as casas pelos animais do brasão, de modo que você tem os lobos Starks, a lula gigante Greyjoy, os leões Lannister, etc. Até mesmo em mundos de alta magia, com coisas fantásticas acontecendo no dia a dia da população, é possível pensar na fantasia dentro da fantasia. As pessoas tendem a achar que qualquer coisa vagamente diferente do que estão acostuma- das é um absurdo. Onde já se viu um goblin azul? Todo mundo sabe que goblins são verdes. Que história é essa que em Valkaria tem restaurantes com o mesmo nome, especialmente um nome tão estranho quanto “Castelo do Sabor”? Profecia da Flecha de Fogo? Que lorota. O interessante nessa abordagem é que você tem os dois mundos, e pode aceitar tudo que o cenário de campanha tem a oferecer sem se preocupar em mudar o que gosta quando essa coisa realmente for entrar na aventura. Você só precisa decidir o que é verdade e o que não é na hora H. Como nosso minotauro lá do começo, que provavelmente já descobriu que Sckhar é beeem real… Canon vs. Headcanon Não consigo usar absolutamente nenhum material de RPG sem mudar um monte de coisas. Tenho essa mania de deixar tudo do meu jeitinho. Gosto de ter a base pra jogar meus temperos, entende? Imagino que seja assim com boa parte das pessoas que mestram RPG. Às vezes acho algo tosco e altero, ou quero criar e detalhar alguma coisa que ainda não foi explorada. É normal. Só que isso sempre me trouxe duas preocupações: uma era de fugir demais do material original e a coisa toda perder a essência. A outra é que é muito tentador se manter ao cânone. O cenário vai seguindo, aparecem novos materiais, o fandom pira, e você não quer se sentir excluído. (Já cheguei até a arranjar um problema pra comuni- dade de Tormenta, porque meu mapinha pessoal cheio de alterações foi parar na internet e um monte de gente acabou sendo levada ao engano achando que era oficial. Desculpa, quinteto!) As belezas do retcon Mas aí você mesmo fez o seu cenário, e tudo que eu disse até agora não serve. Certo? Errado. Além de todos os benefícios de poder criar histórias fantasiosas, confundir os personagens dos jogadores, manter o cenário sempre surpreendente e poder introduzir qualquer coisa a qualquer momento na sua campanha sem a necessidade de ter falado daquilo antes… você pode mudar o que quiser na hora que quiser, inclusive no passado. Às vezes alguém teve um dia ruim, faltou inspiração na hora do jogo ou outra adversidade. Daí faz-se uma bes- teira, uma briga desfaz o grupo, o TPK parece próximo, uma dungeon é mal conduzida, as coisas saem do controle. Geralmente dá pra contornar a situação ingame e/ou a coisa acaba gerando novos plots e tudo fica bem. Às vezes, no entanto, uma cena ou a campanha inteira é arruinada. O clima fica ruim, a história vai sendo empurrada com a barriga e encontra um fim precoce. (Ou às vezes você só é como eu, incrivelmente desmemo- riado, e vive esquecendo fatos e personagens do passado.) Quando essas coisas acontecem, uma boa forma de salvar o dia é o retcon (retroactive continuity). É um termo usado em quadrinhos e outras obras de ficção, onde muda-se coisas pregressas na história para preencher lacunas, consertar problemas, explicar algo melhor e coisas do tipo. Assumir que seu mundo de fantasia é um lugar cheio de, bem, fantasia (perceba que eu evitei bastante o uso do termo fake news durante todo o artigo) é uma forma excelente de usar retcons, com a abordagem de que aquilo sempre foi assim no cenário, mas os personagens dos jogadores tinham ouvido falar de algo exagerado ou inverossímil. Dá até pra “voltar no tempo” e “recontar” cenas que saíram ruins, melhorando ou apagando algo que não deu certo na história. Claro, tudo em comum acordo com os jogadores; muita gente não gosta nadinha de retcons, mas eu sempre advogo pela diversão do grupo. Então, talvez você até consiga con- vencer os “incrédulos” a usar esse recurso narrativo, desde que haja uma boa desculpa dentro do jogo. E nem preciso dizer, mas vou dizer assim mesmo: use com parcimônia. Minha dica aqui é guardar o retcon para coisas importantes, como inserir raças de um suplemento novo no mundo ou provocar os personagens dos jogadores com relatos fabulosos sobre eventos cataclísmicos. Ou ambos, não é, osteons? DAN RAMOS 18 19 D I C A S D E M E S T R E Dragon Age Inquisition: Dragon Age Inquisition: Solas enganou os deuses, Solas enganou os deuses, o povo e nós, jogadores o povo e nós, jogadores
  12. 12. O SEGREDOS DO MESTRE DO HORROR, ATERRORIZANDO SUA MESA DE ORDEM PARANORMAL INSPIRAÇÃO MACABRA ARQUIVOS SECRETOS Na história da literatura, do cinema, das ani- mações e séries, é difícil apontar um autor específico como o grande mestre do horror, de modo definitivo. O cara mais tenso na hora de causar medo em todo mundo ou de te deixar extremamente incomodado sem fazer muito esforço. Aquele maluco capaz de te apavorar com duas ou três linhas de texto, e de esculpir na sua cabeça uma imagem mental que não vai sair de lá por anos. Sim, com candidatos como Clive Barker, Love- craft, Edgar Allan Poe (só para ficar nos clássicos), é difícil mesmo. Para os outros. Para mim é bem fácil: o mestre é Stephen King. King vem, desde a década de 1970, destruindo as almas e mentes que se atrevem a ler suas páginas, com a naturalidade de quem dá a volta no quarteirão para comprar pão e sorvete (quem compra pão e sorvete? Não sei. Mas foi o que veio na hora). Seu tom casual e familiar, sem enrolação desme- dida, serve para aproximar o leitor de um jeito único, inspirando muitos outros criadores, incluindo este que vos fala. Sério, se você consumiu terror nos últimos 40 anos, a impressão digital de Stephen King está lá em algum lugar, mesmo que você nem tenha se dado conta. Assim, me parece muito lógico buscar dicas na mais profunda das fontes na hora de criar sua campanha ou aventura de Ordem Paranormal. Segure seu amuleto preferido, porque é hora de deixar a membrana mais fina e encarar os horrores de frente! ADEUS, VIDA NORMAL! De certa forma, assim como em Ordem Paranormal, na maior parte dos contos e livros de King, pessoas comuns são arrastadas de encontro a acontecimentos paranormais ou inexplicáveis e, até que se estabeleçam nesta nova situação, criando mecanismos de reação e defesa, precisam se virar para lidar com algo que até então não fazia parte de suas vidas. Sim, os personagens de Ordem têm ao seu lado a, er, Ordem da Realidade. Mas não existe motivo que nos impeça de extrair inspiração das obras do Mestre Máximo do Terror. Não custa avisar que este texto inevitavelmente conterá vários spoilers, embora eu prometa tentar não colocar nada que estrague a experiência. Eu sei que é bem mais fácil assistir os filmes, mas se você resolver ler as obras originais, me dê um toque no Twitter. Eu vou gostar de saber. A COISA Em A Coisa, transformado em filme mais de uma vez (para a surpresa de ninguém, o livro é melhor, apesar de bem longo), um palhaço assassino assola a cidade de Derry, matando em sua maioria crianças. Sua tática é bem covarde: atrair os pirralhos com a promessa de diversão e balões infinitos em um lugar onde nada chato existe. Bem no comecinho do filme, George Denbrough é morto pelo monstro ao ser arrastado para um bueiro (a cena é de cortar o coração). Os protagonistas são um grupo de garotos, um deles é o irmão de George, que prometem acabar com a criatura e se reunirem depois de adultos para fazer o mesmo caso o horror volte um dia. Um doce para quem adivinhar o que acontece. V Em Ordem Paranormal: Não é difícil imaginar uma situação em que os personagens determinam a aventura da infância em seus históricos ou na sessão zero, e são convocados para lidar com a ameaça de novo depois de adultos justamente por terem sido bem sucedidos anteriormente em con- dições ainda mais adversas. Assim como no livro, talvez nem todo mundo esteja contente com a ideia e precise ser convencido a encarar o palhaço no- vamente (que, é claro, é muito mais que um mero palhaço psicopata). V Onde assistir: A primeira parte da versão mais recente pode ser encontrada na HBO Max e na TN- TGo. A segunda parte está disponível no Amazon Prime Video e HBO Max. Já a versão clássica, de 1990, pode ser alugada na Microsoft, Apple TV e Amazon Prime. beijo para quem ta lendo 21
  13. 13. CHRISTINE, O CARRO ASSASSINO Sim, é isso que você leu. É um carro assassino que se chama Christine. Mas não feche a revista ainda: o livro estranhamente é bom. Arnie é um adolescente nerd cheio de espinhas na década de 1970, obviamente zoado pelos amigos. Um grande clássico. Até que um dia ele encontra um carrão caindo aos pedaços sendo vendido por Roland, um senhor de idade de saúde debilitada, e o compra por 250 dólares. A ideia dele é simples e nada ruim: reformar o veículo e ganhar popularidade com as garotas. E meio que é o que acontece, só que de uma maneira bizarra. A dedicação de Arnie faz com que o carro comece a regenerar sozinho, enquanto ele próprio se transforma em uma versão muito melhor de si mesmo. Além disso, os inimigos do agora confiante adolescente, começam a ser atropelados misterio- samente. Christine nitidamente se alimenta da devoção de Arnie. Seu histórico nas mãos do dono original também não é dos mais saudáveis. A filha do homem morreu engasgada com um hambúrguer no banco de trás, e a esposa se matou no banco da frente tempos depois. Coisa finíssima. V Em Ordem Paranormal: Descobrir que tudo isso está acontecendo passa não só por investigar a vida de Arnie, ou de quem quer que esteja com o carro, mas também o passado de Roland, além de superar a incredulidade da premissa “tem um carro andando sozinho por aí matando gente”. E já que a ideia é se inspirar, quem disse que a gente precisa se contentar com UM carro? Talvez isso aconteça em outros lugares, em outras situações. Talvez, em algum lugar, um caminhoneiro solitário tenha se dedicado demais a cuidar de seu principal instrumento de profissão… V Onde assistir: Preferi não ver o filme por dois motivos: é de 1983 e eu acho que é mais difí- cil segurar o conceito todo em vídeo do que numa mídia escrita. Mas tem gente que jura que ele é ótimo! Disponível apenas para aluguel no Google Play e Apple TV. O CEMITÉRIO Oh, boy. Dependendo da sua idade você deve ter ouvido falar desse livro como O Cemitério Maldito. Ou de repente já ouviu a música dos Ramones, Pet Sematary, feita para a primeira adaptação cinematográfica. É o meu favorito, junto com A Coisa. Um dos livros mais sutis de King, mas também um dos que batem mais forte, dependendo da sua vivência. Louis Creed se muda para uma casa nova, na beira de uma estrada muito movimentada, com a esposa, suas duas crianças, Ellie e Gage, e seu gato, Church. Louis fica muito amigo de um senhor que mora do outro lado, Jud, e ele mostra à família um lugar bem peculiar atrás da casa deles: o Cemitério de Bichinhos. Basicamente um lugar onde as crianças locais enterram seus pets. Macabro, mas fofo. Só que aí você faz a matemática (estrada movimen- tada + gato + criança) e é lógico que vem tragédia por aí. O gato é atropelado e o pai fica com dó de contar para a filha. Jud simpatiza e diz para Louis enterrar o gato no Cemitério de Bichinhos. Ele faz isso e, na tarde seguinte, Church aparece de volta, do nada. O problema é que ele parece meio estranho, se comporta diferente e a menina sequer quer ficar perto dele. Então, meses depois, Gage, o garotinho fofo, é atropelado por um caminhão. E aí, meus amigos, o que é tentar trazer um filho dos mortos para quem já fez o mesmo por causa de um gato, não é mesmo? V Em Ordem Paranormal: A ideia de pessoas que voltam dos mortos não é nada original. O que faz diferença no livro é a expectativa de que isso vá acon- tecer, e a sutileza das alterações que isso provoca. Em um contexto mais amplo, investigar quem é que voltou dos mortos, os efeitos disso, e corrigir o problema é a grande pegada. É normal encontrar histórias em que as pessoas querem se livrar dos mortos-vivos, mas o que fazer se o familiar vivo não quiser que isso aconteça? V Onde assistir: O livro tem duas adaptações, uma de 1989 (a da música dos Ramones) e outra de 2019. Nunca vi nenhuma, porque a história já é perfeita demais como foi escrita. A dos anos 80 não consegui encontrar, mas se você quiser arriscar, a versão mais recente está disponível para aluguel na Amazon, Apple TV e na Microsoft. O ILUMINADO Aquele caso em que o filme, com o tempo, acaba se tornando mais famoso que o próprio livro. Os memes e as cenas enraizadas na cultura pop ajudam. Ter sido dirigido por Stanley Kubrick também. Jack Torrance (um pretendente a escritor e alcoólico em recuperação), a esposa e o filho, se mudam para o Overlook Hotel, onde ele assu- mirá o cargo de zelador no inverno, quando não há hóspedes e tudo fica coberto pela neve. O trabalho é bem simples, e por isso ele vai ter todo o tempo do mundo para escrever. Ah, sim. A vaga só existe porque o zelador anterior ficou louco misteriosamente, matou a própria família e se matou. Um mero detalhe. Aquestãoéque,paraasurpresadeninguém, o Overlook está infestado de fantasmas que ficam provocando o lado mais obscuro de Jack, com visões e tentações quase inescapá- veis. Quem paga o pato, claro, é a coitada da esposa e o filho, que por um acaso é sensitivo. V Em Ordem Paranormal: A história do Overlook por si só já é um prato cheio para qualquer investigação, mas o desafio de lidar com tudo o que acontece por lá e manter a sanidade é a cereja do bolo. Se o personagem tem um medo, um trauma ou um grande desejo, tenha certeza que o hotel vai tentar manipulá-lo para se voltar contra o próprio grupo. É o tipo de aventura que deve ser negociada com os jogadores de alguma forma, mas ter um amigo como inimigo costuma ser uma expe- riência inesquecível. V Onde assistir: O clás- sico de Kubrick está disponí- vel na HBO Max. Existe uma série de TV que contou com super- visão do próprio Stephen King (que nunca gostou muito da versão para o cinema), mas o final é tão tosco que eu nem me esforcei para procurar. Stephen King tem a prática de manter suas histórias quase sempre no mesmo lugar: a maior parte se passa em cidades localizadas no estado do Maine, não por acaso, seu estado natal. Castle Rock é a mais conhecida delas, mas Derry e Salem’s Lot também povoam a imaginação dos fãs. Para quem pretende criar suas próprias aventuras de Ordem Paranormal, há uma ótima lição a ser tirada daí. Por um lado, King escreve sobre o Maine porque conhece o Maine. É onde ele cresceu, estudou e viveu. Ele sabe como são as estradas, as lojas, as casas, o povo, o sotaque e, por conta disso, consegue passar para as páginas uma verossimilhança difícil de conseguir inventando tudo do nada. Por outro, as três cidades citadas no primeiro parágrafo não existem na vida real. São uma mistura de localidades que King visitou ou frequentou, moldadas para o tipo de história que escolheu contar. Por estarem inseridas num meio familiar, um entorno absolutamente crível, funcionam. Assim, você pode, por exemplo, ambientar sua história em Belém, se for paraense. Mas também pode criar Santa Inácia do Tronco Torto, uma cidade no interior do estado, com características peculiares, e nublar os limites do que é real e do que não é em sua campanha. TUDO ACONTECE NO MAINE 23 22
  14. 14. TROCAS MACABRAS Num belo dia em Castle Rock, surge uma nova loja chamada Needful Things (algo como Coisas Necessá- rias, numa tradução rápida), cujo dono é um velhinho muito simpático chamado Leland. King tem algo com velhinhos simpáticos, embora nem todos se mante- nham assim até o fim da história. O grande diferencial do estabelecimento é que quem entra ali costuma encontrar em suas prateleiras o item que sempre sonhou ter, por mais estranha que a possibilidade possa parecer. Como é um cara muito legal, Leland costuma exigir como preço nada mais do que o que a pessoa tiver no bolso no momento… e um favor futuro. Uma brincadeira. Uma pegadinha contra algum outro morador da cidade. Coisas inofensivas. Lógico que, com o tempo, Leland acaba enre- dando Castle Rock inteira num sistema complexo de recompensa e vingança, que pisa no sobrena- tural mas diz muito também sobre como funciona a mesquinhez da alma humana. V Em Ordem Paranormal: O envolvimento dos jogadores pode acontecer em qualquer das etapas do plano do dono da Needful Things. Quanto mais avançado, falando no português claro, mais o pau tem chance de quebrar, colocando em risco a própria existência de Castle Rock (ou de qualquer outra cidade que o mestre queira usar). Indo mais longe, talvez essa Needful Things seja apenas UMA de várias abertas em outros lugares, ampliando ainda mais a investigação e o potencial de desgraça. V Onde assistir: Trocas Macabras tem um filme bem honesto, produzido em 1993. Tem até ator indicado ao Oscar no elenco (Ed Harris). Disponível no canal MGM, dentro do Amazon Prime. O NEVOEIRO Aqui, ao invés de um romance, temos uma novela (que nada mais é que um conto turbinado, não deixe os escritores confundirem você com explicações complicadas) e um filme de cair o queixo. A premissa nem é complicada. Depois de uma tempestade, a cidade de Bridgton é cercada por um nevoeiro super denso e misterioso. Há quem diga que a culpa é de experimentos numa base militar, mas ninguém tem certeza. O protago- nista, David Drayton, e seu filho ficam presos dentro de um supermercado, cercados pelo fenômeno. Quem tenta sair é atacado por monstros de proce- dência desconhecida. O confinamento no templo do consumo aflora a esquisitice de uma série de personagens. Entre eles a Senhora Carmody, uma fanática religiosa que acredita, obviamente, que o acontecido faz parte de uma profecia que decreta o fim do mundo e começa a recrutar seguidores. O fim do filme é diferente da versão literária, e é tão devastador que o próprio King já declarou achá-lo melhor que a sua ideia original. V Em Ordem Paranormal: O grande apelo da aventura é o isolamento do resto do mundo, de seus recursos, e uma possível busca pelo responsável pelo fenômeno. Claro, a coisa toda pode ter surgido a partir de um ritual feito fora da cidade (e aí o problema é sair do supermercado ileso), mas e se o culpado estiver ali dentro, junto com todo mundo? V Onde assistir: O Nevoeiro está disponível no Amazon Prime e HBO Max, e vale cada minuto. Existe uma série de 2017 que eu nunca assisti, mas pode ser vista na Netflix. HORROR, SIM! CUIDADO, TAMBÉM! Como estamos falando de obras literárias e cine- matográficas, principalmente antigas, é normal que se encontre imagens bem impressionantes. Em A Coisa há uma sequência que envolve a explosão de uma antiga fábrica enquanto crianças procuravam ovos de chocolate. A descrição, sem brin- cadeira, me assombra até hoje e é o exemplo que eu dou toda vez que preciso explicar o que é uma boa cena de terror. Mas RPG é um meio dinâmico, interativo e muito mais envolvente. É preciso ter cuidado na hora de transpor ideias para a mesa. Nunca passe por cima das emoções dos joga- dores e lembre-se sempre: os perso- nagens devem ser explorados, não quem os controla. Por mais que você, mestre, se empolgue com todo o material e as ideias mostradas aqui (e eu vou ficar muito feliz se isso acontecer), lembre-se sempre de dosar de forma inteligente os acon- tecimentos e de respeitar traumas declarados pelos jogadores. A ideia, claro, ainda é explorar o horror, mas a responsabilidade é um ingrediente essencial. VOCÊ QUER UM BALÃO? Por hoje é o que temos, mas a verdade é que há muito a ser explorado! Não só a obra de Stephen King é imensa (nem falamos de A Hora do Vampiro, sua releitura moderna de Drácula), como há muita coisa de outros autores que podem ser adaptadas ao contexto de Ordem Paranormal. Se você é Conselheiro da Dragão Brasil e gostou da ideia, dê um toque no nosso grupo exclusivo. Se não é, deixe um recado nas redes sociais. Quem sabe eu volto para mais uma rodada? Cheers! J.M. TREVISAN 25 24
  15. 15. GOD OF WAR: RAGNARÖK Profecias, reinos, Profecias, reinos, novas raças novas raças e origens em e origens em Tormenta20! Tormenta20! Por Por Glauco Glauco Lessa Lessa e e Felipe Della Corte Felipe Della Corte
  16. 16. 28 29 A D A P T A Ç Ã O A D A P T A Ç Ã O Esta matéria é sobre um infame deus da guerra… e não estamos falando de ninguém de Arton! God of War Ragnarök foi lançado agora, no fim de 2022, e já é um sucesso entre a crítica e os fãs. As aventuras de Kratos e Atreus pelos Nove Reinos não são parecidas com uma campanha de RPG por acaso — aqui você vê como trazer o clima (frio!) do jogo para sua mesa! Depois de cinco anos sem dar novidades sobre a fran- quia, a desenvolvedora Santa Monica Studios lançou God of War em 2018. Conhecido como God of War 4 entre os fãs, o jogo marcou uma nova fase para a franquia e para Kratos. Agora, não só Kratos estava em uma outra região do mundo, como tinha recomeçado a vida e tido um novo filho. A jogabilidade saiu do bom e velho hack ‘n slash para o gênero de ação e aventura. Passamos a ver Kratos através de uma câmera por cima do ombro (famosíssima em Resident Evil 4, por exemplo), como em outros jogos mais recentes — e mergulhamos em um lado mais introspectivo, cansado e silencioso do espartano. Com o sucesso desse novo recomeço (que não foi um reboot, como muitos chegaram a cogitar), o surgimento de uma continuação não seria nada surpreendente. E aqui está. God of War Ragnarök segue os passos de seu jogo predecessor, com melhorias na jogabilidade, novos aliados e vilões e reviravoltas ainda mais acachapantes. Arton também é um mundo com muita intriga divina. Além de opções de regras para Tormenta20, vamos mer- gulhar na mitologia de God of War e entender como os deuses podem deixar sua mesa de RPG mais emocionante! Começando pelo fim Talvez mais famosa que as próprias divindades nórdicas seja a história que conta o seu fim. O Ragnarök é mais do que um mito — é uma profecia conhecida pelos próprios deuses, incapazes de mudar o próprio destino. Traduzido frequentemente como “destino final dos deuses” ou “crepús- culo dos deuses”, o evento começa com um longo inverno conhecido como Fimbulvetr (no jogo, Fimbulwinter), que logo dá sucessão a uma série de confrontos mortais entre os deuses, levando todos à morte. Um incêndio colossal dá lugar a um dilúvio, em que o mar afoga toda a terra. No fim, há um novo começo: um casal de humanos, Líf e Lifthrasir sobrevivem e repovoam Midgard. Na franquia God of War, o Ragnarök começa no fim do jogo de 2018 e se estende durante os acontecimentos do jogo deste ano. A característica mais marcante logo de cara são as mudanças climáticas do Fimbulwinter de cada um dos Nove Reinos. Kratos vê a si e seu filho envolvidos nessa profecia, e se você se lembra bem do jogo anterior, sabe porque! Profecias em jogo RPG é um jogo de narrativa compartilhada. Por isso, é muito difícil contar histórias sobre profecias — afinal, os jogadores têm poder para mudar o rumo da história. Ou o mestre teria que forçar a mão para a trama “voltar para os trilhos” (o que pode ser bem frustrante), ou os jogadores precisariam ter a possibilidade de alterar a profecia. Um truque eficiente para envolver uma profecia na sua mesa é inseri-la retroativamente. Os personagens dos jogadores não precisam saber que são personagens de uma profecia: depois de cinco ou seis sessões, podem descobrir que tudo o que fizeram e passaram até aquele momento já estava previsto. Os próximos passos da profecia são vagos ou misteriosos, conhecidos apenas pelos deuses (que estão atentos aos personagens) ou pelos vilões (que estão tirando proveito disso). Dessa forma, qualquer atitude dos personagens está inescapavelmente dentro da profecia, sem tolher ninguém da liberdade e da agência dentro do jogo. Outra maneira de lidar com isso é oferecer algum recurso que permita que os personagens driblem a profe- cia. Uma espada mágica que corta o fio do destino, um despertar mágico que concede o verdadeiro livre-arbítrio aos heróis… Seus jogadores se sentirão muito poderosos, mesmo que efetivamente só estejam jogando e agindo com seus personagens normalmente. Aviso: a matéria pode conter spoilers tanto do jogo atual quanto da versão de 2018! Estejam todos cientes! A opção menos popular é a de “voltar aos trilhos”, mencionada anteriormente. Muitas aventuras já seguem essa regra, mas colocar isso como parte da trama (em vez de ser apenas um acordo implícito da mesa) pode ser frus- trante para os jogadores. No entanto, talvez eles gostem dessa premissa, aceitando o desafio de tentar interpretar seus personagens dentro dessas limitações, abraçando seus destinos trágicos ou até, quem sabe, encontrando os meios para superá-los com as próprias mãos. Escatologia e sadismo Nem todas as profecias falam do fim do mundo, mas as mais famosas, sim. Mitos escatológicos (que têm a ver com o fim dos tempos, e não com as nojeiras que você está pensando!) existem em várias culturas da humanidade e são um prato cheio para uma semente de campanha na sua mesa. Uma coisa a se ter em mente é: a partir do momento em que uma profecia sobre o fim do mundo surgir na trama da sua campanha, tudo terá que girar em torno disso. Tramas importantes envolvendo NPCs ou até o passado dos personagens inevi- tavelmente cairão para um segundo plano, a não ser que sejam conectadas ao fim de tudo. Essa conexão pode ser direta, como algum NPC importante e querido envolvido na profecia, ou de forma indireta — afinal, sem um mundo para viver, do que adianta buscar vingança contra aquele vilão cruel? Histórias envolvendo o fim do mundo são mais reco- mendadas para campanhas em altíssimo nível. Isso se dá por duas razões principais: poder e apego ao mundo. Obviamente, é pouco pro- vável que personagens de nível 1 tenham condições de impedir uma profecia dessas, a não ser que a campanha os leve até o nível 20 para alcançar esse objetivo. Por outro lado, o fim do mundo só costuma ter peso para os jogadores se eles se importarem com o mundo em primeiro lugar, e isso só vem com o tempo. Por isso, o mais indicado é viver muitas aventuras com os heróis. Deixe que se envolvam com os NPCs, amem e odeiem outros personagens, encontrem um reino ou dois para chamar de lar, e aí sim, revele a terrível profecia que destruirá tudo isso. Agora, eles não só têm poder para evitar a tragédia, mas se importam de verdade com ela. Uma campanha desse tipo também dá maior liberdade criativa para a mesa. Está liberado chutar o balde! Itens mágicos capazes de matar deuses? Combates épicos que inundam continentes e destroem a lua? Não há limite! Seu grupo sempre quis confrontar Mestre Arsenal para uma guerra sem fim? Dois amantes do grupo querem duelar com Valkaria para ter o direito de casar? Nesse tipo de história, os personagens têm todas as condições para desafiar não só o destino como também os próprios deuses! Olha os deuses, mano! Outro ponto muito popular do Ragnarök é o confronto intenso e até as últimas con- sequências entre deuses, os seres mais poderosos do mundo. Em outras mitologias (e até cenários de RPG), deuses não costumam se enfrentar de forma di- reta, já que têm muito a perder — recorrem a esquemas, intrigas e mortais poderosos: os heróis! Arton é um bom exemplo disso. Das tramoias de Sszzaas à punição de Kallyadranoch, das profecias de Thyatis ao desaparecimento de Oceano… são muitos os Thor, o melhor Thor, o melhor guerreiro de Asgard guerreiro de Asgard
  17. 17. 30 31 A D A P T A Ç Ã O A D A P T A Ç Ã O casos em que deuses ganham ou perdem poder por razões misteriosas, indiretas ou distantes dos mortais. Entretanto, Arton também tem situações em que os deuses partem para um confronto aberto e direto, como a ascensão de Aharadak e a morte de Tauron e as derrotas de Glórienn e Ragnar pelas mãos de Thwor. Se você já está criando uma profecia sobre o fim do mundo na sua campanha e seus jogadores são poderosos o suficiente para impedi-la, considere envolver os deuses de forma direta, como convocar os personagens para lutar ao lado dos heróis contra deuses inimigos, e quem sabe algum personagem jogador não se torne um deus? Os Nove Reinos God of War: Ragnarök faz questão de nos apresentar o mundo que Kratos e Atreus vivem, bem como as pessoas que o habitam. Os dois jogos envolvem jorna- das por vários dos reinos que compõem o mundo nórdico do jogo. Cada Reino possui características bem particulares e podem ser grande fonte de inspiração para sua mesa. Todos os Reinos existem interconecta- dos pela Yggdrasil, a Árvore do Mundo. A árvore existe desde sempre, fora do espaço e do tempo, representando o caminho a ser cruzado para viajar de um Reino a outro. Alfheim, o Reino dos Elfos Não fosse palco de uma longa guerra entre elfos luminosos e elfos negros, este Reino possuiria ares tranquilos com suas florestas densas e volumosas. O motivo para o conflito é a Luz de Alfheim, dis- Svartalfheim, tudo que Svartalfheim, tudo que a luz toca é bonito a luz toca é bonito putada pelos dois grupos de maneira ferrenha. Os céus do Reino sempre estão azuis quando os luminosos estão sob controle da Luz, mas logo o firmamento é tingido de vermelho quando os elfos negros tomam controle. Apesar de elfos negros serem vistos como cruéis e malignos por natureza quando comparados aos elfos luminosos, as coisas não são assim tão simples. Há mais tons de cinza nesse conflito do que qualquer analogia fácil entre luz e trevas. Nova Raça: Elfo de Alfheim Duas raças ancestrais que dividem uma mesma origem, os elfos luminosos (Ljósálfar) são seres pálidos de pele quase translúcida e olhos brilhantes, enquanto e os elfos negros (Dökkalfar) têm a pele variando em tons de grafite e características insetóides Habilidades de Raça Destreza +2, Inteligência +1 (Ljósálfar); Força +2, Carisma +1 (Dökkalfar). Armamento das Sombras (Dökkalfar) Você pode gastar 1 PM para cobrir sua arma com energia das trevas. Sua pró- xima rolagem de dano com a arma nesta cena causa +1d6 pontos de dano de trevas. Armas Luminosas (Ljósálfar) Você pode gastar uma ação de movimento e 1 PM para criar uma arma que saiba usar feita de luz sólida. A arma dura até o fim da cena ou até você soltá-la, é considerada mágica e fornece +1 em testes de ataque. Filho da Luz (Ljósálfar) Você recebe +2 em Percepção, visão no escuro e imunidade às condições cego e ofuscado. Ser das Sombras (Dökkalfar) Você recebe visão no escuro, deslocamento de escalada 9m e redução de trevas 10. Voo Enquanto a maioria dos elfos escuros têm asas inse- tóides, os elfos luminosos conseguem voar usando a bênção da Luz. Você pode gastar 1 PM por rodada para voar com deslocamento de 12m. Asgard, o Reino dos Aesir Asgard é mais que um reino — é uma verdadeira fortaleza onde habitam os deuses Aesir, seus súditos e os mais valorosos guerreiros de todos os tempos. Forasteiros não sabem exatamente como é o lugar, já que Odin não permite o acesso a Asgard vindo de outros Reinos. Os sortudos que conseguiram pisar neste Reino sem alertar Odin conhecem a paisagem paradisíaca e idílica, com planícies praticamente inabitadas do lado de fora das grandes Muralhas de Asgard. Dos muros para dentro, o acesso é ainda mais restrito e vigiado por Heimdall, o Vigilante dos Aesir. Nova Origem: Súdito dos Aesir Você vive nos domínios dos Aesir, os grandes deuses, sempre dispo- nível para cumprir suas ordens e caprichos sem hesitar. Essa pro- ximidade com o divino faz com que sua saúde e boa sorte sejam quase inabaláveis, assim como sua fé. Brok e Sindri, mais Brok e Sindri, mais que amigos, irmãos que amigos, irmãos
  18. 18. 32 33 A D A P T A Ç Ã O A D A P T A Ç Ã O Itens Um acessório com a runa de um dos Aesir, que concede +1 em Fortitude, Reflexos ou Vontade (escolhido na criação de personagem). Benefícios Conhecimento, Diplomacia, Religião (perí- cias); Sortudo, Súplica aos Aesir (poderes). SÚPLICA AOS AESIR Quando faz um teste de perícia (exceto testes de ataque ou resistência), você pode gastar 1 PM para fazer uma rápida oração aos deuses e receber um bônus de +2 nesse teste. A cada quatro níveis, você pode gastar +1 PM para aumentar esse bônus em +1. Helheim, o Reino dos Mortos Este Reino congelante é a pós-vida para a maioria das pessoas — aquelas que tiveram uma morte honrada em cam- po de batalha. Vítimas de assassinato, doença ou velhice vêm parar aqui. É dito que o frio é tão castigador que é capaz de congelar almas. Criaturas cruéis torturam os mortos, que são obrigados a reviverem seus maiores arrependimentos em vida. Nova Origem: Retornado de Helheim De alguma forma você retornou do reino dos mortos, seja por conta de uma encantamento poderoso ou mero capricho dos Aesir. Seu corpo retornou de forma saudá- vel, mas sua mente retém as memórias do inferno gelado. Itens Um acessório ou arma simples ligada ao motivo de sua primeira morte. Enquanto você estiver empunhan- do ou vestindo o item, seus pontos de mana máximos aumentam em +1. Benefícios Intimidação, Sobrevivência, Vontade (pe- rícias); Mente Calejada, Presença Aterradora (poderes). MENTE CALEJADA Acostumado aos horrores que presenciou em He- lheim, você recebe +5 em testes de resistência contra efeitos de medo e é imune à condição apavorado. Efeitos que o deixariam apavorado, deixam abalado ao invés disso. Týr, o deus da guerra Týr, o deus da guerra que faz Kratos parecer que faz Kratos parecer um garoto um garoto Midgard, o Reino dos Humanos O nome deste Reino significa, literalmente, “terra do meio” e não poderia ser mais certeiro. Considerado um lugar no meio do caminho entre todos os outros reinos, Midgard é a terra dos humanos e dos animais. Apesar da baixa temperatura, possui terras cultiváveis, rios e mares fecundos. Os habitantes não têm contato direto com os deuses, oferecendo apenas sua devoção e fidelidade. Apesar disso, ao longo dos acontecimentos de God of War é possível ver que os deuses estão mais presentes em Midgard do que se esperaria. Nova Origem: Nativo de Midgard Você cresceu ao lado de grandes heróis e guerreiros, sendo preparado para o Ragnarok desde sua infância. Itens Uma arma simples ou marcial que saiba usar, um escudo leve (se souber usar escudos). Benefícios Atletismo, Luta, Pontaria, Sobrevivência (perícias); Em busca do Valhalla, Proficiência, um poder de combate a sua escolha (poderes). EM BUSCA DO VALHALLA Você vive apenas por uma morte gloriosa em combate, para que as valkírias reconheçam seu valor e carreguem sua alma imortal até os salões dos grandes guerreiros. Sempre que estiver lutando contra ameaças de ND maior que o seu nível, você recebe +2 em testes de ataque e rolagens de dano, mas sofre uma penalidade de –2 na Defesa e em testes de resistência. Jötunheim, o Reino dos Gigantes de Gelo Lar das montanhas mais altas de todos os Nove Reinos, este Reino não possui mais nativos, todos mortos em uma campanha genocida feita por Thor e seu Mjölnir. Nem todos os Jötnar (Jötunn no singular, outro nome para os gigantes de gelo) eram realmente grandes em tamanho. Muitos tinham o tamanho de um humano comum, outros possuíam cabeças de animais ou até eram animais por completo, como a própria Serpente do Mundo, Jörmungandr. Muspelheim, o Reino dos Gigantes de Fogo Um dos Reinos mais primordiais da mitologia nórdica, este lugar é tomado de lava e fumaça vulcânica, comple- tamente inabitável. Já foi habitada por gigantes, mas isso foi há muito tempo. Não se sabe o paradeiro de seu rei, Sutr — alguns su- põem que esteja dormindo apenas esperando o Ragnarök. É um dos reinos mais avessos à vida humana, então aventu- reiros devem estar bem preparados se quiserem desbravá-lo. Nova Raça: Jotunn As poderosas e ancestrais raças de gigantes nativas de Jötunheim e Muspelheim, antigamente abundante em Midgard, mas praticamente dizimada pelos Aesir por conta de seu medo e inveja. Apesar de sua alcunha, os jotnar variam muito e estatura, apresentando desde corpos enormes como montanhas até o tamanho de humanos comuns. Habilidades de Raça JOTUNN DE FOGO Força +2, Destreza +1, Sabedoria -1 JOTUNN DE GELO Força +2, Inteligência +1, Carisma -1 JOTUNN DE ROCHA Constituição +2, Força +1, Inteligência -1 Angrboda, uma das Angrboda, uma das últimas dos Gigantes últimas dos Gigantes
  19. 19. 34 35 A D A P T A Ç Ã O A D A P T A Ç Ã O Svartalfheim, o Reino dos Anões Um Reino próspero, tranquilo, mas ao mesmo tempo apreensivo e temeroso da benevolência de seu patrono, Odin. Os anões são gênios da manufatura e da arquitetu- ra, e trabalham para o Pai-de-Todos em troca de proteção. Não possuem permissão para falar com ninguém que não seja Aesir ou de Asgard. As terras de Svartalfheim são mais férteis, o clima também é mais ameno e agradável. A genialidade anã também oferece mais comodidades, como maquinário e sistemas de fornecimento de água. As riquezas naturais são exploradas pelos artesãos anões e por Asgard — seu aço é tão superior que é conhecido como “aço de Svartalfheim” em outros Reinos. Nova Raça: Anão de Svartalfheim Os mais astutos e talentosos artesãos, alquimistas e cientis- tas dos Nove Reinos, responsá- veis por construir e aperfeiçoar as armas que os deuses irão brandir no dia do Ragnarok. Habilidades de Raça Inteligência +2, Constituição +1, Carisma -1 Caminhar entre os Reinos Você usa as fendas entre os reinos para se mover sem ser detectado. Você aprende e pode lançar a magia Salto Dimensional (atributo- -chave Inteligência), mas só pode lançá-la sobre si mesmo. Caso aprenda novamente essa magia, seu custo diminui em –1 PM. Pacifista Violência é sempre o último recurso para um anão. Você recebe +5 em Diplomacia e Furtividade e sempre fica abalado durante o primeiro turno de um combate. Tecelão do Improvável Você é capaz de usar materiais “impossíveis” como o canto dos pássaros, o aroma do orvalho ou o choro de uma criança , como maté- ria-prima para fabricar itens. Para você, o custo de fabricação de qualquer item mundano é um quinto do preço, ao invés de um terço. Vanaheim, o Reino dos Vanir Este reino tomado de selvas, criaturas perigosas e umidade já foi o lar dos deuses Vanir, inimi- gos derrotados dos Aesir. Poucas pessoas, além dos próprios Vanir, puderam pisar em Vanaheim nos últimos tempos, já que Odin também bloqueou a pas- sagem para o Reino. Em meio às ruínas erguidas aos deuses Vanir, os últi- mos poucos membros de uma resistência tramam planos para enfrentar os Aesir novamente, enquanto impedem que os deuses asgardianos invadam e tomem Vanaheim de forma definitiva. Nova Raça: Vanir Considerados divinos como os Aesir, os Vanir são uma raça escassa e desconfiada desde sua quase aniquilação e vivem escondidos dos Aesir, tramando sua vingança. Sua afinidade com as energias mágicas e com a magia antiga é um grande poder e uma grande maldição. Habilidades de Raça Sabedoria +2, Carisma +1, Constituição -1 Afinidade Mágica Você aprende e pode lançar três magias de 1º círculo, arcanas ou divinas, a sua escolha (atribu- to-chave Carisma). As magias são consideradas divinas para todos os efeitos e você pode aplicar aprimoramen- tos nessas magias como se fosse um Druida de mesmo nível que seu nível de personagem. Caso aprenda novamente essas magias, seu custo diminui em –1 PM. Bênção da Magia Ancestral Você pode lançar qualquer magia que conheça sobre outra criatura inteligente com que possa se comunicar. Ao invés de ser alvo dos efeitos normais da magia, essa criatura recebe a capacidade de lançar esta magia uma única vez até o fim da cena, com os mesmos efeitos mas sem custo em PM. Elusivo Você passou a vida escondendo sua origem e poderes para evadir seus perseguidores. Você recebe +2 em Enganação e Intuição. E vem mais! Acompanhe na Dicas de Mestre do mês que vem (DB 187) regras completas para uso de runas em Tormenta20, A Lenda de Ruff Ghanor e Ordem Paranormal. GLAUCO LESSA FELIPE DELLA CORTE Escolha três poderes da lista a seguir. Gigante Seu tamanho é Grande e você recebe 3 espaços de inventário por ponto de Força, ao invés de 2. Manipulação Elemental Você aprende e pode lançar Ex- plosão de chamas (fogo), Névoa (gelo) ou Transmutar objetos (rocha) (atributo-chave Força). Caso aprenda novamente essa magia, seu custo diminui em –1 PM. Percepção Paracronal Você tem visões sobre o futuro, vislumbrando eventos que não aconteceram ainda. Você aprende e pode lançar Augúrio, mas o tempo de execução da magia aumenta para 1 minuto. Resistência Superior Sua pele é um couro grosso feito de matéria elemental. Você recebe +2 na Defesa e redução 10 contra fogo (fogo), frio (gelo) ou ácido (rocha) Niflheim, o Reino da Névoa Provavelmente o menor dos Reinos, e ainda assim, um lugar traiçoeiro e perigoso. Uma vez lar de anões, agora este é um verdadeiro labirinto tomado por uma névoa espessa — a arquitetura anã é apenas um rastro do que já existiu antes. A névoa foi uma maldição lançada por Odin e drena lentamente a energia vital de qualquer um que ouse explorar o Reino. Não bastasse isso, Nilfheim está cheio de monstros. Nova Origem: Sobrevivente da Névoa. De alguma maneira você sobreviveu à maldição que destruiu seu reino e conseguiu sair do labirinto de monstros, mas essa experiência o marcou para sempre. Itens Lampião, mochila de aventureiro e capa pesada. Benefícios Atletismo, Furtividade e Sobrevivência (perí- cias); Atlético, Rastejador de Masmorras (poderes). RASTEJADOR DE MASMORRAS Você sabe se esgueirar em silêncio através dos am- bientes mais hostis para não atrair atenção indesejada. Você não sofre penalidade de -5 em Furtividade para para se esconder depois de se mover e sua penalidade de armadura não se aplica em testes de Furtividade. Kratos, em busca Kratos, em busca da aposentadoria da aposentadoria Atreus, em busca da Atreus, em busca da experiência completa experiência completa
  20. 20. Imagine a cena: os personagens estão reunidos na taverna — bebendo cerveja, contando suas moedas, fazendo essas coisas que personagens jogadores fazem em tavernas. Subitamente um velhinho entra esbaforido pela porta e exclama: “Aventureiros! Eu preciso de aventureiros!”. Os personagens fazem algumas perguntas e descobrem que o ancião está mesmo com problemas. Parece perigoso demais, melhor não se envolver. O velhinho então diz que pode pagar! Mas o grupo já tem bastante dinheiro. O velhinho revela que o vilão por trás de tudo é um arqui-inimigo dos personagens! Eles concluem: “Esse cara está por aqui? Melhor fugir agora mesmo!”. Ou então: um jardineiro vê seu patrão, um hobbit com quem conviveu a vida toda, se preparando para uma jornada. Ele pergunta ao amigo onde pretende ir e o patrão responde: vai levar um anel amaldiçoado até um conselho de nobres, magos e guerreiros poderosos de todas as raças. O jardineiro dá um sorriso amarelo e se afasta lentamente. À noite, durante o jantar, ele comenta com os amigos como seu patrão endoidou de vez e que espera ter uma boa relação com os novos moradores da casa, que vão herdá-la depois de sua morte... Muitas vezes, a parte mais difícil de contar uma história não é desenvolvê-la, nem mesmo terminá-la. Muitas vezes, nem mesmo começá-la! Muitos mestres e autores iniciantes têm problemas com algo que acontece antes do início da história. Antes do primeiro diálogo ou do primeiro combate — sem isso, não haveria razão para diálogos, combates ou para a história em si. Estamos falando, é claro, de motivação. Rebelde sem causa Já tocamos neste assunto em outras Toolbox ao longo dos anos. Especialmente as colunas Fugindo do Épico (Dragão Brasil 126), Entendendo os Heróis (DB 140), Alerta Ver- melho (DB 157), Agora É Pessoal (DB 173) e Liberdade & Improviso (DB 177) abordam o tema. Contudo, acho que vale a pena focar na motivação dos protagonistas como um elemento separado, já que causa dor de cabeça a muita gente. E, sem essa motivação, quase nenhum dos outros truques que discutimos aqui serve para muita coisa... Caso ainda não tenha ficado claro, motivação é a razão pela qual os protagonistas se envolvem na trama. Partindo do modelo mais clássico de narrativas de aventura, nossa história começa no mundo normal (ou seja, na vida cotidiana), então ocorre um incidente que chama o protagonista à aventura. Motivação essencialmente é a ligação do protagonista com esse chamado, uma “desculpa” para que ele o atenda. De cara, já podemos fazer uma separação/classificação: a motivação pode ser interna (um desejo ou ambição do personagem) ou externa (algo que acontece com o perso- nagem). Existem histórias em que a motivação é puramente interna ou externa, e mais tarde vamos falar sobre elas. Mas é mais comum que seja um misto de ambas. Muitas vezes, o problema de motivação surge quando o autor (escritor/ mestre) apresenta uma motivação externa, presumindo que ela será também uma motivação interna, ou que pelo menos as duas vão convergir. Mas os jogadores não são motivados pelo fator externo, ou o público não se convence de que um protagonista seria motivado por ele. Vamos começar então pela “motivação mista”. Em RPG, não precisamos ir mais longe que a situação arquetípica do velhinho da taverna. O mestre apresenta uma motiva- ção externa: um NPC indefeso com problemas e a chance de ganhar algum ouro. Ele espera que as motivações internas dos personagens jogadores tenham algo a ver com altruísmo e ganância. Mas, sem perguntar aos pró- prios jogadores, não há como ter certeza. Na verdade, o mestre não está errado — a maior parte dos personagens de RPG são mesmo motivados por esses dois fatores. E, a menos que algo tenha sido dito especificamente em contrário na sessão zero ou antes do início da campanha, não há razão para pensar que esses personagens seriam tão diferentes da média. O pulo do gato está em avaliar e regular o quanto es- ses dois fatores estão sendo envolvidos. Se o velhinho está simplesmente preocupado com kobolds que existem numa caverna próxima, isso pode não ser suficiente para despertar o sentido de altruísmo dos aventureiros. Mas uma criança sequestrada, uma ameaça de morte ou mesmo um sacrifício para um deus profano podem fazer esse altruísmo aflorar. Da mesma forma, o pagamento deve justificar os riscos que os personagens vão correr. Em outras palavras, nenhuma motivação externa será universal e aplicável a todos os grupos sem adaptações. Conhecendo os personagens, você pode aumentar o heroísmo e o lucro envolvidos na missão. Isso tudo é bastante óbvio, mas já vamos falar mais sobre o que está por trás desses fatores. 38 39 T O O L B O X T O O L B O X MOTIVAÇÃO Afinal, Afinal, por que seus por que seus heróis fazem heróis fazem tudo isso? tudo isso?
  21. 21. Em ficção (literatura, HQ ou qualquer outra mídia), po- demos simplesmente “obrigar” os personagens a aceitar a motivação externa. Mas então nos arriscamos a cair numa armadilha ainda pior: o público (que em geral não tem uma ligação tão forte com a história, principalmente no início) pode não “comprar” essa motivação. Pode questio- nar a decisão do protagonista. Em outras palavras, pode passar a história inteira perguntando por que Sam decidiu acompanhar Frodo — o que vai gerar uma camada extra de afastamento da obra. Os pontos de convergência de motivações externas e inter- nas para personagens de ficção são infinitos. Contudo, voltando a nossas generalizações, podemos dizer que personagens de ficção são motivados principalmente por relações pessoais (amigos, família, parceiros românticos) e por ambição. Ou seja, quando o fator externo toca em alguém querido ou proporciona a possibilidade de conquistar um sonho, a motivação é boa o bastante para convencer o público. Motivar CD 25 Mas podemos ir mais fundo. Afinal, se o truque fosse simplesmente “deixe o vilão mais malvado e aumente a re- compensa” ou “faça o vilão raptar o namorado da heroína e dê a ela um grande sonho”, esta seria uma coluna bem curta! Precisamos examinar o que é um personagem de RPG e de ficção. Personagens de RPG são essencialmente ferramentas com as quais os jogadores interagem com o cenário de jogo. Mais do que isso: são ferramentas que, salvo raras exceções, devem progredir. Mesmo que o sistema ou os jogadores não se importem com aumento de poder, os personagens adquirem maior capacidade de afetar o mundo ou aprender sobre ele à medida que o tempo de jogo passa. Isso, mais do que qualquer tabela de XP, ato vilanesco ou tesouro, vai nos dar a verdadeira motivação para o grupo embarcar na campanha. A verdadeira motivação para um personagem jogador em uma campanha de RPG é só uma: avanço. Pode ser XP, pode ser ouro, pode ser descoberta de mistérios. Quando concorda em jogar RPG, o jogador (a pessoa real) está implicitamente dizendo que quer avançar no jogo. Assim, sua motivação sempre será algo que faça esse avanço acontecer, mesmo que o jogador não saiba. Por isso o clichê do velhinho da taverna dá tão certo; ele toca em três formas básicas de avanço. Os personagens interagem com um NPC (história/ mistérios/interpretação), são pagos (equipamentos) e vão receber XP (níveis). Quando, durante a sessão zero ou a preparação da campanha, você pergunta aos jogadores o que motiva seus personagens, você está perguntando quais tipos de avanço interessam mais para eles. Sempre que desejar empurrá-los numa certa direção (digamos, para que aceitem uma missão), você deve oferecer uma chance de avançar nisso. Jogadores mais interpretativos em geral querem avançar no sentido de entender mais o mundo e ter mais ligações com NPCs. Jogadores mais combeiros muitas vezes querem chances de melhorar seus personagens. Por isso podemos generalizar tanto e dizer que todos os personagens de RPG têm como objetivo avançar. Mesmo jogos pouco focados em progressão de poder (digamos, o famoso Call of Cthulhu) têm alguma progressão. Em CoC, os personagens perdem Sanidade à medida que encontram criaturas profanas. Ou seja, existe uma progressão, ela ape- nas não diz respeito a poder, mas a degradação e loucura. Os jogadores de CoC também estão atrás de avanço — o avanço de seus personagens rumo ao inevitável. RPG, em termos gerais, presume um “endgame”, seja o 20° nível, seja Sanidade 0. Palestra motivacional E o que são protagonistas de ficção? Bem, essa é uma pergunta com infinitas respostas, mas para nossos propósitos, esses personagens são essencialmente ferramentas para o leitor fazer uma conexão emocional com a obra. Não importa se essa conexão emocional vai existir a partir dos sentimentos profundos do personagem, de seu visual, de seus diálogos engraçados ou de qualquer outra coisa. Como autores, o que queremos é envolver o público com a obra e para isso usamos os protagonistas. Quando dizemos que o público deve entender as mo- tivações dos protagonistas, o que estamos falando é que o autor deve estabelecer pontos de conexão emocional do personagem com o público, para que suas decisões façam sentido. Note que essas decisões não precisam fazer “sentido material”. Não importa que Sam fosse obviamente desprepara- do para uma jornada ao lado de Frodo e que, realisticamente, ele talvez só atrapalhasse. As decisões precisam fazer “sentido emocional”. O público precisa ver a relação de Sam e Frodo para que o jardineiro possa acompanhar seu patrão sem ser questionado. Se nós primeiro conhecemos a lealdade entre os dois e logo em seguida formos apresentados à primeira grande decisão de Frodo, a conclusão lógica do público é que Sam precisa ir junto. Cria-se uma relação emocional de causa e efeito. Qualquer outra coisa pareceria inverossímil. Mais uma vez, pode parecer que estamos discutindo algo óbvio: “faça seu protagonista ter ligação emocional com seu objetivo”. Contudo, assim como em RPG, podemos ir mais fundo. Para que essa ligação emocional exista (isto é, para que seu protagonista tenha uma motivação), você precisa abrir mão da maior parte do cinismo da história. Precisa fazer com que seus protagonistas sejam vulneráveis, frágeis. Precisa, acima de tudo, dar tempo para que eles mostrem ao público quem são — sem piadas, sem ação, sem ironia. Ao criar as condições para uma boa motivação, leve o personagem a sério. Mesmo que ele seja frio ou brincalhão, deixe claro para o público que existe algo por trás disso. Nosso maior aliado ao criar motivações para os protago- nistas é a estrutura linear de história. O personagem começa no mundo comum, sendo verdadeiro e tendo relações sinceras. Resista à tentação de tornar sua história excessivamente mo- vimentada ou surpreendente logo de início. A motivação só vai existir se o protagonista tiver tempo para respirar. Muitas franquias e obras famosas hoje em dia parecem ir pelo caminho oposto, mas na verdade estão fazendo exa- tamente isso. Filmes da Marvel (que eu adoro e não estou criticando) têm roteiros que são essencialmente metralhadoras de piadinhas e ação contínua. Todo esse papo de “deixe seu protagonista respirar” não parece se encaixar com essa estrutura. Contudo, como sempre as grandes franquias têm ferramentas de que a maior parte de nós não dispõe. Ao usar personagens conhecidos, o MCU essencialmente usa toda uma ligação emocional que já foi criada ao longo de anos. Da mesma forma, trailers, teasers e até entrevistas com os atores servem para estabelecer uma conexão prévia. O público já chega preparado, já possui um entendimento dos protagonistas e uma relação emocional com eles. Ninguém está previamente no hype para ver o tio do Homem-Ácaro sendo morto... Mas todos esperamos uma cena emotiva quando o mesmo está para acontecer com o Homem-Aranha. Foco, força & fé Certo, falamos de motivação para um personagem en- trar na história, mas existe uma armadilha muito mais sutil e perigosa, tanto em RPG quanto em ficção: os personagens precisam de motivações para permanecer na história. Uma vez que o(s) protagonista(s) esteja(m) envolvido(s) na história e o público tenha aceitado que sua participação faz todo sentido, você logo entra num terreno arriscado. Os aventureiros cumpriram a missão do velhinho da taverna, ok. 40 41 T O O L B O X T O O L B O X Thor Love & Thunder: Thor Love & Thunder: Sem tempo para respirar quando Sem tempo para respirar quando o vilão pode matar deuses o vilão pode matar deuses
  22. 22. Mas eles descobriram que o problema, o que quer que seja, faz parte de uma situação muito mais grave, uma ameaça que pode destruir o mundo todo! Sam acompanhou Frodo até Valfenda, certo. Mas, no caminho, conhecemos vários perso- nagens interessantes, cujas relações podem ser mais atraentes do que a amizade de um jardineiro e seu patrão. Súbito, os aventureiros decidem que isso tudo está além de sua alçada. Ameaças globais dizem respeito a grandes heróis, então eles avisam um nobre, esperando que ele tome providências, e lavam as mãos. Ou o público de repente passa a questionar a intensidade da lealdade entre Frodo e Sam. O jardineiro já não tem mais nenhuma razão para ficar ao lado de seu patrão. Quase nenhuma história de aventura (ou de outros gêneros, como mistério e terror) resiste por muito tempo à exposição ao mundo mais amplo da história. No instante em que o público (jogadores ou leitores) começa a pensar nas outras opções que existem para lidar com o problema, a maior parte das motivações cai por terra. Nós estamos acostumados com um mundo em que existem instituições, autoridades e especialistas para nos ajudar em situações difíceis — ainda bem! Se somos assaltados, a reação saudável é fazer um BO, não investigar o caso sozinhos. Como autor ou mestre, parte de sua tarefa é limitar o acesso dos protagonistas ao mundo externo — ou, melhor ainda, distrair o público para que eles nem pensem no mundo externo como solução do problema. Tormenta20 apresenta, logo nas primeiras páginas do livro básico, uma opção para lidar com isso. O texto deixa claro que NPCs poderosos têm seus próprios problemas, ameaças tão ou mais graves acon- tecendo o tempo todo e, portanto, não podem resolver o que quer que os personagens jogadores estejam enfrentando. Mais do que isso, o texto informa que heróis (os típicos personagens de Tormenta20) por definição não procuram se esquivar de seus problemas nem lavar as mãos! Isso, se for levado a sério pelo grupo, coloca os jogadores na mentalidade certa: as ameaças estão contidas no microcosmo da campanha. As soluções estão presentes na jornada dos personagens. Resolver os problemas que o mestre coloca faz parte, de uma maneira ou de outra, do avanço dos personagens de RPG, como discutimos antes. Mas existem outras formas de fazer isso. Em Fim dos Tempos, optei por começar numa região isolada, com pro- blemas aparentemente isolados. Isso deixou claro ao grupo que não fazia sentido buscar soluções externas. Quando os Cães das Colinas foram a Valkaria no segundo arco, parte da primeira sessão envolveu a apresentação da capital do Reinado. Eles viram que, nessa cidade, várias ameaças estão acontecendo ao mesmo tempo. Mesmo que estejam lidando com vilões perigosos, eles souberam que precisam enfrentá-los sozinhos ou com a ajuda de seus próprios aliados, não delegar a situação a outros heróis. Em ficção isso é um pouco mais fácil. Você pode simplesmente omitir menções ao mundo exterior dos diálogos dos personagens e evitar mostrar o ambiente além do microcosmo dos protagonistas. Uma obra que faz isso com maestria é House. Se um paciente chega para ser diagnosticado pela equipe do Dr. House, ele será diagnosticado ali, ou vai morrer. Quase nunca há menção de outros médicos, muito menos de outros hospitais! Os diálogos rápidos e a sucessão de complicações logo nos fazem esquecer que isso é sequer uma possibilidade. No meio de um episódio, é raro que um espectador pense “Hmm, mas se eles não dispõem desse equipamento, por que não mandam o paciente para uma clínica especializada?”. Somos lembrados disso ocasionalmente por viradas de trama em que o estado do paciente se agrava ou ele tem pouco tempo de vida, mas em geral essas opções são simplesmente ignoradas. O caso de Frodo e Sam é ainda mais simples e elegante. O jardineiro se torna oficialmente parte da Sociedade do Anel, sem que ninguém sugira a sério que ele simplesmente volte para casa. No instante em que Sam é “marcado” como parte da Sociedade, o público deixa de questionar sua participação — se é que já questionou. Ou seja, os protagonistas são quase literalmente fechados num microcosmo. Se os personagens que se envolveram com o Um Anel em primeiro lugar fazem parte da “Sociedade do Anel”, só o espectador com mais má vontade do mundo vai esperar que o problema do Um Anel seja resolvido fora da Sociedade! Mas já vamos falar sobre má vontade. Antes pre- cisamos lidar com as motivações puramente externas ou internas. Fi-lo porque qui-lo A maneira mais fácil de manter a motivação para um protagonista estar na história é torná-la “pura”. Ou seja, só externa ou só interna. Dois filmes dos anos 80 vão servir para ilustrar isso. Duro de Matar é um ótimo exemplo de motivação 100% externa. John McClane quer se reencontrar com sua ex-esposa. Ele não quer combater uma quadrilha de assal- tantes internacionais, só se envolve com a trama porque está literalmente trancado no prédio em que ela ocorre. Uma vez que Holly esteja em risco, ok, ele tem também uma motivação interna para continuar, mas ainda assim demonstra de novo e de novo que gostaria de sair dessa situação. Ele pede ajuda da polícia, tenta fazer com que a lei interfira e só objeta quando fica claro que os policiais vão criar uma tragédia. Uma das razões pelas quais o filme é tão cativante é que John McClane se torna a voz do público. Ele ativamente traz à tona o absurdo que é resolver sozinho uma situação como essa e nos lembra de novo e de novo do mundo exterior. Numa coluna passada eu já fui contra o senso comum ao dizer que os ferimentos de McClane não importam narrati- vamente — são brutais em termos estéticos, mas não fazem parte da história além disso. O personagem nunca foi um “cara comum” em termos físicos. O que nos aproxima dele é o quanto ele é comum em termos emocionais! Diferente de Sam, McClane não demonstra lealdade ou moralidade extremamente elevadas. Por isso a identificação com ele é tão forte. Karate Kid, em contrapartida, é uma história de motivações 100% internas. A primeira cena do filme mostra Daniel Larusso “brincando de karatê”, chutando a porta do condomínio para onde está se mudando. Ao longo de todo o filme, ele tem a opção de sair da situação — desistir da garota, arranjar outro hobby, não participar do campeonato... Mesmo quando é perseguido pelos bullies, Daniel tem agência. Ele escolheu estar naquela situação e mais tarde escolhe não sair. Enquanto nos identificamos com John McClane porque ele é “um cara comum”, a identificação com Daniel vem do lado oposto: ele continua com seu objetivo/obsessão apesar do mundo externo tentando constantemente demovê-lo. É fácil ver como isso se conecta com o assunto anterior, não? No primeiro caso, a opção de sair da história por causa do mundo exterior é retirada pelo próprio mundo exterior, por mais que o protagonista tente. No segundo, é retirada pelo protagonista, por mais que o mundo exterior tente. Nos anos 90, era comum que mestres de RPG começassem sua preparação perguntando “o que os personagens querem”. Isso era uma tentativa de trazer à tona motivações 100% internas. Um personagem que desejasse ser campeão da arena receberia a opção de lutar na arena e caberia ao jogador tomar a iniciativa. O mundo exterior (o mestre) não fazia questão de empurrá-lo para isso. Mas muitas vezes acontecia o oposto: o jogador dizia que o personagem não 42 43 T O O L B O X T O O L B O X House: House: Dr. House dá conta Dr. House dá conta de tudo sozinho de tudo sozinho Brooklin 99: Brooklin 99: Sempre há uma boa desculpa Sempre há uma boa desculpa para citar Duro de Matar para citar Duro de Matar
  23. 23. queria nada, ou queria apenas sobreviver. Isso sinalizava um jogador que esperava uma motivação 100% externa, dada pelo mestre. Tendo a opção, seu personagem não iria participar da campanha! Hoje em dia, na maior parte dos casos o padrão parece ser personagens com um misto de motivações. Isso não coloca o peso em apenas uma das partes... o que vai nos levar ao próximo tópico. Desmotivado Nem mesmo o mestre mais experiente, nem mesmo o autor mais habilidoso são capazes de vencer um desafio específico: a má vontade do público. Nenhuma história resiste a um escrutínio impiedoso questionando todas as motivações dos personagens. Sam é leal a Frodo e entendemos essa lealdade, ok. Ele é considerado parte da Sociedade do Anel, ok. Mas se um leitor/espectador simplesmente resolver passar o tempo inteiro questionando por que Sam não aproveita a situação para pedir um aumento, ou tentar se tornar jardineiro de Galladriel, ou roubar itens élficos de Elrond, ou fizer qualquer uma de uma lista infinita de ações “práticas”/cínicas, vai conseguir destruir a história... para si mesmo. Da mesma forma, um jogador que passar a campanha inteira questionando como aventureiros independentes podem lidar com grandes questões globais vai conseguir estragar a própria diversão. Mas então fica o questionamento: por que esse pessoal consome essas obras? Por que entra nessas campanhas? Toda história depende de uma mínima boa vontade do público em ao menos tentar aceitar suas “verdades”. Esta coluna falou quase só do trabalho e da responsabilidade de escritores e mestres, mas vamos tirar um tempo para falar de nossa responsabilidade como leitores e jogadores. Em RPG é fácil definir esses parâmetros, ainda que seja também fácil achar pessoas que estejam dispostas a quebrá-los. Na minha opinião, o primeiro passo para ser um bom colega de jogo é justamente “jogar o jogo”. Ou seja, aceitar missões razoáveis, interessar-se pela trama, não interagir de forma hostil com todos os NPCs, participar do grupo... Isso não significa ler a mente do mestre ou apenas concordar com tudo. Mas o pedido do velhinho da taverna claramente é um chamado à aventura. Se você fizer questão de interpretar um personagem ranzinza nessa hora, pode reclamar, mas simplesmente ignorar o pedido é má vontade pura. Da mesma forma, você pode fazer com que seu personagem fique o tempo todo implicando com outro personagem por ser um mago (com o aval do outro jogador, claro). Mas se recusar a participar do grupo porque há um mago entre os colegas não faz sentido. Em outras palavras, você deve ter motivação para jogar RPG. E essa motivação deve informar a motivação de seu personagem. Não está motivado para isso? Sem problemas, você é livre para não participar dessa campanha e fazer qualquer outra coisa. Mas apontar pretensos “furos” e minar a motivação dos outros é algo puramente destrutivo. Como leitores, nossa tarefa é um pouco mais sutil. Na minha opinião, devemos estar cientes de onde estamos entrando e escolher se queremos ou não consumir essa história. Numa história clássica de aventura, precisamos aceitar vínculos idealizados de lealdade, mesmo que isso não faça sentido objetivo. Uma história desse tipo nunca vai resistir a um exame puramente cínico. O mesmo vale com sitcoms nas quais os personagens são motivados por mal-entendidos ou problemas fúteis, obras de terror nas quais os personagens são motivados por medo ou obras românticas nas quais os personagens são motivados pela busca incansável do parceiro “perfeito”. Os personagens estão rejeitando o mundo externo. O autor também está. A obra como um todo está rejeitando o mundo externo e apresentando as motivações possíveis dentro de seu contexto. Apenas um leitor/espectador decidido a não gostar da obra fica constantemente trazendo o mundo externo para esse contexto. Isso não só é garantia de frustração como é absurdo. Não podemos impor motivações do mundo real ao mundo dessas obras... Porque, no universo dessas obras, essas motivações não existem. Seria como questionar por que Frodo não usa uma AK-47 para enfrentar os Espectros do Anel! Tmj Motivações dos protagonistas fazem parte de um acordo tácito entre autor e leitor — ou de um acordo explícito entre jo- gadores e mestre. Uma história na qual o protagonista se envolve sem motivação nenhuma se torna vazia, fraca, oca... Por mais interessante que seja superficialmente, sempre vai faltar algo. Por outro lado, nenhuma motivação será suficiente para responder a todas as perguntas que podem existir sobre o en- volvimento dos personagens. Para abordar todas as questões do mundo real, precisaríamos de um cenário tão complexo quanto o próprio mundo real! No fim das contas, motivar protagonistas é o mesmo que motivar o público: dar a eles a oportunidade de se ligar à história. Depois disso, a decisão de se motivar ou não é de cada um. LEONEL CALDELA 44 T O O L B O X

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