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Uma experiência de
              intervenção
Resultados    socioambiental no
científicos   Salgado Paraense
Realização
Instituto Peabiru e Museu Paraense Emílio Goeldi
Organização
João Meirelles Filho, Hermógenes Sá, Suelen Carvalho
Coordenação Científica
Samuel Almeida, M.Sc. Ecologia Vegetal




Pesquisadores Responsáveis e Colaboradores Temáticos

Caracterização da Vegetação
Antonio Sérgio Lima da Silva, M.Sc. Taxonomia Vegetal,
Aspectos Legais e Institucionais
Benedita da Silva Barros, M.Sc. Direito,
Ictiologia e recursos pesqueiros
Breno Eduardo da Silva Barros, M.Sc. Ecologia Marinha
Crustáceos
Cristiana Ramalho Maciel, Dra. em Aqüicultura,                    Bolsistas e Técnicos:
Florística e Fitossociologia                                      Alessandro dos Reis Oliveira,
Dário Dantas do Amaral, M.Sc. Biologia Vegetal,                   Bolsista Agente Ambiental;
Moluscos                                                          Breno Portilho de Sousa Maia,
Francisco Arimatéia dos Santos Alves, M.Sc. Biologia Ambiental,   Técnico em Pesca; Camila de
Manejo e exploração do caranguejo uçá                             Fátima Simão de Moura, Bolsista
Francisco Carlos Alberto Fonteles Holanda, M.Sc. Engenharia de    PIBIC Museu Goeldi;
Pesca,                                                            Carlos Alberto Santos da Silva,
Aspectos Histórico-Culturais                                      Técnico em Botânica;
Helena Monteiro Quadros, M.Sc. Educação,                          Jaciara Monteiro Cabral, Bolsista
Crustáceos                                                        Agente Ambiental;
Manoel Luciano Aviz de Quadros, M.Sc. Biologia Ambiental,         Jony Vazes Ataíde, Bolsista
Geoprocessamento e identificação de impactos em bacias            Agente Ambiental;
hidrográficas                                                     Nilzilene Cristo do Vale, Bolsista
Marcelo Cordeiro Thalês, M.Sc. Sensoriamento Remoto,              Sc. Licenciatura em Biologia;
Herpetologia                                                      Renata Jeane Lima Cabral,
Pablo Suarez, M.Sc. Genética e Biologia Molecular,                Bolsista Agente Ambiental.
Diagnóstico Arqueológico
 Paulo Roberto do Canto Lopes, M.Sc. Arqueologia,                 Fotos e ilustrações: Equipe da
Aspectos Sócio-Ambientais                                         Casa da Virada
Ruth Helena Cristo Almeida, M.Sc. Sociologia,                     Design: Forminform
Avifauna
Sidnei de Melo Dantas, M.Sc. Ecologia Animal.
                             2                                                          Casa da Virada
Esta publicação é um resumo dos resultados do Programa
                                            Casa da Virada, do Instituto Peabiru, realizado em Curuçá,
                                            Pará, entre 2007 e 2009. Este conjunto de atividades
                                            realizou-se graças ao patrocínio do Programa Petrobras
                                            Ambiental, da Petrobras e Governo Federal.
                                            Participaram destes trabalhos 54 técnicos, entre 15
                                            colaboradores do Peabiru, 21 instrutores, e 18
                                            pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi - MPEG,
                                            Universidade Federal do Pará - UFPA (campus Bragança) e
                                            Instituto Evandro Chagas, Seção de Meio Ambiente
                                            (IEC/SAMAM/SVS/MS), bom como centenas de
                                            representantes de comunidades, de organizações da
                                            sociedade civil de Curuçá e de órgãos públicos das diversas
                                            esferas.

                                            Entre os parceiros cabe destacar e agradecer as duas
                                            entidades que participam desde o início: o Museu Goeldi,
                                            especialmente nos projetos de biosocio-indicadores e do
                                            Ecomuseu do Mangue e a Associação dos Usuários da Resex
                                            Mãe Grande de Curuçá - AUREMAG, cedendo a Casa do
                                            Pescador.

                                            Importante mencionar a UFPA, Campus Bragança, a
                                            Secretaria Estadual de Educação, por meio da Escola
                                            Estadual de Ensino Médio Olinda Veras Alves, de Curuçá, e a
                                            Prefeitura Municipal de Curuçá e organizações da sociedade
                                            civil, especialmente a ONG Cabanos.
                                            A proposta é que este trabalho oriente as políticas públicas
                                            para a região do Salgado e na Zona Bragantina e, em
                                            especial para Curuçá.



Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 3
Entre as conclusões podem-se destacar as seguintes,     socioambiental, uma vez que estes não existem
 que merecem maior discussão e sua transformação        desde sua criação a partir de 2002.
 em projetos, portarias, decretos e leis e ações       2.4 Implementar ações de educação ambiental
 complementares, entre as quais há recomendações        para que as populações beneficiárias das unidades
 de âmbito regional (para o Salgado e Zona              de conservação efetivamente se assenhorem de seu
 Bragantina), para o município de Curuçá ou para        patrimônio e gestão, zelando por sua
 determinadas ilhas ou comunidades, a saber:            sustentabilidade. As pesquisas da Casa da Virada
2.1 Criação de Corredor Ecológico da Zona               indicam que a percepção das comunidades em
 Costeira do Pará - Considerando-se o conjunto de       relação à RESEX Mãe Grande de Curuçá é muito
 8 reservas extrativistas federais marinhas (RESEX)     superficial e tênue.
 no Nordeste Paraense, acrescido de áreas de           2.5 Garantir a continuidade da formação de
 proteção ambiental (APA) estaduais de Algodoal         agentes ambientais – como bem demonstraram
 (Marapanim) e Urumajó (Augusto Corrêa),                os resultados da formação de 60 agentes
 recomenda-se aos órgãos federais e estaduais a         ambientais pela Casa da Virada;
 criação do Corredor Ecológico da Zona Costeira        2.6 Ações propostas para a Mata Amazônica
 do Pará que promoveria a gestão integrada e            Atlântica:
 compartilhada destas unidades, garantindo os          2.6.1 Inclusão da nova classificação de Mata
 direitos de uso das populações tradicionais, como      Amazônica Atlântica pelos órgãos responsáveis
 a integridade de manguezais e ecossistemas             (Ministério do Meio Ambiente, ICMBIO, Secretaria
 marinhos e costeiros, incluindo-se a nova tipologia    de Meio Ambiente do Estado do Pará – SEMA e IBGE
 de vegetação, classificação proposta pela Casa da      (como classificação oficial da cartografia brasileira)
 Virada, da Mata Amazônica Atlântica. É preciso         como ambiente único e altamente vulnerável,
 considerar um Plano de Manejo Geral para o             remanescente nas ilhas flúvio-marinhas (Ipomonga
 Corredor Ecológico, seja a partir dos planos de        e outras) de Curuçá e região, como medida para a
 cada unidade (hoje inexistentes), seja das demais      conservação dos remanescentes florestais do
 informações técnico-científicas;                       ameaçado litoral do Pará.
2.2 Criação do Conselho Consultivo do Corredor         2.6.2 Delimitação da área de ocorrência da Mata
 Ecológico da Zona Costeira do Pará –                   Amazônica Atlântica, com a preparação de mapa
 antecipando-se à criação deste Corredor Ecológico,     técnico e documentos de apoio, para o que devem
 seu objetivo seria angariar o apoio, a                 ser realizadas expedições científicas urgentemente;
 fundamentação técnica e científica e discutir, de
                                                       2.6.3 Criação de unidade de conservação de
 maneira apropriada e no tempo pertinente às
                                                        proteção integral para proteger a Mata
 comunidades, para contribuir à sua formalização e
                                                        Amazônica Atlântica, especialmente em ilhas
 garantir sua gestão adequada; propiciando plena
                                                        flúvio-marinhas como Ipomonga, a nível estadual;
 representatividade das comunidades usuárias, de
                                                       2.6.4 Realização de campanha de educação
 organizações civis e públicas;
                                                        ambiental, acerca da importância da Mata
2.3 Realizar a demarcação e os planos de manejo
                                                        Amazônica Atlântica;
 das unidades de conservação existentes – para
                                                       2.6.5 A criação de uma Estação de Pesquisas,
 garantir que estas desempenhem sua função
                                                        como centro de referência sobre a Mata Amazônica
                             4                                                                   Casa da Virada
Atlântica, e que proporcione base de apoio física às             preciso estudar a possibilidade de buscar a
 pesquisas científicas;                                           denominação de sítio RAMSAR - Convenção sobre
2.7 Dinamizar as pesquisas cientificas sobre a                    Zonas Húmidas de Importância Internacional,
 Zona Costeira do Pará - o que se torna ainda mais                especialmente como Habitat de Aves Aquáticas;
 urgente diante das crescentes ameaças (uso                      2.9.4 Monitorar as ameaças de espécies exóticas
 inadequado dos solos no meio rural, expansão                     – a principal ameaça constatada é a de camarões.
 urbana etc.) e, da potencial instalação de portos                Merecem atenção: a) a presença da espécie exótica
 de grande escala em Curuçá;                                      Gigante-da-Malásia (Macrobrachium rosenbergii);
2.8 Implementar os biosocio-indicadores                           b) O cultivo de outra espécie exótica Litopennaeus
 desenvolvidos no presente programa,                              vannamei, original do Pacífico. O uso de espécies
 garantindo que organismos públicos locais e                      exóticas requer monitoramento redobrado, pois
 populações usuárias sejam capazes de acompanhar                  resultam em riscos de enfermidades e competição
 e analisar os impactos sobre os sistemas naturais,               por alimento e espaço com espécies nativas. A
 propondo medidas mitigadoras;                                    construção de portos representa ameaças de
2.9 Promover a Conservação da biodiversidade -                    organismos trazidos de outras regiões (as águas de
 Garantir proteção adequada às espécies de flora e                lastro e espécies encontradas em cascos de
 fauna vulneráveis e ameaçadas, a partir das                      embarcações - algas, fungos, mariscos etc.);
 pesquisas científicas, especialmente para:                      2.10 Incrementar a fiscalização ambiental: é
2.9.1 Ostras –atenção à diversidade de moluscos                   insuficiente a atenção à exploração do caranguejo.
 (Gastrópodes e Bivalves) de Nazaré do Mocajuba,                  Da mesma maneira, carece de maior atenção a ação
 Lauro Sodré e Arapiranga de Dentro, não observada                predatória de barcos pesqueiros industriais mais
 em outras localidades da RESEX;                                  afora dos estuários.
2.9.2 Quelônios - Pela primeira vez na microrregião              2.11 Aprofundar pesquisas de arqueologia – a
 foram encontradas 5 espécies de quelônios, 2 de                  identificação de materiais arqueológico e indícios
 hábitos terrestres e 3 de hábitos aquáticos. Há                  relevantes apontam o potencial arqueológico da
 pequena população isolada de tartarugas                          área, especialmente em zonas associadas à Mata
 subaquáticas mussuã (Kinosternon scorpioides                     Amazônica Atlântica (especialmente na ilha de
 scorpioides), espécie na lista de animais                        Ipomonga).
 ameaçados de extinção. Em relação às tartarugas                 2.12 Priorizar a conservação da cultura local ao
 marinhas, foram observados sinais de locais de                   implementar o Ecomuseu do Mangue, a partir da
 nidificação para o que deve ser realizada pesquisa               proposta apresentada pelo Museu Goeldi, a
 específica e conservação das praias como sítios de               detalhar e discutir com os beneficiários;
 reprodução das tartarugas marinhas.                             2.13 Implementar Cadeias de valor biodiversas
2.9.3 Aves - é preciso formar lista mais completa                 e sustentáveis – o desenvolvimento de negócios
 para a região. Dois dos táxons registrados, a                    comunitários, inclusivos, geradores de renda e que
 Maracanã-verdadeira (Primolius maracana) e o                     promovam a sociobiodiversidade, valorizem seu
 João-teneném-castanho (Synallaxis rutilans -                     patrimônios natural e cultural:
 subespécie omissa), encontram-se na lista                       2.13.1 A aquicultura - as condições são
 paraense de espécies ameaçadas de extinção. É                    favoráveis, desde que aplicadas boas práticas de
Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 5
manejo e utilizem-se espécies nativas (peixes,        2.13.6 Implementar as propostas da Agenda 21
 caranguejos, ostras etc.);                             local - a partir do processo democrático de
2.13.2 Atividades agroflorestais -                      construção da Agenda 21 local, com especial
 especialmente a fruticultura a partir de espécies      atenção para as áreas de geração de renda,
 perenes em substituição à agricultura de               transporte e saúde.
 subsistência e baixa produtividade de mandioca e
 culturas anuais, baseadas no corte-e-queima em        Estas recomendações não esgotam as demandas
 capoeiras e florestas secundárias;                     locais, reprimidas por décadas, e levantadas no
2.13.3 Criação e abelhas nativas da Amazônia            trabalho da Casa da Virada, apenas apresentam, de
 – visando o aumento da polinização de frutíferas, a    maneira organizada, uma plataforma de trabalho
 recuperação de áreas degradadas, a fixação de          para os próximos anos, a partir de informações
 carbono, e a geração renda com a venda de mel de       científicas e de mecanismos de escuta popular de-
 abelhas nativas. Os primeiros resultados da Casa da    baixo-para-cima.
 Virada demonstram o potencial da atividade;           Reiteramos nossa alegria em apresentar estes
2.13.4 Ecoturismo – os trabalhos realizados pela        estudos e nosso compromisso em buscar parcerias
 Casa da Virada demonstram o potencial,                 e recursos para implementar esta agenda de
 especialmente do ecoturismo de base comunitária;       trabalhos.
2.13.5 Garantir o fortalecimento do tecido
 social local – a partir das organizações de base
 comunitária, para que estas sejam capazes de          João Meirelles Filho       Hermógenes Sá
 representar os anseios das 52 comunidades de          Diretor Geral              Gerente do Programa
 Curuçá, além de diferentes grupos de interesse;




                             6                                                                Casa da Virada
Índice




                                        1.     Apresentação ..........................................................3
                                        2.    Próximos Desafios ....................................................4
                                        3.    A Amazônia, o Peabiru e a Casa da Virada .....................8
                                        4.    Ciência .....................................................................15
                                        5.    Inventários botânicos nas comunidades ......................20
                                        6.    Descobertas relacionadas à fauna ..............................24
                                        7.    Indicadores biossociais e de ameaça à biodiversidade...27
                                        8.    Indicadores de impacto ambiental sobre
                                                 recursos hídricos ..................................................33
                                       9.     Indicadores de Áreas de degradação ...........................34
                                      10.     Caranguejo nosso de cada dia.....................................36
                                      11.     Arqueologia - Vestígios da ocupação humana
                                                 no litoral da Amazônia .........................................38
                                      12.     Ecomuseu do Mangue..................................................39
                                              Equipe ......................................................................44
                                              Anexo .......................................................................45




Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 7
A Casa da Virada foi concebida      A Casa da Virada constitui-se de   • Biosócio-indicadores -
    como intervenção socioambiental     sete projetos, a saber:            para orientar as comunidades no
    para contribuir para o aumento      • Educação Ambiental -             monitoramento de políticas
    da auto-estima de comunidades       formação de 60 agentes             públicas, manejo de recursos
    tradicionais caboclas do Nordeste   ambientais em 2 cursos             hídricos, florísticos, faunísticos e
    Paraense, ao mesmo tempo que        semestrais de 200 horas e mais     sociais.
    valoriza a biosociodiversidade,     de 30 mini-cursos e oficinas       • Clínica de ONGs –
    promove negócios sustentáveis e     comunitárias, sobre artesanato,    Assistência técnica em
    fortalece as unidades de            ecoturismo, água, segurança        planejamento e mobilização de
    conservação.                        alimentar, manejo sustentável,     recursos para fortalecimento
    O conjunto de ações                 valor da floresta etc.             de 8 organizações locais.
    educacionais, científicas e de      • Agenda 21 –                      • Ecoturismo de base
    difusão tecnológica visa            construção participativa e         comunitária –
    contribuir para transformar a       democrática de uma agenda          Desenvolvimento de unidade de
    realidade de 32 mil pessoas, que    comum de sonhos e ações de 52      negócio administrada por jovens,
    vivem em mais de 52                 comunidades de Curuçá.             capacitados como monitores de
    comunidades de Curuçá,                                                 ecoturismo.
                                        • Museu do Mangue -
    município da microrregião do
                                        (Ecomuseu) – elaboração de         • Abelhas nativas –
    Salgado, meso-região do
                                        projeto de museu comunitário, a    implantação de criação de
    Nordeste Paraense, a 130 km de
                                        partir de narrativas orais e       abelhas nativas
    Belém.
                                        formação de coleção do             (meliponicultura) para 60
                                        patrimônio material, visando a     famílias em 5 comunidades,
                                        instalação futura de espaço        com especial atenção para
                                        museológico.                       mulheres e jovens.




                                                                           Alunos do curso de agentes
1                                                                          ambientais e equipe
                                 8                                                                Casa da Virada
Entre os resultados cabe destacar          em diferentes locais do Pará,
a melhora da auto-estima de                Amapá e Amazonas.
mais de 120 jovens participantes           Como resultados extras da Casa
dos diferentes programas                   da Virada destacam-se o
(agentes ambientais, ecoturismo            Ecoturismo, uma vez que não
etc.). Ainda como parte da                 constava no plano inicial. Esta
Educação Ambiental, as                     iniciativa apresentou resultados
capacitações comunitárias em               significativos, mesmo com
legislação ambiental                       limitados recursos, como a
colaboraram para aprimorar a               formação de monitores em
consciência coletiva a respeito da         ecoturismo, a criação pelos
Resex e sua função social.                 jovens capacitados de uma ONG,
O trabalho dos pesquisadores do            o Instituto Tapiaim, e a
Museu Goeldi e da UFPA                     continuidade da iniciativa por
constitui-se em acervo valioso             meio de outros projetos.
acerca da região, principalmente           Da mesma maneira, o trabalho
no que se refere a orientações             com as abelhas nativas não
para políticas públicas de                 previsto, constituiu-se em outro
conservação.                               resultado positivo. Visando a
O projeto do Museu do Mangue               futura geração de renda
segue os preceitos de um                   complementar para as famílias
Ecomuseu. O Fórum da Agenda 21             envolvidas.                        De cima para baixo, reunião do Fórum da
                                                                              Agenda 21, manutenção das caixas de
Local das comunidades de Curuçá
                                                                              abelhas nativas e monitores de ecoturismo
foi implantado e realizado a                                                  e visitantes em roteiro de base comunitária
partir de ampla base local. É
iniciativa que merece ser
acompanhada por seu caráter
inovador e desafiador.
A Clínica de ONGs, apesar das
metas terem sido alcançadas,
apresenta-se como um dos
maiores desafios. Os resultados
permitem conjecturar a
necessidade de revisão
metodológica. Esta ação
permitiu, por exemplo, gerar uma
reflexão no Peabiru como se deve
conduzir seu programa de
capacitação de ONGs, realizado
Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 9
Pescador da maré

                                                                         3.2 A Amazônia


                                                                         Na Amazônia brasileira mais 3
                                                                         milhões de pessoas (10% do
                                                                         total) são de populações
                                                                         tradicionais – índios, quilombolas
                                                                         e caboclos. Se considerarmos
                                                                         somente as populações caboclos
                                                                         – ribeirinhos, seringueiros,
                                                                         pescadores artesanais,
                                                                         quebradeiras de coco, pequenos
                                                                         agricultores etc., encontraremos
                                                                         cerca de 30 mil comunidades
                                                                         rurais.
                                                                         Historicamente, o Brasil relegou a
                                                                         região ao segundo plano,
                                                                         concebendo-a como fonte
                                                                         inesgotável de terras e matérias
                                                                         primas, desrespeitando suas
                                                                         populações, praticando
                                                                         sistematicamente a pilhagem e a
3.1 A proposta metodológica                                              ocupação de forma desordenada e
                                                                         violenta. A partir de 1964 a
                                    auto-estima, a conservação da        Amazônia é interligada por
Ao longo de seus 11 anos, o
                                    cultura e da biodiversidade, o       estradas ao nordeste e centro-sul
Instituto Peabiru aprimorou uma
                                    resgate da cidadania, a geração de   do país, a migração é fortemente
abordagem para a ação social
                                    emprego e renda, e estimular o       estimulada, e os incentivos fiscais
visando o desenvolvimento local
                                    fortalecimento do tecido social a    atraem indústrias, incentivam a
que compreende a economia
                                    partir das associações               pecuária bovina extensiva e pólos
local, a cidadania, a cultura e o
                                    comunitárias. O termo Virada é       minero-metalúrgicos.
fortalecimento institucional das
organizações da sociedade civil.    invenção dos pescadores de           Graças à impunidade, à ausência
A intenção é desenvolver as áreas   Curuçá. Quando vão em busca de       de Estado, à corrupção, ao
do conhecimento de maneira          seu sustento no mangue ou na         coronelismo vigentes, bem como
integrada.                          maré dizem que vão para a virada.    a incompreensão do que
                                    Ao mesmo tempo, Virada significa     verdadeiramente representa a
Esta abordagem, batizada de
                                    mudar de vida, o ano da virada, o    sociedade e a natureza da
Casa da Virada, significa
                                    gol da virada, dia 31 de dezembro,   Amazônia, a região pouco avança
implementar, simultaneamente,
                                    data para renovar esperanças.        em termos sociais.
iniciativas para a elevação da
                             10                                                                Casa da Virada
FOTO 07
Em termos ambientais o                     rapidamente, e ensaia-se novo        necessidade de atender os
resultado é catastrófico. Em               ciclo de grandes                     pescadores artesanais e
menos de meio século a                     empreendimentos de infra-            pequenos agricultores no manejo
Amazônia perde 17% de sua                  estrutura, mineração e               racional desses recursos,
cobertura vegetal (70 milhões de           metalurgia, com investimentos,       especialmente de manguezais e
hectares), superfície igual à              em 5 anos, de mais de R$ 150         pela situação crítica da
soma das áreas dos estados do              bilhões, superiores aos dos          conservação da água doce.
Rio Grande do Sul, Santa                   últimos 500 anos.                    Igualmente importante é a
Catarina, Paraná, São Paulo, Rio           Que Amazônia queremos? É             ameaça da construção de mega-
de Janeiro e Espírito Santo).              possível aliar sustentabilidade,     empreendimentos, como o porto
Em vez de atacar o problema de             mineração e negócios rurais?         flutuante proposto pela
frente, como Nação, tratamos dos           Como substituir atividades não       Angloamerican (MMX) e o porto
efeitos – a malária, a dengue, a           sustentáveis antes que estas nos     off-shore do Espadarte.
desnutrição, a violência, a                destruam e à Amazônia? De que        Segundo o IBGE (Estimativas
prostituição, o desemprego, a              maneira garantir direitos básicos    2007 e Censo 2000), Curuçá tem
queimada e o desmatamento –; e             aos cidadãos amazônicos?             33.768 habitantes. Desses,
não das causas – a falta de                O propósito do Peabiru é             20.741 vivem em áreas rurais.
conhecimento e acesso aos                  contribuir para fortalecer a auto-   Apenas 25,5% das casas têm
direitos básicos, a má                     estima, a geração de renda de        fossa séptica ou são ligadas à
distribuição de renda, o acesso            forma sustentável e a                rede geral de esgoto; 22,2% têm
injusto à educação e aos serviços          recuperação das paisagens            acesso ao serviço de coleta de
públicos, a subserviência aos              naturais da Amazônia mais            lixo e 12,2% da população é
ditames de mercados por madeira            devassada. É neste sentido que o     analfabeta.
e carne bovina barata, energia             Peabiru prioriza o nordeste          Segundo o Atlas de
subsidiada e água exportada na             paraense e seu litoral. É na         Desenvolvimento Humano no
forma de grãos e carne bovina.             região do Salgado, e em Curuçá,      Brasil, o Índice de
No meio rural, o maior desafio é           onde nossa ação se desenvolve.       Desenvolvimento Humano (IDH)
oferecer respostas adequadas ao                                                 de Curuçá é de 0,709; o IDH-
avanço da pecuária bovina. Em                                                   Renda é de 0,561 com 74,1% da
50 anos o Brasil transferiu para a                                              população sendo considerada
região 1/3 de seu rebanho (75              3.3 Curuçá e a região do             pobre.
milhões de cabeças). Entre as              Salgado
                                                                                  Entre Belém, Pará, e São Luís,
consequências estão: Brasil                                                     Maranhão, estão os mais
campeão mundial de                         O Peabiru atua no Salgado, e, em     extensos, complexos e
desmatamento e queimadas, e 5o             particular, em Curuçá, motivado      biodiversos manguezais do
maior emissor de gases para o              pelas limitadas oportunidades de     planeta. Na Costa Norte brasileira
aquecimento global.                        educação e geração de renda,         (MA, PA e AP) concentra-se 85%
As perspectivas são sombrias: a            pela forte pressão sobre os          dos manguezais do país, dos
pecuária e a soja avançam                  recursos naturais; pela              quais 270 mil hectares no litoral
Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 11
nordeste do Pará. O mangue é a      de Curuçá (RESEX). Com 37.062       existência da RESEX
fonte de alimentação e de renda     hectares, esta protege igarapés,    impossibilitaria qualquer
para mais de 30 mil famílias de     restingas, manguezais e baías,      empreendimento no local.
pescadores do Salgado. O IBAMA      principal fonte de sobrevivência    O escritório do Peabiru em Curuçá
e o ICMBIO consideram os            de cerca de 6 mil famílias de       foi instalado em 2006 e, desde
manguezais (que ocupam apenas       pescadores e pequenos               então, serve como apoio às
1,87% do bioma Amazônia) entre      agricultores.                       iniciativas da organização. Em
as áreas mais frágeis e                                                 2007, fomos selecionados, entre
ameaçadas da região, pois estão                                         mais de 900 concorrentes, para o
suscetíveis às ações predatórias    3.4 As ações do Peabiru em          Programa Petrobras Ambiental
do homem e são considerados         Curuçá                              com a Casa da Virada. Em 2007,
ambientes de baixa resiliência      A partir de 2005 o Peabiru inicia   em parceria com a Royal Tropical
(baixa capacidade de                suas atividades em Curuçá, em       Institute, da Holanda, e
recuperação natural). Além disto,   projeto de pesquisa para a          financiamento do Banco Real,
é possível que mais de 2/3 das      empresa RDP (Planejamento e         iniciamos o programa Abelhas
espécies marinhas dependam, de      Desenvolvimento Permacultural       nativas da Amazônia. Em 2009,
alguma forma, desses                Ltda). O trabalho resultou em       foi a vez do Programa de
ecossistemas.                       avaliação preliminar de             Educação para Jovens, apoiado
   A partir da demanda das mais     viabilidade ambiental, fundiária    pelo Criança Esperança (Rede
de 52 comunidades tradicionais      e político-social de                Globo e UNESCO), como
do município, em 2002 foi criada    empreendimento turístico no         continuidade a uma das
a Reserva Extrativista Mãe Grande   local, demonstrando que a           atividades da Casa da Virada.
                             12                                                              Casa da Virada
3.5 O Instituto Peabiru
O Peabiru é uma Organização da Sociedade Civil de                Responsabilidade Social Empresarial.
Interesse Público – OSCIP, com a missão de gerar                 São ações em 16 municípios em 4 estados: Amapá
valores para a conservação da biosociodiversidade                (Macapá, Santana, Mazagão, Oiapoque e Porto
das florestas tropicais, especialmente da Amazônia.              Grande), Amazonas (Boa Vista do Ramos), Pará
Criado em São Paulo em 1998, tem sua sede em                     (Acará, Barcarena, Belém, Castanhal, Curuçá, Juruti,
Belém desde 2004. São mais de 110 projetos                       Marapanim, Monte Alegre e Tailândia); e São Paulo
realizados, dos quais 11 em andamento. As                        (São Bernardo do Campo).
atividades do Peabiru estão organizadas em 3                     O Peabiru conta com uma assembléia geral de sócios
programas: Escolas de Sustentabilidade – onde se se              pessoas físicas brasileiras, um conselho diretor de e
insere a Casa da Virada; Negócios Inclusivos; e                  um conselho fiscal. As ações são conduzidas por

                                                                                    Manguezal eM Curuçá




Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 13
uma equipe com cerca de 23 pessoas, entre seus 6      O Peabiru participa da Rede AVINA, do Fórum
escritórios (Belém, Curuçá, Juruti, Macapá, São       Amazônia Sustentável - FAS, da ABCR – Associação
Paulo e Tailândia).                                   Brasileira dos Captadores de Recursos e da Rede
Nosso público preferencial são as associações de      GERCO – Rede de Gerenciamento Costeiro, e colabora
moradores e produtores de comunidades                 para a Rede GTA – Grupo de Trabalho da Amazônia.
tradicionais da Amazônia. Os recursos advém de        Em parceria com o Conselho das Associações de
doações de empresas privadas; fundações e             Comunidades Afro-descendentes do Amapá (CCADA)
institutos nacionais e internacionais; editais        criou a Néctar da Amazônia Ltda., empresa com sede
públicos; assessorias em responsabilidade social      em Macapá, AP, para apoiar a cadeia produtiva de
empresarial; doações da Secretaria da Receita         mel de abelhas nativas da Amazônia.
Federal; e neutralização de carbono de organizações
e eventos.




                             14                                                             Casa da Virada
4.1 Em busca da conservação                mexilhões) e a agricultura de       as ilhas e o interior, tanto para a
do Salgado                                 subsistência.                       amostragem socioambiental,
Para contribuir para a                     As comunidades selecionadas         quanto para sensoriamento
conservação dos ambientes                  pertencem a 3 micro-bacias          remoto, caracterização da
naturais e da cultura o Programa           hidrográficas: a do Rio Muriá, um   vegetação, composição florística,
Casa da Virada desenvolveu                 furo separando a vila do Abade,     inventário biológico de aves,
pesquisas científicas em parceria          na parte continental, e as ilhas    peixes, anfíbios, répteis,
com o Museu Paraense Emílio                de Fora, Ipomonga e Marinteua; a    crustáceos e moluscos.
Goeldi - MPEG. Pesquisadores               bacia do Rio Mocajuba, cuja         Em termos de identificação de
trabalharam na área costeira e             nascente está no centro do          espécies, os resultados foram
interior de Curuçá, especialmente          município, com águas mistas,        promissores, ao revelar um rol
nos manguezais, protegidos pela            sendo água doce na primeira         considerável de espécies da flora
RESEX Mãe Grande de Curuçá.                metade e salobra e salgada, a       e da fauna que não se imaginava
Entre as ações estão o inventário          partir da influência da água do     ser tão extenso e singular, seja
da biodiversidade (identificação           mar; e a micro-bacia do Rio         em ambientes de vegetação
de espécies de flora e fauna), a           Curuçá, cujas nascentes ficam no    secundária (capoeiras),
identificação e caracterização de          município de Marapanim, com         remanescentes de florestas de
indicadores de impacto                     águas mistas, e com maior           terra firme, manguezais,
ambiental, e a avaliação do                contingente humano em seu           restingas e vegetação inundada,
estado de conservação dos                  entorno.                            como campos e igapós.
principais rios. Foram estudadas           As metodologias levam em            As atividades de campo buscaram
as ilhas flúvio-marinhas (como a           consideração as diferenças entre    compreender a percepção das
ilha de Fora, onde estão as vilas
                                                                               Ilha flúvio-marinha de Areuá
de Algodoal, Arapiranga de Fora,
Iririteua, Mutucal, Pedras
Grandes e Recreio), e as ilhas de
Areuá, Ipomonga, Marinteua e
Romana, onde há presença
temporária de pescadores.
O interior incluiu o estudo de
comunidades em um raio de 20
km a partir do núcleo urbano do
município. Foram visitados os
povoados com vegetação costeira
de manguezais e restingas, e que
apresentam como atividades
econômicas a pesca, a catação de
mariscos (caranguejos,
camarões, ostras, turus e
Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 15
Mapa da vegetação de Curuçá




comunidades locais em relação a      biodiversidade e uso sustentável    4.2 Curuçá: Conjunto raro e
RESEX. Os resultados levantados      de recursos naturais. A             singular de ecossistemas
nas ilhas e áreas continentais       participação dos pesquisadores      Na zona costeira a paisagem é
auxiliarão na construção de          do Museu Goeldi inclui, ainda,      dominada por manguezais,
plano diretor que possa favorecer    aspectos legais, organizacionais,   restingas, praias e dunas. No
o desenvolvimento sustentável        avaliação do capital social e       interior, pela agricultura familiar,
de suas comunidades. Estes           questões relativas ao impacto       capoeiras em diversos estágios
resultados prestam-se para           sobre o uso de recursos naturais.   de recrescimento e escassos
orientar políticas públicas para a                                       remanescentes de florestas de
recuperação de áreas                                                     terra firme. O Salgado Paraense é
degradadas, proteção e manejo                                            a região que mais perdeu
das micro-bacias, conservação da

                              16                                                                Casa da Virada
florestas de terra firme na                Em cerca de 90 km2 encontram-        único acesso era a via fluvial. As
Amazônia, ao longo de 150 anos             se 5 comunidades. Nas outras         comunidades mais recentes estão
de colonização, com redução de             ilhas identificam-se abrigos         ao longo da rodovia Castanhal-
mais de 90% de sua cobertura               provisórios de pesca, visitados      Curuçá (PA 136). Nas
original. A microrregião do                por pescadores, camaroneiros e       comunidades rurais é raro
Salgado abrange outros onze                tiradores de caranguejo na safra     encontrar remanescentes de
municípios, apresentando uma               pesqueira, o que ocorre durante      florestas originais, os poucos
zona costeira de cerca de 300              os meses menos chuvosos.             remanescentes estão em
quilômetros.                               Somente nas praias oceânicas há      propriedades de maior porte.
O conjunto de ilhas flúvio-
marinhas de Curuçá apresenta
grande importância, seja pelo
alto grau de conservação da
vegetação, especialmente
manguezais e florestas de terra
firme (bacurizais, umirizais e
outros). Este é o caso da Ilha de
Ipomonga, exemplo de floresta
de terra firme, que impressiona
pelas características de Mata
Atlântica em plena Amazônia, o
que leva-nos a propor nova
nomenclatura específica para
esta vegetação: a Mata                                                          Aspecto externo de vegetação
Amazônica Atlântica, aquela                                                     secundária, cuja luminosidade
                                           uma presença de alguns               favorece o desenvolvimento de cipós.
encontrada próxima da costa do
Oceano Atlântico.                          pescadores durante o ano todo.
                                                                                4.3 Inventário da
Por sua vez, as ilhas de Areuá,            A parte continental, o interior de
                                                                                biodiversidade
Marinteua e Romana apresentam              Curuçá, é composta por 52
                                           comunidades (vilas, povoados e       Os pesquisadores inventariaram
vegetações de restinga, campos
                                           localidades) além do núcleo          populações de grupos biológicos
(apicuns) e dunas litorâneas,
                                           urbano. As capoeiras e pequenas      mais importantes da
além de extensos manguezais e
                                           áreas de agricultura de              biodiversidade, principalmente
áreas de campos savanóides,
                                           subsistência são marcantes na        pelo seu interesse à economia
compostas de antigas dunas
                                           paisagem das vilas do interior. A    local. Milhares de pessoas
aplainadas.
                                           maioria está localizada às           sobrevivem da coleta de recursos
A única ilha habitada de forma                                                  costeiros – peixes, camarões,
                                           margens das micro-bacias dos
permanente é a Ilha de Fora, cuja                                               caranguejos, ostras e mexilhões
                                           rios Curuçá, Muriá, Mocajuba e
cobertura vegetal de terra firme                                                – para a comercialização e
                                           Tijoca, e até recentemente, o
encontra-se bastante alterada.                                                  consumo próprio. Foram, ainda,
Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 17
roliça (postes, caibros e varas),
                                                                           fibras vegetais e cipós (para a
                                                                           fabricação de artefatos
                                                                           domésticos, construção de cercas
                                                                           e para habitações e depósitos
                                                                           rústicos, os chamados tapiris e
                                                                           paióis). As capoeiras e
                                                                           remanescentes e até os
                                                                           manguezais servem como fonte
                                                                           de madeira empregada na
                                                                           reforma de currais de pesca e
                                                                           para lenha e carvão vegetal.
                                                                           Nessas pequenas áreas de
                                                                           floresta densa foram encontrados
                                                                           exemplares de espécies
                                                                           localmente raras, do ponto de
                                                                           vista biológico e florestal, como
                                                                           o Tauari (Couratari multiflora),
A Mata Amazônica Atlântica na ilha de Ipomonga                             Cupiúba (Goupia glabra),
listadas e caracterizadas espécies     vegetação secundária. Mais de       Sucupira (Diplotropis purpúrea),
botânicas (somente para plantas        80% da ilha é coberta por           dentre outras.
com flores) e da fauna terrestre       florestas secundárias               Na Ilha de Fora, e na costa do
(aves, répteis e anfíbios).            (capoeiras), em diversos graus de   município, estão presentes os
                                       recuperação, utilizadas de          bosques de manguezais, como os
Descobertas relacionadas à             tempos em tempos para a             mais densos e altos de todo o
flora                                  agricultura de subsistência,        litoral amazônico, com o dossel
                                       baseada no corte-e-queima, ou       atingindo até 30 metros de
Diversos aspectos de importância
                                       seja, no cultivo e posterior        altura. Nestes, há as 3 espécies
acerca da flora local foram
                                       abandono, comum à agricultura       de mangue: Mangueiro-vermelho
identificados na Ilha de Fora. A
                                       itinerante da Amazônia.             (Rhizophora mangle), Siriubeira
ilha, com certa diversidade
vegetal localiza-se a noroeste do      Por este motivo, restam na ilha     (Avicennia nítida) e Tinteiro
município, entre a foz do Rio          poucos fragmentos de florestas      (Laguncularia racemosa).
Muriá e a do Rio Curuçá. Nesta foi     densas de terra baixa, ameaçadas
possível analisar parâmetros           pela exploração madeireira para     4.4 Ipomonga: a Mata
florísticos e fitossociológicos da     atender as necessidades locais, e   Amazônica Atlântica
área e, a partir daí, conhecer         pelas novas áreas de agricultura
aspectos botânicos e ecológicos,       de subsistência. Desses
                                       remanescentes florestais, as        As expedições científicas do
e os impactos da ocupação
                                       comunidades retiram madeira         Museu Goeldi, como parte da
humana, como o surgimento da
                               18                                                               Casa da Virada
Casa da Virada, identificaram a
ocorrência de um tipo de floresta
remanescente que apresenta
características de Mata Atlântica
em plena região Amazônica.
Trata-se da floresta presente na
Ilha de Ipomonga e ilhas com
características semelhantes na
região do Salgado. A Ilha de
Ipomonga, com 12 km2, localiza-
se a 5 km do Oceano Atlântico.
O conceito de Mata Atlântica
envolve questões biogeográficas.
O bioma Mata Atlântica que
cobria o litoral e parte do interior
do Brasil, em mais de 1 milhão de
km2 (100 milhões de hectares),
desde o Rio Grande do Sul ao
Ceará, apresenta diferentes                                            Pesquisadores em expedição na Ilha de Fora
características na medida em que           Bragantina eram de florestas de       Bacuris (Platonia insignis) de
se alteram o clima, os solos, a            terra firme, semelhantes à de         grande porte, que já vinham
altitude e outros fatores                  Ipomonga, com diferenças              sendo estudadas pela EMBRAPA.
geográficos.                               fundamentais. A floresta da Ilha      Ipomonga apresenta, ainda,
Na Ilha de Ipomonga, em Curuçá,            de Ipomonga apresenta                 espécies de árvores típicas da
há também Mata Atlântica, com o            diferenças em relação às demais       floresta de terra firme, o Piquiá
acréscimo de Amazônica, a Mata             matas densas amazônicas. Existe       (caryocar villosum), o Tauari
Amazônica Atlântica, porque,               maior proporção de espécies           (Couratari guianensis) e a
antes de tudo, esta é amazônica,           caducifólias, ou seja, que perdem     Sapucaia (Lecythis pisonis).
uma vez que está no bioma                  as folhas durante a estação seca.     Para conservá-la e protegê-la, o
amazônico. Essa classe não existe          Há maior proporção de epífitas,       Museu Goeldi e o Instituto
entre as tipologias florestais da          no que se assemelha com a Mata        Peabiru, recomendam que a Ilha
região, classificadas pelo IBGE.           Atlântica. Existem algumas            de Ipomonga se transforme em
No entanto, nesta escala                   espécies, como o Jatobá               unidade de conservação estadual
analisada pelo Museu Goeldi para           (Hymenaea courbaril), que são         ou federal, e como Estação de
a Casa da Virada, podemos                  encontradas em toda a mata.           Pesquisas, enfim, um centro de
considerar essa tipologia                  É impressionante o estado de          referência sobre esse tipo de
singular.                                  conservação da ilha de                floresta na Amazônia, e que
A antiga cobertura florestal tanto         Ipomonga. Foram encontradas           proteja este ecossistema único do
do Salgado como da Zona                    populações remanescente de            bioma amazônico.
Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 19
5.1 Comunidade de Nazaré do          5.2 A Comunidade Vila Lauro Sodré
Mocajuba                             Também possui capoeira proveniente de roça abandonada, utilizada
Possui capoeira de mais de 20        para a retirada de madeira, com mais de 30 anos. O relevo é plano, com
anos, proveniente de roça            solo areno-argiloso. O sub-bosque é ralo, e onde é mais denso nota-se a
abandonada. É utilizada como         presença de cipós. No chão da capoeira, encontrou-se grande incidência
reserva, mas sofre a retirada de     de Sellaginella sp. (Sellaginellaceae). Provavelmente pela alta
madeira de pequeno porte,            umidade, uma vez que estas áreas eram próximas de igarapés. A
principalmente para caibros e        presença de epífitas é muito baixa, observando-se, apenas, algumas
esteios. A capoeira se encontra em   espécies de Araceae. Entre as palmeiras, destacam-se a regeneração de
área de relevo plano, com solo       Tucumã (Astrocaryum vulgare) e Inajá (Attalea maripa).
arenoso. Em algumas partes há        Há camada de liteira densa, principalmente junto aos igarapés. O dossel
terra-preta areno-argilosa,          é de aproximadamente 18 m, com emergentes que chegam a atingir
provavelmente por causa das          entre 25 a 30 m, como Pará-pará (Jacaranda copaia – Bignoniaceae),
queimadas anteriores.                Virola michelli (Myristicaceae) e Xylopia nitida (Annonaceae). Essas
Na comunidade há sub-bosque          emergentes são provenientes da mata primitiva, à exceção de Pará-
não muito denso, com áreas de        pará, espécie pioneira de crescimento rápido.
maior densidade de cipós. Não        No dossel não observamos espécies dominantes. Entre as mais comuns
foram observadas epífitas. A         há a Tapiririca (Tapirira guianensis – Anacardiaceae). Observou-se a
camada de liteira não é muito        regeneração e indivíduos juvenis de espécies da mata primitiva, como a
espessa. Entre as palmeiras          Sucuúba (Himatantus sucuuba – Apocynaceae), Chrysophyllum sp
observou-se o Tucumã e               (Sapotaceae). Nessa área existe Cupuaçú (Theobroma grandiflorum –
Desmoncus sp.                        Sterculiaceae).
O dossel é de aproximadamente 12
m de altura, com predominância
de Croton sp (Euphorbiaceae),
Saboeiro (Abarema jupunba – Leg.
Mimosoideae) e Guapira venosa
(Nyctaginaceae). Entre os cipós o
Escada-de-jabuti (Bauhinia
guianensis – Leg.
Caesalpinioideae) Arrabidaea sp.                                                           Detalhe de mangue
(Bignoniaceae). Entre as ervas a     5.3 Vila Lauro Sodré
Wulffia baccata (Compositae),        A capoeira também tem                Arecaceae) e certa dominância de
Heliconia psilostachya               aproximadamente 30 anos, e é         Connarus perrotetti
(Heliconiaceae). Não foram           semelhante à anterior, com           (Connaraceae). Há retirada de
observadas regeneração nem           pequenas diferenças na               madeira para caibros, esteios etc.
indivíduos jovens de espécies        composição florística, como a        Entre as ervas está a Sororoca
florestais que poderiam ser          presença de Mumbaca                  (Phenacospermum guianensis –
provenientes da floresta primária.   (Astrocaryum gynacanthum –           Strelitziaceae).

                                20                                                              Casa da Virada
5.4 Comunidade Arapiranga                  5.5 Comunidade Nazaré da
Está bastante desmatada. A área            Tijoca
observada estava abandonada a              A capoeira é mais antiga, entre 25   gêneros Arrabidaea
aproximadamente 10 anos.                   e 30 anos, em área plana, também     (Bignoniaceae) e Escada-de-
Apresenta terreno plano, solo              resultado de roças abandonadas.      jabuti (Bauhinia guianensis – Leg.
areno-argiloso, arenoso em                 Não há informações sobre retirada    Caesalpinioideae).
alguns pontos. A vegetação tem             de madeira. O solo é areno-          O dossel é de aproximadamente
aproximadamente 3 m de altura              argiloso e a camada de liteira       15 m, não apresentando
com árvores remanescentes da               apresenta, de 1 a 3 cm de            emergentes. No dossel não há
floresta primitiva, o                      espessura. O sub-bosque não é        predominância de determinada
Chrysophyllum sp. –                        denso, com poucos cipós e            espécie, e as mais abundantes são
Sapotaceae).                               palmeiras. Entre as palmeiras        a Guapira opposita
Um sub-bosque muito denso,                 apenas indivíduos de Inajá           (Nyctaginaceae) e o Bacuri
com presença de Tiririca (Scleria          (Attalea maripa – Arecaceae) e       (Platonia insignis – Clusiaceae),
sp. – Cyperaceae), Paspalum sp.            pouca regeneração. Os poucos         com intensa regeneração.
(Poaceae) e outros, como                   cipós são principalmente dos
                                                                                Frutas na estrada
Solanum sp. (Solanacae),
Stylosanthes guianensis (Leg.
Papilionoideae) e Wullfia baccata
(Compositae). Os cipós são raros,
sendo observados aqueles de
áreas recentemente desmatadas,
como espécies de Mandevilla sp.
(Bignoniaceae). Apesar da
devastação, as matas ciliares, as
beiras dos igarapés, estão
relativamente preservadas.




Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 21
5.6 Comunidade Santo Antonio          5.7 Boa Vista do Muriá
da Tijoca                             A capoeira chega a três décadas de regeneração, e está localizada a
Observadas capoeiras de 20 anos.      apenas 5 m do mangue. É área de preservação da comunidade e não é
Seu relevo é plano, o solo é          permitida a extração de madeira ou caça. O relevo é plano, o solo
areno-argiloso, a camada de           arenoso a areno-argiloso, e em algumas partes pedregoso. O sub-
liteira apresenta, em média, de 1     bosque é limpo, com boa penetração de luz. A camada de liteira é
a 3 cm. O sub-bosque não é muito      espessa, e o dossel de 13 a 15 m, com emergentes de até 20 m. Entre as
denso, com poucos cipós e             ervas, há grande número de indivíduos de Heliconia psilostachya
palmeiras. Entre as epífitas          (Heliconiaceae) e Scleria sp. (Cyperaceae). Os cipós, apesar de não
alguns indivíduos de Anthurium        serem abundantes apresentam espécies como Bauhinia guianensis
sp. (Araceae). Entre as palmeiras     (Leg. Caesalpinioideae), Mandevilla sp. (Apocynaceae), Cipó-de-fogo
a abundancia de Tucumã                (Doliocarpus dentatus e Doliocarpus sp. – Dilleniaceae), Maripa sp.
(Astrocaryum vulgare –                (Convolvulaceae), Smilax sp. (Smilaceae) entre outras.
Arecaceae), em grandes touceiras      As poucas palmeiras são dos gêneros Bactris sp. (comum no sub-
com até 10 indivíduos em cada         bosque), Astrocaryum vulgare (tucumã). No dossel há uma ligeira
uma, e intensa regeneração.           predominância de Sucuúba (Himatantus sucuuba – Apocynaceae),
Entre as ervas a Heliconia            Tatapiririca (Tapirira guianensis – Anacardiaceae). As emergentes são a
psilostachya, Scleria sp.; os cipós   Sucuúba (Himatanthus sucuuba), alguns indivíduos de Tatapiririca e
observados foram Memora               Trattinickia burserifolia (Burseraceae), que atingiu aproximadamente
magnifica (Bignoniaceae), Derris      25 m. Devido à proximidade do mangue foram observados indivíduos de
utilis (Leguminosae                   Taperebá (Spondias monbim – Anacardiaceae).
Papilonoideae) e Memora flavida
(Bignoniaceae).
O dossel é de 12 a 14 metros, sem
dominância de espécie. As             5.8 Comunidade da Beira
emergentes são Cecropia palmata       Foi observada capoeira com 20 anos, proveniente de roça abandonada,
(Cecropiaceae), Saboeiro              em área de relevo plano, solo argilo-arenoso a argiloso. O sub-bosque é
(Abarema jupunba – Leg.               limpo, com boa penetração de luz. Há pouca ocorrência de epífitas,
Mimosoideae), observaram-se           cipós e de palmeiras. A camada de liteira é espessa. O dossel possui
indivíduos de Xylopia sp.             aproximadamente 17 m de altura, e as emergentes chegam a atingir
(Annonaceae) embora não               25m.
tenham sido inventariados.            As ervas são pouco representadas, com a presença de Heliconia
                                      psylostachia (Heliconiaceae), Pariana sp. (Poaceae). Os cipós estão
                                      representados principalmente por Bauhinia guianensis (Leg. Caesalp.),
                                      Serjania sp. (Sapindaceae), Strychnos sp. (Loganiaceae) e Dioscorea sp.
                                      (Dioscoreaceae). No dossel, embora não haja predominância de
                                      determinada espécie, evidenciamos o Marupá (Simarouba amara –
                                      Simaroubaceae), a Sucuúba (Himatanthus sucuuba – Apocynaceae) e o
                                      Saboeiro (Abarema jupunba – Leg. Mimos).
                               22                                                                Casa da Virada
A flora em números
                                                 Inicialmente foram listadas 173 espécies vegetais,
                                                 representantes de 45 famílias botânicas. A partir de análises
                                                 de similaridade florística, a lista de espécies caiu para 126.
                                                 Destas, 37% são comuns aos dois ambientes, o das ilhas e o
                                                 do continente. Um grupo de 43% apresenta ocorrência
                                                 restrita às capoeiras continentais. Cerca de 20% das espécies
                                                 são exclusivas das capoeiras insulares.
                                                 As capoeiras continentais apresentam maior riqueza
                                                 quantitativa, com 126 espécies. As capoeiras das ilhas
                                                 apresentaram 94 espécies. Quase a metade das espécies
                                                 (42%) corresponde a 5 famílias botânicas: Fabaceae
                                                 (15,03%), Myrtaceae (8,67%), Annonaceae (6,36%),




                                           5.9 Comunidade de Curuperé
                                           Trata-se de assentamento, vizinho à Reserva Extrativista, onde há
                                           grande capoeirão em terreno plano e solo de areia branca. O sub-
                   Pesquisa de campo       bosque é limpo, com boa penetração de luz. A camada de liteira é
                                           espessa, com pouca presença de cipós e dossel de 15 m, com
                                           emergentes com mais de 20 m.
Entre as emergentes destacam-se            As palmeiras compõem o sub-bosque e principalmente a Mumbaca
a Sucuúba e o Marupá, além de              (Astrocaryum gynacanthum – Arecaceae) e alguns indivíduos esparsos
Croton matourensis                         de Bactris sp. Poucas ervas foram encontradas. O dossel não apresenta
(Euphorbiaceae), o Saboeiro e              predominância de determinada espécie, no entanto, estão presentes
Sapium lanceolatum                         Andira retusa (Leg. Papil.), Guatteria poeppigiana (Annonaceae),
(Euphorbiaceae). Algumas                   Thyrsodium paraensis (Anacardiaceae), Rinorea guianensis (Violaceae),
espécies típicas de mata de terra          Rollinia exsucca (Annonaceae). Todas espécies de mata de terra firme.
de firme, como o Breu-de-leite             Os cipós são Davilla kunthii (Dilleniaceae), Smilax sp. (Smilacaceae).
(Thyrsodium paraensis –                    Há regeneração de espécies da mata de terra firme: Virola sebifera
Anacardiaceae), Pouteria hirta             (Myristicaceae), Saccoglotis guianensis (Humiriaceae), Andira retusa
(Sapotaceae), Copaíba (Copaifera           (Leg. Pap.). Embora haja indícios de extração de madeira, a área é bem
sp.) e Eschweilera coriacea foram          preservada.
observadas com indivíduos
juvenis e em regeneração.
Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 23
Para répteis e anfíbios foram recolhidos dados em       ou de florestas de terra firme. Poucas espécies
manguezais, margens de igarapés, capoeiras,             migratórias, como maçaricos e gaivotas, foram
florestas de terra firme e áreas savanóides das ilhas   registradas, devido a época do trabalho, fora do
de Fora, Ipomonga, Marinteua e Areuá. Mesmo em          período de migração.
áreas onde há comunidades (Ilha de Fora), o número      Nos manguezais destacou-se o grande número de
de espécies é de 74, sendo 18 espécies de anfíbios,     Garças-brancas grandes (Ardea alba) e Garças-
15 de lagartos e 12 de serpentes.                       pequenas (Egretta thula). Em menor número,
Pela primeira vez na microrregião, foram                espécies como a Garça-maguari (Ardea cocoi), a
encontradas 5 espécies de quelônios, 2 de hábitos       Garça-azul (Egretta caerulea), a Garça-tricolor
terrestres e 3 de hábitos aquáticos. A mais relevante   (Egretta tricolor), e os Savacus (Nycticorax
é a pequena população isolada de tartarugas sub-        nycticorax e Nyctanassa violacea). O Guará
áquaticas que vive em lagoas nas ilhas. A espécie       (Eudocimus ruber) registrado ao longo dos
está na lista de animais ameaçados de extinção          manguezais diversas vezes, em grupos de 2 a 7
(Kinosternon scorpioides scorpioides).                  indivíduos. Trata-se de espécie relativamente
Entre os anfíbios, houve a predominância de             comum em Curuçá, o que indica a boa conservação
espécies das famílias Hylidae e Leptodactylidae.        do mangue.
Entre os lagartos, a família com maior número de        Quanto aos peixes, apesar de pescadores relatarem a
espécies foi a Teiidae. Das 12 espécies de serpentes,   ocorrência de pescados apresentando enfermidades,
6 foram da família Colubridae, 2 das famílias Biodae    constatou-se que a região é relativamente íntegra
e Elapidae e apenas 1 de cada família, Typhlopidae e    ecologicamente. Nas amostras foi observada
Viperidae.                                              considerável inferioridade na proporção de
Os manguezais e ilhas sã importantes habitats para      indivíduos onívoros (que comem de tudo – insetos e
aves migratórias. As áreas florestadas nas ilhas        larvas, outros peixes, algas e vegetais) em relação
merecem atenção especial por abrigar espécies           carnívoros e herbívoros (que se alimentam de
ameaçadas de extinção. Dois dos táxons registrados,     plantas) e planctívoros (que se alimentam de algas e
a Maracanã-verdadeira (Primolius maracana) e o          pequenos invertebrados).
João-teneném-castanho (Synallaxis rutilans -            As amostragens indicam que nas águas interiores
subespécie omissa), encontram-se na lista paraense      (conhecidas como Maré) em Curuçá a fauna foi
de espécies ameaçadas de extinção, a primeira como      pouco alterada pela ação da pesca, apesar da ação
vulnerável, e a segunda como em perigo.                 predatória de barcos pesqueiros industriais, mais
É preciso formar lista mais completa, e realizar        afora do estuário determinar a diminuição de
melhor avaliação da importância dessas formações        algumas espécies.
vegetais para a avifauna local. Estudos sócio-          A Reserva Extrativista é composta por comunidades
econômicos e ambientais contribuem para avaliar o       tradicionais de pescadores e agricultores, que
impacto de ações predatórias como desmatamento          utilizam práticas artesanais da pesca de
ilegal, captura de filhotes etc.                        subsistência, sendo os caranguejos, siris e camarões
Na região foram registradas 121 espécies de aves, de    os recursos da carcinofauna mais importantes.
43 famílias. A maioria habita ambientes secundários     Além de espécies que apresentam interesse

                              24                                                                 Casa da Virada
econômico para os pescadores, foi observada fauna               Foi observada em Curuperé pequenas fazendas de
diversificada e abundante. Foram registradas mais de            camarão marinho, cultivando Litopennaeus
mil indivíduos distribuídos em 24 espécies. Um tipo             vannamei, espécie exótica, originada do Pacífico. O
de caranguejo coletado ainda não foi identificado,              uso de espécies exóticas requer monitoramento
pode tratar-se de uma nova ocorrência para a região,            redobrado, pois trazem riscos de enfermidades e
ou mesmo espécie nova, por isso foi enviado para                competição por alimento e espaço com as espécies
análise de especialista.                                        nativas. Não foi coletado nenhum indivíduo dessa
Foi observada a presença da espécie exótica de                  espécie nas diversas áreas do levantamento.
camarão Macrobrachium rosenbergii, conhecido                    Pescadores relatam que houve captura desses
como Gigante-da-Malásia. Esse registro requer                   camarões com as espécies nativas. A região
monitoramento, pois segundo ribeirinhos, esse                   apresenta condições favoráveis para a aquicultura,
camarão não é cultivado na região há algum tempo,               desde que aplicadas boas práticas de manejo e haja
indicando risco de reprodução e colonização do                  restrição ao uso de espécies exóticas.
ambiente natural.
                                                                                   Pescada-amarela (Cynoscion acoupa)




Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 25
Nazaré do Mocajuba, Lauro Sodré       (Gastrópodes e Bivalves), não      moluscos, ainda possuem outro
e Arapiranga de Dentro têm um         encontradas em outras              fator favorável, uma vez que não
grande potencial para cultivo e       localidades de Curuçá, o que       lançam esgotos nos rios,
extrativismo comercial de ostras      indica necessidade de              fundamental na medida que para
nativas, de maneira sustentável.      conservação dos habitats destas    o crescimento dos moluscos,
Estas possuem grande diversidade      espécies. Além de serem            biofiltradores, não devem existir
de espécies de moluscos               excelentes para o cultivo desses   fontes de poluição da água.




Banco natural de ostras e mexilhões
                               26                                                              Casa da Virada
O crescimento da população de Curuçá e as mudanças em relação ao uso de recursos naturais, causam
transformações na conservação da biodiversidade. Segundo as pesquisas do Museu Goeldi foi possível
propor indicadores relacionados à biodiversidade, à pesca, à agricultura, aos conflitos sociais, à infra-
estrutura, à saúde e ao saneamento básico.

7.1 Biosocio-indicadores                   e de outros estados, o que gera      para consumo local ou venda.
7.1.1 Socioambiental                       conflitos. A pesca de subsistência   Neste contexto, a preservação dos
                                           está em decadência e as              manguezais é vital para a
A percepção das comunidades em
                                           comunidades, crescentemente,         manutenção de diversas espécies,
relação à RESEX é muito
                                           alimentam-se de outras proteínas     assim como, para assegurar
superficial e tênue. Inexiste
                                           animais, como carne de frango e      recursos pesqueiros. A maior
consciência coletiva sobre a
                                           bovina.                              organização das comunidades em
importância dessa unidade de
conservação como área a                    Entre os desafios para melhorar a
proteger, e como fator para a              disponibilidade de estoques
melhoria de condições de vida.             sustentáveis de recursos




Pescadores da maré                                                                                  Plantio de açaí
                                           pesqueiros estão a educação
7.1.2 Pesca                                                                     acordos de pesca apresenta-se
                                           ambiental, a valorização dos
Ano a ano aumentam as                      saberes populares, o                 como essencial e urgente para a
dificuldades em encontrar                  fortalecimento das organizações      sustentabilidade da RESEX.
pescado. Cada vez é necessário             sociais e o desenvolvimento          7.1.3 Agricultura
dedicar maior tempo e esforços             tecnológico e científico da          Há restrições no uso das terras,
para que a pesca resulte                   atividade.                           uma vez que sua maior parte
satisfatória. Além das entidades
                                           Por diversas ocasiões constatou-     encontra-se no entorno de uma
de classe não abrangerem o
                                           se que a mera adoção de práticas     unidade de conservação, a
universo de pescadores locais,
                                           simples de manejo poderiam           Reserva Extrativista. No entanto,
estes sofrem a concorrência de
                                           significar, em curto prazo, maior    como não há plano de manejo e a
pescadores de outros municípios,
                                           oferta de proteínas animais, seja    orientação pública é insuficiente,
Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 27
os danos aos solos, aos recursos hídricos e à vegetação
prosseguem. A produção de subsistência, especialmente de
mandioca, indica a necessidade buscar meios sustentáveis
desta cultura para maior produtividade e geração de renda.
7.1.4 Conflitos sociais
Uma das principais causas de conflito é a presença de
pescadores de outras comunidades e municípios. O processo
de Agenda 21 demonstrou como é baixa a participação da
população nos processos municipais de decisão política.
A questão fundiária é outra fonte de conflitos sociais, haja
vista que a maioria dos terrenos não possui documentação, o
que, sabe-se, é determinante para o desenvolvimento agrícola.
7.1.5 Infra-estrutura
A precariedade do sistema viário e a falta de transporte
público regular estão entre as principais reivindicações das
comunidades. Com dificuldades de circulação, as
comunidades encontram-se isoladas, prejudicando o acesso
à educação, sistema de saúde, e o atendimento às
necessidades básicas por serviços para os moradores das
comunidades.
7.1.6 Saúde e Saneamento Básico
Entre as principais causas de doenças estão aquelas
relacionadas à qualidade da água, na medida que diversas
comunidades não contam com abastecimento regular de
água. A maior parte das comunidades está distante dos
serviços de saúde pública. A maior parte dos postos de saúde
não são equipados e, muitas vezes, nem mesmo funcionam.
A coleta de lixo é insuficiente, o que resulta em acumulo de
lixo, que é carreado para cursos d’água, atraindo vetores de
doenças, como mosquitos, moscas, roedores e urubus.
7.2 Indicadores de ameaça à biodiversidade
Florestas dominadas por Bacuris (Platonia insignis); invasão
de espécies exóticas de crustáceos e moluscos; e redução de
populações de aves, anfíbios, répteis; estão entre os
principais indicadores de que a biodiversidade do município
de Curuçá está ameaçada. Daí ser fundamental um conjunto
de medidas e o acompanhamento da conservação da
biodiversidade local, especialmente faunística.
                              28                                Casa da Virada
7.2.1 Desmatamento - Flora e vegetação
                                                        À exceção de manguezais e de alguns ambientes de ilhas
                                                        mais isoladas, a flora e a vegetação da área foram
                                                        completamente alteradas pelo homem (ação antrópica)
                                                        através da agricultura de subsistência de corte-e-queima.
                                                        Esta prática torna os solos degradados em curto espaço de
                                                        tempo, especialmente devido a solos tropicais de baixa
                                                        fertilidade.
                                                        7.2.2 Caranguejos
                                                        A extração de caranguejo é realizada de maneira artesanal
                                                        por diversas comunidades do entorno da Reserva
                                                        Extrativista. Em São João do Abade destaca-se como local de
                                                        comercialização de caranguejos, para onde, inclusive,
                                                        barcos de outros municípios e comunidades vizinhas se
                                                        dirigem.
                                                        Alguns fatores interferem diretamente na rotina dos
                                                        pescadores artesanais da RESEX: os conflitos por pontos de
                                                        coleta de caranguejos; o uso de técnicas predatórias de
                                                        catação; a concorrência com a pesca industrial e a retirada
                                                        ilegal de caranguejos por pessoas de outras localidades,
                                                        especialmente de São Caetano de Odivelas. Assim, é de suma
                                                        importância o maior conhecimento do potencial faunístico
                                                        da região.
                                                        7.2.3 Camarão
                                                        A exploração de camarões de água doce e marinhos nas
                                                        áreas estuarinas são pontos críticos a considerar com
                                                        reserva. Neste ambiente os camarões marinhos são
                                                        pequenos, pois geralmente são juvenis que migraram do mar
                                                        para crescerem e posteriormente retornarem ao ambiente
                                                        marinho. Os camarões de água doce geralmente são adultos
                                                        que se deslocaram para áreas com água salobra, para a
                                                        reprodução.
                                                        Os crescentes conflitos por pontos de pesca causam
                                                        significativos impactos ambientais. Outra ameaça às
                                                        espécies nativas é o registro dos camarões exóticos: o
                                                        Gigante-da-Malásia (M. rosenbergii) e o Camarão-Cinza
                                                        (Litopennaeus vannamei). O Gigante-da -Malásia é
                                                        territorial e predador, competindo por espaço e alimento.
Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 29
Provavelmente, esses camarões escaparam de viveiros de
criação. A sua fecundidade é alta em relação às espécies
nativas, reproduz-se em água salobra, e as condições de seu
habitat de origem são similares às da RESEX, representando
risco de colonização de espécie exótica. L. vannamei
apresenta dois importantes possíveis focos de conflito: as
enfermidades atribuídas à presença desses animais em
outros ecossistemas, e há casos no nordeste brasileiro; e o
uso de produtos químicos na despesca de fazendas de
camarão (metabissulfito de sódio). Esse provoca redução
brusca, porém passageira, do oxigênio dissolvido da água, o
que poderia gerar grande mortalidade de peixes e
crustáceos. São necessárias ações educativas com aqueles
dedicados ao cultivo de espécies aquáticas para empregadas
as boas práticas de manejo.
7.2.4 Moluscos
A diversidade e abundância de moluscos está diretamente
relacionada aos diferentes habitats da Resex. Entre as
principais ameaças à sustentabilidade de determinados
grupos está a introdução de espécies exóticas de moluscos,
crustáceos e peixes de áreas de criatórios ou introduzidos
acidentalmente. A criação de ostras e mexilhões sem
acompanhamento técnico pode causar a proliferação de
predadores, causando a exaustão da base de recursos
alimentícios.
7.2.5 Peixes
As entrevistas com 34 pescadores artesanais apontam que a
quantidade do pescado está diminuindo. A Tainha (Mugil
curema) é cada vez menos encontrada, seguida pelo Mero, a
Pescada-amarela (Cynoscion acoupa), a Gurijuba e diversas
espécies de Cação.
Os pescadores, tanto da área urbana de Curuçá, como do
Abade relatam a presença de enfermidades no pescado
(ocorrência de desvios de coluna de peixes mugilídeos,
como a Tainha, Pratiqueira (Mugil incilis) e Pescada-gó
(Macrodon ancylodon). Relatam, igualmente, parasitas na
Pescada-amarela e em Pacamuns (Batrachoides
surinamensis), comuns nas espécies e que não

                             30                               Casa da Virada
comprometem a saúde dos peixes.
                                                        Como técnicas de pesca, a maioria dos pescadores usam
                                                        redes de malha entre 25 a 40 mm. A estação chuvosa é a
                                                        mais abundante e a mais produtiva. Nesse período a Tainha e
                                                        a Pratiqueira são as mais frequentes, seguidas pela Pescada-
                                                        gó e por grandes bagres balizadores, a Dourada e
                                                        Piramutaba.
                                                        7.2.6 Anfíbios e répteis
                                                        A diversidade da fauna de anfíbios e répteis é pequena,
                                                        como regra na zona costeira. A salinidade limita esses
                                                        grupos a algumas espécies adaptadas. As lagoas e igarapés
                                                        são de vital importância nos ciclos de vida da maioria de
                                                        anfíbios e répteis. A degradação da maioria das cabeceiras
                                                        de igarapés e matas ciliares é a mais séria ameaça para
                                                        anfíbios e répteis.
                                                        7.2.7 Tartarugas (quelônios)
                                                        Nas áreas costeiras e de influência de marés, existe
                                                        preocupante impacto sobre tartarugas marinhas. Foram
                                                        registradas 5 espécies. A Chelonoidis carbonaria e a C.
                                                        denticulata são de hábitos terrestres. Três espécies são de
                                                        hábitos aquáticos, 2 de água doce, a Rhinoclemmys
                                                        punctularia e a Kinosternon scorpioides; e 1 Marinha, a
                                                        Lepidochelys olivacea.
                                                        Alterações nestes ambientes são responsáveis pela
                                                        destruição ou modificação de sítios de desova e áreas de
                                                        alimentação. A captura acidental por equipamentos
                                                        pesqueiros também causa danos. Moradores de Mutucal
                                                        contam sobre capturas ocasionais em currais de praia de
                                                        exemplares de L. olivacea. É de vital importância maior
                                                        esforço para determinar a conservação das praias como
                                                        sítios de reprodução de tartarugas marinhas.
                                                        Do grupo de quelônios Kinosternon scorpioides representou
                                                        a espécie mais abundante, e provavelmente corresponda ao
                                                        principal predador de girinos e adultos de Hypsiboas,
                                                        Leptodactylus, Physalemus e Rhinella em lagoas das ilhas.
                                                        Especialmente, na lagoa da Campina, na Ilha das Pedras
                                                        Grandes, onde esta espécie foi o único predador noturno
                                                        observado, com registros de 8 indivíduos de várias classes
Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 31
etárias. Deve-se ter especial atenção ao quelônio       Espadarte, que se cogitou nos anos 1980, para ser o
muçuã visto tratar-se de população rara e isolada,      porto de Carajás, e para o qual o Ministério do Meio
podendo ter atributos genéticos diferenciados por       Ambiente apresentou os termos de referência do EIA-
estar tão próximo de região salina.                     RIMA por solicitação de grupo privado; o segundo é a
7.2.8 Aves                                              iniciativa de porto flutuante, pelo empresa Anglo-
                                                        American (Companhia Minerais e Metálicos S.A -
Foram observados diversos locais de retirada de
                                                        MMX), para servir como porto da mineração de ferro
madeira na região das ilhas e nos povoados, que
                                                        da Serra do Navio, no Amapá.
comprometem a avifauna no local (locais de
nidificação, pouso, alimentação etc.). Outra ameaça     Ambas propostas representam impacto ambiental e
é a captura de filhotes, como de Papagaios e            social. Do ponto de vista ambiental, quaisquer
Maracanãs, como animal doméstico e para a               estruturas representam riscos. A passagem de grande
comercialização ilegal. No período entre setembro e     volume de embarcações alteraria as condições
janeiro, essas espécies migram em grande                naturais de turbidez, luminosidade e outros fatores
quantidade para a Ilha de Fora para reprodução. Em      das águas doce e salgada e, riscos de derramamento
ilhas como a de Ipomonga, onde ainda existem matas      de óleo e outros produtos, além da contaminação
primárias de terra firme, foram encontradas espécies    por flora e fauna exóticos trazidos nas águas de
características de florestas, como duas espécies de     lastro.
Tucano (Ramphastos tucanos e R. vitellinus), e o        Do ponto de vista social, empreendimentos de porte
Capitão-de-saíra-amarelo (Attila spadiceus).            resultam em aumento populacional descontrolado,
Na Ilha de Fora, foram registradas espécies c de        risco social para grupos menos protegidos (crianças,
floresta de terra firme, como os Tucanos, o Gavião-     jovens, mulheres, idosos etc.), invasões, enfim, a
relógio (Micrastur semitorquatus), o                    desestruturação social e colapso dos já exauridos
Macuru-de-pescoço-branco (Notharchus                    manguezais, acirrando a disputa por acesso a
hyperrhynchus), a Galinha-do-mato (Formicarius          recursos naturais. Estes riscos merecem estudos
colma) e a Choca-lisa (Thamnophilus aethiops).          profundos e o acompanhamento da população local.
7.3 Porto
Uma das grandes ameaças à biodiversidade da região
são os dois empreendimentos portuários projetados
para a Ponta da Tijoca, na ilha da Romana. A região é
de grande interesse pois a uma milha náutica da
costa, em frente a Romana, há uma profundidade
estável de 25 m, sem necessidade de dragagem, em
águas r calmas, o que garantiria o acesso a
embarcações Cape Size (que não passam no Canal
(Cape) do Panamá), com capacidade de carga
superior a 200 mil toneladas, ideal para o transporte
de minério de ferro.
O primeiro é o Terminal Marítimo Off-shore do

                              32                                                                 Casa da Virada
É crítico o estado de degradação dos ambientes                   Murajá. Pelos rios foram percorridos trechos dos rios
naturais da região relacionados às micro-bacias                  Muriá, Mocajuba, Curuçá e Araquaim. Foram
hidrográficas que demandam o complexo flúvio-                    observados os eventos de impactos que se seguem.
marinho. Os desmatamentos, especialmente de                      Ao longo do Rio Muriá, exceto nas confluências com
matas ciliares, as queimadas anuais para a                       os Rios Mocajuba e Curuçá, foram observadas faixas
preparação de áreas agrícolas, resultam no aumento               estreitas de mangue, com vegetação secundária ao
progressivo de erosão de solos, e consequente                    fundo. Estes mangues se caracterizam por vegetação
assoreamentos de corpos d’água. Isto pode ser                    mais baixa, quando comparada a áreas mais
observado pelo crescente número de currais no meio               extensas do Rio Mocajuba. É na transição do
dos rios, algo inconcebível há algumas décadas. Os               mangue para a vegetação secundária e áreas de uso
pescadores, sem compreender a situação, reputam                  que se localizam a maioria das vilas.
aos currais a destruição, no entanto, estes só são
                                                                 O mangue pode parecer um local sem condições de
fincados em novos areais pois areia foi carreada para
                                                                 habitação, mas não é isto que está ocorrendo. As
o leito dos rios.
                                                                 vilas expandem-se em direção aos manguezais. A
A estes fatores acresce-se a ocupação irregular de               expansão da Vila de Abade relaciona-se à
áreas protegidas por lei – manguezais, dunas e                   proximidade da área urbana de Curuçá, com acesso
restingas – alteradas, de maneira irreversível para a            por asfalto. A expansão do Abade, com 5 mil
expansão viária e urbano, e para garantir mais                   habitantes, desloca-se em direção ao mangue à
espaço a pastagens e áreas agrícolas.                            margem do Rio Grande. Também foram observadas
Por terra foram visitadas as vilas de Curuperé, Boa              em áreas de mangue residências isoladas, barracas
Vista do Muriá, Abade, Lauro Sodré, Santo Antônio                de pescadores, criadouros de camarão e fazendas de
do Tijoca, Nazaré do Tijoca, Água Boa, Candeua e                 pecuária com pastagens artificiais.
Mapas das principais Micro-Bacias Hidrográficas




Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 33
O Salgado Paraense é uma das        torna-se mais dificil,              compatíveis a florestas em
áreas mais antigas sob pressão de   especialmente no verão              regeneração) seria possível
ocupação e uso intensivo do solo    amazônico. A disponibilidade de     recuperar as paisagens e buscar
na Amazônia. Este processo de       proteínas animais da caça e pesca   novo equilíbrio ambiental.
quase dois séculos, resulta em      escasseiam e, mesmo a água para     Nas áreas de vegetação
depauperamento do solo e perda      a agricultura e pecuária sofrem     secundária há espécies de uso
de diversidade biológica. Da        restrições severas.                 madeireiro como o Cumarú
cobertura vegetal original restam   Essas áreas apresentam              (Dipteryx odorata), o Marupá
menos de 10%, fragmentados em       vegetação secundária, onde          (Simarouba amara), a Sucupira-
pequenas manchas de terra firme,    ocorrem, espécies frutíferas como   preta (Diplotropis purpurea), o
bosques de mangues e vegetação      o Bacuri (indicador de              Paricarana (Stryphnodendron
não florestais como restingas e     degeneração do solo), o             pulcherrimum), o Morototó
campos.                             Taperebá, o Muruci e o Tucumã       (Shefflera morototoni) que
O solo das agrovilas de Curuçá e    (como outras palmeiras,             poderão ser priorizadas em
de algumas ilhas igualmente         altamente resistente ao fogo e      programas de repovoamento.
sofreram, processos de corte-e-     secas). Se estas capoeiras fossem   Estas contribuem, ainda, para a
queima relacionados à agricultura   bem manejadas para a geração de     manutenção do fluxo gênico
de subsistência. Isso eliminou as   renda (produção de madeira,         destas espécies, evitando-se a
coberturas vegetais de floresta     carvão, caça, frutas, etc.          sua extinção local.
primárias, resultando em
                                                                          Pesquisadores em área degradada
ambiente comprometido em suas
funções ecológicas. Destarte, as
florestas perderam um de seus
papéis, o de refúgio e lugar de
procriação de animais silvestres.
Da mesma maneira, a maior parte
das nascentes e igarapés foram
alterados de maneira definitiva,
agravado pela derrubada das
florestas de galeria (matas
ciliares). Se a cobertura vegetal
não for recomposta as nascentes
tendem a diminuir, tornando-se
intermitentes durante a seca, e
chegando, inclusive, como ocorre
em muitos casos, a se extinguir.
Esses fatores modificam a
qualidade de vida das
comunidades. O acesso à água
                               34                                                            Casa da Virada
Alguns indicadores de impactos             inadequado de seus recursos       sustentabilidade da costa
demonstram que a costa e, em               naturais ambientais.              atlântica paraense estaria
particular, ambientes mais                 É preciso estruturar medidas de   definitivamente comprometida,
sensíveis – manguezais e                   correção e vigilância ambiental   tornando-a uma costa estéril e
restingas – estariam sofrendo              para esta região, sob pena da     um mar vazio.
profundas e indesejáveis                   degradação ambiental alcançar
modificações, devido ao uso                níveis além dos quais a
                                                                                   Nascente de um curso d´água




Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 35
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Casa da Virada: uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense

  • 1. Uma experiência de intervenção Resultados socioambiental no científicos Salgado Paraense
  • 2. Realização Instituto Peabiru e Museu Paraense Emílio Goeldi Organização João Meirelles Filho, Hermógenes Sá, Suelen Carvalho Coordenação Científica Samuel Almeida, M.Sc. Ecologia Vegetal Pesquisadores Responsáveis e Colaboradores Temáticos Caracterização da Vegetação Antonio Sérgio Lima da Silva, M.Sc. Taxonomia Vegetal, Aspectos Legais e Institucionais Benedita da Silva Barros, M.Sc. Direito, Ictiologia e recursos pesqueiros Breno Eduardo da Silva Barros, M.Sc. Ecologia Marinha Crustáceos Cristiana Ramalho Maciel, Dra. em Aqüicultura, Bolsistas e Técnicos: Florística e Fitossociologia Alessandro dos Reis Oliveira, Dário Dantas do Amaral, M.Sc. Biologia Vegetal, Bolsista Agente Ambiental; Moluscos Breno Portilho de Sousa Maia, Francisco Arimatéia dos Santos Alves, M.Sc. Biologia Ambiental, Técnico em Pesca; Camila de Manejo e exploração do caranguejo uçá Fátima Simão de Moura, Bolsista Francisco Carlos Alberto Fonteles Holanda, M.Sc. Engenharia de PIBIC Museu Goeldi; Pesca, Carlos Alberto Santos da Silva, Aspectos Histórico-Culturais Técnico em Botânica; Helena Monteiro Quadros, M.Sc. Educação, Jaciara Monteiro Cabral, Bolsista Crustáceos Agente Ambiental; Manoel Luciano Aviz de Quadros, M.Sc. Biologia Ambiental, Jony Vazes Ataíde, Bolsista Geoprocessamento e identificação de impactos em bacias Agente Ambiental; hidrográficas Nilzilene Cristo do Vale, Bolsista Marcelo Cordeiro Thalês, M.Sc. Sensoriamento Remoto, Sc. Licenciatura em Biologia; Herpetologia Renata Jeane Lima Cabral, Pablo Suarez, M.Sc. Genética e Biologia Molecular, Bolsista Agente Ambiental. Diagnóstico Arqueológico Paulo Roberto do Canto Lopes, M.Sc. Arqueologia, Fotos e ilustrações: Equipe da Aspectos Sócio-Ambientais Casa da Virada Ruth Helena Cristo Almeida, M.Sc. Sociologia, Design: Forminform Avifauna Sidnei de Melo Dantas, M.Sc. Ecologia Animal. 2 Casa da Virada
  • 3. Esta publicação é um resumo dos resultados do Programa Casa da Virada, do Instituto Peabiru, realizado em Curuçá, Pará, entre 2007 e 2009. Este conjunto de atividades realizou-se graças ao patrocínio do Programa Petrobras Ambiental, da Petrobras e Governo Federal. Participaram destes trabalhos 54 técnicos, entre 15 colaboradores do Peabiru, 21 instrutores, e 18 pesquisadores do Museu Paraense Emílio Goeldi - MPEG, Universidade Federal do Pará - UFPA (campus Bragança) e Instituto Evandro Chagas, Seção de Meio Ambiente (IEC/SAMAM/SVS/MS), bom como centenas de representantes de comunidades, de organizações da sociedade civil de Curuçá e de órgãos públicos das diversas esferas. Entre os parceiros cabe destacar e agradecer as duas entidades que participam desde o início: o Museu Goeldi, especialmente nos projetos de biosocio-indicadores e do Ecomuseu do Mangue e a Associação dos Usuários da Resex Mãe Grande de Curuçá - AUREMAG, cedendo a Casa do Pescador. Importante mencionar a UFPA, Campus Bragança, a Secretaria Estadual de Educação, por meio da Escola Estadual de Ensino Médio Olinda Veras Alves, de Curuçá, e a Prefeitura Municipal de Curuçá e organizações da sociedade civil, especialmente a ONG Cabanos. A proposta é que este trabalho oriente as políticas públicas para a região do Salgado e na Zona Bragantina e, em especial para Curuçá. Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 3
  • 4. Entre as conclusões podem-se destacar as seguintes, socioambiental, uma vez que estes não existem que merecem maior discussão e sua transformação desde sua criação a partir de 2002. em projetos, portarias, decretos e leis e ações 2.4 Implementar ações de educação ambiental complementares, entre as quais há recomendações para que as populações beneficiárias das unidades de âmbito regional (para o Salgado e Zona de conservação efetivamente se assenhorem de seu Bragantina), para o município de Curuçá ou para patrimônio e gestão, zelando por sua determinadas ilhas ou comunidades, a saber: sustentabilidade. As pesquisas da Casa da Virada 2.1 Criação de Corredor Ecológico da Zona indicam que a percepção das comunidades em Costeira do Pará - Considerando-se o conjunto de relação à RESEX Mãe Grande de Curuçá é muito 8 reservas extrativistas federais marinhas (RESEX) superficial e tênue. no Nordeste Paraense, acrescido de áreas de 2.5 Garantir a continuidade da formação de proteção ambiental (APA) estaduais de Algodoal agentes ambientais – como bem demonstraram (Marapanim) e Urumajó (Augusto Corrêa), os resultados da formação de 60 agentes recomenda-se aos órgãos federais e estaduais a ambientais pela Casa da Virada; criação do Corredor Ecológico da Zona Costeira 2.6 Ações propostas para a Mata Amazônica do Pará que promoveria a gestão integrada e Atlântica: compartilhada destas unidades, garantindo os 2.6.1 Inclusão da nova classificação de Mata direitos de uso das populações tradicionais, como Amazônica Atlântica pelos órgãos responsáveis a integridade de manguezais e ecossistemas (Ministério do Meio Ambiente, ICMBIO, Secretaria marinhos e costeiros, incluindo-se a nova tipologia de Meio Ambiente do Estado do Pará – SEMA e IBGE de vegetação, classificação proposta pela Casa da (como classificação oficial da cartografia brasileira) Virada, da Mata Amazônica Atlântica. É preciso como ambiente único e altamente vulnerável, considerar um Plano de Manejo Geral para o remanescente nas ilhas flúvio-marinhas (Ipomonga Corredor Ecológico, seja a partir dos planos de e outras) de Curuçá e região, como medida para a cada unidade (hoje inexistentes), seja das demais conservação dos remanescentes florestais do informações técnico-científicas; ameaçado litoral do Pará. 2.2 Criação do Conselho Consultivo do Corredor 2.6.2 Delimitação da área de ocorrência da Mata Ecológico da Zona Costeira do Pará – Amazônica Atlântica, com a preparação de mapa antecipando-se à criação deste Corredor Ecológico, técnico e documentos de apoio, para o que devem seu objetivo seria angariar o apoio, a ser realizadas expedições científicas urgentemente; fundamentação técnica e científica e discutir, de 2.6.3 Criação de unidade de conservação de maneira apropriada e no tempo pertinente às proteção integral para proteger a Mata comunidades, para contribuir à sua formalização e Amazônica Atlântica, especialmente em ilhas garantir sua gestão adequada; propiciando plena flúvio-marinhas como Ipomonga, a nível estadual; representatividade das comunidades usuárias, de 2.6.4 Realização de campanha de educação organizações civis e públicas; ambiental, acerca da importância da Mata 2.3 Realizar a demarcação e os planos de manejo Amazônica Atlântica; das unidades de conservação existentes – para 2.6.5 A criação de uma Estação de Pesquisas, garantir que estas desempenhem sua função como centro de referência sobre a Mata Amazônica 4 Casa da Virada
  • 5. Atlântica, e que proporcione base de apoio física às preciso estudar a possibilidade de buscar a pesquisas científicas; denominação de sítio RAMSAR - Convenção sobre 2.7 Dinamizar as pesquisas cientificas sobre a Zonas Húmidas de Importância Internacional, Zona Costeira do Pará - o que se torna ainda mais especialmente como Habitat de Aves Aquáticas; urgente diante das crescentes ameaças (uso 2.9.4 Monitorar as ameaças de espécies exóticas inadequado dos solos no meio rural, expansão – a principal ameaça constatada é a de camarões. urbana etc.) e, da potencial instalação de portos Merecem atenção: a) a presença da espécie exótica de grande escala em Curuçá; Gigante-da-Malásia (Macrobrachium rosenbergii); 2.8 Implementar os biosocio-indicadores b) O cultivo de outra espécie exótica Litopennaeus desenvolvidos no presente programa, vannamei, original do Pacífico. O uso de espécies garantindo que organismos públicos locais e exóticas requer monitoramento redobrado, pois populações usuárias sejam capazes de acompanhar resultam em riscos de enfermidades e competição e analisar os impactos sobre os sistemas naturais, por alimento e espaço com espécies nativas. A propondo medidas mitigadoras; construção de portos representa ameaças de 2.9 Promover a Conservação da biodiversidade - organismos trazidos de outras regiões (as águas de Garantir proteção adequada às espécies de flora e lastro e espécies encontradas em cascos de fauna vulneráveis e ameaçadas, a partir das embarcações - algas, fungos, mariscos etc.); pesquisas científicas, especialmente para: 2.10 Incrementar a fiscalização ambiental: é 2.9.1 Ostras –atenção à diversidade de moluscos insuficiente a atenção à exploração do caranguejo. (Gastrópodes e Bivalves) de Nazaré do Mocajuba, Da mesma maneira, carece de maior atenção a ação Lauro Sodré e Arapiranga de Dentro, não observada predatória de barcos pesqueiros industriais mais em outras localidades da RESEX; afora dos estuários. 2.9.2 Quelônios - Pela primeira vez na microrregião 2.11 Aprofundar pesquisas de arqueologia – a foram encontradas 5 espécies de quelônios, 2 de identificação de materiais arqueológico e indícios hábitos terrestres e 3 de hábitos aquáticos. Há relevantes apontam o potencial arqueológico da pequena população isolada de tartarugas área, especialmente em zonas associadas à Mata subaquáticas mussuã (Kinosternon scorpioides Amazônica Atlântica (especialmente na ilha de scorpioides), espécie na lista de animais Ipomonga). ameaçados de extinção. Em relação às tartarugas 2.12 Priorizar a conservação da cultura local ao marinhas, foram observados sinais de locais de implementar o Ecomuseu do Mangue, a partir da nidificação para o que deve ser realizada pesquisa proposta apresentada pelo Museu Goeldi, a específica e conservação das praias como sítios de detalhar e discutir com os beneficiários; reprodução das tartarugas marinhas. 2.13 Implementar Cadeias de valor biodiversas 2.9.3 Aves - é preciso formar lista mais completa e sustentáveis – o desenvolvimento de negócios para a região. Dois dos táxons registrados, a comunitários, inclusivos, geradores de renda e que Maracanã-verdadeira (Primolius maracana) e o promovam a sociobiodiversidade, valorizem seu João-teneném-castanho (Synallaxis rutilans - patrimônios natural e cultural: subespécie omissa), encontram-se na lista 2.13.1 A aquicultura - as condições são paraense de espécies ameaçadas de extinção. É favoráveis, desde que aplicadas boas práticas de Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 5
  • 6. manejo e utilizem-se espécies nativas (peixes, 2.13.6 Implementar as propostas da Agenda 21 caranguejos, ostras etc.); local - a partir do processo democrático de 2.13.2 Atividades agroflorestais - construção da Agenda 21 local, com especial especialmente a fruticultura a partir de espécies atenção para as áreas de geração de renda, perenes em substituição à agricultura de transporte e saúde. subsistência e baixa produtividade de mandioca e culturas anuais, baseadas no corte-e-queima em Estas recomendações não esgotam as demandas capoeiras e florestas secundárias; locais, reprimidas por décadas, e levantadas no 2.13.3 Criação e abelhas nativas da Amazônia trabalho da Casa da Virada, apenas apresentam, de – visando o aumento da polinização de frutíferas, a maneira organizada, uma plataforma de trabalho recuperação de áreas degradadas, a fixação de para os próximos anos, a partir de informações carbono, e a geração renda com a venda de mel de científicas e de mecanismos de escuta popular de- abelhas nativas. Os primeiros resultados da Casa da baixo-para-cima. Virada demonstram o potencial da atividade; Reiteramos nossa alegria em apresentar estes 2.13.4 Ecoturismo – os trabalhos realizados pela estudos e nosso compromisso em buscar parcerias Casa da Virada demonstram o potencial, e recursos para implementar esta agenda de especialmente do ecoturismo de base comunitária; trabalhos. 2.13.5 Garantir o fortalecimento do tecido social local – a partir das organizações de base comunitária, para que estas sejam capazes de João Meirelles Filho Hermógenes Sá representar os anseios das 52 comunidades de Diretor Geral Gerente do Programa Curuçá, além de diferentes grupos de interesse; 6 Casa da Virada
  • 7. Índice 1. Apresentação ..........................................................3 2. Próximos Desafios ....................................................4 3. A Amazônia, o Peabiru e a Casa da Virada .....................8 4. Ciência .....................................................................15 5. Inventários botânicos nas comunidades ......................20 6. Descobertas relacionadas à fauna ..............................24 7. Indicadores biossociais e de ameaça à biodiversidade...27 8. Indicadores de impacto ambiental sobre recursos hídricos ..................................................33 9. Indicadores de Áreas de degradação ...........................34 10. Caranguejo nosso de cada dia.....................................36 11. Arqueologia - Vestígios da ocupação humana no litoral da Amazônia .........................................38 12. Ecomuseu do Mangue..................................................39 Equipe ......................................................................44 Anexo .......................................................................45 Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 7
  • 8. A Casa da Virada foi concebida A Casa da Virada constitui-se de • Biosócio-indicadores - como intervenção socioambiental sete projetos, a saber: para orientar as comunidades no para contribuir para o aumento • Educação Ambiental - monitoramento de políticas da auto-estima de comunidades formação de 60 agentes públicas, manejo de recursos tradicionais caboclas do Nordeste ambientais em 2 cursos hídricos, florísticos, faunísticos e Paraense, ao mesmo tempo que semestrais de 200 horas e mais sociais. valoriza a biosociodiversidade, de 30 mini-cursos e oficinas • Clínica de ONGs – promove negócios sustentáveis e comunitárias, sobre artesanato, Assistência técnica em fortalece as unidades de ecoturismo, água, segurança planejamento e mobilização de conservação. alimentar, manejo sustentável, recursos para fortalecimento O conjunto de ações valor da floresta etc. de 8 organizações locais. educacionais, científicas e de • Agenda 21 – • Ecoturismo de base difusão tecnológica visa construção participativa e comunitária – contribuir para transformar a democrática de uma agenda Desenvolvimento de unidade de realidade de 32 mil pessoas, que comum de sonhos e ações de 52 negócio administrada por jovens, vivem em mais de 52 comunidades de Curuçá. capacitados como monitores de comunidades de Curuçá, ecoturismo. • Museu do Mangue - município da microrregião do (Ecomuseu) – elaboração de • Abelhas nativas – Salgado, meso-região do projeto de museu comunitário, a implantação de criação de Nordeste Paraense, a 130 km de partir de narrativas orais e abelhas nativas Belém. formação de coleção do (meliponicultura) para 60 patrimônio material, visando a famílias em 5 comunidades, instalação futura de espaço com especial atenção para museológico. mulheres e jovens. Alunos do curso de agentes 1 ambientais e equipe 8 Casa da Virada
  • 9. Entre os resultados cabe destacar em diferentes locais do Pará, a melhora da auto-estima de Amapá e Amazonas. mais de 120 jovens participantes Como resultados extras da Casa dos diferentes programas da Virada destacam-se o (agentes ambientais, ecoturismo Ecoturismo, uma vez que não etc.). Ainda como parte da constava no plano inicial. Esta Educação Ambiental, as iniciativa apresentou resultados capacitações comunitárias em significativos, mesmo com legislação ambiental limitados recursos, como a colaboraram para aprimorar a formação de monitores em consciência coletiva a respeito da ecoturismo, a criação pelos Resex e sua função social. jovens capacitados de uma ONG, O trabalho dos pesquisadores do o Instituto Tapiaim, e a Museu Goeldi e da UFPA continuidade da iniciativa por constitui-se em acervo valioso meio de outros projetos. acerca da região, principalmente Da mesma maneira, o trabalho no que se refere a orientações com as abelhas nativas não para políticas públicas de previsto, constituiu-se em outro conservação. resultado positivo. Visando a O projeto do Museu do Mangue futura geração de renda segue os preceitos de um complementar para as famílias Ecomuseu. O Fórum da Agenda 21 envolvidas. De cima para baixo, reunião do Fórum da Agenda 21, manutenção das caixas de Local das comunidades de Curuçá abelhas nativas e monitores de ecoturismo foi implantado e realizado a e visitantes em roteiro de base comunitária partir de ampla base local. É iniciativa que merece ser acompanhada por seu caráter inovador e desafiador. A Clínica de ONGs, apesar das metas terem sido alcançadas, apresenta-se como um dos maiores desafios. Os resultados permitem conjecturar a necessidade de revisão metodológica. Esta ação permitiu, por exemplo, gerar uma reflexão no Peabiru como se deve conduzir seu programa de capacitação de ONGs, realizado Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 9
  • 10. Pescador da maré 3.2 A Amazônia Na Amazônia brasileira mais 3 milhões de pessoas (10% do total) são de populações tradicionais – índios, quilombolas e caboclos. Se considerarmos somente as populações caboclos – ribeirinhos, seringueiros, pescadores artesanais, quebradeiras de coco, pequenos agricultores etc., encontraremos cerca de 30 mil comunidades rurais. Historicamente, o Brasil relegou a região ao segundo plano, concebendo-a como fonte inesgotável de terras e matérias primas, desrespeitando suas populações, praticando sistematicamente a pilhagem e a 3.1 A proposta metodológica ocupação de forma desordenada e violenta. A partir de 1964 a auto-estima, a conservação da Amazônia é interligada por Ao longo de seus 11 anos, o cultura e da biodiversidade, o estradas ao nordeste e centro-sul Instituto Peabiru aprimorou uma resgate da cidadania, a geração de do país, a migração é fortemente abordagem para a ação social emprego e renda, e estimular o estimulada, e os incentivos fiscais visando o desenvolvimento local fortalecimento do tecido social a atraem indústrias, incentivam a que compreende a economia partir das associações pecuária bovina extensiva e pólos local, a cidadania, a cultura e o comunitárias. O termo Virada é minero-metalúrgicos. fortalecimento institucional das organizações da sociedade civil. invenção dos pescadores de Graças à impunidade, à ausência A intenção é desenvolver as áreas Curuçá. Quando vão em busca de de Estado, à corrupção, ao do conhecimento de maneira seu sustento no mangue ou na coronelismo vigentes, bem como integrada. maré dizem que vão para a virada. a incompreensão do que Ao mesmo tempo, Virada significa verdadeiramente representa a Esta abordagem, batizada de mudar de vida, o ano da virada, o sociedade e a natureza da Casa da Virada, significa gol da virada, dia 31 de dezembro, Amazônia, a região pouco avança implementar, simultaneamente, data para renovar esperanças. em termos sociais. iniciativas para a elevação da 10 Casa da Virada
  • 11. FOTO 07 Em termos ambientais o rapidamente, e ensaia-se novo necessidade de atender os resultado é catastrófico. Em ciclo de grandes pescadores artesanais e menos de meio século a empreendimentos de infra- pequenos agricultores no manejo Amazônia perde 17% de sua estrutura, mineração e racional desses recursos, cobertura vegetal (70 milhões de metalurgia, com investimentos, especialmente de manguezais e hectares), superfície igual à em 5 anos, de mais de R$ 150 pela situação crítica da soma das áreas dos estados do bilhões, superiores aos dos conservação da água doce. Rio Grande do Sul, Santa últimos 500 anos. Igualmente importante é a Catarina, Paraná, São Paulo, Rio Que Amazônia queremos? É ameaça da construção de mega- de Janeiro e Espírito Santo). possível aliar sustentabilidade, empreendimentos, como o porto Em vez de atacar o problema de mineração e negócios rurais? flutuante proposto pela frente, como Nação, tratamos dos Como substituir atividades não Angloamerican (MMX) e o porto efeitos – a malária, a dengue, a sustentáveis antes que estas nos off-shore do Espadarte. desnutrição, a violência, a destruam e à Amazônia? De que Segundo o IBGE (Estimativas prostituição, o desemprego, a maneira garantir direitos básicos 2007 e Censo 2000), Curuçá tem queimada e o desmatamento –; e aos cidadãos amazônicos? 33.768 habitantes. Desses, não das causas – a falta de O propósito do Peabiru é 20.741 vivem em áreas rurais. conhecimento e acesso aos contribuir para fortalecer a auto- Apenas 25,5% das casas têm direitos básicos, a má estima, a geração de renda de fossa séptica ou são ligadas à distribuição de renda, o acesso forma sustentável e a rede geral de esgoto; 22,2% têm injusto à educação e aos serviços recuperação das paisagens acesso ao serviço de coleta de públicos, a subserviência aos naturais da Amazônia mais lixo e 12,2% da população é ditames de mercados por madeira devassada. É neste sentido que o analfabeta. e carne bovina barata, energia Peabiru prioriza o nordeste Segundo o Atlas de subsidiada e água exportada na paraense e seu litoral. É na Desenvolvimento Humano no forma de grãos e carne bovina. região do Salgado, e em Curuçá, Brasil, o Índice de No meio rural, o maior desafio é onde nossa ação se desenvolve. Desenvolvimento Humano (IDH) oferecer respostas adequadas ao de Curuçá é de 0,709; o IDH- avanço da pecuária bovina. Em Renda é de 0,561 com 74,1% da 50 anos o Brasil transferiu para a população sendo considerada região 1/3 de seu rebanho (75 3.3 Curuçá e a região do pobre. milhões de cabeças). Entre as Salgado Entre Belém, Pará, e São Luís, consequências estão: Brasil Maranhão, estão os mais campeão mundial de O Peabiru atua no Salgado, e, em extensos, complexos e desmatamento e queimadas, e 5o particular, em Curuçá, motivado biodiversos manguezais do maior emissor de gases para o pelas limitadas oportunidades de planeta. Na Costa Norte brasileira aquecimento global. educação e geração de renda, (MA, PA e AP) concentra-se 85% As perspectivas são sombrias: a pela forte pressão sobre os dos manguezais do país, dos pecuária e a soja avançam recursos naturais; pela quais 270 mil hectares no litoral Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 11
  • 12. nordeste do Pará. O mangue é a de Curuçá (RESEX). Com 37.062 existência da RESEX fonte de alimentação e de renda hectares, esta protege igarapés, impossibilitaria qualquer para mais de 30 mil famílias de restingas, manguezais e baías, empreendimento no local. pescadores do Salgado. O IBAMA principal fonte de sobrevivência O escritório do Peabiru em Curuçá e o ICMBIO consideram os de cerca de 6 mil famílias de foi instalado em 2006 e, desde manguezais (que ocupam apenas pescadores e pequenos então, serve como apoio às 1,87% do bioma Amazônia) entre agricultores. iniciativas da organização. Em as áreas mais frágeis e 2007, fomos selecionados, entre ameaçadas da região, pois estão mais de 900 concorrentes, para o suscetíveis às ações predatórias 3.4 As ações do Peabiru em Programa Petrobras Ambiental do homem e são considerados Curuçá com a Casa da Virada. Em 2007, ambientes de baixa resiliência A partir de 2005 o Peabiru inicia em parceria com a Royal Tropical (baixa capacidade de suas atividades em Curuçá, em Institute, da Holanda, e recuperação natural). Além disto, projeto de pesquisa para a financiamento do Banco Real, é possível que mais de 2/3 das empresa RDP (Planejamento e iniciamos o programa Abelhas espécies marinhas dependam, de Desenvolvimento Permacultural nativas da Amazônia. Em 2009, alguma forma, desses Ltda). O trabalho resultou em foi a vez do Programa de ecossistemas. avaliação preliminar de Educação para Jovens, apoiado A partir da demanda das mais viabilidade ambiental, fundiária pelo Criança Esperança (Rede de 52 comunidades tradicionais e político-social de Globo e UNESCO), como do município, em 2002 foi criada empreendimento turístico no continuidade a uma das a Reserva Extrativista Mãe Grande local, demonstrando que a atividades da Casa da Virada. 12 Casa da Virada
  • 13. 3.5 O Instituto Peabiru O Peabiru é uma Organização da Sociedade Civil de Responsabilidade Social Empresarial. Interesse Público – OSCIP, com a missão de gerar São ações em 16 municípios em 4 estados: Amapá valores para a conservação da biosociodiversidade (Macapá, Santana, Mazagão, Oiapoque e Porto das florestas tropicais, especialmente da Amazônia. Grande), Amazonas (Boa Vista do Ramos), Pará Criado em São Paulo em 1998, tem sua sede em (Acará, Barcarena, Belém, Castanhal, Curuçá, Juruti, Belém desde 2004. São mais de 110 projetos Marapanim, Monte Alegre e Tailândia); e São Paulo realizados, dos quais 11 em andamento. As (São Bernardo do Campo). atividades do Peabiru estão organizadas em 3 O Peabiru conta com uma assembléia geral de sócios programas: Escolas de Sustentabilidade – onde se se pessoas físicas brasileiras, um conselho diretor de e insere a Casa da Virada; Negócios Inclusivos; e um conselho fiscal. As ações são conduzidas por Manguezal eM Curuçá Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 13
  • 14. uma equipe com cerca de 23 pessoas, entre seus 6 O Peabiru participa da Rede AVINA, do Fórum escritórios (Belém, Curuçá, Juruti, Macapá, São Amazônia Sustentável - FAS, da ABCR – Associação Paulo e Tailândia). Brasileira dos Captadores de Recursos e da Rede Nosso público preferencial são as associações de GERCO – Rede de Gerenciamento Costeiro, e colabora moradores e produtores de comunidades para a Rede GTA – Grupo de Trabalho da Amazônia. tradicionais da Amazônia. Os recursos advém de Em parceria com o Conselho das Associações de doações de empresas privadas; fundações e Comunidades Afro-descendentes do Amapá (CCADA) institutos nacionais e internacionais; editais criou a Néctar da Amazônia Ltda., empresa com sede públicos; assessorias em responsabilidade social em Macapá, AP, para apoiar a cadeia produtiva de empresarial; doações da Secretaria da Receita mel de abelhas nativas da Amazônia. Federal; e neutralização de carbono de organizações e eventos. 14 Casa da Virada
  • 15. 4.1 Em busca da conservação mexilhões) e a agricultura de as ilhas e o interior, tanto para a do Salgado subsistência. amostragem socioambiental, Para contribuir para a As comunidades selecionadas quanto para sensoriamento conservação dos ambientes pertencem a 3 micro-bacias remoto, caracterização da naturais e da cultura o Programa hidrográficas: a do Rio Muriá, um vegetação, composição florística, Casa da Virada desenvolveu furo separando a vila do Abade, inventário biológico de aves, pesquisas científicas em parceria na parte continental, e as ilhas peixes, anfíbios, répteis, com o Museu Paraense Emílio de Fora, Ipomonga e Marinteua; a crustáceos e moluscos. Goeldi - MPEG. Pesquisadores bacia do Rio Mocajuba, cuja Em termos de identificação de trabalharam na área costeira e nascente está no centro do espécies, os resultados foram interior de Curuçá, especialmente município, com águas mistas, promissores, ao revelar um rol nos manguezais, protegidos pela sendo água doce na primeira considerável de espécies da flora RESEX Mãe Grande de Curuçá. metade e salobra e salgada, a e da fauna que não se imaginava Entre as ações estão o inventário partir da influência da água do ser tão extenso e singular, seja da biodiversidade (identificação mar; e a micro-bacia do Rio em ambientes de vegetação de espécies de flora e fauna), a Curuçá, cujas nascentes ficam no secundária (capoeiras), identificação e caracterização de município de Marapanim, com remanescentes de florestas de indicadores de impacto águas mistas, e com maior terra firme, manguezais, ambiental, e a avaliação do contingente humano em seu restingas e vegetação inundada, estado de conservação dos entorno. como campos e igapós. principais rios. Foram estudadas As metodologias levam em As atividades de campo buscaram as ilhas flúvio-marinhas (como a consideração as diferenças entre compreender a percepção das ilha de Fora, onde estão as vilas Ilha flúvio-marinha de Areuá de Algodoal, Arapiranga de Fora, Iririteua, Mutucal, Pedras Grandes e Recreio), e as ilhas de Areuá, Ipomonga, Marinteua e Romana, onde há presença temporária de pescadores. O interior incluiu o estudo de comunidades em um raio de 20 km a partir do núcleo urbano do município. Foram visitados os povoados com vegetação costeira de manguezais e restingas, e que apresentam como atividades econômicas a pesca, a catação de mariscos (caranguejos, camarões, ostras, turus e Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 15
  • 16. Mapa da vegetação de Curuçá comunidades locais em relação a biodiversidade e uso sustentável 4.2 Curuçá: Conjunto raro e RESEX. Os resultados levantados de recursos naturais. A singular de ecossistemas nas ilhas e áreas continentais participação dos pesquisadores Na zona costeira a paisagem é auxiliarão na construção de do Museu Goeldi inclui, ainda, dominada por manguezais, plano diretor que possa favorecer aspectos legais, organizacionais, restingas, praias e dunas. No o desenvolvimento sustentável avaliação do capital social e interior, pela agricultura familiar, de suas comunidades. Estes questões relativas ao impacto capoeiras em diversos estágios resultados prestam-se para sobre o uso de recursos naturais. de recrescimento e escassos orientar políticas públicas para a remanescentes de florestas de recuperação de áreas terra firme. O Salgado Paraense é degradadas, proteção e manejo a região que mais perdeu das micro-bacias, conservação da 16 Casa da Virada
  • 17. florestas de terra firme na Em cerca de 90 km2 encontram- único acesso era a via fluvial. As Amazônia, ao longo de 150 anos se 5 comunidades. Nas outras comunidades mais recentes estão de colonização, com redução de ilhas identificam-se abrigos ao longo da rodovia Castanhal- mais de 90% de sua cobertura provisórios de pesca, visitados Curuçá (PA 136). Nas original. A microrregião do por pescadores, camaroneiros e comunidades rurais é raro Salgado abrange outros onze tiradores de caranguejo na safra encontrar remanescentes de municípios, apresentando uma pesqueira, o que ocorre durante florestas originais, os poucos zona costeira de cerca de 300 os meses menos chuvosos. remanescentes estão em quilômetros. Somente nas praias oceânicas há propriedades de maior porte. O conjunto de ilhas flúvio- marinhas de Curuçá apresenta grande importância, seja pelo alto grau de conservação da vegetação, especialmente manguezais e florestas de terra firme (bacurizais, umirizais e outros). Este é o caso da Ilha de Ipomonga, exemplo de floresta de terra firme, que impressiona pelas características de Mata Atlântica em plena Amazônia, o que leva-nos a propor nova nomenclatura específica para esta vegetação: a Mata Aspecto externo de vegetação Amazônica Atlântica, aquela secundária, cuja luminosidade uma presença de alguns favorece o desenvolvimento de cipós. encontrada próxima da costa do Oceano Atlântico. pescadores durante o ano todo. 4.3 Inventário da Por sua vez, as ilhas de Areuá, A parte continental, o interior de biodiversidade Marinteua e Romana apresentam Curuçá, é composta por 52 comunidades (vilas, povoados e Os pesquisadores inventariaram vegetações de restinga, campos localidades) além do núcleo populações de grupos biológicos (apicuns) e dunas litorâneas, urbano. As capoeiras e pequenas mais importantes da além de extensos manguezais e áreas de agricultura de biodiversidade, principalmente áreas de campos savanóides, subsistência são marcantes na pelo seu interesse à economia compostas de antigas dunas paisagem das vilas do interior. A local. Milhares de pessoas aplainadas. maioria está localizada às sobrevivem da coleta de recursos A única ilha habitada de forma costeiros – peixes, camarões, margens das micro-bacias dos permanente é a Ilha de Fora, cuja caranguejos, ostras e mexilhões rios Curuçá, Muriá, Mocajuba e cobertura vegetal de terra firme – para a comercialização e Tijoca, e até recentemente, o encontra-se bastante alterada. consumo próprio. Foram, ainda, Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 17
  • 18. roliça (postes, caibros e varas), fibras vegetais e cipós (para a fabricação de artefatos domésticos, construção de cercas e para habitações e depósitos rústicos, os chamados tapiris e paióis). As capoeiras e remanescentes e até os manguezais servem como fonte de madeira empregada na reforma de currais de pesca e para lenha e carvão vegetal. Nessas pequenas áreas de floresta densa foram encontrados exemplares de espécies localmente raras, do ponto de vista biológico e florestal, como o Tauari (Couratari multiflora), A Mata Amazônica Atlântica na ilha de Ipomonga Cupiúba (Goupia glabra), listadas e caracterizadas espécies vegetação secundária. Mais de Sucupira (Diplotropis purpúrea), botânicas (somente para plantas 80% da ilha é coberta por dentre outras. com flores) e da fauna terrestre florestas secundárias Na Ilha de Fora, e na costa do (aves, répteis e anfíbios). (capoeiras), em diversos graus de município, estão presentes os recuperação, utilizadas de bosques de manguezais, como os Descobertas relacionadas à tempos em tempos para a mais densos e altos de todo o flora agricultura de subsistência, litoral amazônico, com o dossel baseada no corte-e-queima, ou atingindo até 30 metros de Diversos aspectos de importância seja, no cultivo e posterior altura. Nestes, há as 3 espécies acerca da flora local foram abandono, comum à agricultura de mangue: Mangueiro-vermelho identificados na Ilha de Fora. A itinerante da Amazônia. (Rhizophora mangle), Siriubeira ilha, com certa diversidade vegetal localiza-se a noroeste do Por este motivo, restam na ilha (Avicennia nítida) e Tinteiro município, entre a foz do Rio poucos fragmentos de florestas (Laguncularia racemosa). Muriá e a do Rio Curuçá. Nesta foi densas de terra baixa, ameaçadas possível analisar parâmetros pela exploração madeireira para 4.4 Ipomonga: a Mata florísticos e fitossociológicos da atender as necessidades locais, e Amazônica Atlântica área e, a partir daí, conhecer pelas novas áreas de agricultura aspectos botânicos e ecológicos, de subsistência. Desses remanescentes florestais, as As expedições científicas do e os impactos da ocupação comunidades retiram madeira Museu Goeldi, como parte da humana, como o surgimento da 18 Casa da Virada
  • 19. Casa da Virada, identificaram a ocorrência de um tipo de floresta remanescente que apresenta características de Mata Atlântica em plena região Amazônica. Trata-se da floresta presente na Ilha de Ipomonga e ilhas com características semelhantes na região do Salgado. A Ilha de Ipomonga, com 12 km2, localiza- se a 5 km do Oceano Atlântico. O conceito de Mata Atlântica envolve questões biogeográficas. O bioma Mata Atlântica que cobria o litoral e parte do interior do Brasil, em mais de 1 milhão de km2 (100 milhões de hectares), desde o Rio Grande do Sul ao Ceará, apresenta diferentes Pesquisadores em expedição na Ilha de Fora características na medida em que Bragantina eram de florestas de Bacuris (Platonia insignis) de se alteram o clima, os solos, a terra firme, semelhantes à de grande porte, que já vinham altitude e outros fatores Ipomonga, com diferenças sendo estudadas pela EMBRAPA. geográficos. fundamentais. A floresta da Ilha Ipomonga apresenta, ainda, Na Ilha de Ipomonga, em Curuçá, de Ipomonga apresenta espécies de árvores típicas da há também Mata Atlântica, com o diferenças em relação às demais floresta de terra firme, o Piquiá acréscimo de Amazônica, a Mata matas densas amazônicas. Existe (caryocar villosum), o Tauari Amazônica Atlântica, porque, maior proporção de espécies (Couratari guianensis) e a antes de tudo, esta é amazônica, caducifólias, ou seja, que perdem Sapucaia (Lecythis pisonis). uma vez que está no bioma as folhas durante a estação seca. Para conservá-la e protegê-la, o amazônico. Essa classe não existe Há maior proporção de epífitas, Museu Goeldi e o Instituto entre as tipologias florestais da no que se assemelha com a Mata Peabiru, recomendam que a Ilha região, classificadas pelo IBGE. Atlântica. Existem algumas de Ipomonga se transforme em No entanto, nesta escala espécies, como o Jatobá unidade de conservação estadual analisada pelo Museu Goeldi para (Hymenaea courbaril), que são ou federal, e como Estação de a Casa da Virada, podemos encontradas em toda a mata. Pesquisas, enfim, um centro de considerar essa tipologia É impressionante o estado de referência sobre esse tipo de singular. conservação da ilha de floresta na Amazônia, e que A antiga cobertura florestal tanto Ipomonga. Foram encontradas proteja este ecossistema único do do Salgado como da Zona populações remanescente de bioma amazônico. Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 19
  • 20. 5.1 Comunidade de Nazaré do 5.2 A Comunidade Vila Lauro Sodré Mocajuba Também possui capoeira proveniente de roça abandonada, utilizada Possui capoeira de mais de 20 para a retirada de madeira, com mais de 30 anos. O relevo é plano, com anos, proveniente de roça solo areno-argiloso. O sub-bosque é ralo, e onde é mais denso nota-se a abandonada. É utilizada como presença de cipós. No chão da capoeira, encontrou-se grande incidência reserva, mas sofre a retirada de de Sellaginella sp. (Sellaginellaceae). Provavelmente pela alta madeira de pequeno porte, umidade, uma vez que estas áreas eram próximas de igarapés. A principalmente para caibros e presença de epífitas é muito baixa, observando-se, apenas, algumas esteios. A capoeira se encontra em espécies de Araceae. Entre as palmeiras, destacam-se a regeneração de área de relevo plano, com solo Tucumã (Astrocaryum vulgare) e Inajá (Attalea maripa). arenoso. Em algumas partes há Há camada de liteira densa, principalmente junto aos igarapés. O dossel terra-preta areno-argilosa, é de aproximadamente 18 m, com emergentes que chegam a atingir provavelmente por causa das entre 25 a 30 m, como Pará-pará (Jacaranda copaia – Bignoniaceae), queimadas anteriores. Virola michelli (Myristicaceae) e Xylopia nitida (Annonaceae). Essas Na comunidade há sub-bosque emergentes são provenientes da mata primitiva, à exceção de Pará- não muito denso, com áreas de pará, espécie pioneira de crescimento rápido. maior densidade de cipós. Não No dossel não observamos espécies dominantes. Entre as mais comuns foram observadas epífitas. A há a Tapiririca (Tapirira guianensis – Anacardiaceae). Observou-se a camada de liteira não é muito regeneração e indivíduos juvenis de espécies da mata primitiva, como a espessa. Entre as palmeiras Sucuúba (Himatantus sucuuba – Apocynaceae), Chrysophyllum sp observou-se o Tucumã e (Sapotaceae). Nessa área existe Cupuaçú (Theobroma grandiflorum – Desmoncus sp. Sterculiaceae). O dossel é de aproximadamente 12 m de altura, com predominância de Croton sp (Euphorbiaceae), Saboeiro (Abarema jupunba – Leg. Mimosoideae) e Guapira venosa (Nyctaginaceae). Entre os cipós o Escada-de-jabuti (Bauhinia guianensis – Leg. Caesalpinioideae) Arrabidaea sp. Detalhe de mangue (Bignoniaceae). Entre as ervas a 5.3 Vila Lauro Sodré Wulffia baccata (Compositae), A capoeira também tem Arecaceae) e certa dominância de Heliconia psilostachya aproximadamente 30 anos, e é Connarus perrotetti (Heliconiaceae). Não foram semelhante à anterior, com (Connaraceae). Há retirada de observadas regeneração nem pequenas diferenças na madeira para caibros, esteios etc. indivíduos jovens de espécies composição florística, como a Entre as ervas está a Sororoca florestais que poderiam ser presença de Mumbaca (Phenacospermum guianensis – provenientes da floresta primária. (Astrocaryum gynacanthum – Strelitziaceae). 20 Casa da Virada
  • 21. 5.4 Comunidade Arapiranga 5.5 Comunidade Nazaré da Está bastante desmatada. A área Tijoca observada estava abandonada a A capoeira é mais antiga, entre 25 gêneros Arrabidaea aproximadamente 10 anos. e 30 anos, em área plana, também (Bignoniaceae) e Escada-de- Apresenta terreno plano, solo resultado de roças abandonadas. jabuti (Bauhinia guianensis – Leg. areno-argiloso, arenoso em Não há informações sobre retirada Caesalpinioideae). alguns pontos. A vegetação tem de madeira. O solo é areno- O dossel é de aproximadamente aproximadamente 3 m de altura argiloso e a camada de liteira 15 m, não apresentando com árvores remanescentes da apresenta, de 1 a 3 cm de emergentes. No dossel não há floresta primitiva, o espessura. O sub-bosque não é predominância de determinada Chrysophyllum sp. – denso, com poucos cipós e espécie, e as mais abundantes são Sapotaceae). palmeiras. Entre as palmeiras a Guapira opposita Um sub-bosque muito denso, apenas indivíduos de Inajá (Nyctaginaceae) e o Bacuri com presença de Tiririca (Scleria (Attalea maripa – Arecaceae) e (Platonia insignis – Clusiaceae), sp. – Cyperaceae), Paspalum sp. pouca regeneração. Os poucos com intensa regeneração. (Poaceae) e outros, como cipós são principalmente dos Frutas na estrada Solanum sp. (Solanacae), Stylosanthes guianensis (Leg. Papilionoideae) e Wullfia baccata (Compositae). Os cipós são raros, sendo observados aqueles de áreas recentemente desmatadas, como espécies de Mandevilla sp. (Bignoniaceae). Apesar da devastação, as matas ciliares, as beiras dos igarapés, estão relativamente preservadas. Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 21
  • 22. 5.6 Comunidade Santo Antonio 5.7 Boa Vista do Muriá da Tijoca A capoeira chega a três décadas de regeneração, e está localizada a Observadas capoeiras de 20 anos. apenas 5 m do mangue. É área de preservação da comunidade e não é Seu relevo é plano, o solo é permitida a extração de madeira ou caça. O relevo é plano, o solo areno-argiloso, a camada de arenoso a areno-argiloso, e em algumas partes pedregoso. O sub- liteira apresenta, em média, de 1 bosque é limpo, com boa penetração de luz. A camada de liteira é a 3 cm. O sub-bosque não é muito espessa, e o dossel de 13 a 15 m, com emergentes de até 20 m. Entre as denso, com poucos cipós e ervas, há grande número de indivíduos de Heliconia psilostachya palmeiras. Entre as epífitas (Heliconiaceae) e Scleria sp. (Cyperaceae). Os cipós, apesar de não alguns indivíduos de Anthurium serem abundantes apresentam espécies como Bauhinia guianensis sp. (Araceae). Entre as palmeiras (Leg. Caesalpinioideae), Mandevilla sp. (Apocynaceae), Cipó-de-fogo a abundancia de Tucumã (Doliocarpus dentatus e Doliocarpus sp. – Dilleniaceae), Maripa sp. (Astrocaryum vulgare – (Convolvulaceae), Smilax sp. (Smilaceae) entre outras. Arecaceae), em grandes touceiras As poucas palmeiras são dos gêneros Bactris sp. (comum no sub- com até 10 indivíduos em cada bosque), Astrocaryum vulgare (tucumã). No dossel há uma ligeira uma, e intensa regeneração. predominância de Sucuúba (Himatantus sucuuba – Apocynaceae), Entre as ervas a Heliconia Tatapiririca (Tapirira guianensis – Anacardiaceae). As emergentes são a psilostachya, Scleria sp.; os cipós Sucuúba (Himatanthus sucuuba), alguns indivíduos de Tatapiririca e observados foram Memora Trattinickia burserifolia (Burseraceae), que atingiu aproximadamente magnifica (Bignoniaceae), Derris 25 m. Devido à proximidade do mangue foram observados indivíduos de utilis (Leguminosae Taperebá (Spondias monbim – Anacardiaceae). Papilonoideae) e Memora flavida (Bignoniaceae). O dossel é de 12 a 14 metros, sem dominância de espécie. As 5.8 Comunidade da Beira emergentes são Cecropia palmata Foi observada capoeira com 20 anos, proveniente de roça abandonada, (Cecropiaceae), Saboeiro em área de relevo plano, solo argilo-arenoso a argiloso. O sub-bosque é (Abarema jupunba – Leg. limpo, com boa penetração de luz. Há pouca ocorrência de epífitas, Mimosoideae), observaram-se cipós e de palmeiras. A camada de liteira é espessa. O dossel possui indivíduos de Xylopia sp. aproximadamente 17 m de altura, e as emergentes chegam a atingir (Annonaceae) embora não 25m. tenham sido inventariados. As ervas são pouco representadas, com a presença de Heliconia psylostachia (Heliconiaceae), Pariana sp. (Poaceae). Os cipós estão representados principalmente por Bauhinia guianensis (Leg. Caesalp.), Serjania sp. (Sapindaceae), Strychnos sp. (Loganiaceae) e Dioscorea sp. (Dioscoreaceae). No dossel, embora não haja predominância de determinada espécie, evidenciamos o Marupá (Simarouba amara – Simaroubaceae), a Sucuúba (Himatanthus sucuuba – Apocynaceae) e o Saboeiro (Abarema jupunba – Leg. Mimos). 22 Casa da Virada
  • 23. A flora em números Inicialmente foram listadas 173 espécies vegetais, representantes de 45 famílias botânicas. A partir de análises de similaridade florística, a lista de espécies caiu para 126. Destas, 37% são comuns aos dois ambientes, o das ilhas e o do continente. Um grupo de 43% apresenta ocorrência restrita às capoeiras continentais. Cerca de 20% das espécies são exclusivas das capoeiras insulares. As capoeiras continentais apresentam maior riqueza quantitativa, com 126 espécies. As capoeiras das ilhas apresentaram 94 espécies. Quase a metade das espécies (42%) corresponde a 5 famílias botânicas: Fabaceae (15,03%), Myrtaceae (8,67%), Annonaceae (6,36%), 5.9 Comunidade de Curuperé Trata-se de assentamento, vizinho à Reserva Extrativista, onde há grande capoeirão em terreno plano e solo de areia branca. O sub- Pesquisa de campo bosque é limpo, com boa penetração de luz. A camada de liteira é espessa, com pouca presença de cipós e dossel de 15 m, com emergentes com mais de 20 m. Entre as emergentes destacam-se As palmeiras compõem o sub-bosque e principalmente a Mumbaca a Sucuúba e o Marupá, além de (Astrocaryum gynacanthum – Arecaceae) e alguns indivíduos esparsos Croton matourensis de Bactris sp. Poucas ervas foram encontradas. O dossel não apresenta (Euphorbiaceae), o Saboeiro e predominância de determinada espécie, no entanto, estão presentes Sapium lanceolatum Andira retusa (Leg. Papil.), Guatteria poeppigiana (Annonaceae), (Euphorbiaceae). Algumas Thyrsodium paraensis (Anacardiaceae), Rinorea guianensis (Violaceae), espécies típicas de mata de terra Rollinia exsucca (Annonaceae). Todas espécies de mata de terra firme. de firme, como o Breu-de-leite Os cipós são Davilla kunthii (Dilleniaceae), Smilax sp. (Smilacaceae). (Thyrsodium paraensis – Há regeneração de espécies da mata de terra firme: Virola sebifera Anacardiaceae), Pouteria hirta (Myristicaceae), Saccoglotis guianensis (Humiriaceae), Andira retusa (Sapotaceae), Copaíba (Copaifera (Leg. Pap.). Embora haja indícios de extração de madeira, a área é bem sp.) e Eschweilera coriacea foram preservada. observadas com indivíduos juvenis e em regeneração. Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 23
  • 24. Para répteis e anfíbios foram recolhidos dados em ou de florestas de terra firme. Poucas espécies manguezais, margens de igarapés, capoeiras, migratórias, como maçaricos e gaivotas, foram florestas de terra firme e áreas savanóides das ilhas registradas, devido a época do trabalho, fora do de Fora, Ipomonga, Marinteua e Areuá. Mesmo em período de migração. áreas onde há comunidades (Ilha de Fora), o número Nos manguezais destacou-se o grande número de de espécies é de 74, sendo 18 espécies de anfíbios, Garças-brancas grandes (Ardea alba) e Garças- 15 de lagartos e 12 de serpentes. pequenas (Egretta thula). Em menor número, Pela primeira vez na microrregião, foram espécies como a Garça-maguari (Ardea cocoi), a encontradas 5 espécies de quelônios, 2 de hábitos Garça-azul (Egretta caerulea), a Garça-tricolor terrestres e 3 de hábitos aquáticos. A mais relevante (Egretta tricolor), e os Savacus (Nycticorax é a pequena população isolada de tartarugas sub- nycticorax e Nyctanassa violacea). O Guará áquaticas que vive em lagoas nas ilhas. A espécie (Eudocimus ruber) registrado ao longo dos está na lista de animais ameaçados de extinção manguezais diversas vezes, em grupos de 2 a 7 (Kinosternon scorpioides scorpioides). indivíduos. Trata-se de espécie relativamente Entre os anfíbios, houve a predominância de comum em Curuçá, o que indica a boa conservação espécies das famílias Hylidae e Leptodactylidae. do mangue. Entre os lagartos, a família com maior número de Quanto aos peixes, apesar de pescadores relatarem a espécies foi a Teiidae. Das 12 espécies de serpentes, ocorrência de pescados apresentando enfermidades, 6 foram da família Colubridae, 2 das famílias Biodae constatou-se que a região é relativamente íntegra e Elapidae e apenas 1 de cada família, Typhlopidae e ecologicamente. Nas amostras foi observada Viperidae. considerável inferioridade na proporção de Os manguezais e ilhas sã importantes habitats para indivíduos onívoros (que comem de tudo – insetos e aves migratórias. As áreas florestadas nas ilhas larvas, outros peixes, algas e vegetais) em relação merecem atenção especial por abrigar espécies carnívoros e herbívoros (que se alimentam de ameaçadas de extinção. Dois dos táxons registrados, plantas) e planctívoros (que se alimentam de algas e a Maracanã-verdadeira (Primolius maracana) e o pequenos invertebrados). João-teneném-castanho (Synallaxis rutilans - As amostragens indicam que nas águas interiores subespécie omissa), encontram-se na lista paraense (conhecidas como Maré) em Curuçá a fauna foi de espécies ameaçadas de extinção, a primeira como pouco alterada pela ação da pesca, apesar da ação vulnerável, e a segunda como em perigo. predatória de barcos pesqueiros industriais, mais É preciso formar lista mais completa, e realizar afora do estuário determinar a diminuição de melhor avaliação da importância dessas formações algumas espécies. vegetais para a avifauna local. Estudos sócio- A Reserva Extrativista é composta por comunidades econômicos e ambientais contribuem para avaliar o tradicionais de pescadores e agricultores, que impacto de ações predatórias como desmatamento utilizam práticas artesanais da pesca de ilegal, captura de filhotes etc. subsistência, sendo os caranguejos, siris e camarões Na região foram registradas 121 espécies de aves, de os recursos da carcinofauna mais importantes. 43 famílias. A maioria habita ambientes secundários Além de espécies que apresentam interesse 24 Casa da Virada
  • 25. econômico para os pescadores, foi observada fauna Foi observada em Curuperé pequenas fazendas de diversificada e abundante. Foram registradas mais de camarão marinho, cultivando Litopennaeus mil indivíduos distribuídos em 24 espécies. Um tipo vannamei, espécie exótica, originada do Pacífico. O de caranguejo coletado ainda não foi identificado, uso de espécies exóticas requer monitoramento pode tratar-se de uma nova ocorrência para a região, redobrado, pois trazem riscos de enfermidades e ou mesmo espécie nova, por isso foi enviado para competição por alimento e espaço com as espécies análise de especialista. nativas. Não foi coletado nenhum indivíduo dessa Foi observada a presença da espécie exótica de espécie nas diversas áreas do levantamento. camarão Macrobrachium rosenbergii, conhecido Pescadores relatam que houve captura desses como Gigante-da-Malásia. Esse registro requer camarões com as espécies nativas. A região monitoramento, pois segundo ribeirinhos, esse apresenta condições favoráveis para a aquicultura, camarão não é cultivado na região há algum tempo, desde que aplicadas boas práticas de manejo e haja indicando risco de reprodução e colonização do restrição ao uso de espécies exóticas. ambiente natural. Pescada-amarela (Cynoscion acoupa) Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 25
  • 26. Nazaré do Mocajuba, Lauro Sodré (Gastrópodes e Bivalves), não moluscos, ainda possuem outro e Arapiranga de Dentro têm um encontradas em outras fator favorável, uma vez que não grande potencial para cultivo e localidades de Curuçá, o que lançam esgotos nos rios, extrativismo comercial de ostras indica necessidade de fundamental na medida que para nativas, de maneira sustentável. conservação dos habitats destas o crescimento dos moluscos, Estas possuem grande diversidade espécies. Além de serem biofiltradores, não devem existir de espécies de moluscos excelentes para o cultivo desses fontes de poluição da água. Banco natural de ostras e mexilhões 26 Casa da Virada
  • 27. O crescimento da população de Curuçá e as mudanças em relação ao uso de recursos naturais, causam transformações na conservação da biodiversidade. Segundo as pesquisas do Museu Goeldi foi possível propor indicadores relacionados à biodiversidade, à pesca, à agricultura, aos conflitos sociais, à infra- estrutura, à saúde e ao saneamento básico. 7.1 Biosocio-indicadores e de outros estados, o que gera para consumo local ou venda. 7.1.1 Socioambiental conflitos. A pesca de subsistência Neste contexto, a preservação dos está em decadência e as manguezais é vital para a A percepção das comunidades em comunidades, crescentemente, manutenção de diversas espécies, relação à RESEX é muito alimentam-se de outras proteínas assim como, para assegurar superficial e tênue. Inexiste animais, como carne de frango e recursos pesqueiros. A maior consciência coletiva sobre a bovina. organização das comunidades em importância dessa unidade de conservação como área a Entre os desafios para melhorar a proteger, e como fator para a disponibilidade de estoques melhoria de condições de vida. sustentáveis de recursos Pescadores da maré Plantio de açaí pesqueiros estão a educação 7.1.2 Pesca acordos de pesca apresenta-se ambiental, a valorização dos Ano a ano aumentam as saberes populares, o como essencial e urgente para a dificuldades em encontrar fortalecimento das organizações sustentabilidade da RESEX. pescado. Cada vez é necessário sociais e o desenvolvimento 7.1.3 Agricultura dedicar maior tempo e esforços tecnológico e científico da Há restrições no uso das terras, para que a pesca resulte atividade. uma vez que sua maior parte satisfatória. Além das entidades Por diversas ocasiões constatou- encontra-se no entorno de uma de classe não abrangerem o se que a mera adoção de práticas unidade de conservação, a universo de pescadores locais, simples de manejo poderiam Reserva Extrativista. No entanto, estes sofrem a concorrência de significar, em curto prazo, maior como não há plano de manejo e a pescadores de outros municípios, oferta de proteínas animais, seja orientação pública é insuficiente, Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 27
  • 28. os danos aos solos, aos recursos hídricos e à vegetação prosseguem. A produção de subsistência, especialmente de mandioca, indica a necessidade buscar meios sustentáveis desta cultura para maior produtividade e geração de renda. 7.1.4 Conflitos sociais Uma das principais causas de conflito é a presença de pescadores de outras comunidades e municípios. O processo de Agenda 21 demonstrou como é baixa a participação da população nos processos municipais de decisão política. A questão fundiária é outra fonte de conflitos sociais, haja vista que a maioria dos terrenos não possui documentação, o que, sabe-se, é determinante para o desenvolvimento agrícola. 7.1.5 Infra-estrutura A precariedade do sistema viário e a falta de transporte público regular estão entre as principais reivindicações das comunidades. Com dificuldades de circulação, as comunidades encontram-se isoladas, prejudicando o acesso à educação, sistema de saúde, e o atendimento às necessidades básicas por serviços para os moradores das comunidades. 7.1.6 Saúde e Saneamento Básico Entre as principais causas de doenças estão aquelas relacionadas à qualidade da água, na medida que diversas comunidades não contam com abastecimento regular de água. A maior parte das comunidades está distante dos serviços de saúde pública. A maior parte dos postos de saúde não são equipados e, muitas vezes, nem mesmo funcionam. A coleta de lixo é insuficiente, o que resulta em acumulo de lixo, que é carreado para cursos d’água, atraindo vetores de doenças, como mosquitos, moscas, roedores e urubus. 7.2 Indicadores de ameaça à biodiversidade Florestas dominadas por Bacuris (Platonia insignis); invasão de espécies exóticas de crustáceos e moluscos; e redução de populações de aves, anfíbios, répteis; estão entre os principais indicadores de que a biodiversidade do município de Curuçá está ameaçada. Daí ser fundamental um conjunto de medidas e o acompanhamento da conservação da biodiversidade local, especialmente faunística. 28 Casa da Virada
  • 29. 7.2.1 Desmatamento - Flora e vegetação À exceção de manguezais e de alguns ambientes de ilhas mais isoladas, a flora e a vegetação da área foram completamente alteradas pelo homem (ação antrópica) através da agricultura de subsistência de corte-e-queima. Esta prática torna os solos degradados em curto espaço de tempo, especialmente devido a solos tropicais de baixa fertilidade. 7.2.2 Caranguejos A extração de caranguejo é realizada de maneira artesanal por diversas comunidades do entorno da Reserva Extrativista. Em São João do Abade destaca-se como local de comercialização de caranguejos, para onde, inclusive, barcos de outros municípios e comunidades vizinhas se dirigem. Alguns fatores interferem diretamente na rotina dos pescadores artesanais da RESEX: os conflitos por pontos de coleta de caranguejos; o uso de técnicas predatórias de catação; a concorrência com a pesca industrial e a retirada ilegal de caranguejos por pessoas de outras localidades, especialmente de São Caetano de Odivelas. Assim, é de suma importância o maior conhecimento do potencial faunístico da região. 7.2.3 Camarão A exploração de camarões de água doce e marinhos nas áreas estuarinas são pontos críticos a considerar com reserva. Neste ambiente os camarões marinhos são pequenos, pois geralmente são juvenis que migraram do mar para crescerem e posteriormente retornarem ao ambiente marinho. Os camarões de água doce geralmente são adultos que se deslocaram para áreas com água salobra, para a reprodução. Os crescentes conflitos por pontos de pesca causam significativos impactos ambientais. Outra ameaça às espécies nativas é o registro dos camarões exóticos: o Gigante-da-Malásia (M. rosenbergii) e o Camarão-Cinza (Litopennaeus vannamei). O Gigante-da -Malásia é territorial e predador, competindo por espaço e alimento. Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 29
  • 30. Provavelmente, esses camarões escaparam de viveiros de criação. A sua fecundidade é alta em relação às espécies nativas, reproduz-se em água salobra, e as condições de seu habitat de origem são similares às da RESEX, representando risco de colonização de espécie exótica. L. vannamei apresenta dois importantes possíveis focos de conflito: as enfermidades atribuídas à presença desses animais em outros ecossistemas, e há casos no nordeste brasileiro; e o uso de produtos químicos na despesca de fazendas de camarão (metabissulfito de sódio). Esse provoca redução brusca, porém passageira, do oxigênio dissolvido da água, o que poderia gerar grande mortalidade de peixes e crustáceos. São necessárias ações educativas com aqueles dedicados ao cultivo de espécies aquáticas para empregadas as boas práticas de manejo. 7.2.4 Moluscos A diversidade e abundância de moluscos está diretamente relacionada aos diferentes habitats da Resex. Entre as principais ameaças à sustentabilidade de determinados grupos está a introdução de espécies exóticas de moluscos, crustáceos e peixes de áreas de criatórios ou introduzidos acidentalmente. A criação de ostras e mexilhões sem acompanhamento técnico pode causar a proliferação de predadores, causando a exaustão da base de recursos alimentícios. 7.2.5 Peixes As entrevistas com 34 pescadores artesanais apontam que a quantidade do pescado está diminuindo. A Tainha (Mugil curema) é cada vez menos encontrada, seguida pelo Mero, a Pescada-amarela (Cynoscion acoupa), a Gurijuba e diversas espécies de Cação. Os pescadores, tanto da área urbana de Curuçá, como do Abade relatam a presença de enfermidades no pescado (ocorrência de desvios de coluna de peixes mugilídeos, como a Tainha, Pratiqueira (Mugil incilis) e Pescada-gó (Macrodon ancylodon). Relatam, igualmente, parasitas na Pescada-amarela e em Pacamuns (Batrachoides surinamensis), comuns nas espécies e que não 30 Casa da Virada
  • 31. comprometem a saúde dos peixes. Como técnicas de pesca, a maioria dos pescadores usam redes de malha entre 25 a 40 mm. A estação chuvosa é a mais abundante e a mais produtiva. Nesse período a Tainha e a Pratiqueira são as mais frequentes, seguidas pela Pescada- gó e por grandes bagres balizadores, a Dourada e Piramutaba. 7.2.6 Anfíbios e répteis A diversidade da fauna de anfíbios e répteis é pequena, como regra na zona costeira. A salinidade limita esses grupos a algumas espécies adaptadas. As lagoas e igarapés são de vital importância nos ciclos de vida da maioria de anfíbios e répteis. A degradação da maioria das cabeceiras de igarapés e matas ciliares é a mais séria ameaça para anfíbios e répteis. 7.2.7 Tartarugas (quelônios) Nas áreas costeiras e de influência de marés, existe preocupante impacto sobre tartarugas marinhas. Foram registradas 5 espécies. A Chelonoidis carbonaria e a C. denticulata são de hábitos terrestres. Três espécies são de hábitos aquáticos, 2 de água doce, a Rhinoclemmys punctularia e a Kinosternon scorpioides; e 1 Marinha, a Lepidochelys olivacea. Alterações nestes ambientes são responsáveis pela destruição ou modificação de sítios de desova e áreas de alimentação. A captura acidental por equipamentos pesqueiros também causa danos. Moradores de Mutucal contam sobre capturas ocasionais em currais de praia de exemplares de L. olivacea. É de vital importância maior esforço para determinar a conservação das praias como sítios de reprodução de tartarugas marinhas. Do grupo de quelônios Kinosternon scorpioides representou a espécie mais abundante, e provavelmente corresponda ao principal predador de girinos e adultos de Hypsiboas, Leptodactylus, Physalemus e Rhinella em lagoas das ilhas. Especialmente, na lagoa da Campina, na Ilha das Pedras Grandes, onde esta espécie foi o único predador noturno observado, com registros de 8 indivíduos de várias classes Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 31
  • 32. etárias. Deve-se ter especial atenção ao quelônio Espadarte, que se cogitou nos anos 1980, para ser o muçuã visto tratar-se de população rara e isolada, porto de Carajás, e para o qual o Ministério do Meio podendo ter atributos genéticos diferenciados por Ambiente apresentou os termos de referência do EIA- estar tão próximo de região salina. RIMA por solicitação de grupo privado; o segundo é a 7.2.8 Aves iniciativa de porto flutuante, pelo empresa Anglo- American (Companhia Minerais e Metálicos S.A - Foram observados diversos locais de retirada de MMX), para servir como porto da mineração de ferro madeira na região das ilhas e nos povoados, que da Serra do Navio, no Amapá. comprometem a avifauna no local (locais de nidificação, pouso, alimentação etc.). Outra ameaça Ambas propostas representam impacto ambiental e é a captura de filhotes, como de Papagaios e social. Do ponto de vista ambiental, quaisquer Maracanãs, como animal doméstico e para a estruturas representam riscos. A passagem de grande comercialização ilegal. No período entre setembro e volume de embarcações alteraria as condições janeiro, essas espécies migram em grande naturais de turbidez, luminosidade e outros fatores quantidade para a Ilha de Fora para reprodução. Em das águas doce e salgada e, riscos de derramamento ilhas como a de Ipomonga, onde ainda existem matas de óleo e outros produtos, além da contaminação primárias de terra firme, foram encontradas espécies por flora e fauna exóticos trazidos nas águas de características de florestas, como duas espécies de lastro. Tucano (Ramphastos tucanos e R. vitellinus), e o Do ponto de vista social, empreendimentos de porte Capitão-de-saíra-amarelo (Attila spadiceus). resultam em aumento populacional descontrolado, Na Ilha de Fora, foram registradas espécies c de risco social para grupos menos protegidos (crianças, floresta de terra firme, como os Tucanos, o Gavião- jovens, mulheres, idosos etc.), invasões, enfim, a relógio (Micrastur semitorquatus), o desestruturação social e colapso dos já exauridos Macuru-de-pescoço-branco (Notharchus manguezais, acirrando a disputa por acesso a hyperrhynchus), a Galinha-do-mato (Formicarius recursos naturais. Estes riscos merecem estudos colma) e a Choca-lisa (Thamnophilus aethiops). profundos e o acompanhamento da população local. 7.3 Porto Uma das grandes ameaças à biodiversidade da região são os dois empreendimentos portuários projetados para a Ponta da Tijoca, na ilha da Romana. A região é de grande interesse pois a uma milha náutica da costa, em frente a Romana, há uma profundidade estável de 25 m, sem necessidade de dragagem, em águas r calmas, o que garantiria o acesso a embarcações Cape Size (que não passam no Canal (Cape) do Panamá), com capacidade de carga superior a 200 mil toneladas, ideal para o transporte de minério de ferro. O primeiro é o Terminal Marítimo Off-shore do 32 Casa da Virada
  • 33. É crítico o estado de degradação dos ambientes Murajá. Pelos rios foram percorridos trechos dos rios naturais da região relacionados às micro-bacias Muriá, Mocajuba, Curuçá e Araquaim. Foram hidrográficas que demandam o complexo flúvio- observados os eventos de impactos que se seguem. marinho. Os desmatamentos, especialmente de Ao longo do Rio Muriá, exceto nas confluências com matas ciliares, as queimadas anuais para a os Rios Mocajuba e Curuçá, foram observadas faixas preparação de áreas agrícolas, resultam no aumento estreitas de mangue, com vegetação secundária ao progressivo de erosão de solos, e consequente fundo. Estes mangues se caracterizam por vegetação assoreamentos de corpos d’água. Isto pode ser mais baixa, quando comparada a áreas mais observado pelo crescente número de currais no meio extensas do Rio Mocajuba. É na transição do dos rios, algo inconcebível há algumas décadas. Os mangue para a vegetação secundária e áreas de uso pescadores, sem compreender a situação, reputam que se localizam a maioria das vilas. aos currais a destruição, no entanto, estes só são O mangue pode parecer um local sem condições de fincados em novos areais pois areia foi carreada para habitação, mas não é isto que está ocorrendo. As o leito dos rios. vilas expandem-se em direção aos manguezais. A A estes fatores acresce-se a ocupação irregular de expansão da Vila de Abade relaciona-se à áreas protegidas por lei – manguezais, dunas e proximidade da área urbana de Curuçá, com acesso restingas – alteradas, de maneira irreversível para a por asfalto. A expansão do Abade, com 5 mil expansão viária e urbano, e para garantir mais habitantes, desloca-se em direção ao mangue à espaço a pastagens e áreas agrícolas. margem do Rio Grande. Também foram observadas Por terra foram visitadas as vilas de Curuperé, Boa em áreas de mangue residências isoladas, barracas Vista do Muriá, Abade, Lauro Sodré, Santo Antônio de pescadores, criadouros de camarão e fazendas de do Tijoca, Nazaré do Tijoca, Água Boa, Candeua e pecuária com pastagens artificiais. Mapas das principais Micro-Bacias Hidrográficas Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 33
  • 34. O Salgado Paraense é uma das torna-se mais dificil, compatíveis a florestas em áreas mais antigas sob pressão de especialmente no verão regeneração) seria possível ocupação e uso intensivo do solo amazônico. A disponibilidade de recuperar as paisagens e buscar na Amazônia. Este processo de proteínas animais da caça e pesca novo equilíbrio ambiental. quase dois séculos, resulta em escasseiam e, mesmo a água para Nas áreas de vegetação depauperamento do solo e perda a agricultura e pecuária sofrem secundária há espécies de uso de diversidade biológica. Da restrições severas. madeireiro como o Cumarú cobertura vegetal original restam Essas áreas apresentam (Dipteryx odorata), o Marupá menos de 10%, fragmentados em vegetação secundária, onde (Simarouba amara), a Sucupira- pequenas manchas de terra firme, ocorrem, espécies frutíferas como preta (Diplotropis purpurea), o bosques de mangues e vegetação o Bacuri (indicador de Paricarana (Stryphnodendron não florestais como restingas e degeneração do solo), o pulcherrimum), o Morototó campos. Taperebá, o Muruci e o Tucumã (Shefflera morototoni) que O solo das agrovilas de Curuçá e (como outras palmeiras, poderão ser priorizadas em de algumas ilhas igualmente altamente resistente ao fogo e programas de repovoamento. sofreram, processos de corte-e- secas). Se estas capoeiras fossem Estas contribuem, ainda, para a queima relacionados à agricultura bem manejadas para a geração de manutenção do fluxo gênico de subsistência. Isso eliminou as renda (produção de madeira, destas espécies, evitando-se a coberturas vegetais de floresta carvão, caça, frutas, etc. sua extinção local. primárias, resultando em Pesquisadores em área degradada ambiente comprometido em suas funções ecológicas. Destarte, as florestas perderam um de seus papéis, o de refúgio e lugar de procriação de animais silvestres. Da mesma maneira, a maior parte das nascentes e igarapés foram alterados de maneira definitiva, agravado pela derrubada das florestas de galeria (matas ciliares). Se a cobertura vegetal não for recomposta as nascentes tendem a diminuir, tornando-se intermitentes durante a seca, e chegando, inclusive, como ocorre em muitos casos, a se extinguir. Esses fatores modificam a qualidade de vida das comunidades. O acesso à água 34 Casa da Virada
  • 35. Alguns indicadores de impactos inadequado de seus recursos sustentabilidade da costa demonstram que a costa e, em naturais ambientais. atlântica paraense estaria particular, ambientes mais É preciso estruturar medidas de definitivamente comprometida, sensíveis – manguezais e correção e vigilância ambiental tornando-a uma costa estéril e restingas – estariam sofrendo para esta região, sob pena da um mar vazio. profundas e indesejáveis degradação ambiental alcançar modificações, devido ao uso níveis além dos quais a Nascente de um curso d´água Uma experiência de intervenção socioambiental no Salgado Paraense 35