4. Quem a visitasse não encontrava rochas árvores rios pássaros grutas animais
5. Mas, afinal, de que ilha estamos a falar? Encontrava somente o vazio de tudo isso, mas sob a forma de uma massa sonora que encantava quem se aventurasse naquelas estranhas paragens.
6. Estamos a falar de uma ilha toda feita de palavras que eram a única riqueza e a verdadeira razão de existir daquela ilha perdida no mar imenso das coisas que ainda estão por descobrir.
7. e dos livros de Geografia fui à procura dos Atlas Quando me falaram da ilha das palavras
15. Ao longo dos séculos passaram por esta ilha pessoas de todas as origens geográficas Portugueses Ingleses Vikings Holandeses Espanhóis
16. Finalmente, surgiu uma pista... disseram-me que durante o sono ficaria a saber a localização da Ilha das Palavras.
17. Nessa noite deitei-me cedo, mas com a ansiedade não conseguia adormecer. Quando já dormia recebi a visita dos papagaios, que, em sonhos,
18. desenrolaram um velho mapa com o bico e finalmente indicaram a localização da misteriosa ilha.
19. ...perdi a bagagem, apanhei umas febres estranhas e por último as viagens marítimas para aquela zona foram todas canceladas. Como tenho boa memória, quando acordei recontruí o mapa. Pensei que seria fácil chegar à Ilha, mas surgiram-me alguns imprevistos...
20. Vi-me assim forçado a contratar um pescador que me levasse até ao destino chamado À Luz das Estrelas, no idioma daquela terra distante. no seu pequeno barco Quando chegámos ao sítio onde a Ilha estava localizada....
21. o céu escureceu de repente e fomos sobrevoados por um bando de papagaios. Era como se a noite tivesse caído a meio do dia O que aconteceu a seguir não me lembro! e as aves exóticas nos viessem servir de guias.
22. Só me lembro de estar, já sem o pescador, num lugar estranho onde nada parecia ter a consistência das coisas materiais. No entanto, ouviam-se vozes que pronunciavam em várias línguas as mais estranhas e belas palavras que eu já tinha ouvido. Estava enfeitiçado por aquele conjunto de palavras que tinham o poder mágico de dar forma e consistência a tudo aquilo que chamavam.
23. Se diziam "montanha", eu via-me cercado por montes de picos muito altos e luminosos que se perdiam no meio das nuvens.
24. Não me restavam dúvidas eu estava no coração da Ilha das Palavras! Que não me tinha saído do espírito durante mais de dois anos de incessante pesquisa. Mas, o mais fantástico é que tudo o que eu ali via me parecia estranhamente familiar, dando-me uma sensação de segurança e de proximidade que não consigo explicar.
25. Quando uma voz pronunciou a palavra "livro", logo a ilha se encheu de livros de todas as cores e tamanhos. Mas o mais surpreendente, é que todos traziam os seus autores, uns famosos e há muito desaparecidos e outros muito jovens e ainda em busca do seu lugar no mundo das palavras impressas.
26. Não era uma ilha igual às outras porque era imaterial e intensamente sonora. Ganhava uma beleza estonteante quando as palavras que pairavam no ar faziam parte de poemas que eu conhecia. Deambulando pela ilha sem sentir fome, ou cansaço, cruzei-me com escritores vivos e mortos que conhecia das páginas dos jornais e dos livros.
27. Quando senti fome e sede pronunciei os nomes daquilo que me apetecia comer e beber e logo as palavras soletradas se tranformaram em apetitosos alimentos. Enquanto comia vi poetas como Luís de Camões, Alexandre O,Neill, Cesário Verde e Sophia de Mello Brayner a conversar com as ondas do mar. Tudo o que ali acontecia começava e acabava nas palavras que eram a alma e a matéria de que a ilha era feita.
28. Quando anoiteceu o sono acabou por me vencer. Entrei no território do sonho com a cabeça recheada de palavras e confesso que nunca adormeci tão feliz.
29. Durante o sono recebi a visita do papagaio do meu amigo, que me perguntou se tinha gostado da revelação que ele me fez. Respondi que sim e perguntei-lhe o que lhe poderia dar como forma de agradecimento. Ele respondeu-me que não teria de lhe dar absolutamente nada. Quando acordei, vi a minha cama rodeada de livros com palavras escritas em muitas línguas. Estavam ali como por encanto e debaixo deles estava o mapa que me tinha levado até à Ilha das Palavras.
30. Como este é um assunto de que é difícil falar sem ser chamado de louco, decidi passar esta história para o papel, mas sem lhe juntar o mapa que me permitiu chegar a um sítio tão longínquo e mágico. Tornei-me poeta depois dessa viagem e nunca mais deixei de o ser!
31. arranjo um barco e faço-me ao mar, na esperança de voltar a encontrar essa ilha que é diferente de todas as outras ilhas Agora, quando me faltarem as palavras de que preciso para nomear as coisas e os sentimentos que verdadeiramente interessam na vida das pessoas para que tudo volte de novo a ser possível, até a nossa felicidade.
33. Ser Poeta Ser poeta é ser mais alto, é ser maior Do que os homens! Morder como quem beija! É ser mendigo e dar como quem seja Rei do Reino de Aquém e de Além Dor! É ter de mil desejos o esplendor. E não saber sequer que se deseja! É ter cá dentro um astro que flameja. É ter garras e asas de condor! É ter fome, é ter sede de Infinito! Por elmo, as manhãs de oiro e de cetim...É condensar o mundo num só grito! E é amar-te, assim, perdidamente...É seres alma, e sangue, e vida em mim. E dizê-lo cantando a toda a gente! Florbela Espanca
34. Uma ilha é uma porção de terra rodeada de água por todos os lados.