3. Ofimdaprivacidade AViaVerdeeoschipsantirroubo registam via
gens os cartões de cré
dito e de fidelização ca
dastram compras os
servidores de correio ele
trónico os motores de busca e as redes so
ciais monitorizam comunicações pági
nas visitadas preferências e contactos
E os smartphones além de assinalarem
chamadas devoz emensagens escritas dão
a nossalocalização exata em tempo real
Portanto para assegurar totalmente a
privacidade teríamos de no mínimo evi
tar as estradas SCUT fazer compras ape
nas em dinheiro desligar a internet e usar
um telemóvel obsoleto e com um cartão
pré pago Mas mesmo assim não escapa
ríamos à monitorização estatal dos rendi
mentos compras propriedades e até da
dos médicos e medicações prescritas pelo
Serviço Nacional de Saúde
Por isso a resposta simples e imedia
ta à pergunta da página anterior parece
ser só uma não A não ser que tenhamos
conhecimentos próximos do nível de um
pirata informático ou estejamos dispostos
a abdicar de várias comodidades do sécu
lo XXI já não é possível manter algum ano
nimato Navegando um pouco mais longe
será então correto dizer que a privacida
de morreu definitivamente Aí a respos
tajáé diferente não necessariamente Na
verdade até existe privacidade neste nem
sempre admirável novo mundo digital Só
que na aldeia global onde agora vivemos
o conceito já não é o que era Mas a culpa
é mais das pessoas do que da tecnologia
«Não há como negar que o conceito de
privacidade estáem mutação» diz Fátima
Abreu Ferreira psicóloga e investigado
ra da Universidade do Minho «O desen
volvimento das novas tecnologias trouxe
imensos benefícios mas para nos inscre
vermos nesses serviços temos de abdicar
de certos dados como o nome o telefone
ou a nossa localização geográfica »É
preço que pagamos para usar as inovado
ras aplicações cibernéticas
Além desses dados há todo um outro
conjunto de informações que voluntá
ria ou involuntariamente cedemos Por
exemplo se enviarmos alguns e mails
com a palavra «Amesterdão» ou pesqui
sarmos por esta cidade num motor debus
ca é quase certo que veremos nas nossas
navegações posteriores cada vez mais
anúncios relacionados com a cidade ho
landesa Isto acontece porque ao criar
contas de e mail ou numa rede social au
torizamos os prestadores desses serviços a
recolherem todas as informações quejul
guem relevantes incluindo as comunica
ções privadas Estes dados são depois pro
cessados por algoritmos que encaminham
anúncios específicos para os destinatários
que revelaram potencial de ser seduzidos
por eles
ESTE É O VERDADEIRO E GRANDE
negócio dos motores de busca o arma
zenamento on linedeficheiros servidores de
correioeletrónicoeredessociais «Osserviços
são grátis mas as empresas não são
beneméritas Ganham milhões com as
informações queaspessoascolocamnassuas
redes» diz Clara Guerra porta voz da
Comissão Nacional de Proteção dos Dados
CNPD
No mundo digital também não há al
moços grátis e as nossas informações são
a contrapartida Porém a conta final não
parece assustar os utilizadores «Quando
aderem as pessoas dão um consentimen
to Consideram que não estar numa rede
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4. social tem consequências negativas supe
riores do que ceder alguma da sua privaci
dade» diz Paulo MotaPinto Para o ex juiz
conselheiro do Tribunal Constitucional
estacedência é «mais um fenómeno socio
lógico do que uma questão de direito»
Todavia nem sempre esse consentimen
to é feito como manda a lei «Em alguns
casos as empresas não pedem autoriza
ção e dão informação pouco transparen
te» diz Clara Guerra «Além disso há ter
mos econdições que não respeitam alegis
lação porque incluem cláusulas abusivas
e são feitos para desincentivar a leitura
A lei diz ainda que os dados devem ser re
colhidos para fins específicos e legítimos
e que as empresas devem reter apenas as
informações adequadas e pertinentes pa
ra esse fim e não as ceder a terceiros sem
consentimento Mas na prática «muitas
empresas não são eompletamente trans
parentes nem dizem o que fazem com os
dados a que têm acesso»
MESMO ASSIM PARA A MAIORIA
das pessoas especialmente para os mais
jovens estarforado mundo digital nãoé uma
hipótese «Paraeles asredessociaiseadispo
nibilização de conteúdos são ferramentas
quotidianas naturais Tudo acontece online
e o importante éfazerparte do grupo mesmo
correndoalgunsriscos» explicaFátimaAbreu
Ferreira queestáaterminarumdoutoramen
to em Psicologia da Justiça na Universidade
doMinhocomotema «Vitimizaçãoonline os
riscos deviverna era digital»
Até há vinte anos convivia se à volta
da mesa do café Hoje graças à internet
e à revolução digital a mesa alargou se
aos quatro cantos do mundo No fundo
é a concretização prática da aldeia global
prevista em 1963 pelo sociólogo canadia
no Marshall McLuhan no livro A Galá
xia Gutenberg
Como seria de esperar este novo plano
comunicacional levou a uma explosão da
partilha tanto em quantidade como em
qualidade Para se ter uma ideia o Face
book tem atualmente 1 55 mil milhões de
utilizadores ativos c a media de conexões
diárias em setembro foi de 1 01 mil milhões
de utilizadores ou seja umaem cada sete
pessoas de todo o mundo Outro dado im
pressionante diariamente são publicadas
80 milhões de fotografias no Instagram a
famosa rede de partilha de imagens com
400 milhões de utilizadores ativos
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5. Para muitos a começar nos gurus das
redes sociais a reserva davida privada pa
rece não ter lugar nesta aldeia global «Se
tem alguma coisa que não quer que se sai
ba talvez não devesse estar afazê la» dis
se em 2009 numa entrevista à CNBC
Eric Schmidt atual presidente executivo
daAlphabetlnc a empresa mãe da Goo
gle O criador do Facebook também não
parece valorizar a privacidade pelo con
trário Mathias Dopfner CEO do grupo
alemão de media Alex Springer escreveu
numa carta aberta em abril de 2014 que «a
única frase ainda mais preocupante que a
de Shcmidt é uma de Mark Zuckerberg»
dita numa conferência em que os três esti
verampresentes Segundo Dopfner quando
questionado sobre que garantias de confi
dencialidade e proteção dos dados podia
oferecer aos utilizadores dasuarede social
o fundador do Facebook respondeu «Não
percebo a sua pergunta Se não tem nada a
esconder não tem nada a temer
Nuno Ribeiro diretor regional para
Portugal do Institut Fabernovel também
não vê grande mal na partilha de dados
com as empresas desde que haja respon
sabilidade «Acredito que cause alguma
preocupação para quem tenha segredos
A mim não me choca Esses dados são im
portantíssimos para a empresa conhecer
ao máximo o cliente e desenhar ou melho
rar os seus produtos experiências e ser
viços » Mas o especialista emcultura
gital considera que as empresas deveriam
sempre partilhar o que estão a guardar e
sabem de cada consumidor «É desejável
que haja transparência e que eu saiba o
que eles sabem de mim
Os jovens também encaram a partilha
como normal «Para a geração digital as
plataformas públicas são extensões de as
petos privados» diz FátimaAbreu Ferrei
ra Não se pense no entanto que os ado
lescentes não têm nenhuma noção de pri
vacidade Eles conhecem o conceito mas
orientam no conforme as suas priorida
des «Sabem manobrar o perfil e criar
páginas falsas para se protegerem Mas
fazem no principalmente para garantir
privacidade dos pais e dos educadores»
explica a investigadora
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6. À medida que vamos navegando na in
ternet vamos produzindo um enorme con
junto de conteúdos e deixamos ativa ou
passivamente um rasto de informações
Graças à evolução tecnológica esta «pega
da digital» assume se cadavez mais como
ilimitada e eterna Este potencial infinito
parece escapar à maioria dos internautas
«Muitos não têm consciência da conser
vação da informação A rede não esquece
mas muitos só o percebem a posteriori»
diz Paulo Mota Pinto
Normalmente as redes sociais e presta
dores de serviços permitem fazer um opt
out ou seja apagar das bases de dados to
dos os registos de determinado utilizador
E existem mecanismos judiciais para rea
gir contra o uso indevido ou a publicação
abusiva de fotografias e informações Mas
«as pessoas não dão muito valor a isso e só
em casos extremos é que os utilizam» ga
rante Paulo Mota Pinto
«A MAIOR PARTE DOS JOVENS SABE
que está a correr um risco antecipado ao
efetuar uma partilha mas não estão
conscientes da sua grandeza» diz a
investigadora Fátima Abreu Ferreira E é
mais grave quando ainda estão a construir
se como pessoas Ou seja podem estar a
cristalizarnainternetvalores que secalhar
vão rejeitar pouco tempo depois Mas a
pegada ficou e isso pode prejudicá los por
exemplo em termos de empregabilidade
Além disso mesmo num grupo fechado de
umarede social existe ahipótesedeinvasão
cópiae apropriação indevida E umavez na
rede mesmo que sejam rapidamente
apagados «há sempre a possibilidade de os
conteúdos voltarem a aparecer» diz Clara
Guerra da CNPD «Ainternettem memória
de elefante
É precisamente esta memória ilimitada
que tem levado ao crescimento e ao refi
namento das bases de dados Hoje as em
presas e os Estados já têm acesso a uma
quantidade de informação que caso fos
se impressa em papel daria para encher
milhares e milhares de Torres do Tombo
São arquivos que não param de crescer
porque a recolha de dados até pode estar
a abrandar mas não vai parar e está cada
vez mais inteligente «Estamos a passar
da era de big data para a de smart data
Da recolha do máximo de informação pa
ra a recolha seletiva e a análise apenas das
três ou quatro variáveis mais importantes
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7. para a tomada das decisões» explica Nu
no Ribeiro Mas com aplicações cada vez
mais inteligentes e diversificadas «há
cada vez mais dados e cada vez mais ín
timos» E com consequências imprevis
tas Por exemplo se uma seguradora tiver
acesso aos dados de uma aplicação de tele
móvel que mede o batimento cardíaco do
utilizador pode calcular se ele é um po
tencial cliente de risco e recusá lo O mes
mo sucederá caso inspecione o histórico
da internet de um proponente e veja que
ele consulta muitos sites sobre hiperten
são ou outra doença grave
Graças ao avanço vertiginoso da tecno
logia otratamento dos dados assume uma
dimensão que pensaríamos só serpossível
no domínio da ficção científica Anteci
par padrões de consumo ou de comporta
mento perante a utilização de sites ou fer
ramentas pode já não ser uma realidade
tão distante E o mesmo se aplica aos soft
wares de reconhecimento facial que estão
cadavez mais apurados «Permitem correr
todaa internet numaprocuratransversal
e agregar asinformações em torno de uma
cara» diz a porta voz da CNPD Ou seja
bastaalguémpublicarumafotografiaonde
apareçamos mesmo que em segundo pla
no e sem o nosso consentimento para as
informações que ela traz ficarem agrega
das a um único perfil podendo ligar per
fis profissionais pessoais e anónimos Ou
seja apartirdaquelafotografiadafestade
Natal da empresa que alguém publicará
no Facebook por estes dias é possível que
outros fiquem a saber onde trabalhamos
sefor num restaurante ondevamos almo
çar se for em grupo com quem nos damos
e por aí em diante «São uma minapara as
empresas privadas e mais ainda para as
autoridades policiais» diz Clara Guerra
E certo que estasferramentas serão muito
úteis para por exemplo apanhar um cri
minoso em fuga mas com a desculpa do
combate ao terrorismo ou ao crime eco
nómico também podem ser usadas para
uma vigilância maciça dos cidadãos
QUASE TODOS OS ESPECIALISTAS
e analistas concordam que a informação é a
mercadoria mais valiosa do século XXI
Porém mais importante ainda do que o seu
potencial económico esta capacidade de
recolha e tratamento de dados confere aos
Estados uma ascendência quase ilimitada
sobre os cidadãos Convém por isso ques
tionar o que poderá acontecer caso ela caia
nas mãos erradas É que as bases médicas
informatizadas teriam dado imensojeito às
teorias da pureza daraçae da eugenia nazis
Paulo Mota Pinto reconhece que há Es
tados que «utilizam estas ferramentas no
limite da ilicitude como meio de vigilân
cia» mas prefere não comentar mais es
te tópico por ser membro do Conselho de
Fiscalização do Sistema de Informações
da República Portuguesa Já Clara Guer
ra garante que «em Portugal não se veri
fica uma vigilância maciça por parte dos
serviços secretos»
O problema é que vigora a globalização
dos serviços das comunicações e da eco
nomia «Se umaempresa nãoestánonosso
território não podemos impedi lade ceder
as informações dos cidadãos» queixa se a
porta voz da CNPD Por isso Nuno Ribei
ro crê que a grande responsabilidade está
mais do lado das organizações e das em
presas do que dos Estados «Têm de ser elas
próprias a ter bom senso e a garantir a pri
vacidade da informação que lhes é confia
da » Com tudo o queisso
Mas em última análise a derradeira pa
lavra é sempre dos utilizadores Nós os uti
lizadores E somosnós que optamos por dis
ponibilizar ou não os nossos dados «O que
conta é o uso que fazemos da ferramenta»
diz a investigadora FátimaAbreu Ferreira
«Por isso tem de haver maior consciencia
lização do que pode advir de um mau uso
Clara Guerra concorda «A tecnologia em
si mesma é neutra » Por erespondem
do novamente à pergunta do início deste
texto sobre a possibilidade de manter al
gum anonimato sim é possível Mas se
quisermos garantir o anonimato total en
tão é melhor desativarmosjá o perfil do Fa
cebook Sem pensar duas vezes
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