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volume 69, (nº 2), 1997                                                                                    HAS. Doença programada no útero?




                                     Hipertensão Arterial Sistêmica.
                                  Uma Doença Programada no Útero?
                                                                    Sandra S. Mattos
                                                                           Recife, PE



      A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é fator de risco                      cimento sobre os mecanismos de base para o desenvolvi-
para a doença coronária e o acidente vascular cerebral.                            mento da HAS na vida adulta.
      Desde os estudos de Framingham 1, há quase meio sé-                                Em 1990, Barker e col 7, observaram que PA na vida
culo, cardiologistas e clínicos gerais travam uma batalha                          adulta correlaciona-se inversamente com o peso ao nasci-
preventiva contra a HAS e a doença aterosclerótica coro-                           mento. Esta correlação á ainda mais evidente, quando a rela-
nária (DAC).                                                                       ção fetal/peso placentário está alterada em favor da placen-
      Mudanças de hábitos higieno-dietéticos, controle dos                         ta (Barker e col, 1991) 8. Os autores sugeriram que a relação a
níveis de pressão arterial (PA), implementação de progra-                          longo prazo entre crescimento fetal alterado e PA subse-
mas de condicionamento físico, redução nas jornadas de                             qüente, e a sua importância nas diferenças qualitativas no
trabalho com melhor aproveitamento de momentos de lazer                            crescimento, sugere que a fisiopatologia da HAS pode es-
são os principais aspectos preventivos enfatizados.                                tar baseada em crescimento tecidual comprometido por um
      Ainda assim, a morbi-mortalidade decorrente da HAS                           ambiente adverso durante um período crítico, possivelmen-
e da DAC representam o maior problema de Saúde Pública                             te curto, do desenvolvimento fetal.
em todo o mundo.                                                                         Konje e col, em 1996 9, estudando os diâmetros renais
      Desde a década de 50, estudos anatomopatológicos em                          em fetos normais e naqueles pequenos para a idade gesta-
jovens soldados mortos nas guerras da Coréia e Vietnã                              cional (PIG) observaram menores diâmetros dos rins nos
alertaram para o desenvolvimento precoce da doença. Obs-                           fetos PIG. Nestes, ainda, os níveis de renina plasmática do-
trução coronária >50% do lúmen dos vasos foi observada em                          cumentada na veia umbilical, ao nascimento, estavam signi-
15% desses jovens com idade média de 22 anos na Coréia 2.                          ficantemente mais elevados do que nos neonatos com de-
Doença obstrutiva em dois ou três vasos foi encontrada em                          senvolvimento normal.
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Vietnã 3.                                                                          gramação intra-uterina” da PA, e ampliam sobremaneira as
      Alterações ateromatosas na aorta foram documenta-                            áreas de atuação da cardiologia fetal.
das em crianças com 10 anos de idade 4.                                                  A cardiologia fetal vem sendo praticada há pouco
      A observação de que mais e mais adultos jovens de-                           mais de uma década. Suas áreas de atuação incluem a
senvolviam HAS e coronariopatias levou Paul Dudley                                 detecção das cardiopatias congênitas estruturais, e altera-
White 5,6, nos anos 70, a propor uma “Cruzada da Criança:                          ções hemodinâmicas, funcionais e do ritmo cardíaca fetal. O
para modificar o estilo de vida das crianças do nosso século”.                     manuseio destas anomalias pode iniciar-se ainda intra-úte-
      Até hoje, ainda são poucos os centros de Cardiologia                         ro, como nas reversões das arritmias cardíacas, ou ser pla-
Pediátrica que desenvolvem trabalhos em medicina preventiva.                       nejado para após o nascimento. O acompanhamento psico-
      Campanhas de saúde pública, envolvendo os órgãos                             lógico e o aconselhamento genético são alguns dos princi-
de telecomunicação, raramente abordam a importância da                             pais aspectos do trabalho interdisciplinar, fundamental para
educação preventiva para esta epidemia.                                            a prática da especialidade.
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Aceito 25/6/97



                                                                                                                                              87
Mattos SS                                                                                                                                           Arq Bras Cardiol
HAS. Doença programada no útero?                                                                                                               volume 69, (nº 2), 1997




                                                                                 Referências

1.   Kannel WB, Gordon T - The Framingham Study: an epidemiological investiga-             6.   White PD - The early infancy of preventive cardiology. Trans Am Clin Climatol
     tion of cardiovascular disease, section 30. Some characteristics related to the in-        Assoc 1973; 84: 17-21.
     cidence of cardiovascular disease and death: The Framingham Study. 18-year fol-       7.   Barker D, Bull A, Osmond C, Simmonds S - Fetal and placental size and the risk of
     low-up. Washington DC, Government Printing Office, 1974.                                   hypertension in adult life. Br Med J 1990; 301: 259-62.
2.   Enos WF, Beyer JC, Holmes RH - Pathogenesis of coronary disease in American           8.   Barker D, Godfrey K, Osmond C, Bull A - The relation of fetal length, ponderal
     soldiers kiled in Korea. JAMA 1955; 158: 912-6.                                            index and head circunference to blood pressure and the risk of hypertension in
3.   McNamara JJ, Molot MA, Stremple JF, Cutting RT - Coronary artery disease in                adult life. Paediatrics and Perinatal Epidemiology 1991; 6: 35-44.
     combat casualities in Viet Nam. JAMA 1971; 216: 1185-7.                               9.   Konje JC, Bell SC, Morton JJ, de Chazal R, Taylor DJ - Human fetal kidney mor-
4.   Strong JP, MCGil HC Jr - The pediatric aspect of atherosclerosis. J Atheroscler            phometry during gestational and the relationship between weight, kidney mor-
     Res 1969; 9: 251-65.                                                                       phometry and plasma active renin concentration ar birth. Clin Sci Colch 1996;
5.   White PD - The tardy growth of preventive cardiology. Am J Cardiol 1972; 29: 886-8.        91: 169-75.




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HAS: Uma doença programada no útero

  • 1. Arq Bras Cardiol Mattos SS Editorial volume 69, (nº 2), 1997 HAS. Doença programada no útero? Hipertensão Arterial Sistêmica. Uma Doença Programada no Útero? Sandra S. Mattos Recife, PE A hipertensão arterial sistêmica (HAS) é fator de risco cimento sobre os mecanismos de base para o desenvolvi- para a doença coronária e o acidente vascular cerebral. mento da HAS na vida adulta. Desde os estudos de Framingham 1, há quase meio sé- Em 1990, Barker e col 7, observaram que PA na vida culo, cardiologistas e clínicos gerais travam uma batalha adulta correlaciona-se inversamente com o peso ao nasci- preventiva contra a HAS e a doença aterosclerótica coro- mento. Esta correlação á ainda mais evidente, quando a rela- nária (DAC). ção fetal/peso placentário está alterada em favor da placen- Mudanças de hábitos higieno-dietéticos, controle dos ta (Barker e col, 1991) 8. Os autores sugeriram que a relação a níveis de pressão arterial (PA), implementação de progra- longo prazo entre crescimento fetal alterado e PA subse- mas de condicionamento físico, redução nas jornadas de qüente, e a sua importância nas diferenças qualitativas no trabalho com melhor aproveitamento de momentos de lazer crescimento, sugere que a fisiopatologia da HAS pode es- são os principais aspectos preventivos enfatizados. tar baseada em crescimento tecidual comprometido por um Ainda assim, a morbi-mortalidade decorrente da HAS ambiente adverso durante um período crítico, possivelmen- e da DAC representam o maior problema de Saúde Pública te curto, do desenvolvimento fetal. em todo o mundo. Konje e col, em 1996 9, estudando os diâmetros renais Desde a década de 50, estudos anatomopatológicos em em fetos normais e naqueles pequenos para a idade gesta- jovens soldados mortos nas guerras da Coréia e Vietnã cional (PIG) observaram menores diâmetros dos rins nos alertaram para o desenvolvimento precoce da doença. Obs- fetos PIG. Nestes, ainda, os níveis de renina plasmática do- trução coronária >50% do lúmen dos vasos foi observada em cumentada na veia umbilical, ao nascimento, estavam signi- 15% desses jovens com idade média de 22 anos na Coréia 2. ficantemente mais elevados do que nos neonatos com de- Doença obstrutiva em dois ou três vasos foi encontrada em senvolvimento normal. 26% e 4%, respectivamente, nos casos estudados no Estas observações apontam para uma possível “pro- Vietnã 3. gramação intra-uterina” da PA, e ampliam sobremaneira as Alterações ateromatosas na aorta foram documenta- áreas de atuação da cardiologia fetal. das em crianças com 10 anos de idade 4. A cardiologia fetal vem sendo praticada há pouco A observação de que mais e mais adultos jovens de- mais de uma década. Suas áreas de atuação incluem a senvolviam HAS e coronariopatias levou Paul Dudley detecção das cardiopatias congênitas estruturais, e altera- White 5,6, nos anos 70, a propor uma “Cruzada da Criança: ções hemodinâmicas, funcionais e do ritmo cardíaca fetal. O para modificar o estilo de vida das crianças do nosso século”. manuseio destas anomalias pode iniciar-se ainda intra-úte- Até hoje, ainda são poucos os centros de Cardiologia ro, como nas reversões das arritmias cardíacas, ou ser pla- Pediátrica que desenvolvem trabalhos em medicina preventiva. nejado para após o nascimento. O acompanhamento psico- Campanhas de saúde pública, envolvendo os órgãos lógico e o aconselhamento genético são alguns dos princi- de telecomunicação, raramente abordam a importância da pais aspectos do trabalho interdisciplinar, fundamental para educação preventiva para esta epidemia. a prática da especialidade. Observações mais recentes ampliaram o nosso conhe- O trabalho interdisciplinar com obstetras, fetologistas, ultra-sonografistas, nutricionistas e geneticistas na detecção precoce de alterações na circulação materno-feto-placen- tária, suas influências na organogênese e possíveis correla- Instituto do Coração de Pernambuco - Real Hospital Português - Recife ções com o desenvolvimento da HAS e da DAC constitui- Correspondência: Sandra S. Mattos - Unidade de Cardiologia Materno-Fetal - se uma nova e excitante área de atuação da cardiologia fetal. Instituto do Coração de PE - Av. Agamenon Magalhães, S/N - 52090-900 - Recife, PE Seria este, um dos ramos da cardiologia preventiva do Recebido para publicação em 28/5/97 3º milênio? Aceito 25/6/97 87
  • 2. Mattos SS Arq Bras Cardiol HAS. Doença programada no útero? volume 69, (nº 2), 1997 Referências 1. Kannel WB, Gordon T - The Framingham Study: an epidemiological investiga- 6. White PD - The early infancy of preventive cardiology. Trans Am Clin Climatol tion of cardiovascular disease, section 30. Some characteristics related to the in- Assoc 1973; 84: 17-21. cidence of cardiovascular disease and death: The Framingham Study. 18-year fol- 7. Barker D, Bull A, Osmond C, Simmonds S - Fetal and placental size and the risk of low-up. Washington DC, Government Printing Office, 1974. hypertension in adult life. Br Med J 1990; 301: 259-62. 2. Enos WF, Beyer JC, Holmes RH - Pathogenesis of coronary disease in American 8. Barker D, Godfrey K, Osmond C, Bull A - The relation of fetal length, ponderal soldiers kiled in Korea. JAMA 1955; 158: 912-6. index and head circunference to blood pressure and the risk of hypertension in 3. McNamara JJ, Molot MA, Stremple JF, Cutting RT - Coronary artery disease in adult life. Paediatrics and Perinatal Epidemiology 1991; 6: 35-44. combat casualities in Viet Nam. JAMA 1971; 216: 1185-7. 9. Konje JC, Bell SC, Morton JJ, de Chazal R, Taylor DJ - Human fetal kidney mor- 4. Strong JP, MCGil HC Jr - The pediatric aspect of atherosclerosis. J Atheroscler phometry during gestational and the relationship between weight, kidney mor- Res 1969; 9: 251-65. phometry and plasma active renin concentration ar birth. Clin Sci Colch 1996; 5. White PD - The tardy growth of preventive cardiology. Am J Cardiol 1972; 29: 886-8. 91: 169-75. 88