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INDICAÇÃO
Este livro foi escrito para estudantes de concursos públicos que desejam
estudar e realmente aprender a disciplina direito econômico.
Não é uma tarefa fácil, especialmente considerando que, ao contrário das
demais disciplinas jurídicas, o conceito, a autonomia e a abrangência do direito econômico
ainda apresentam controvérsias na doutrina.
O autor optou por seguir e explicitar, sempre quando possível, a doutrina
pacifica ou majoritária, a jurisprudência dos tribunais, e respostas consideradas corretas
em concursos públicos, evitando dar unicamente sua posição pessoal a respeito de cada
questão.
Ao longo e como parte do texto do livro, há respostas e assertivas que
foram objeto de provas de concurso público, de modo que se possa ver, de forma
atualizada, como certas questões estão sendo apreciadas pelas bancas examinadoras.
SOBRE O AUTOR
BRUNO MATTOS E SILVA é Bacharel em Direito pela USP, professor
universitário, advogado em Brasília (DF) e Consultor Legislativo do Senado Federal. Foi
Procurador-chefe do INSS nos tribunais superiores, Procurador Federal da CVM e
Assessor Especial do Ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. É autor dos
livros “Compra de imóveis: aspectos jurídicos, cautelas devidas, análise de riscos” e
“Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário”, ambos publicados pela Editora
Atlas.
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SUMÁRIO
NOTA DO AUTOR
CAPÍTULO I - INTRODUÇÃO AO DIREITO ECONÔMICO
1.Definição de direito econômico.
1.1.Conceito de atividade econômica
2.Conteúdo, objeto e abrangência do direito econômico. Autonomia científica do
direito econômico.
3.A ordem econômica constitucional.
3.1.A ordem econômica na Constituição Federal de 1988
CAPÍTULO II - AÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA
1.O Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica.
2.O Estado prestador de serviços públicos.
3.Atividade econômica exercida pelo Estado.
3.1.O Estado e as empresas estatais.
4.Conclusões a respeito do regime da ação estatal.
CAPÍTULO III - DEFESA DA ORDEM ECONÔMICA
1.Repressão às infrações à ordem econômica. Lei nº 8.884/94.
1.1. O CADE - Conselho Administrativo de Defesa Econômica e a SDE -Secretaria de
Direito Econômico.
2. Âmbito territorial de aplicação da Lei nº 8.884/94.
3.Infrações à ordem econômica
4.Fusão, incorporação e demais atos de concentração de empresas
BIBLIOGRAFIA
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NOTA DO AUTOR
O trabalho está dividido da seguinte forma:
O Capítulo I faz uma análise geral do tema central proposto, define o que
é atividade econômica, qual o objeto e abrangência do direito econômico e descreve as
opções políticas que o Estado pode tomar na condução dessa atuação, materializadas na
Constituição.
O Capítulo II descreve as ações estatais na economia., que tratando da
normatização da atividade econômica, da prestação dos serviços públicos e do exercício
da atividade econômica em sentido estrito pelo Estado, seja diretamente, seja por meio de
empresas estatais.
O Capítulo III trata do regime jurídico das ações realizadas pelo Estado na
defesa da ordem econômica, em especial da proteção do mercado, dado que a ordem
econômica brasileira e mundial está baseada na livre iniciativa. Descreve as infrações à
ordem econômica, trata da legislação antitruste, dos órgãos estatais responsáveis pela
proteção do mercado e da concorrência e dos limites estabelecidos às ações dos
particulares para que esses objetivos sejam atingidos.
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CAPÍTULO I
INTRODUÇÃO AO DIREITO ECONÔMICO
1.1.Definição de direito econômico.
O Estado atua na economia, seja exercendo diretamente atividade
econômica, seja como agente regulador da atividade econômica. O regime jurídico dessa
atuação tem sido chamado de direito econômico.
Assim, o estudo do direito econômico consiste na análise, sob o aspecto
jurídico, dos atos realizados pelo Estado que repercutem diretamente na economia.
Devemos enfocar a abrangência desse regime jurídico (direito econômico), o objeto da
ação estatal na economia, a ordem econômica estabelecida pela Constituição Federal e
os meios utilizados pelo Estado para a proteção dessa ordem econômica.
Como pressuposto óbvio para estudo do direito econômico, é preciso
definir o que é atividade econômica, pois, como vimos acima, o direito econômico é a
parte da ciência jurídica que estuda a ação estatal na economia. É o que veremos no
subitem seguinte.
No que se refere à análise regime jurídico da atuação estatal propriamente
dita, o ponto de partida é a verificação dos modos pelos quais Estado pode atuar na
economia. Iremos descrever quais são essas ações, classificando-as de uma forma
didática.
Analisando o presente, o passado recente e o passado distante,
percebemos que a ação do Estado tomou diferentes formas e conteúdos, com diferentes
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matizes, mas sempre objetivando o desenvolvimento da atividade econômica e dos meios
de produção.
Por exemplo, em Atenas, havia a regra de que dois terços de todo o
carregamento de trigo deveria ser vendido na cidade.1
Em Roma, durante certo tempo não
houve freio algum contra a usura, mas Constantino se viu obrigado em momento posterior
a abolir as antigas leis e a fixar a taxa de juros legítima em 100%.2
Mais recentemente, podemos citar a criação da URV – Unidade Real de
Valor e das demais medidas de direcionamento da economia, materializadas no famoso
“Plano Real”, durante o Governo de Itamar Franco, por meio das Medidas Provisórias nºs
434, de 27/02/1994, e 1.053, de 30/06/95, reeditadas e posteriormente convertidas nas
Leis nºs 8.880, de 27/05/1994, e 10.192, de 14/2/2001.
O Estado pode até mesmo ser agente da atividade econômica, seja
diretamente, seja mediante a criação de empresas que exercerão a atividade econômica.
Optamos por classificar em três as formas de ação estatal na economia:
normatização, prestação dos serviços públicos e exercício de atividade econômica em
sentido estrito.
Veremos o que deve e o que não deve ser considerado atividade própria
do Estado, bem como iremos analisar as ações estatais com o escopo de proteção do
mercado. Depois de ver que elas podem ser regulatórias, prestadoras de serviços
considerados públicos e até mesmo de exercício de atividade econômica propriamente
dita, veremos como essas ações podem ser direcionadas para a proteção do mercado.
1
CORREA, Alexandre Augusto de Castro. “Existiu, em Roma, direito comercial?”. In Revista da faculdade de direito
da universidade de São Paulo, v. 65, 1970, p. 68. FERRAZ, Manoel Martins de Figueiredo. “Aspectos jurídicos do
comércio na Grécia antiga”. In Revista de direito civil, imobiliário, agrário e empresarial, v. 12, nº 44, abr./jun. 1988, p.
160-171.
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Dentro da ordem política vigente, cabe à livre iniciativa o papel
preponderante no exercício da atividade econômica. Coerente com esse postulado, cabe
ao Estado a defesa da livre iniciativa, de modo a evitar que alguns grupos possam se
apropriar de forma desordenada ou inadequada do espaço econômico, ou até mesmo
prejudicar a atividade econômica e o interesse público mediante atos nocivos ou hostis.
Assim, veremos como está regulada a ação estatal na defesa do mercado.
1.1.1.Conceito de atividade econômica.
Antes de definir o que é atividade econômica, é preciso definir o que é
atividade.
Em sentido amplo, atividade é qualquer ação. Em termos mais estritos,
atividade é uma série de atos concatenados, dirigidos a uma finalidade.3
Essa finalidade poderá ser econômica ou não.
Assim, atividade econômica é qualquer atividade produtora de riquezas,
que se opera por meio de transformação de produtos já existentes para a criação de
produtos novos (à luz das ciências exatas, “nada se cria, tudo se transforma”). Ou seja,
atividade econômica é a atividade criadora de riqueza ou de nova vantagem econômica.4
Atividade econômica compreende tudo aquilo que possa ser objeto de especulação
lucrativa.5
2
BOCCARDO, Jeronimo. Historia del comercio, de la industria y de la economia política. Buenos Aires: Impulso,
1942, p. 71.
3
SZTAJN, Raquel. Teoria jurídica da empresa: atividade empresária e mercados. São Paulo: Atlas, 2003, p. 92.
4
COTTINO, Gastone. Diritto commerciale. v. 1. Padova: CEDAM, 1976, p. 69.
5
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 138.
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É necessário que a atividade econômica seja exercida com intuito de
lucro?
Lucro, que é a remuneração do exercente de atividade econômica,
consiste na diferença entre os resultados e os custos da atividade. Os lucros poderão, em
cada caso concreto, existir ou não. Existirão lucros se essa diferença for positiva; se for
negativa, existirão prejuízos ou perdas. A atividade econômica, abstratamente
considerada, é uma atividade que potencialmente é geradora de lucros ou de perdas.6
A doutrina tradicional considera que o objetivo da atividade econômica
deveria ser o de lucro para fins de caracterização, sob o aspecto jurídico, como atividade
empresária, pois se a atividade é profissional, tem-se implícito que é exercida com ânimo
de lucro,7
bem como atividade econômica, por sua índole, seria necessariamente uma
atividade de lucro.8
Por outro lado, também já se afirmou que a atividade econômica é
suscetível de gerar lucros, ainda que ele não ocorra por razões de mercado, de má
avaliação do empresário etc,9
ou mesmo nos casos em que isso ocorre por uma escolha
do agente da atividade econômica, como é o caso da empresa pública, que poderá ou não
gerar lucros.10
O intuito de lucro, portanto, seria um elemento natural, mas não essencial
como motivo da atividade econômica.11
6
Vide, a respeito da diferença entre fins lucrativos e fins econômicos: SILVA, Bruno Mattos e. Direito de empresa:
teoria da empresa e direito societário. São Paulo: Atlas, 2007, p. 46, 47, 56, 57, 197, 200 e 201.
7
MARCONDES, Sylvio. Questões de direito mercantil. São Paulo: Saraiva, 1977, p. 11. ASCARELLI, Túlio.
Iniciación al estudio del derecho mercantil. Traduzido para o espanhol por Evello Verdera y Tuells. Barcelona: Bosch,
1964, p. 172-173.
8
MESSINEO, Francesco. Manual de derecho civil y comercial. Traduzido para o espanhol por Santiago Sentis
Melendo. Tomo II. Buenos Aires: EJEA, 1954-1956, p. 201.
9
CORSI, Francesco. Diritto dell’impresa. 2. ed. Milão: Giuffrè, 2003, p. 28.
10
RIVA-SANSEVERINO, Luisa. Disciplina delle attività professionali: impresa in generale. Bologna: N. Zanichelli;
Roma: Foro Italiano, 1977, p. 134. CORSI, Francesco. Diritto dell’impresa. 2. ed. Milão: Giuffrè, 2003, p. 28.
11
ASQUINI, Alberto. “Perfis da empresa”. In Revista de direito mercantil, industrial, econômico e financeiro.
Traduzido por Fábio Konder Comparato do artigo “Profili dell’impresa”, publicado em 1943 na Rivista del Diritto
Commerciale, v. 41, I. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. Nº 104, outubro-dezembro de 1996, p. 116.
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O Estado, por exemplo, pode criar uma empresa pública para exercer
alguma atividade econômica com um objetivo que não seja o de gerar lucros para si, mas
beneficiar a economia do país como um todo. Essa atividade é econômica? Evidente que
sim, pois ela é potencialmente lucrativa, ainda que, por uma opção política, ela não o seja
no caso concreto.12
Diante de tudo isso, parece ser mais adequado perceber que a atividade
econômica deve ser abstratamente passível de gerar lucro, o que explicaria as hipóteses
em que uma pessoa jurídica13
exerce atividade econômica organizada sem ânimo de obter
lucro, mas apenas para exercer um fim social (ex. uma empresa estatal deficitária ou uma
cooperativa). A questão é controvertida na doutrina.14
As atividades econômicas poderão ser consideradas como serviço público
ou não, conforme opção política do legislador. A parcela da atividade econômica que não
é considerada serviço público constitui a chamada atividade econômica em sentido
estrito.15
Ou seja, partindo de uma noção ampla de atividade econômica – tudo aquilo que
é potencialmente lucrativo – podemos fazer uma divisão entre a atividade econômica que
está no campo de ação dos particulares (atividade econômica em sentido estrito) e a que
está no campo de ação do Estado (serviço público).
Contudo, o Estado também poderá explorar atividade econômica em
sentido estrito (que poderá ser efetivamente lucrativa ou não), nos limites
12
“Che l’impresa pubblica non produca utili è conseguenza di uma scelta gestionale e política, non del carattere
dell’attività.” (CORSI, Francesco. Diritto dell’impresa. 2. ed. Milão: Giuffrè, 2003, p. 28).
13
Para mais informações a respeito da teoria da pessoa jurídica, da personificação e da desconsideração da
personalidade jurídica, vide: Bruno Mattos e. Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário. São Paulo:
Atlas, 2007, p. 179-255.
14
GALGANO, Francesco.Trattado di diritto commerciale e di diritto pubblico dell’economia. V. 2. Padova: CEDAM,
1978, p. 55-56. AULETTA, Giuseppe. SALANITRO, Niccolò. Diritto commerciale. 11. ed. Milano: Dott. A. Giuffrè
Editore, 1998, p. 16.
15
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 132.
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constitucionais,16
assim como o particular poderá prestar serviço público, seja nas
hipóteses em que essa prestação é livre (ex. hospitais, escolas),17
seja por concessão,
nos termos da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995.18
E tanto é assim que o art. 175
da Constituição Federal,19
que se refere à prestação de serviços públicos, encontra-se no
Título VII - Da Ordem Econômica e Financeira. Não se deve confundir, ademais,
atividades econômicas (em sentido estrito) que, embora não sejam consideradas serviço
público, dependem de autorização estatal (ex. atividade bancária, nos termos da Lei nº
4.595, de 31 de dezembro de 1964).
Em resumo, atividade econômica é qualquer atividade produtora de
riquezas, que se opera por meio de transformação de produtos já existentes para a
criação de produtos novos. O conceito de atividade econômica prescinde da existência
real ou mesmo do ânimo de lucro, mas a atividade deve ser teoricamente passível de
gerar lucro. A parcela da atividade econômica que não é considerada serviço público
constitui a chamada atividade econômica em sentido estrito. 20
1.2.Conteúdo, objeto e abrangência do direito econômico. O direito
econômico como ramo autônomo do direito.
A atuação estatal na econômica não é arbitrária, não podendo ser feita ao
talante do governante. Ao contrário, há regência por normas jurídicas, criadas pelo próprio
16
Diz o caput do art. 173 da Constituição Federal: "Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a
exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será admitida quando necessária aos imperativos da segurança
nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei."
17
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 15a
. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 628.
18
SILVA, Bruno Mattos e. Direito administrativo para concursos. Brasília: Fortium, 2005, p. 66-68.
19
“Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre
através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: I - o regime das empresas
concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem
como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; II - os direitos dos usuários; III -
política tarifária; IV - a obrigação de manter serviço adequado.”
20
SILVA, Bruno Mattos e. Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário. São Paulo: Atlas, 2007, p. 46, 47,
56, 57, 197, 200 e 201.
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Estado, que vinculam a Administração Pública como um todo. O conjunto de princípios e
regras que rege a atuação do Estado na economia é chamado de Direito Econômico.
É intuitivo que cabe ao Estado regular relações privadas com conteúdo
econômico. Pretende-se aqui discutir quais outras ações exercidas pelo Estado não se
caracterizam como simples normas de direito privado.
Assim, regras relativas ao fomento estatal da atividade econômica, à
criação de uma situação favorável à atividade econômica, à proteção da concorrência e do
mercado, entre outras, não parecem ser singelamente normas de direito privado. Com
efeito, as normas dessas ações fazem parte do que passou a se chamar de direito
econômico.
O direito econômico pode estar constitucionalizado, isto é, pode ter seus
princípios básicos contidos na Constituição. É o que ocorreu, no Brasil, a partir da
Constituição de 1934, como veremos adiante.
Qual o objeto do direito econômico?
Dizer que o direito econômico é um direito da economia, embora tenha um
fundo de verdade, não delimita seus exatos limites, uma vez que o direito civil e,
principalmente, o direito comercial, regem relações jurídicas de caráter econômico. Aliás,
até mesmo o direito administrativo e o direito do trabalho podem ter normas com conteúdo
econômico!
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Assim, é errado dizer que "A existência de um conteúdo econômico na
norma é suficiente para transformá-la em norma de direito econômico, não sendo
necessário que essa norma seja reguladora de uma política econômica".21
A diferença fundamental entre norma de direito econômico e conteúdo
econômico da norma consiste no caráter norteador das normas de direito econômico, que
materializam objetivos de política econômica.22
Já se afirmou que o direito econômico regeria relações econômicas.
Durante o período soviético, uma corrente doutrinária sustentou que o direito econômico
regeria não apenas a direção da atividade econômica pelo Estado, mas também as
relações econômicas entre os diversos agentes econômicos.23
Visto desse modo, o objeto
do direito econômico seria por demais amplo.
Dando uma abrangência muito menor, já se afirmou que o direito
econômico trata do "planejamento da economia nacional".24
Visto sob o ângulo objetivo, direito econômico consiste na positivação das
opções de políticas econômicas estabelecidas pelo Estado. Essas opções, evidentemente,
são as consagradas pela síntese das forças dominantes, que controlam o Estado. Nesse
sentido, o direito econômico seria “uma espécie de ordenamento constitucional da
economia, no qual se situariam os princípios básicos que devem reger as instituições
econômicas”.25
Assim, o objeto do direito econômico seria um pouco mais amplo, pois
além de tratar do planejamento, trata também da ação estatal. Daí o caráter instrumental
do direito econômico.
21
Afirmativa constante da questão nº 58 (2), considerada errada pelo gabarito oficial, da prova realizada pelo CESPE
em 3/3/2002 relativa ao Concurso Público para provimento do cargo de Consultor Legislativo do Senado Federal - Área
5 - Direito Comercial e Econômico
22
NUSDEO, Fábio. Curso de economia. Introdução ao direito econômico. 3. ed. São Paulo: RT, 2001. p. 206-207.
23
LAPTEV, V. Derecho economico. Trad. para o espanhol por Rene Gomez Manzano. Moscou: Progresso, 1988. p. 42.
24
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Atlas, 1991, p. 137.
25
COMPARATO, Fábio Konder. Ensaios e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 462.
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O objeto e limites do direito econômico ficará mais claro nos tópicos
seguintes, mas desde logo podemos dizer que o objeto do direito econômico é a política
econômica.
Visto sob o ângulo objetivo, o direito econômico é o “conjunto das técnicas
jurídicas de que lança mão o Estado contemporâneo na realização de sua política
econômica. Ele constitui assim a disciplina normativa da ação estatal sobre as estruturas
do sistema econômico, seja este centralizado ou descentralizado”.26
A finalidade de realização da política econômica do Estado é uma marca
do direito econômico. Nisso consiste seu caráter instrumental, que no plano do direito
constitucional faz parte da noção consagrada de constituição dirigente.
Além dos princípios da ordem econômica positivados na Constituição
Federal, o direito econômico, em si, tem princípios próprios.
Existe um critério difundido na literatura jurídica no sentido de que cada
ramo do direito possui princípios próprios. Assim, por exemplo, para o direito civil e
também no direito comercial são aplicáveis o princípio de igualdade entre as partes; já no
direito administrativo é aplicável o princípio de supremacia do ente público (estatal) sobre
o particular.
No direito econômico podemos perceber que ambos os princípios são
aplicáveis, dependendo da situação concreta. Ao longo deste livro isto ficará evidente.
O direito econômico não é um direito que protege precipuamente o
interesse privado, tal como ocorre com o direito civil e o direito comercial. Muito ao revés,
os interesses protegidos pelo direito econômico são direitos da coletividade.
26
COMPARATO, Fábio Konder. Ensaios e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 465.
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O direito civil e o direito comercial, na maior parte das vezes, tratam de
direitos disponíveis; já o direito econômico versa, na maior parte dos casos, de direitos
indisponíveis. É claro que o direito civil e o direito comercial têm também como objeto a
proteção de valores sociais que são benéficos para a sociedade como um todo; contudo,
eles protegem diretamente o interesse dos particulares, tendo sua função social
exatamente por protegerem esses interesses privados, já que é de interesse da
coletividade a proteção dos indivíduos também na condição de indivíduos, parte da
sociedade. O mesmo não ocorre com o direito econômico, pois a proteção da saúde da
economia beneficia diretamente a coletividade e, por via de conseqüência, indiretamente,
os indivíduos.
De um modo geral, as relações jurídicas de caráter horizontal são objeto
do direito civil ou do direito comercial. São de caráter horizontal as relações jurídicas em
que as partes estão em um mesmo patamar de igualdade, sem existir subordinação entre
elas. Por outro lado, nas relações jurídicas de caráter vertical, nas quais a subordinação
existe, o direito regente é o direito administrativo.27
Observe-se, por exemplo, o princípio
de supremacia do interesse público em face do interesse particular, que norteia o direito
administrativo.
O direito econômico assume a feição de realização da política do Estado
no campo econômico. Por exemplo, o Estado brasileiro opta em defender a concorrência.
É um princípio positivado pelo art. 170, IV, da Constituição Federal, que é concretizado
pelo CADE mediante aplicação da Lei nº 8.884/94. O Estado brasileiro opta também por
defender o consumidor (art. 170, V, da Constituição Federal).
A título comparativo, nos Estados Unidos, a Lei Sherman proíbe qualquer
ato de concentração que prejudique a concorrência, sem abrir exceções
(desconsideremos, por ora, a interpretação dada pelos tribunais americanos no sentido de
27
GRILLO, Luisa Rodriguez et al. Derecho economico - temas complementarios. Havana: Facultad de Derecho
Universidad de La Habana, 1989, p. 7.
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mitigar a aplicação da Lei Sherman). Trata-se de uma opção política do legislador estatal:
defender a concorrência, ainda que a defesa exacerbada da concorrência possa vir a
prejudicar o consumidor.
São opções políticas, que poderiam não existir ou poderiam existir de
forma diferente.
Ou seja, tanto nos países de economia planificada, como nos países de
economia liberal, o direito econômico assume uma nítida feição de reger a organização e
direção da economia por parte do Estado.
Podemos dizer que o direito econômico é ramo autônomo do direito?
Alguns autores, como por exemplo os professores de direito econômico da
Universidade Estatal de Lomonosov de Moscou28
sustentam que a disciplina direito
econômico está conformada por normas e distintos ramos do direito que interagem
funcionalmente entre si, razão pela qual não é possível definir um objeto específico de
regulação jurídica por parte do direito econômico. Essa posição também tem adeptos nos
países ocidentais, onde vários autores sustentam o direito econômico seria um direito de
superposição, exatamente por se sobrepor aos vários ramos da ciência jurídica, tal como
um corte transversal na árvore do Direito.29
Outros autores defendem que o direito econômico é ramo autônomo do
direito, por ter objeto único e homogêneo de regulação, do qual derivam princípios
28
GRILLO, Luisa Rodriguez et al. Derecho economico - temas complementarios. Havana: Facultad de Derecho
Universidad de La Habana, 1989, p. 7-8.
29
NUSDEO, Fábio. Curso de economia. Introdução ao direito econômico. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais,
2001. p. 204-206.
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especiais, assim como sujeitos próprios entre os quais se estabelecem as relações
jurídicas de conteúdo econômico.30
Além dos ramos do direito terem princípios próprios, cada ramo do direito
se distingue pelo seu objeto de regulação, pelo caráter das relações sociais que
regulam.31
O direito econômico tem objeto próprio de regulação, que é a política
econômica do Estado, como visto acima.
A autonomia do direito econômico decorre da sua finalidade, que é a de
traduzir juridicamente os instrumentos da política econômica do Estado.32
A grande dificuldade de se identificar o direito econômico como ramo
autônomo do direito reside na dificuldade de divisão entre o público e o privado, entre
direito público e o direito privado. Onde estaria o direito econômico? Essa divisão, em
termos absolutos, é uma marca da concepção liberal, incompatível com a realidade atual.
No direito moderno não há essa separação absoluta. Veja-se, por exemplo, o disposto no
art. 182, § 4º, da Constituição Federal, que faculta o Poder Público municipal exigir, nos
termos que especifica, o "adequado aproveitamento" do solo urbano. A propriedade é
privada, mas deve atender a sua função social.
Assim, o direito econômico é ramo autônomo do direito que regula e
instrumentaliza a política econômica.
A quem cabe legislar sobre direito econômico?
30
GRILLO, Luisa Rodriguez et al. Derecho economico - temas complementarios. Havana: Facultad de Derecho
Universidad de La Habana, 1989, p. 7-8.
31
LAPTEV, V. Derecho economico. Trad. para o espanhol por Rene Gomez Manzano. Moscou: Progresso, 1988. p. 30.
32
COMPARATO, Fábio Konder. Ensaios e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 471.
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A Constituição Federal estabelece no art. 24, I, que é de competência
concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal legislar concorrentemente sobre
direito econômico.
No âmbito da legislação concorrente, cabe à União a edição de normas
gerais e, aos Estados, a edição de normas específicas. Caberá ao STF, se provocado,
dizer se a norma estadual invadiu a competência da União.33
33
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 7.737/2004, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO.
GARANTIA DE MEIA ENTRADA AOS DOADORES REGULARES DE SANGUE. ACESSO A LOCAIS
PÚBLICOS DE CULTURA ESPORTE E LAZER. COMPETÊNCIA CONCORRENTE ENTRE A UNIÃO,
ESTADOS-MEMBROS E O DISTRITO FEDERAL PARA LEGISLAR SOBRE DIREITO ECONÔMICO.
CONTROLE DAS DOAÇÕES DE SANGUE E COMPROVANTE DA REGULARIDADE. SECRETARIA DE
ESTADO DA SAÚDE. CONSTITUCIONALIDADE. (...) 4. A Constituição do Brasil em seu artigo 199, § 4º, veda
todo tipo de comercialização de sangue, entretanto estabelece que a lei infraconstitucional disporá sobre as condições e
requisitos que facilitem a coleta de sangue. 5. O ato normativo estadual não determina recompensa financeira à doação
ou estimula a comercialização de sangue. 6. Na composição entre o princípio da livre iniciativa e o direito à vida há de
ser preservado o interesse da coletividade, interesse público primário. 7. Ação direta de inconstitucionalidade julgada
improcedente.” (STF, ADI 3512/ES, Rel. Min. EROS GRAU, j. em 15/02/2006, DJ 23-06-2006)
”Ação direta de inconstitucionalidade. Lei n° 3.542/01, do Estado do Rio de Janeiro, que obrigou farmácias e drogarias a
conceder descontos a idosos na compra de medicamentos. Ausência do periculum in mora, tendo em vista que a
irreparabilidade dos danos decorrentes da suspensão ou não dos efeitos da lei se dá, de forma irremediável, em prejuízo
dos idosos, da sua saúde e da sua própria vida. Periculum in mora inverso. Relevância, ademais, do disposto no art. 230,
caput da CF, que atribui à família, à sociedade e ao Estado o dever de amparar as pessoas idosas, defendendo sua
dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida. Precedentes: ADI n° 2.163/RJ e ADI nº 107-8/AM. Ausência
de plausibilidade jurídica na alegação de ofensa ao § 7º do art. 150 da Constituição Federal, tendo em vista que esse
dispositivo estabelece mecanismo de restituição do tributo eventualmente pago a maior, em decorrência da concessão do
desconto ao consumidor final. Precedente: ADI nº 1.851/AL. Matéria relativa à intervenção de Estado-membro no
domínio econômico relegada ao exame do mérito da ação. Medida liminar indeferida.” (STF, ADI-MC nº 2.435/RJ, Rel.
Min. ELLEN GRACIE, j. em 13/03/2002, DJ de 31-10-2003)
“AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 14.861/05, DO ESTADO DO PARANÁ. INFORMAÇÃO
QUANTO À PRESENÇA DE ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS EM ALIMENTOS E
INGREDIENTES ALIMENTARES DESTINADOS AO CONSUMO HUMANO E ANIMAL. LEI FEDERAL
11.105/05 E DECRETOS 4.680/03 E 5.591/05. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE PARA DISPOR
SOBRE PRODUÇÃO, CONSUMO E PROTEÇÃO E DEFESA DA SAÚDE. ART. 24, V E XII, DA CONSTITUIÇÃO
FEDERAL. ESTABELECIMENTO DE NORMAS GERAIS PELA UNIÃO E COMPETÊNCIA SUPLEMENTAR
DOS ESTADOS. 1. Preliminar de ofensa reflexa afastada, uma vez que a despeito da constatação, pelo Tribunal, da
existência de normas federais tratando da mesma temática, está o exame na ação adstrito à eventual e direta ofensa, pela
lei atacada, das regras constitucionais de repartição da competência legislativa. Precedente: ADI 2.535-MC, rel. Min.
Sepúlveda Pertence, DJ 21.11.03. 2. Seja dispondo sobre consumo (CF, art. 24, V), seja sobre proteção e defesa da saúde
(CF, art. 24, XII), busca o Diploma estadual impugnado inaugurar regulamentação paralela e explicitamente contraposta
à legislação federal vigente. 3. Ocorrência de substituição - e não suplementação - das regras que cuidam das exigências,
procedimentos e penalidades relativos à rotulagem informativa de produtos transgênicos por norma estadual que dispôs
sobre o tema de maneira igualmente abrangente. Extrapolação, pelo legislador estadual, da autorização constitucional
voltada para o preenchimento de lacunas acaso verificadas na legislação federal. Precedente: ADI 3.035, rel. Min.
Gilmar Mendes, DJ 14.10.05. 4. Declaração de inconstitucionalidade conseqüencial ou por arrastamento de decreto
regulamentar superveniente em razão da relação de dependência entre sua validade e a legitimidade constitucional da lei
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Na prática, são poucos os casos em que os Estados legislam,
explicitamente, a respeito de direito econômico. Mas é comum a edição de leis estaduais
que, extravasando ou não a competência constitucionalmente estabelecida, tenham
conteúdo econômico.
O direito econômico faz parte do direito privado, do direito público ou não
cabe dentro dessa divisão?
A divisão entre direito público e direito privado tem origem no direito
romano, no Digesto de Ulpiano. De acordo o Digesto (L. 1, § 2º D. 1, 1), o direito público
abrangeria além da religião (jus sacrum), a forma de governo, os poderes públicos e as
relações dos particulares com o governo. Ao contrário do direito privado, o direito público
não foi muito desenvolvido na época romana. Justiniano sequer cuidou do direito público,
tendo apenas se contentado em defini-lo.34
Exatamente em razão da intervenção crescente do Estado no domínio
econômico, muitos são os autores que sustentam a perda de absoluta distinção entre a
esfera pública e privada.35
Isso significa que o direito moderno não cabe na estreita divisão entre
direito público e direito privado: o direito econômico, o direito do trabalho, o direito do
sistema financeiro e o direito do consumidor estão em um campo jurídico intermediário,
nem exatamente público, nem exatamente privado.
objeto da ação. Precedentes: ADI 437-QO, rel. Min. Celso de Mello, DJ 19.02.93 e ADI 173-MC, rel. Min. Moreira
Alves, DJ 27.04.90. 5. Ação direta cujo pedido formulado se julga procedente.” (STF, ADI 3645/PR, Rel. Min. ELLEN
GRACIE, j. em 31/05/2006)
34
LARICHE, M. BONJEAN, Georges. Explication méthodique des institutes de Justinien. v. 1. Paris: A. Durand et
Pedone-Lauriel, Éditeurs, 1878, p. 12.
35
FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Atlas, 1991, p. 131.
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Seja como for, como o Estado moderno tem uma ação positiva na
economia e constituições de caráter dirigente, deve ser reputado como mais adequado o
estudo do direito econômico como ramo autônomo.
Por todas essas razões, opto em conceituar o direito econômico como
ramo autônomo do direito que regula e instrumentaliza a política econômica.
Porém, nada disso é intocável. Para fins de concurso público, em uma
questão aberta, pode-se adotar uma resposta como "o direito econômico pode ser visto
como um ramo jurídico ou como um método de análise e interpretação do Direito". Uma
resposta assim não poderia ser considerada errada, ainda que o examinador seja
partidário de uma ou de outra corrente. Ademais, tal afirmação é uma das conclusões a
que chegam alguns doutrinadores no Brasil, como Fábio Nusdeo36
, a respeito do direito
econômico. Para quem vai fazer concurso público é fundamental saber como caminha a
doutrina pátria.
Visto como ramo autônomo do direito ou não, o que irá variar de país para
país é conteúdo que assumirão as normas de direito econômico.
A título exemplo, vejamos uma exposição de direito econômico efetuada
de acordo com a Constituição cubana:
"En la República de Cuba rige el sistema socialista de economía basado en
la propiedad socialista de todo el pueblo sobre los medios de produción y en la
supreción de la explotación del hombre por el hombre (art. 14). (...) El Estado
organiza, dirige y controla la actividad económica nacional de acuerdo con el Plan
Único de Desarrollo Económico-Social, en cuya elaboración y ejecución participan
activa y conscientemente los trabajadores de todas las ramas de la economía y de
las demás esferas de la vida social (art. 16, párr. 1º)"
37
36
NUSDEO, Fábio. Curso de economia. Introdução ao direito econômico. 3. ed. São Paulo: RT, 2001. p. 206-222.
37
MARILL RIVERO, Emilio. Constituición de la Republica de Cuba - temática/legislación complementaria. Havana:
Editorial de Ciencias Sociales, 1989, pp. 88, 141 e 142
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No Brasil, exatamente porque é fundamento constitucional da ordem
econômica a livre iniciativa (art. 170, caput), bem como a propriedade privada é princípio
dessa mesma ordem econômica (art. 170, II), além das hipóteses expressamente
previstas na Constituição, o Estado apenas deverá explorar diretamente a atividade
econômica quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante
interesse coletivo. Não é, como vimos acima, a opção política contida na Constituição
cubana, que prevê não apenas a planificação econômica, mas também a propriedade
socialista dos meios de produção.
Ou seja, o conteúdo das normas de direito econômico em Cuba e no
Brasil são diferentes. Também são diferentes a Lei nº 8.884/94 do Brasil e a Lei Sherman
dos Estados Unidos.
Mas é inegável que todas essas normas - de Cuba, do Brasil e dos
Estados Unidos - têm o nítido de propósito de dirigir a economia. No caso do Brasil e dos
Estados Unidos, as normas procuram, dentre outros objetivos, defender a concorrência
contra abusos do poder econômico.
O que pode existir é uma direção da economia a favor do mercado (Brasil
e Estados Unidos) e não um total ou quase total controle dos meios de produção por
órgãos estatais (Cuba). Veja-se, nesse contexto, os limites da expressão acima dirigir a
economia!
Não podemos ser ingênuos a ponto de pensar que são as bases
constitucionais da ordem econômica que definem a estrutura de determinado sistema
econômico; a constituição formal não constitui a realidade material. Por outro lado, não é
possível aceitar um determinismo econômico sobre a realidade jurídica formal.38
Com
efeito, é inegável que a Constituição tem força normativa, isto é, a Constituição pode ser
um meio de transformar a realidade.39
38
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 722.
39
HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991.
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Veremos, no tópico seguinte, como as constituições brasileiras trataram o
direito econômico, especialmente a Constituição Federal de 1988.
1.3.A ordem econômica constitucional.
A constituição econômica formal consiste no conjunto de normas da
constituição política que garantindo os elementos definidores de um determinado sistema
econômico, estabelece os princípios fundamentais de determinada forma de organização
e funcionamento da economia e estabelece, por isso mesmo, uma determinada ordem
econômica.40
A primeira Constituição brasileira, que foi a Constituição do Império, de
1824, não tratou da ordem econômica. Ela não tinha dispositivos que possam ser
verdadeiramente considerados como de direito econômico. Com esforço mental no sentido
de encontrar alguma manifestação sobre o tema, podemos pinçar o item 25 do art. 179,
que previu a abolição das corporações de ofícios.
A segunda Constituição brasileira, que foi a primeira Constituição da
República, de 1891, também não tratou da ordem econômica. Também é necessário
esforço para encontrar algum dispositivo que possa ser reputado como sendo de direito
econômico. Podemos pinçar os seguintes: art. 7º, item 2º, que estabeleceu ser de
competência da União os direitos de entrada, saída e estadia de navios, sendo livre o
comércio de cabotagem às mercadorias nacionais, bem como às estrangeiras que já
tenham pago impostos de importação; art. 7º, § 1º, item 1º, que estabelece ser de
competência privativa da União a instituição de bancos emissores; art. 72, § 17, que previa
o direito de propriedade, salvo a desapropriação por necessidade ou utilidade pública e
afirmava que a propriedade das minas era do proprietário do solo.
40
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 723.
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A primeira Constituição brasileira a tratar da ordem econômica foi a de
1934, sob o título "Da Ordem Econômica e Social", que continha vinte e oito artigos.
Dentre outros aspectos relevantes, podemos destacar os seguintes: o art. 115 estabelecia
que a ordem econômica deveria ser organizada conforme os princípios da Justiça e as
necessidades da vida nacional, de modo a possibilitar a todos existência digna e, dentro
desses limites, garantia a liberdade econômica. No art. 117, parágrafo único, proibia a
usura, punida na forma da lei. O art. 118 inovou ao estabelecer que a propriedade das
minas era distinta da propriedade do solo para efeito de exploração ou aproveitamento
industrial. O art. 119 previa que a exploração das minas e das jazidas minerais seria feita
mediante autorização ou concessão federal, que seriam conferidas exclusivamente a
brasileiros ou a empresas organizadas no Brasil, ressalvada ao proprietário a preferência
na exploração ou co-participação nos lucros. O art. 131 vedava a propriedade de
empresas jornalísticas a estrangeiros, que não poderiam ser acionistas de empresas
jornalísticas, e a sociedades anônimas com ações ao portador. O art. 132 estabelecia que
deveriam ser brasileiros os proprietários, armadores e comandantes de navios nacionais.
A Constituição de 1937 tratou da matéria na parte "Da Ordem Econômica"
em vinte e um artigos. O art. 142 dizia "A usura será punida". O art. 145 previa que só
poderiam funcionar no Brasil bancos de depósito e empresas de seguro de propriedade de
brasileiros. O art. 149 dispôs que os proprietários, armadores e comandantes de navios
nacionais deveriam ser brasileiros natos.
A Constituição de 1946 tratou da ordem econômica no Título V, "Da
Ordem Econômica e Social" em dezoito artigos. O art. 145 dizia que "A ordem econômica
deve ser organizada conforme os princípios da justiça social, conciliando a liberdade de
iniciativa com a valorização do trabalho humano". O art. 146 previa que, mediante lei
especial, a União poderia intervir no domínio econômico e monopolizar (!) determinada
indústria ou atividade, com base no interesse público e com limite nos direitos
fundamentais constitucionalmente assegurados. O art. 147 previa o uso da propriedade
condicionado ao bem-estar social. O art. 148 estabelecia que a lei reprimiria o abuso do
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poder econômico e os grupos de empresas que pretendessem dominar mercados,
eliminar a concorrência e aumentar arbitrariamente os lucros. O art. 154 previa que a
usura seria punida na forma da lei. O art. 155 estabeleceu a navegação de cabotagem
para o transporte de mercadoria seria privativa de navios nacionais, salvo caso de
necessidade pública. O § 2º do art. 155 dispôs que os proprietários, armadores e
comandantes de navios nacionais deveriam ser brasileiros.
A Constituição de 1967, no Título III, "Da Ordem Econômica e Social",
tratou da matéria em dez artigos. O art. 157 dizia que a ordem econômica teria por fim
realizar a justiça social, com base nos seguintes princípios: liberdade de iniciativa;
valorização do trabalho como condição da dignidade humana; função social da
propriedade; harmonia e solidariedade entre os fatores de produção; desenvolvimento
econômico; repressão ao abuso do poder econômico, caracterizado pelo domínio dos
mercados, a eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros. O § 8º do art.
157 previa intervenção no domínio econômico e o monopólio (!) de determinada indústria
ou atividade, mediante lei federal, quando indispensável por motivo de segurança nacional
ou para organizar setor que não pudesse ser desenvolvido com eficiência no regime de
competição. O art. 162 estabeleceu que a pesquisa e lavra do petróleo em território
nacional constituem monopólio da União, na forma da lei. O art. 163 estabelecia a
primazia da iniciativa privada na exploração da atividade econômica, a qual deveria ser
estimulada e apoiada pelo Estado, que poderia exercer diretamente a atividade econômica
para suplementar a atividade exercida pela iniciativa privada. O art. 166 vedava a
propriedade e a administração de empresas jornalísticas a estrangeiros, a sociedades que
tivessem sócios estrangeiros ou pessoas jurídicas (excetos partidos políticos) e a
sociedades anônimas com ações ao portador. A Emenda Constitucional nº 1/69 tratou da
matéria nos arts. 160 a 174, sem inovar substancialmente.
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3.1.A ordem econômica na Constituição Federal de 1988.
O cerne do direito econômico está no Título VII da Constituição Federal,
arts. 170 a 192, que consagra a ordem econômica e financeira.
O Título VII está dividido em quatro capítulos. Além dos princípios gerais
da atividade econômica, previstos nos art. 170 a 181 (Capítulo I), a Constituição Federal
de 1988 trata da política urbana (Capítulo II), da política agrícola e fundiária e da reforma
agrária (Capítulo IIII) e do sistema financeiro nacional (Capítulo IV).
Como é até intuitivo, o modo de produção capitalista, em sua versão
social-democrata, foi positivada pela Constituição de 1988. 41
A atividade econômica está baseada na livre iniciativa. Isso significa que,
como regra geral, o Estado não exercerá diretamente a atividade econômica. Isso é
incumbência dos particulares.
Mas o princípio constitucional da livre iniciativa não significa que o
empresário tem o direito de fazer o que bem entender - não há plena liberdade no sentido
ultra-liberal do termo. Há limitações.
A existência de limitações à atividade privada (poder de polícia), inclusive
à atividade econômica, não contradiz com a existência da livre iniciativa como princípio
básico da ordem econômica. A regulação da atividade econômica, por parte do Estado,
em menor ou maior grau, é indispensável para a manutenção do sistema capitalista. Não
há país no mundo que não tenha um mínimo de regulamentação e de restrições à
atividade econômica.
41
SILVA, Bruno Mattos e. Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário. São Paulo: Atlas, 2007, p. 79.
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O art. 170 da Constituição Federal estabelece alguns princípios da ordem
econômica constitucional. Podemos destacar o da livre iniciativa e o da função social da
propriedade. Esses princípios não devem ser interpretados isoladamente, mas sim em
consonância com os demais princípios positivados em todo o texto da Constituição. É de
meridiana clareza que o objetivo do constituinte, ao estabelecer esses princípios, foi o de
criar um sistema em que a produção gerasse bem estar social, para toda a população, e
não apenas lucro para os empresários.
A esse respeito, merece ser transcrita a lição de Eros Roberto Grau:42
a ordem econômica na Constituição de 1988 consagra um regime de
mercado organizado, entendido como tal aquele afetado pelos preceitos da ordem
pública clássica (Geraldo Vidigal); opta pelo tipo liberal do processo econômico,
que só admite a intervenção do Estado para coibir abusos e preservar a livre
concorrência de quaisquer interferências, quer do próprio Estado, que do embate
econômico que pode levar à formação de monopólios e ao abuso do poder
econômico visando aumento arbitrário dos lucros - mas sua posição corresponde
ao do neo-liberalismo ou social-liberalismo, como a defesa da livre iniciativa
(Miguel Reale); (note-se que a ausência do vocábulo 'controle' no texto do art. 174
da Constituição assume relevância na sustentação dessa posição; a ordem
econômica na Constituição de 1988 contempla a economia de mercado,
distanciada porém do modelo liberal puro e ajustada à ideologia neo-liberal
(Washington Peluso Albino de Souza); a Constituição repudia o dirigismo, porém
acolhe o intervencionismo econômico, que não se faz contra o mercado, mas a seu
favor (Tércio Sampaio Ferraz Júnior); a Constituição é capitalista, mas a liberdade
apenas é admitida enquanto exercida no interesse da justiça social e confere
prioridade aos valores do trabalho humano sobre todos os demais valores da
economia de mercado (José Afonso da Silva)
A evolução das relações de produção, a necessidade de melhorar as
condições de vida dos trabalhadores e o mau uso da liberdade conferida aos empresários
no sistema capitalista (no qual é falaciosa a 'harmonia natural dos interesses” de
empresários e trabalhadores) fizeram surgir mecanismos de condicionamento da atividade
privada, com o objetivo de ser realizada a justiça social. Nessa perspectiva é que deve ser
o texto do art. 170 da Constituição Federal compreendido: trata-se de uma Constituição
preocupada com a justiça social e com o bem estar coletivo. 43
42
A ordem econômica na Constituição de 1988, 4. ed., São Paulo: Malheiros, 1998, p. 212-213
43
SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 13. ed.. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 725-726.
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O século XX foi o século da social-democracia preocupada em manter o
sistema capitalista intacto, mediante uma melhoria das condições de vida dos
trabalhadores. O exemplo do sucesso dessa doutrina está nos países da Europa
ocidental, especialmente nos países escandinavos, onde a social-democracia
efetivamente confere boas condições de vida para a população. Nos países periféricos,
contudo, as tentativas de implantação dessa idéia não têm propiciado os mesmos
resultados. De todo modo, a Constituição Federal de 1988 positivou os princípios da
social-democracia.
Ensina-nos o Prof. Carlos Jacques Vieira Gomes que há duas categorias
de princípios jurídicos na Constituição de 1988: os princípios liberais ou estatutários, e os
princípios intervencionistas ou conformadores, que compõem a constituição econômica
em sentido formal e definem a ordem econômica instituída. Os princípios liberais são os
que se opõem ou limitam a intervenção do Estado, garantindo uma esfera de isenção ao
particular em face da ação estatal, e os princípios intervencionistas são os que justificam e
impõe essa intervenção, como forma de conformar a realidade econômica e social. Dentre
os princípios liberais – aduz o mencionado autor – pode-se citar a livre iniciativa
econômica (arts. 1º, IV, 5º, XIII e 170, caput) e o direito à propriedade privada dos meios
de produção e de consumo (arts. 5º, XXII e 170, II); e, dentre os princípios
intervencionistas, pode-se mencionar a dignidade da pessoa humana (arts. 1º, III e 170,
caput), o valor social do trabalho (arts. 1º, IV e 170, caput), a função social da propriedade
(arts. 5º, XXIII e 170, III), o objetivo de construção de uma sociedade livre e solidária (art.
3º, I), dentre outros.44
Ao lado da política de seguridade social, de prestação de serviços
públicos, enfim, de proteção da população, para atingir os objetivos de bem estar social, é
protegida a liberdade de iniciativa dos particulares, mas é também permitida pela
Constituição não apenas a regulamentação dessa atividade econômica e a até a própria
44
GOMES, Carlos Jacques Vieira. Ordem econômica constitucional e direito antitruste. Porto Alegre: S. ª Fabris, 2004,
pp. 82-84.
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exploração diretamente pelo Estado, nos limites estabelecidos pelo art. 173 da
Constituição Federal. A regra geral, porém, é que incumbe o exercício da atividade
econômica aos particulares: a atuação direta do Estado como agente produtivo é
excepcional. Veremos os instrumentos de que dispõe o Estado para agir como empresário
nos itens 3 e .3.1 do Capítulo II.
É fundamental ter em mente que a liberdade de atividade econômica
somente pode ser limitada pela lei, assim como o direito privado - que rege a atividade
econômica - prestigia a teoria da autonomia da vontade. Nesses pressupostos estão
assentados o modelo jurídico do liberalismo econômico vigente no Brasil.
Ainda que a planificação econômica não seja um princípio da ordem
constitucional brasileira, há um nítido caráter de constituição dirigente na Constituição
Federal de 1988. Existem objetivos a serem atingidos: “assegurar a todos existência
digna” (art. 170); “bem-estar e justiça sociais” (art. 193) etc
Portanto, o Estado tem um papel de indutor da atividade econômica, que
pode ser exercido mediante poder normativo, que tem forte carga transformadora da
realidade fática. É o que veremos no item 1 do Capítulo II.
Feitas essas considerações, vejamos os princípios da ordem econômica,
tal como positivada pela Constituição Federal.
De acordo com o caput do art. 170, da Constituição Federal, a ordem
econômica está fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa. O escopo
é assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social.
A interpretação da legislação infraconstitucional e até mesmo dos
dispositivos constitucionais deve ser feita de acordo com os seguintes postulados:
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• valorização do trabalho;
• livre iniciativa;
• existência digna a todos;
• justiça social.
O fundamento da ordem econômica é a valorização do trabalho humano e
a livre iniciativa. Ou seja, o legislador constituinte deixou clara a opção pelo liberalismo
econômico, em sua versão social-democrata. Isso significa que o Estado brasileiro não
deve ser omisso na condução da economia. Ao contrário, deve agir.
Assim, “A livre iniciativa é expressão de liberdade titulada não apenas pela
empresa, mas também pelo trabalho. Por isso a Constituição, ao contemplá-la, cogita
também da ‘iniciativa do Estado’; não a privilegia, portanto, como bem pertinente apenas à
empresa”.45
O art. 170 também estabelece alguns princípios, que norteiam a ordem
econômica. São eles:
• soberania nacional;
• propriedade privada;
• função social da propriedade;
• livre concorrência;
• defesa do consumidor;
• defesa do meio ambiente;
• redução das desigualdades regionais e sociais;
• busca do pleno emprego;
• tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte
constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e
administração no País.
45
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Como se pode notar, “São princípios que devem ser observados na
atividade econômica: I. Propriedade privada e função social da propriedade; II. Livre
concorrência e defesa do consumidor; III. Defesa do meio ambiente e redução das
desigualdades regionais e sociais”, mas não fazem parte desse rol a “IV - Busca do pleno
emprego e pluralismo político”.46
Além disso, os arts. 172 a 181 estabelecem princípios e regras, dentro do
contexto geral dos princípios gerais da atividade econômica.
Não é difícil concluir a Constituição Federal estabeleceu uma economia de
mercado. A iniciativa privada é um princípio básico dessa ordem econômica, de natureza
capitalista. Porém, essa mesma ordem econômica dá prioridade aos valores do trabalho
humano sobre todos os valores da economia de mercado. Isso deve orientar a intervenção
do Estado na economia, para fazer valer os valores sociais do trabalho que, ao lado da
iniciativa privada, são fundamentos da ordem econômica e do próprio Estado brasileiro, a
teor do art. 1º, IV, da Constituição Federal. 47
Os arts. 173, 174 e 175 da Constituição Federal estabeleceram que o
Estado regula a economia, presta serviços públicos e, em caráter excepcional, exerce
atividade econômica. São atividades que não se confundem, devendo ser
complementares, como veremos no capítulo seguinte.
Já o art. 176 estabelece o seguinte:
Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os
potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para
efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao
concessionário a propriedade do produto da lavra.
§ 1º A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos
potenciais a que se refere o "caput" deste artigo somente poderão ser efetuados
46
Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Concurso para Juiz de Direito– Prova tipo 1, aplicação em agosto
de 2007, questão nº 9, alternativa “b) As proposições I, II e III estão corretas”.
47
SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 720.
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mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por
brasileiros ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e
administração no País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas
quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras
indígenas.
§ 2º - É assegurada participação ao proprietário do solo nos resultados da
lavra, na forma e no valor que dispuser a lei.
§ 3º - A autorização de pesquisa será sempre por prazo determinado, e as
autorizações e concessões previstas neste artigo não poderão ser cedidas ou
transferidas, total ou parcialmente, sem prévia anuência do poder concedente.
§ 4º - Não dependerá de autorização ou concessão o aproveitamento do
potencial de energia renovável de capacidade reduzida.
Assim, é errada a seguinte assertiva: “Considere que o presidente da
República outorgue, por intermédio de decreto, à pessoa jurídica Shevchenko do Brasil,
com sede em Moscou, Rússia, concessão para pesquisa e lavra de jazida de carvão
mineral em determinada região brasileira. Nessa situação, segundo a ordenação
normativa vigente, o ato de concessão será considerado constitucional se, em virtude do
interesse nacional, a outorga tiver sido realizada com base no grau de especialização da
referida pessoa jurídica”.48
É correto dizer que “A construção de pequena represa em propriedade
rural, para o aproveitamento do potencial de energia hídrica, a fim de suprir a demanda de
energia elétrica da casa dos proprietários, independe de autorização ou concessão”.49
Portanto, não se deve confundir a atuação direta do Estado como agente
produtivo, que é excepcional, com a atuação do Estado na economia como agente
normativo, prestador de serviços públicos, sancionador de condutas lesivas à ordem
econômica etc., que nada tem de excepcional. Nesse sentido, já afirmou o STF:
É certo que a ordem econômica na Constituição de 1988 define opção por
um sistema no qual joga um papel primordial a livre iniciativa. Essa circunstância
48
CESPE/UnB – Advocacia-Geral da União, Concurso Público para Procurador Federal, Prova Objetiva P1, aplicação
em 1º/7/2007, questão nº 88.
49
CESPE/UnB – Advocacia-Geral da União, Concurso Público para Procurador Federal, Prova Objetiva P1, aplicação
em 1º/7/2007, questão nº 89.
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não legitima, no entanto, a assertiva de que o Estado só intervirá na economia em
situações excepcionais.
50
Em resumo e em conclusão: a Constituição tem força normativa, podendo
ser um meio de transformar a realidade. A primeira Constituição brasileira a tratar da
ordem econômica foi a de 1934. De acordo com a Constituição Federal de 1988, a
atividade econômica está baseada na livre iniciativa. Isso significa que, como regra geral,
o Estado não exercerá diretamente a atividade econômica: a atuação direta do Estado
como agente produtivo é excepcional.
50
STF, ADI nº 1.950/SP, Rel. Min. EROS GRAU, j. em 03/11/2005, DJ de 02-06-2006.
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CAPÍTULO II
AÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA
1.O Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica.
Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado
exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este
último determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. É o que dispõe o
art. 174 da Constituição Federal.
De acordo com o princípio das prescrições obrigatórias, uma das partes
da relação jurídica dá à outra uma instrução que tem caráter obrigatório.51
Durante o período socialista na Polônia, país em que parte significativa da
economia se manteve nas mãos de particulares, as regras do planejamento econômico
eram obrigatórias também para o setor privado.
No Brasil, de acordo com o art. 174 da Constituição Federal, exatamente
porque o planejamento é apenas indicativo para o setor privado, no que se refere ao
planejamento, não existe no direito brasileiro o princípio das prescrições obrigatórias para
o setor privado. Já para o setor público, esse princípio é plenamente aplicável, de acordo
com o mesmo art. 174.
Porém, o art. 174 estabelece as prescrições obrigatórias existirão para os
particulares fora do âmbito do planejamento, quando o Estado é agente normativo e
regulador da atividade econômica.
51
GRILLO, Luisa Rodriguez et al. Derecho economico - temas complementarios. Havana: Facultad de Derecho
Universidad de La Habana, 1989, p. 13.
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A intervenção do Estado como agente normativo e regulador da atividade
econômica pode ocorrer por direção e por indução, duas modalidades de intervenção
indireta.
Intervenção por direção ocorre por meio de criação de regras de
observância obrigatória e de incidência direta nas relações econômicas públicas e
privadas. Ex. congelamento de preços; criação de agência reguladora.
Intervenção por indução ocorre sem se estabelecer regras de incidência
direta nas relações jurídicas privadas, mas sim por meio de regras instrumentais que
indiretamente afetam a atividade econômicas, seja incentivando, seja desincentivando
determinadas atividades. Ex. tributação com caráter extrafiscal: imposto de importação,
incentivos fiscais.
A existência de expressa previsão constitucional para a normatização e
regulação da atividade econômica não contradiz com o livre mercado, com a devida venia
de Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que afirma justamente o contrário.52
Na verdade, a
saúde do livre mercado depende de ação estatal.
Aliás, é o próprio art. 174 da Constituição Federal que fundamenta a
possibilidade legal da existência de agências reguladoras, bem como da possibilidade
dessas agências criarem normas jurídicas. O vocábulo agência tem origem na palavra
agency, que consiste, de acordo com o direito norte-americano, em uma autarquia com
poder de regulação em campos específicos da economia. Evidentemente, a atuação das
agências não é feita contra o livre mercado; muito ao revés, as agências desempenham
papel fundamental para a saúde do mercado, ao prescrever regras de conduta
52
"O art. 174 define o Estado 'como agente normativo e regulador da atividade econômica'. Assim, não seria o mercado,
como é típico de uma economia descentralizada (ou liberal), mas o Poder Público, segundo é próprio de uma economia
de tipo centralizado (ou soviético), que regeria a economia. Isto colide com os princípios de livre iniciativa, livre
concorrência, que a Constituição consagra (arts. 1º, IV, caput e inc. IV), que atenuam esse centralismo econômico."
(FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional, de acordo com a Constituição de 1988. 18.
ed. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 306)
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(regulação), ao fiscalizar e punir (direito administrativo sancionador) os componentes do
mercado que agirem de forma indevida, nociva ao mercado.
Foi considerado correto dizer que “As agências reguladoras são
autarquias sob regime especial, que é caracterizado pela independência administrativa,
pela autonomia financeira e pelo poder normativo atribuídos a essas agências”.53
A atividade de regulação da economia (entendendo-se que a economia
abrange a atividade econômica em sentido estrito e a prestação de serviços públicos)
consiste em uma forma de intervenção indireta na atividade econômica.
Por isso é certo dizer que "A criação de agência para regular serviços
públicos, privatizados ou não, constitui forma de intervenção indireta do Estado na
atividade econômica".54
Pelas mesmas razões, está errado dizer que "O controle dos atos de
concentração econômica, na forma prevista pela Lei nº 8.884/1994, constitui forma de
intervenção direta do Estado na atividade econômica".55
Um dos instrumentos de intervenção por indução da atividade econômica
para fins previamente determinados (ex. defesa do mercado, estímulo a determinadas
atividades econômicas, combate a excessiva volatilidade de preços de certos produtos
etc) é a instituição de contribuição social de intervenção no domínio econômico (CIDE), na
forma do art. 149 da Constituição Federal.
Assim, de acordo com a jurisprudência do STJ, as contribuições de
intervenção no domínio econômico são constitucionalmente destinadas a finalidades não
53
UnB/CESPE – Concurso Público para Juiz Federal Substituto da 5ª Região - CADERNO FREVO – aplicação em
24/7/2005, questão nº 36.
54
Questão nº 62 (1) da prova realizada pelo CESPE em 3/3/2002, Concurso Público para provimento do cargo de
Consultor Legislativo do Senado Federal - Área 5 - Direito Comercial e Econômico.
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diretamente referidas ao sujeito passivo, o qual não necessariamente é beneficiado com a
atuação estatal e nem a ela dá causa (referibilidade). Isso as distingue das contribuições
de interesse de categorias profissionais e de categorias econômicas. A CIDE afeta toda a
sociedade e obedecem ao princípio da solidariedade e da capacidade contributiva,
refletindo políticas econômicas de governo.56
A instituição de CIDE é de competência da União, que pode criá-las por lei
ordinária. O STF, já afirmou que a CIDE “não é imposto”, concluindo que “não se exige
que a lei complementar defina a sua hipótese de incidência, a base imponível e
contribuintes”.57
É correto dizer que “O produto da arrecadação da contribuição de
intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação e comercialização
de petróleo e seus derivados será destinado, entre outros fins, ao financiamento de
programa de infra-estrutura de transportes”,58
por expressa disposição do art. 177, § 4º, da
Constituição Federal.
Um interessante (sob o aspecto jurídico...) exemplo de intervenção por
indução foi a ampliação da desoneração de ICMS para mercadorias destinadas ao exterior
para os produtos primários e semi-elaborados, levada a cabo pelo art. 3º, II, da Lei
Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir) e pela Emenda
Constitucional nº 42, de 19 de dezembro de 2003, que alterou a alínea “a” do inciso X do §
2º do art. 155 da Constituição Federal. Objetivou-se, evidentemente, o aumento das
exportações desses produtos, ainda que eles sejam de baixo valor agregado. Foi uma
opção política do Governo da época, instrumentalizada nas referidas normas jurídicas.
55
Questão nº 62 (5) da prova realizada pelo CESPE em 3/3/2002, Concurso Público para provimento do cargo de
Consultor Legislativo do Senado Federal - Área 5 - Direito Comercial e Econômico.
56
STJ, SEGUNDA TURMA, REsp 933.440/PR, Rel. Min. ELIANA CALMON, j. em 02.08.2007, DJ de 14.08.2007.
57
STF, Segunda Turma, AI-ED 518082 / SC, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, j. em 17/05/2005, DJ de 17-06-2005.
58
CESPE/UnB – Advocacia-Geral da União, Concurso Público para Procurador Federal, Prova Objetiva P1, aplicação
em 1º/7/2007, questão nº 90.
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Evidentemente, esse tipo de intervenção é considerada intervenção
indireta, que, como vimos acima, abrange a intervenção por direção e a intervenção por
indução. Portanto, é errado dizer que “O ato de restituição do ICMS sobre a exportação de
produtos industrializados é considerado modalidade de intervenção direta do Estado no
domínio econômico”.59
O Estado deve ser dotado de meios eficazes para intervenção no domínio
econômico. É correto afirmar que “É dispensável a licitação quando a União tiver que
intervir no domínio econômico para regular preços ou normalizar o abastecimento”,60
a
teor do disposto no inciso VI do art. 24 da Lei nº 8.666/93 (Lei de Licitações).
2.O Estado prestador de serviços públicos.
Cabe ao Estado a prestação de serviços públicos. Os serviços públicos
devem ser prestados diretamente pelo Estado ou por particulares, sob regime de
concessão ou permissão, de acordo com o art. 175 da Constituição Federal.
Vimos no item 1.1 a definição de atividade econômica, bem como que
parte da atividade pode ser qualificada como serviços públicos.
O que são serviços públicos?
A Constituição Federal não define o que seja serviço público. Diz que
“Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou
permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos” (art. 175).
59
CESPE/UnB – Advocacia-Geral da União, Concurso Público para Procurador Federal, Prova Objetiva P1,
aplicação em 1º/7/2007, questão nº 91.
60
TJDF, Concurso para Juiz de Direito, prova objetiva, aplicação em 1º/4/2007, questão nº 21.
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Não é pacífica a definição do que seja serviço público. A doutrina já definiu
como "todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e
controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade
ou simples conveniências do Estado"61
e já definiu como “toda atividade de oferecimento
de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas
fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus
deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito
Público”,62
dentre outras possíveis.
O cerne da divergência entre os vários administrativistas reside em excluir
da noção de serviço público as atividades estatais que não constituam em uma prestação
de utilidade material ou comodidade material singularmente fruível pelos administrados.
Ou seja, para alguns autores, como Celso Antônio Bandeira de Mello,
somente constitui serviço público a atividade de prestação de serviços uti singuli, excluída
a noção de serviço público em sentido amplo, que inclui os serviços uti universi, pois se
considerarmos como serviço público toda a atividade estatal, a noção de serviço público
não teria qualquer utilidade, pois se confundiria com a noção de atividade pública.63
Já outros autores, como Hely Lopes Meirelles, incluem no conceito de
serviço público outras atividades estatais, tais como a atividade de polícia, de defesa
nacional, de preservação da saúde pública, iluminação pública, bem como as atividades
executadas para atender às necessidade internas da Administração (“serviços
administrativos”) e os serviços prestados a usuários indeterminados (“serviços uti
universi”).64
61
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 294.
62
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 15a
. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 612.
63
MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 15a
. ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 615 e
616.
64
MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 1994, pp. 286-288.
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Prefiro a noção restrita de Celso Antônio Bandeira de Mello. Além dos
motivos mencionados, a jurisprudência está pacificada no sentido de que as atividades
prestadas pelo Estado que não sejam serviço público específico e divisível não podem
ensejar a cobrança de taxa.65
É verdade que nada impede que um imposto custeie um
serviço público, mas a mim parece quebrar a coerência do sistema jurídico dizer que
certos “serviços” não podem ser custeados por taxa! Afinal de contas, a definição de taxa
é exatamente esta: tributo para custear a prestação de um serviço público específico e
divisível (art. 145, II, da Constituição Federal) ou o exercício do poder de polícia. É
evidente que se pode sustentar que há outros serviços públicos que não são específicos
ou divisíveis, para os quais não se pode cobrar taxa: a noção de serviço público, como
vimos acima, não é pacífica. Para fins de concurso público, deve o estudante conhecer a
nítida divergência existente na doutrina.
Seja como for, a atividade econômica prestada com as características
mencionadas acima deve ser considerada serviço público. É que serviço público faz parte
da atividade econômica considerada em sentido amplo; portanto, há que se diferenciar a
expressão atividade econômica, tomada como gênero, da expressão atividade econômica
em sentido estrito, essa última sim com significado diferenciado de serviço público. O
gênero atividade econômica contempla as espécies serviço público e atividade econômica
em sentido estrito. 66
Em sentido diverso, a Min. Eliana Calmon afirma que serviços públicos
podem ser próprios ou gerais, nos casos em que não há possibilidade de identificação dos
usuários, hipóteses em que são financiados por tributos e prestados pelo próprio Estado
65
“CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. TAXA DE LIMPEZA PÚBLICA: MUNICÍPIO DE IPATINGA/MG. C.F.,
art. 145, II. CTN, art. 79, II e III. I. - As taxas de serviço devem ter como fato gerador serviços públicos específicos e
divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição. Serviços específicos são aqueles que podem ser
destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidade públicas; e divisíveis, quando
suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos usuários. CTN, art. 79, II e III. II. - Taxa de Limpeza
Pública: Município de Ipatinga/MG: o seu fato gerador apresenta conteúdo inespecífico e indivisível. III. - Agravo não
provido.” (STF, Segunda Turma, RE (AgR) nº 366086/MG, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, j. em 10/06/2003, DJ de
1º/8/2003)
66
GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 4ª ed., São Paulo: Malheiros, 1998, p. 131.
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(ex. segurança pública); ou podem ser impróprios ou individuais, nos casos em que os
destinatários são determinados ou determináveis, hipóteses em que podem ser prestados
por órgãos da administração indireta ou por meio de delegação, mediante concessão e
permissão de serviços públicos (art. 175 da Constituição Federal e Lei nº 8.987/95). Desse
modo, os serviços prestados por concessionárias são remunerados por tarifa, sendo
facultativa a sua utilização e plenamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor.67
A Constituição Federal estabelece quais são as Unidades da Federação
competentes para a prestação de determinados serviços públicos. Há as competências
comuns a todas as unidades da Federação (União, Estados, Distrito Federal e
Municípios), que estão elencadas no art. 23 da CF.
Além das competências comuns, há as competências materiais atribuídas
da União, taxativamente previstas no art. 21.
Para os Estados, há uma única competência expressa: é a competência
para exploração dos serviços locais de gás canalizado (art. 25, § 2º), mas os Estados
dispõem das competências remanescentes (isto é, o que não for previsto na Constituição
é de competência dos Estados).
Já os Municípios têm como competências a prestação de serviços
públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo; a de manter, com a
cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré-
escolar e de ensino fundamental e a de prestar, também com a cooperação técnica e
financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população.
Ao Distrito Federal compete a prestação dos serviços públicos de
competência dos Estados e dos Municípios.
67
STJ, SEGUNDA TURMA, REsp 705.203/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, j. em 11/10/2005, DJ 07.11.2005.
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3.Atividade econômica exercida pelo Estado.
O Estado pode realizar determinadas atividades reservando-se o exercício
em monopólio por razões de interesse público. Além disso, são comuns os casos de
exercício público de atividades econômicas em regime de concorrência com a iniciativa
privada.68
Como conseqüência do princípio da livre iniciativa (art. 170, caput),
fundamento da ordem econômica, a atividade exercida pelo Estado é excepcional.
Quando pode o Estado exercer atividade econômica?
Diz o caput do art. 173 da própria Constituição Federal:
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração
direta de atividade econômica pelo Estado só será admitida quando necessária aos
imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme
definidos em lei.
Inicialmente, observamos que há casos expressos na Constituição em que
o Estado deve desempenhar atividade econômica.
É a hipótese do art. 177, que estabelece monopólios da União sobre:
pesquisa e lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos;
refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; importação e exportação dos produtos e
derivados básicos das atividades mencionadas; transporte marítimo do petróleo bruto de
origem nacional ou derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o
transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de
qualquer origem; pesquisa, lavra, enriquecimento, reprocessamento, industrialização e
68
ASCARELLI, Túlio. Iniciación al estudio del derecho mercantil. Traduzido para o espanhol por Evello Verdera y
Tuells. Barcelona: Bosch, 1964, p. 198-199.
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comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados (com exceção dos
radioisótopos, que podem ser explorados por particulares mediante permissão em casos
específicos).
É correto dizer que “O monopólio é uma forma de intervenção do Estado
na economia e está previsto expressamente, na Constituição Federal, para a hipótese de
transporte de petróleo, de seus derivados e de gás natural, de origem nacional ou
estrangeira, por meio de conduto”.69
É também a hipótese do art. 21, XXIII, que estabelece ser de competência
da União explorar os serviços e instalações nucleares e exercer em regime de monopólio
a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio
de minérios nucleares e seus derivados, nos termos em que especifica.
É certo, portanto, dizer que "A Constituição da República prevê áreas em
que a exploração direta de atividade econômica pela União é feita por meio de
monopólios"70
Fora das hipóteses previstas na Constituição, somente poderá haver
exercício de atividade econômica pelo Estado quando necessária aos imperativos da
segurança nacional ou relevante interesse coletivo, na forma da lei.
Está correto dizer que "apesar de reconhecida a primazia da iniciativa
privada, caberá a atuação do Estado onde o legislador, numa decisão política, entender
existir um 'relevante interesse coletivo'".71
69
CESPE/UnB – TRF-5ª Região, Concurso Público para Juiz Federal, prova objetiva, aplicação em 30/7/2006, questão
nº 1.
70
CESPE/UnB, Concurso para provimento de cargos de Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados - Área VII -
Finanças e Direito Comercial, Questão nº 75 (4), prova realizada em 29/9/2002.
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O exercício de atividade econômica em sentido estrito pelo Estado
constitui intervenção direta do Estado na economia.
Por isso, está correto dizer que "A criação de empresa estatal para
explorar atividade econômica necessária aos imperativos da segurança nacional constitui
forma de intervenção direta do Estado na atividade econômica".72
A intervenção direta na economia também é chamada de intervenção por
absorção (o Estado exerce a atividade econômica em regime de monopólio) ou por
participação (o Estado exerce a atividade econômica em regime de competição com
particulares).
2.3.1.Exploração de atividade econômica pelas empresas estatais.
A princípio, qualquer pessoa ou qualquer grupo de pessoas pode exercer
atividade econômica.
O direito, porém, regula como essa atividade deve ser feita. Essa
regulação poderá ser objeto do direito econômico ou do direito comercial, agora visto
como o direito de empresas. Outros ramos do direito também fazem regulação de
aspectos da atividade econômica, como o direito do trabalho, o direito civil e o direito
administrativo.
Pode o Estado ser empresário?
71
FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional, de acordo com a Constituição de 1988. 18.
ed. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 306.
72
Questão nº 62 (3) da prova realizada pelo CESPE em 3/3/2002, Concurso Público para provimento do cargo de
Consultor Legislativo do Senado Federal - Área 5 - Direito Comercial e Econômico.
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A regra geral, conforme vimos no item 1.3.1, é no sentido de que o Estado
não deve ser empresário, pois incumbe à iniciativa privada e não ao Estado o exercício da
atividade econômica. Em regra, o empresário é uma pessoa física ou pessoa jurídica
privada; em certos casos, porém, o Estado poderá ser empresário.73
Com efeito, pode o
Estado explorar diretamente a atividade econômica quando for necessário para a
segurança nacional ou para atender a relevante interesse coletivo, conforme definidos em
lei (art. 173 da Constituição Federal).74
Nessas hipóteses, o Estado poderá criar pessoas jurídicas para essa
atividade. São elas: empresa pública e sociedade de economia mista.
Vejamos, inicialmente, as características comuns da empresa pública e da
sociedade de economia mista, que chamaremos, genericamente, de empresas estatais.
As empresas estatais podem explorar atividade econômica em pé de igualdade com os
particulares; há empresas estatais, porém, que prestam serviço público, tal como veremos
adiante.
Tanto a empresa pública como sociedade de economia mista têm seu
regime jurídico baseado na diretriz fixada pelo art. 173, da Constituição Federal, em sua
redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 04 de junho de 1998:
Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração
direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária
aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme
definidos em lei.
§ 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade
de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de
produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo
sobre:
I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade;
II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive
quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários;
III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações,
observados os princípios da administração pública;
73
RIVA-SANSEVERINO, Luisa. Disciplina delle attività professionali: impresa in generale. Bologna: N. Zanichelli;
Roma: Foro Italiano, 1977, p. 137.
74
SILVA, Bruno Mattos e. Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário. São Paulo: Atlas, 2007, p. 472.
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IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e
fiscal, com a participação de acionistas minoritários;
V - os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos
administradores.
§ 2º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista não
poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado.
§ 3º - A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a
sociedade.
(...)
É pacífico que a empresa pública e a sociedade de economia mista,
embora criadas por iniciativa do Poder Público, quer exerçam atividade econômica em
sentido estrito, quer prestem serviço público, são pessoas jurídicas de direito privado. O
regime jurídico das empresas estatais é de direito privado, parcialmente derrogado pelo
direito público, como inclusive se pode notar pela leitura do dispositivo constitucional supra
transcrito. Na verdade, exatamente em razão dessa parcial derrogação, acho que seria
mais adequado dizer que elas têm natureza híbrida, como afirmam alguns autores.75
Mas,
para fins de concurso, deve-se dizer que as empresas estatais são pessoas jurídicas de
direito privado, com o regime parcialmente derrogado pelo direito público.
Algumas normas de direito público são aplicáveis às empresas estatais:
necessidade de concurso público para admissão de empregados, necessidade de
obediência à Lei nº 8.666, 21 de junho de 1993 (Lei de Licitações) para contratar etc. O
art. 173, § 1º, da Constituição Federal prevê a edição de lei que tratará do regime jurídico
da empresa pública e da sociedade de economia mista que exploram atividade
econômica. Contudo, essa lei ainda não foi editada, razão pela qual, atualmente, todas
empresas estatais devem obedecer à Lei nº 8.666/93.
O cumprimento de execuções judiciais por parte da empresa pública e da
sociedade de economia mista, como regra geral, não é feito por meio de precatório; os
bens das empresas estatais, como regra geral, são passíveis de penhora; a execução dos
75
CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 10. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003,
p. 392.
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seus créditos é regida pelo Código de Processo Civil, e não pela Lei de Execução Fiscal76
;
seus trabalhadores são regidos pelo direito civil, se prestadores de serviço, ou pelo direito
do trabalho, se empregados, não existindo nos seus quadros a figura do servidor público,
regido pelo direito administrativo, que existe nas autarquias e fundações criadas pelo
Poder Público. Além disso, as empresas estatais são sujeitas ao controle do Tribunal de
Contas (art. 71 da Constituição Federal) e do Congresso Nacional (art. 49, X, da
Constituição Federal); e aplica-se aos seus dirigentes e empregados a proibição de
cumulação de cargos, nos termos do art. 37, XVII).
Com relação às sociedades de economia mista, é errado dizer que “os
servidores não concursados dessas sociedades podem ser aproveitados em órgãos da
administração direta, desde que já estivessem em exercício há 5 anos, na data da
promulgação da Constituição Federal de 1988”,77
bem como também é errado dizer que “é
permitida a contratação de pessoal para serviços permanentes por meio de ajuste civil de
locação de serviços, sem que isso configure escapismo à exigência constitucional do
concurso público”.78
Pelas mesmas razões, o mesmo se aplica à empresa pública e a
qualquer empresa controlada, direta ou indiretamente, pelo Poder Público.
Por isso se diz que as empresas públicas e sociedades de economia mista
são pessoas jurídicas de direito privado, com regime jurídico parcialmente derrogado pelo
direito público.
A sociedade anônima tem uma função social, não devendo apenas buscar
o lucro. Com relação às empresas estatais, a necessidade de cumprimento de fins sociais
tem relevo ainda maior. Certas situações que poderiam caracterizar abuso no poder de
controle em uma sociedade regida unicamente pelo direito privado poderão ser lícitas e
manifestamente justas em uma empresa estatal.
76
SILVA, Bruno Mattos e. Execução Fiscal. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 1.
77
CESPE/UNB – Procurador do Estado do Espírito Santo/Concurso Público – aplicação em 7/11/2004, questão nº 52.
78
CESPE/UNB – Procurador do Estado do Espírito Santo/Concurso Público – aplicação em 7/11/2004, questão nº 53.
DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva
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Assim, pode ser adequado do ponto de vista da ação estatal a venda de
determinados produtos a com reduzida margem de lucro, a preço de custo ou mesmo a
preços subsidiados, como forma de beneficiar um outro segmento da atividade econômica
ou mesmo a população em geral. Por exemplo, quando, em maio de 2006, foram elevados
os custos de empresa controlada da Petrobras que opera na Bolívia, por força de ato do
Governo local, o Presidente do Brasil declarou que esse aumento não seria repassado ao
consumidor brasileiro.79
A toda evidência, tratou-se de atitude lícita do controlador indireto,
no caso, o Governo brasileiro, já que a função social de uma empresa estatal tem
relevância maior do que a simples busca de lucros.
Quem opta por ser acionista de uma sociedade de economia mista sabe
(ou deveria saber) que o objetivo do controlador poderá não ser o lucro, assim como a
busca de outros objetivos fazem parte do regime jurídico da sociedade de economia mista
ou de uma empresa pública.
A teor do art. 4º, II, do Decreto-lei nº 200/67, as empresas públicas e as
sociedades de economia mista fazem parte da administração indireta. Essas entidades
vinculam-se ao Ministério em cuja área de competência estiver enquadrada sua principal
atividade (art. 4º, parágrafo único, do Decreto-lei nº 200/67) e estão abrangidas pelo art.
37, XXI, da Constituição Federal:
Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios
de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao
seguinte:
(...)
XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços,
compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública
que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que
estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da
proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação
técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.
DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva
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A teor do disposto no Decreto-lei nº 200/67, as empresas estatais estão
sujeitas à supervisão do Ministro de Estado competente, mas a elas estão asseguradas as
condições de funcionamento idênticas às do setor privado, cabendo ajustar-se ao plano
geral do Governo. As empresas estatais deverão estar habilitadas a prestar contas da sua
gestão, pela forma e nos prazos estipulados em cada caso; prestar a qualquer momento,
por intermédio do Ministro de Estado, as informações solicitadas pelo Congresso Nacional;
evidenciar os resultados positivos ou negativos de seus trabalhos, indicando suas causas
e justificando as medidas postas em prática ou cuja adoção se impuser, no interesse do
Serviço Público.
A Constituição Federal estabelece que as empresas públicas e as
sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às
do setor privado (art. 173, § 2º).
Portanto, é correto dizer que “Uma empresa pública federal constituída
para prestar serviços de transmissão de energia elétrica, não pode gozar de incentivos
fiscais não extensivos às empresas do setor privado”.80
mas está errado dizer que "as
empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios
fiscais", uma vez que a Constituição não veda privilégios fiscais para as empresas
estatais, mas apenas proíbe que tais privilégios não sejam extensivos às empresas
privadas, razão pela qual está correto dizer que "as empresas públicas e as sociedades de
economia mista, ao explorarem serviços públicos, poderão gozar de privilégios fiscais"81
e
está errado dizer que “As empresas públicas criadas para o desempenho de atividade
econômica relevante poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às empresas do
setor privado”.82
79
Notícia estampada na primeira página do jormal Correio braziliense de 6 de maio de 2006.
80
CESPE/UnB – Município de Vitória, Concurso Público para Procurador Municipal, aplicação em 3/6/2007, questão nº
97.
81
CESPE/UnB, Concurso para provimento de cargos de Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados - Área VII -
Finanças e Direito Comercial, Questão nº 75 (5), prova realizada em 29/9/2002.
82
Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Concurso para Juiz de Direito– Prova tipo 1, aplicação em agosto de 2007,
questão nº 58, alternativa “b” (incorreta).
DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva
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A Constituição Federal estabelece que a criação de empresa pública e de
sociedade de economia mista deve ser autorizada por lei:
Art. 37 (...)
XIX – somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a
instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação,
cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação;
A expressão autorização legislativa é utilizada também pela Lei nº
6.404/76, no caput do art. 236 ao tratar da constituição da sociedade de economia mista:
Art. 236. A constituição de companhia de economia mista depende de prévia
autorização legislativa.
A empresa pública e a sociedade de economia mista não são criadas por
lei, mas sim pelos procedimentos próprios, previsto na lei que autoriza a criação da
empresa pública e, no caso das sociedades de economia mista, na Lei nº 6.404/76. Assim,
é errado dizer que “As sociedades de economia mista e as empresas públicas têm em
comum a sua criação por lei”.83
Portanto, tecnicamente, as sociedades de economia mista e empresas
públicas não são “criadas” por lei (mas sim sua criação é autorizada por lei). Em um
concurso público, foi considerado correto dizer que, "com base no art. 37, XIX, da CF,
somente por lei específica podem ser criadas": "as autarquias" (alternativa "b", correta),
mas não "as sociedades de economia mista e suas subsidiárias" (alternativa "c", incorreta)
nem "todas as entidades de administração indireta" (alternativa "d", incorreta).84
83
CESPE/UNB/PGE-CE/Concurso Público – aplicação em 15/2/2004, questão 27(d).
84
TJRO - Concurso Público de Provas e Títulos para Ingresso e Remoção para os Serviços Notariais e de Registro do
Estado de Rondônia, realizado em 2004/2005, questão nº 6.
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  • 1. Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br
  • 2. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br INDICAÇÃO Este livro foi escrito para estudantes de concursos públicos que desejam estudar e realmente aprender a disciplina direito econômico. Não é uma tarefa fácil, especialmente considerando que, ao contrário das demais disciplinas jurídicas, o conceito, a autonomia e a abrangência do direito econômico ainda apresentam controvérsias na doutrina. O autor optou por seguir e explicitar, sempre quando possível, a doutrina pacifica ou majoritária, a jurisprudência dos tribunais, e respostas consideradas corretas em concursos públicos, evitando dar unicamente sua posição pessoal a respeito de cada questão. Ao longo e como parte do texto do livro, há respostas e assertivas que foram objeto de provas de concurso público, de modo que se possa ver, de forma atualizada, como certas questões estão sendo apreciadas pelas bancas examinadoras. SOBRE O AUTOR BRUNO MATTOS E SILVA é Bacharel em Direito pela USP, professor universitário, advogado em Brasília (DF) e Consultor Legislativo do Senado Federal. Foi Procurador-chefe do INSS nos tribunais superiores, Procurador Federal da CVM e Assessor Especial do Ministro do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. É autor dos livros “Compra de imóveis: aspectos jurídicos, cautelas devidas, análise de riscos” e “Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário”, ambos publicados pela Editora Atlas.
  • 3. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br SUMÁRIO NOTA DO AUTOR CAPÍTULO I - INTRODUÇÃO AO DIREITO ECONÔMICO 1.Definição de direito econômico. 1.1.Conceito de atividade econômica 2.Conteúdo, objeto e abrangência do direito econômico. Autonomia científica do direito econômico. 3.A ordem econômica constitucional. 3.1.A ordem econômica na Constituição Federal de 1988 CAPÍTULO II - AÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA 1.O Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica. 2.O Estado prestador de serviços públicos. 3.Atividade econômica exercida pelo Estado. 3.1.O Estado e as empresas estatais. 4.Conclusões a respeito do regime da ação estatal. CAPÍTULO III - DEFESA DA ORDEM ECONÔMICA 1.Repressão às infrações à ordem econômica. Lei nº 8.884/94. 1.1. O CADE - Conselho Administrativo de Defesa Econômica e a SDE -Secretaria de Direito Econômico. 2. Âmbito territorial de aplicação da Lei nº 8.884/94. 3.Infrações à ordem econômica 4.Fusão, incorporação e demais atos de concentração de empresas BIBLIOGRAFIA
  • 4. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br NOTA DO AUTOR O trabalho está dividido da seguinte forma: O Capítulo I faz uma análise geral do tema central proposto, define o que é atividade econômica, qual o objeto e abrangência do direito econômico e descreve as opções políticas que o Estado pode tomar na condução dessa atuação, materializadas na Constituição. O Capítulo II descreve as ações estatais na economia., que tratando da normatização da atividade econômica, da prestação dos serviços públicos e do exercício da atividade econômica em sentido estrito pelo Estado, seja diretamente, seja por meio de empresas estatais. O Capítulo III trata do regime jurídico das ações realizadas pelo Estado na defesa da ordem econômica, em especial da proteção do mercado, dado que a ordem econômica brasileira e mundial está baseada na livre iniciativa. Descreve as infrações à ordem econômica, trata da legislação antitruste, dos órgãos estatais responsáveis pela proteção do mercado e da concorrência e dos limites estabelecidos às ações dos particulares para que esses objetivos sejam atingidos.
  • 5. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br CAPÍTULO I INTRODUÇÃO AO DIREITO ECONÔMICO 1.1.Definição de direito econômico. O Estado atua na economia, seja exercendo diretamente atividade econômica, seja como agente regulador da atividade econômica. O regime jurídico dessa atuação tem sido chamado de direito econômico. Assim, o estudo do direito econômico consiste na análise, sob o aspecto jurídico, dos atos realizados pelo Estado que repercutem diretamente na economia. Devemos enfocar a abrangência desse regime jurídico (direito econômico), o objeto da ação estatal na economia, a ordem econômica estabelecida pela Constituição Federal e os meios utilizados pelo Estado para a proteção dessa ordem econômica. Como pressuposto óbvio para estudo do direito econômico, é preciso definir o que é atividade econômica, pois, como vimos acima, o direito econômico é a parte da ciência jurídica que estuda a ação estatal na economia. É o que veremos no subitem seguinte. No que se refere à análise regime jurídico da atuação estatal propriamente dita, o ponto de partida é a verificação dos modos pelos quais Estado pode atuar na economia. Iremos descrever quais são essas ações, classificando-as de uma forma didática. Analisando o presente, o passado recente e o passado distante, percebemos que a ação do Estado tomou diferentes formas e conteúdos, com diferentes
  • 6. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br matizes, mas sempre objetivando o desenvolvimento da atividade econômica e dos meios de produção. Por exemplo, em Atenas, havia a regra de que dois terços de todo o carregamento de trigo deveria ser vendido na cidade.1 Em Roma, durante certo tempo não houve freio algum contra a usura, mas Constantino se viu obrigado em momento posterior a abolir as antigas leis e a fixar a taxa de juros legítima em 100%.2 Mais recentemente, podemos citar a criação da URV – Unidade Real de Valor e das demais medidas de direcionamento da economia, materializadas no famoso “Plano Real”, durante o Governo de Itamar Franco, por meio das Medidas Provisórias nºs 434, de 27/02/1994, e 1.053, de 30/06/95, reeditadas e posteriormente convertidas nas Leis nºs 8.880, de 27/05/1994, e 10.192, de 14/2/2001. O Estado pode até mesmo ser agente da atividade econômica, seja diretamente, seja mediante a criação de empresas que exercerão a atividade econômica. Optamos por classificar em três as formas de ação estatal na economia: normatização, prestação dos serviços públicos e exercício de atividade econômica em sentido estrito. Veremos o que deve e o que não deve ser considerado atividade própria do Estado, bem como iremos analisar as ações estatais com o escopo de proteção do mercado. Depois de ver que elas podem ser regulatórias, prestadoras de serviços considerados públicos e até mesmo de exercício de atividade econômica propriamente dita, veremos como essas ações podem ser direcionadas para a proteção do mercado. 1 CORREA, Alexandre Augusto de Castro. “Existiu, em Roma, direito comercial?”. In Revista da faculdade de direito da universidade de São Paulo, v. 65, 1970, p. 68. FERRAZ, Manoel Martins de Figueiredo. “Aspectos jurídicos do comércio na Grécia antiga”. In Revista de direito civil, imobiliário, agrário e empresarial, v. 12, nº 44, abr./jun. 1988, p. 160-171.
  • 7. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Dentro da ordem política vigente, cabe à livre iniciativa o papel preponderante no exercício da atividade econômica. Coerente com esse postulado, cabe ao Estado a defesa da livre iniciativa, de modo a evitar que alguns grupos possam se apropriar de forma desordenada ou inadequada do espaço econômico, ou até mesmo prejudicar a atividade econômica e o interesse público mediante atos nocivos ou hostis. Assim, veremos como está regulada a ação estatal na defesa do mercado. 1.1.1.Conceito de atividade econômica. Antes de definir o que é atividade econômica, é preciso definir o que é atividade. Em sentido amplo, atividade é qualquer ação. Em termos mais estritos, atividade é uma série de atos concatenados, dirigidos a uma finalidade.3 Essa finalidade poderá ser econômica ou não. Assim, atividade econômica é qualquer atividade produtora de riquezas, que se opera por meio de transformação de produtos já existentes para a criação de produtos novos (à luz das ciências exatas, “nada se cria, tudo se transforma”). Ou seja, atividade econômica é a atividade criadora de riqueza ou de nova vantagem econômica.4 Atividade econômica compreende tudo aquilo que possa ser objeto de especulação lucrativa.5 2 BOCCARDO, Jeronimo. Historia del comercio, de la industria y de la economia política. Buenos Aires: Impulso, 1942, p. 71. 3 SZTAJN, Raquel. Teoria jurídica da empresa: atividade empresária e mercados. São Paulo: Atlas, 2003, p. 92. 4 COTTINO, Gastone. Diritto commerciale. v. 1. Padova: CEDAM, 1976, p. 69. 5 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 138.
  • 8. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br É necessário que a atividade econômica seja exercida com intuito de lucro? Lucro, que é a remuneração do exercente de atividade econômica, consiste na diferença entre os resultados e os custos da atividade. Os lucros poderão, em cada caso concreto, existir ou não. Existirão lucros se essa diferença for positiva; se for negativa, existirão prejuízos ou perdas. A atividade econômica, abstratamente considerada, é uma atividade que potencialmente é geradora de lucros ou de perdas.6 A doutrina tradicional considera que o objetivo da atividade econômica deveria ser o de lucro para fins de caracterização, sob o aspecto jurídico, como atividade empresária, pois se a atividade é profissional, tem-se implícito que é exercida com ânimo de lucro,7 bem como atividade econômica, por sua índole, seria necessariamente uma atividade de lucro.8 Por outro lado, também já se afirmou que a atividade econômica é suscetível de gerar lucros, ainda que ele não ocorra por razões de mercado, de má avaliação do empresário etc,9 ou mesmo nos casos em que isso ocorre por uma escolha do agente da atividade econômica, como é o caso da empresa pública, que poderá ou não gerar lucros.10 O intuito de lucro, portanto, seria um elemento natural, mas não essencial como motivo da atividade econômica.11 6 Vide, a respeito da diferença entre fins lucrativos e fins econômicos: SILVA, Bruno Mattos e. Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário. São Paulo: Atlas, 2007, p. 46, 47, 56, 57, 197, 200 e 201. 7 MARCONDES, Sylvio. Questões de direito mercantil. São Paulo: Saraiva, 1977, p. 11. ASCARELLI, Túlio. Iniciación al estudio del derecho mercantil. Traduzido para o espanhol por Evello Verdera y Tuells. Barcelona: Bosch, 1964, p. 172-173. 8 MESSINEO, Francesco. Manual de derecho civil y comercial. Traduzido para o espanhol por Santiago Sentis Melendo. Tomo II. Buenos Aires: EJEA, 1954-1956, p. 201. 9 CORSI, Francesco. Diritto dell’impresa. 2. ed. Milão: Giuffrè, 2003, p. 28. 10 RIVA-SANSEVERINO, Luisa. Disciplina delle attività professionali: impresa in generale. Bologna: N. Zanichelli; Roma: Foro Italiano, 1977, p. 134. CORSI, Francesco. Diritto dell’impresa. 2. ed. Milão: Giuffrè, 2003, p. 28. 11 ASQUINI, Alberto. “Perfis da empresa”. In Revista de direito mercantil, industrial, econômico e financeiro. Traduzido por Fábio Konder Comparato do artigo “Profili dell’impresa”, publicado em 1943 na Rivista del Diritto Commerciale, v. 41, I. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais. Nº 104, outubro-dezembro de 1996, p. 116.
  • 9. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br O Estado, por exemplo, pode criar uma empresa pública para exercer alguma atividade econômica com um objetivo que não seja o de gerar lucros para si, mas beneficiar a economia do país como um todo. Essa atividade é econômica? Evidente que sim, pois ela é potencialmente lucrativa, ainda que, por uma opção política, ela não o seja no caso concreto.12 Diante de tudo isso, parece ser mais adequado perceber que a atividade econômica deve ser abstratamente passível de gerar lucro, o que explicaria as hipóteses em que uma pessoa jurídica13 exerce atividade econômica organizada sem ânimo de obter lucro, mas apenas para exercer um fim social (ex. uma empresa estatal deficitária ou uma cooperativa). A questão é controvertida na doutrina.14 As atividades econômicas poderão ser consideradas como serviço público ou não, conforme opção política do legislador. A parcela da atividade econômica que não é considerada serviço público constitui a chamada atividade econômica em sentido estrito.15 Ou seja, partindo de uma noção ampla de atividade econômica – tudo aquilo que é potencialmente lucrativo – podemos fazer uma divisão entre a atividade econômica que está no campo de ação dos particulares (atividade econômica em sentido estrito) e a que está no campo de ação do Estado (serviço público). Contudo, o Estado também poderá explorar atividade econômica em sentido estrito (que poderá ser efetivamente lucrativa ou não), nos limites 12 “Che l’impresa pubblica non produca utili è conseguenza di uma scelta gestionale e política, non del carattere dell’attività.” (CORSI, Francesco. Diritto dell’impresa. 2. ed. Milão: Giuffrè, 2003, p. 28). 13 Para mais informações a respeito da teoria da pessoa jurídica, da personificação e da desconsideração da personalidade jurídica, vide: Bruno Mattos e. Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário. São Paulo: Atlas, 2007, p. 179-255. 14 GALGANO, Francesco.Trattado di diritto commerciale e di diritto pubblico dell’economia. V. 2. Padova: CEDAM, 1978, p. 55-56. AULETTA, Giuseppe. SALANITRO, Niccolò. Diritto commerciale. 11. ed. Milano: Dott. A. Giuffrè Editore, 1998, p. 16. 15 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na constituição de 1988. 4. ed. São Paulo: Malheiros, 1998, p. 132.
  • 10. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br constitucionais,16 assim como o particular poderá prestar serviço público, seja nas hipóteses em que essa prestação é livre (ex. hospitais, escolas),17 seja por concessão, nos termos da Lei nº 8.987, de 13 de fevereiro de 1995.18 E tanto é assim que o art. 175 da Constituição Federal,19 que se refere à prestação de serviços públicos, encontra-se no Título VII - Da Ordem Econômica e Financeira. Não se deve confundir, ademais, atividades econômicas (em sentido estrito) que, embora não sejam consideradas serviço público, dependem de autorização estatal (ex. atividade bancária, nos termos da Lei nº 4.595, de 31 de dezembro de 1964). Em resumo, atividade econômica é qualquer atividade produtora de riquezas, que se opera por meio de transformação de produtos já existentes para a criação de produtos novos. O conceito de atividade econômica prescinde da existência real ou mesmo do ânimo de lucro, mas a atividade deve ser teoricamente passível de gerar lucro. A parcela da atividade econômica que não é considerada serviço público constitui a chamada atividade econômica em sentido estrito. 20 1.2.Conteúdo, objeto e abrangência do direito econômico. O direito econômico como ramo autônomo do direito. A atuação estatal na econômica não é arbitrária, não podendo ser feita ao talante do governante. Ao contrário, há regência por normas jurídicas, criadas pelo próprio 16 Diz o caput do art. 173 da Constituição Federal: "Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será admitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei." 17 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 15a . ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 628. 18 SILVA, Bruno Mattos e. Direito administrativo para concursos. Brasília: Fortium, 2005, p. 66-68. 19 “Art. 175. Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos. Parágrafo único. A lei disporá sobre: I - o regime das empresas concessionárias e permissionárias de serviços públicos, o caráter especial de seu contrato e de sua prorrogação, bem como as condições de caducidade, fiscalização e rescisão da concessão ou permissão; II - os direitos dos usuários; III - política tarifária; IV - a obrigação de manter serviço adequado.” 20 SILVA, Bruno Mattos e. Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário. São Paulo: Atlas, 2007, p. 46, 47, 56, 57, 197, 200 e 201.
  • 11. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Estado, que vinculam a Administração Pública como um todo. O conjunto de princípios e regras que rege a atuação do Estado na economia é chamado de Direito Econômico. É intuitivo que cabe ao Estado regular relações privadas com conteúdo econômico. Pretende-se aqui discutir quais outras ações exercidas pelo Estado não se caracterizam como simples normas de direito privado. Assim, regras relativas ao fomento estatal da atividade econômica, à criação de uma situação favorável à atividade econômica, à proteção da concorrência e do mercado, entre outras, não parecem ser singelamente normas de direito privado. Com efeito, as normas dessas ações fazem parte do que passou a se chamar de direito econômico. O direito econômico pode estar constitucionalizado, isto é, pode ter seus princípios básicos contidos na Constituição. É o que ocorreu, no Brasil, a partir da Constituição de 1934, como veremos adiante. Qual o objeto do direito econômico? Dizer que o direito econômico é um direito da economia, embora tenha um fundo de verdade, não delimita seus exatos limites, uma vez que o direito civil e, principalmente, o direito comercial, regem relações jurídicas de caráter econômico. Aliás, até mesmo o direito administrativo e o direito do trabalho podem ter normas com conteúdo econômico!
  • 12. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Assim, é errado dizer que "A existência de um conteúdo econômico na norma é suficiente para transformá-la em norma de direito econômico, não sendo necessário que essa norma seja reguladora de uma política econômica".21 A diferença fundamental entre norma de direito econômico e conteúdo econômico da norma consiste no caráter norteador das normas de direito econômico, que materializam objetivos de política econômica.22 Já se afirmou que o direito econômico regeria relações econômicas. Durante o período soviético, uma corrente doutrinária sustentou que o direito econômico regeria não apenas a direção da atividade econômica pelo Estado, mas também as relações econômicas entre os diversos agentes econômicos.23 Visto desse modo, o objeto do direito econômico seria por demais amplo. Dando uma abrangência muito menor, já se afirmou que o direito econômico trata do "planejamento da economia nacional".24 Visto sob o ângulo objetivo, direito econômico consiste na positivação das opções de políticas econômicas estabelecidas pelo Estado. Essas opções, evidentemente, são as consagradas pela síntese das forças dominantes, que controlam o Estado. Nesse sentido, o direito econômico seria “uma espécie de ordenamento constitucional da economia, no qual se situariam os princípios básicos que devem reger as instituições econômicas”.25 Assim, o objeto do direito econômico seria um pouco mais amplo, pois além de tratar do planejamento, trata também da ação estatal. Daí o caráter instrumental do direito econômico. 21 Afirmativa constante da questão nº 58 (2), considerada errada pelo gabarito oficial, da prova realizada pelo CESPE em 3/3/2002 relativa ao Concurso Público para provimento do cargo de Consultor Legislativo do Senado Federal - Área 5 - Direito Comercial e Econômico 22 NUSDEO, Fábio. Curso de economia. Introdução ao direito econômico. 3. ed. São Paulo: RT, 2001. p. 206-207. 23 LAPTEV, V. Derecho economico. Trad. para o espanhol por Rene Gomez Manzano. Moscou: Progresso, 1988. p. 42. 24 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Atlas, 1991, p. 137. 25 COMPARATO, Fábio Konder. Ensaios e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 462.
  • 13. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br O objeto e limites do direito econômico ficará mais claro nos tópicos seguintes, mas desde logo podemos dizer que o objeto do direito econômico é a política econômica. Visto sob o ângulo objetivo, o direito econômico é o “conjunto das técnicas jurídicas de que lança mão o Estado contemporâneo na realização de sua política econômica. Ele constitui assim a disciplina normativa da ação estatal sobre as estruturas do sistema econômico, seja este centralizado ou descentralizado”.26 A finalidade de realização da política econômica do Estado é uma marca do direito econômico. Nisso consiste seu caráter instrumental, que no plano do direito constitucional faz parte da noção consagrada de constituição dirigente. Além dos princípios da ordem econômica positivados na Constituição Federal, o direito econômico, em si, tem princípios próprios. Existe um critério difundido na literatura jurídica no sentido de que cada ramo do direito possui princípios próprios. Assim, por exemplo, para o direito civil e também no direito comercial são aplicáveis o princípio de igualdade entre as partes; já no direito administrativo é aplicável o princípio de supremacia do ente público (estatal) sobre o particular. No direito econômico podemos perceber que ambos os princípios são aplicáveis, dependendo da situação concreta. Ao longo deste livro isto ficará evidente. O direito econômico não é um direito que protege precipuamente o interesse privado, tal como ocorre com o direito civil e o direito comercial. Muito ao revés, os interesses protegidos pelo direito econômico são direitos da coletividade. 26 COMPARATO, Fábio Konder. Ensaios e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 465.
  • 14. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br O direito civil e o direito comercial, na maior parte das vezes, tratam de direitos disponíveis; já o direito econômico versa, na maior parte dos casos, de direitos indisponíveis. É claro que o direito civil e o direito comercial têm também como objeto a proteção de valores sociais que são benéficos para a sociedade como um todo; contudo, eles protegem diretamente o interesse dos particulares, tendo sua função social exatamente por protegerem esses interesses privados, já que é de interesse da coletividade a proteção dos indivíduos também na condição de indivíduos, parte da sociedade. O mesmo não ocorre com o direito econômico, pois a proteção da saúde da economia beneficia diretamente a coletividade e, por via de conseqüência, indiretamente, os indivíduos. De um modo geral, as relações jurídicas de caráter horizontal são objeto do direito civil ou do direito comercial. São de caráter horizontal as relações jurídicas em que as partes estão em um mesmo patamar de igualdade, sem existir subordinação entre elas. Por outro lado, nas relações jurídicas de caráter vertical, nas quais a subordinação existe, o direito regente é o direito administrativo.27 Observe-se, por exemplo, o princípio de supremacia do interesse público em face do interesse particular, que norteia o direito administrativo. O direito econômico assume a feição de realização da política do Estado no campo econômico. Por exemplo, o Estado brasileiro opta em defender a concorrência. É um princípio positivado pelo art. 170, IV, da Constituição Federal, que é concretizado pelo CADE mediante aplicação da Lei nº 8.884/94. O Estado brasileiro opta também por defender o consumidor (art. 170, V, da Constituição Federal). A título comparativo, nos Estados Unidos, a Lei Sherman proíbe qualquer ato de concentração que prejudique a concorrência, sem abrir exceções (desconsideremos, por ora, a interpretação dada pelos tribunais americanos no sentido de 27 GRILLO, Luisa Rodriguez et al. Derecho economico - temas complementarios. Havana: Facultad de Derecho Universidad de La Habana, 1989, p. 7.
  • 15. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br mitigar a aplicação da Lei Sherman). Trata-se de uma opção política do legislador estatal: defender a concorrência, ainda que a defesa exacerbada da concorrência possa vir a prejudicar o consumidor. São opções políticas, que poderiam não existir ou poderiam existir de forma diferente. Ou seja, tanto nos países de economia planificada, como nos países de economia liberal, o direito econômico assume uma nítida feição de reger a organização e direção da economia por parte do Estado. Podemos dizer que o direito econômico é ramo autônomo do direito? Alguns autores, como por exemplo os professores de direito econômico da Universidade Estatal de Lomonosov de Moscou28 sustentam que a disciplina direito econômico está conformada por normas e distintos ramos do direito que interagem funcionalmente entre si, razão pela qual não é possível definir um objeto específico de regulação jurídica por parte do direito econômico. Essa posição também tem adeptos nos países ocidentais, onde vários autores sustentam o direito econômico seria um direito de superposição, exatamente por se sobrepor aos vários ramos da ciência jurídica, tal como um corte transversal na árvore do Direito.29 Outros autores defendem que o direito econômico é ramo autônomo do direito, por ter objeto único e homogêneo de regulação, do qual derivam princípios 28 GRILLO, Luisa Rodriguez et al. Derecho economico - temas complementarios. Havana: Facultad de Derecho Universidad de La Habana, 1989, p. 7-8. 29 NUSDEO, Fábio. Curso de economia. Introdução ao direito econômico. 3. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2001. p. 204-206.
  • 16. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br especiais, assim como sujeitos próprios entre os quais se estabelecem as relações jurídicas de conteúdo econômico.30 Além dos ramos do direito terem princípios próprios, cada ramo do direito se distingue pelo seu objeto de regulação, pelo caráter das relações sociais que regulam.31 O direito econômico tem objeto próprio de regulação, que é a política econômica do Estado, como visto acima. A autonomia do direito econômico decorre da sua finalidade, que é a de traduzir juridicamente os instrumentos da política econômica do Estado.32 A grande dificuldade de se identificar o direito econômico como ramo autônomo do direito reside na dificuldade de divisão entre o público e o privado, entre direito público e o direito privado. Onde estaria o direito econômico? Essa divisão, em termos absolutos, é uma marca da concepção liberal, incompatível com a realidade atual. No direito moderno não há essa separação absoluta. Veja-se, por exemplo, o disposto no art. 182, § 4º, da Constituição Federal, que faculta o Poder Público municipal exigir, nos termos que especifica, o "adequado aproveitamento" do solo urbano. A propriedade é privada, mas deve atender a sua função social. Assim, o direito econômico é ramo autônomo do direito que regula e instrumentaliza a política econômica. A quem cabe legislar sobre direito econômico? 30 GRILLO, Luisa Rodriguez et al. Derecho economico - temas complementarios. Havana: Facultad de Derecho Universidad de La Habana, 1989, p. 7-8. 31 LAPTEV, V. Derecho economico. Trad. para o espanhol por Rene Gomez Manzano. Moscou: Progresso, 1988. p. 30. 32 COMPARATO, Fábio Konder. Ensaios e pareceres de direito empresarial. Rio de Janeiro: Forense, 1978, p. 471.
  • 17. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br A Constituição Federal estabelece no art. 24, I, que é de competência concorrente da União, dos Estados e do Distrito Federal legislar concorrentemente sobre direito econômico. No âmbito da legislação concorrente, cabe à União a edição de normas gerais e, aos Estados, a edição de normas específicas. Caberá ao STF, se provocado, dizer se a norma estadual invadiu a competência da União.33 33 “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI N. 7.737/2004, DO ESTADO DO ESPÍRITO SANTO. GARANTIA DE MEIA ENTRADA AOS DOADORES REGULARES DE SANGUE. ACESSO A LOCAIS PÚBLICOS DE CULTURA ESPORTE E LAZER. COMPETÊNCIA CONCORRENTE ENTRE A UNIÃO, ESTADOS-MEMBROS E O DISTRITO FEDERAL PARA LEGISLAR SOBRE DIREITO ECONÔMICO. CONTROLE DAS DOAÇÕES DE SANGUE E COMPROVANTE DA REGULARIDADE. SECRETARIA DE ESTADO DA SAÚDE. CONSTITUCIONALIDADE. (...) 4. A Constituição do Brasil em seu artigo 199, § 4º, veda todo tipo de comercialização de sangue, entretanto estabelece que a lei infraconstitucional disporá sobre as condições e requisitos que facilitem a coleta de sangue. 5. O ato normativo estadual não determina recompensa financeira à doação ou estimula a comercialização de sangue. 6. Na composição entre o princípio da livre iniciativa e o direito à vida há de ser preservado o interesse da coletividade, interesse público primário. 7. Ação direta de inconstitucionalidade julgada improcedente.” (STF, ADI 3512/ES, Rel. Min. EROS GRAU, j. em 15/02/2006, DJ 23-06-2006) ”Ação direta de inconstitucionalidade. Lei n° 3.542/01, do Estado do Rio de Janeiro, que obrigou farmácias e drogarias a conceder descontos a idosos na compra de medicamentos. Ausência do periculum in mora, tendo em vista que a irreparabilidade dos danos decorrentes da suspensão ou não dos efeitos da lei se dá, de forma irremediável, em prejuízo dos idosos, da sua saúde e da sua própria vida. Periculum in mora inverso. Relevância, ademais, do disposto no art. 230, caput da CF, que atribui à família, à sociedade e ao Estado o dever de amparar as pessoas idosas, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito à vida. Precedentes: ADI n° 2.163/RJ e ADI nº 107-8/AM. Ausência de plausibilidade jurídica na alegação de ofensa ao § 7º do art. 150 da Constituição Federal, tendo em vista que esse dispositivo estabelece mecanismo de restituição do tributo eventualmente pago a maior, em decorrência da concessão do desconto ao consumidor final. Precedente: ADI nº 1.851/AL. Matéria relativa à intervenção de Estado-membro no domínio econômico relegada ao exame do mérito da ação. Medida liminar indeferida.” (STF, ADI-MC nº 2.435/RJ, Rel. Min. ELLEN GRACIE, j. em 13/03/2002, DJ de 31-10-2003) “AÇÃO DIRETA DE INCONSTITUCIONALIDADE. LEI 14.861/05, DO ESTADO DO PARANÁ. INFORMAÇÃO QUANTO À PRESENÇA DE ORGANISMOS GENETICAMENTE MODIFICADOS EM ALIMENTOS E INGREDIENTES ALIMENTARES DESTINADOS AO CONSUMO HUMANO E ANIMAL. LEI FEDERAL 11.105/05 E DECRETOS 4.680/03 E 5.591/05. COMPETÊNCIA LEGISLATIVA CONCORRENTE PARA DISPOR SOBRE PRODUÇÃO, CONSUMO E PROTEÇÃO E DEFESA DA SAÚDE. ART. 24, V E XII, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. ESTABELECIMENTO DE NORMAS GERAIS PELA UNIÃO E COMPETÊNCIA SUPLEMENTAR DOS ESTADOS. 1. Preliminar de ofensa reflexa afastada, uma vez que a despeito da constatação, pelo Tribunal, da existência de normas federais tratando da mesma temática, está o exame na ação adstrito à eventual e direta ofensa, pela lei atacada, das regras constitucionais de repartição da competência legislativa. Precedente: ADI 2.535-MC, rel. Min. Sepúlveda Pertence, DJ 21.11.03. 2. Seja dispondo sobre consumo (CF, art. 24, V), seja sobre proteção e defesa da saúde (CF, art. 24, XII), busca o Diploma estadual impugnado inaugurar regulamentação paralela e explicitamente contraposta à legislação federal vigente. 3. Ocorrência de substituição - e não suplementação - das regras que cuidam das exigências, procedimentos e penalidades relativos à rotulagem informativa de produtos transgênicos por norma estadual que dispôs sobre o tema de maneira igualmente abrangente. Extrapolação, pelo legislador estadual, da autorização constitucional voltada para o preenchimento de lacunas acaso verificadas na legislação federal. Precedente: ADI 3.035, rel. Min. Gilmar Mendes, DJ 14.10.05. 4. Declaração de inconstitucionalidade conseqüencial ou por arrastamento de decreto regulamentar superveniente em razão da relação de dependência entre sua validade e a legitimidade constitucional da lei
  • 18. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Na prática, são poucos os casos em que os Estados legislam, explicitamente, a respeito de direito econômico. Mas é comum a edição de leis estaduais que, extravasando ou não a competência constitucionalmente estabelecida, tenham conteúdo econômico. O direito econômico faz parte do direito privado, do direito público ou não cabe dentro dessa divisão? A divisão entre direito público e direito privado tem origem no direito romano, no Digesto de Ulpiano. De acordo o Digesto (L. 1, § 2º D. 1, 1), o direito público abrangeria além da religião (jus sacrum), a forma de governo, os poderes públicos e as relações dos particulares com o governo. Ao contrário do direito privado, o direito público não foi muito desenvolvido na época romana. Justiniano sequer cuidou do direito público, tendo apenas se contentado em defini-lo.34 Exatamente em razão da intervenção crescente do Estado no domínio econômico, muitos são os autores que sustentam a perda de absoluta distinção entre a esfera pública e privada.35 Isso significa que o direito moderno não cabe na estreita divisão entre direito público e direito privado: o direito econômico, o direito do trabalho, o direito do sistema financeiro e o direito do consumidor estão em um campo jurídico intermediário, nem exatamente público, nem exatamente privado. objeto da ação. Precedentes: ADI 437-QO, rel. Min. Celso de Mello, DJ 19.02.93 e ADI 173-MC, rel. Min. Moreira Alves, DJ 27.04.90. 5. Ação direta cujo pedido formulado se julga procedente.” (STF, ADI 3645/PR, Rel. Min. ELLEN GRACIE, j. em 31/05/2006) 34 LARICHE, M. BONJEAN, Georges. Explication méthodique des institutes de Justinien. v. 1. Paris: A. Durand et Pedone-Lauriel, Éditeurs, 1878, p. 12. 35 FERRAZ JÚNIOR, Tércio Sampaio. Introdução ao estudo do direito. São Paulo: Atlas, 1991, p. 131.
  • 19. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Seja como for, como o Estado moderno tem uma ação positiva na economia e constituições de caráter dirigente, deve ser reputado como mais adequado o estudo do direito econômico como ramo autônomo. Por todas essas razões, opto em conceituar o direito econômico como ramo autônomo do direito que regula e instrumentaliza a política econômica. Porém, nada disso é intocável. Para fins de concurso público, em uma questão aberta, pode-se adotar uma resposta como "o direito econômico pode ser visto como um ramo jurídico ou como um método de análise e interpretação do Direito". Uma resposta assim não poderia ser considerada errada, ainda que o examinador seja partidário de uma ou de outra corrente. Ademais, tal afirmação é uma das conclusões a que chegam alguns doutrinadores no Brasil, como Fábio Nusdeo36 , a respeito do direito econômico. Para quem vai fazer concurso público é fundamental saber como caminha a doutrina pátria. Visto como ramo autônomo do direito ou não, o que irá variar de país para país é conteúdo que assumirão as normas de direito econômico. A título exemplo, vejamos uma exposição de direito econômico efetuada de acordo com a Constituição cubana: "En la República de Cuba rige el sistema socialista de economía basado en la propiedad socialista de todo el pueblo sobre los medios de produción y en la supreción de la explotación del hombre por el hombre (art. 14). (...) El Estado organiza, dirige y controla la actividad económica nacional de acuerdo con el Plan Único de Desarrollo Económico-Social, en cuya elaboración y ejecución participan activa y conscientemente los trabajadores de todas las ramas de la economía y de las demás esferas de la vida social (art. 16, párr. 1º)" 37 36 NUSDEO, Fábio. Curso de economia. Introdução ao direito econômico. 3. ed. São Paulo: RT, 2001. p. 206-222. 37 MARILL RIVERO, Emilio. Constituición de la Republica de Cuba - temática/legislación complementaria. Havana: Editorial de Ciencias Sociales, 1989, pp. 88, 141 e 142
  • 20. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br No Brasil, exatamente porque é fundamento constitucional da ordem econômica a livre iniciativa (art. 170, caput), bem como a propriedade privada é princípio dessa mesma ordem econômica (art. 170, II), além das hipóteses expressamente previstas na Constituição, o Estado apenas deverá explorar diretamente a atividade econômica quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo. Não é, como vimos acima, a opção política contida na Constituição cubana, que prevê não apenas a planificação econômica, mas também a propriedade socialista dos meios de produção. Ou seja, o conteúdo das normas de direito econômico em Cuba e no Brasil são diferentes. Também são diferentes a Lei nº 8.884/94 do Brasil e a Lei Sherman dos Estados Unidos. Mas é inegável que todas essas normas - de Cuba, do Brasil e dos Estados Unidos - têm o nítido de propósito de dirigir a economia. No caso do Brasil e dos Estados Unidos, as normas procuram, dentre outros objetivos, defender a concorrência contra abusos do poder econômico. O que pode existir é uma direção da economia a favor do mercado (Brasil e Estados Unidos) e não um total ou quase total controle dos meios de produção por órgãos estatais (Cuba). Veja-se, nesse contexto, os limites da expressão acima dirigir a economia! Não podemos ser ingênuos a ponto de pensar que são as bases constitucionais da ordem econômica que definem a estrutura de determinado sistema econômico; a constituição formal não constitui a realidade material. Por outro lado, não é possível aceitar um determinismo econômico sobre a realidade jurídica formal.38 Com efeito, é inegável que a Constituição tem força normativa, isto é, a Constituição pode ser um meio de transformar a realidade.39 38 SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 722. 39 HESSE, Konrad. A força normativa da constituição. Porto Alegre: Sergio Antonio Fabris Editor, 1991.
  • 21. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Veremos, no tópico seguinte, como as constituições brasileiras trataram o direito econômico, especialmente a Constituição Federal de 1988. 1.3.A ordem econômica constitucional. A constituição econômica formal consiste no conjunto de normas da constituição política que garantindo os elementos definidores de um determinado sistema econômico, estabelece os princípios fundamentais de determinada forma de organização e funcionamento da economia e estabelece, por isso mesmo, uma determinada ordem econômica.40 A primeira Constituição brasileira, que foi a Constituição do Império, de 1824, não tratou da ordem econômica. Ela não tinha dispositivos que possam ser verdadeiramente considerados como de direito econômico. Com esforço mental no sentido de encontrar alguma manifestação sobre o tema, podemos pinçar o item 25 do art. 179, que previu a abolição das corporações de ofícios. A segunda Constituição brasileira, que foi a primeira Constituição da República, de 1891, também não tratou da ordem econômica. Também é necessário esforço para encontrar algum dispositivo que possa ser reputado como sendo de direito econômico. Podemos pinçar os seguintes: art. 7º, item 2º, que estabeleceu ser de competência da União os direitos de entrada, saída e estadia de navios, sendo livre o comércio de cabotagem às mercadorias nacionais, bem como às estrangeiras que já tenham pago impostos de importação; art. 7º, § 1º, item 1º, que estabelece ser de competência privativa da União a instituição de bancos emissores; art. 72, § 17, que previa o direito de propriedade, salvo a desapropriação por necessidade ou utilidade pública e afirmava que a propriedade das minas era do proprietário do solo. 40 SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 723.
  • 22. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br A primeira Constituição brasileira a tratar da ordem econômica foi a de 1934, sob o título "Da Ordem Econômica e Social", que continha vinte e oito artigos. Dentre outros aspectos relevantes, podemos destacar os seguintes: o art. 115 estabelecia que a ordem econômica deveria ser organizada conforme os princípios da Justiça e as necessidades da vida nacional, de modo a possibilitar a todos existência digna e, dentro desses limites, garantia a liberdade econômica. No art. 117, parágrafo único, proibia a usura, punida na forma da lei. O art. 118 inovou ao estabelecer que a propriedade das minas era distinta da propriedade do solo para efeito de exploração ou aproveitamento industrial. O art. 119 previa que a exploração das minas e das jazidas minerais seria feita mediante autorização ou concessão federal, que seriam conferidas exclusivamente a brasileiros ou a empresas organizadas no Brasil, ressalvada ao proprietário a preferência na exploração ou co-participação nos lucros. O art. 131 vedava a propriedade de empresas jornalísticas a estrangeiros, que não poderiam ser acionistas de empresas jornalísticas, e a sociedades anônimas com ações ao portador. O art. 132 estabelecia que deveriam ser brasileiros os proprietários, armadores e comandantes de navios nacionais. A Constituição de 1937 tratou da matéria na parte "Da Ordem Econômica" em vinte e um artigos. O art. 142 dizia "A usura será punida". O art. 145 previa que só poderiam funcionar no Brasil bancos de depósito e empresas de seguro de propriedade de brasileiros. O art. 149 dispôs que os proprietários, armadores e comandantes de navios nacionais deveriam ser brasileiros natos. A Constituição de 1946 tratou da ordem econômica no Título V, "Da Ordem Econômica e Social" em dezoito artigos. O art. 145 dizia que "A ordem econômica deve ser organizada conforme os princípios da justiça social, conciliando a liberdade de iniciativa com a valorização do trabalho humano". O art. 146 previa que, mediante lei especial, a União poderia intervir no domínio econômico e monopolizar (!) determinada indústria ou atividade, com base no interesse público e com limite nos direitos fundamentais constitucionalmente assegurados. O art. 147 previa o uso da propriedade condicionado ao bem-estar social. O art. 148 estabelecia que a lei reprimiria o abuso do
  • 23. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br poder econômico e os grupos de empresas que pretendessem dominar mercados, eliminar a concorrência e aumentar arbitrariamente os lucros. O art. 154 previa que a usura seria punida na forma da lei. O art. 155 estabeleceu a navegação de cabotagem para o transporte de mercadoria seria privativa de navios nacionais, salvo caso de necessidade pública. O § 2º do art. 155 dispôs que os proprietários, armadores e comandantes de navios nacionais deveriam ser brasileiros. A Constituição de 1967, no Título III, "Da Ordem Econômica e Social", tratou da matéria em dez artigos. O art. 157 dizia que a ordem econômica teria por fim realizar a justiça social, com base nos seguintes princípios: liberdade de iniciativa; valorização do trabalho como condição da dignidade humana; função social da propriedade; harmonia e solidariedade entre os fatores de produção; desenvolvimento econômico; repressão ao abuso do poder econômico, caracterizado pelo domínio dos mercados, a eliminação da concorrência e o aumento arbitrário dos lucros. O § 8º do art. 157 previa intervenção no domínio econômico e o monopólio (!) de determinada indústria ou atividade, mediante lei federal, quando indispensável por motivo de segurança nacional ou para organizar setor que não pudesse ser desenvolvido com eficiência no regime de competição. O art. 162 estabeleceu que a pesquisa e lavra do petróleo em território nacional constituem monopólio da União, na forma da lei. O art. 163 estabelecia a primazia da iniciativa privada na exploração da atividade econômica, a qual deveria ser estimulada e apoiada pelo Estado, que poderia exercer diretamente a atividade econômica para suplementar a atividade exercida pela iniciativa privada. O art. 166 vedava a propriedade e a administração de empresas jornalísticas a estrangeiros, a sociedades que tivessem sócios estrangeiros ou pessoas jurídicas (excetos partidos políticos) e a sociedades anônimas com ações ao portador. A Emenda Constitucional nº 1/69 tratou da matéria nos arts. 160 a 174, sem inovar substancialmente.
  • 24. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br 3.1.A ordem econômica na Constituição Federal de 1988. O cerne do direito econômico está no Título VII da Constituição Federal, arts. 170 a 192, que consagra a ordem econômica e financeira. O Título VII está dividido em quatro capítulos. Além dos princípios gerais da atividade econômica, previstos nos art. 170 a 181 (Capítulo I), a Constituição Federal de 1988 trata da política urbana (Capítulo II), da política agrícola e fundiária e da reforma agrária (Capítulo IIII) e do sistema financeiro nacional (Capítulo IV). Como é até intuitivo, o modo de produção capitalista, em sua versão social-democrata, foi positivada pela Constituição de 1988. 41 A atividade econômica está baseada na livre iniciativa. Isso significa que, como regra geral, o Estado não exercerá diretamente a atividade econômica. Isso é incumbência dos particulares. Mas o princípio constitucional da livre iniciativa não significa que o empresário tem o direito de fazer o que bem entender - não há plena liberdade no sentido ultra-liberal do termo. Há limitações. A existência de limitações à atividade privada (poder de polícia), inclusive à atividade econômica, não contradiz com a existência da livre iniciativa como princípio básico da ordem econômica. A regulação da atividade econômica, por parte do Estado, em menor ou maior grau, é indispensável para a manutenção do sistema capitalista. Não há país no mundo que não tenha um mínimo de regulamentação e de restrições à atividade econômica. 41 SILVA, Bruno Mattos e. Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário. São Paulo: Atlas, 2007, p. 79.
  • 25. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br O art. 170 da Constituição Federal estabelece alguns princípios da ordem econômica constitucional. Podemos destacar o da livre iniciativa e o da função social da propriedade. Esses princípios não devem ser interpretados isoladamente, mas sim em consonância com os demais princípios positivados em todo o texto da Constituição. É de meridiana clareza que o objetivo do constituinte, ao estabelecer esses princípios, foi o de criar um sistema em que a produção gerasse bem estar social, para toda a população, e não apenas lucro para os empresários. A esse respeito, merece ser transcrita a lição de Eros Roberto Grau:42 a ordem econômica na Constituição de 1988 consagra um regime de mercado organizado, entendido como tal aquele afetado pelos preceitos da ordem pública clássica (Geraldo Vidigal); opta pelo tipo liberal do processo econômico, que só admite a intervenção do Estado para coibir abusos e preservar a livre concorrência de quaisquer interferências, quer do próprio Estado, que do embate econômico que pode levar à formação de monopólios e ao abuso do poder econômico visando aumento arbitrário dos lucros - mas sua posição corresponde ao do neo-liberalismo ou social-liberalismo, como a defesa da livre iniciativa (Miguel Reale); (note-se que a ausência do vocábulo 'controle' no texto do art. 174 da Constituição assume relevância na sustentação dessa posição; a ordem econômica na Constituição de 1988 contempla a economia de mercado, distanciada porém do modelo liberal puro e ajustada à ideologia neo-liberal (Washington Peluso Albino de Souza); a Constituição repudia o dirigismo, porém acolhe o intervencionismo econômico, que não se faz contra o mercado, mas a seu favor (Tércio Sampaio Ferraz Júnior); a Constituição é capitalista, mas a liberdade apenas é admitida enquanto exercida no interesse da justiça social e confere prioridade aos valores do trabalho humano sobre todos os demais valores da economia de mercado (José Afonso da Silva) A evolução das relações de produção, a necessidade de melhorar as condições de vida dos trabalhadores e o mau uso da liberdade conferida aos empresários no sistema capitalista (no qual é falaciosa a 'harmonia natural dos interesses” de empresários e trabalhadores) fizeram surgir mecanismos de condicionamento da atividade privada, com o objetivo de ser realizada a justiça social. Nessa perspectiva é que deve ser o texto do art. 170 da Constituição Federal compreendido: trata-se de uma Constituição preocupada com a justiça social e com o bem estar coletivo. 43 42 A ordem econômica na Constituição de 1988, 4. ed., São Paulo: Malheiros, 1998, p. 212-213 43 SILVA, José Afonso da. Curso de Direito Constitucional Positivo. 13. ed.. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 725-726.
  • 26. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br O século XX foi o século da social-democracia preocupada em manter o sistema capitalista intacto, mediante uma melhoria das condições de vida dos trabalhadores. O exemplo do sucesso dessa doutrina está nos países da Europa ocidental, especialmente nos países escandinavos, onde a social-democracia efetivamente confere boas condições de vida para a população. Nos países periféricos, contudo, as tentativas de implantação dessa idéia não têm propiciado os mesmos resultados. De todo modo, a Constituição Federal de 1988 positivou os princípios da social-democracia. Ensina-nos o Prof. Carlos Jacques Vieira Gomes que há duas categorias de princípios jurídicos na Constituição de 1988: os princípios liberais ou estatutários, e os princípios intervencionistas ou conformadores, que compõem a constituição econômica em sentido formal e definem a ordem econômica instituída. Os princípios liberais são os que se opõem ou limitam a intervenção do Estado, garantindo uma esfera de isenção ao particular em face da ação estatal, e os princípios intervencionistas são os que justificam e impõe essa intervenção, como forma de conformar a realidade econômica e social. Dentre os princípios liberais – aduz o mencionado autor – pode-se citar a livre iniciativa econômica (arts. 1º, IV, 5º, XIII e 170, caput) e o direito à propriedade privada dos meios de produção e de consumo (arts. 5º, XXII e 170, II); e, dentre os princípios intervencionistas, pode-se mencionar a dignidade da pessoa humana (arts. 1º, III e 170, caput), o valor social do trabalho (arts. 1º, IV e 170, caput), a função social da propriedade (arts. 5º, XXIII e 170, III), o objetivo de construção de uma sociedade livre e solidária (art. 3º, I), dentre outros.44 Ao lado da política de seguridade social, de prestação de serviços públicos, enfim, de proteção da população, para atingir os objetivos de bem estar social, é protegida a liberdade de iniciativa dos particulares, mas é também permitida pela Constituição não apenas a regulamentação dessa atividade econômica e a até a própria 44 GOMES, Carlos Jacques Vieira. Ordem econômica constitucional e direito antitruste. Porto Alegre: S. ª Fabris, 2004, pp. 82-84.
  • 27. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br exploração diretamente pelo Estado, nos limites estabelecidos pelo art. 173 da Constituição Federal. A regra geral, porém, é que incumbe o exercício da atividade econômica aos particulares: a atuação direta do Estado como agente produtivo é excepcional. Veremos os instrumentos de que dispõe o Estado para agir como empresário nos itens 3 e .3.1 do Capítulo II. É fundamental ter em mente que a liberdade de atividade econômica somente pode ser limitada pela lei, assim como o direito privado - que rege a atividade econômica - prestigia a teoria da autonomia da vontade. Nesses pressupostos estão assentados o modelo jurídico do liberalismo econômico vigente no Brasil. Ainda que a planificação econômica não seja um princípio da ordem constitucional brasileira, há um nítido caráter de constituição dirigente na Constituição Federal de 1988. Existem objetivos a serem atingidos: “assegurar a todos existência digna” (art. 170); “bem-estar e justiça sociais” (art. 193) etc Portanto, o Estado tem um papel de indutor da atividade econômica, que pode ser exercido mediante poder normativo, que tem forte carga transformadora da realidade fática. É o que veremos no item 1 do Capítulo II. Feitas essas considerações, vejamos os princípios da ordem econômica, tal como positivada pela Constituição Federal. De acordo com o caput do art. 170, da Constituição Federal, a ordem econômica está fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa. O escopo é assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social. A interpretação da legislação infraconstitucional e até mesmo dos dispositivos constitucionais deve ser feita de acordo com os seguintes postulados:
  • 28. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br • valorização do trabalho; • livre iniciativa; • existência digna a todos; • justiça social. O fundamento da ordem econômica é a valorização do trabalho humano e a livre iniciativa. Ou seja, o legislador constituinte deixou clara a opção pelo liberalismo econômico, em sua versão social-democrata. Isso significa que o Estado brasileiro não deve ser omisso na condução da economia. Ao contrário, deve agir. Assim, “A livre iniciativa é expressão de liberdade titulada não apenas pela empresa, mas também pelo trabalho. Por isso a Constituição, ao contemplá-la, cogita também da ‘iniciativa do Estado’; não a privilegia, portanto, como bem pertinente apenas à empresa”.45 O art. 170 também estabelece alguns princípios, que norteiam a ordem econômica. São eles: • soberania nacional; • propriedade privada; • função social da propriedade; • livre concorrência; • defesa do consumidor; • defesa do meio ambiente; • redução das desigualdades regionais e sociais; • busca do pleno emprego; • tratamento favorecido para as empresas de pequeno porte constituídas sob as leis brasileiras e que tenham sua sede e administração no País. 45 STF, ADI nº 3.512/ES, Rel. Min. EROS GRAU, j. em 15/02/2006, DJ 23-06-2006.
  • 29. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Como se pode notar, “São princípios que devem ser observados na atividade econômica: I. Propriedade privada e função social da propriedade; II. Livre concorrência e defesa do consumidor; III. Defesa do meio ambiente e redução das desigualdades regionais e sociais”, mas não fazem parte desse rol a “IV - Busca do pleno emprego e pluralismo político”.46 Além disso, os arts. 172 a 181 estabelecem princípios e regras, dentro do contexto geral dos princípios gerais da atividade econômica. Não é difícil concluir a Constituição Federal estabeleceu uma economia de mercado. A iniciativa privada é um princípio básico dessa ordem econômica, de natureza capitalista. Porém, essa mesma ordem econômica dá prioridade aos valores do trabalho humano sobre todos os valores da economia de mercado. Isso deve orientar a intervenção do Estado na economia, para fazer valer os valores sociais do trabalho que, ao lado da iniciativa privada, são fundamentos da ordem econômica e do próprio Estado brasileiro, a teor do art. 1º, IV, da Constituição Federal. 47 Os arts. 173, 174 e 175 da Constituição Federal estabeleceram que o Estado regula a economia, presta serviços públicos e, em caráter excepcional, exerce atividade econômica. São atividades que não se confundem, devendo ser complementares, como veremos no capítulo seguinte. Já o art. 176 estabelece o seguinte: Art. 176. As jazidas, em lavra ou não, e demais recursos minerais e os potenciais de energia hidráulica constituem propriedade distinta da do solo, para efeito de exploração ou aproveitamento, e pertencem à União, garantida ao concessionário a propriedade do produto da lavra. § 1º A pesquisa e a lavra de recursos minerais e o aproveitamento dos potenciais a que se refere o "caput" deste artigo somente poderão ser efetuados 46 Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Concurso para Juiz de Direito– Prova tipo 1, aplicação em agosto de 2007, questão nº 9, alternativa “b) As proposições I, II e III estão corretas”. 47 SILVA, José Afonso. Curso de direito constitucional positivo. 13. ed. São Paulo: Malheiros, 1997, p. 720.
  • 30. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br mediante autorização ou concessão da União, no interesse nacional, por brasileiros ou empresa constituída sob as leis brasileiras e que tenha sua sede e administração no País, na forma da lei, que estabelecerá as condições específicas quando essas atividades se desenvolverem em faixa de fronteira ou terras indígenas. § 2º - É assegurada participação ao proprietário do solo nos resultados da lavra, na forma e no valor que dispuser a lei. § 3º - A autorização de pesquisa será sempre por prazo determinado, e as autorizações e concessões previstas neste artigo não poderão ser cedidas ou transferidas, total ou parcialmente, sem prévia anuência do poder concedente. § 4º - Não dependerá de autorização ou concessão o aproveitamento do potencial de energia renovável de capacidade reduzida. Assim, é errada a seguinte assertiva: “Considere que o presidente da República outorgue, por intermédio de decreto, à pessoa jurídica Shevchenko do Brasil, com sede em Moscou, Rússia, concessão para pesquisa e lavra de jazida de carvão mineral em determinada região brasileira. Nessa situação, segundo a ordenação normativa vigente, o ato de concessão será considerado constitucional se, em virtude do interesse nacional, a outorga tiver sido realizada com base no grau de especialização da referida pessoa jurídica”.48 É correto dizer que “A construção de pequena represa em propriedade rural, para o aproveitamento do potencial de energia hídrica, a fim de suprir a demanda de energia elétrica da casa dos proprietários, independe de autorização ou concessão”.49 Portanto, não se deve confundir a atuação direta do Estado como agente produtivo, que é excepcional, com a atuação do Estado na economia como agente normativo, prestador de serviços públicos, sancionador de condutas lesivas à ordem econômica etc., que nada tem de excepcional. Nesse sentido, já afirmou o STF: É certo que a ordem econômica na Constituição de 1988 define opção por um sistema no qual joga um papel primordial a livre iniciativa. Essa circunstância 48 CESPE/UnB – Advocacia-Geral da União, Concurso Público para Procurador Federal, Prova Objetiva P1, aplicação em 1º/7/2007, questão nº 88. 49 CESPE/UnB – Advocacia-Geral da União, Concurso Público para Procurador Federal, Prova Objetiva P1, aplicação em 1º/7/2007, questão nº 89.
  • 31. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br não legitima, no entanto, a assertiva de que o Estado só intervirá na economia em situações excepcionais. 50 Em resumo e em conclusão: a Constituição tem força normativa, podendo ser um meio de transformar a realidade. A primeira Constituição brasileira a tratar da ordem econômica foi a de 1934. De acordo com a Constituição Federal de 1988, a atividade econômica está baseada na livre iniciativa. Isso significa que, como regra geral, o Estado não exercerá diretamente a atividade econômica: a atuação direta do Estado como agente produtivo é excepcional. 50 STF, ADI nº 1.950/SP, Rel. Min. EROS GRAU, j. em 03/11/2005, DJ de 02-06-2006.
  • 32. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br CAPÍTULO II AÇÃO ESTATAL NA ECONOMIA 1.O Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica. Como agente normativo e regulador da atividade econômica, o Estado exercerá, na forma da lei, as funções de fiscalização, incentivo e planejamento, sendo este último determinante para o setor público e indicativo para o setor privado. É o que dispõe o art. 174 da Constituição Federal. De acordo com o princípio das prescrições obrigatórias, uma das partes da relação jurídica dá à outra uma instrução que tem caráter obrigatório.51 Durante o período socialista na Polônia, país em que parte significativa da economia se manteve nas mãos de particulares, as regras do planejamento econômico eram obrigatórias também para o setor privado. No Brasil, de acordo com o art. 174 da Constituição Federal, exatamente porque o planejamento é apenas indicativo para o setor privado, no que se refere ao planejamento, não existe no direito brasileiro o princípio das prescrições obrigatórias para o setor privado. Já para o setor público, esse princípio é plenamente aplicável, de acordo com o mesmo art. 174. Porém, o art. 174 estabelece as prescrições obrigatórias existirão para os particulares fora do âmbito do planejamento, quando o Estado é agente normativo e regulador da atividade econômica. 51 GRILLO, Luisa Rodriguez et al. Derecho economico - temas complementarios. Havana: Facultad de Derecho Universidad de La Habana, 1989, p. 13.
  • 33. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br A intervenção do Estado como agente normativo e regulador da atividade econômica pode ocorrer por direção e por indução, duas modalidades de intervenção indireta. Intervenção por direção ocorre por meio de criação de regras de observância obrigatória e de incidência direta nas relações econômicas públicas e privadas. Ex. congelamento de preços; criação de agência reguladora. Intervenção por indução ocorre sem se estabelecer regras de incidência direta nas relações jurídicas privadas, mas sim por meio de regras instrumentais que indiretamente afetam a atividade econômicas, seja incentivando, seja desincentivando determinadas atividades. Ex. tributação com caráter extrafiscal: imposto de importação, incentivos fiscais. A existência de expressa previsão constitucional para a normatização e regulação da atividade econômica não contradiz com o livre mercado, com a devida venia de Manoel Gonçalves Ferreira Filho, que afirma justamente o contrário.52 Na verdade, a saúde do livre mercado depende de ação estatal. Aliás, é o próprio art. 174 da Constituição Federal que fundamenta a possibilidade legal da existência de agências reguladoras, bem como da possibilidade dessas agências criarem normas jurídicas. O vocábulo agência tem origem na palavra agency, que consiste, de acordo com o direito norte-americano, em uma autarquia com poder de regulação em campos específicos da economia. Evidentemente, a atuação das agências não é feita contra o livre mercado; muito ao revés, as agências desempenham papel fundamental para a saúde do mercado, ao prescrever regras de conduta 52 "O art. 174 define o Estado 'como agente normativo e regulador da atividade econômica'. Assim, não seria o mercado, como é típico de uma economia descentralizada (ou liberal), mas o Poder Público, segundo é próprio de uma economia de tipo centralizado (ou soviético), que regeria a economia. Isto colide com os princípios de livre iniciativa, livre concorrência, que a Constituição consagra (arts. 1º, IV, caput e inc. IV), que atenuam esse centralismo econômico." (FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional, de acordo com a Constituição de 1988. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 306)
  • 34. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br (regulação), ao fiscalizar e punir (direito administrativo sancionador) os componentes do mercado que agirem de forma indevida, nociva ao mercado. Foi considerado correto dizer que “As agências reguladoras são autarquias sob regime especial, que é caracterizado pela independência administrativa, pela autonomia financeira e pelo poder normativo atribuídos a essas agências”.53 A atividade de regulação da economia (entendendo-se que a economia abrange a atividade econômica em sentido estrito e a prestação de serviços públicos) consiste em uma forma de intervenção indireta na atividade econômica. Por isso é certo dizer que "A criação de agência para regular serviços públicos, privatizados ou não, constitui forma de intervenção indireta do Estado na atividade econômica".54 Pelas mesmas razões, está errado dizer que "O controle dos atos de concentração econômica, na forma prevista pela Lei nº 8.884/1994, constitui forma de intervenção direta do Estado na atividade econômica".55 Um dos instrumentos de intervenção por indução da atividade econômica para fins previamente determinados (ex. defesa do mercado, estímulo a determinadas atividades econômicas, combate a excessiva volatilidade de preços de certos produtos etc) é a instituição de contribuição social de intervenção no domínio econômico (CIDE), na forma do art. 149 da Constituição Federal. Assim, de acordo com a jurisprudência do STJ, as contribuições de intervenção no domínio econômico são constitucionalmente destinadas a finalidades não 53 UnB/CESPE – Concurso Público para Juiz Federal Substituto da 5ª Região - CADERNO FREVO – aplicação em 24/7/2005, questão nº 36. 54 Questão nº 62 (1) da prova realizada pelo CESPE em 3/3/2002, Concurso Público para provimento do cargo de Consultor Legislativo do Senado Federal - Área 5 - Direito Comercial e Econômico.
  • 35. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br diretamente referidas ao sujeito passivo, o qual não necessariamente é beneficiado com a atuação estatal e nem a ela dá causa (referibilidade). Isso as distingue das contribuições de interesse de categorias profissionais e de categorias econômicas. A CIDE afeta toda a sociedade e obedecem ao princípio da solidariedade e da capacidade contributiva, refletindo políticas econômicas de governo.56 A instituição de CIDE é de competência da União, que pode criá-las por lei ordinária. O STF, já afirmou que a CIDE “não é imposto”, concluindo que “não se exige que a lei complementar defina a sua hipótese de incidência, a base imponível e contribuintes”.57 É correto dizer que “O produto da arrecadação da contribuição de intervenção no domínio econômico relativa às atividades de importação e comercialização de petróleo e seus derivados será destinado, entre outros fins, ao financiamento de programa de infra-estrutura de transportes”,58 por expressa disposição do art. 177, § 4º, da Constituição Federal. Um interessante (sob o aspecto jurídico...) exemplo de intervenção por indução foi a ampliação da desoneração de ICMS para mercadorias destinadas ao exterior para os produtos primários e semi-elaborados, levada a cabo pelo art. 3º, II, da Lei Complementar nº 87, de 13 de setembro de 1996 (Lei Kandir) e pela Emenda Constitucional nº 42, de 19 de dezembro de 2003, que alterou a alínea “a” do inciso X do § 2º do art. 155 da Constituição Federal. Objetivou-se, evidentemente, o aumento das exportações desses produtos, ainda que eles sejam de baixo valor agregado. Foi uma opção política do Governo da época, instrumentalizada nas referidas normas jurídicas. 55 Questão nº 62 (5) da prova realizada pelo CESPE em 3/3/2002, Concurso Público para provimento do cargo de Consultor Legislativo do Senado Federal - Área 5 - Direito Comercial e Econômico. 56 STJ, SEGUNDA TURMA, REsp 933.440/PR, Rel. Min. ELIANA CALMON, j. em 02.08.2007, DJ de 14.08.2007. 57 STF, Segunda Turma, AI-ED 518082 / SC, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, j. em 17/05/2005, DJ de 17-06-2005. 58 CESPE/UnB – Advocacia-Geral da União, Concurso Público para Procurador Federal, Prova Objetiva P1, aplicação em 1º/7/2007, questão nº 90.
  • 36. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Evidentemente, esse tipo de intervenção é considerada intervenção indireta, que, como vimos acima, abrange a intervenção por direção e a intervenção por indução. Portanto, é errado dizer que “O ato de restituição do ICMS sobre a exportação de produtos industrializados é considerado modalidade de intervenção direta do Estado no domínio econômico”.59 O Estado deve ser dotado de meios eficazes para intervenção no domínio econômico. É correto afirmar que “É dispensável a licitação quando a União tiver que intervir no domínio econômico para regular preços ou normalizar o abastecimento”,60 a teor do disposto no inciso VI do art. 24 da Lei nº 8.666/93 (Lei de Licitações). 2.O Estado prestador de serviços públicos. Cabe ao Estado a prestação de serviços públicos. Os serviços públicos devem ser prestados diretamente pelo Estado ou por particulares, sob regime de concessão ou permissão, de acordo com o art. 175 da Constituição Federal. Vimos no item 1.1 a definição de atividade econômica, bem como que parte da atividade pode ser qualificada como serviços públicos. O que são serviços públicos? A Constituição Federal não define o que seja serviço público. Diz que “Incumbe ao Poder Público, na forma da lei, diretamente ou sob regime de concessão ou permissão, sempre através de licitação, a prestação de serviços públicos” (art. 175). 59 CESPE/UnB – Advocacia-Geral da União, Concurso Público para Procurador Federal, Prova Objetiva P1, aplicação em 1º/7/2007, questão nº 91. 60 TJDF, Concurso para Juiz de Direito, prova objetiva, aplicação em 1º/4/2007, questão nº 21.
  • 37. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Não é pacífica a definição do que seja serviço público. A doutrina já definiu como "todo aquele prestado pela Administração ou por seus delegados, sob normas e controles estatais, para satisfazer necessidades essenciais ou secundárias da coletividade ou simples conveniências do Estado"61 e já definiu como “toda atividade de oferecimento de utilidade ou comodidade material destinada à satisfação da coletividade em geral, mas fruível singularmente pelos administrados, que o Estado assume como pertinente a seus deveres e presta por si mesmo ou por quem lhe faça as vezes, sob um regime de Direito Público”,62 dentre outras possíveis. O cerne da divergência entre os vários administrativistas reside em excluir da noção de serviço público as atividades estatais que não constituam em uma prestação de utilidade material ou comodidade material singularmente fruível pelos administrados. Ou seja, para alguns autores, como Celso Antônio Bandeira de Mello, somente constitui serviço público a atividade de prestação de serviços uti singuli, excluída a noção de serviço público em sentido amplo, que inclui os serviços uti universi, pois se considerarmos como serviço público toda a atividade estatal, a noção de serviço público não teria qualquer utilidade, pois se confundiria com a noção de atividade pública.63 Já outros autores, como Hely Lopes Meirelles, incluem no conceito de serviço público outras atividades estatais, tais como a atividade de polícia, de defesa nacional, de preservação da saúde pública, iluminação pública, bem como as atividades executadas para atender às necessidade internas da Administração (“serviços administrativos”) e os serviços prestados a usuários indeterminados (“serviços uti universi”).64 61 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 1994, p. 294. 62 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 15a . ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 612. 63 MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de direito administrativo. 15a . ed. São Paulo: Malheiros, 2003, p. 615 e 616. 64 MEIRELLES, Hely Lopes. Direito administrativo brasileiro. 19. ed. São Paulo: Malheiros, 1994, pp. 286-288.
  • 38. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Prefiro a noção restrita de Celso Antônio Bandeira de Mello. Além dos motivos mencionados, a jurisprudência está pacificada no sentido de que as atividades prestadas pelo Estado que não sejam serviço público específico e divisível não podem ensejar a cobrança de taxa.65 É verdade que nada impede que um imposto custeie um serviço público, mas a mim parece quebrar a coerência do sistema jurídico dizer que certos “serviços” não podem ser custeados por taxa! Afinal de contas, a definição de taxa é exatamente esta: tributo para custear a prestação de um serviço público específico e divisível (art. 145, II, da Constituição Federal) ou o exercício do poder de polícia. É evidente que se pode sustentar que há outros serviços públicos que não são específicos ou divisíveis, para os quais não se pode cobrar taxa: a noção de serviço público, como vimos acima, não é pacífica. Para fins de concurso público, deve o estudante conhecer a nítida divergência existente na doutrina. Seja como for, a atividade econômica prestada com as características mencionadas acima deve ser considerada serviço público. É que serviço público faz parte da atividade econômica considerada em sentido amplo; portanto, há que se diferenciar a expressão atividade econômica, tomada como gênero, da expressão atividade econômica em sentido estrito, essa última sim com significado diferenciado de serviço público. O gênero atividade econômica contempla as espécies serviço público e atividade econômica em sentido estrito. 66 Em sentido diverso, a Min. Eliana Calmon afirma que serviços públicos podem ser próprios ou gerais, nos casos em que não há possibilidade de identificação dos usuários, hipóteses em que são financiados por tributos e prestados pelo próprio Estado 65 “CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. TAXA DE LIMPEZA PÚBLICA: MUNICÍPIO DE IPATINGA/MG. C.F., art. 145, II. CTN, art. 79, II e III. I. - As taxas de serviço devem ter como fato gerador serviços públicos específicos e divisíveis, prestados ao contribuinte ou postos à sua disposição. Serviços específicos são aqueles que podem ser destacados em unidades autônomas de intervenção, de utilidade ou de necessidade públicas; e divisíveis, quando suscetíveis de utilização, separadamente, por parte de cada um dos usuários. CTN, art. 79, II e III. II. - Taxa de Limpeza Pública: Município de Ipatinga/MG: o seu fato gerador apresenta conteúdo inespecífico e indivisível. III. - Agravo não provido.” (STF, Segunda Turma, RE (AgR) nº 366086/MG, Rel. Min. CARLOS VELLOSO, j. em 10/06/2003, DJ de 1º/8/2003) 66 GRAU, Eros Roberto. A ordem econômica na Constituição de 1988. 4ª ed., São Paulo: Malheiros, 1998, p. 131.
  • 39. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br (ex. segurança pública); ou podem ser impróprios ou individuais, nos casos em que os destinatários são determinados ou determináveis, hipóteses em que podem ser prestados por órgãos da administração indireta ou por meio de delegação, mediante concessão e permissão de serviços públicos (art. 175 da Constituição Federal e Lei nº 8.987/95). Desse modo, os serviços prestados por concessionárias são remunerados por tarifa, sendo facultativa a sua utilização e plenamente aplicável o Código de Defesa do Consumidor.67 A Constituição Federal estabelece quais são as Unidades da Federação competentes para a prestação de determinados serviços públicos. Há as competências comuns a todas as unidades da Federação (União, Estados, Distrito Federal e Municípios), que estão elencadas no art. 23 da CF. Além das competências comuns, há as competências materiais atribuídas da União, taxativamente previstas no art. 21. Para os Estados, há uma única competência expressa: é a competência para exploração dos serviços locais de gás canalizado (art. 25, § 2º), mas os Estados dispõem das competências remanescentes (isto é, o que não for previsto na Constituição é de competência dos Estados). Já os Municípios têm como competências a prestação de serviços públicos de interesse local, incluído o de transporte coletivo; a de manter, com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, programas de educação pré- escolar e de ensino fundamental e a de prestar, também com a cooperação técnica e financeira da União e do Estado, serviços de atendimento à saúde da população. Ao Distrito Federal compete a prestação dos serviços públicos de competência dos Estados e dos Municípios. 67 STJ, SEGUNDA TURMA, REsp 705.203/SP, Rel. Ministra ELIANA CALMON, j. em 11/10/2005, DJ 07.11.2005.
  • 40. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br 3.Atividade econômica exercida pelo Estado. O Estado pode realizar determinadas atividades reservando-se o exercício em monopólio por razões de interesse público. Além disso, são comuns os casos de exercício público de atividades econômicas em regime de concorrência com a iniciativa privada.68 Como conseqüência do princípio da livre iniciativa (art. 170, caput), fundamento da ordem econômica, a atividade exercida pelo Estado é excepcional. Quando pode o Estado exercer atividade econômica? Diz o caput do art. 173 da própria Constituição Federal: Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será admitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. Inicialmente, observamos que há casos expressos na Constituição em que o Estado deve desempenhar atividade econômica. É a hipótese do art. 177, que estabelece monopólios da União sobre: pesquisa e lavra das jazidas de petróleo e gás natural e outros hidrocarbonetos fluidos; refinação do petróleo nacional ou estrangeiro; importação e exportação dos produtos e derivados básicos das atividades mencionadas; transporte marítimo do petróleo bruto de origem nacional ou derivados básicos de petróleo produzidos no País, bem assim o transporte, por meio de conduto, de petróleo bruto, seus derivados e gás natural de qualquer origem; pesquisa, lavra, enriquecimento, reprocessamento, industrialização e 68 ASCARELLI, Túlio. Iniciación al estudio del derecho mercantil. Traduzido para o espanhol por Evello Verdera y Tuells. Barcelona: Bosch, 1964, p. 198-199.
  • 41. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br comércio de minérios e minerais nucleares e seus derivados (com exceção dos radioisótopos, que podem ser explorados por particulares mediante permissão em casos específicos). É correto dizer que “O monopólio é uma forma de intervenção do Estado na economia e está previsto expressamente, na Constituição Federal, para a hipótese de transporte de petróleo, de seus derivados e de gás natural, de origem nacional ou estrangeira, por meio de conduto”.69 É também a hipótese do art. 21, XXIII, que estabelece ser de competência da União explorar os serviços e instalações nucleares e exercer em regime de monopólio a pesquisa, a lavra, o enriquecimento e reprocessamento, a industrialização e o comércio de minérios nucleares e seus derivados, nos termos em que especifica. É certo, portanto, dizer que "A Constituição da República prevê áreas em que a exploração direta de atividade econômica pela União é feita por meio de monopólios"70 Fora das hipóteses previstas na Constituição, somente poderá haver exercício de atividade econômica pelo Estado quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou relevante interesse coletivo, na forma da lei. Está correto dizer que "apesar de reconhecida a primazia da iniciativa privada, caberá a atuação do Estado onde o legislador, numa decisão política, entender existir um 'relevante interesse coletivo'".71 69 CESPE/UnB – TRF-5ª Região, Concurso Público para Juiz Federal, prova objetiva, aplicação em 30/7/2006, questão nº 1. 70 CESPE/UnB, Concurso para provimento de cargos de Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados - Área VII - Finanças e Direito Comercial, Questão nº 75 (4), prova realizada em 29/9/2002.
  • 42. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br O exercício de atividade econômica em sentido estrito pelo Estado constitui intervenção direta do Estado na economia. Por isso, está correto dizer que "A criação de empresa estatal para explorar atividade econômica necessária aos imperativos da segurança nacional constitui forma de intervenção direta do Estado na atividade econômica".72 A intervenção direta na economia também é chamada de intervenção por absorção (o Estado exerce a atividade econômica em regime de monopólio) ou por participação (o Estado exerce a atividade econômica em regime de competição com particulares). 2.3.1.Exploração de atividade econômica pelas empresas estatais. A princípio, qualquer pessoa ou qualquer grupo de pessoas pode exercer atividade econômica. O direito, porém, regula como essa atividade deve ser feita. Essa regulação poderá ser objeto do direito econômico ou do direito comercial, agora visto como o direito de empresas. Outros ramos do direito também fazem regulação de aspectos da atividade econômica, como o direito do trabalho, o direito civil e o direito administrativo. Pode o Estado ser empresário? 71 FERREIRA FILHO, Manoel Gonçalves. Curso de direito constitucional, de acordo com a Constituição de 1988. 18. ed. São Paulo: Saraiva, 1990, p. 306. 72 Questão nº 62 (3) da prova realizada pelo CESPE em 3/3/2002, Concurso Público para provimento do cargo de Consultor Legislativo do Senado Federal - Área 5 - Direito Comercial e Econômico.
  • 43. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br A regra geral, conforme vimos no item 1.3.1, é no sentido de que o Estado não deve ser empresário, pois incumbe à iniciativa privada e não ao Estado o exercício da atividade econômica. Em regra, o empresário é uma pessoa física ou pessoa jurídica privada; em certos casos, porém, o Estado poderá ser empresário.73 Com efeito, pode o Estado explorar diretamente a atividade econômica quando for necessário para a segurança nacional ou para atender a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei (art. 173 da Constituição Federal).74 Nessas hipóteses, o Estado poderá criar pessoas jurídicas para essa atividade. São elas: empresa pública e sociedade de economia mista. Vejamos, inicialmente, as características comuns da empresa pública e da sociedade de economia mista, que chamaremos, genericamente, de empresas estatais. As empresas estatais podem explorar atividade econômica em pé de igualdade com os particulares; há empresas estatais, porém, que prestam serviço público, tal como veremos adiante. Tanto a empresa pública como sociedade de economia mista têm seu regime jurídico baseado na diretriz fixada pelo art. 173, da Constituição Federal, em sua redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 04 de junho de 1998: Art. 173. Ressalvados os casos previstos nesta Constituição, a exploração direta de atividade econômica pelo Estado só será permitida quando necessária aos imperativos da segurança nacional ou a relevante interesse coletivo, conforme definidos em lei. § 1º A lei estabelecerá o estatuto jurídico da empresa pública, da sociedade de economia mista e de suas subsidiárias que explorem atividade econômica de produção ou comercialização de bens ou de prestação de serviços, dispondo sobre: I - sua função social e formas de fiscalização pelo Estado e pela sociedade; II - a sujeição ao regime jurídico próprio das empresas privadas, inclusive quanto aos direitos e obrigações civis, comerciais, trabalhistas e tributários; III - licitação e contratação de obras, serviços, compras e alienações, observados os princípios da administração pública; 73 RIVA-SANSEVERINO, Luisa. Disciplina delle attività professionali: impresa in generale. Bologna: N. Zanichelli; Roma: Foro Italiano, 1977, p. 137. 74 SILVA, Bruno Mattos e. Direito de empresa: teoria da empresa e direito societário. São Paulo: Atlas, 2007, p. 472.
  • 44. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br IV - a constituição e o funcionamento dos conselhos de administração e fiscal, com a participação de acionistas minoritários; V - os mandatos, a avaliação de desempenho e a responsabilidade dos administradores. § 2º - As empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado. § 3º - A lei regulamentará as relações da empresa pública com o Estado e a sociedade. (...) É pacífico que a empresa pública e a sociedade de economia mista, embora criadas por iniciativa do Poder Público, quer exerçam atividade econômica em sentido estrito, quer prestem serviço público, são pessoas jurídicas de direito privado. O regime jurídico das empresas estatais é de direito privado, parcialmente derrogado pelo direito público, como inclusive se pode notar pela leitura do dispositivo constitucional supra transcrito. Na verdade, exatamente em razão dessa parcial derrogação, acho que seria mais adequado dizer que elas têm natureza híbrida, como afirmam alguns autores.75 Mas, para fins de concurso, deve-se dizer que as empresas estatais são pessoas jurídicas de direito privado, com o regime parcialmente derrogado pelo direito público. Algumas normas de direito público são aplicáveis às empresas estatais: necessidade de concurso público para admissão de empregados, necessidade de obediência à Lei nº 8.666, 21 de junho de 1993 (Lei de Licitações) para contratar etc. O art. 173, § 1º, da Constituição Federal prevê a edição de lei que tratará do regime jurídico da empresa pública e da sociedade de economia mista que exploram atividade econômica. Contudo, essa lei ainda não foi editada, razão pela qual, atualmente, todas empresas estatais devem obedecer à Lei nº 8.666/93. O cumprimento de execuções judiciais por parte da empresa pública e da sociedade de economia mista, como regra geral, não é feito por meio de precatório; os bens das empresas estatais, como regra geral, são passíveis de penhora; a execução dos 75 CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de direito administrativo. 10. ed. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2003, p. 392.
  • 45. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br seus créditos é regida pelo Código de Processo Civil, e não pela Lei de Execução Fiscal76 ; seus trabalhadores são regidos pelo direito civil, se prestadores de serviço, ou pelo direito do trabalho, se empregados, não existindo nos seus quadros a figura do servidor público, regido pelo direito administrativo, que existe nas autarquias e fundações criadas pelo Poder Público. Além disso, as empresas estatais são sujeitas ao controle do Tribunal de Contas (art. 71 da Constituição Federal) e do Congresso Nacional (art. 49, X, da Constituição Federal); e aplica-se aos seus dirigentes e empregados a proibição de cumulação de cargos, nos termos do art. 37, XVII). Com relação às sociedades de economia mista, é errado dizer que “os servidores não concursados dessas sociedades podem ser aproveitados em órgãos da administração direta, desde que já estivessem em exercício há 5 anos, na data da promulgação da Constituição Federal de 1988”,77 bem como também é errado dizer que “é permitida a contratação de pessoal para serviços permanentes por meio de ajuste civil de locação de serviços, sem que isso configure escapismo à exigência constitucional do concurso público”.78 Pelas mesmas razões, o mesmo se aplica à empresa pública e a qualquer empresa controlada, direta ou indiretamente, pelo Poder Público. Por isso se diz que as empresas públicas e sociedades de economia mista são pessoas jurídicas de direito privado, com regime jurídico parcialmente derrogado pelo direito público. A sociedade anônima tem uma função social, não devendo apenas buscar o lucro. Com relação às empresas estatais, a necessidade de cumprimento de fins sociais tem relevo ainda maior. Certas situações que poderiam caracterizar abuso no poder de controle em uma sociedade regida unicamente pelo direito privado poderão ser lícitas e manifestamente justas em uma empresa estatal. 76 SILVA, Bruno Mattos e. Execução Fiscal. Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 1. 77 CESPE/UNB – Procurador do Estado do Espírito Santo/Concurso Público – aplicação em 7/11/2004, questão nº 52. 78 CESPE/UNB – Procurador do Estado do Espírito Santo/Concurso Público – aplicação em 7/11/2004, questão nº 53.
  • 46. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br Assim, pode ser adequado do ponto de vista da ação estatal a venda de determinados produtos a com reduzida margem de lucro, a preço de custo ou mesmo a preços subsidiados, como forma de beneficiar um outro segmento da atividade econômica ou mesmo a população em geral. Por exemplo, quando, em maio de 2006, foram elevados os custos de empresa controlada da Petrobras que opera na Bolívia, por força de ato do Governo local, o Presidente do Brasil declarou que esse aumento não seria repassado ao consumidor brasileiro.79 A toda evidência, tratou-se de atitude lícita do controlador indireto, no caso, o Governo brasileiro, já que a função social de uma empresa estatal tem relevância maior do que a simples busca de lucros. Quem opta por ser acionista de uma sociedade de economia mista sabe (ou deveria saber) que o objetivo do controlador poderá não ser o lucro, assim como a busca de outros objetivos fazem parte do regime jurídico da sociedade de economia mista ou de uma empresa pública. A teor do art. 4º, II, do Decreto-lei nº 200/67, as empresas públicas e as sociedades de economia mista fazem parte da administração indireta. Essas entidades vinculam-se ao Ministério em cuja área de competência estiver enquadrada sua principal atividade (art. 4º, parágrafo único, do Decreto-lei nº 200/67) e estão abrangidas pelo art. 37, XXI, da Constituição Federal: Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte: (...) XXI - ressalvados os casos especificados na legislação, as obras, serviços, compras e alienações serão contratados mediante processo de licitação pública que assegure igualdade de condições a todos os concorrentes, com cláusulas que estabeleçam obrigações de pagamento, mantidas as condições efetivas da proposta, nos termos da lei, o qual somente permitirá as exigências de qualificação técnica e econômica indispensáveis à garantia do cumprimento das obrigações.
  • 47. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br A teor do disposto no Decreto-lei nº 200/67, as empresas estatais estão sujeitas à supervisão do Ministro de Estado competente, mas a elas estão asseguradas as condições de funcionamento idênticas às do setor privado, cabendo ajustar-se ao plano geral do Governo. As empresas estatais deverão estar habilitadas a prestar contas da sua gestão, pela forma e nos prazos estipulados em cada caso; prestar a qualquer momento, por intermédio do Ministro de Estado, as informações solicitadas pelo Congresso Nacional; evidenciar os resultados positivos ou negativos de seus trabalhos, indicando suas causas e justificando as medidas postas em prática ou cuja adoção se impuser, no interesse do Serviço Público. A Constituição Federal estabelece que as empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às do setor privado (art. 173, § 2º). Portanto, é correto dizer que “Uma empresa pública federal constituída para prestar serviços de transmissão de energia elétrica, não pode gozar de incentivos fiscais não extensivos às empresas do setor privado”.80 mas está errado dizer que "as empresas públicas e as sociedades de economia mista não poderão gozar de privilégios fiscais", uma vez que a Constituição não veda privilégios fiscais para as empresas estatais, mas apenas proíbe que tais privilégios não sejam extensivos às empresas privadas, razão pela qual está correto dizer que "as empresas públicas e as sociedades de economia mista, ao explorarem serviços públicos, poderão gozar de privilégios fiscais"81 e está errado dizer que “As empresas públicas criadas para o desempenho de atividade econômica relevante poderão gozar de privilégios fiscais não extensivos às empresas do setor privado”.82 79 Notícia estampada na primeira página do jormal Correio braziliense de 6 de maio de 2006. 80 CESPE/UnB – Município de Vitória, Concurso Público para Procurador Municipal, aplicação em 3/6/2007, questão nº 97. 81 CESPE/UnB, Concurso para provimento de cargos de Consultor Legislativo da Câmara dos Deputados - Área VII - Finanças e Direito Comercial, Questão nº 75 (5), prova realizada em 29/9/2002. 82 Tribunal de Justiça de Santa Catarina, Concurso para Juiz de Direito– Prova tipo 1, aplicação em agosto de 2007, questão nº 58, alternativa “b” (incorreta).
  • 48. DIREITO ECONÔMICO PARA CONCURSOS Bruno Mattos e Silva http://www.brunosilva.adv.br A Constituição Federal estabelece que a criação de empresa pública e de sociedade de economia mista deve ser autorizada por lei: Art. 37 (...) XIX – somente por lei específica poderá ser criada autarquia e autorizada a instituição de empresa pública, de sociedade de economia mista e de fundação, cabendo à lei complementar, neste último caso, definir as áreas de sua atuação; A expressão autorização legislativa é utilizada também pela Lei nº 6.404/76, no caput do art. 236 ao tratar da constituição da sociedade de economia mista: Art. 236. A constituição de companhia de economia mista depende de prévia autorização legislativa. A empresa pública e a sociedade de economia mista não são criadas por lei, mas sim pelos procedimentos próprios, previsto na lei que autoriza a criação da empresa pública e, no caso das sociedades de economia mista, na Lei nº 6.404/76. Assim, é errado dizer que “As sociedades de economia mista e as empresas públicas têm em comum a sua criação por lei”.83 Portanto, tecnicamente, as sociedades de economia mista e empresas públicas não são “criadas” por lei (mas sim sua criação é autorizada por lei). Em um concurso público, foi considerado correto dizer que, "com base no art. 37, XIX, da CF, somente por lei específica podem ser criadas": "as autarquias" (alternativa "b", correta), mas não "as sociedades de economia mista e suas subsidiárias" (alternativa "c", incorreta) nem "todas as entidades de administração indireta" (alternativa "d", incorreta).84 83 CESPE/UNB/PGE-CE/Concurso Público – aplicação em 15/2/2004, questão 27(d). 84 TJRO - Concurso Público de Provas e Títulos para Ingresso e Remoção para os Serviços Notariais e de Registro do Estado de Rondônia, realizado em 2004/2005, questão nº 6.