O outono do nosso descontentamento está aí (política e economia em Portugal)
1. O OUTONO DO NOSSO DESCONTENTAMENTO ESTÁ AÍ
Sumário
A tara privatizadora
Nova contabilidade junta dívida à dívida
Retoma, onde te escondes?
A brilhante classe política portuguesa
+++++//+++++
A tara privatizadora
A desaparição da PT, engolida na Oi, faz lembrar quando a empresa teve de ceder a
Vivo à Telefónica1 com altos lucros para os acionistas, dominados pelo BES, o mesmo
que, recentemente, utilizou o seu agente Granadeiro e outros para uma golpada de
900 M na PT; esta empresa foi uma desnatadeira do regime cleptocrático vigente há
perto de 40 anos, RIP.
Também a Cimpor foi comprada por brasileiros, a EDP por chineses, a REN por
franceses, a Tranquilidade ficará para americanos, a Espirito Santo Saúde para
mexicanos, etc. enquanto o cervejeiro nomeado para ministro se afadiga na magna
tarefa de vender a TAP, depois de concretizada a alienação dos CTT. Tudo isto para
além da costumeira e silenciosa2 privatização que se oculta nas rubricas de
fornecimentos e serviços de terceiros das entidades públicos, como emanações
contabilísticas de lógicas de downsizing complementadas com outsourcings. Essas
designações em inglês constituem pretensões provincianas de modernidade ou - de
pugresso como verbaliza Cavaco – que ocultam a indigência cultural dos mandarins
governamentais. Está aberta uma feira internacional de privatizações com saldos,
promoções e contribuições para o cofre do partido.
1 http://www.slideshare.net/durgarrai/pt-cimpor-e-banca-as-atribulaes-de-um-capitalismo-subalterno
2 http://www.slideshare.net/durgarrai/segurana-social-processos-de-descapitalizao-1
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2. Tornou-se uma imagem de marca do gang governamental um afã privatizador que já
ultrapassou, largamente, as exigências da troika3, podendo a qualquer momento surgir
a privatização da água. Na banca, em breve o domínio nacional ficará reduzido à CGD,
descapitalizada pelo gang PSD/PS, para tapar o buraco BPN; e portanto, uma CGD
barata quando em rampa de lançamento de privatização. Quanto ao BES-bom, a banca
concorrente interessada na compra tem todo o interesse na sua desvalorização4 sendo
o dinheiro público - previamente emprestado pela troika e colocado no Fundo de
Resolução5 - um sério candidato a perdas, necessárias para que a feira dos saldos se
apresente competitiva.
Segundo nos confidenciou Marques Mendes, bem informado sobre o que se diz no
Conselho de Ministros e arredores, o governo prepara novas fontes de receita. O pré-fabricado
Maduro, cuja voz emite som de gaita, propôs uma concessão, durante vinte
anos, da expressão da língua portuguesa em Portugal à Bertelsmann que cobrará a
todos os falantes uma taxa, a incluir na fatura da eletricidade; ficando isentos bófias,
militares, a confraria da toga e a classe política, por sugestão de vários ministros.
Passos ficou de consultar o Moedas, agora com a pasta da inovação em Bruxelas.
Por seu turno, o inteligente Pires das cervejas defendeu parcerias público-privadas para
todas as Ruas Direitas ou Ruas Tenente Valadim do país, com pórticos a instalar
também nos passeios; e, finalmente, o Aguiar Branco propôs que a sua firma de
advogados inicie contactos para que ao nome do mosteiro dos Jerónimos se
acrescente Fly Emirates, pagando os Emirados a promoção a efetuar junto dos turistas.
As fantasias nos parágrafos anteriores não são muito diversas de outras efetivamente
despejadas nos media pelo gang governamental.
A primeira prende-se com Portas, quando afirmou ter Lagarde cometido um “lapso
involuntário” (poderia ter sido um “lapso de esquecimento”, não?) porque aquela não
relevou o esforço governamental na redução (?) do desemprego.
A segunda saiu da cloaca de um untuoso criativo, secretário do carocho Mota Soares,
segundo o qual "a solução que está encontrada (para o emprego) é uma solução que
privilegia que os serviços privados de emprego podem ser exercidos em função da
atividade económica que as entidades venham a deter. Significa isto que empresas de
trabalho temporário que tenham uma atividade económica também associada às
agências privadas de colocação poderão naturalmente desenvolver essas atividades"6.
Até ao século XIX havia pessoas apanhados nas zonas da floresta africana,
encaminhadas como escravos, por sobas do litoral que os comercializavam com os
ocidentais, com relevo para os portugueses, por troca com armas, álcool e missangas.
Cerca de dois séculos depois os sobas do governo, bem dentro da tradição de
3 http://economico.sapo.pt/noticias/portugal-privatizou-mais-dois-mil-milhoes-do-que-o-acordado-com-a-troika_200880.html
4
http://www.jornaldenegocios.pt/empresas/detalhe/ulrich_estou_convicto_que_o_novo_banco_nao_vale_49_mil_milhoes.html
5 http://grazia-tanta.blogspot.pt/2014/08/o-bes-bom-o-bes-mau-e-ma-gestao-dos.html
6 http://www.noticiasaominuto.com/economia/273253/aberto-mercado-de-emprego-a-agencias-de-trabalho-
temporario
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3. traficantes, capturam desempregados e entregam-nos aos atuais negreiros, as
empresas de trabalho temporário, cuja função útil se desconhece. Pela conversa do
volumoso energúmeno, a civilização deverá recuar dois séculos, para bem do
banditismo, do empreendorismo, do mercado, da competitividade.
Nova contabilidade junta dívida à dívida
Dia 1 de setembro terão sido refletidos nas contas nacionais as alterações
contabilísticas integradas num novo plano estatístico (SEC10) para as contas do
Eurostat. Quando a dívida pública representava 125.7% do PIB (dezembro/2013)
orçava-se que aquelas alterações contabilísticas fariam elevar aquela relação para
136% quando introduzidas a partir de setembro7. Ora acontece que em julho último e
antes da aplicação da nova norma, a dívida pública estará pelos 132.8% do PIB, sendo
de prever uma nítida ascensão quando forem revelados dados de setembro, lá para
novembro, com a inclusão nas contas, de entidades até agora não consolidadas em
termos de dívida pública, no âmbito das operações de desorçamentação que foram
regra até anos recentes. E ainda falta ver como se contabiliza o apoio ao Fundo de
Resolução do BES-bom e, sobretudo o tóxico que dali possa emanar.
Retoma, onde te escondes?
A evolução recente tem vindo a confirmar tudo o que dissemos em março, quando
demonstrámos não ser pagável a dívida pública portuguesa8, ao contrário do governo
que vem enganando a população com uma retoma que não se afirma, de uma
melhoria das contas públicas sempre adiada e com uma oposição tosca que se
contenta em pedir as migalhas de uma reestruturação, para não magoar Bruxelas,
Frankfurt ou o capital financeiro global.
Apesar de privatizações, cortes na despesa e aumentos de impostos, de alterações na
legislação do trabalho, no cálculo das pensões, a dívida continua a crescer
regularmente acentuando a relevância dos seus encargos em juros e amortizações,
como comentámos, a propósito do Documento de Estratégia Orçamental (DEO) do
governo9.
A constante promessa de que a redução da dívida pública está próxima, de que a
austeridade vai acabar, de que a retoma já está no terreno, não se têm verificado. O
relógio que o sacripanta Portas colocou a contar os dias em falta para a saída da troika,
terá avariado ou não passou de um truque infantil para ocultar a tutela da UE enquanto
a dívida pública não se quedar pelos 60% do PIB e o deficit na ordem dos 3%. A OCDE,
pouco suspeita de antipatia para com as receitas da troika, da UE, do FMI para com
7 http://www.noticiasaominuto.com/economia/160124/divida-publica-aumenta-quase-10-do-pib-com-novas-
regras#.UthDGPRdUYE
8 http://grazia-tanta.blogspot.pt/2014/03/porque-nao-e-pagavel-divida-publica.html
9 http://grazia-tanta.blogspot.pt/2014/05/a-obra-suja-do-passos.html
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4. países endividados e empobrecidos revela que Portugal não sai do atoleiro, após mais
de três anos de austeridade e cortes.
Num plano global de anemia económica é nítido que Portugal começou a regredir
desde março, pouco depois da Irlanda e da Alemanha, enquanto a Espanha e a Grécia
mantêm um pendor ascendente há bastante mais tempo. Lagarde sabia o que dizia
sobre a marcha das economias dos países intervencionados e, se referiu Espanha e não
Portugal como um caso de saída da fossa, não foi por “lapso involuntário” como disse
o pantomineiro Portas.
No gráfico que se segue evidencia-se uma grande redução do saldo da balança
corrente – que até se tornou positivo no último semestre do ano transato - mas que se
deteriora já este ano, pela primeira vez desde 2011. Esse menor desequilíbrio deveu-se
essencialmente à quebra das importações, na sequência do menor poder de compra da
população e da grande quebra do investimento; e, menos ao aumento das
exportações. No primeiro semestre de 2014, pela primeira vez no período considerado,
aumentam as importações e reduzem-se as exportações, contrariamente à estúpida
fixação na ortodoxia neoliberal levada a cabo pelo subserviente governo em funções.
Essa estupidez acaba de ser vincada pela Comissão Europeia quando afirma10 que a
intervenção da troika "contribuiu para a implementação de reformas com vista a
melhorar a competitividade" e que "o futuro crescimento económico (de Portugal)
deve ser baseado na capacidade de aumentar a exportação de bens e serviços com alto
10 http://www.noticiasaominuto.com/economia/274012/portugal-deve-prosseguir-esforcos-para-melhorar-
competitividade
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5. valor acrescentado, juntamente com a capacidade de atrair investimento estrangeiro".
Para os teólogos neoliberais cada capitalista deve produzir para a exportação, ser
competitivo e desprezar o consumo interno que deverá ser satisfeito por bens e
serviços importados. Mas como esta filosofia é aplicada por todos e a competitividade
repousa no esmagamento de salários e outros rendimentos, a recessão fica garantida
para todos.
Fonte primária: Banco de Portugal
Neste contexto ideológico que favorece o capital financeiro e a transnacionalização da
estrutura produtiva global, são cada vez menos comuns os gorgolejos patrióticos sobre
os centros de decisão nacionais, vindo de muitos dos que traficam ações para engordar
contas em off-shores. A própria Comissão Europeia coloca delicadamente uma questão
relevante – pouco falada em Portugal; a da histórica baixa qualidade dos capitalistas
lusos, incapazes de investir para além das altas cilindradas mas hábeis no fomento de
uma classe política tão indigente cultural quanto corrupta (uns por ação, outros porque
olham para o lado).
Diz também a Comissão que se deve combater a falta de investimento. Ora, como se
sabe, a Comissão acreditará que a lógica de Draghi em reduzir a taxa de referência
para 0.05% vai promover catadupas de investidores na zona euro; o que equivale a
acreditar que o fim da URSS resultou das preces em Fátima pela “conversão da Rússia”.
Num quadro típico de recessão, com a redução do poder de compra, o desemprego,
etc. ninguém se mete em negócios (excepto armas, órgãos humanos, imigrantes,
corrupção e especulação financeira). E é inútil imaginar como o faz o BCE que baixando
a taxa de juro aumenta os apetites investidores.
Deverão ser as pessoas a tomar o seu futuro nas suas próprias mãos ou terão de
suportar - e em agravamento - as manobras do capital financeiro, dos capitalistas em
geral e dos seus funcionários da classe política.
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6. A brilhante classe política portuguesa
A propósito da classe política é interessante ver como se sucedem os desastres
governamentais pelas mãos do matemático Crato11 e ver os reitores das universidades
preocupados com a empresarialização do ensino e a competitiva captação de
estudantes estrangeiros para compor o orçamento, bem como o fomento de bolseiros
para toda a vida. Ou observar como a advogadeca Teixeira da Cruz se atasca no
downsizing (mais um) do sistema judiciário, com o programa informático central
bloqueado12 e processos com folhas trocadas ou a voar numa avenida de Setúbal tal
como ver como em poucos meses, o pomposo DEO – Documento de Estratégia
Orçamental ficou obsoleto. E ainda recordar como Passos ou Portas de férias deixaram
o assunto BES nas mãos do Carlos Costa do BdP, como frágil tradutor dos despachos
de Draghi. Enfim, tudo num plano no qual, em institutos e reguladores se encaixam os
elementos de uma administração pública paralela criada com os membros mais
ignotos do partido-estado ou jotinhas, enquanto os verdadeiros funcionários são
convidados à rescisão.
Quanto ao que se chama eufemisticamente “oposição” o espetáculo não é melhor até
porque o acesso aos meios do Estado é muito menor. O PS anda envolvido num
wrestling verbal entre o encarregado de um interregno cujo fim se aproxima e um
mafioso convencido de ter chegado a hora de se candidatar ao pódio, salivando com o
cheiro do orçamento do Estado, muito superior ao da autarquia lisboeta. Enfim, a luta
entre um D. António, prior do Rato e um outro D. António que quer ser o prior
seguinte.
Para os lados menos à direita do espectro eleitoral, o PC anuncia uma recolha de
fundos para alargamento do seu Parque Jurássico onde poderão proceder à
preparação de postes fronteiriços após uma tão desejada saída do euro. O minguante
BE discute o sexo dos anjos a apresentar na sua convenção, incapaz de se emancipar
do seu guru fundador, que se desdobra em livros e guiões, na apresentação de serviço,
para ser ministro do novo governo do PS.
Neste desastre económico e nesta miséria política, alguém se poderá admirar que
Portugal seja apenas um local geográfico onde se cruzam redes transnacionais de
negócios, que se estão nas tintas para qualquer harmonia estrutural da economia
paroquial? Resulta de tudo o que se disse, um país subalterno e 10.5 M de colonizados,
com muitos tontos a sonhar com soberania, fronteiras, com uma melhor seleção de
futebol, numa olímpica ignorância das caraterísticas do capitalismo de hoje.
Qualquer solução passará sempre pela ação conjunta dos povos europeus, do sul
especialmente, contra o capital financeiro, as multinacionais e as classes políticas
nacionais ou destacadas em Bruxelas
11 O matemático alterou o algoritmo da sua vida quando viu, depois de 1975, que a ditadura do
proletariado lhe não traria tacho e poder
12 http://www.noticiasaominuto.com/pais/273402/ha-dois-anos-que-ministra-sabia-que-citius-ia-dar-problemas
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7. E se não mexermos os pezinhos nem colocarmos as meninges a borbulhar,
coletivamente, sem gurus nem chefes partidários, devemos estar preparados para
longos invernos de frio, muitos verões de seca, fome nas barrigas a contrastar com a
abundância de promessas e comentadores na tv.
Outros documentos em:
http://grazia-tanta.blogspot.com/
http://pt.scribd.com/profiles/documents/index/2821310
http://www.slideshare.net/durgarrai/documents
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