1. Equac~oes Diferenciais Parciais e o Teorema de Exist^encia e Unicidade para o
Problema de Cauchy, caso linear
Cristiane C. F. Cintra1y, Luciana B. Goecking2
1Discente do curso de Matematica Licenciatura da Universidade Federal de Alfenas.
2Docente do Instituto de Ci^encias Exatas da Universidade Federal de Alfenas.
Resumo: Seja
de R2 uma regi~ao aberta, I um intervalo aberto e a equac~ao linear de primeira
ordem n~ao homog^enea em sua forma mais geral a(x; y)ux +b(x; y)uy = c(x; y) e a condic~ao ini-cial
u((t); (t)) = f(t) em que a, b e c s~ao de classe C1 em
que contem a curva suave
= ((t); (t)); t 2 I, chamada curva inicial do problema. Este tipo de problema e chamado
um Problema de Cauchy. Para resolvermos este problema de Cauchy sera de import^ancia fun-damental
o conceito das curvas caracterstica da equac~ao, pois estas representam o ponto de
partida na busca da soluc~ao para o problema.Tambem, veremos que a forma como as curvas ca-racter
sticas intersectam a curva inicial ((t); (t)) dada determina se o problema tera soluc~ao
unica, in
2. nitas soluc~oes ou se a soluc~ao n~ao existe. Veremos o Teorema de Exist^encia e Unici-dade
que nos da as condic~oes necessarias para a exist^encia e unicidade da soluc~ao do Problema
de Cauchy mencionado. E
importante observar que o Teorema de Exist^encia e Unicidade nos
garante apenas resultados locais, ja que o comportamento das curvas caractersticas longe da
curva inicial pode tornar-se demasiado complexo.
Palavras-chave: Problema de valor inicial, mudanca de variaveis, curva caracterstica.
Abstract: It
of R2 is a open region, I an open interval and the linear equation of
3. rst or-der
non homogeneous in its most general form a(x; y)ux + b(x; y)uy = c(x; y) and the initial
condition u((t); (t)) = f(t) that a, b and c are C1 class in
that contains the smoth curve
= ((t); (t)); t 2 I, initial curve of problem. This type of problem is called a Cauchy Pro-blem.
To solve this Cauchy problem is fundamental the concept of characteristic curves of the
equation, since these represent the starting point in the search for solution to the problem. Also,
we will see that the way in which the characteristic curves intersect the initial curve ((t); (t))
given determines whether the problem will have unique solution, endless solutions or if the so-lution
does not exist. We will see the Existence and Uniqueness Theorem that gives us the
necessary conditions for the existence and uniqueness of solution of Cauchy Problem cited. It is
important to note that the Existence and Uniqueness Theorem guarantees us just local results,
since the behavior of the characteristic curves away from the initial curve can become to complex.
Keywords: Initial value problem, variable changes, curve feature.
yCorresponding author: cristiane.uai@oi.com.br.
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
4. Cintra e Goecking (2012) 45
Introduc~ao
As Equac~oes Diferenciais Parciais (EDP's) s~ao utilizadas para descrever acontecimentos f-
sicos, biologicos, entre outros. Da a grande relev^ancia de seu estudo.
De acordo com Bassanezi e Junior (1988, p. 2) ...as Equac~oes Diferenciais talvez sejam o
ramo da matematica que tenha maior proximidade e interac~oes com outras ci^encias.
Muitos fen^omenos que ocorrem na otica, mec^anica, biologia, entre outros, podem ser mo-delados
por Equac~oes Diferenciais Parciais. A Elasticidade e a Din^amica dos Fluidos, [...]
tiveram seu desenvolvimento em comum com uma grande e boa parte da teoria matematica
destas equac~oes. (BASSANEZI; JUNIOR, 1988, p. 469). A soluc~ao de inumeros problemas de
import^ancia pratica e cient
5. ca em Mec^anica do Meio Contnuo depende do desenvolvimento da
teoria das EDP's.
Considere a equac~ao linear de primeira ordem n~ao homog^enea
a(x; y)ux + b(x; y)uy = c(x; y); (x; y) 2
u((t); (t)) = f(t); t 2 I
em que
R2 e um aberto, a; b; c 2 C1(
), I representa um intervalo aberto e
= ((t); (t))
e uma parametrizac~ao de uma curva qualquer em
, denominada Curva Inicial do problema.
Este tipo de problema e chamado um Problema de Cauchy.
O Problema de Cauchy e um problema classico dentro da teoria das Equac~oes Diferenciais.
A. L. Cauchy (1789-1857) demonstrou rigorosamente pela primeira vez, e por
tr^es metodos diferentes, a exist^encia de soluc~oes para uma vasta classe de
Equac~oes Diferenciais que inclui essencialmente todos os modelos conhecidos.
(BASSANEZI; JUNIOR, 1988, p. 9).
Vamos ver como resolver problemas de Cauchy para equac~oes lineares de primeira ordem com
duas variaveis independentes. Para isto, estudaremos o Teorema de Exist^encia e Unicidade para
o caso linear para o Problema de Cauchy. Este teorema nos fornecera as condic~oes necessarias
para que este problema tenha soluc~ao e para que esta seja unica.
Conceitos Fundamentais
Notac~oes
Seja
Rn um aberto e u :
! R uma func~ao diferenciavel. Se u = u(x1; :::; xn) e uma
func~ao de varias variaveis, usaremos diferentes notac~oes para as derivadas parciais de u. Por
exemplo,
(i)
@u
@x1
; ux1 ; @x1u ou D1u denota a derivada parcial de u em relac~ao a primeira variavel x1.
(ii)
@2u
@x2@x1
; ux1x2 ; @x2@x1u ou D2D1u denota a derivada de u primeiro em relac~ao a x1 e
depois a x2.
(iii)
@2u
@x2i
; uxixi ; @2
xiu ou D2
i u denota a derivada de segunda ordem de u com relac~ao a mesma
variavel xi.
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
6. Cintra e Goecking (2012) 46
Equac~ao Diferencial Parcial
Uma Equac~ao Diferencial Parcial (EDP) e uma equac~ao que envolve variaveis independentes
x1; x2; :::; xn e derivadas parciais de uma func~ao (variavel dependente) u = u(x1; x2; :::; xn). Uma
EDP em n variaveis independentes x1; :::; xn e uma equac~ao da forma
F
x1; :::; xn; u;
@u
@xi
;
@2u
@xi@xj
; :::;
@mu
@xi1:::@xim
= 0 (1)
em que x = (x1; ::; xn) 2
, que representa um subconjunto aberto de Rn, u :
! R e uma
func~ao com derivadas parciais de ordem m.
Obs.: Um subconjunto
de Rn e aberto se, dado qualquer x0 2
, existe uma bola aberta de
raio r 0 centrada em x0 inteiramente contida em
.
Exemplos de EDP's:
1) ut = uxxx + uux
2) xux yuy = sen(xy)
3) (ux)2 x2 + ut = 0
Classi
8. cada segundo sua ordem e linearidade.
A ordem de uma EDP e dada pela sua derivada parcial de maior ordem. Dizemos que a
EDP (1) e linear se F e linear em relac~ao a u e a todas as suas derivadas parciais; caso contrario
a EDP e dita n~ao linear.
O exemplo 1) e uma EDP linear de terceira ordem, no exemplo 2), temos uma EDP linear
de primeira ordem e no exemplo 3), a EDP e n~ao linear de primeira ordem.
Uma EDP linear de primeira ordem possui a forma geral
Xn
j=1
aj(x)Dju + b(x)u + c(x) = 0; (2)
em que algum dos coe
9. cientes aj n~ao e identicamente nulo.
Ja no caso de equac~oes de segunda ordem, a forma mais geral de uma EDP linear e
Xn
i;j=1
aij(x)DiDju +
Xn
j=1
bj(x)Dju + c(x)u + d(x) = 0; (3)
em que algum dos coe
10. cientes aij n~ao e identicamente nulo.
Caso a EDP possua duas variaveis independentes x; y, as equac~oes (2) e (3) podem ser
reescritas, respectivamente,
A(x; y)ux + B(x; y)uy + C(x; y)u + D(x; y) = 0; (4)
A(x; y)uxx + 2B(x; y)uxy + C(x; y)uyy + D(x; y)ux + E(x; y)uy + F(x; y)u + G(x; y) = 0: (5)
Obs.: A equac~ao (5) n~ao contem o termo com uyx, pois procuramos soluc~oes u que s~ao duas
vezes continuamente diferenciaveis na regi~ao de interesse e, para tais func~oes, uxy = uyx.
Uma EDP linear e dita homog^enea se o termo que n~ao contem a variavel dependente e
identicamente nulo. O exemplo 1) e de uma EDP linear homog^enea e no exemplo 2) temos uma
EDP linear n~ao homog^enea.
As equac~oes (4) e (5) se tornam homog^eneas quando as func~oes D(x; y) e G(x; y) s~ao res-pectivamente
iguais a zero.
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
11. Cintra e Goecking (2012) 47
Tr^es EDP's importantes
1) A equac~ao de Laplace,
@2u
@x2 +
@2u
@y2 = 0;
e uma equac~ao linear de segunda ordem homog^enea.
2) Uma outra equac~ao importante e a equac~ao unidimensional de calor
@u
@t
= 2 @2u
@x2 ;
onde u = u(x; t), x 2 R, t 0 e 2 e uma constante. E
uma equac~ao de segunda ordem,
linear e homog^enea.
3) A equac~ao unidimensional de onda
@2u
@t2 = c2 @2u
@x2 :
e tambem linear, homog^enea e de segunda ordem.
Obs.: O termo unidimensional faz refer^encia ao fato de x ter dimens~ao espacial 1, enquanto t
representa o tempo.
O Operador Diferencial Parcial L
Consideremos uma EDP de primeira ou segunda ordem com n variaveis independentes
x1; :::; xn. Considerando uma equac~ao do tipo
Xn
i;j=1
aij(x)DiDju +
Xn
j=1
bj(x)Dju + c(x)u + d(x) = 0: (6)
Denotaremos por k a ordem da equac~ao, k = 1 ou k = 2. Note que se k = 1, ent~ao aij 0
quaisquer que sejam i; j 2 f1; :::; ng e existe j; 1 j n, tal que bj6 0.
Podemos colocar a equac~ao (6) na forma
Lu = f; (7)
em que f(x) = d(x) e
(Lu)(x) =
Xn
i;j=1
aij(x)DiDju(x) +
Xn
j=1
bj(x)Dju(x) + c(x)u(x): (8)
A cada func~ao u corresponde uma unica func~ao Lu. Assim, de
12. nimos o operador ou trans-forma
c~ao L. Considere
um subconjunto aberto de Rn, onde as func~oes aij ; bj e c, 1 i; j n;
s~ao contnuas em
e tomam valores reais. De
13. nimos, ent~ao
L : Ck(
) ! C(
) (9)
u7! Lu
onde Lu e dado pela formula (8) e Ck(
) e o conjunto das func~oes u :
7! R que s~ao k vezes
continuamente diferenciaveis.
O operador L representa um exemplo de um operador diferencial parcial. Como a equac~ao
(6) e linear, temos que o operador L de
14. nido por (8) e um operador linear, isto e, L leva a
func~ao identicamente nula nela mesmo e
L(u + v) = Lu + Lv (10)
para quaisquer u; v no domnio de L e qualquer escalar 2 R.
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
15. Cintra e Goecking (2012) 48
Curvas Caractersticas
A seguir, vamos de
16. nir o conceito de Curvas Caractersticas, ja que estas desempenham
importante papel na obtenc~ao da soluc~ao para o Problema de Cauchy. Para isso, introduzimos
o conceito do Metodo das Caractersticas cuja ideia principal para resolver equac~oes de primeira
ordem consiste em obter curvas ao longo das quais a EDP se reduz a um sistema de EDO's que s~ao
as curvas caractersticas da equac~ao. Em seguida, a EDO obtida e integrada ao longo das curvas
caractersticas para se obter a soluc~ao. Podemos dizer que ao longo das curvas caractersticas,
a EDP se comporta como uma derivada total que, provavelmente, pode ser integrada.
Vamos a um exemplo simples para entendimento do conceito e de como obter as curvas
caractersticas.
Considere a equac~ao:
ut + c(x; t)ux = 0 em R2 ()
Se (x(t); t) e uma curva arbitraria do plano xt, a derivada de u ao longo desta curva e dada
por
d
dt
u(x(t); t) = ut(x(t); t) + x0(t)ux(x(t); t)
Por () temos que du
dt = 0 ao longo das curvas em que x0(t) = c(x; t).
Donde podemos concluir que u e constante ao longo das curvas x0(t) = c(x; t), ou seja, a
EDP () foi reduzida a EDO u0 = 0 ao longo de curvas caractersticas da equac~ao que s~ao as
curvas (x(t); t) que satisfazem a EDO x0(t) = c(x; t).
Para obter a soluc~ao para o problema, basta integrar a EDO ao longo dessas curvas carac-ter
sticas. Da segue a de
18. nic~ao: As curvas caractersticas da equac~ao ut + c(x; t)ux = 0 s~ao as curvas soluc~oes da
EDO x0(t) = c(x; t).
Considerando agora o problema
a(x; y)ux + b(x; y)uy = 0; (x; y) 2
u((t); (t)) = f(t); t 2 I;
temos a de
20. nic~ao: Seja
um aberto de R2. As curvas caractersticas da equac~ao linear homog^enea de
primeira ordem
a(x; y)ux + b(x; y)uy = 0
com a; b 2 C1(
) s~ao as curvas C(s) = ((s);
24. (s))
Exemplo: Usando o metodo das caractersticas encontre a soluc~ao para o problema n~ao ho-mog^
eneo
3ux 4uy = x2; (x; y) 2 R2
u
t;
3
4
t
=
t3
9
; t 2 R
Primeiramente, vamos encontrar as curvas caractersticas da equac~ao homog^enea correspondente
3ux 4uy = 0.
Temos que
0(s) = 3
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
26. 0(s) = 4
Deste sistema de EDO's, vemos que as curvas caractersticas s~ao as retas
(s) = 3s + x0
27. (s) = 4s + y0
Denotando por
(t) = ((t); (t)) = (t; 3
4 t) a curva inicial dada, vemos que os vetores
(0(t); 0(t)) e (a((t); (t)); b((t); (t))) s~ao Linearmente Independentes, para todo t 2 R, o
que signi
28. ca que uma unica curva caracterstica passa pelo ponto ((t); (t)).
Ent~ao, podemos cobrir uma vizinhanca da curva
com essas curvas caractersticas e fazer
as mudancas de variaveis de (x; y) para (s; t), t 2 I, de modo que tenhamos
(s) = x(s; t)
29. (s) = y(s; t)
tomando como pontos iniciais para estas retas caractersticas os pontos ao longo da reta inicial
y = 3
4 t dada no problema, temos
x(s) = 3s + t
y(s) = 4s +
3
4
t
Integrando
d
ds
u(x(s); y(s)) = uxx0(s) + uyy0(s) = x2 = (3s + t)2
de 0 ate s, obtemos
u(x(s); y(s)) u(x(0); y(0)) =
(3s + t)3
9
t3
9
u(x(s); y(s)) =
(3s + t)3
9
t3
9
+ u(x(0); y(0)) =
x3(s)
9
t3
9
+
t3
9
=
x3(s)
9
Portanto, a soluc~ao para o problema e x3
9 :
O Problema de Cauchy
Nesta sec~ao, estudaremos equac~oes lineares de primeira ordem. Primeiramente sera mostrado
o estudo de problemas de Cauchy para equac~oes lineares sem depend^encia explcita na variavel
dependente. Depois, discutiremos o caso geral de soluc~oes de equac~oes lineares.
O Problema de Cauchy
Estamos estudando o problema de Cauchy para a EDP linear da forma
a(x; y)ux + b(x; y)uy = c(x; y); (11)
em que a incognita u aparece apenas na parte principal de (11).
Existe uma relac~ao entre a curva inicial
e a regi~ao aberta
R2, onde queremos que exista
soluc~ao e que ela seja unica:
deve ser coberta por caractersticas planas que intersectam
em
apenas um ponto.
Parametrizando
por ((t); (t)), t 2 I, nosso problema
30. ca:
a(x; y)ux + b(x; y)uy = c(x; y); (12)
u((t); (t)) = f(t); t 2 I;
R2
em que
e um aberto que contem
:
Hipoteses sobre este Problema de Cauchy:
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
31. Cintra e Goecking (2012) 50
(i)
e uma curva suave.
(ii) f 2 C1(I)
(iii) a; b; c 2 C1(
) e a e b n~ao se anulam simultaneamente em
.
Para garantir a exist^encia e unicidade do problema (12) precisamos:
Achar as curvas caractersticas planas de (12).
Garantir que as curvas caractersticas intersectam a curva inicial
em um unico ponto.
Fazer algumas mudancas de variaveis que transformem o problema (12) em um problema
de valor inicial para uma EDO de primeira ordem que, pode ent~ao, ser resolvida com as
tecnicas de resoluc~ao para EDO's.
Para resolver o problema (12) devemos, primeiramente, achar as curvas caractersticas planas
da equac~ao (11).
Se C e uma curva caracterstica plana parametrizada por ((s);
32. (s)), ent~ao a derivada total
de u ao longo se C e
d
ds
[u((s);
42. (s)): (14)
Logo, para que o lado esquerdo da equac~ao (14) seja igual a qualquer uma das express~oes
em (13), e preciso que, exista um numero real (s)6= 0, para cada s, tal que
0(s) = a((s);
60. (s0) = y0:
O Teorema de Picard para EDO's garante soluc~ao unica para (18). A soluc~ao e obtida
integrando-se ao longo das curvas caractersticas planas encontradas em (17).
A exist^encia e unicidade do problema (12) depende de como as caractersticas encontradas
acima intersectam a curva inicial
.
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
61. Cintra e Goecking (2012) 51
Se
nunca e tangente as curvas caractersticas planas, ou seja, se os vetores (;(t); ;(t))
e (a((t); (t)); b((t); (t))) nunca s~ao paralelos, isso garante uma unica curva caracterstica
passando pelo ponto ((t); (t)), que e a soluc~ao de (18).
Se uma unica caracterstica intersecta
no ponto ((t); (t)), podemos cobrir uma vizinhanca
da curva
em exatamente um ponto.
Isso nos permite fazer uma mudanca de variavel de (x; y) para (s; t).
Denotando a curva caracterstica ((s);
62. (s)) por (x(s; t); y(s; t)), reescrevemos (18):
xs(s; t) = a(x(s; t); y(s; t)); (19)
ys(s; t) = b(x(s; t); y(s; t));
x(0; t) = (t);
y(0; t) = (t)
alem disso, como os vetores
(0(t); 0(t)) e (a((t); (t)); b((t); (t)))
s~ao linearmente independentes, a mudanca de variavel sera
(s; t) = u(x; y); (20)
obtemos, pela regra da cadeia,
@
@s
(s; t) =
@u
@x
(x(s; t); y(s; t))
@x
@s
+
@u
@y
(x(s; t); y(s; t))
@y
@s
=
= a(x(s; t); y(s; t))
@u
@x
(x(s; t); y(s; t)) + b(x(s; t); y(s; t))
@u
@y
(x(s; t); y(s; t)): (21)
Substituindo a EDP (11) em (21), obtemos
s = c(x(s; t); y(s; t)):
Alem disso, a condic~ao inicial do problema (12)
63. ca
(0; t) = f(t); t 2 I;
Ent~ao, o problema que satisfaz e
s = c(x(s; t); y(s; t)); (22)
(0; t) = f(t); t 2 I:
Para cada t 2 I
64. xo, o problema (22) e um problema de valor inicial para uma EDO de
primeira ordem, cuja soluc~ao e obtida integrando diretamente de 0 a s. Assim, obtemos
(s; t) =
Z s
0
s(; t)d + (0; t) =
Z s
0
c(x(; t); y(; t))d + f(t) (23)
Logo, a soluc~ao no ponto (x0; y0) = (x(s0; t0); y(s0; t0)) e obtida integrando a EDP ao longo
da caracterstica plana que passa por (x0; y0) de s = 0 ate s = s0.
Como
65. zemos uma mudanca de variavel, para voltar para u, dado (x0; y0), seja t0 = t(x0; y0)
e s0 = s(x0; y0), ou seja, x0 = x(s0; t0) e y0 = y(s0; t0); substituindo (20) em (23), obtemos
u(x0; y0) = f(t0) +
Z s0
0
c(x(s; t0); y(s; t0))ds: (24)
Se u e soluc~ao de (12), ent~ao u satisfaz (24), que por sua vez, e soluc~ao de (12), logo a soluc~ao
e unica.
Assim, acabamos de provar o teorema a seguir.
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
66. Cintra e Goecking (2012) 52
Teorema de Exist^encia e Unicidade
Sejam
R2 aberto, I R um intervalo aberto,
uma curva suave em
parametrizada
67.
68.
69.
70. por
(t) = ((t); (t)), t 2 I, f 2 C1(I) e a; b; c 2 C1(
). Suponha que a(x; y)2 + b(x; y)26= 0,
8(x; y) 2
, e a(((t); (t)) b((t); (t))
;(t) ;(t)
71.
72.
73.
74. 6= 0; 8t 2 I:
Ent~ao o problema (12) tem uma unica soluc~ao de classe C1 em uma vizinhanca da curva
em
dada por (24).
Obs.: Normalmente e mais facil achar as curvas caractersticas planas diretamente e integrar ao
longo dessas curvas do que utilizar a formula (24).
Exemplo:
ux 3uy = sen(x) + cos(y) (25)
u(t; t) = p(t);
com t 2 R e p uma func~ao dada.
Primeiramente, vamos encontrar as curvas caractersticas planas para a EDP em (25). Pro-curamos,
ent~ao, curvas s7! ((s);
76. 0(s) = 3
Assim, obtemos
(s) = s + c ) x = s + c
77. (s) = 3s + c ) y = 3s + c
Portanto, as curvas caractersticas planas para a EDP em (25) s~ao as retas y = 3x + c.
Como a curva inicial e a reta y = x, ela intersecta cada caracterstica plana em exatamente um
ponto. Estamos, portanto, nas condic~oes do Teorema de Exist^encia e Unicidade.
Dado qualquer ponto (x1; y1) 2 R2, ele esta na reta y = 3x + c onde c = y1 + 3x1, e esta
reta intersecta a curva inicial no ponto (x0; y0) onde
x0 =
y1 + 3x1
4
Parametrizando ent~ao a reta por s7! (s;3s + c), obtemos:
u(x; y) u(x0; y0) =
Z x
y1+3x1
4
(sen(s) + cos(3s + c)) ds )
u(x; y) =
Z x
y1+3x1
4
(sen(s) + cos(3s + c))ds + p(x0)
Com as tecnicas de resoluc~ao de integrais, chegamos a seguinte soluc~ao:
u(x; y) = cos(x) + cos
y + 3x
4
1
3
sen(y) sen
y + 3x
4
+ p
y + 3x
4
:
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
78. Cintra e Goecking (2012) 53
Soluc~ao Geral
Agora, a func~ao incognita u n~ao aparece apenas na parte principal da equac~ao
a(x; y)ux + b(x; y)uy = c(x; y)
Considere o operador diferencial linear de primeira ordem
L = a(x; y)
@
@x
+ b(x; y)
@
@y
+ c(x; y)
isto e,
Lu = a(x; y)ux + b(x; y)uy + c(x; y)u
e vamos estudar a equac~ao
Lu = d(x; y) (26)
com a; b; c; d constantes e pertencentes a C(
):
Para resolver a equac~ao (26), vamos procurar uma mudanca de variavel (s; t) que transforme
esta EDP em uma equac~ao onde so apareca a derivada em relac~ao a uma das variaveis (no caso,
s). Assim, poderemos resolver a equac~ao como se fosse uma EDO,
79. xando a outra variavel.
Vamos procurar a soluc~ao geral da equac~ao:
ax + by + c = d (27)
onde a; b; c; d 2 R e a2 + b26= 0. Vamos fazer a mudanca de variavel s = s(x; y); t = t(x; y),
com t constante ao longo das caractersticas planas, de modo que a equac~ao (27)
80. que em uma
forma mais simples.
Assim, as caractersticas planas para a equac~ao acima satisfazem
x0(s) = a ) x(s) = as + c1
y0(s) = b ) y(s) = bs + c2
Portanto, as curvas caractersticas planas para a EDP em (27) s~ao as retas ay bx = k1, k1
constante e as retas ortogonais a estas s~ao as retas by +ax = k2, k2 constante. Tomando t = k1
e s = k2, obtemos:
s = ax + by (28)
t = bx + ay
Isolando x e y em (28), obtemos:
x =
as bt
a2 + b2 y =
bs + at
a2 + b2
e
xs =
a
a2 + b2 ys =
b
a2 + b2
Com a mudanca de variavel w(s; t) = (x; y), temos:
@w
@s
(s; t) = xxs + yys (29)
Substituindo os valores de xs e ys em (29), a equac~ao (27)
81. ca
(a2 + b2)ws + cw = d: (30)
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
83. xo, a equac~ao (30) e uma EDO de primeria ordem com fator integrante
1
a2 + b2 exp
cs
a2 + b2
; (31)
multiplicando (30) por (31), obtemos,
@
@s
w exp
cs
a2 + b2
=
d
a2 + b2 exp
cs
a2 + b2
:
Se c6= 0, a soluc~ao geral de (30) e
w(s; t) =
d
c
+ f(t) exp
cs
a2 + b2
e a soluc~ao geral de (27) e
(x; y) =
d
c
+ f(bx + ay) exp
:
c
a2 + b2 (ax + by)
Agora, se c = 0, a soluc~ao geral de (30) e
w(s; t) =
d
a2 + b2 s + f(t)
e a soluc~ao geral de (27) e
(x; y) =
d
a2 + b2 (ax + by) + f(bx + ay)
onde f 2 C1(R) e arbitraria.
Discuss~ao dos Resultados
Nesta sec~ao, ser~ao discutidas situac~oes nas quais o Teorema de Exist^encia e Unicidade n~ao
e valido para Problemas de Cauchy.
Voltando ao problema (12)
a(x; y)ux + b(x; y)uy = c(x; y);
u((t); (t)) = f(t); t 2 I;
(i) Veremos o que acontece se a curva inicial
e uma curva caracterstica plana.
Para tanto, primeiramente de
84. niremos o que e uma curva caracterstica espacial e o que
e a superfcie soluc~ao. Uma curva caracterstica para o problema (12) e uma curva suave
s7! ((s);
85. (s); (s)) 2 R3 que tem tangente no ponto ((s);
94. (s)):
Quando a curva inicial
n~ao e tangente as curvas caractersticas planas, a superfcie soluc~ao
e gerada pela curva : t 2 I7! ((t); (t); f(t)) e pelas curvas caractersticas em R3 que
intersectam .
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
95. Cintra e Goecking (2012) 55
Suponha que
e uma caracterstica plana. Discutiremos o caso em que e uma caracterstica
e o caso em que n~ao e caracterstica.
Discutiremos primeiro o caso em que e uma curva caracterstica para a EDP (12). Seja
uma curva plana qualquer que nunca e tangente as caractersticas planas e que intersecta
no
ponto ((s0); (s0)), seja t7! (p(t); q(t)) uma parametrizac~ao de com
(p(0); q(0)) = ((s0); (s0)) (32)
e seja r uma func~ao arbitraria de classe C1 satisfazendo
r(0) = f(s0): (33)
Como ja vimos, o problema
a(x; y)ux + b(x; y)uy = c(x; y) (34)
u(p(t); q(t)) = r(t)
tem uma unica soluc~ao u em uma vizinhanca de ; alem disso, a superfcie soluc~ao contem a
curva : t7! (p(t); q(t); r(t)) e contem todas as caractersticas da EDP que intersectam . Em
particular, a superfcie soluc~ao contem pois
(p(o); q(0); r(0)) = ((s0); (s0); f(s0)) 2
por (32) e (33).
Portanto u e soluc~ao de (12). O problema tem in
97. nidade
de escolhas possveis para a curva e para a func~ao r.
Veremos, agora, o caso em que n~ao e uma caracterstica para (12).
Suponha, por absurdo, que o problema (12) tem soluc~ao nesse caso: se u e soluc~ao, qualquer
que seja t 2 I, derivando a condic~ao inicial obtemos
0(t)ux((t); (t)) + 0(t)uy((t); (t)) = f0(t); (35)
por outro lado, a EDP (12) no ponto ((t); (t))
98. ca
a((t); (t))ux((t); (t)) + b((t); (t))uy((t); (t)) = c((t); (t)); (36)
comparando (35) e (36) e usando o fato que os vetores (0(t); 0(t)) e a((t); (t)); b((t); (t))
s~ao paralelos (pois
e caracterstica plana), obtemos que os vetores em R3
(0(t); 0(t)) e (a((t); (t)); b((t); (t)); c((t); (t)))
tambem s~ao paralelos, isto e, e uma caracterstica, o que contradiz a hipotese.
Portanto, o problema (12) n~ao tem soluc~ao neste caso.
(ii)Veremos agora o que acontece quando
e tangente curva caracterstica plana.
Vamos resolver o problema:
ux(x; y) = x2 (37)
u(x; x3) = f(x); x 2 R:
Neste caso, as caractersticas planas s~ao as retas y = c; c 2 R, e, embora a curva inicial
: t 2 R7! (t; t3) seja tangente reta y = 0 em t = 0, cada caracterstica plana intercepta
em apenas um ponto. Ent~ao, para obter a soluc~ao, podemos integrar ao longo das curvas
caractersticas planas:
u(x; y) =
Z x
3 p
y
t2dt + f(x) =
x3
3
y
3
+ f(x):
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.
99. Cintra e Goecking (2012) 56
Mesmo no caso em que cada caracterstica plana intersecta
em exatamente um ponto,
pode ocorrer que a mudanca de variavel (s; t)7! (x; y) n~ao seja mais diferenciavel e, portanto,
a soluc~ao encontrada integrando ao longo das caractersticas n~ao e de classe C1. Modi
100. cando o
problema (37):
ux = 1
u(x; x3) = f(x); x 2 R;
A soluc~ao e
u(x; y) =
Z x
3 p
y
dt + f(x) = x 3 p
y + f(x):
Note que as caractersticas planas s~ao as mesmas, mas essa soluc~ao n~ao e diferenciavel em y = 0.
Refer^encias
BASSANEZI, R. C.; JUNIOR, W. C. F. Equac~oes Diferenciais com Aplicac~oes. S~ao Paulo:
Ed. Harbra Ltda., 1988.
BIEZUNER, R. J. Introduc~ao as Equac~oes Diferenciais Parciais. Notas de aula. Disponvel
em: http://www.mat.ufmg.br/~rodney/notas_de_aula/iedp.pdf. Acesso em: 05 out 2012.
CULLEN, M. R.; ZILL, D.G. Equac~oes Diferenciais. Vol. 2, 3. ed., S~ao Paulo: Ed. Pearson,
2001.
FERREIRA, A.P. Problema de Cauchy para Equac~oes Diferenciais Ordinarias. In: XI
Encontro Anual de Iniciac~ao Cient
101. ca, Maringa, PR: Universidade Estadual de Maringa,
2002.
I ORIO, V. EDP - Um curso de Graduac~ao. Colec~ao Matematica Universitaria, 2.ed.,Rio de
Janeiro: IMPA, 2007.
Sigmae, Alfenas, v.1, n.1, p. 44-56. 2012.