O documento discute a transferência na psicanálise, notando que ela é ambígua e pode servir tanto como motor quanto como resistência à análise. A transferência positiva envolve sentimentos conscientes de simpatia pelo analista, mas focar apenas nisso pode ignorar aspectos inconscientes. A transferência negativa envolve desconfiança e distância em relação ao analista. O manejo da transferência é crucial, mas difícil para o analista.
1. Tema: A TRANSFERÊNCIA (parte 2) Alexandre Simões
2. Continuemos com mais algumas observações sobre a transferência na psicanálise ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
3. Chegamos a ver que a transferência não é um processo que se desenvolve em uma única direção. Aliás, uma das características fundamentais da transferência é que ela é ambígua: O alerta de Freud sobre esta dupla face da transferência: “... na análise, a transferência surge como a resistência mais poderosa ao tratamento.” (FREUD. A dinâmica da transferência, p. 135) ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
4. Como compreender que a transferência, até então imprescindível à análise e tida como motor da mesma, possa comportar uma considerável resistência ao trabalho da análise?“À primeira vista, parece ser uma imensa desvantagem, para a psicanálise como método, que aquilo que alhures constitui o fator mais forte no sentido do sucesso nela se transforme no mais poderoso meio de resistência” (FREUD. A dinâmica da transferência, p. 135) ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
5. Freud indica uma cena clínica para localizar este aspecto: “... Se as associações de um paciente faltam [neste ponto, Freud faz referência a uma suspensão do discurso e não somente à evitação ou desvio de um assunto] a interrupção pode invariavelmente ser removida pela garantia de que ele está sendo dominado, momentaneamente, por uma associação relacionada com o próprio médico ou com algo a este vinculado.” (A dinâmica da transferência, p. 135) ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
6. Esta característica da transferência leva-nos a considerar uma circunstância especialmente importante na condução de uma análise: o atrelamento ao Outro (que é mais amplo do que o espaço da transferência) “A resistência acompanha o tratamento passo a passo. Cada associação isolada, cada ato da pessoa em tratamento tem de levar em conta a resistência e representa uma conciliação entre as forças que estão lutando no sentido do restabelecimento e as que se lhe opõem.” (A dinâmica da transferência, p. 138) ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
7. O vínculo amoroso com o analista Uma forma de manifestação dos fenômenos da transferência que em grande parte chamou a atenção de Freud foi a face do amor, mais precisamente, o amor do analisando dirigido ao analista ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
8. Em vários momentos dos textos de Freud dedicados ao assunto, ele localiza o analista nesta problemática por meio da designação “figura do médico”. Isto nos ajuda a pensar que o analista, para o analisando, conta menos como aquilo que ele é e muito mais como o lugar que ele ocupa na fantasia do analisando. No caso do amor, estamos nos referindo a um lugar de preenchimento (como resolução da demanda do paciente) ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
9. Este vínculo preenchedor ... Conduz o paciente a “... desprezar a regra fundamental da psicanálise, que estabelece que tudo que lhe venha à cabeça deve ser comunicado sem crítica...” (A dinâmica da transferência, p. 142) ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
10. Como, por outro lado, o amor também impulsiona uma análise, Freud é levado a enfrentar este problema (o da ambiguidade ou ambivalência da transferência) por meio de um artifício: a distinção entre uma “transferência positiva” (também chamada de “transferência erótica”) e uma “transferência negativa” ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
11. Devemos ter atenção para não fazer um uso dicotômico ou meramente instrumental dessa distinção entre duas formas de transferência Freud irá nos lembrar que a “a transferência negativa (...) é encontrada lado a lado com a transferência afetuosa, amiúde dirigidas simultaneamente para a mesma pessoa.” (A dinâmica da transferência, p. 141) ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
12. Podemos partir da premissa que a transferência positiva seja constituída por sentimentos conscientes de simpatia, envolvimento com o tratamento e cordialidade dirigidos à figura do analista; logo, como uma circunstância conveniente ao desenvolvimento da análise. Todavia, isto é também um problema para a condução das análises. Caso nos concentremos no campo movediço da transferência positiva, podemos cair nos erro de nos aliarmos excessivamente ao eu do analisando (e, por fim, do próprio analista) e manter, assim, a ignorância acerca de seus avessos. ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
13. Certamente, a face aprazível da transferência positiva é mais cômoda para a administração do setting analítico. Isto se torna mais visível (e perigoso) na medida em que tudo isto pode convergir para os fantasmas narcisistas do analista. ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
14. Já no que tange àquilo que Freud nomeou como “transferência negativa” podemos encontrar o paciente reticente a dirigir seu discurso ao analista; ele desconfia do profissionalismo e comprometimento do analista, argumenta sobre a inocuidade do próprio trabalho terapêutico e mantem uma distância cautelosa (“não acredito nisto...”). Este posicionamento, em boa parte, responde pelos abandonos precipitados que costumam ocorrer ao início de uma análise. ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
15. É este entrecruzamento que conduz Freud a propor o “manejo” ou “manobra” da transferência, com a seguinte ressalva: “Não se discute que controlar os fenômenos da transferência representa para o psicanalista as maiores dificuldades; mas não se deve esquecer que são precisamente elas que nos prestam o inestimável serviço de tornar imediatos e manifestos os impulsos eróticos ocultos e esquecidos do paciente. Pois, quando tudo está dito e feito, é impossível destruir alguém in absentia ou in effigie.” (A dinâmica da transferência, p. 143) ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
16. Prosseguiremos na próxima aula! Prof. Alexandre Simões Contatos: www.alexandresimoes.com.br alexandresimoes@terra.com.br ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.