O documento discute o trabalho de Jacques Lacan e sua contribuição à psicanálise contemporânea, incluindo sua ênfase na linguagem e no objeto como dimensões essenciais da subjetivação. O documento também aborda os principais conceitos lacanianos como o inconsciente estruturado como linguagem e a primazia do significante.
HOSPITAL SÃO JOÃO DE DEUS (parte 1): A ESCUTA PSICANALÍTICA NO HOSPITAL GERAL
Lacan e a Psicanálise
1. Lacan e a Psicanálise:interlocuções com a contemporaneidade Tema de abertura: quem foi Jacques Lacan? Coordenação Alexandre Simões ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
2. Proposta geral do curso: Em um primeiro momento, abordaremos as propostas clínicas apresentadas por Jacques Lacan em seus primeiros seminários (do 1 ao 10) para, em seguida, realizarmos um aprofundamento do Seminário 10 (A angústia). Enfatizaremos as formas de manifestação de duas dimensões essenciais que promovem a subjetivação - a dimensão da linguagem (os significantes) e a dimensão do objeto (o a-significante) - e suas incidências na clínica psicanalítica contemporânea. ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
3. A dimensão da linguagem (os significantes);A dimensão do objeto (o a-significante); Não são duas coisas ou substâncias distintas que nos habitam. São dois atributos que se descompletam mutuamente e que fazem de nós o que somos; ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
4. Se o significante nós sabemos, em certa, medida o que é, o que produz, em que implica ... oobjeto é aquilo que faz parte de mim, me faz ser irremediavelmente diferente de qualquer outro e que, contudo, eu não sei muito bem o que é, no que implica, o que promove ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
5. Esquecimentos, tropeços, falhas, sonhos, sintomas, são formações do inconsciente. É precisamente aí que Lacan nos levou a reconhecer as formações do significante. (Cf. Jacques Lacan. O Seminário – Livro 11: Os quatro conceitos fundamentais da psicanálise. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1985, p. 42.) ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
6. Jacques Lacan (1901-1981) convidou os analistas de seu tempo bem como de nosso tempo a um desafio: “alcançar em seu horizonte a subjetividade de sua época” ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
7. Isto, segundo Lacan, implica em retomar o caminho de Freud em uma época na qual este percurso se encontrava embaçado quanto aos seus fundamentos e seu poder de subverter o já-dado Este é o ‘retorno a Freud’ pelo qual Lacan ficou bastante conhecido ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
8. Não se trata, no retorno a Freud, de repetir o que Freud falou, mas de retomar o âmago do percurso freudiano, do qual o próprio Freud não tinha plena noção. ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
9. Trata-se, no seu retorno a Freud (anunciado de maneira formal, pela primeira vez, no texto Função e campo da fala e da linguagem em psicanálise, de 1953, mais conhecido como Discurso de Roma) de reinstaurar a virulência, a potência da via aberta por Freud ao falar em inconsciente, desejo, fantasia, etc. ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
10. Tese que se depreende do movimento de Lacan ao longo de seu retorno a Freud: o novo deve ser apreendido com instrumentos novos, a cada momento. Daí, o recurso que Lacan faz a certos aspectos da linguística, da filosofia, da matemática para expor a experiência do sujeito ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
11. Freud vai demonstrar clinicamente que cada um de nós não responde inteiramente por seus atos, escolhas e posicionamentos recorrendo à consciência (o sujeito não é quem pensa que é, ele não faz o que pensa que faz) Ou seja, a correspondência entre os atos e a coerente ciência dos mesmos não é suficiente para dizer sobre cada um; Este hiato tem voz, daí a possibilidade de ouvi-lo. ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
12. Primazia do significante: as palavras têm autonomia, têm uma lógica que lhes é própria. O psicanalista deve confiar nas palavras com sua escuta ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
13. Isto quer dizer que o psicanalista não deve querer se desfazer apressadamente das palavras, pressupondo que há, por detrás delas, uma outra realidade maior e mais importante do que elas. Desta forma, não se trata de senti-las(no sentido de encontrar o que elas querem dizer como se o que apresentassem fosse de menor valor e o fundamental, em contrapartida, se revelando para-além delas)
14. Para se compreender o aforismo de Lacan ‘o inconsciente é estruturado como uma linguagem’ é imprescindível localizar estas considerações e, em conjunto, a regra fundamental da psicanálise: a associação livre Fale tudo que vier à sua mente, não dispense nada, por mais irrelevante, vergonhoso ou estranho que possa lhe parecer. Tente dizer tudo, que as coisas começarão a acontecer ... ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
15. A sobredeterminação do Simbólico: ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
16. Para entendermos melhor a dimensão do significante, tão trabalhada por Jacques Lacan, examinemos o relato de um sonho: Boa parte dos sonhos que ouvimos parecem não seguir nenhuma lógica (lógica aristotélica, com seus princípios: princípio de identidade, princípio da não-contradição, princípio do terceiro excluído). Todavia, para Freud, este relato não é destituído de lógica, tendo uma lógica que lhe é própria. O entrecruzamento de imagens, as frases interrompidas ou intempestivas de um sonho, as mudanças bruscas de cenário ou as circunstâncias de emperramento não ocorrem a esmo.
17. Lacan e a confusão: desde Freud, a Psicanálise não oferece uma visão de mundo, porém, põe em questão as vigentes ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
18. Um exemplo de boa confusão: a clínica psicanalítica, tão fortemente amparada pela palavra, deve se resolver com aquilo que está fora da palavra ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
19. É neste âmbito que podemos localizar com mais pertinência uma ruptura que Lacan manteve ao longo de seu trabalho como psicanalista: a ruptura com a noção predominante do inconsciente como o domínio das pulsões irracionais. Para Lacan, esta ideia não faz jus à novidade introduzida por Freud. Ao invés de entendermos o inconsciente como o espaço intimista de cada um de nós, preenchido por pulsões violentas, desagregadoras dos laços-sociais e que, por isso, necessitam de ser conquistadas pelo eu, devemos reconhecer o inconsciente como o lugar onde uma verdade traumática fala. ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
20. É nesta exata direção que Lacan oferece uma versão bem distinta dos pós-freudianos de sua época (e, em boa proporção, dos de hoje) para a fórmula de Freud ‘onde isso estava, devo advir’ (Wo es war, sollichwerden): ao invés de ‘o eu deveria conquistar o isso’ - o lugar das pulsões inconscientes – teríamos ‘eu deveria ousar me aproximar do lugar da verdade’
21. Do ponto de vista clínico, Lacan foi alguém que conseguiu propor importantes avanços para se operacionalizar o descompleto, o contingente, o adverso no que tange a todos nós => embrulhos do real Isto abriu importantes perspectivas para uma clínica mais inventiva e afeita às condições do mundo atual. Estes caminhos ainda estão trilhados de maneira muito incipiente. ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
22. Como já dissemos mais ao início desse encontro: Jacques Lacan convidou os analistas de seu tempo bem como de nosso tempo a um desafio: “alcançar em seu horizonte a subjetividade de sua época” ... Cabe perceber que os avanços tecnológicos e as transformações sociais de nossa época tornaram mais aguda a divisão do sujeito (há escolhas, dilemas e caminhos até então impensados) ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.
23. Prosseguiremos no próximo encontro com o tema Lacan e suas clínicas. Até lá! Acesso a este conteúdo: www.alexandresimoes.com.br ALEXANDRE SIMÕES ® Todos os direitos de autor reservados.