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MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO
UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ
A influência do contexto histórico na trajetória e na Antropologia de
Lévi-Strauss
Trabalho apresentado à disciplina de
Antropologia pelo aluno Ráfagan Sebástian de Abreu,
curso de História – Licenciatura com Bacharelado, sob
a orientação do professor Lorenzo Macagno, sujeito à
avaliação.
CURITIBA
2011
2	
	
SUMÁRIO
INTRODUÇÃO ........................................................................................................................1
O NOVO MUNDO ...................................................................................................................2
AS INFLUÊNCIAS DAS PESQUISAS NO BRASIL NO PENSAMENTO DE
LÉVI-STRAUSS .......................................................................................................................3
CONCLUSÃO...........................................................................................................................6
REFERÊNCIAS........................................................................................................................7
3	
	
Introdução
Lévi-Strauss cresceu em uma época onde as nações buscavam teorias para
estabelecerem sua superioridade diante de suas neocolônias e dos demais países
“rivais”. Momento de Invenção de Tradições com o intuito de identificar-se diante de
um passado do qual se deseja ser herdeiro, criando para isso teorias de superioridade
baseadas em preceitos científicos como o Darwinismo.
Paralelamente a essas teorias, observamos o início do interesse de etnólogos
europeus de buscar as origens dos povos. Em 1925 é criada a primeira instituição de
estudo de etnologia na França. Instituição essa que tem como idealizadores Durkheim,
Mauss, Lévy-Bruhl, Rivet e outros interessados na ampliação das pesquisas e de
interesses pelas culturas “primitivas”. Nesse momento inicia-se uma onda de incursões
etnográficas na África que dará moldes ao que será chamado de “missão francesa”. O
surrealismo, movimento artístico em auge nessa época, também incorpora práticas
culturais africanas. Dessa forma observamos que nem todos pensavam aos moldes
Eurocentristas, e é nesse cenário que surge também os movimentos de pesquisa na
América, onde Lévi-Strauss estará inserido.
Influenciado pelas obras de Freud, pelo surrealismo e por influências socialistas
pelas leituras que fez sobre Marx, Lévi-Strauss inicia já aos dezessete anos1
um
pensamento de que: o que parece absurdo e incoerente na natureza humana pode ter
uma racionalidade muito profunda.
A carreira etnográfica deste antropólogo se inicia “num domingo de 1934, às
nove horas da manhã, com um telefonema: [...] o senhor ainda deseja fazer etnografia?
–sem dúvida! – Então, candidate-se ao cargo de professor de sociologia na Universidade
de São Paulo. A periferia está cheia de índios. Você poderá vê-los nos fins de semana
[...]” (LÉVI-STRAUSS, 2004: 45). Ou seja, o Brasil a partir desse ponto passará a fazer
parte da vida e dos trabalhos desse grande pesquisador. Dessa forma, é no interesse
pelas influências do contexto histórico brasileiro e mundial nos trabalhos de Lévi-
Strauss, com certeza um dos mais importantes Antropólogos do século XX, que se
inicia este ensaio. Como ele afirma no documentário: “Não escolhi o Brasil. Foi o Brasil
que me escolheu”.
																																																													
1
	Argumento	retirado	do	documentário	“Saudades	do	Brasil”	produzido	pela	TV	Senado	em	2005
4	
	
O Novo Mundo2
A criação da USP se deu no clima da Revolução Constitucionalista de 1932 com
o intuito de deselitizar a cultura e para fazer frente “à influência tradicional da Igreja e
do exército” (Lévi-Strauss, 2004: 97), ou seja, para democratizar a cultura. Sendo este
período de grandes agitações perante a mudança de uma república cafeeira para um
“Estado do povo”, esta Universidade envolve primeiramente interesses da elite cafeeira
paulista em “transformar o Estado de São Paulo e, portanto, a sociedade e o poder do
Estado, num poder onde se pudesse preparar as elites para o exercício da presidência da
província de São Paulo”3
. Logicamente, a elite de São Paulo também desejava manter o
seu prestígio perante o governo Getulista, o qual haviam sido “desbancados”.
Lévi-Strauss vem para o Brasil, juntamente com outros professores franceses
para ministrar aulas na Universidade. Ele então fica maravilhado com os fenômenos que
aqui ocorrem. Diferentemente do que pensavam na Europa, a cidade de São Paulo não
era mais aquele “território desconhecido habitado somente pelos índios [...] a não ser
um grupo de algumas famílias localizadas no litoral que vinham vender aos domingos
[...] pretensas curiosidades” (Lévi-Strauss, 2004: 47). No documentário4
, também se
mostra fascinado quando afirma que “aquilo que, na Europa, demorou séculos para
formar-se, no Brasil, se fazia em meses, semanas, ou até dias”.
Com relação aos alunos que teve, Lévi-Strauss se mostrou também fascinado.
Uma curiosidade interessante é que algumas vezes após as aulas eles os convidava para
tomar chá em sua casa. Tamanha é a sua relação com alguns, que em seu livro “Tristes
Trópicos” cita seus nomes. Como coloca no livro:
“Pensando no que era a Europa da época e no que é hoje, aprendi, vendo-nos
vencer em poucos anos uma distância intelectual que poderia supor da ordem de
vários decênios, como desaparecem e como nascem as sociedades; e que essas
grandes reviravoltas da história que, nos livros, parecem resultar do jogo das
forças anônimas agindo no centro das trevas, também podem, num claro
instante, realizar-se pela resolução viril de um punhado de crianças bem
dotadas” (Lévi-Strauss, 2004: 100).
																																																													
2
Parte do livro que achei mais interessante a destacar neste ensaio, especialmente o capítulo intitulado “São Paulo”.
3
	Palávras de Hirano extraídas do documentário	
4
“Saudades do Brasil”
5	
	
O primeiro estudo do Antropólogo no Brasil, portanto, foi com relação ao
fenômeno urbano. Percebemos em “Tristes Trópicos” alguns traços marcantes desse
período de crescimento enorme da cidade de São Paulo, que ocorria por razões aqui já
citadas. Diziam que se erguia na cidade uma casa por hora. “A cidade desenvolve-se a
tal velocidade que é impossível obter seu mapa: cada semana demandaria uma nova
edição” (Lévi-Strauss, 2004: 92).
Após voltar das expedições aos Bororo e Kadweu, Lévi-Strauss, quando se
preparava para partir a uma nova expedição por volta de 1938, sofre problemas com a
burocracia do governo do Estado Novo, que estava na época, assim como todo o resto
do mundo, com ideologias de ódio aos estrangeiros e de nacionalismo exacerbado. O
governo exigia que para que a expedição fosse autorizada, um fiscal os acompanhasse.
Apesar dos problemas, é aí que Lévi-Strauss conhece Luís de Castro, fiscal que o
acompanhara na viagem e muito lhe ajudara em seus estudos. Assim, ele parte para
estudar os Nambiquara e, depois, os Tupi-Cavaíba.
No tempo em que deu aulas na USP e estudou as tribos brasileiras, preparou um
itinerário de trabalhos envolvendo diversos assuntos, entre eles a questão racial, a qual
será muito bem abordada em seu célebre “Raça e História” e “Raça e Cultura”.
As influências das pesquisas no Brasil no pensamento de Lévi-Strauss
Vimos que o contexto histórico muito influenciou na carreira de Lévi-Strauss,
fazendo-o vir para o Brasil e repensar muitos conceitos que eram difundidos na Europa.
Observemos agora algumas características de suas obras que foram escritas
principalmente graças ao conhecimento acumulado com as tribos indígenas brasileiras.
Em seu artigo intitulado “Raça e Cultura”, o autor coloca que “Não é da
competência de um etnólogo tentar dizer o que é, ou o que não é uma raça, pois os
especialistas da antropologia física, que a discutem desde há dois séculos, jamais
chegaram a pôr-se de acordo e nada indica que estejam hoje mais perto de se
entenderem acerca de uma resposta a esta questão” (Lévi-Strauss, 1986: 21). Para
defender esse argumento, ele aponta que não há diferença entre raças, mas sim entre
culturas. Também coloca que cada tribo se intitula a primeira, a maior, sendo que as
demais são consideradas secundárias.
Provavelmente o tempo que passou com os índios brasileiros também o tenha
levado a refletir sobre o respeito que os mesmos têm com a natureza. No artigo ele
6	
	
afirma que as diferenças evolutivas apontadas pelos estudiosos são muito peculiares,
pois se estabelecermos uma análise, os europeus são mais civilizados por terem em
mãos tecnologia de ponta, ao mesmo tempo em que os índios são os mais civilizados
por respeitarem a natureza. Essa ideia de respeito à natureza é bem colocada neste
trecho: “que reine, enfim, a ideia de que os homens, os animais e as plantas dispõem de
um capital comum de vida, por forma a que qualquer abuso cometido sobre uma espécie
se traduza necessariamente, na filosofia indígena, por uma diminuição da esperança de
vida dos próprios homens [...]” (Lévi-Strauss, 1986: 35).
O autor também coloca no artigo que as teorias racistas surgem do desejo de se
estabelecer relações de força e que o preconceito surge do sentimento de competição e
rivalidade entre as nações, o qual deve ser combatido com a comunicação. Esta última
vem para romper barreiras, colocando em contato diversos grupos diferentes, mostrando
as realidades, globalizando culturas, diminuindo as diferenças. Ela aproxima pessoas
distantes geograficamente, conscientiza a aceitação e respeito pela diversidade, quebra
barreiras lingüísticas e culturais e quebra o isolamento que por milênios caracterizou a
vida humana. Como coloca Strauss: “As convulsões desencadeadas pela revolução
industrial em expansão, a rapidez crescente dos meios de transporte e de comunicação
destruíram essas barreiras” (Lévi-Strauss, 1986:48).
Podemos cotejar essas informações com as do documentário, quando é colocado
que os Kadweu possuíam uma ideia de aristocracia muito grande, se considerando como
os senhores do lugar e das terras. Observemos também que é graças ao documentário
que as informações a respeito da cultura e do trabalho de Lévi-Strauss estão sendo
debatidas, provando que a comunicação quebra realmente barreiras. Com relação à
natureza, o antropólogo fez um interessante trabalho com os Bororo sobre a forma como
eles encaram a morte. “Bororo não morre, Bororo troca de condição”, ou seja, o índio
após a morte se transforma e da continuidade à natureza.
Outro artigo de Lévi-Strauss que se mostrou muito importante5
é o intitulado
“Raça e História”. Neste texto o autor elenca diversos aspectos envolvendo raças,
argumentos estes divididos em 10 subtítulos6
. Tantas são as ideias propostas que um
ensaio apenas para elas deveria ser proposto.
																																																													
5
	Observamos	nesse	artigo	o	amadurecimento	de	muitas	ideias	propostas	pelo	autor	no	“Raça	e	
Cultura”.	
6
	“Raça	e	cultura”,	“Diversidade	das	culturas”,	“O	etnocentrismo”,	“Culturas	arcaicas	e	culturas	
primitivas”,	“A	ideia	de	progresso”,	“História	estacionária	e	História	cumulativa”,	“Lugar	da	civilização	
ocidental”,	“Acaso	e	civilização”,	“A	colaboração	das	culturas”	e	“O	duplo	sentido	do	progresso”.
7	
	
No início do artigo o autor debate algumas ideias acerca de que cada raça traz
sua contribuição cultura para a humanidade e que as classificações surgem como uma
maneira de discriminação e opressão. Também coloca que a tendência é que cada vez a
população se torne mais mestiça, mostrando-se, portanto inútil definir raças. Mais
adiante, o autor debate acerca da ausência de fontes para analisar o passado das
civilizações e que nenhuma cultura se desenvolveu separadamente de todas as outras.
Também afirma que apesar da diversidade das culturas ser um fenômeno natural,
muitas pessoas insistem em resistir e buscar justificativas cientificas para as diferenças e
que tendemos a observar com olhos preconceituosos aquilo que é diferente aos nossos
costumes, sendo esse o caso do Eurocentrismo. Afirma mais adiante que mesmo que a
Europa tenha se dado melhor de certa forma no que tange o desenvolvimento, cada
sociedade tem de certa forma o seu passado de grandeza:
Para tratar certas sociedades como “etapas” do desenvolvimento de outras, seria
preciso admitir que, enquanto para estas ultimas acontecia alguma coisa, para as
outras nada ou pouca coisa acontecia. E, com efeito, fala-se facilmente dos
“povos sem história” (para dizer as vezes que não são mais felizes). Esta fórmula
elíptica significa apenas que sua história é e permanecerá desconhecida, não que
ela não exista. Durante dezenas e mesmo centenas de milhares de anos, la
também houve homens que amaram, odiaram, sofreram, inventaram,
combateram. Na verdade, não existem povos infantes; todos são adultos, mesmo
os que não mantiveram um diário de infância e adolescência (Lévi-Strauss,
1993: 340).
Ainda debate ideias como a do progresso, explicando que quando se trata de
progresso, sempre o elemento do acaso está presente, e como a da História estacionária
e cumulativa, colocando que estas são questões de ponto de vista, já que a riqueza de
acontecimentos de uma cultura não é determinada pelo seu real valor, mas sim pelo que
achamos delas, “da situação em que nos encontramos em relação a elas, do número e da
diversidade de nossos interesses, que nelas empenhamos.” (Lévi-Strauss, 1993: 345).
Portanto devemos levar em conta todas as contribuições e maneiras de cada cultura ser o
que é a seu modo. Todas têm sua contribuição:
Fenícia para a escrita; chinesa para o papel, a pólvora de canhão, a
bussola; hindu para o vidro e o aço... [...] E o que faz a originalidade de cada
uma delas está antes na sua maneira particular de resolver problemas, de
perspectivar valores, que são aproximadamente os mesmos para todos os
8	
	
homens: pois todos os homens, sem exceção, possuem uma linguagem, técnicas,
uma arte, conhecimentos positivos, crenças religiosas, uma organização social,
econômica e política. Ora, essa dosagem nunca é exatamente a mesma para cada
cultura, e, cada vez mais, a Etnologia moderna dedica-se menos a erigir um
inventário de traços separados, do que a descobrir a origem secreta dessas
opções (Lévi-Strauss, 1993: 349).
Podemos observar com esses trechos destacados que Lévi-Strauss se preocupou
no desfecho de sua carreira com as diversas questões relacionadas ao preconceito, ao
racismo, à diversidade entre culturas, ao respeito mutuo entre diferentes culturas, às
contribuições que cada cultura oferece uma a outra, sempre destacando que as culturas
devem buscar as trocas, mas ao mesmo tempo preservar a sua originalidade, mostrando
ser alguém preocupado com a preservação da riqueza cultural das civilizações.
É pensando nesses preceitos que provavelmente ele escreveu em Tristes
Trópicos na página 229 sobre as relações que a tribo Bororo faz com as demais,
estabelecendo apoio mútuo, caridade e justiça. Também observemos que a tribo
Nambiquara possuía mitos semelhantes ao do dilúvio, provando o que Strauss afirma
em “Raça e História” quando afirma que a única coisa que separa a sociedade pré-
colombiana da dos colonizadores no século XVI é a de que estes últimos possuíam uma
história cumulativa maior pela vantagem de terem se relacionado por mais tempo com
tribos vizinhas. Afirma também que se a Revolução Industrial não tivesse ocorrido na
Europa quando ocorreu, provavelmente teria ocorrido em outro local num espaço de
tempo próximo, ou seja, não existe sociedade mais evoluída, o que existe são maiores
relações entre culturas que possibilitam a uma sociedade ser mais desenvolvida que
outra.
Conclusão
Observamos com os estudos de Strauss que a cultura indígena está num patamar
muito maior que o questionamento do homem “civilizado”. Se são primitivas, como
então explicar a beleza e riqueza cultural única encontrada em cada tribo, costumes e
cordialidade que até hoje não temos. Amor ao próximo, temor às divindades, respeito à
natureza. Se são primitivas, ser primitivo é ser civilizado. Ser primitivo é fazer como
ninguém o que nenhum ocidental civilizado faz: Viver e compreender a natureza.
9	
	
Nas palavras de Jean Malaurie, uma das personalidades do documentário: “Nós,
os brancos, o Ocidente, já demos o que tínhamos que dar. Quem vai dar um novo sopro?
Outra humanidade, que está de reserva, escanteada. Com sua sensibilidade no sagrado,
sua percepção do mundo [...]. Mais ainda por protegerem a Terra, essas tribos são a
seiva da humanidade. A Terra é sagrada!”.
Comprova-se então que Claude Lévi-Strauss é um fruto de seu tempo, ousando-
se afirmar inclusive que é especialmente um fruto desse Brasil enorme que abrange as
mais diversas culturas e mestiçagens. “O mundo começou sem o homem e concluirá
sem ele” (Lévi-Strauss, 2004: 390), resta a nós sabermos qual o sentido daremos a nossa
existência. Mais que um diário de um Antropólogo, as obras de Lévi-Strauss são uma
homenagem à vida.
Referências
LÉVI-STRAUSS, Claude. “Raça e História”. In: LÉVI-STRAUSS, Claude.
Antropologia estrutural dois. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1993, PP. 328-366.
LÉVI-STRAUSS, Claude. “Raça e Cultura”. In: LÉVI-STRAUSS, Claude. O olhar
distanciado. Lisboa: Edições 70, 1986, pp. 21-49.
LÉVI-STRAUSS, Claude. Tristes Trópicos, São Paulo, Companhia das Letras, 2004.

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Antropologia e cultura
 

Ensaio Antropologia Levis Strauss

  • 1. 1 MINISTÉRIO DA EDUCAÇÃO UNIVERSIDADE FEDERAL DO PARANÁ A influência do contexto histórico na trajetória e na Antropologia de Lévi-Strauss Trabalho apresentado à disciplina de Antropologia pelo aluno Ráfagan Sebástian de Abreu, curso de História – Licenciatura com Bacharelado, sob a orientação do professor Lorenzo Macagno, sujeito à avaliação. CURITIBA 2011
  • 2. 2 SUMÁRIO INTRODUÇÃO ........................................................................................................................1 O NOVO MUNDO ...................................................................................................................2 AS INFLUÊNCIAS DAS PESQUISAS NO BRASIL NO PENSAMENTO DE LÉVI-STRAUSS .......................................................................................................................3 CONCLUSÃO...........................................................................................................................6 REFERÊNCIAS........................................................................................................................7
  • 3. 3 Introdução Lévi-Strauss cresceu em uma época onde as nações buscavam teorias para estabelecerem sua superioridade diante de suas neocolônias e dos demais países “rivais”. Momento de Invenção de Tradições com o intuito de identificar-se diante de um passado do qual se deseja ser herdeiro, criando para isso teorias de superioridade baseadas em preceitos científicos como o Darwinismo. Paralelamente a essas teorias, observamos o início do interesse de etnólogos europeus de buscar as origens dos povos. Em 1925 é criada a primeira instituição de estudo de etnologia na França. Instituição essa que tem como idealizadores Durkheim, Mauss, Lévy-Bruhl, Rivet e outros interessados na ampliação das pesquisas e de interesses pelas culturas “primitivas”. Nesse momento inicia-se uma onda de incursões etnográficas na África que dará moldes ao que será chamado de “missão francesa”. O surrealismo, movimento artístico em auge nessa época, também incorpora práticas culturais africanas. Dessa forma observamos que nem todos pensavam aos moldes Eurocentristas, e é nesse cenário que surge também os movimentos de pesquisa na América, onde Lévi-Strauss estará inserido. Influenciado pelas obras de Freud, pelo surrealismo e por influências socialistas pelas leituras que fez sobre Marx, Lévi-Strauss inicia já aos dezessete anos1 um pensamento de que: o que parece absurdo e incoerente na natureza humana pode ter uma racionalidade muito profunda. A carreira etnográfica deste antropólogo se inicia “num domingo de 1934, às nove horas da manhã, com um telefonema: [...] o senhor ainda deseja fazer etnografia? –sem dúvida! – Então, candidate-se ao cargo de professor de sociologia na Universidade de São Paulo. A periferia está cheia de índios. Você poderá vê-los nos fins de semana [...]” (LÉVI-STRAUSS, 2004: 45). Ou seja, o Brasil a partir desse ponto passará a fazer parte da vida e dos trabalhos desse grande pesquisador. Dessa forma, é no interesse pelas influências do contexto histórico brasileiro e mundial nos trabalhos de Lévi- Strauss, com certeza um dos mais importantes Antropólogos do século XX, que se inicia este ensaio. Como ele afirma no documentário: “Não escolhi o Brasil. Foi o Brasil que me escolheu”. 1 Argumento retirado do documentário “Saudades do Brasil” produzido pela TV Senado em 2005
  • 4. 4 O Novo Mundo2 A criação da USP se deu no clima da Revolução Constitucionalista de 1932 com o intuito de deselitizar a cultura e para fazer frente “à influência tradicional da Igreja e do exército” (Lévi-Strauss, 2004: 97), ou seja, para democratizar a cultura. Sendo este período de grandes agitações perante a mudança de uma república cafeeira para um “Estado do povo”, esta Universidade envolve primeiramente interesses da elite cafeeira paulista em “transformar o Estado de São Paulo e, portanto, a sociedade e o poder do Estado, num poder onde se pudesse preparar as elites para o exercício da presidência da província de São Paulo”3 . Logicamente, a elite de São Paulo também desejava manter o seu prestígio perante o governo Getulista, o qual haviam sido “desbancados”. Lévi-Strauss vem para o Brasil, juntamente com outros professores franceses para ministrar aulas na Universidade. Ele então fica maravilhado com os fenômenos que aqui ocorrem. Diferentemente do que pensavam na Europa, a cidade de São Paulo não era mais aquele “território desconhecido habitado somente pelos índios [...] a não ser um grupo de algumas famílias localizadas no litoral que vinham vender aos domingos [...] pretensas curiosidades” (Lévi-Strauss, 2004: 47). No documentário4 , também se mostra fascinado quando afirma que “aquilo que, na Europa, demorou séculos para formar-se, no Brasil, se fazia em meses, semanas, ou até dias”. Com relação aos alunos que teve, Lévi-Strauss se mostrou também fascinado. Uma curiosidade interessante é que algumas vezes após as aulas eles os convidava para tomar chá em sua casa. Tamanha é a sua relação com alguns, que em seu livro “Tristes Trópicos” cita seus nomes. Como coloca no livro: “Pensando no que era a Europa da época e no que é hoje, aprendi, vendo-nos vencer em poucos anos uma distância intelectual que poderia supor da ordem de vários decênios, como desaparecem e como nascem as sociedades; e que essas grandes reviravoltas da história que, nos livros, parecem resultar do jogo das forças anônimas agindo no centro das trevas, também podem, num claro instante, realizar-se pela resolução viril de um punhado de crianças bem dotadas” (Lévi-Strauss, 2004: 100). 2 Parte do livro que achei mais interessante a destacar neste ensaio, especialmente o capítulo intitulado “São Paulo”. 3 Palávras de Hirano extraídas do documentário 4 “Saudades do Brasil”
  • 5. 5 O primeiro estudo do Antropólogo no Brasil, portanto, foi com relação ao fenômeno urbano. Percebemos em “Tristes Trópicos” alguns traços marcantes desse período de crescimento enorme da cidade de São Paulo, que ocorria por razões aqui já citadas. Diziam que se erguia na cidade uma casa por hora. “A cidade desenvolve-se a tal velocidade que é impossível obter seu mapa: cada semana demandaria uma nova edição” (Lévi-Strauss, 2004: 92). Após voltar das expedições aos Bororo e Kadweu, Lévi-Strauss, quando se preparava para partir a uma nova expedição por volta de 1938, sofre problemas com a burocracia do governo do Estado Novo, que estava na época, assim como todo o resto do mundo, com ideologias de ódio aos estrangeiros e de nacionalismo exacerbado. O governo exigia que para que a expedição fosse autorizada, um fiscal os acompanhasse. Apesar dos problemas, é aí que Lévi-Strauss conhece Luís de Castro, fiscal que o acompanhara na viagem e muito lhe ajudara em seus estudos. Assim, ele parte para estudar os Nambiquara e, depois, os Tupi-Cavaíba. No tempo em que deu aulas na USP e estudou as tribos brasileiras, preparou um itinerário de trabalhos envolvendo diversos assuntos, entre eles a questão racial, a qual será muito bem abordada em seu célebre “Raça e História” e “Raça e Cultura”. As influências das pesquisas no Brasil no pensamento de Lévi-Strauss Vimos que o contexto histórico muito influenciou na carreira de Lévi-Strauss, fazendo-o vir para o Brasil e repensar muitos conceitos que eram difundidos na Europa. Observemos agora algumas características de suas obras que foram escritas principalmente graças ao conhecimento acumulado com as tribos indígenas brasileiras. Em seu artigo intitulado “Raça e Cultura”, o autor coloca que “Não é da competência de um etnólogo tentar dizer o que é, ou o que não é uma raça, pois os especialistas da antropologia física, que a discutem desde há dois séculos, jamais chegaram a pôr-se de acordo e nada indica que estejam hoje mais perto de se entenderem acerca de uma resposta a esta questão” (Lévi-Strauss, 1986: 21). Para defender esse argumento, ele aponta que não há diferença entre raças, mas sim entre culturas. Também coloca que cada tribo se intitula a primeira, a maior, sendo que as demais são consideradas secundárias. Provavelmente o tempo que passou com os índios brasileiros também o tenha levado a refletir sobre o respeito que os mesmos têm com a natureza. No artigo ele
  • 6. 6 afirma que as diferenças evolutivas apontadas pelos estudiosos são muito peculiares, pois se estabelecermos uma análise, os europeus são mais civilizados por terem em mãos tecnologia de ponta, ao mesmo tempo em que os índios são os mais civilizados por respeitarem a natureza. Essa ideia de respeito à natureza é bem colocada neste trecho: “que reine, enfim, a ideia de que os homens, os animais e as plantas dispõem de um capital comum de vida, por forma a que qualquer abuso cometido sobre uma espécie se traduza necessariamente, na filosofia indígena, por uma diminuição da esperança de vida dos próprios homens [...]” (Lévi-Strauss, 1986: 35). O autor também coloca no artigo que as teorias racistas surgem do desejo de se estabelecer relações de força e que o preconceito surge do sentimento de competição e rivalidade entre as nações, o qual deve ser combatido com a comunicação. Esta última vem para romper barreiras, colocando em contato diversos grupos diferentes, mostrando as realidades, globalizando culturas, diminuindo as diferenças. Ela aproxima pessoas distantes geograficamente, conscientiza a aceitação e respeito pela diversidade, quebra barreiras lingüísticas e culturais e quebra o isolamento que por milênios caracterizou a vida humana. Como coloca Strauss: “As convulsões desencadeadas pela revolução industrial em expansão, a rapidez crescente dos meios de transporte e de comunicação destruíram essas barreiras” (Lévi-Strauss, 1986:48). Podemos cotejar essas informações com as do documentário, quando é colocado que os Kadweu possuíam uma ideia de aristocracia muito grande, se considerando como os senhores do lugar e das terras. Observemos também que é graças ao documentário que as informações a respeito da cultura e do trabalho de Lévi-Strauss estão sendo debatidas, provando que a comunicação quebra realmente barreiras. Com relação à natureza, o antropólogo fez um interessante trabalho com os Bororo sobre a forma como eles encaram a morte. “Bororo não morre, Bororo troca de condição”, ou seja, o índio após a morte se transforma e da continuidade à natureza. Outro artigo de Lévi-Strauss que se mostrou muito importante5 é o intitulado “Raça e História”. Neste texto o autor elenca diversos aspectos envolvendo raças, argumentos estes divididos em 10 subtítulos6 . Tantas são as ideias propostas que um ensaio apenas para elas deveria ser proposto. 5 Observamos nesse artigo o amadurecimento de muitas ideias propostas pelo autor no “Raça e Cultura”. 6 “Raça e cultura”, “Diversidade das culturas”, “O etnocentrismo”, “Culturas arcaicas e culturas primitivas”, “A ideia de progresso”, “História estacionária e História cumulativa”, “Lugar da civilização ocidental”, “Acaso e civilização”, “A colaboração das culturas” e “O duplo sentido do progresso”.
  • 7. 7 No início do artigo o autor debate algumas ideias acerca de que cada raça traz sua contribuição cultura para a humanidade e que as classificações surgem como uma maneira de discriminação e opressão. Também coloca que a tendência é que cada vez a população se torne mais mestiça, mostrando-se, portanto inútil definir raças. Mais adiante, o autor debate acerca da ausência de fontes para analisar o passado das civilizações e que nenhuma cultura se desenvolveu separadamente de todas as outras. Também afirma que apesar da diversidade das culturas ser um fenômeno natural, muitas pessoas insistem em resistir e buscar justificativas cientificas para as diferenças e que tendemos a observar com olhos preconceituosos aquilo que é diferente aos nossos costumes, sendo esse o caso do Eurocentrismo. Afirma mais adiante que mesmo que a Europa tenha se dado melhor de certa forma no que tange o desenvolvimento, cada sociedade tem de certa forma o seu passado de grandeza: Para tratar certas sociedades como “etapas” do desenvolvimento de outras, seria preciso admitir que, enquanto para estas ultimas acontecia alguma coisa, para as outras nada ou pouca coisa acontecia. E, com efeito, fala-se facilmente dos “povos sem história” (para dizer as vezes que não são mais felizes). Esta fórmula elíptica significa apenas que sua história é e permanecerá desconhecida, não que ela não exista. Durante dezenas e mesmo centenas de milhares de anos, la também houve homens que amaram, odiaram, sofreram, inventaram, combateram. Na verdade, não existem povos infantes; todos são adultos, mesmo os que não mantiveram um diário de infância e adolescência (Lévi-Strauss, 1993: 340). Ainda debate ideias como a do progresso, explicando que quando se trata de progresso, sempre o elemento do acaso está presente, e como a da História estacionária e cumulativa, colocando que estas são questões de ponto de vista, já que a riqueza de acontecimentos de uma cultura não é determinada pelo seu real valor, mas sim pelo que achamos delas, “da situação em que nos encontramos em relação a elas, do número e da diversidade de nossos interesses, que nelas empenhamos.” (Lévi-Strauss, 1993: 345). Portanto devemos levar em conta todas as contribuições e maneiras de cada cultura ser o que é a seu modo. Todas têm sua contribuição: Fenícia para a escrita; chinesa para o papel, a pólvora de canhão, a bussola; hindu para o vidro e o aço... [...] E o que faz a originalidade de cada uma delas está antes na sua maneira particular de resolver problemas, de perspectivar valores, que são aproximadamente os mesmos para todos os
  • 8. 8 homens: pois todos os homens, sem exceção, possuem uma linguagem, técnicas, uma arte, conhecimentos positivos, crenças religiosas, uma organização social, econômica e política. Ora, essa dosagem nunca é exatamente a mesma para cada cultura, e, cada vez mais, a Etnologia moderna dedica-se menos a erigir um inventário de traços separados, do que a descobrir a origem secreta dessas opções (Lévi-Strauss, 1993: 349). Podemos observar com esses trechos destacados que Lévi-Strauss se preocupou no desfecho de sua carreira com as diversas questões relacionadas ao preconceito, ao racismo, à diversidade entre culturas, ao respeito mutuo entre diferentes culturas, às contribuições que cada cultura oferece uma a outra, sempre destacando que as culturas devem buscar as trocas, mas ao mesmo tempo preservar a sua originalidade, mostrando ser alguém preocupado com a preservação da riqueza cultural das civilizações. É pensando nesses preceitos que provavelmente ele escreveu em Tristes Trópicos na página 229 sobre as relações que a tribo Bororo faz com as demais, estabelecendo apoio mútuo, caridade e justiça. Também observemos que a tribo Nambiquara possuía mitos semelhantes ao do dilúvio, provando o que Strauss afirma em “Raça e História” quando afirma que a única coisa que separa a sociedade pré- colombiana da dos colonizadores no século XVI é a de que estes últimos possuíam uma história cumulativa maior pela vantagem de terem se relacionado por mais tempo com tribos vizinhas. Afirma também que se a Revolução Industrial não tivesse ocorrido na Europa quando ocorreu, provavelmente teria ocorrido em outro local num espaço de tempo próximo, ou seja, não existe sociedade mais evoluída, o que existe são maiores relações entre culturas que possibilitam a uma sociedade ser mais desenvolvida que outra. Conclusão Observamos com os estudos de Strauss que a cultura indígena está num patamar muito maior que o questionamento do homem “civilizado”. Se são primitivas, como então explicar a beleza e riqueza cultural única encontrada em cada tribo, costumes e cordialidade que até hoje não temos. Amor ao próximo, temor às divindades, respeito à natureza. Se são primitivas, ser primitivo é ser civilizado. Ser primitivo é fazer como ninguém o que nenhum ocidental civilizado faz: Viver e compreender a natureza.
  • 9. 9 Nas palavras de Jean Malaurie, uma das personalidades do documentário: “Nós, os brancos, o Ocidente, já demos o que tínhamos que dar. Quem vai dar um novo sopro? Outra humanidade, que está de reserva, escanteada. Com sua sensibilidade no sagrado, sua percepção do mundo [...]. Mais ainda por protegerem a Terra, essas tribos são a seiva da humanidade. A Terra é sagrada!”. Comprova-se então que Claude Lévi-Strauss é um fruto de seu tempo, ousando- se afirmar inclusive que é especialmente um fruto desse Brasil enorme que abrange as mais diversas culturas e mestiçagens. “O mundo começou sem o homem e concluirá sem ele” (Lévi-Strauss, 2004: 390), resta a nós sabermos qual o sentido daremos a nossa existência. Mais que um diário de um Antropólogo, as obras de Lévi-Strauss são uma homenagem à vida. Referências LÉVI-STRAUSS, Claude. “Raça e História”. In: LÉVI-STRAUSS, Claude. Antropologia estrutural dois. Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1993, PP. 328-366. LÉVI-STRAUSS, Claude. “Raça e Cultura”. In: LÉVI-STRAUSS, Claude. O olhar distanciado. Lisboa: Edições 70, 1986, pp. 21-49. LÉVI-STRAUSS, Claude. Tristes Trópicos, São Paulo, Companhia das Letras, 2004.