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             Fernanda Ribeiro




DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS À
   CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO

     Ensaio epistemológico para um
        novo modelo curricular




           Edições Afrontamento
28                         DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO




2. INFORMAÇÃO SOCIAL - UMA DEFINIÇÃO PARADIGMÁTICA

    Desfeito esse insidioso equívoco podemos reter o contributo que levou Sanchez-
-Bravo Cenjor a considerar a «estrutura da informação» como fenomenológica o que
quer dizer que temos que partir da experiência, que temos de voltar às coisas mesmas,
que temos de superar todo o tipo de preconceito para informar estruturalmente com
verdade que os factos puros não existem, que existe um facto mais um acto que o
detecta e descreve ou transmite, que todo o problema da cultura vai ligado ao da sua
transmissão e, finalmente, que a consciência é intencional 19.
    Para Husserl a fenomenologia pura é o estudo das essências que parte da dúvida
básica e transcendente face à afirmação arbitrária, numa busca exigente do recôndito e
do peculiar ou originário que cada ser e cada coisa têm em si mesmos, longe do arti-
ficial, do falso ou do aparente. Este método visa, como meta última, a descrição do que
se nos apresenta por traços essenciais e não por dados acidentais, relacionando-se com
as questões gerais e fundamentais da teoria do conhecimento. Daí que, segundo a
afirmação do próprio Husserl nas suas Investigações lógicas, a fenomenologia das
realidades lógicas tenha por objecto procurar uma compreensão descritiva (e não
empírico-psicológica) tão ampla como necessária para essas realidades psíquicas e para
o sentido que ocultam ou têm, com o fim de oferecer a todos os conceitos lógicos
fundamentais significações rigorosas. Isto é, significações que, clarificadas por um
retorno às relações de essência, aprofundadas analiticamente, entre a intenção e a
realização significativas, sejam, ao mesmo tempo, compreensíveis e seguras na sua
função de conhecimento possível. Em resumo, significações reclamadas pelo interesse
da lógica pura e, antes de tudo, pelo interesse da visão evidente, exigida por uma crítica
do conhecimento.
    Os conceitos lógicos e noéticos fundamentais têm sido até agora imperfeitamente
clarificados: estão repletos de equívocos perniciosos e são dificilmente determináveis e
retidos como distintos. Assente nestas bases, Husserl procurou demonstrar a inten-
cionalidade da consciência (toda a consciência é consciência de algo) e a aplicação
metodológica da redução ou epoché. A redução é uma operação radical que perante os
ídolos, potências da tradição e preconceitos de todo o género, impõe o direito da razão
autónoma como única autoridade em matéria de verdade - julgar as coisas de uma




19
  . SANCHEZ-BRAVO CENJOR, Antonio - Op. cit. p. 118.
29                                                  NOÇÕES FUNDAMENTAIS




maneira racional e científica é tomar como regra as coisas mesmas, porque o retorno a
estas e o abandono dos pressupostos ou preconceitos constitui o grande objectivo
metodológico. Em síntese, a base do método fenomenológico é a busca da essência ou
daquilo que justifica a vida para além das aparências.
   Trata-se, portanto, de uma perspectiva filosófica que Sanchez-Bravo Cenjor20 adap-
tou à Informação periodística e que nós julgamos possível aplicar, de forma livre e
necessariamente crítica, à Informação em geral, concebendo-a, assim, como algo de
essencial (não imutável, mas modelada por um conjunto fixo de propriedades intrinse-
camente subjectivas e intersubjectivas) que está para além dos suportes físicos/materiais
que o «coisificam», porque só o acto humano (individual), pleno de consciência
intencional, de racionalidade e de liberdade, é informacional. E nele se acha implicada,
como frisámos atrás, a comunicação, processo ínsito à condição humana, mas que con-
voca apenas a alteridade (o fecundo relacionamento com os outros) e as questões
específicas que lhe são inerentes. À pergunta o que é a comunicação? John Fiske res-
pondeu:
               A comunicação é uma daquelas actividades humanas que todos reconhe-
            cemos, mas que poucos sabem definir satisfatoriamente. Comunicação é
            falarmos uns com os outros, é a televisão, é divulgar informação, é o nosso
            penteado, é a crítica literária: a lista é interminável.

   E, apesar de tamanha diversidade, o autor, embora subsumindo a Informação no
processo comunicacional 21, acaba por aderir a uma definição geral muito expressiva: a
comunicação é a interacção social através de mensagens 22.
   Ao clarificarmos bem a distinção conceptual entre mensagens e comunicação esta-
mos a responder melhor a algumas das questões atrás colocadas. E desde logo é-nos
possível afirmar que a Informação é algo em si mesma e anterior à coisificação/mate-
rialização que lhe dá temporalidade e espacialidade.
   Foi, aliás, essa coisificação que tornou possível a noção comum e antiga de Docu-
mento ou de Documentação, sobrevalorizada pelo senso comum e pela conversação
quotidiana e trivial. José López Yepes23 e K. J. McGarry, que se socorreram do
contributo epistemológico dos três mundos de Karl Popper - onde o mundo um é o
mundo dos objectos e estados físicos, o mundo dois compreende os estados de
consciência e o mundo três integra o conhecimento no sentido objectivo, entrando nesta
categoria a informação em sentido objectivo porque é a expressão de pensamentos




     20. SANCHEZ-BRAVO CENJOR, Antonio - Op. cit. p. 90-112.
     21. O exemplo cabal dessa abusiva redução acha-se nos capítulos 3 - Comunicação, significação e signos, 4 - Códigos e –
5 Significação, em que procedeu a uma abordagem semiótica do processo comunicacional subentendendo aí a Informação
(ver: SANCHEZ-BRAVO CENJOR, Antonio - Op. cit. p.61-136).
     22. FlSKE, John - Introdução ao estudo da comunicação. Porto: Edições Asa, 1993. p. 13-14. 23. Ver: LÓPEZ YEPES,
     José - Hacia una teoria de la documentación. In Manual de información y documentación. Coord. José López Yepes.
     Madrid: Ediciones Pirámide, 1996. p. 63-95.
30                            DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS A CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO




científicos, literários e artísticos codificados em bibliotecas e museus, assim como
todos os registos da cultura humana24 - só admitem a Informação única e
exclusivamente como Documentação, ou seja, registo de letras, números, traços,
imagens num suporte material. Esta é, aliás, uma ideia fixa propalada e reproduzida por
muitos autores até hoje, sendo facilmente envolvida e contaminada pela deriva
empírica (sensorial) e patrimonialista.
   Glosando também a discutível proposta popperiana, Bertram C. Brookes 25 não hesi-
tou em aplicá-la à caracterização do objecto da information science, associando o
mundo três - o do conhecimento objectivo, formado pelos produtos ou artefactos da
mente humana armazenados, sob a forma de códigos linguísticos, de artes, de ciências e
de tecnologias, por todo o planeta - ao domínio específico e concreto da informação,
materializado nos suportes clássicos da era pós-invenção da escrita (livros impressos e
manuscritos vários) e nos novos suportes electrónicos. E concluiu desta forma:
                           O Mundo 3 de Popper deve recomendar-se à biblioteconomia e à
                        ciência da informação porque, pela primeira vez, oferece uma
                        abordagem racional às suas actividades profissionais, a qual pode ser
                        expressa noutros termos que não meramente práticos (...) E a tarefa
                        teorizadora consiste em estudar as interacções entre o Mundo 2 e o 3,
                        descrevê-los e explicá-los se possível e também ajudar a organizar
                        mais o 26conhecimento que o documento com vista a um uso
                        efectivo .

   O autor inflectiu, deste modo, na aceitação de um mundo de coisas sensíveis e
objectivas e, dentro da enunciação dos aspectos filosóficos 27, enfatizou a equação
fundamental implicada pela relação entre informação e conhecimento, concluindo que
a absorção da informação pela estrutura do conhecimento pode causar não simples-
mente uma adição, mas algum ajustamento à estrutura tal como uma mudança nas
relações envolvendo dois ou mais conceitos já admitidos. Nas ciências, o incremento
da informação tem conduzido, por vezes, a uma reestruturação catastrófica 28. A ideia-
-força de Brookes consiste, pois, em demonstrar que a Informação, verbal e não-verbal,
permite observar, objectivamente, o modo como crescem e evoluem as estruturas do
conhecimento individual. Para este autor, não só é possível medir o fluxo informa-
cional, como também se torna possível aplicar determinadas medidas para objectivar o
conhecimento.
   Mas esta posição teórica, aqui genericamente sumariada, merece, sobretudo, o
seguinte reparo: a pretensa «coisificação» da informação é impossível porque por mais


    24. MCGARRY, K. J. - Op. cit. p. 87.
    25. Veja-se: BROOKES, Bertram C. - The Foundations of information science. Part I - Philosophical aspects. Journal of
    Information Science. Amsterdam; New York. 2 (1980) 125-133.
   26. BROOKES, Bertram C. - Op. cit. p. 128; ver também: POPPER, Karl R. - Objective knowledge: an evolutionary approach.
Oxford: University Press, 1972.
   27. BROOKES, Bertram C. - Op. cit.
   28. BROOKES, Bertram C. - Op. cit. p. 131.
31                                         NOÇÕES FUNDAMENTAIS




concretos e externos ao observador que sejam os «artefactos informacionais» (livros,
periódicos, manuscritos, etc.), eles são extensões do pensamento e da acção humana e
social, contendo, por isso, uma margem variável de imprecisão 29 e de representação
subjectiva, sem que, contudo, tal margem inviabilize formas mais elaboradas de
conhecimento.
    Este aspecto parece-nos crucial, porque facilmente se podem formar subtis equívo-
cos ou confusões perduráveis e assimiláveis pela «opinião pública» e até pelo «senso
comum».
    Julgar que um texto (produto informacional «puro») perde a subjectividade original e
ganha objectividade ao ser registado, isto é, ao materializar-se num suporte (papel,
electrónico ou digital) é confundir a sua natureza (ideias, conceitos e imagens
codificadas pela língua ou por outros códigos) com a natureza do(s) suporte(s), o que
nos parece ser um erro grosseiro.
    Que intrínseca semelhança há entre o acto de pensar e de produzir discurso e o de
fazer (tecnologia do) papel ou de fazer em série peças de hardware computacional? Se
não há nenhuma, a subjectividade original do discurso mantém-se, seja ele registado ou
não, ainda que, como se verá adiante, o cientista da informação, ao contrário de outros
cientistas sociais, não careça tanto do imperativo de interpretar, embora isto não
signifique a recusa da hermenêutica, importante e decisiva no estudo da informação e
de uma das suas propriedades - a transmissibilidade -, pela qual se torna inevitável a
ligação fenoménica ao processo da comunicação. Mas a faceta processual, ao acentuar
a valorização dos procedimentos e das técnicas de produção, armazenamento e
recuperação, traz em si um grau de objectividade maior do que o que é possível atingir
na generalidade dos fenómenos humanos e sociais.
    Uma parte substancial do exposto talvez possa ser melhor entendida através de
 exemplos adequados.
    A bibliografia descritiva não se reduz à catalogação e à classificação dos livros ou
 dos periódicos em suporte papel, indo mais longe na caracterização do(s) objecto(s)
 informacional(ais). Mas para cumprir o seu objectivo ela tem de enfrentar,
 inevitavelmente, uma profunda cisão de dois níveis materialmente unidos, mas
 essencialmente distintos: o texto (informação) e o suporte. Num livro é, pois,
 necessário distinguir entre o que é a essência informacional e o que é existencial no
 sentido de que corresponde à presença material, à durabilidade e ao uso (recuperação)
 permanente. Pode, graficamente, esquematizar-se em duas colunas (ver quadro na
 página seguinte).
     E se quisermos complicar a «tese» passemos à Arte e consideremos um quadro de
 Rembrandt ou de Picasso. Quadro único e uno em que, no entanto, podemos «isolar» a
 Informação (ou seja, as formas, as cores e a imagem pictórica global) do suporte (tela,
 tintas e moldura). E que é possível separar o «conteúdo» do «continente» prova-o a
 fácil abundância de cópias e a digitalização das imagens... 30

  29. Veja-se, a este propósito: MOLES, Abraham; ROHMER, Elisabeth - As Ciências do impreciso. Porto: Edições
Afrontamento, 1995.
  30. Esta visão tem todo o sentido do ponto de vista informacional, que não é, naturalmente, o mesmo numa
perspectiva ontológica ou estética, em que a obra de arte é objecto de análise em si mesma e na sua unidade
intrínseca.
32                   DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO




                          Informação                                               Suporte

     texto/discurso/linguagem incorporando códigos diversos          cadernos de papel formato 4°,8°,16°
     paginação                                                       números de folhas e suas medidas
     autor(es) e títulos de livros ou de periódicos                  brochura ou encadernação
     sumários e índices                                              tinta (do texto)
     indicação de 1.ª ou mais edições                                gramagem e tipo de papel
     ilustrações, gravuras ou «extra-textos»                         bolsas para material acompanhante


    A divisória proposta aplica-se a qualquer tipo de Informação registada em suporte
físico, nomeadamente o electrónico, embora este apresente uma sofisticação tecnológica
ímpar a ponto de ser constituído por uma base «mecânica» ou hardware e outra de tipo
«lógico» - programação/software - que é um género especial de informação
indispensável na criação, memorização e recuperação da Informação em sentido mais
comum. Mas mesmo neste caso é possível traçar a linha que separa a «essência» da
mera base instrumental.
    Essa linha divisória serve, sobretudo, para se refutar com vigor a «escola» espanhola
de López Yepez, defensora de uma Ciência documental ou Ciência da Documentação
distinta da Ciência da Informação por se tratar - a documentação - de informação sobre
informação. É, poderia dizer-se, ao menos como ponto de partida, informação elevada
ao quadrado. É, simultaneamente, informação e fonte de informação31. No mínimo uma
distinção epistemologicamente redundante!...
    Vincado este ponto - o carácter epifenoménico da Documentação, inscrito, portanto,
no fenómeno32 da Informação -, parece-nos necessário repisar a característica
fundamental, já atrás referida, do código simbólico que exprime as ideias, os conceitos
ou as impressões produzidas pelo ser humano, individualmente considerado.
    Qualquer código tem as suas regras e meandros e, por exemplo, a língua compreende
duas componentes básicas: uma sintáctica/gramatical e outra semântica/retórica.




    31. LÓPEZ YEPES, José; ROS GARClA, Juan - Qué es documentación?: teoria e história del concepto en
España. Madrid: Editorial Síntesis, 1993. p. 112.
    32. Cingimo-nos, aqui, ao sentido comum patente num vulgar glossário filosófico, como, por exemplo, o da
História da Filosofia de Brian Magee (Lisboa: Círculo de Leitores, 1999. p. 229-230) a saber: Fenómeno. Uma
experiência que está imediatamente presente. Se olharmos para um objecto, o objecto tal como é experimentado por
mim é um fenómeno. Kant distinguiu isto do próprio objecto, independentemente de este ser experimentado: a isto
chama-se Númeno. (.,.) Númeno. A realidade desconhecida por detrás do que se apresenta à consciência humana,
sendo o último conhecido como Fenómeno. A uma coisa, tal como é, independentemente de ter sido experimentada,
chama-se «um númeno», «O numenal» tornou-se, portanto, uma expressão para a natureza suprema da realidade.
A expressão alemã para a «coisa em si» é Ding-an-sich que também foi utilizada em outras línguas e significa o
mesmo que númeno.
33                                            NOÇÕES FUNDAMENTAIS




À Linguística e suas escolas (designadamente a estruturalista), assim como à Psicolin-
guística, cabe o estudo sistemático da sintáctica, enquanto à Semiologia/Semiótica
compete a desconstrução da semântica (constructo social). E ao fazê-lo será que inci-
dem em pleno na Informação? Parece-nos que não, embora tais estudos sejam, natu-
ralmente, complementares. No entanto, a complementaridade cobre, sobretudo, o
ambiente genésico e as margens do fenómeno. Ao mesmo tempo, a fenomenalidade
informacional determina um campo científico próprio.
   Para se entender melhor o que pretendemos dizer atente-se no esboço de definição,
entre várias possíveis33, extraído do Harrod's librarians' glossary: Informação é um
conjunto de dados registados de uma forma compreensível em papel ou em algum outro
meio, e capaz de comunicação34.
   São vários os limites desta definição demasiado simplificada. O primeiro reside na
expressão inicial - conjunto de dados. A este propósito é legítima a questão sobre se a
Informação é um dado35 ou um processo, embora ela nos pareça mal colocada. Se dado
corresponde a facto, notícia ou referência concreta de algo cognoscível constitui, então,
uma parcela muito reduzida do que é ou do que pode ser a Informação como conjunto
ou universo lato de representações (mentais e afectivas ou emocionais) que não se
esgota - frisámo-lo já - na faculdade humana/psíquica de conhecer. E mesmo que a
Informação fosse só dado(s) isso implicava, também, a acção humana em perpétuo
movimento, sendo consequentemente processo. Daqui se infere a pobreza inaceitável do
conceito de dado e a subjacente noção de processo porque a Informação produz-se,
memoriza-se e recupera-se dinamicamente, isto é, em processo. A outra limitação
consiste no laconismo de numa forma compreensível em vez de ficar expresso que esse
conjunto de dados, ou melhor, de representações implica um ou mais tipos de código,
podendo ser registado em papel ou noutro suporte qualquer. E não fica, por último,
claro na definição citada que só pela codificação das representações se potencializa a
transmissão/comunicação.
   Passemos, entretanto, da análise crítica da definição, muito vulgarizada, mas também
muito resumida do Harrod's librarians' glossary, para a versão provisória (ou paper de
1986) do Programme général d'information et Unisist da UNESCO sobre consolidação




    33. A este propósito, consultar, por exemplo: MCGARRY, K. J. - Op. Cit. Cap. 1.
    34. Harrod's Librarians' glossary of terms used in Librarianship, documentation and the book crafts
and reference book. Compilo by Ray Prytherch. 6th ed. Hants: Gower, copo 1987. p. 381. Parece aproximar-se desta
definição a de dado (representação de factos, conceitos ou instruçães, de um modo convencional e adequado à
comunicação, interpretação ou tratamento por meios humanos ou automáticos), tomado expressamente como
sinónimo de informação, in ALVES, Ivone [et al.] - Dicionário de terminologia arquivística. Lisboa: Instituto da
Biblioteca Nacional e do Livro, 1993. p. 30 e 57.
    35. O termo tornou-se corrente na informática de gestão. É comum a expressão «base de dados» e até não falta
quem defina informação como conjunto de dados com significado, como se pudesse haver dados (um nome, uma
coisa...) vazios de sentido ou significado!... (ver: SOUSA, Alexandre O Laboratório de aprendizagem na transição
para uma economia de serviços de informação. Sistemas de Informação. Braga. 1 (1993) 56).
34                           DAS «CIÊNCIAS" DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO




da informação. Deparamo-nos aí com quatro definições consideradas pelos autores do
projecto - Tefko Saracevic e Judith B. Wood - particularmente aplicáveis ao conceito de
consolidação de informação, correspondendo cada uma a um ponto de vista diferente e a
uma propriedade ou característica diversa da informação.
    Na primeira definição, a Informação é uma escolha diante de um conjunto de men-
sagens disponíveis, uma escolha que reduz a incerteza e nesta medida podemos dizer
que a Informação é o que atenua a incerteza. É patente aqui a influência da conhecida
teoria da informação ou da transmissão de sinais de Claude Shannon36.
    Na segunda, a Informação é o sentido que um ser humano atribui aos dados usando
convenções conhecidas que servem para os representar. O American National Standards
Institute subscreveu esta perspectiva, baseada, aliás, no conceito operatório de sentido
como sendo a significação que a informação tem para o sistema que a trata.
    Na terceira, a Informação é a estrutura de todo o texto que é capaz de modificar a
imagem-estrutura de um receptor: um texto é uma colecção de signos deliberadamente
estrutura dos pelo emissor com a intenção de modificar a imagem-estrutura do receptor.
Esta definição em uso na Ciência da Informação acha-se mais articulada com o fim
visado pela consolidação da informação e, dentro desta óptica, o importante será a
modificação - adição, supressão, confirmação e reorganização - do conhecer ou do ser
de uma pessoa, a «imagem de si».
    Na quarta e última definição, a Informação é o conjunto dos dados que têm um valor
para a tomada de decisões, pois que a Informação em si mesma não tem valor algum e
só o seu uso é que confere valor para o indivíduo e a sociedade. Inspirada na teoria da
decisão e da gestão vigente nas chamadas ciências empresariais 37.
    Todas estas vertentes se completam e associam com a noção de conhecimento
público, definido por Tefko Saracevic e Judith B. Wood, como o consenso racional de
ideias e de informação. Fixaram, assim, o patamar de onde evoluíram para uma carac-
terização operatória da Informação consolidada através de três gradações ou níveis:
                          1 ° Actividades de Consolidação da Informação - correspondem à
                       função exerci da pelos indivíduos, dos Serviços ou das Organizações,
                       tendente a avaliar e a condensar os documentos pertinentes a fim de
                       fornecer a certos grupos de utilizadores novos corpora de
                       conhecimentos fiáveis e concisos;
                          2° A Avaliação - nível operatório que distingue a consolidação da
                       indexação, da elaboração de resumos ou abstracts e de outros
                       procedimentos; e
                          3° A Informação Consolidada impõe-se, portanto, como o
                       conhecimento público expressamente escolhido, analisado, avaliado e
                       eventualmente reorganizado e recondicionado em função de certas
                       decisões imediatas, de certos problemas e das necessidades de
                       informação de uma clientela ou de um grupo social preciso que, sem

    36. Sobre este tema, ver, por exemplo: EPSTEIN, Isaac - Teoria da informação. 2" ed. São Paulo: Editora Ática,
1988.
    37. SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Consolidation de I'information: guide pour I'évaluation, la
réorganisation et le reconditionnement de I'information scientifique et technique: version provisoire. Paris:
Organisation des Nations Unies pour l'Éducation, la Science et la Culture, 1986. (PGI-81jWSj16). p. 6-7.
35                                            NOÇÕES FUNDAMENTAIS




                      isso, não está talvez em condições de aceder a este conhecimento tal
                      qual ele38se apresenta na massa dos documentos ou sob a sua forma
                      original .
   Chegados a este ponto de apuramento conceptual os autores reconheceram, muito
lucidamente, que a Informação Consolidada é uma forma particular de representação da
informação na qual todos os aspectos gerais têm sempre pleno curso, mas que é sujeita
a certos constrangimentos, a saber:
                          -     é     um     conjunto      de     mensagens       que   pode
                            provavelmente/potencialmente reduzir a incerteza, mas só numa
                            condição precisa: a mensagem ou o conjunto de mensagens deve
                            ser escolhido, avaliado e estruturado em função das necessidades
                            dos receptores potenciais;
                          - é um sentido atribuído aos dados, após as convenções usadas
                            para os representar, convenções que são conhecidas tanto pelo
                            emissor como pelo receptor, e que são mais particularmente
                            escolhidas em função do ponto de vista do receptor;
                          - é um texto estruturado que está pronto para agir sobre o conheci-
                            mento do receptor, enquanto a estrutura do texto é
                            essencialmente construída em função das necessidades do
                            receptor; e
                          - ela adquire naturalmente valor na tomada de decisões, enquanto
                            os problemas e as etapas dos decisores são a preocupação
                            primordial na sua selecção, avaliação e estrutura 39.

   Configurada deste modo, a Informação consolidada resulta de um processo faseado
e complexo, que convoca a comunicação40 enquanto processo fundamental ou sequên-
cia de procedimentos que produzem alguns efeitos41. E por causa deste «processo fun-
damental» os autores enumeraram oito operações directamente envolvidas na consoli-
dação informacional e retomadas em manual posterior 42: (1) estudo dos utilizadores

    38. Cf. SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Op. cit. p. 8. Estes autores foram ainda mais longe ao
apresentarem uma definição ligeiramente mais concisa e mais ampla, a saber: A Informação Consolidada é um texto
ou uma mensagem (ou um conjunto de textos ou de mensagens) deliberadamente estruturada a partir do
conhecimento público existente, de maneira a agir sobre o conhecimento privado e as decisões do indivíduo que, sem
isso, não está talvez em condições de aceder a esse conhecimento público tal qual ele se apresenta na massa original
dos documentos ou na estrutura e sob a sua forma original, nem de o utilizar de maneira eficaz e eficiente.
39. SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Op. cit. p. 9.
40. Os autores fornecem duas definições de comunicação. Uma breve e genérica: A Comunicação é um processo pelo
qual a informação é veiculada entre os membros de uma população no seio de um sistema comum de símbolos. E
outra mais desenvolvida: A Comunicação é um processo pelo qual a informação é transferida, por uma ou várias
vias determinadas, de uma fonte, ou emissor, a um destino, ou receptor. O processo pode ir nos dois sentidos, o que
implica um retorno de informação do receptor para o emissor; pode igualmente comportar uma atitude de
autoregulação. Compreende, habitualmente, um certo número de etapas. Há por vezes também uma fonte de ruído,
quer dizer, uma fonte de informação «parasita» (SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Op. cit. p. 9).
41. SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Op. cit. p. 9.
42. SARACEVIC, Tefko - Cours de consolidation de l'information: manuel de formation théorique et pratique à
l'analyse, à la synthèse et au reconditionnement de l'information: version préliminaire. Paris: UNESCO, 1986. (PGI-
86jWSj14).
36                           DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO




potenciais que determina os critérios aplicáveis a todos os outros processos; (2) escolha
da ou das fontes de informação que contenha(m) a informação potencialmente mais útil
do ponto de vista dos problemas e das necessidades do utilizador, podendo a selecção
ser operada a partir de uma gama de fontes primárias e secundárias; (3) avaliação da
informação tendo em conta o valor intrínseco da sua validade e fiabilidade; (4) análise
com vista a determinar e a extrair as características mais marcantes; (5) reorganização
da informação extraída num conteúdo que possa ser usado da maneira mais eficaz e
mais eficiente pelos utilizadores, podendo implicar nomeadamente a síntese, a
condensação, a reescrita, a simplificação, revisão e estado da questão; (6)
acondicionamento e recondicionamento (aspecto formal) da informação reorganizada
sob uma forma que acrescente o seu potencial de utilização; (7) difusão ou dissemi-
nação da informação segundo as modalidades que encorajarão e favorecerão o seu uso,
implicando também a formação dos utilizadores no uso da informação e a respectiva
comercialização; e (8) retroacção ou a informação em retorno fornecido pelos uti-
lizadores, avaliação dos esforços e dos ajustamentos43.
    Partindo destas operações fica mais fácil desenhar a crítica que o contributo focado
nos suscita.
   Se parece óbvio que a Informação seja texto e o que isto implica (representações
codificadas, não importa como, desde que humana e socialmente inteligíveis), é óbvia
também a diferença dos olhares problematizadores que interpelam o mesmo objecto. Ao
contrário de Popper diremos que há objecto para lá do sujeito, mas concordamos com
ele quando acrescentamos que esse objecto também é construído através de um corpus
homogéneo de problemas e de perspectivas formuladas pelo sujeito. Ora, algumas
dessas operações centradas num tipo específico de Informação (a consolidada, para
usarmos o termo de Saracevic e Woods) assemelham-se muito a procedimentos
metodológicos próprios de ciências sociais e humanas como a História, a Sociologia ou
a Antropologia e neste sentido teríamos de concluir haver uma profunda «promis-
cuidade» epistémica entre elas e a disciplina científica orientada para o estudo espe-
cífico do fenómeno informacional. Julgamos, porém, que não deve haver tal, nem há de
facto e a prova contundente desta nossa opinião passa pela linha divisória que é possível
traçar entre a análise de conteúdo (indexação) e a avaliação/reorganização (produção de
sínteses e de resumos). Aquela insere-se plenamente no estudo da Informação em si
mesma, enquanto esta penetra em segmentos temáticos especializados que só podem ser
reorganizados ou resumidos com desenvoltura por quem os conheça em pormenor - o
químico, o técnico de electrónica, o físico, o historiador, o psicólogo, o médico, o
jurista, etc.
   Temos, assim, que a Informação consolidada é, antes de mais, Informação e o acto
de consolidação remete mais para o contexto orgânico de produção (veja-se, por




     43. SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Op. cit. p. 16.
37                                     NOÇÕES FUNDAMENTAIS




exemplo, o caso de uma Assessoria Jurídica de empresa ou instituição que faça resumos
e condensados de leis e de disposições normativas para apoio à acção da respectiva
entidade), do que para a função científico-técnica de um bibliotecário, documentalista
ou arquivista. Há, portanto, limites à esfera científica destes últimos, situada a montante
do processo comunicacional.
   Tais limites justificam a tentativa de uma definição de Informação, talvez ainda
imperfeita, mas mais completa: conjunto estruturado de representações mentais
codificadas (símbolos significantes) socialmente contextualizadas e passíveis de
serem registadas num qualquer suporte material (papel, filme, banda magnética,
disco compacto, etc.) e, portanto, comunicadas de forma assíncrona e multi-
direccionada.
   Deste tentame definitório podemos seguir para outra definição do Harrod's
librarians' glossary sobre sistema de informação, que serve para colmatar a
compreensão do modo prático como se estruturam as representações, numa palavra, a
Informação: Sistema de Informação é um procedimento organizado para colectar,
processar, armazenar e recuperar informação a fim de satisfazer uma variedade de fins
ou necessidades44.
   A notória fragilidade desta definição foi superada por Robert Hayes com a definição
publicada na ALA world encyclopedia of library and information services: a informação
é uma propriedade de dados resultante ou produzida por um processo desempenhado
sobre esses dados. O processo pode ser simplesmente transmissão de dados (neste caso,
são aplicáveis a definição e a medida usadas na teoria da comunicação); pode ser
selecção de dados; pode ser organização de dados; pode ser análise de dados45. Hayes
procurou sublinhar, ainda que de forma pouco precisa, as propriedades inerentes ao
fenómeno e pelas quais surge, se repete e renova, conserva e é passível de recuperação
sine die. Confirma-se, assim, a Informação como conjunto lato de representações e
como processo, sem que isso implique uma inevitável confusão com o processo
comunicacional. E infere-se ainda desta perspectiva que a Informação pode ser melhor
compreendida e conhecida no contexto de sistemas específicos. Por «sistemas de
informação» Hayes entendeu aquele conjunto de um sistema geral (um fenómeno
natural, um constructo físico ou um constructo lógico) que é identificado como
produzindo informação46.
   Mas se a distinção entre informação e comunicação pode tornar-se evidente, como
atrás demonstrámos, a fronteira com o conhecimento e as demais faculdades da psiqué
humana afigura-se mais subtil, porque a Informação tem aí o seu locus e o seu
momento de gestação. Poderemos, por isso, considerar a Psicologia e outras ciências e
disciplinas afins implicadas no estudo científico da Informação? Tais ciências e disci-
plinas afiguram-se-nos complementares dado que não abrangem o núcleo central do

44. Harrod's librarians' glossary... (op. cit.), p. 385.
45. HAYES, Robert M. - Information Science education. In ALA world encyclopedia of library and information services.
20' ed. Chicago: American Library Association, 1986. p. 358.
46. Cf.: HAYES, Robert M. - Op. cit. p. 359.
38                 DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO




fenómeno em causa e nesta medida a Psicologia Cognitiva, por exemplo, não pode
explorar todas as propriedades da Informação e muito menos consegue acompanhar
quer o processo informacional com as operações de uso, de memorização e de recupe-
ração, quer os efeitos/reacções dos utentes que formam o chamado information beha-
viour (comportamento informacional). Fica, assim, espaço para uma disciplina científica
centrada nas características, propriedades e mutações dinâmicas do fenómeno, apesar da
crítica relativista de vários autores, que duvidam da relação entre o «sujeito» e o
«objecto» porquanto é impossível, para além de outros aspectos, encontrar uma óbvia
adequação entre o emissor da asserção e a compreensão do receptor e que o estudo do
«assunto» e o estudo do «objecto» acontecem numa diferente dimensão metodológica e
teorética47.
Romulo Enmark exprimiu o seu cepticismo sobre uma ciência que escolhe estudar a
Informação, significando esta o conteúdo de um documento físico e, ao mesmo tempo, a
compreensão mental desse mesmo conteúdo. A sua crítica de fundo abrange as defi-
nições de Informação que a projectam tanto na dimensão mental, como na dimensão
física. Ora esta duplicidade é falaciosa e contraproducente e neste ponto concordamos
com o autor sueco, embora nos afastemos das suas ilações. O registo material ou físico
faz a Informação existir, mas não a faz ser. A sua «essência» é de raiz psíquica e social,
ou seja, radica, por um Lado, na mente humana e, por outro, na interacção dos sujeitos
com o meio natural e entre si, interacção esta «coisificada» num código, como a Língua,
que é parte integrante do fenómeno, e do qual difere a materialização num suporte físico
externo à pessoa humana (a voz e o gesto são intrínsecos à natureza humana e por isso
não cabem dentro desse tipo de materialização...).
Para estudá-lo urge, pois, «isolá-lo» do conhecimento e da comunicação, sem esquecer
as respectivas interpenetrações. E é preciso também postulá-lo como entidade
objectivável em que há alguma implicação do sujeito cognoscente (em ciências sociais e
humanas o ser humano e social é sempre e de alguma forma sujeito e objecto), mas
dentro dos Limites possíveis de um conhecimento efectivo. Esta perspectiva, assim
ligeiramente esboçada, confronta-nos com o que poderemos entender por características
e propriedades intrínsecas da Informação.




    47. ENMARK, Romulo - The Non-existing point: on the subject of defining library and information science and
the concept of information. In http://ifla.fr/IV/ifla64/029-94e.htm. 28 p. (Comunicação apresentada à 64th IFLA
General Conference, Amsterdam, 16-21 August 1998).

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A Informação como fenômeno social e humano

  • 1. Armando Malheiro da Silva Fernanda Ribeiro DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO Ensaio epistemológico para um novo modelo curricular Edições Afrontamento
  • 2. 28 DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO 2. INFORMAÇÃO SOCIAL - UMA DEFINIÇÃO PARADIGMÁTICA Desfeito esse insidioso equívoco podemos reter o contributo que levou Sanchez- -Bravo Cenjor a considerar a «estrutura da informação» como fenomenológica o que quer dizer que temos que partir da experiência, que temos de voltar às coisas mesmas, que temos de superar todo o tipo de preconceito para informar estruturalmente com verdade que os factos puros não existem, que existe um facto mais um acto que o detecta e descreve ou transmite, que todo o problema da cultura vai ligado ao da sua transmissão e, finalmente, que a consciência é intencional 19. Para Husserl a fenomenologia pura é o estudo das essências que parte da dúvida básica e transcendente face à afirmação arbitrária, numa busca exigente do recôndito e do peculiar ou originário que cada ser e cada coisa têm em si mesmos, longe do arti- ficial, do falso ou do aparente. Este método visa, como meta última, a descrição do que se nos apresenta por traços essenciais e não por dados acidentais, relacionando-se com as questões gerais e fundamentais da teoria do conhecimento. Daí que, segundo a afirmação do próprio Husserl nas suas Investigações lógicas, a fenomenologia das realidades lógicas tenha por objecto procurar uma compreensão descritiva (e não empírico-psicológica) tão ampla como necessária para essas realidades psíquicas e para o sentido que ocultam ou têm, com o fim de oferecer a todos os conceitos lógicos fundamentais significações rigorosas. Isto é, significações que, clarificadas por um retorno às relações de essência, aprofundadas analiticamente, entre a intenção e a realização significativas, sejam, ao mesmo tempo, compreensíveis e seguras na sua função de conhecimento possível. Em resumo, significações reclamadas pelo interesse da lógica pura e, antes de tudo, pelo interesse da visão evidente, exigida por uma crítica do conhecimento. Os conceitos lógicos e noéticos fundamentais têm sido até agora imperfeitamente clarificados: estão repletos de equívocos perniciosos e são dificilmente determináveis e retidos como distintos. Assente nestas bases, Husserl procurou demonstrar a inten- cionalidade da consciência (toda a consciência é consciência de algo) e a aplicação metodológica da redução ou epoché. A redução é uma operação radical que perante os ídolos, potências da tradição e preconceitos de todo o género, impõe o direito da razão autónoma como única autoridade em matéria de verdade - julgar as coisas de uma 19 . SANCHEZ-BRAVO CENJOR, Antonio - Op. cit. p. 118.
  • 3. 29 NOÇÕES FUNDAMENTAIS maneira racional e científica é tomar como regra as coisas mesmas, porque o retorno a estas e o abandono dos pressupostos ou preconceitos constitui o grande objectivo metodológico. Em síntese, a base do método fenomenológico é a busca da essência ou daquilo que justifica a vida para além das aparências. Trata-se, portanto, de uma perspectiva filosófica que Sanchez-Bravo Cenjor20 adap- tou à Informação periodística e que nós julgamos possível aplicar, de forma livre e necessariamente crítica, à Informação em geral, concebendo-a, assim, como algo de essencial (não imutável, mas modelada por um conjunto fixo de propriedades intrinse- camente subjectivas e intersubjectivas) que está para além dos suportes físicos/materiais que o «coisificam», porque só o acto humano (individual), pleno de consciência intencional, de racionalidade e de liberdade, é informacional. E nele se acha implicada, como frisámos atrás, a comunicação, processo ínsito à condição humana, mas que con- voca apenas a alteridade (o fecundo relacionamento com os outros) e as questões específicas que lhe são inerentes. À pergunta o que é a comunicação? John Fiske res- pondeu: A comunicação é uma daquelas actividades humanas que todos reconhe- cemos, mas que poucos sabem definir satisfatoriamente. Comunicação é falarmos uns com os outros, é a televisão, é divulgar informação, é o nosso penteado, é a crítica literária: a lista é interminável. E, apesar de tamanha diversidade, o autor, embora subsumindo a Informação no processo comunicacional 21, acaba por aderir a uma definição geral muito expressiva: a comunicação é a interacção social através de mensagens 22. Ao clarificarmos bem a distinção conceptual entre mensagens e comunicação esta- mos a responder melhor a algumas das questões atrás colocadas. E desde logo é-nos possível afirmar que a Informação é algo em si mesma e anterior à coisificação/mate- rialização que lhe dá temporalidade e espacialidade. Foi, aliás, essa coisificação que tornou possível a noção comum e antiga de Docu- mento ou de Documentação, sobrevalorizada pelo senso comum e pela conversação quotidiana e trivial. José López Yepes23 e K. J. McGarry, que se socorreram do contributo epistemológico dos três mundos de Karl Popper - onde o mundo um é o mundo dos objectos e estados físicos, o mundo dois compreende os estados de consciência e o mundo três integra o conhecimento no sentido objectivo, entrando nesta categoria a informação em sentido objectivo porque é a expressão de pensamentos 20. SANCHEZ-BRAVO CENJOR, Antonio - Op. cit. p. 90-112. 21. O exemplo cabal dessa abusiva redução acha-se nos capítulos 3 - Comunicação, significação e signos, 4 - Códigos e – 5 Significação, em que procedeu a uma abordagem semiótica do processo comunicacional subentendendo aí a Informação (ver: SANCHEZ-BRAVO CENJOR, Antonio - Op. cit. p.61-136). 22. FlSKE, John - Introdução ao estudo da comunicação. Porto: Edições Asa, 1993. p. 13-14. 23. Ver: LÓPEZ YEPES, José - Hacia una teoria de la documentación. In Manual de información y documentación. Coord. José López Yepes. Madrid: Ediciones Pirámide, 1996. p. 63-95.
  • 4. 30 DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS A CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO científicos, literários e artísticos codificados em bibliotecas e museus, assim como todos os registos da cultura humana24 - só admitem a Informação única e exclusivamente como Documentação, ou seja, registo de letras, números, traços, imagens num suporte material. Esta é, aliás, uma ideia fixa propalada e reproduzida por muitos autores até hoje, sendo facilmente envolvida e contaminada pela deriva empírica (sensorial) e patrimonialista. Glosando também a discutível proposta popperiana, Bertram C. Brookes 25 não hesi- tou em aplicá-la à caracterização do objecto da information science, associando o mundo três - o do conhecimento objectivo, formado pelos produtos ou artefactos da mente humana armazenados, sob a forma de códigos linguísticos, de artes, de ciências e de tecnologias, por todo o planeta - ao domínio específico e concreto da informação, materializado nos suportes clássicos da era pós-invenção da escrita (livros impressos e manuscritos vários) e nos novos suportes electrónicos. E concluiu desta forma: O Mundo 3 de Popper deve recomendar-se à biblioteconomia e à ciência da informação porque, pela primeira vez, oferece uma abordagem racional às suas actividades profissionais, a qual pode ser expressa noutros termos que não meramente práticos (...) E a tarefa teorizadora consiste em estudar as interacções entre o Mundo 2 e o 3, descrevê-los e explicá-los se possível e também ajudar a organizar mais o 26conhecimento que o documento com vista a um uso efectivo . O autor inflectiu, deste modo, na aceitação de um mundo de coisas sensíveis e objectivas e, dentro da enunciação dos aspectos filosóficos 27, enfatizou a equação fundamental implicada pela relação entre informação e conhecimento, concluindo que a absorção da informação pela estrutura do conhecimento pode causar não simples- mente uma adição, mas algum ajustamento à estrutura tal como uma mudança nas relações envolvendo dois ou mais conceitos já admitidos. Nas ciências, o incremento da informação tem conduzido, por vezes, a uma reestruturação catastrófica 28. A ideia- -força de Brookes consiste, pois, em demonstrar que a Informação, verbal e não-verbal, permite observar, objectivamente, o modo como crescem e evoluem as estruturas do conhecimento individual. Para este autor, não só é possível medir o fluxo informa- cional, como também se torna possível aplicar determinadas medidas para objectivar o conhecimento. Mas esta posição teórica, aqui genericamente sumariada, merece, sobretudo, o seguinte reparo: a pretensa «coisificação» da informação é impossível porque por mais 24. MCGARRY, K. J. - Op. cit. p. 87. 25. Veja-se: BROOKES, Bertram C. - The Foundations of information science. Part I - Philosophical aspects. Journal of Information Science. Amsterdam; New York. 2 (1980) 125-133. 26. BROOKES, Bertram C. - Op. cit. p. 128; ver também: POPPER, Karl R. - Objective knowledge: an evolutionary approach. Oxford: University Press, 1972. 27. BROOKES, Bertram C. - Op. cit. 28. BROOKES, Bertram C. - Op. cit. p. 131.
  • 5. 31 NOÇÕES FUNDAMENTAIS concretos e externos ao observador que sejam os «artefactos informacionais» (livros, periódicos, manuscritos, etc.), eles são extensões do pensamento e da acção humana e social, contendo, por isso, uma margem variável de imprecisão 29 e de representação subjectiva, sem que, contudo, tal margem inviabilize formas mais elaboradas de conhecimento. Este aspecto parece-nos crucial, porque facilmente se podem formar subtis equívo- cos ou confusões perduráveis e assimiláveis pela «opinião pública» e até pelo «senso comum». Julgar que um texto (produto informacional «puro») perde a subjectividade original e ganha objectividade ao ser registado, isto é, ao materializar-se num suporte (papel, electrónico ou digital) é confundir a sua natureza (ideias, conceitos e imagens codificadas pela língua ou por outros códigos) com a natureza do(s) suporte(s), o que nos parece ser um erro grosseiro. Que intrínseca semelhança há entre o acto de pensar e de produzir discurso e o de fazer (tecnologia do) papel ou de fazer em série peças de hardware computacional? Se não há nenhuma, a subjectividade original do discurso mantém-se, seja ele registado ou não, ainda que, como se verá adiante, o cientista da informação, ao contrário de outros cientistas sociais, não careça tanto do imperativo de interpretar, embora isto não signifique a recusa da hermenêutica, importante e decisiva no estudo da informação e de uma das suas propriedades - a transmissibilidade -, pela qual se torna inevitável a ligação fenoménica ao processo da comunicação. Mas a faceta processual, ao acentuar a valorização dos procedimentos e das técnicas de produção, armazenamento e recuperação, traz em si um grau de objectividade maior do que o que é possível atingir na generalidade dos fenómenos humanos e sociais. Uma parte substancial do exposto talvez possa ser melhor entendida através de exemplos adequados. A bibliografia descritiva não se reduz à catalogação e à classificação dos livros ou dos periódicos em suporte papel, indo mais longe na caracterização do(s) objecto(s) informacional(ais). Mas para cumprir o seu objectivo ela tem de enfrentar, inevitavelmente, uma profunda cisão de dois níveis materialmente unidos, mas essencialmente distintos: o texto (informação) e o suporte. Num livro é, pois, necessário distinguir entre o que é a essência informacional e o que é existencial no sentido de que corresponde à presença material, à durabilidade e ao uso (recuperação) permanente. Pode, graficamente, esquematizar-se em duas colunas (ver quadro na página seguinte). E se quisermos complicar a «tese» passemos à Arte e consideremos um quadro de Rembrandt ou de Picasso. Quadro único e uno em que, no entanto, podemos «isolar» a Informação (ou seja, as formas, as cores e a imagem pictórica global) do suporte (tela, tintas e moldura). E que é possível separar o «conteúdo» do «continente» prova-o a fácil abundância de cópias e a digitalização das imagens... 30 29. Veja-se, a este propósito: MOLES, Abraham; ROHMER, Elisabeth - As Ciências do impreciso. Porto: Edições Afrontamento, 1995. 30. Esta visão tem todo o sentido do ponto de vista informacional, que não é, naturalmente, o mesmo numa perspectiva ontológica ou estética, em que a obra de arte é objecto de análise em si mesma e na sua unidade intrínseca.
  • 6. 32 DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO Informação Suporte texto/discurso/linguagem incorporando códigos diversos cadernos de papel formato 4°,8°,16° paginação números de folhas e suas medidas autor(es) e títulos de livros ou de periódicos brochura ou encadernação sumários e índices tinta (do texto) indicação de 1.ª ou mais edições gramagem e tipo de papel ilustrações, gravuras ou «extra-textos» bolsas para material acompanhante A divisória proposta aplica-se a qualquer tipo de Informação registada em suporte físico, nomeadamente o electrónico, embora este apresente uma sofisticação tecnológica ímpar a ponto de ser constituído por uma base «mecânica» ou hardware e outra de tipo «lógico» - programação/software - que é um género especial de informação indispensável na criação, memorização e recuperação da Informação em sentido mais comum. Mas mesmo neste caso é possível traçar a linha que separa a «essência» da mera base instrumental. Essa linha divisória serve, sobretudo, para se refutar com vigor a «escola» espanhola de López Yepez, defensora de uma Ciência documental ou Ciência da Documentação distinta da Ciência da Informação por se tratar - a documentação - de informação sobre informação. É, poderia dizer-se, ao menos como ponto de partida, informação elevada ao quadrado. É, simultaneamente, informação e fonte de informação31. No mínimo uma distinção epistemologicamente redundante!... Vincado este ponto - o carácter epifenoménico da Documentação, inscrito, portanto, no fenómeno32 da Informação -, parece-nos necessário repisar a característica fundamental, já atrás referida, do código simbólico que exprime as ideias, os conceitos ou as impressões produzidas pelo ser humano, individualmente considerado. Qualquer código tem as suas regras e meandros e, por exemplo, a língua compreende duas componentes básicas: uma sintáctica/gramatical e outra semântica/retórica. 31. LÓPEZ YEPES, José; ROS GARClA, Juan - Qué es documentación?: teoria e história del concepto en España. Madrid: Editorial Síntesis, 1993. p. 112. 32. Cingimo-nos, aqui, ao sentido comum patente num vulgar glossário filosófico, como, por exemplo, o da História da Filosofia de Brian Magee (Lisboa: Círculo de Leitores, 1999. p. 229-230) a saber: Fenómeno. Uma experiência que está imediatamente presente. Se olharmos para um objecto, o objecto tal como é experimentado por mim é um fenómeno. Kant distinguiu isto do próprio objecto, independentemente de este ser experimentado: a isto chama-se Númeno. (.,.) Númeno. A realidade desconhecida por detrás do que se apresenta à consciência humana, sendo o último conhecido como Fenómeno. A uma coisa, tal como é, independentemente de ter sido experimentada, chama-se «um númeno», «O numenal» tornou-se, portanto, uma expressão para a natureza suprema da realidade. A expressão alemã para a «coisa em si» é Ding-an-sich que também foi utilizada em outras línguas e significa o mesmo que númeno.
  • 7. 33 NOÇÕES FUNDAMENTAIS À Linguística e suas escolas (designadamente a estruturalista), assim como à Psicolin- guística, cabe o estudo sistemático da sintáctica, enquanto à Semiologia/Semiótica compete a desconstrução da semântica (constructo social). E ao fazê-lo será que inci- dem em pleno na Informação? Parece-nos que não, embora tais estudos sejam, natu- ralmente, complementares. No entanto, a complementaridade cobre, sobretudo, o ambiente genésico e as margens do fenómeno. Ao mesmo tempo, a fenomenalidade informacional determina um campo científico próprio. Para se entender melhor o que pretendemos dizer atente-se no esboço de definição, entre várias possíveis33, extraído do Harrod's librarians' glossary: Informação é um conjunto de dados registados de uma forma compreensível em papel ou em algum outro meio, e capaz de comunicação34. São vários os limites desta definição demasiado simplificada. O primeiro reside na expressão inicial - conjunto de dados. A este propósito é legítima a questão sobre se a Informação é um dado35 ou um processo, embora ela nos pareça mal colocada. Se dado corresponde a facto, notícia ou referência concreta de algo cognoscível constitui, então, uma parcela muito reduzida do que é ou do que pode ser a Informação como conjunto ou universo lato de representações (mentais e afectivas ou emocionais) que não se esgota - frisámo-lo já - na faculdade humana/psíquica de conhecer. E mesmo que a Informação fosse só dado(s) isso implicava, também, a acção humana em perpétuo movimento, sendo consequentemente processo. Daqui se infere a pobreza inaceitável do conceito de dado e a subjacente noção de processo porque a Informação produz-se, memoriza-se e recupera-se dinamicamente, isto é, em processo. A outra limitação consiste no laconismo de numa forma compreensível em vez de ficar expresso que esse conjunto de dados, ou melhor, de representações implica um ou mais tipos de código, podendo ser registado em papel ou noutro suporte qualquer. E não fica, por último, claro na definição citada que só pela codificação das representações se potencializa a transmissão/comunicação. Passemos, entretanto, da análise crítica da definição, muito vulgarizada, mas também muito resumida do Harrod's librarians' glossary, para a versão provisória (ou paper de 1986) do Programme général d'information et Unisist da UNESCO sobre consolidação 33. A este propósito, consultar, por exemplo: MCGARRY, K. J. - Op. Cit. Cap. 1. 34. Harrod's Librarians' glossary of terms used in Librarianship, documentation and the book crafts and reference book. Compilo by Ray Prytherch. 6th ed. Hants: Gower, copo 1987. p. 381. Parece aproximar-se desta definição a de dado (representação de factos, conceitos ou instruçães, de um modo convencional e adequado à comunicação, interpretação ou tratamento por meios humanos ou automáticos), tomado expressamente como sinónimo de informação, in ALVES, Ivone [et al.] - Dicionário de terminologia arquivística. Lisboa: Instituto da Biblioteca Nacional e do Livro, 1993. p. 30 e 57. 35. O termo tornou-se corrente na informática de gestão. É comum a expressão «base de dados» e até não falta quem defina informação como conjunto de dados com significado, como se pudesse haver dados (um nome, uma coisa...) vazios de sentido ou significado!... (ver: SOUSA, Alexandre O Laboratório de aprendizagem na transição para uma economia de serviços de informação. Sistemas de Informação. Braga. 1 (1993) 56).
  • 8. 34 DAS «CIÊNCIAS" DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO da informação. Deparamo-nos aí com quatro definições consideradas pelos autores do projecto - Tefko Saracevic e Judith B. Wood - particularmente aplicáveis ao conceito de consolidação de informação, correspondendo cada uma a um ponto de vista diferente e a uma propriedade ou característica diversa da informação. Na primeira definição, a Informação é uma escolha diante de um conjunto de men- sagens disponíveis, uma escolha que reduz a incerteza e nesta medida podemos dizer que a Informação é o que atenua a incerteza. É patente aqui a influência da conhecida teoria da informação ou da transmissão de sinais de Claude Shannon36. Na segunda, a Informação é o sentido que um ser humano atribui aos dados usando convenções conhecidas que servem para os representar. O American National Standards Institute subscreveu esta perspectiva, baseada, aliás, no conceito operatório de sentido como sendo a significação que a informação tem para o sistema que a trata. Na terceira, a Informação é a estrutura de todo o texto que é capaz de modificar a imagem-estrutura de um receptor: um texto é uma colecção de signos deliberadamente estrutura dos pelo emissor com a intenção de modificar a imagem-estrutura do receptor. Esta definição em uso na Ciência da Informação acha-se mais articulada com o fim visado pela consolidação da informação e, dentro desta óptica, o importante será a modificação - adição, supressão, confirmação e reorganização - do conhecer ou do ser de uma pessoa, a «imagem de si». Na quarta e última definição, a Informação é o conjunto dos dados que têm um valor para a tomada de decisões, pois que a Informação em si mesma não tem valor algum e só o seu uso é que confere valor para o indivíduo e a sociedade. Inspirada na teoria da decisão e da gestão vigente nas chamadas ciências empresariais 37. Todas estas vertentes se completam e associam com a noção de conhecimento público, definido por Tefko Saracevic e Judith B. Wood, como o consenso racional de ideias e de informação. Fixaram, assim, o patamar de onde evoluíram para uma carac- terização operatória da Informação consolidada através de três gradações ou níveis: 1 ° Actividades de Consolidação da Informação - correspondem à função exerci da pelos indivíduos, dos Serviços ou das Organizações, tendente a avaliar e a condensar os documentos pertinentes a fim de fornecer a certos grupos de utilizadores novos corpora de conhecimentos fiáveis e concisos; 2° A Avaliação - nível operatório que distingue a consolidação da indexação, da elaboração de resumos ou abstracts e de outros procedimentos; e 3° A Informação Consolidada impõe-se, portanto, como o conhecimento público expressamente escolhido, analisado, avaliado e eventualmente reorganizado e recondicionado em função de certas decisões imediatas, de certos problemas e das necessidades de informação de uma clientela ou de um grupo social preciso que, sem 36. Sobre este tema, ver, por exemplo: EPSTEIN, Isaac - Teoria da informação. 2" ed. São Paulo: Editora Ática, 1988. 37. SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Consolidation de I'information: guide pour I'évaluation, la réorganisation et le reconditionnement de I'information scientifique et technique: version provisoire. Paris: Organisation des Nations Unies pour l'Éducation, la Science et la Culture, 1986. (PGI-81jWSj16). p. 6-7.
  • 9. 35 NOÇÕES FUNDAMENTAIS isso, não está talvez em condições de aceder a este conhecimento tal qual ele38se apresenta na massa dos documentos ou sob a sua forma original . Chegados a este ponto de apuramento conceptual os autores reconheceram, muito lucidamente, que a Informação Consolidada é uma forma particular de representação da informação na qual todos os aspectos gerais têm sempre pleno curso, mas que é sujeita a certos constrangimentos, a saber: - é um conjunto de mensagens que pode provavelmente/potencialmente reduzir a incerteza, mas só numa condição precisa: a mensagem ou o conjunto de mensagens deve ser escolhido, avaliado e estruturado em função das necessidades dos receptores potenciais; - é um sentido atribuído aos dados, após as convenções usadas para os representar, convenções que são conhecidas tanto pelo emissor como pelo receptor, e que são mais particularmente escolhidas em função do ponto de vista do receptor; - é um texto estruturado que está pronto para agir sobre o conheci- mento do receptor, enquanto a estrutura do texto é essencialmente construída em função das necessidades do receptor; e - ela adquire naturalmente valor na tomada de decisões, enquanto os problemas e as etapas dos decisores são a preocupação primordial na sua selecção, avaliação e estrutura 39. Configurada deste modo, a Informação consolidada resulta de um processo faseado e complexo, que convoca a comunicação40 enquanto processo fundamental ou sequên- cia de procedimentos que produzem alguns efeitos41. E por causa deste «processo fun- damental» os autores enumeraram oito operações directamente envolvidas na consoli- dação informacional e retomadas em manual posterior 42: (1) estudo dos utilizadores 38. Cf. SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Op. cit. p. 8. Estes autores foram ainda mais longe ao apresentarem uma definição ligeiramente mais concisa e mais ampla, a saber: A Informação Consolidada é um texto ou uma mensagem (ou um conjunto de textos ou de mensagens) deliberadamente estruturada a partir do conhecimento público existente, de maneira a agir sobre o conhecimento privado e as decisões do indivíduo que, sem isso, não está talvez em condições de aceder a esse conhecimento público tal qual ele se apresenta na massa original dos documentos ou na estrutura e sob a sua forma original, nem de o utilizar de maneira eficaz e eficiente. 39. SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Op. cit. p. 9. 40. Os autores fornecem duas definições de comunicação. Uma breve e genérica: A Comunicação é um processo pelo qual a informação é veiculada entre os membros de uma população no seio de um sistema comum de símbolos. E outra mais desenvolvida: A Comunicação é um processo pelo qual a informação é transferida, por uma ou várias vias determinadas, de uma fonte, ou emissor, a um destino, ou receptor. O processo pode ir nos dois sentidos, o que implica um retorno de informação do receptor para o emissor; pode igualmente comportar uma atitude de autoregulação. Compreende, habitualmente, um certo número de etapas. Há por vezes também uma fonte de ruído, quer dizer, uma fonte de informação «parasita» (SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Op. cit. p. 9). 41. SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Op. cit. p. 9. 42. SARACEVIC, Tefko - Cours de consolidation de l'information: manuel de formation théorique et pratique à l'analyse, à la synthèse et au reconditionnement de l'information: version préliminaire. Paris: UNESCO, 1986. (PGI- 86jWSj14).
  • 10. 36 DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO potenciais que determina os critérios aplicáveis a todos os outros processos; (2) escolha da ou das fontes de informação que contenha(m) a informação potencialmente mais útil do ponto de vista dos problemas e das necessidades do utilizador, podendo a selecção ser operada a partir de uma gama de fontes primárias e secundárias; (3) avaliação da informação tendo em conta o valor intrínseco da sua validade e fiabilidade; (4) análise com vista a determinar e a extrair as características mais marcantes; (5) reorganização da informação extraída num conteúdo que possa ser usado da maneira mais eficaz e mais eficiente pelos utilizadores, podendo implicar nomeadamente a síntese, a condensação, a reescrita, a simplificação, revisão e estado da questão; (6) acondicionamento e recondicionamento (aspecto formal) da informação reorganizada sob uma forma que acrescente o seu potencial de utilização; (7) difusão ou dissemi- nação da informação segundo as modalidades que encorajarão e favorecerão o seu uso, implicando também a formação dos utilizadores no uso da informação e a respectiva comercialização; e (8) retroacção ou a informação em retorno fornecido pelos uti- lizadores, avaliação dos esforços e dos ajustamentos43. Partindo destas operações fica mais fácil desenhar a crítica que o contributo focado nos suscita. Se parece óbvio que a Informação seja texto e o que isto implica (representações codificadas, não importa como, desde que humana e socialmente inteligíveis), é óbvia também a diferença dos olhares problematizadores que interpelam o mesmo objecto. Ao contrário de Popper diremos que há objecto para lá do sujeito, mas concordamos com ele quando acrescentamos que esse objecto também é construído através de um corpus homogéneo de problemas e de perspectivas formuladas pelo sujeito. Ora, algumas dessas operações centradas num tipo específico de Informação (a consolidada, para usarmos o termo de Saracevic e Woods) assemelham-se muito a procedimentos metodológicos próprios de ciências sociais e humanas como a História, a Sociologia ou a Antropologia e neste sentido teríamos de concluir haver uma profunda «promis- cuidade» epistémica entre elas e a disciplina científica orientada para o estudo espe- cífico do fenómeno informacional. Julgamos, porém, que não deve haver tal, nem há de facto e a prova contundente desta nossa opinião passa pela linha divisória que é possível traçar entre a análise de conteúdo (indexação) e a avaliação/reorganização (produção de sínteses e de resumos). Aquela insere-se plenamente no estudo da Informação em si mesma, enquanto esta penetra em segmentos temáticos especializados que só podem ser reorganizados ou resumidos com desenvoltura por quem os conheça em pormenor - o químico, o técnico de electrónica, o físico, o historiador, o psicólogo, o médico, o jurista, etc. Temos, assim, que a Informação consolidada é, antes de mais, Informação e o acto de consolidação remete mais para o contexto orgânico de produção (veja-se, por 43. SARACEVIC, Tefko; WOOD, Judith B. - Op. cit. p. 16.
  • 11. 37 NOÇÕES FUNDAMENTAIS exemplo, o caso de uma Assessoria Jurídica de empresa ou instituição que faça resumos e condensados de leis e de disposições normativas para apoio à acção da respectiva entidade), do que para a função científico-técnica de um bibliotecário, documentalista ou arquivista. Há, portanto, limites à esfera científica destes últimos, situada a montante do processo comunicacional. Tais limites justificam a tentativa de uma definição de Informação, talvez ainda imperfeita, mas mais completa: conjunto estruturado de representações mentais codificadas (símbolos significantes) socialmente contextualizadas e passíveis de serem registadas num qualquer suporte material (papel, filme, banda magnética, disco compacto, etc.) e, portanto, comunicadas de forma assíncrona e multi- direccionada. Deste tentame definitório podemos seguir para outra definição do Harrod's librarians' glossary sobre sistema de informação, que serve para colmatar a compreensão do modo prático como se estruturam as representações, numa palavra, a Informação: Sistema de Informação é um procedimento organizado para colectar, processar, armazenar e recuperar informação a fim de satisfazer uma variedade de fins ou necessidades44. A notória fragilidade desta definição foi superada por Robert Hayes com a definição publicada na ALA world encyclopedia of library and information services: a informação é uma propriedade de dados resultante ou produzida por um processo desempenhado sobre esses dados. O processo pode ser simplesmente transmissão de dados (neste caso, são aplicáveis a definição e a medida usadas na teoria da comunicação); pode ser selecção de dados; pode ser organização de dados; pode ser análise de dados45. Hayes procurou sublinhar, ainda que de forma pouco precisa, as propriedades inerentes ao fenómeno e pelas quais surge, se repete e renova, conserva e é passível de recuperação sine die. Confirma-se, assim, a Informação como conjunto lato de representações e como processo, sem que isso implique uma inevitável confusão com o processo comunicacional. E infere-se ainda desta perspectiva que a Informação pode ser melhor compreendida e conhecida no contexto de sistemas específicos. Por «sistemas de informação» Hayes entendeu aquele conjunto de um sistema geral (um fenómeno natural, um constructo físico ou um constructo lógico) que é identificado como produzindo informação46. Mas se a distinção entre informação e comunicação pode tornar-se evidente, como atrás demonstrámos, a fronteira com o conhecimento e as demais faculdades da psiqué humana afigura-se mais subtil, porque a Informação tem aí o seu locus e o seu momento de gestação. Poderemos, por isso, considerar a Psicologia e outras ciências e disciplinas afins implicadas no estudo científico da Informação? Tais ciências e disci- plinas afiguram-se-nos complementares dado que não abrangem o núcleo central do 44. Harrod's librarians' glossary... (op. cit.), p. 385. 45. HAYES, Robert M. - Information Science education. In ALA world encyclopedia of library and information services. 20' ed. Chicago: American Library Association, 1986. p. 358. 46. Cf.: HAYES, Robert M. - Op. cit. p. 359.
  • 12. 38 DAS «CIÊNCIAS» DOCUMENTAIS À CIÊNCIA DA INFORMAÇÃO fenómeno em causa e nesta medida a Psicologia Cognitiva, por exemplo, não pode explorar todas as propriedades da Informação e muito menos consegue acompanhar quer o processo informacional com as operações de uso, de memorização e de recupe- ração, quer os efeitos/reacções dos utentes que formam o chamado information beha- viour (comportamento informacional). Fica, assim, espaço para uma disciplina científica centrada nas características, propriedades e mutações dinâmicas do fenómeno, apesar da crítica relativista de vários autores, que duvidam da relação entre o «sujeito» e o «objecto» porquanto é impossível, para além de outros aspectos, encontrar uma óbvia adequação entre o emissor da asserção e a compreensão do receptor e que o estudo do «assunto» e o estudo do «objecto» acontecem numa diferente dimensão metodológica e teorética47. Romulo Enmark exprimiu o seu cepticismo sobre uma ciência que escolhe estudar a Informação, significando esta o conteúdo de um documento físico e, ao mesmo tempo, a compreensão mental desse mesmo conteúdo. A sua crítica de fundo abrange as defi- nições de Informação que a projectam tanto na dimensão mental, como na dimensão física. Ora esta duplicidade é falaciosa e contraproducente e neste ponto concordamos com o autor sueco, embora nos afastemos das suas ilações. O registo material ou físico faz a Informação existir, mas não a faz ser. A sua «essência» é de raiz psíquica e social, ou seja, radica, por um Lado, na mente humana e, por outro, na interacção dos sujeitos com o meio natural e entre si, interacção esta «coisificada» num código, como a Língua, que é parte integrante do fenómeno, e do qual difere a materialização num suporte físico externo à pessoa humana (a voz e o gesto são intrínsecos à natureza humana e por isso não cabem dentro desse tipo de materialização...). Para estudá-lo urge, pois, «isolá-lo» do conhecimento e da comunicação, sem esquecer as respectivas interpenetrações. E é preciso também postulá-lo como entidade objectivável em que há alguma implicação do sujeito cognoscente (em ciências sociais e humanas o ser humano e social é sempre e de alguma forma sujeito e objecto), mas dentro dos Limites possíveis de um conhecimento efectivo. Esta perspectiva, assim ligeiramente esboçada, confronta-nos com o que poderemos entender por características e propriedades intrínsecas da Informação. 47. ENMARK, Romulo - The Non-existing point: on the subject of defining library and information science and the concept of information. In http://ifla.fr/IV/ifla64/029-94e.htm. 28 p. (Comunicação apresentada à 64th IFLA General Conference, Amsterdam, 16-21 August 1998).