O texto conta a história de um veado que se vê refletido em uma fonte e admira seus chifres, mas lamenta suas pernas magras. Quando um cão de caça o persegue, o veado consegue fugir graças às suas pernas, mas acaba preso entre os galhos de uma árvore por causa de seus chifres, sendo capturado pelo cão. O veado amaldiçoa então a beleza de seus chifres que acabaram sendo sua perdição.
2. Numa fonte que corria,
Certo dia,
Um estólido veado
Retratado
No cristal puro se via.
3. Em segredo
Celebrava a celsa frente
Adornada lindamente
Dum ramífero arvoredo.
Mas se a frente celebrava,
Lamentava,
A magreza assaz mesquinha
Que nas longas pernas tinha,
Que podiam parecer
Quatro fusos de torcer.
4. Eis que nisto,
Um sabujo mui previsto
Deu com ele.
O levíssimo veado,
Assustado,
Por querer salvar a pele,
Meteu pernas tão ligeiro,
Que o rafeiro
Já mui longe lhe ficava;
E escapava,
Se entrar numa selva escura
Não quisesse o miserando;
5. Que a cornífera armadura
Encalhando
Entre os ramos da espessura,
O prendia,
Lugar dando ao que o seguia,
Que chegasse
E no lombo lhe ferrasse.
6. Os seus chifres esgalhados,
Tão louvados,
Que lhe ornavam tanto a frente,
Lhe empeceram totalmente
O proveito
Que seus pés lhe tinham feito;
Mal olhados
Por esguios e delgados.
7. Neste aperto se desdisse
Sem conforto
O veado semimorto,
E maldisse
Da armação, que viu na testa,
A beleza sedutora,
Que lhe fora
Tão funesta!
8. Muitas vezes maldizemos
O que é útil,
E o vistoso engrandecemos,
Bem que fútil.
Eis o exemplo demonstrado
No veado.