“A mentira é simplesmente a linguagem da alma, pois, assim
como nos servimos de palavras, que são sons articulados de
uma maneira absurda, para em linguagem real traduzir os
mais íntimos e subtis movimentos da emoção e do
pensamento , que as palavras forçosamente não poderão
nunca traduzir, assim nos servimos da mentira e da ficção
para nos entendermos uns aos outros , o que com a verdade
própria e intransmissível, se nunca poderia fazer. ”Fernando
Pessoa
As temáticas de Fernando
Pessoa:
•Fingimento artístico
•A dor de pensar
•A nostalgia da infância mítica
•A fragmentação do ‘’eu’’- O tédio existencial
Binómios :
•Consciência/ Inconsciência
•Pensar/ Sentir
•Realidade/Sonho
Fingimento Artístico
Criação Poética
Fingimento
O poema não traduz aquilo que o poeta sente , mas sim aquilo
que imagina a partir do que anteriormente sentiu. O poeta é
pois um fingidor, que escreve uma emoção fingida
, pensada, por isso fruto da razão e da imaginação, e não a
emoção sentida pelo coração, que apenas chega ao poema
transfigurada, na tal emoção trabalhada
poeticamente, imaginada.
Fingimento
Artístico portanto, que
É
teoria que diz
a
aquilo que se
escreve não é o
que se sente mas o
que se pensa que
se sente, logo, não
se sente, só se
pensa.
‘Autopsicografia’ ‘Isto’
*Explicita a condição do
poeta, ‘ o poeta é um *Clarificação do verdadeiro
fingidor’; sentido do fingimento :
*Subordinação dos ‘’sinto com a imaginação ‘’ ;
sentimentos à * A criação poética implica
razão, imprescindível no ato a conceção de novas
poético , conduz ao relações distanciando-se do
movimento cíclico da arte : real, o que se pode entender
Sentir , Pensar , Criar.
como fingimento artístico
‘’Não: não digas nada! Começa com um apelo. O
Ao longo do Supor o que dirá silêncio é o nada, mas é também
poema a A tua boca velada - de certa forma - o tudo que
mensagem não foi ainda dito: é uma forma
parece ser
É ouvi-lo já de realidade perfeita
dirigida a um
interlocutor : É ouvi-lo melhor •Fuga da realidade concreta
Ofélia , a amada Do que o dirias. •Dicotomia sentir/pensar
do poeta •As palavras não exprimem o
O que és não vem à flor
seu verdadeiro interior
Das frases e dos dias.
Dicotomia sentir
/pensar : a pureza
dos sentimentos
És melhor do que tu.
sobrepõem-se ao Não digas nada: sê! O sujeito lírico concebe a
exterior que Graça do corpo nu ideia da sua "amante ideal“
exprime a fraca que é melhor do que ela
Que invisível se vê.’’ alguma vez poderá ser.
intelectualização dos
sentimentos
Dor de Pensar
Dotado de uma lucidez anormal, Pessoa, buscou
avidamente a felicidade contudo nunca a conseguiu
encontrar. ‘’ Porque cedo o torturou a fome
inextinguível de conhecer; a inteligência discursiva só
lhe deu a certeza de que <<tudo é oculto >>’’ – ou seja
ultrapassa os limites inteligíveis do Homem. Esta
consciência perturbava-o .
E ávido por alcançar a felicidade e a leveza de espirito
tentava permanecer ao nível do sensível e encontrar
um ponto de equilíbrio entre
consciência/inconsciência, uma vez que o próprio
pensamento corrompe a inconsciência, inerente
à felicidade de viver.
Vive num constante
sofrimento, causado pela
• a racionalização em excesso
vastidão dos seus pensamentos
• lucidez
, e por uma consciência activa
‘’Tenho tanto sentimento Inicialmente, o sujeito poético apresenta-se
Que é frequente persuadir-me como um ser emocional, contudo numa
De que sou sentimental, análise mais profunda revela-se um ser
Mas reconheço, ao medir-me, racionalista , tendo por vezes a ilusão que é
Que tudo isso é pensamento,
Que não senti afinal. sentimental .
Temos, todos que vivemos, A oposição sentir/pensar , opera-se nos pares:
Uma vida que é vivida vida vivida/vida pensada ; vida verdadeira/vida
E outra vida que é pensada, errada : entre o que ele desejaria que fosse a sua
E a única vida que temos vida e o que a sua vida é realmente. Ele chega à
É essa que é dividida conclusão que a "vida que temos" está dividida
Entre a verdadeira e a errada.
entre esses dois polos, sem nunca ser perfeita
Qual porém é a verdadeira como desejamos que seja.
E qual errada, ninguém
Nos saberá explicar;
E vivemos de maneira Impossibilidade de discernir qual a vida certa da
Que a vida que a gente tem errada. No ultimo verso esta patente a
É a que tem que pensar. ’’ subordinação dos sentimentos à razão/pensamento.
Não sei ser triste a valer •Incapacidade de ‘’ser’’
Nem ser alegre deveras. •Consciência/ inconsciência dos
Acreditem: não sei ser. outros , e a falsidade associada a
Serão as almas sinceras isso
Assim também, sem saber?
Ah, ante a ficção da alma SENTIR PENSAR
E a mentira da emoção,
Com que prazer me dá calma
Ver uma flor sem razão •O homem sente e pensa mas nele a razão e a
Florir sem ter coração! emoção são mentira, pois não se podem conjugar
Mas enfim não há diferença. •Por seu lado, a flor, nem sente nem pensa e, no
Se a flor flore sem querer, entanto, desabrocha sem precisar de razão e de
Sem querer a gente pensa. coração. Para a flor, florescer é um acto
O que nela é florescer involuntário, tal como é um acto involuntário para o
Em nós é ter consciência. homem pensar.
Depois, a nós como a ela,
Quando o Fado a faz passar, Procura sugerir que, enquanto a morte não
Surgem as patas dos deuses chega, devemos aproveitar cada momento
E ambos nos vêm calcar. da vida, seja florindo inconscientemente
'Stá bem, enquanto não vêm como uma flor, seja pensando, como é
Vamos florir ou pensar. inevitável no homem.
• A ceifeira canta alegre, nas suas lides, e inconsciente da sua dura condição de
vida
• O sujeito poético anseia pela sua paz, e pede aos elementos impulsionadores da
‘’Ela canta serenidade espiritual : o céu, a canção, e o campo que o ajudem e transportem à
paz . Isto durante um processo consciente
pobre ceifeira’’
• Frustração em relação ao passado (os sonhos não se
concretizaram), incapacidade de viver de acordo com o momento – só
posteriormente se apercebe que esse momento não foi verdadeiramente vivido
(não se sente feliz, realizado em nenhum
‘’No entardecer momento), tristeza, angústia, solidão.
da Terra’’
• A "aldeia" surge como espaço de intimidade, metáfora da interioridade
do poeta.
• Sino é símbolo da passagem do tempo (doloroso),
• Pouca expectativa em relação ao futuro; inconformismo, procura
‘’Ó sino da constante do eu; tempo dividido em fragmentos); solidão
minha aldeia’’ ansiedade, nostalgia da infância.