Este documento discute a importância da cultura popular e como ela é desenvolvida por pessoas comuns sem apoio dos poderes públicos. A autora reflete sobre como manifestações culturais como o Terno de Reis em Santo Antonio de Jesus precisam se manter sozinhas financeiramente, sem estímulo do governo local.
Atividades propostas - Projeto gêneros textuais na EJA
Revista Outras Farpas [segunda edição]segunda edição
1. R G T W B K P F S Ç P F Z A Q
Ô I T G H B S A A E D H B N M
I P O L K A L E M S X T E E A
A Z M I Y E E D J H S A A N W
Ç Ç J H Q A O U T R A S M A K
B A W G H H P Z Q Q E S T I K
U E C B L D O A K G Z T I B W
B B U W E D A S K F A R P A S
N L O I T E W A S D N A A F F
A S D F G Ç L K J H A B N E A
T Y U I D W B D K J A A S W Q
J K H F R U N H G D I A C U I
H J K K Y U I B N M K A S W X
B G T I A N E A E W A Z C B D
G H J E W Q S K G D R J Z V M
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H Y N M J U I K L Ç P A E C S
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I K M O L P U H B G R E S A Z
R E D C V F Y U I K J M L O P
Ç E S Z F R T R F V B H Y U J
M K A W R A C T O N Z C R T A
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P Ç O T G F R E L E E E A S K
B G R Y U U I O E A A D Q W A
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R A A E V F J K L O I O P W Y
R W D F G T B H J I I S O P S
E Z V B A N D R E A D A S A C
L H Y U W S A Q E S C C N H Y
U J K I E W S C F G T U Z A E
D V G J K O P Ç D X A L W Z Z
ANO I - Edição II
2. MODÉSTIA
Por Lucas Borges Santos
Não importa onde eu for
Leitor de bom senso, aqui vamos nós. Receba a segunda Sempre terei:
edição do Outras Farpas, feita com o mesmo carinho da anterior, ao Um pé no borralho
tempo em que agradecemos pela receptividade, elogios e também A coragem suburbana
pelas críticas realizadas. A força sertaneja
A pecha soteropolitana
Acredite que se constituiu num enorme prazer, para todos
E o chão...
nós, ter prestado nossa pequena contribuição para o sucesso da
Pra pisar ou cair
noite de 24 de julho de 2008, quando foram dadas as boas vindas
Cravar os pés ou sair...
Á francesa
aos calouros de 2008.1 do Campus V da UNEB.
Estrear à Bahia,
E como vovó já dizia:
Nesta edição, pegaremos carona na Pré-Jornada de Cinema
...Esqueci.
da Bahia na UNEB, que acontecerá dos dias 02 a 04 de setembro no
Até volto atrás
Auditório Milton Santos, Campus V.
Mas não me arrependo
Às vezes nem entendo...
Agradecemos também a todas as pessoas que, mesmo de
A mim,
longe, nos incentivaram na realização deste trabalho, aos nossos
Quem dera os outros tivessem
colaboradores, sejam os que sempre estiveram conosco, sejam os
O privilegio de ver
que estão chegando agora, como o Lucas Borges Santos, cidadão
Como eu vejo o mundo
soteropolitano, formado em História pela Universidade Federal da
Sem ângulos retos,
Bahia e que atualmente batalha o pão de cada dia láááá em
Gostosamente obtuso,
Correntina. Muito obrigado pelo poema, este que segue transcrito Indigestamente denso,
aqui ao lado. Ridiculamente simples,
Complicados são os eus que o povoam
E é agradecendo que fechamos esta edição, ansiosos, felizes e E os tús que o comentam
inspirados por estas maravilhosas musiquinhas que fazem das Em meias verdades
campanhas eleitorais este espetáculo tão............típico. Pra fones de ouvido e tvs
Sem tecla sap
Continuemos dialogando, todos temos a ganhar com isso. E enquanto ouvidos moucos dormem,
Brados ecoam dos sonâmbulos,
De Valença para Santo Antonio de Jesus, 30 de agosto de Eu sigo fielmente minha rota...
2008. Acordado.
Manoel “Durrel” das Neves.
Equipe Outras Farpas:
Acton Lôbo, Colaboraram com esta edição:
Jean Michel,
Leandro Bulhões (Leo Pó); Rosana “Zana” Mercês;
Manoel “Durrel” das Neves; Rosangela “Rô” dos Reis Mercês Santos;
Kelma Costa;
Franco Oliveira;
Hilda Vasconcelos;
E-mail: outrasfarpas@gmail.com Cristiane Puridade;
Lucas Santos;
Diacui Pataxo;
Fabiane Andrade;
Andrea Barreto.
3. “Vota Brasil, o futuro de sua cidade é o seu futuro.”
Por Acton Lobo importante missão. Utilizando-se de oportunistas e sanguessugas ávidos
toda a sua engenhosa e espetacular pelo poder? É essa a grande questão
Olá ilustres leitores! Aproveitando máquina midiática; elas, como num que me faz queimar os neurônios.
o momento de efervescência que vive o passe de mágica, transformam
nosso país por conta das eleições qualquer “Zé Ninguém” em um grande Mas não se desespere querido
municipais, nada mais justo do que se político. Ou seja, em um grande Zé leitor-eleitor com esta minha reflexão,
fazer um comentário sobre o nosso exerça o seu direito: Vote! vote em
Ninguém. Utilizando-se de fantásticos
“democrático” e “evoluído” processo efeitos especiais oriundos quem quiser! No momento do voto,
de
eleitoral. Este que a cada quatro anos, programas como Photoshop ou do cara a cara com a urna, talvez você se
nos obriga a exercer o direito de votar. Corel Draw, elas editam as imagens;lembre das cômicas propagandas do TSE
(Parece incoerente, não é? Mas, essa é a escondendo as rugas, as olheiras, aque diz: “O futuro de sua cidade está
“democracia” brasileira e agradeça aos em suas mãos”. Se a escolha que fizer
arrogância, a corrupção, a sede pelo
Céus por ela). será boa ou ruim, somente depois de
poder, o sorriso sem graça e tudo mais
que possa comprometer a possível quatro anos você saberá. Uma única
A lista de candidatos é quase vitória de seu candidato-cliente. coisa é certeza: não importa o seu sexo,
interminável e têm opções para a sua cor, a sua religião, se-
todos os gostos e preferências: de xualidade, a quantidade de filhos
ladrão à pastor evangélico, de “Na contínua busca pelo voto, que você possui, no final, todos nós
dançarina de grupo de pagode à pagaremos essa onerosa e
garota de programa. Se você
as agências de publicidade dispendiosa conta.
procurar cuidadosamente pode ter exercem uma importante
certeza que irá encontrar um que te missão.[...]transformam Por fim, independentemente de
agrade. todas as incoerências existentes em
qualquer “Zé Ninguém” em um nosso regime, jamais devemos
Hoje já não interessa mais se o grande político. Ou seja, em deixar de agradecer e homenagear
candidato tem uma proposta ou no àqueles que lutaram e morreram
mínimo uma idéia coerente. um grande Zé Ninguém.” pela nossa tão almejada e às duras
Sabiamente, alguém encontrou o penas conquistada, Democracia
“mapa da mina” e espalhou para Brasileira. A grande decepção,
todos que esse é o melhor caminho para Maquiam-se sem pudor os porém, foi no que ela se resumiu ao
faturar uma grana em cima do nosso defeitos, as burrices e as falcatruas, longo do tempo e a forma nas quais
miserável povo brasileiro. transformando o mais vil e torpe podemos exercê-la: Pelo voto
candidato na criatura mais singela, obrigatório e atualmente através do
Para que os planos desses pseudo- pueril e bondosa que possa existir na Código de Defesa do Consumidor.
representantes se concretizem, eles não face da Terra. Ao povo, sobra-lhe a
poupam esforços nem recursos, fazendo difícil e arriscada incumbência: Votar
qualquer coisa para conquistar a naquele candidato bonitinho,
simpatia e o sorriso “banguela” do sorridente e que dá tudo em troca de ____________________
pobre eleitor brasileiro. O bombardeio um voto. Se você pedir com “jeitinho”, *Acton Lobo é licenciado em geografia
vem de todos os lados. Desde os eles te darão até o orifício anal pelo seu pela Universidade do Estado da Bahia
insuportáveis carros de som com voto. UNEB Campus V. Atualmente reside em
aquelas musiquinhas plagiadas, Salvador.
extremamente toscas, irritantes e Generalizações e sarcasmos à E-mail: actonlobo@hotmail.com
insuportáveis que entram pelos nossos parte caro leitor, creio veemen-
ouvidos, corroendo lentamente nossos temente que ainda existam candidatos
cérebros, até os insuportáveis e sérios, comprometidas e com um
desnecessários programas eleitorais. projeto político consistente. A pergunta
Afinal, quem hoje em dia tem paciência que faço para você é a seguinte: Onde
para assisti-los? devemos procurá-los em meio ao
mercado a céu aberto em que se
Na contínua busca pelo voto, as tornou a política partidária no Brasil?
agências de publicidade exercem uma Como identificá-los entre vermes
4. Cultura Popular?
Por Fabiane Andrade só foi possível pela labuta e coragem de pessoas como D.
Bernarda e Eliseu, que dedicavam tempo, seus recursos e, por
Há alguns anos, quando da minha graduação em que não dizer, suas vidas, a fim de colocar o Terno na rua.
história, discutíamos muito, sobre uma chamada cultura Perdoem-me, mas não posso deixar passar em branco
popular que se desenvolve, muitas vezes, sem que os poderes esta oportunidade, embora muito se fale em cultura, na nossa
públicos estabelecidos tenham interesse em sua manutenção cidade, há muito tempo, esta anda esquecida. Meus
ou mesmo em sua existência. Desabrocha nos becos e nas narradores sempre me chamavam atenção para o fato de que
entranhas de vivências coletivas, através do partilhar de um durante quase toda a sua existência, o Terno de Reis era
cotidiano que conduz a experiências que só têm sentido “recursos próprios”, sabe o que isso significa? Que em Santo
dentro da localidade. Nessa teia de significados e relações Antonio de Jesus a cultura popular precisa se manter
emergem manifestações, modos de vida, visões de mundo economicamente sozinha, pois não há estimulo, auxílio,
que constituem essa tal cultura popular. interesse. As manifestações culturais, que ora são
Ao mesmo tempo em que me encantava com as desenvolvidas por populares que precisam gastar parte de
discussões de grandes pesquisadores que analisavam a seus míseros salários para comprar adereços e compor
cultura popular européia, emergiam questões: e a nossa fantasias, não são lembradas pela política local. Entristece-nos
cultura, quem a estuda? Quem a conhece? Quem a vive? saber que muitas festas, celebrações, rituais estão “sumindo”
Estas inquietações me atormentaram por algum tempo, por falta de apoio público, ou mesmo de espectadores
até que a angústia cedeu espaço para o prazer da prática da interessados.
pesquisa. Sair às ruas, olhar a cidade, buscar a cultura Os desfiles do Humildes em Alegrias terminaram em
popular... e foi no contato com o Humildes em Alegrias, um 1992 quando D. Bernarda veio a falecer. Os moradores da
Terno de Reis do bairro Andaiá em Santo Antonio de Jesus, localidade lamentam a falta de um divertimento saudável e
que muitas das minhas inquietações teóricas ganharam educativo, propiciador da construção de uma juventude que
contornos práticos. desenvolva maiores vínculos com identidades locais. E fico eu
Nas idas ao bairro tive contato não com a festa de Reis, a pensar o que nos cabe fazer? Enquanto historiadora tenho
que não mais existe, mas com as lembranças acerca desta. E me dedicado a tentar manter “viva” as memórias da festa.
nas conversas com os sujeitos humildes, mas tão sabedores, Aos poderes públicos, seria interessante se tivessem interesse
que ora fizeram parte deste grupo, tenho construído minhas em dar incentivos para a cultura do povo. A você caro leitor,
impressões sobre a cultura popular, agora sob outros olhares. espero que, na medida de suas possibilidades, algo também
A festa, a qual me refiro, se desenvolveu a partir de um seja feito para que a cultura popular de Santo Antonio de
sonho, acreditem, de uma senhora chamada D. Bernarda Jesus não se reduza a uma memória saudosista.
(conhecida pelos íntimos de minha pesquisa como “Dona B.”). _____________________
Ela sonhou com uma determinada representação religiosa e, Fabiane da Silva Andrade Graduada em História,
crendo nesta, passou a sentir-se na obrigação de realizar uma especialização em História Regional e Local pela Universidade
festa de Reis na localidade. O que era pra ser um desfile de do Estado da Bahia UNEB, e Mestranda em Cultura, Memória
senhoras tornou-se uma das vivências centrais da Rua da e Desenlvovimento Regional pela UNEB.
Alegria, integrando os moradores através do partilhar de E-mail: fabhist@hotmail.com
lazer, diversão e fé. A manutenção do Terno, durante 24 anos,
Palavras soltas.
Eu nunca sento num banco pra altivos, tornam-se então cansados e se
Por Hilda Vasconcelos
tem como inocente utopia cobrir toda a
descansar. Sento pra ver a vida que fecham a fim de se protegerem da cruel humanidade que sente frio, mesmo sob
anda, a que pára e a que só vive. Sento superficialidade que corre solta ao um sol sertanejo...
pra ficar cansado e só por isso ter redor dos bancos onde sento pra ficar
coragem de levantar. Há coisas mara- cansado. Toda esta dinâmica vital deve- Tudo isso num banco, onde vidas
vilhosas aos meus sentidos que só se ao meu elo com os bancos, lugares estão registradas, seja por terem tocado
percebo quando estou num banco, onde me sinto mais homem e menos sua madeira, sejam por simplesmente
sentado com minha estúpida e inútil gente, onde escuto palavras soltas e passar por elas. O banco é, enfim, um
solidão, mas que por pura teimosia e construo um poema universal, lugares mundo de almas presas, ao qual me
vaidade insisto em carregar. Mas onde vejo arco-íris no sol sertanejo. É junto todas as manhãs ao sentar-me, só
também há certos dias, em certos um exercício de rasgar, cortar, pra ficar cansado...
bancos, que parece que só há espaço remendar e costurar as percepções
pro vazio. Meus olhos, sempre muito como numa colcha de retalhos, que
5. A ROTINA Por Manoel das Neves
o único espectador além dela, olhava descaradamente
Ocorreu hoje de manhã, num dia que começou para os dois, fixando um pouco de minha atenção nas
comum, dentro da mais angustiante normalidade. reações da moça. Me perdi um pouco naqueles cabelos,
Acordei, me espreguicei, reprogramei o despertador e passando a vista nos seios e quadris. Quando voltei
voltei a dormir um pouco mais. Acordei novamente, novamente à visão de seu rosto, a repentina expressão
me espreguicei, praguejei contra o mundo e a de pavor que ali se fez também me apavorou.
necessidade de trabalhar e então me levantei. Banho, Olhei imediatamente para a janela do ônibus, e
roupas, perfumes, etc. Saí de casa pontualmente as naquele quadrado mágico, onde há pouco tinha visto
6:45, como de costume, caminhando apressado, com uma demonstração profundamente meiga do
expressão séria, em direção ao terminal rodoviário, a fim de pegar sentimento amor, agora, como se alguém de posse do controle
meu ônibus para Nazaré, onde trabalho. remoto tivesse mudado o canal, vi um homem com gestos
Enquanto o ônibus não chegava, sentei na mesma cadeira de desesperados, insanos, de pé sobre a poltrona, abaixar as calças e
todos os dias, aquela que não fica exatamente de frente para a TV, exibir um membro rijo e abjeto, sacudindo-o de forma alucinada,
permitindo uma visão mais ampla do terminal. Como também é de esfregando-o no vidro, fazendo insinuações. Dentro do veículo deu-
costume, o meu ônibus é o mais atrasado dentre todos do horário e se início a uma comoção generalizada. Pessoas descendo
as pessoas que haviam sentado próximo a mim já estavam se desesperadas, tropeçando umas nas outras e sendo brutalmente
dirigindo às suas respectivas plataformas a fim de procederem seus pisoteadas pelas que vinham atrás, outras pulando a janela e se
embarques. O ônibus da linha Bom Despacho- Camamú foi o estatelando, outros, mais valentes, buscando conter a fúria do
primeiro a partir. Em seguida o da linha Camamú- Feira de Santana amante insano. A platéia aumentava, as mulheres gritavam, as
ligou seus motores em sinal de partida, momento em que os crianças choravam, dois policiais chegaram e depois de muito
passageiros engrossaram a fila para entrar no veículo e foi quando rebuliço, de mais gente caindo desesperada, finalmente o maluco
meu ônibus finalmente se apresentou. foi retirado do ônibus aos gritos.
Levantei e fui caminhando devagar em direção à plataforma, Paralisado de êxtase, fui trazido de volta à realidade pelo
não esquecendo de desejar bom dia para o moço que recolhe os buzinar do meu ônibus que já se preparava pra sair. O motorista
comprovantes da tarifas de embarque. A rotina fez crescer em nós estava mal humorado e não achou muita graça no espetáculo. Olhei
um sentimento de amizade, nos cumprimentamos com sorrisos ao meu redor e não vi mais a moça.
bastante espontâneos. Entrei no carro e lancei um olhar na poltrona 22, corredor, a
Desci a plataforma e enquanto procurava meu lugar na fila que mais gosto de me sentar. Ao me aproximar, para minha
para entrar no carro, uma cena bastante romântica atraiu minha surpresa, encontrei a pobre donzela sentada na 21, com a cabeça
atenção: Um jovem, dentro do ônibus para Feira de Santana baixa. Supus que os gritos do maluco estavam ecoando em sua
sinalizava (a janela estava fechada) em direção a uma mulher que mente e me deixei sensibilizar com a trágica forma pela qual havia
estava parada do lado de fora com ares de perdida. Não resisti ao terminado a breve história de amor vivida por aquela jovem logo de
meu instinto de ajudar o mundo e toquei nos ombros dela, manhã cedo.
apontando em seguida para a janela onde o rapaz gesticulava por Sentei ao seu lado e tive medo até de respirar. O ônibus já
um pouco de atenção. estava em movimento quando ela finalmente se ergueu, e ao me
A jovem sorriu desconcertada quando o rapaz assoprou o reconhecer, acho que não se sentiu muito à vontade. Olhou para
vidro da janela, criando um círculo embaçado, e dentro desse mim com a expressão fria, de quem não ia esperar mais nada de
círculo, com os dois dedos indicadores, desenhou um coração. Seu ninguém durante um bom tempo. Aquele olhar me fuzilou e tímido
sorriso, cada vez menos discreto, quase enrubescido, despertou no que sou, passei o resto da viagem tentando montar a frase ideal
rapaz (e transmitiu a mim) uma sensação de correspondência com a qual quebraria aquele gelo e iniciaria uma maldita conversa.
sentimental. Constatei que eram namorados e aquela despedida, Pena que Nazaré chegou para mim antes que eu pudesse exercer a
tão romântica, conseguia estabelecer um parêntese na rotina da minha capacidade de sedução, e ao alcançar meu destino
minha vida, despertando em mim calores invejosos. tristemente constatei que o maluco era muito melhor conquistador
Minha fila finalmente começou a andar (o motorista queria do que eu. Mas isso não era novidade, eu já me conhecia, e a
tirar o atraso) e a jovem se moveu em direção ao mesmo ônibus ciência desse meu jeito foi o primeiro indício de que aquela quebra
que eu, e foi aí que algumas coisas começaram a encontrar novos de protocolo já havia se dissipado e a (agora) boa e velha rotina se
sentidos e aquele momento se tornou uma situação ao menos fazia presente.
curiosa. O rapaz, em estado um tanto quanto excitado, ao perceber Levantei e não tive sequer coragem de olhar para ela. Desci
que a moça ameaçava se retirar, arriscou o seu amor em gestos do ônibus e cumprimentei o vendedor ambulante, que também
instáveis, e talvez sem pensar, não sei ao certo, colocou a língua havia se tornado meu amigo. Durante o resto do dia, tudo
para fora e começou a lamber o vidro de forma lasciva. A moça aconteceu na mais perfeita normalidade, como há de ocorrer
parou e durante aquele tempo manteve seus olhos fixos na janela. amanhã e sempre.
Já não sorria e sua expressão era assustada. ____________________
O espetáculo continuou e era como se ele estivesse sugando * Manoel das Neves - Durrel.
a própria vagina da mulher, a ponto de, se minha razão não tivesse Graduando do Curso de Direito da Universidade do Estado da Bahia
me reiterado a certeza de que se tratava apenas de um vidro sujo, - UNEB Campus XV Valença-BA.
poder se deduzir que ele conseguia mesmo sentir o gosto daquele E-mail: manoelsaj@hotmail.com
outro ser. A esta altura eu não tinha mais discrição e, talvez sendo
6. O Édipo de Dan Futterman
Por Kelma Costa
Herdamos dos gregos o gosto por tragédias. Foi para satisfazer este tipo
de necessidade do público que, em 1959, Truman Capote deixou a
movimentada Nova York e partiu para Holcomb, pequena cidade no interior do
Kansas. Lá, toda uma família havia sido brutalmente assassinada. A idéia
primeira era fazer uma matéria sobre o acontecido, contudo, a aproximação de
Capote com os fatos o fez perceber que era oportuno escrever um livro. É assim
que surge “A sangue frio”, sua obra de maior sucesso.
O filme Capote revela como Truman produziu o que ele próprio
denominou de primeiro romance de não-ficção, o que é contestável, pois obras
anteriores já faziam uso de um novo gênero jornalístico denominado de
Jornalismo Literário. Este tinha como uma das principais características a
abolição de alguns pressupostos positivistas, sobretudo o que defendia a
objetividade. Truman, na verdade, foi mais um difusor desta tradição.
No Kansas e já interessado na composição da obra, Truman,
acompanhado da amiga e escritora Nelle Harper Lee (Catherine Keener), realiza
uma rigorosa apuração dos fatos referentes ao crime da família Clutter. Teve
contatos com relatos orais e também com documentos oficiais, inserindo-se no
cotidiano das investigações. Quando os assassinos são aprisionados, Truman
também tem acesso a eles. O livro demorou cinco anos para ser lançado. Ele é
concluído apenas quando os assassinos Perry Smith (Clifton Collins Jr) e Dick
Título Original:Capote
Hickock (Marx Pellegrino) sofrem a pena capital na forca.
Gênero:Drama
O longa de 98 minutos, com direção de Bennett Miller e roteiro de Dan Tempo de Duração: 98 minutos
Futterman deu a Philip Seymour Hoffman (Perfume de mulher) o Oscar de Ano de Lançamento (EUA): 2005
melhor ator. Hoffman representa Truman atendendo a toda a excentricidade Direção:Bennett Miller
peculiar a um dos maiores jornalistas dos Estados Unidos: o ator adota trejeitos Roteiro: Dan Futterman
afetados e voz macia que causam estranheza a quem já viu outras
interpretações suas. Elenco
Com uma dinâmica antagônica ao estereótipo hollywoodiano, já que nele Philip Seymour Hoffman (Truman Capote)
Catherine Keener (Harper Lee)
não aparece nenhum carro em chamas, tampouco um avião dominado por
Clifton Collins Jr. (Perry Smith)
terroristas, Capote está mais para o cinema europeu. O clima bucólico é Chris Cooper (Alvin Dewey)
resultado da predominância da fotografia interiorana, na tentativa de revelar a Bruce Greenwood (Jack Dunphy)
estadia de Truman em Holcomb. A atmosfera de tensão, pertinente para a sua
composição, é garantida pela ausência de trilha sonora. O filme explora cenas Mais informações:
paradas e assegura a oposição entre grandes centros e pequenas localidades. www.adorocinema.com/filmes/capote/capote
Truman Capote, no entanto, não é representado como um sacerdote que,
abandonando a vida novaiorquina degreda-se no marasmo do Kansas para dar
conta dos acontecimentos que desnortearam a vida social e questionaram a
condição humana. Ao contrário, na composição de sua obra, ele, por vezes, fez
usos de métodos questionáveis.
O filme mostra como aproximação dos fatos e dos assassinos, em
especial, Perry Smith, foi o fator diferencial do livro A sangue frio. Trumam, que
chegou a assistir, ainda que relutante, a execução dos condenados, buscou ____________________
humanizar os assassinos, mostrar que Perry, o Minoutauro, o mostro, também Kelma Costa é formada em História pela
tinha uma parte humana. A Sangue Frio foi a última obra desse notável autor, e, Universidade do Estado da Bahia e
especula-se que, este perdera-se no labirinto da obra que ele mesmo criara. graduanda do Curso de Comunicação da
Truman Capote findou como Édipo. Não conseguiu conviver com o seu passado. Universidade Federal do Rocôncavo Baiano -
UFRB - Cachoeira.
A dúvida inexiste: Capote daria platéia entre os Helenos. E-mail: kelmacs@hotmail.com
7. AOS DOUTORES DA ACADEMIA
submeti a tal, expondo-me ao ridículo, “persona pós-moderna”, o novo, o
Por Diacui Pataxó colocando-me a mercê de pobres futuro, mas vossa mente sustenta-se no
diabos ignorantes como vós, todos que atraso, na tradição, no preconceito e na
Estou farta desses se julgam “sábios” e “doutores”, discriminação... bobos da corte,
intelectualóides titulados e tutelados porque outros, tanto quanto (parvos), marionetes, fantoches macabros,
que permitem a privatização estatal de assinou-vos um pedaço de papel, assim dançais dentro de sedas e ternos caros
sua vidas e querem exigir o mesmo de testemunhando, após haver escrito o ritmo lúgubre da morte dos excluídos.
mim. Cansada de suas hipocrisias, páginas e páginas sobre o que os outros Sois cúmplices dos encapuzados, dos
mediocridades e suas bobagens disseram, fizeram e pensaram! endinheirados, dos capa preta, dos
livrescas e enciclopédicas. Enojada de Pensais ser grandes! Desiludi-vos mandantes, dos coronéis, dos
suas exigências minuciosas que não de vossa grandeza, despi-vos de vossa assassinos de colarinho branco, dos
levam ninguém (a não ser eles mesmos) megalomania pseudo-sábios. Sois pó, carrascos sangrentos do analfabetismo,
a lugar nenhum, mas podem tirar muita lama, como todos nós, outros mortais! da fome e da doença... até em vossos
gente do caminho. Enjoada de suas Acaso ides ao banheiro? Excretais ou livros os bajulais e isto é fácil de provar!
caras bobas, de onde me não? Necessitais Quereis representar a
fitam olhos de desprezo, banhar-se ou não modernidade, mas viveis fechados em
desprezíveis. Realmente, “Desiludi-vos de fedeis nunca? E vossos próprios feudos (alguns
assumo, eu não sei filosofar, drogas? Usai-as conformando-se com pequenas baias
eu não decorei vossos livros,
vossa grandeza, às escondidas brancas, cheias de computadores e
vossas coleções, vossos despi-vos de dentro de vossos bugigangas dentro)! O inusitado, mas
sábios de gabinete. Sócrates feudos para que a não passais de repetição. Quereis
não leu ninguém nem vossa Academia não representar a vanguarda intelectual,
escreveu nada! Eu não sei saiba que sois mas sois racistas, tolos, rasos e
vossa filosofia, eu não sei
megalomania drogados, atrasados! Fazeis o discurso da
filosofar! pseudo-sábios. hipócritas? democracia e da igualdade, mas sois
Muitos de vós, a Fazeis troça tiranos nojentos, ditadores pusilânimes,
maioria mesmo, sabeis Sois pó, lama, de quem não capazes sabe-se lá de quê para
apenas repetir o que como todos nós, conheceis, conquistar vossos objetivos.
houvestes lido e, juntando Sentindo-vos Representais o passado! Subliminar à
pedaços e recortes de um e outros mortais! ” donos da situação vossa bandeira branca da paz pode-se
outro forjais o que chamais ousais humilhar ver as fileiras disciplinadas, carregando
vosso próprio pensamento, vossa os pequenos, mas só a vós mesmos a suástica de Hitler, as traições de
própria filosofia. tendes diminuído quando tentais Stálin, os assassinatos cometidos por
“Eu tenho a minha loucura, desmerecer a outrem.. Ouvi e entendei Pinochet, Mussolini, Vargas e tantos
levanto-a como um facho a arder na , sepulcros caiados, a farsa que outros ditadores de carteirinha pelo
noite escura... não me peça representais já está desnuda na própria mundo afora que se locupletaram do
definições... não me diga: vem por filosofia. Não calareis nunca o meu, o poder público para enriquecer suas
aqui..só vou por onde me guiam meus nosso grito que, como as lições de próprias contas bancárias e perseguir
próprios passos...” “Olhai os lírios do Sócrates, continuará ecoando em aqueles que pensam diferente dos seus
campo...” e poderia deter-me aqui em outras bocas, como as bombas de instintos genocidas, etnocidas,
muitas poesias - lêde poesia ou só Bakunin continuará explodindo em homofóbicos, fratricidas, elitistas,
filosofia? a explicar-vos vossa soberba outras praças; como os tiros das armas desumanos!
e ignomínia, vossa fraqueza e de todos os revolucionários mortos em “Viva o país do bandido, salve
mediocridade; vossa vida e insanidade, combate e continuará alvejando outros pátria do jaguar!”
assim, recitando versos... mercenários como vós, séculos após ____________________
Deixaste-vos carimbar, rotular, séculos, milênios... a denunciar vossa Diacui Pataxó
registrar, vendeste-vos! Paciência! No pusilanimidade e os interesses escusos Professora de Filosofia, Arte, Religião e
mundo das aparências em que viveis, que motivam suas ações. História, especialista em Política
pensando estar no das idéias, não sou Usais brincos na orelha, andais Educacional e vive em Ilhéus.
nada e até para ser mais uma sombra com ginga, tendes tatuagem nos pés e diacui_pataxo@hotmail.com
necessito de vossa aprovação, de vossa
avaliação. Mais medíocre eu, que me nas mãos para com tudo isso compor a
8. REENCONTRO Por Leandro Bulhões
havia decidido voltar sozinha. derramados no banheiro. Afinal, quanto
Girava a penca de chaves como tempo é necessário para que a matéria
num comportamento obsessivo, minúscula deixe de existir no mundo, no
havia caído duas vezes ao chão. As mundo de seu quarto?
casas que ficavam bem ao lado do Com a mão no queixo, sentiu um
passeio ouviam seus passos forte cheiro de suor de pé. Não resistiu,
rápidos, ajeitava os cabelos num aproximou as narinas e encheu os pulmões.
entrelaçar que se desfazia ao Criou uma expectativa para tirar o pé
tombo de seu caminhar. E se esquerdo. O sapato não era dos melhores
estivesse ocorrendo um estupro, pra ocasião, aquele era um modesto sapato
uma violência criminal bem ao sandália, havia umas ventilações que fazem
lado de sua casa e nesse exato perder a essência do guardado odor
instante? De onde vinha esse produzido paulatinamente pelo seu próprio
desejo, essa vontade, prazer e corpo. Meu próprio corpo, pensava.
necessidade pelo trivial Passou a mão direita na axila
espetáculo? Por que essa sede esquerda por debaixo da blusa amarela e
copiosa de novidade? sabia que ali, naquele santuário seu que
Pensava que o curso exalava ela, estaria uma produção que
natural das coisas era o pior lugar, merecia respeito. Assim, se criou em ouro e
mas era ali que ela concentrava prazeres, ora cheirando uma mão, ora
parte de seus esforços diários, no outra. Parecia bom e deitou-se. Assoprava
empenho de manter toda aquela seu cheiro agora e sabia que aquilo que é
ordem, aquele previsto cotidiano. indestrutível e não tem pra onde ir que são
Ao chegar finalmente em os cheiros, flutua no mundo por anos. Que
casa, alguns metros antes já coisa louca ficar assim, cheiro. E cheirando-
balbuciava algum som entendido se, foi envolvida por um sono profundo.
por seu cachorro, ele ia latir, mas Ainda havia porção de consciência
não latiu por que era ela e era quando se imaginou inserindo-se nas
assim que ela queria. Como se divertia com profundezas de si mesma. E envolta nessas
Mais uma vez. Tinha acabado de isso! Empurrou a porta sabendo que logo obscenidades existencialistas, foi convidada
decidir voltar pra casa e não sabia o que lhe depois de uma marca diagonal do assoalho ao universo fugidio do dormir. Suas células,
aguardava. Costumava acreditar que as a porta rangia, ela rangeu. Com que alegria enquanto isso, esperavam o inusitado.
coisas mais diferentes e absurdas do ela sorria à casa. Foi direto ao seu quarto, o Quando chegou um indivíduo à sua porta,
mundo poderiam lhe ocorrer a qualquer cachorro a seguiu, mas entendeu a hora de (havia um problema perto dali) ela não
momento e, por isso, religiosamente, todos parar porque ela não suportava a idéia de conseguiu acordar, sono pesado dizia sua
os dias, assistia a todos os telejornais e não ter pêlos voando hora ali outra aqui nos mãe. Naquela cena holística, pernas
perdia oportunidades de apreciar capas de cômodos simples de seu aposento que entreabertas, pés no chão, tronco caído na
matérias de jornais que espetacularizavam continuava à meia luz. cama, havia mundo e novidade, mas uma
constantemente os acontecimentos. Sofria O poste lá fora deixava entrar uma pena não saber ela. Ela havia reencontrado
por não sofrer; perdia sempre tudo aquilo fresta de luz pelos vidros da janela que e os sons na porta àquela altura da noite,
que podia ganhar nas marés de sortes de formava uma penumbra, uma massa que é noite perigosa, não a abalavam, até
comuns que relatavam experiências; seu amorfa e um clima denso naquele canto porque ela jamais iria abrir sua porta a um
útero secava por não poder parir exclusivo do quarto. É lá que ela tira seus possível estranho. Ao mesmo tempo, a
quadrigêmeos ou bebês em datas sapatos. Ao abaixar, embebeda-se com o ritmia dos sons na porta constituía o
comemorativas. Assim, o espaço cheiro de suas axilas. Como aquilo a baluarte melódico de seu sonho.
jornalístico que existia em sua vida era satisfaz! Ela ri, sabe que naquele lugar ____________________
repleto de êxtase, pavor, expectativa. ninguém poderá julgá-la em nada. Nada de Leandro Santos Bulhões de Jesus é
Lembrava que tinha olhado o gás ao comentários, estranhamentos, nada. Ela, o graduado em História e mestrando em
sair de casa, desligou-o; a janela quarto, a fresta e o mais absoluto nada. Cultura, memória e desenvolvimento
devidamente fechada; retirava todas as Lembrou que não sabia realmente onde regional - UNEB Campus V
tomadas dos eletrodomésticos, afinal, se a estava com a cabeça quando aceitou morar ____________________
tal coisa acontecesse, teria de vir por com Armando. Havia quase quatro meses Imagem:
intermédio maior de um ente maior, que ele deixou de morar na rua Olivença René Magritte- “Les Liaisons Dangereuses”.
exterior. E quando isso acontecesse algo Taquary, mas ela ainda sentia uma 1936
estaria dialogando com ela. Esse dia não presença morna como se seus pedaços de
chegava, mas ela estava chegando junto à vida deixados ali, suas células epiteliais,
porta. Chaves nas mãos desde quando cheiro nos lençóis, excrementos
9. Por Jean Michel
limpador de pára-brisas de carros estacionados, slogans
HIPERBÓREOS LEITORES!
escritos com letras gigantes nas paredes de playgrounds,
Apresento-os hoje um dos mais fantásticos
cartas anônimas enviadas a destinatários previamente
espécimes de uma das ilhas mais fabulosas que topei eleitos ou escolhidos ao acaso (fraude postal),
nessas minhas internéticas navegações. Como transmissões de rádio pirata, cimento fresco…
intempestivo pirata fujo às lânguidas e preguiçosas A reação do público ou o choque-estético produzido
tentações das rotas tradicionais, tão mais seguras quanto pelo TP tem que ser uma emoção pelo menos tão forte
menos enriquecedoras, das já deveras conhecidas - terras quanto o terror - profunda repugnância, tesão sexual,
“orkuticas” e “m-s-ênicas”. Transito em águas revoltosas, temor supersticioso, súbitas revelações intuitivas, angústia
ainda não mapeadas, nas quais o espírito humano é dadaísta - não importa se o TP é dirigido a apenas uma
moldado no medo do incerto e da tormenta, porém, a pessoa ou várias pessoas, se é “assinado” ou anônimo: se
recompensa para os mais bravos e determinados é a não mudar a vida de alguém (além da do artista), ele
falhou.
contemplação de maravilhas nunca dantes imaginadas
O TP é um ato num Teatro da Crueldade sem palco,
como essa especiaria que vos ofereço.
sem fileiras de poltronas, sem ingressos ou paredes. Para
Não vos importuno mais com imprecisas descrições que funcione, o TP deve afastar-se de forma categórica de
que em nada podem acrescentar a seus próprios sentidos, todas as estruturas tradicionais para o consumo de arte
que estes sejam os maiores motivadores a vossas próprias (galerias, publicações, mídia). Mesmo as táticas de
empreitadas em busca do novo, do desconhecido, pois guerrilha Situacionista do teatro de rua talvez tenham
então, vejam, bebam, apalpem, cheirem e escutem! agora se tornado muito conhecidas & previsíveis.
Uma requintada sedução levada adiante não apenas
TERRORISMO POÉTICO pela satisfação mútua, mas também como um ato
Hakim Bey consciente por uma vida deliberadamente mais bela - deve
Tradução de Jersson de Oliveira ser o TP definitivo. O Terrorista Poético comporta-se como
um trapaceiro barato cuja meta não é dinheiro, mas
DANÇAR BIZARRAMENTE A NOITE INTEIRA em caixas MUDANÇA.
eletrônicos de bancos. Apresentações pirotécnicas não Não faça TP para outros artistas, faça-o para pessoas
autorizadas. Land-art*, peças de argila que sugerem que não perceberão (pelo menos por alguns momentos)
estranhos artefatos alienígenas espalhados em parques que o que você fez é arte. Evite categorias artísticas
estaduais. Arrombe apartamentos, mas, em vez de roubar, reconhecíveis, evite a política, não fique por perto para
deixe objetos Poético-terroristas. Seqüestre alguém & o faça discutir, não seja sentimental; seja impiedoso, corra riscos,
feliz. Escolha alguém ao acaso & o convença de que é vandalize apenas o que precisa ser desfigurado, faça algo
herdeiro de uma enorme, inútil e impressionante fortuna - que as crianças lembrarão pelo resto da vida mas só seja
digamos, cinco mil quilômetros quadrados na Antártica, um espontâneo quando a Musa do TP o tenha possuído.
velho elefante de circo, um orfanato em Bombaim ou uma Fantasie-se. Deixe um nome falso. Seja lendário. O
coleção de manuscritos de alquimia. Mais tarde, essa pessoa melhor TP é contra a lei, mas não seja pego. Arte como
perceberá que por alguns momentos acreditou em algo crime; crime como arte.
extraordinário & talvez se sinta motivada a procurar um -------------------------------
modo mais interessante de existência. * Tipo de arte que usa a paisagem, normalmente natural,
Coloque placas de bronze comemorativas nos lugares como objeto artístico, sendo a própria natureza (e seus
(públicos ou privados) onde você teve uma revelação ou fenômenos, chuva, vento, etc.) elementos constitutivos da
viveu uma experiência sexual particularmente inesquecível obra.
etc. Disponível em:
Fique nu para simbolizar algo. www.rizoma.net/interna.php?id=62&secao=hierografia
Organize uma greve na escola ou trabalho em protesto ___________________
por eles não satisfazerem a sua necessidade de indolência & Jean Michel F. Santos é licenciado em história pela
beleza espiritual. Universidade do Estado da Bahia UNEB Campus V,
A arte do grafite emprestou alguma graça aos horríveis Mestrando em Cultura, Memória e Desenvolvimento
vagões de metrô & sóbrios monumentos públicos - a arte - TP Regional também pela UNEB Campus V e Graduando do
também pode ser criada para lugares públicos: poemas curso de direito da UNEB Campus XV. Atualmente reside
rabiscados nos lavabos dos tribunais, pequenos fetiches entre Valença e Santo Antonio de Jesus.
abandonados em parques & restaurantes, arte-xerox sob o
10. “Viver a sorte de um amor tranqüilo, com sabor de fruta mordida.”
Aí, me pego pensando sobre gênero. Numa primeiro parágrafo. Seja por conceitos morais enraizados em
sociedade machista, (sem querer ser clichê + sendo), onde um nós, pela necessidade do amor tranqüilo, por sexo
homem maduro, solteiro, letrado e com alguma monogâmico, ou pelo simples fato da obviedade da
independência financeira é o sonho de consumo de várias maturidade feminina (que é natural do gênero, enquanto os
mulheres na atual conjuntura (digamos assim)... É a homens se tornam adolescentes garanhões depois dos
verdadeira coca light do deserto, o último biscoito do pacote. quarenta). Não é isso?
Enfim, é o cara. Outro aspecto, (diálogo de três mulheres: Zana, eu e
Nós mulheres, como sempre, nas mesmas condições, Mila), as mulheres estão optando por outras mulheres, pois o
não temos tanta sorte. Eu me tomo como exemplo nessa mundo gay masculino cresce vertiginosamente, nascem mais
reflexão filosófica de quinta categoria. Vejam vocês leitores e mulheres que homens, muitos homens são fracos e
leitoras, as farpas as quais já me meti, inúmeras vezes, diga- insuportavelmente traumatizados com tudo, péssimos de
se de passagem. cama, sem falar nos broxas.
Visto o manequim do segundo parágrafo (... nas Segundo Camila: as mulheres se entendem, falta
mesmas condições...). Então. Vivendo nessa cidade homem no mercado, e destacando a verdadeira vaidade
interiorana, coberta de preconceitos e discriminações, saio feminina, elas se vestem para as outras, além disso, fazem
sempre com minhas irmãs e companheiras de luta para sexo muito bem. Zana deu sua contribuição dizendo que nós,
encontrar os amigos, pessoas as quais não conseguiria viver mulheres, já não precisamos dos homens como antigamente,
sem, pois deles me valho sempre que possível em matéria de chefes e donos de nossa casa e de nossas vidas, além disso,
prazeres dos mais variados, desde tomar uma em Sr. Julio poucos sabem fazer sexo oral bem, e são facilmente
e/ou Sr Chico... Para aqueles que não estão entendendo, substituídos por um vibrador.
esclareço, são botecos do mais alto nível, próximos a UNEB, Resumo da obra, não somos feministas como alguns
os quais possibilitam a alguns mestres ilustres a comodidade devem estar pensando, estamos sim buscando um mundo
de orientar seus alunos inspirados por aquela cervejinha mais equânime, mais livre e também achamos que as
(canela de pedreiro, cú de foca...), até saborear um bom mudanças são necessárias para as transformações inerentes
prato, um bom filme, uma boa transa. (prefiro transar com ao ser humano.
amigos a com inimigos). Dito popular ridículo, mas não resisti, Concluo essa loucura de idéias difusas, pensando na
perdoem-me. paixão, que não escolhe sexo, cor, questões de gênero, ou
Fiz alguns rodeios típicos daqueles que são covardes qualquer outra coisa e continuo investindo no amor.
para externar suas verdadeiras idéias. Contudo, aí me vou... Como cantou Cartola: Deixe-me ir, preciso andar, vou
Temos muito que discutir ainda em relação ao gênero por ai a procurar, rir pra não chorar...
feminino, sua história, seus lugares, os chamados “universos -------------------------------
femininos”... Rosangela dos Reis Mercês Santos
Vejamos. Tudo isso pra dizer que por mais que sejamos Psicopedagoga, graduanda em História da UNEB
independentes, estaremos sempre à procura do cara do E-mail: roreismerces@hotmail.com
Ode aos sentidos...
MÚSICA LIVRO FILME
ÁLBUM: TRANSA LIVRO: TRILOGIA DE TITULO: O FABULOSO
ARTISTA: CAETANO NOVA YORK DESTINO DE AMÉLIE
VELOSO AUTOR: PAUL AUSTER POULAIN
ANO: 1972 ANO: 1987 ANO: 2001
DIREAÇÃO: JEAN-
Estimula, excita, ousa.... Transcendei PIERRE JEUNET
para ouví-lo. Ouve para transcender.
Multi-sensitivo. Convidativo à uma boa Intrigante, denso, perturbador! Suave, romântico, papai-mamãe, verde,
trepada. São sete faixas que não se fabuloso e de uma sonoridade
encerram, transformando os ouvintes maravilhosa..
em suas extensões. Para ser visto a dois(ou mais), na cama,
depois de uma noite de “amor”.
11. Coisa de Negr@ Por Cristiane Puridade
indústrias de brinquedos, naquele criarmos uma seremos preconceituosas
momento o padrão de beleza estético racistas! Sim !!! Racistas... então venha
imposto pela mídia, era o padrão sorrir conosco, Bonecas pretas, lindas,
europeu, “Barbies”, “Xuxas”, N'Zingas, Dandaras, Azeviche, Ébanos
“Angélicas”, alavancavam as vendas com nome e história que valoriza o
com seus corpos esqueléticos, peles nosso povo negro e nossos ancestrais.”
claras, olhos azuis e cabelos loiros, Mais que um convite a “brincar de
traços que diferem completamente da boneca” ou um retorno a nossa “velha
maioria das meninas brasileiras. infância”, queridos leitores, o projeto
Hoje, após muitas lutas para o “Coisa de Negro”, nos leva a refletir
reconhecimento positivo do “ser sobre as diferenças étnicas, não se
negro” e as políticas públicas restringe a criar teorias sobre este
Na minha infância sempre gostei direcionadas para a melhoria da auto- assunto, ainda tão delicado de discutir
mais das denominadas “brincadeiras de estima da população afro-descendente, em nossa sociedade, a discriminação
menino”, jogar gude, pião, empinar evidenciando que a estética negra tem étnica, “arregaçando as mangas”, sem
pipa, carrinho de rolimã, subir em uma beleza específica e que deve ser discursos vitimizadores e trazendo para
árvore, entre outras. Não tinha muita valorizada, foram criados vários ordem do dia uma discussão tão
habilidade com as “brincadeiras de mecanismos para inserir no mercado “farposa”. O Ka Naombo é um recurso
menina”, principalmente quando se produtos que demonstrassem as que podemos empregar para educar
tratava de “brincar de boneca”, achava características dessa parcela da nossas crianças. Utilizando-o de forma
uma brincadeira monótona e população brasileira, que sempre foi a lúdica, para demonstrar uma realidade
enfadonha, sempre gostei de aventuras, maioria, mas nunca foi tratada como tal. que não é “brincadeira”.
de experimentar o novo, o diferente, e Entre várias ações a criação de Sem apologias, a este ou aquele
as “brincadeiras de menino” me brinquedos que fossem utilizados para movimento, sem querer sobrepor uma
proporcionavam isso. melhorar a autoconfiança das crianças etnia a outra, essas e outras iniciativas
Nos raros momentos que afro-descendentes, entre esses devem ser valorizadas, pois, buscam a
brincava com bonecas, não me brinquedos destacamos as Abayomis equidade das relações humanas,
agradava brincar com aquelas bonecas africanas artesanalmente contribuindo, para amenizarmos e,
industrializadas, tradicionais (a maioria confeccionadas em tecido que, nos quem sabe um dia, sanarmos esta forma
delas de material plástico), preferia as remetem àquelas bonecas feitas pela de discriminação que contribui para o
que eu e minha irmã confeccionávamos “vovó”, só que com um diferencial, as crescimento do abismo social que existe
de papel de bala (aquelas embalagens meninas brasileiras reconhecem nessas no nosso país. Assim como há alguns
coloridas que revestem os “queimados” bonecas suas fisionomias naturais. séculos passamos por um processo
em festa de aniversário) ou de qualquer Dentro dessas iniciativas Patrícia histórico de embranquecimento da
outro material reciclável. Agradava-me Silva, Licenciada em História pela UNEB nossa nação, concluo com o convite que
criar o corpo e as caras das minhas Campus V e artesã criou o projeto Ka Patrícia nos faz no seu texto; “TOPAS
bonecas, deixá-las do jeito que eu Naombo, termo Yorubá que em ENTÃO DENEGRIR A NOSSA IMAGEM??”
desejava, trazê-las para o mais próximo português significa, “Coisa de Negro”. , isso mesmo, vamos enegrecer um
possível da minha realidade, já que as No perfil que foi criado no orkut, pouco mais nossa sociedade? Quem
bonecas que ganhava eram exclusivamente para a divulgação desta sabe utilizando bem o pincel e as tintas
completamente diferentes da iniciativa tão imprescindível, Patrícia dessa aquarela étnica não consigamos
representação do feminino que aponta inquietações que povoaram criar um lindo arco-íris? Até a próxima...
conhecia. nossa infância com a ausência desse __________________
Um desejo que tinha, caros referencial, da ridicularização realizada Cristiane Puridade
leitores, e que só revelarei agora, era de às bonecas étnicas quando escreve: “E Licenciada em História pela
criar uma boneca com as características as bonecas brancas tem nome!!! Universidade do Estado da Bahia -
físicas da minha mãe, que sempre achei Cinderela, Branca de Neve, Mônica, são UNEB. É professora do Centro Educa-
uma mulher muito bonita, a típica tantos que podemos perder dias cional de Correntina, cidade em que
mulher brasileira; quadris largos, seios escrevendo. E as nossas, como é mesmo reside.
pequenos, cabelos e olhos pretos, pele que são chamadas??? Humm, deixa eu __________________
negra etc. Mas, uma boneca com essas ver!!! É isso mesmo! “Nega Maluca”!!!!! Para mais informações pesquise no
características em plena década de 80, Estranho né? Porque será que não orkut:
não traria retorno financeiro para as existe boneca “branca maluca”? Se “Kanaombo - Coisa de Negr@“
12. Comendo para não morrer
escancarada cheia de dentes alimentar o corpo e engordar as idéias:
Por Rosana “Zana” Mercês esperando a morte chegar de novo”... Macarrão Pesto.
Santos Zana continua.
__ Caymmi, Gonzaguinha, Nara 1 molho de manjericão fresco
Leão... Rosângela completa. 1 xícara de azeite extra-virgem
Mais uma seção de devaneios. __É. Oferecemos vários. Conclui 1 dente alho
Camila, Sheila, Rosangela e eu sentadas Camila. 1 pacote de massa
na tão disputada mesa da cozinha. Os Lançamos as Farpas e cuidamos
amigos sempre optam por ela, como o para que elas fiquem bem encravadas Modo de fazer: Cozinha a massa
lugar mais aprazível para papiar e na carne destes que transformam a em água fervente e acrescente o sal. A
tomar a tão desejada cervejinha. música neste ridículo conjunto massa deve ficar ao dente. Para o
Escutando Elza Soares. desastroso que nos fere os ouvidos e molho: bata no liquidificador as folhas
Profetiza Zana.__ Antes era nos arranha a alma. de manjericão, o azeite, o alho e um
preciso ir até a polícia e explicar que ia Não esqueçamos alguns bons: caldo de galinha. Refoga o molho no
haver um samba, um baile, uma festa, Lenine, Elza Soares, Nação Zumbi, O fogo rapidamente, cerca de 1 minuto e
enfim. Os sambistas para fugir da Teatro Mágico, Cordel do Fogo incorporar a massa. Sirva-o quente e
policia subiam o morro para, ocultos, Encantado, Betânia de Nonato, salpicado de queijo parmesão ralado na
fazerem sua música em paz. O samba Caetano e sua Paloma, Gil, Maria Rita, hora. Bom apetite.
não nasceu no morro, mas no asfalto. Ney Matogrosso, Marisa Monte,
Pura nostalgia, mas uma nostalgia Arnaldo Antunes, Luiz Melodia e... Os -------------------------------
sadia. De repente a conversa fluiu. E melhores versos e as melhores poesias. Rosana “Zana” Mercês Santos - Pós-
Rosângela fala. Poesias que invadem a alma e graduada em Psicopedagogia e Gestão
__Eu troco todos os cantores de enfeitiçam os ouvidos. Uns para mais e Escolar e Graduanda em História na
pagode vivos por Pixinguinha, João da uns para menos. Não estamos aqui UNEB - CAMPUS V - Santo Antonio de
Bahia, Donga, Noel Rosa, Cartola... para eleger os melhores e sim resgatar Jesus.
Sheila interpela. os ícones. Porque não?
__E eu troco Sandy por Elis Os que vivem, salve!
Regina. Ivete Sangalo, Daniela Mercury Os que já foram resgatemo-los!
e Ana Carolina por Cássia Eller Na Ah, e trataremos de educar
verdade eu troco todos e Babado Novo nossos talentos para que o rolo
vai de quebra. compressor do mercado fonográfico
__E Bob Marley, Janis Joplin... não nos afogue em prostituição...
Zana sempre complementa. Não somos complacentes. Somos
__ Vamos entregar a alma de a farpa que machuca. A farpa que E para terminar, um pouco de Nelson
todos os cantores de pagode paulistas: entranha na sua terra e faz sangrar. Rodrigues:
Exalta Samba, Belo e companhia. E de Causa dor. Causa medo e te faz divagar.
brinde Dudu Nobre, Roupa Nova, Caros leitores, não deixem que te “Acho a velocidade um prazer de
Serginho e a Lacraia, a mulher roubem o poder da reflexão. Não deixe cretinos. Ainda conservo o deleite dos
melancia, Guiguigueto, Calypso, todas que te roubem o senso, eu vos digo. bondes que não chegam nunca.”
essas de forró (alma sebosa é mais
barato). Camila defende. No centro da mesa: garrafas de
__Vamos resgatar do inferno o cervejas fluídas, cigarros esparsos, Paciência, leitor. A gente volta.
Rei do Rock . Se é que é isso que ele pratos coloridos, taças tilintando,
deseja. talheres gastos e rodados, amigos Enquanto isso nos escreve:
__ Quem? Zana pergunta. vadios. Podem sentir inveja desta
__Raul. Responde Camila. mesa, ela é de causar arrepios densos outrasfarpas@gmail.com
__Ah, ele vai querer mesmo é na alma. Ela é fruto de cobiça e você
ficar lá por baixo. Prefere o inferno a tem a honra de compartilhá-la
voltar e “ficar sentado com a boca conosco. Agora uma comidinha para