1. PÓS GRADUAÇÃO EM PSICOMOTRICIDADE EDUCACIONAL
A educação psicomotora no processo de ensino/
aprendizagem na educação infantil de crianças
com 4 a 6 anos
Gelcinéia Polizello
Thaís da Silva Vieira
CAMPINAS
2018
INSTITUTO BRASILEIRO DE FORMAÇÃO DE
EDUCADORES
2. 1
RESUMO
O presente artigo pretende o levantamento de informações esclarecedoras
acerca do tema Psicomotricidade e dificuldade de aprendizagem. Assim, é feita
uma revisão bibliográfica apresentando uma perspectiva histórica a fim de
refletir acerca da eficácia da psicomotricidade na educação, para assim
consolidar a educação psicomotora como base no processo de ensino/
aprendizagem na educação infantil.
Palavras chave: Psicomotricidade. Dificuldades de Aprendizagem. Educação
Infantil. Construtivismo
INTRODUÇÃO:
É de grande relevância para os profissionais da educação infantil
compreenderem a importância da educação psicomotora no processo de
ensino e aprendizagem na educação infantil e como o mesmo interfere para
uma aprendizagem significativa. Para tal, conhecer as fases do
desenvolvimento psicomotor sob uma perspectiva construtivista é
imprescindível para que tais profissionais compreendam que o movimento traz
consigo muito sobre o indivíduo, seus desejos e inquietações.
Analisando a história da psicomotricidade observa-se que no início de
seu surgimento, a mesma era usada apenas para reparar erros puramente
motores. Hoje é possível analisar uma nova característica desse segmento,
principalmente na primeira infância onde é possível reconhecer um vínculo
entre desenvolvimento motor, afetivo e intelectual.
Assim esse trabalho tem o intuito de analisar as implicações
psicomotoras na aprendizagem de crianças de 4 a 6 anos, tendo como
premissa que a criança se relaciona através de suas ações com o meio.
Para Fonseca (1988) a psicomotricidade é atualmente concebida como a
integração superior da motricidade, produto de uma relação inteligível entre a
criança e o meio.
A história do saber da psicomotricidade representa já um século de
esforço de ação e de pensamento. A sua cientificidade na era da
3. 2
cibernética e da informática, vai nos permitir certamente, ir mais longe
da descrição das relações mútuas e recíprocas da convivência do
corpo com o psíquico. Esta intimidade filogenética e ontogenética
representam o triunfo evolutivo da espécie humana, um longo
passado de vários milhões de anos de conquistas psicomotoras.
(FONSECA, 1988, p. 99.)
Nesse sentido, o presente trabalho tem como objetivos principais
conhecer o desenvolvimento psicomotor, refletir acerca da eficácia da
educação psicomotora no processo ensino/ aprendizagem e consolidar a
educação psicomotora como base no processo de ensino/ aprendizagem na
educação infantil a partir de metodologia bibliográfica.
CONCEPÇÃO DE ENSINO E APRENDIZAGEM
Diversas concepções de educação foram construídas ao longo dos
anos; tais concepções atuaram de forma direta no ambiente escolar e
influenciaram as práticas na sala de aula.
No presente trabalho o enfoque principal será a concepção construtivista
de Jean Piaget, que surgiu no início do século XX na Rússia, e chegou ao
Brasil por volta de 1945.
A Epistemologia Genética defende que o indivíduo passa por várias
etapas de desenvolvimento ao longo da sua vida. O desenvolvimento
é observado pela sobreposição do equilíbrio entre a assimilação e a
acomodação, resultando em adaptação. Assim, nesta formulação, o
ser humano assimila os dados que obtém do exterior, mas uma vez
que já tem uma estrutura mental que não está “vazia”, precisa
adaptar esses dados à estrutura mental já existente. O processo de
modificação de si próprio é chamado de acomodação. Este esquema
revela que nenhum conhecimento chega do exterior sem que sofra
alguma alteração pelo indivíduo, sendo que tudo o que se aprende é
influenciado por aquilo que já havia sido aprendido. A assimilação
ocorre quando a informação é incorporada às estruturas já pré
existentes nessa dinâmica estrutura cognitiva, enquanto que a
adaptação ocorre quando o organismo se modifica de alguma
maneira de modo a incorporar dinamicamente a nova informação. Por
fim, de um pensamento moderno que, buscando a síntese inusitada
entre o biológico e o lógico-matemático, parece encontrar seus limites
na desconstrução ainda mais inusitada a que tende sistematicamente
todo o pensamento na atualidade: a de si mesmo se construindo de
modo essencialmente esclarecido.(PIAGET, 1977, 361)
Antagônico a perspectiva tradicional, que justifica o ensino por meio da
“transmissão” de conhecimento do professor, que nesse modelo de educação é
o único a dominar o conhecimento, para o alunos, que por sua vez são
4. 3
“tabulas rasas“ e não possuem conhecimento algum, a concepção
construtivista, propõe que o aluno traz consigo uma bagagem anterior a que
será construída no ambiente escolar, tal bagagem, que foi produzida desde o
nascimento, e dará subsídios para a estruturação de novos conhecimentos.
Emilia Ferreiro, também traz críticas a educação tradicional, de acordo
com psicolinguista, o papel ativo do aluno na própria educação é fundamental
para uma aprendizagem significativa; pensando no aluno como protagonista da
sua aprendizagem e não apenas um “recebedor” de informações, é possível
compreender a aprendizagem como um todo, e o ser da mesma forma.
Negando assim a ideia de que educação motora e cognitiva se desenvolvem
de forma isolada e independente; ”nenhuma prática pedagógica é neutra.
Todas estão apoiadas em certo modo de conceber o processo de
aprendizagem e o objeto dessa aprendizagem” (FERREIRO, 1979, p.31).
O Desenvolvimento psíquico na perspectiva construtivista
Na tentativa de entender como tem origem e evolui o conhecimento,
Piaget investiu mais de 50 anos de pesquisa. Seu interesse epistemológico foi
aos poucos configurando um trabalho também psicológico, pois embora o
objeto de seu estudo fosse o conhecimento, a necessidade de abordar a
gênese deste conhecimento levou-o a um objeto de estudo: o desenvolvimento
da criança.
Apesar do caráter global do desenvolvimento psíquico, o autor distinguiu
funções diferenciadas neles, que são conhecidas, como: Funções de
conhecimento, de representação e afetivas.
As funções de conhecimento são responsáveis pelo conhecimento que
se tem do mundo e que incluem o pensamento lógico – que evolui desde os
reflexos, que é a mais primitiva ação do homem sobre o mundo, até o
pensamento operatório, próprio do adulto; a organização da realidade - que
evolui desde o estado de indiferenciação entre o eu e o mundo até as
percepções complexas a respeito de si e do mundo e a construção de
conceitos. As Funções de representação incluem todas as funções graças às
quais representamos um significado usando um significante determinado e, por
fim, as Funções afetivas, constituem, para Piaget (1977), o motor do
5. 4
desenvolvimento cognitivo. O autor analisou-as do ponto de vista da relação
com o outro, distinguindo etapas que vão desde a anomia (ausência de regras
morais), passam para a heteronomia (regras impostas pelo outro) e atingem a
autonomia moral.
Segundo o autor, pode-se considerar também que o desenvolvimento
dessas funções é marcado por períodos dotados de características bem
definidas, as quais expõem uma estrutura qualitativamente diferente da que a
precedera e das que a sucederão, ao mesmo tempo em que preparam o
indivíduo para o estádio seguinte.
Para o autor o desenvolvimento intelectual da criança vai desde o
nascimento até a maturidade. A seguir serão apresentadas as características
gerais de cada período: sensório motor, pré-operatório, operatório concreto e
operatório formal.
Período Sensório-motor (de 0 a aproximadamente 18 ou 24 meses)
O primeiro momento do desenvolvimento lógico é denominado sensório-
motor porque nele se verifica uma coordenação sensório-motora de ação
baseada na evolução da percepção e da motricidade. Esta fase estende-se do
nascimento ao aparecimento da linguagem, e embora seja rápida é muito
importante, pois é quando vão se formando as primeiras estruturas decorrentes
de atividades inteiramente práticas.
O período sensório-motor é dividido em seis subperíodos, denominados
de: exercício reflexo, reações circulares primárias, coordenação de visão e
preensão, coordenação dos esquemas secundários, diferenciação dos
esquemas de ação por reação circular terciária e início da interiorização dos
esquemas e solução de alguns problemas.
Período Pré-operatório (aproximadamente de 2 a 6 ou 7 anos)
Esse período é marcado pelo pensamento representativo caracterizado
pela capacidade de diferenciar significantes de significados, ou seja, é capaz
de representar o real por meio de significantes distintos. Essa capacidade é
chamada por Piaget de função simbólica. A linguagem, o jogo simbólico, a
imitação diferida e, provavelmente, os primórdios da imagem mental, concebida
como uma imitação interiorizada, vão se organizando, permitindo, então
6. 5
caracterizar este período pelo surgimento da representação. Predomina, nesta
fase, a “transdução”, modelo de raciocínio primitivo, baseado em relações
analógicas, que se orienta do particular para o particular.
Período Operatório Concreto (de 7 até aproximadamente 11/12
anos)
No terceiro período do desenvolvimento lógico, os termos “operações” e
“concretas” evidenciam as características próprias desta fase de
desenvolvimento.
As operações consistem em transformações reversíveis e tal
reversibilidade pode consistir em inversões (A - A = 0) ou em reciprocidade (A
= B logo B = A). Na fase de operações concretas a criança compreende cada
uma dessas formas de reversibilidade, sem, contudo, coordená-las.
O período das operações concretas constitui uma fase de transição
entre a ação e as estruturas lógicas mais gerais, que implicam uma
combinatória e uma estrutura de “grupo”; essas operações nascentes se
coordenam em estruturas de conjunto mais elementares, que Piaget denomina
“agrupamentos”.
No período operatório concreto a afetividade adquire novos conceitos
morais, como: honestidade, companheirismo, a compreensão da mentira, o
sentimento de justiça, entre outros e as relações sociais são baseadas na
cooperação (sentimento de respeito mútuo).
Período Operatório Formal (a partir de 11/12 anos)
Apresenta como característica essencial a distinção entre o real e o
possível: o adolescente, ao tomar em consideração um problema, é capaz de
prever todas as relações que poderiam ser válidas e logo procura determinar,
por experimentação e análise, qual dessas relações possíveis tem validez real.
Em lugar de limitar-se a organizar o que lhe chega através dos sentidos, o
adolescente tem a capacidade potencial de imaginar o que poderia estar ali.
A estratégia cognitiva que trata de determinar a realidade no contexto da
possibilidade tem caráter fundamentalmente hipotético-dedutivo.
Diferentemente do que ocorria no período anterior, os dados manipulados pelo
adolescente em seu raciocínio já não são dados concretos, mas enunciados ou
7. 6
proposições que contém esses dados. Por isso, o pensamento formal é,
sobretudo, pensamento proposicional. Enquanto no período de operações
concretas, a cognição era organizada sobre objetos e fatos concretos, na
adolescência tomam-se os resultados das operações concretas, moldando-os
em proposições, para se operar com eles. Ao enfrentar um problema o
adolescente, cuja orientação para o possível e o hipotético foi recentemente
desenvolvida, quer determinar todas as relações possíveis inerentes ao
problema, de modo que se possa pôr a prova o status de realidade de cada
uma. Para isso, o adolescente isola de modo sistemático todas as variáveis
individuais, submetendo-as a uma análise combinacional, método que
assegura a realização de um inventário completo do possível.
Concepção de psicomotricidade
Para que se possa compreender melhor o conceito de psicomotricidade
que será empregado no presente trabalho é necessário assimilar a definição
de psicomotricidade.
Psicomotricidade, portanto, é um termo empregado para uma
concepção de movimento organizado e integrado, em função das
experiências vividas pelo sujeito cuja ação é resultante de sua
individualidade, sua linguagem e sua socialização (Associação
Brasileira de Psicomotricidade, 1970).
De acordo com a Associação Brasileira de Psicomotricidade (1970), a
mesma é compreendida como um campo interdisciplinar na qual o objeto de
estudo são as relações e as influências recíprocas e sistêmicas entre o
psiquismo e a motricidade.
A Psicomotricidade baseia-se em uma concepção unificada da
pessoa, que inclui as interações cognitivas, sensoriomotoras e
psíquicas na compreensão das capacidades de ser e de expressar-
se, a partir do movimento, em um contexto psicossocial. Ela se
constitui por um conjunto de conhecimentos psicológicos, fisiológicos,
antropológicos e relacionais que permitem, utilizando o corpo como
mediador, abordar o ato motor humano com o intento de favorecer a
integração deste sujeito consigo e com o mundo dos objetos e outros
sujeitos (Associação Brasileira de Psicomotricidade, 1970).
A palavra psico refere-se à psiquismo, que nesse contexto está
relacionado ao funcionamento mental e todas suas possibilidades e
integrações. Já a palavra motricidade refere-se ao funcionamento motor e suas
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expressões corporais funções tônicas, posturais e práxicas que permitem e
sustentam as funções psíquicas.
Para Fonseca (1988) a psicomotricidade é atualmente concebida como
a integração superior da motricidade, produto de uma relação inteligível entre a
criança e o meio.
Assim a psicomotricidade estabelece ligações entre o sujeito e o mundo
que o cerca em função das experiências vividas por ele cuja ação é resultante
de sua individualidade, sua linguagem e sua socialização.
Psicomotricidade e aprendizagem escolar
O corpo é o meio pelo qual o homem se relaciona com mundo. Desde o
nascimento, a criança demonstra suas emoções através do seu corpo. Ao
receber os estímulos do ambiente que a cerca, ela vai interagindo,
“experimentando” e ampliando suas funções intelectivas, sendo cada um de
seus atos uma forma de exprimir suas emoções afetivas, emocionais e
intelectuais.
Do ponto de vista psicomotor Oliveira (1997) ressalta que para uma
criança aprender a ler e a escrever, é necessário que ela possua adequado
domínio de gesto, lateralização estruturada, orientação espacial e temporal. E
ainda Oliveira (1997, p.32) explica que “para a psicomotricidade se
desenvolver, é necessário que a criança tenha um nível de inteligência
suficiente para fazê-la desejar, “experienciar”, comparar, classificar, distinguir
os objetos”. O desenvolvimento da inteligência se constrói através da
manipulação de objetos e da interação do indivíduo com o meio ambiente.
Piaget (apud OLIVEIRA, 1997, p. 31) ao descrever a importância do
período sensório-motor e da motricidade, antes mesmo da aquisição da
linguagem, no desenvolvimento da inteligência diz que o “desenvolvimento
mental, se constrói paulatinamente, é uma equilibração progressiva, uma
passagem contínua, de um estado de menor equilíbrio para um estado de
equilíbrio superior”. Para ele a adaptação ocorre com a interação com o meio e
se faz por intermédio de dois processos complementares: assimilação e
acomodação.
9. 8
Nesse sentido, acredita-se que a educação psicomotora não pode ser
apenas um treino puramente mecânico, robotizado; não pode ser considerada
mais um método de ensino, uma técnica com movimentos repetitivos. Para
Defontaine (apud OLIVEIRA, 1997, p. 34) ela deve ser entendida como uma
“triangulação corpo, espaço e tempo”.
A educação psicomotora é indispensável a toda criança, pois ela
aumenta o potencial motor, proporcionando condições para um bom
desempenho escolar. Ela ajuda a criança a superar suas dificuldades e
prevenir possíveis inadaptações. Portanto ela deve ser trabalhada desde as
séries iniciais para que a criança possa conhecer melhor seu corpo, situar-se
melhor no tempo e no espaço e adquirir coordenação de seus gestos e
movimentos.
A educação psicomotora pode ser preventiva, quando ela proporciona
condições à criança de se desenvolver melhor em seu ambiente. Também
pode ser reeducativa, quando trata de indivíduos com problema motor.
Para uma pessoa agir no meio ambiente ela depende de um dos vários
sistemas que o nosso organismo possui que é o sistema nervoso. O sistema
nervoso coordena e controla todas as atividades do organismo, integra
sensações e ideias, opera os fenômenos de consciência e é responsável por
interpretar e responder cada um dos estímulos através de suas células
chamadas neurônios. As células do sistema nervoso se desenvolvem entre o
6º mês de gestação até mais ou menos os seis anos de idade da criança,
portanto, tanto a alimentação da mãe como da criança após o nascimento são
fundamentais para sua formação, pois é através dele que ocorrem as sinapses.
Sinapses são conexões que ocorrem entre os neurônios onde um estimula o
outro através dos neurotransmissores que transmitem informações.
Além da necessidade de se ter uma boa alimentação e da estimulação
que a criança recebe do meio ambiente, merece destacar que o sistema
nervoso não se desenvolve de uma só vez. Ele obedece a uma sequência,
portanto para uma criança aprender é necessário considerar seu processo de
maturação, processo este que está sempre em desenvolvimento e nunca pára.
É importante ressaltar que os movimentos do sistema nervoso, não aparecem
por acaso, embora sejam controlados por ele se classificam em três grupos:
movimento voluntário que depende de nossa vontade e é sempre aprendido;
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movimento reflexo que ocorre independente de nossa vontade; movimento
automático que depende de aprendizagem, da história de vida e de
experiências próprias de cada um.
Oliveira (1997, p. 27) lembra que “todo movimento realiza-se sobre um
fundo tônico e um dos aspectos fundamentais é a sua ligação com as
emoções”. O tônus muscular está presente em todas as funções motrizes,
como equilíbrio, coordenação, movimento e postura.
A coordenação global está relacionada às atividades dos grandes
músculos e depende da capacidade de equilíbrio postural da criança. A falta
dela pode causar inabilidade para correr, para sentar-se corretamente ao
escrever, para adquirir domínio dos movimentos porque só consegue fazer um
movimento por vez. Uma consequência importante da falta de coordenação
global é a dificuldade em adquirir o esquema corporal, por isso a criança
sempre se atrasa em relação aos demais colegas.
A coordenação fina e óculo manual estão relacionadas à habilidade e
destreza manual, porém é necessário que haja também um controle ocular
para que a visão acompanhe os gestos da mão. Uma criança com dificuldade
de coordenação fina, terá dificuldades em atividades como vestir, recortar,
apagar, escrever, entre outras. Ela precisa de um tempo maior que as demais,
além da necessidade de realizar um trabalho bem intenso de exercitação para
o desenvolvimento da preensão, assim sua escrita não ficará tremida e
irregular.
Sendo o corpo um meio de interação com o mundo, uma criança precisa
ter um corpo “organizado” para agir através de seus aspectos psicológicos,
psicomotores, emocionais, cognitivos e sociais (OLIVEIRA, 1997, p.48). Uma
criança que tenha esquema corporal mal trabalhado não coordena bem os
movimentos, tem dificuldade na caligrafia, pode sentir dores nos braços quando
escreve, não consegue se representar corretamente em um desenho e
posicionar seu corpo em relação aos objetos. Também terá dificuldade em
discriminação perceptiva, quando estiver diante de situações em que precise
analisar e comparar duas coisas. O esquema corporal regula a postura e o
equilíbrio. Não é um conceito aprendido, ele é organizado de acordo com o uso
que a criança faz de seu corpo.
11. 10
De acordo com a teoria psicomotora as etapas do esquema corporal
estão divididas em três: Corpo Vivido, Corpo Percebido ou Descoberto e Corpo
Representado.
A primeira etapa é a do Corpo Vivido e compreende a fase que vai do
nascimento até os 3 anos de idade da criança. Ela corresponde à fase da
inteligência sensório-motora de Jean Piaget. É a fase chamada de vivência
corporal. Sua atividade é incessante e espontânea, é a fase do conhecimento
das partes do corpo. No final desta fase, pode-se falar em imagem do corpo,
pois o “eu” se torna unificado e individualizado.
A segunda etapa é a do Corpo Percebido ou “Descoberto” e vai dos 3
aos 7 anos. Nela a criança, por meio da maturação passa a ter um maior
domínio sobre o seu corpo; uma etapa importante na representação mental. É
nesta fase que a criança vai representar-se por intermédio do desenho. Não
conhece apenas as partes de seu corpo, mas também chega à orientação
corporal a partir da posição de seu corpo, o que pode ser caracterizado como
pré-operatório. Aperfeiçoa e refina os movimentos adquirindo uma maior
coordenação dentro de um espaço e tempo determinados. Assimila conceitos
como embaixo, acima, direita, esquerda, assim como noções temporais, como
a duração dos intervalos de tempo, de ordem e sucessão.
A terceira e última etapa é a do Corpo Representado e vai dos 7 aos 12
anos. Nesta fase a criança chega a um espaço representativo. Ela amplia e
organiza seu esquema corporal. Passa da imagem de corpo de reprodutora
para antecipatória (operações concretas de Piaget). Torna-se capaz de
organizar, de combinar as diversas orientações. Os pontos de referência
deixam de estar centrados no próprio corpo, sendo que ela mesma cria os
pontos de referência que irão orientá-la.
A lateralidade é a propensão que o ser humano tem em utilizar
preferencialmente mais um lado do corpo do que o outro em três níveis: mão,
olho e pé. O lado dominante apresenta maior força muscular, mais precisão e
mais rapidez. É ele que inicia e executa uma ação principal, porém o outro lado
auxilia esta ação sendo igualmente importante. Nesse sentido, considera-se
que os dois não funcionam isoladamente, mas um complementando o outro.
Podemos verificar o predomínio motor de uma criança quando ela
escreve, usa uma régua, risca uma folha, nesse caso estamos verificando sua
12. 11
dominância manual. A dominância pedal pode ser verificada através de um
jogo de amarelinha ou um jogo de futebol. A dominância bucal pode ser
identificada pelo dentista através de exame bucal, quando é verificado um lado
da boca que é mais usado durante a mastigação. A dominância auricular pode
ser verificada quando tentamos ouvir o som de uma concha do mar ou quando
falamos ao telefone.
A dominância pode ser classificada em quatro níveis: destra homogênea
ou canhota homogênea quando uma pessoa tiver a mesma dominância nos
três níveis - mão, olho e pé. Lateralidade cruzada quando usa a mão direita, o
olho e o pé esquerdos ou qualquer outra combinação. Quando a pessoa
executa com mesma precisão ambos os lados do corpo, o que não é muito
comum chamamos de Ambidestra. Ás vezes, por alguma razão, pode
ocasionar um desvio da lateralidade, nesse caso chamamos de falsa
sinistralidade ou falsa destralidade.
Quando a dominância não está bem definida ou é trocada, a criança tem
dificuldade em discriminar direito-esquerda e também possui falta de direção
gráfica. Apresenta comprometimento na leitura e escrita porque não discrimina
letras de direções simétricas como d e b, p e q.
Uma criança pode apresentar muitos problemas quando possui
Orientação Espacial falha. Ela não consegue usar adequadamente todo o
espaço disponível na folha, tem dificuldade para escrever na linha, centralizar
títulos, usar mapas, realizar desenhos geométricos. Também pode apresentar
dificuldade na discriminação visual, não conseguir se orientar. Na escrita pode
confundir n e u, ou e on, b e p, 6 e 9.
A estruturação espacial é muito importante para qualquer pessoa viver
em sociedade e ela é adquirida através das interações ocorridas com o meio.
Através do trabalho mental selecionamos, comparamos, classificamos,
agrupamos e chegamos à construção de conceitos. É na escrita que a
estruturação espacial tem significativa contribuição, pois ela depende como em
outras situações de sala de aula, da manipulação das relações espaciais entre
os objetos. Segundo Ajuriaguerra (apud OLIVEIRA, 1997, p.75), “a escrita é
uma atividade motora que obedece a exigências muito preciosas de
estruturação espacial.” E continua “a escrita é, pois, uma atividade espaço-
temporal muito complexa”.
13. 12
Na escola, a criança com problemas na estruturação temporal, pode
apresentar dificuldades na ordenação das sílabas, não perceber quem é o
primeiro e quem é o último, antes e depois, não perceber os intervalos. Não
consegue se organizar dentro de um tempo para realizar uma atividade. Pode
se prejudicar em matemática por não conseguir organizar colunas, ler tabelas.
Não consegue perceber a sucessão dos dias da semana, os meses do ano,
enfim terá dificuldade até para manipular uma agenda. Pode apresentar uma
leitura desarmônica, pois não percebe entonação e pausas, enquanto que na
escrita pode confundir ou trocar letras e sílabas. No que se refere à orientação
temporal, uma criança precisa ter os principais conceitos de simultaneidade,
ordenação e sequência, duração de intervalos, renovação cíclica de certos
períodos e ritmo.
A discriminação visual e auditiva também são noções essenciais que o
professor deve estar atento em classe para que o aluno adquira uma
aprendizagem satisfatória.
Uma criança com problema de discriminação visual pode apresentar
dificuldades, como: troca de letras simétricas (d e b, n e u, p e q), troca de
letras que se diferem por pequenos detalhes (o e e, f e t, c e e, h e b, a e o),
pode apresentar supressão de letras e deformação em letras aglutinadas. A
leitura se torna lenta, com tom de voz monótono e acaba por ler várias vezes
as mesmas linhas sem perceber, pula frases inteiras, pois sua movimentação
dos olhos ocorre de forma desordenada, sem coordenação óculo-manual.
Quanto à discriminação auditiva, cabe aos educadores proporcionar aos
alunos exercícios de atenção auditiva e concentração que os ajudarão a
discernir melhor os sons e auxiliá-los na discriminação dos sons dentro da
linguagem oral.
Desde que o mundo é mundo a leitura e a escrita tornaram-se
indispensáveis ao homem para que este se integre e possa viver em
sociedade.
Muito antes da criança aprender a ler e escrever dentro do padrão
convencional da nossa língua, ela passa por fase de escrita, que é também
considerada uma forma de linguagem usada por ela para se comunicar,
chamada de linguagem gráfica. Esse tipo de linguagem são os desenhos, as
garatujas que ela usa como forma de expressar seus sentimentos e de fazer
14. 13
sua leitura de mundo, mas que muitas vezes não são bem interpretadas pelos
adultos que acabam interferindo nesse processo.
Ler é um processo bastante complexo, é um ato que vai além da
codificação das letras. A criança quando inicia seu processo de leitura, precisa
perceber que cada símbolo gráfico corresponde a um determinado som.
Precisa entender que a escrita é composta por uma sequencia de letras que
são símbolos gráficos e que correspondem a uma sequencia sonora também.
A leitura antecede a escrita. Se uma criança não sabe ler dificilmente
escreverá, como já escrevemos anteriormente, na escrita há uma
correspondência sonora e nesse caso essa correspondência sonora não existe.
Nesse sentido, faz-se necessário apresentar as contribuições da teoria
piagetiana sobre o desenvolvimento psíquico da criança e que serão descritas
a seguir.
Jogos psicomotores
Os jogos permeiam o universo escolar; e há muito tempo, é considerado
como uma atividade importante na educação das crianças.
A preocupação com a importância do aprendizado da criança tornar-se
divertindo e agregar sentido é muito antiga. Surge com os gregos e romano,
mas é com Fröebel que os jogos passam a fazer parte central da educação.
Foi no período da escola nova que o jogo tornou-se cada vez mais
utilizado com o objetivo de auxiliar as tarefas escolares.
Outros educadores como Dewey, Decroly, Claparèd, Montessori
também consideraram o jogo um instrumento importante para o
desenvolvimento físico, intelectual e social da criança, divulgando a importância
do mesmo nas escolas (BRENELLI, 1996, p. 19).
Segundo Piaget (apud BRENELLI, 1996, p.21), “o jogo tem importância
quando revestido de seu significado funcional.” E continua “por meio da
atividade lúdica, a criança assimila ou interpreta a realidade a si própria,
atribuindo então, ao jogo um valor educacional muito grande”.
Nas atividades psicomotoras as crianças revelam as mais diferentes
emoções, tendo a oportunidade de criar, expressar-se por meio das
15. 14
brincadeiras, conhecer a si mesma e as diferentes funções que o corpo realiza,
conhecer o outro, e o espaço.
Neste capítulo pretende-se mostrar o uso do jogo como estratégia de
intervenção psicomotora nos processos de desenvolvimento e aprendizagem
de crianças com dificuldade para aprender.
Nessa proposta o jogo deve ser trabalhado de forma intencional e com
os objetivos bem claros para atingir de forma satisfatória as habilidades
desejadas; deve-se também ter como ponto de partida o uso do jogo como
estratégia de ensino/ aprendizagem, tal estratégia deve possibilitar que a
criança tenha condições de construir um conhecimento científico através de
situações reais ou imaginárias a fim de instigá-las a buscar recursos para
resolução de problemas durante o jogo.
Os jogos psicomotores precisam contemplar todos os aspectos citados
acima e agregar a motricidade, também de forma intencional. Para melhor
compreensão organizamos os jogos sugeridos para o desenvolvimento de cada
elemento psicomotor.
• Esquema Corporal
Jogo mão na bola.
Realização: os participantes devem ser organizados duplas de frente um
para o outro com uma bola entre eles, ao comando do mediador os
participantes devem tocar as partes do próprio corpo que são ditas; exemplo:
mão na cabeça, mão no joelho e etc. marca ponto o jogador que tocar na bola
(quando solicitado pelo mediador) primeiro. Um esquema desse jogo pode ser
observado na figura 1.
A habilidade motora é trabalhada quando a criança toca seu corpo de
acordo com a solicitação do mediador, reconhecendo e identificando seu corpo
localizando cada parte de forma individual.
16. 15
Figura 1: Jogo mão na bola.
Fonte: MILLER, 2016.
• Equilíbrio
Campo minado
Realização: o mediador deve espalhar em um espaço diferentes formas
geométricas de diversas cores em E.V.A. e dar o comando para que os
participantes se movam. Exemplo: pisar apenas com o calcanhar no círculo
azul, ir de um pé só nos quadrados vermelhos, ou andar de quatro apoiso nos
triângulos laranjas e etc. A habilidade motora é trabalhada quando a criança
precisa equilibrar seu corpo na posição solicitada pelo mediador. Um esquema
desse jogo pode ser observado na figura 2.
17. 16
Figura 2: Campo minado
Fonte: OLIVEIRA, 2013.
• Lateralidade
Acerte o alvo
Realização: o mediar deve amarrar duas fitas de cores diferentes nos
braços e/ ou pernas dos participantes e solicitar que ele jogue ou chute o objeto
com a cor dita pelo mediador. Exemplo: fita amarela na mão ou pé direito, fita
azul da mão ou pé esquerdo, o mediador deve dizer apenas a cor e a ação.
Exemplo: Amarela arremesse a bola, azul chute a bola e etc. A habilidade
motora é trabalhada quando a criança segura, arremessa ou chuta a bola
apenas com o membro solicitado pelo mediador. Um esquema desse jogo pode
ser observado na figura 3.
18. 17
Figura 3: Lateralidade.
Fonte: Um jeito diferente de ensinar, 2016.
• Ritmo
Dança da lagarta
Realização: o mediador deve cantar a música e pedir que os
participantes andem e dancem pelo espaço de acordo com o ritmo (velocidade)
que a música é cantada. Toda vez que for cantada rápido os movimentos
precisam ser rápidos e sempre que for cantada devagar os movimentos devem
ser mais lentos. A habilidade motora é trabalhada quando a criança muda a
velocidades dos passos e da dança de acordo com a velocidade que o
mediador a canta. Um esquema desse jogo pode ser observado nas figuras 4 e
5.
Figura 4 (à direita): Dança da lagarta
19. 18
Fonte: DC Clicrbr, 2013.
Figura 5 (à esquerda): Dança da lagarta
Fonte: OPOVO, 2018.
• Organização espaço-temporal
Alerta
Realização: o mediador deve espalhar coletes de cores diferentes no
chão e orientar que cores devem ser pegas, com uma bola bem macia
(sugestão bola de tecido) amarrada a uma corda o mediador deve ficar no meio
do espaço reservado entre os coletes girando a bola. Os participantes devem
abaixados se arrastar até os coletes e pegar um deles sem que a bola toque no
seu corpo. A habilidade motora é trabalhada quando os jogadores observam o
espaço que precisam percorrer e a velocidade da bola, fazendo assim uma
relação de espaço/ tempo para pegar os coletes. Um esquema desse jogo
pode ser observado na figura 6.
Figura 6: Alerta
Fonte: São Pio X, 2017.
20. 19
• Praxia fina
Bingo de rosquear
Realização: em uma superfície dura devem ser colados gargalos de
garrafas sem tampas. Nas tampinhas devem ser escritos números ou letras. O
mediador deve “cantar” as peças e os participantes encontrar a peça e
mosqueá-la quando formar uma fileira vertical ou horizontal, o jogador marca
ponto e o jogo recomeça. A habilidade motora é trabalhada quando os
participantes rosqueiam as tampinhas nos gargalos. Um esquema desse jogo
pode ser observado na figura 7.
Figura 7: Bingo de rosquear.
Fonte: HEINZ, 2018.
• Praxia global.
Circuito
Realização: O mediador deve organizar diversas atividades que devem
ser realizadas em sequência e orientar os participantes o que fazer em cada
estação. Exemplo: se arrastar de barriga para baixo no túnel, se equilibrar e
atravessar um banco, pular dentro de pneus, subir e descer obstáculos agachar
e se levantar, passar pela cama de gato sem encostar nos fios e etc. A
habilidade motora é trabalhada quando o participante usa diversas partes do
21. 20
corpo, de forma simultânea ou não, para percorrer os desafios traçados pelo
mediador. Um esquema desse jogo pode ser observado na figura 8.
Figura 8: Circuito.
Fonte: SOARES, 2014.
Conclusão
A psicomotricidade institucional atua no âmbito escolar de forma
preventiva, promovendo ações antes que os problemas de aprendizagem
apareçam, ou quando essas dificuldades já existem, procura intervir e auxiliar o
corpo docente a combatê-los, com o objetivo de elevar a qualidade do
processo de ensino e aprendizagem.
O presente artigo foi construído com o intuito de provocar melhoria no
processo de aquisição motora na educação infantil através de jogos,
possibilitando assim que os docentes possam refletir sobre as relações
existentes no cotidiano escolar, que podem interferir direta ou indiretamente no
processo de aprendizagem através da psicomotricidade.
22. 21
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