Congresso Grocery & Drinks I Desafios e importância de fidelizar o seu cliente.
A conquista dos novos consumidores - HSM | Mar / Abr11
1. estratégia
a conquista
dos novos
consumidores
Cada vez mais empresas
mudam suas estratégias
e inovam em produtos
dirigidos aos Clientes
da base da pirâmide
soCioeConômiCa brasileira
N
os últimos anos, o brasil atravessou tamente afetadas é o consumo.
um expressivo período de crescimento novos consumidores, recém-che-
econômico, com geração de empregos, gados a um novo mercado, estão
aumento da renda dos trabalhadores e ávidos por comprar. isso pede, por
inclusão social. de acordo com a pesqui- sua vez, novas abordagens das empresas. e parece ser
sa nacional de amostragem por domicí- justamente no front do atendimento às faixas extremas
lio (pnad), do instituto brasileiro de geografia e estatística da população (os mais pobres e os mais ricos) que vêm sen-
(ibge), 29 milhões de pessoas ingressaram na classe C (renda do desenvolvidas as estratégias e os produtos que decretarão o
familiar bruta de r$ 1.126 a r$ 4.854) entre 2003 e 2009, um sucesso ou o fracasso de um negócio. a gestão brasileira tem sido
crescimento de 34,3%. segundo o levantamento, o país contava reconhecida especialmente no que tange às estratégias voltadas
em 2009 com cerca de 95 milhões de habitantes nessa faixa de para a base da pirâmide socioeconômica. e o lema é: diferenciação,
renda, em uma população total de 190,7 milhões (Censo 2010). customização, qualidade e atenção ao cliente, atributos antes ex-
Já a classe b (de r$ 4.855 a r$ 6.329) aumentou 38,5% e a classe clusivos do mercado de luxo (veja quadro na página 26), também
a (a partir de r$ 6.330), 40,9%. devem ser entregues aos consumidores de baixa renda.
diante dos números, é fácil deduzir que o fato provoca mudanças parte do comércio brasileiro já dava atenção aos consumi-
fundamentais em nossa sociedade, e uma das áreas mais imedia- dores mais pobres, porém, com essa mudança de paradigma, a
indústria aderiu e o processo se acelerou. “a estabilização da
moeda, o acesso facilitado ao crédito e à tecnologia têm impul-
a reportagem é de Nara Damante, colaboradora de Hsm management.
sionado a classe C para um patamar mais elevado de qualidade,
22 HSM Management • Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo • Edição Especial Março 2011
2. Casas Bahia: mudança nas
prateleiras para atender às
novas demandas
conhecimento e poder de compra. se antes o grande motivador
era o preço e a pechincha, hoje essas pessoas querem qualida-
de e marcas”, compara michel Klein, presidente do conselho de
administração da nova Casas bahia, que faturou r$ 18 bilhões
em 2010.
o cenário fez com que a rede repensasse suas prateleiras,
uma vez que, por um bom tempo, apenas 20% dos produtos
eram de marcas reconhecidas. Foi preciso ainda agregar mais
qualidade aos móveis de marca própria (bartira) e patrocinar
a participação de seus profissionais em feiras internacionais,
onde puderam conhecer as mais recentes tendências e tec-
nologias. modelos mais sofisticados de telefones celulares,
câmeras fotográficas e televisores também invadiram as lo-
jas e foram os produtos mais procurados no último natal. o
mesmo padrão se repetiu no concorrente magazine luiza.
Sonhos de consumo
essa transformação provocou a consolidação de uma velha
crença da Casas bahia de que, para as classes populares, a
aquisição de um bem representa a realização de um sonho,
um momento compartilhado com os familiares, que precisa de
atenção antes, durante e depois da venda. para responder à
demanda, a empresa investe em um sistema de logística pró-
prio, com equipes de entregadores, montadores e motoristas
treinados pela rede, além de uma central de relacionamento
com o cliente. o passo seguinte foi a oferta de serviços nas
lojas, como a implantação de quiosques para vendas de pas-
Michel Klein, da
Fotos: divulgação
Casas Bahia: todo sagens aéreas, em parceria com a tam. a iniciativa, mais uma
consumidor busca vez, atende aos anseios do consumidor: pesquisa da Cetelem
mais qualidade
nos dias de hoje
ipsos 2010 indica que viagem e lazer são objetos de desejo
de 32% dos consumidores das classes populares.
HSM Management • Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo • Edição Especial Março 2011 23
3. estratégia
de olho no mesmo filão, o magazine luiza firmou acordo Ivan Zurita, presidente da Nestlé Brasil: o programa Nestlé Até Você
com a azul linhas aéreas para oferecer a comodidade em subiu a bordo, lançando supermercado flutuante na Amazônia
suas lojas. “milhões de pessoas ingressaram nas classes C e
d, passaram a ter dignidade e acesso ao consumo. muitas de-
las estão comprando eletrodomésticos, o que favoreceu em
10% nosso faturamento no ano passado”, conta luiza trajano,
presidente da empresa. em 2010, a rede viu seu faturamen-
to crescer para r$ 5,3 bilhões, contra os r$ 700 milhões
de 2002. uma das apostas para 2011 é a recém-inaugurada
megaloja tietê, na capital paulista. o estabelecimento ofere-
ce experiências com os produtos, interatividade, serviços e
entretenimento (padaria, salão de beleza, espaço com brin-
quedos para crianças, shows e eventos).
para Fábio mariano borges, professor de pós-graduação da
escola superior de propaganda e marketing (espm) na área
de comportamento do consumidor, o entendimento do cliente
baseado em hábitos e perfil se esgotou. “as empresas preci-
sam estudar o modelo mental de seus clientes, saber quais
são seus valores e crenças”, diz. assim, segundo ele, existe a
possibilidade da volta de uma prática adotada nos anos 1990
por gigantes como a unilever, a nestlé e a procter & gamble:
a redução da linha de produtos para facilitar a escolha. “pro-
dutos descolados de experiências e significados para o con-
sumidor geram confusão.”
Foto: Walter Craveiro/Arquivo HSM
Mais perto do consumidor
essa iniciativa de facilitar o conhecimento dos produtos é
louvável, na opinião de andré torretta, diretor da ponte es-
tratégia, firma de consultoria que trabalha com inovação e
modelagem de negócios para a nova classe média. “num país
em que 72% das pessoas têm algum grau de analfabetismo
funcional, as empresas devem mesmo redesenhar seus mo-
delos de negócio”, prega. para ele, a comunicação voltada
para o consumidor requer vocabulário mais simples e direto.
além disso, ele explica que os gostos das classes C e d são devem estar presentes em quem pretende conquistar novos
distintos daqueles que aparecem nas ações de marketing. “as consumidores”, ressalta o consultor.
empresas sempre produziram para quem tem dinheiro. agora outro exemplo é a nestlé, que pesquisa desde 2003 os hábitos de
elas precisam entender que a base da pirâmide tem hábitos consumo e carências nutricionais da população de regiões desfavo-
diferentes”, defende. recidas, a fim de desenvolver produtos adequados a ela. em 2009,
“nos estados unidos e na França, os pro- passou a atuar com a plataforma nestlé até você,
dutos e serviços são feitos para o norte-
americano e o francês médios. no brasil, A plataforma com a qual vende, no modelo porta a porta, kits
com biscoitos, chocolates, iogurtes, leites fermen-
estão voltados para a elite, o que não tem
sintonia com a nova realidade”, argumenta.
Nestlé Até tados e sobremesas. além de trabalhar itens de
maior apelo para cada comunidade, respeitando
torretta também aponta que a publicidade Você, lançada as diferenças e peculiaridades regionais, a em-
das marcas, em geral, sempre esteve dire- presa oferece oportunidade de renda extra e in-
cionada para o eixo rio-são paulo, com pou- em 2009, clusão social por meio da geração de empregos.
cas exceções. entre elas, ele cita a Kraft, que
mantém um braço de sua área de marketing
faz a venda presente em 18 estados, a iniciativa já conta com
7,7 mil revendedores em regiões carentes e mais
em recife para cuidar especificamente das
estratégias destinadas à região, e a ambev,
porta a porta de 235 microdistribuidores.
que produz a cerveja brahma Fresh, desen- de iogurtes a A academia investiga: a múltipla
volvida para os mercados do norte e do classe C e a misteriosa classe D
nordeste. “o respeito e a adequação cultural chocolates se as empresas brasileiras vêm inovando
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4. A conquista dos novos consumidores
para atrair a base da pirâmide socioeconômica, a academia universo ao qual passaram a pertencer. eles até consomem
do país também avança nas pesquisas sobre esse mercado. produtos tecnológicos e outros que não faziam parte de sua
por exemplo, a antropóloga Carla barros, pesquisadora de rotina, mas preferem manter seu modo de vida tradicional.
tecnologia entre camadas populares do Centro de altos es-
tudos em propaganda e marketing da escola superior de • O terceiro grupo é um híbrido dos dois primeiros, exem-
propaganda e marketing (Caep/espm), já plificado por uma família cujos pais possuem
identifica três classes C distintas, em vez
de apenas uma, sofisticando sua análise:
O varejo vem baixo grau de instrução e os filhos, que mo-
ram com eles, leem livros e têm acesso a
• Há a classe C que migrou da D, ascen-
investindo produtos e serviços mais sofisticados, expe-
rimentando um pouco dos dois mundos.
deu no consumo e sobre a qual o elemento em serviços
aspiracional exerce grande influência. essa “nossas empresas ainda estão num estágio
é a parcela mais impactada pela propagan- diferenciados e inicial de diferenciação desse público e muitas
da e pela oferta de produtos e serviços aos
quais não tinham acesso.
no atendimento vezes erram a mão ao não estudar a fundo o
comportamento social desses indivíduos”, afir-
ma Carla. uma premissa essencial para entender
• Uma segunda camada é formada pelos indivíduos que a base da pirâmide é saber que, enquanto a classe b tem um de-
olham para o mercado e, apesar de terem condições de sejo de consumo aspiracional da classe a, parte da classe C quer
comprar, não se identificam com as lojas e com esse novo ser ela mesma.
“Há um caráter aspiracional vertical, de se impressionar com os
segmentos mais afluentes e todos os símbolos que eles carregam,
mas também existe um aspiracional horizontal, no qual o consumi-
dor quer ter o sentimento de integração a seu grupo social e não de
Fotos: Fernando battistetti/divulgação
Nova loja do Magazine
Luiza em São Paulo
tem salão de beleza,
brinquedos para
crianças e espaço para
shows e eventos; é o
ponto de encontro da
comunidade
HSM Management • Brasil: Presença na Gestão que Dá Certo • Edição Especial Março 2011 25
5. estratégia A conquista dos novos consumidores
Quer pagar quanto?
Foto: divulgação
“No século 21, o consumidor finalmente assumiu o poder. Ele
está mais exigente e mais criterioso.” A afirmação é de Fábio
Mariano Borges, professor de pós-graduação da Escola Superior
de Propaganda e Marketing (ESPM), que enxerga uma mudança
nas relações dos indivíduos com os produtos e serviços que
consomem. Ele afirma que, diante das opções, o consumidor
realiza os movimentos chamados de “trading-up“ ou ‘trading-
-down”, dependendo da ocasião.
“O consumidor faz trading-up quando quer viver uma experiência
e um privilégio, ou seja, em tudo o que é relevante e singular
para ele. Nesses casos, ele aceita gastar mais. Já o trading-down
acontece quando ele quer pagar o mínimo possível por algo que
não tem tanto significado ou importância”, explica. Por exemplo,
quando um executivo viaja a trabalho, ele opta por um hotel
econômico, fazendo o trading-down; quando a motivação é o lazer
após a jornada, ele escolhe uma hospedagem mais confortável,
realizando o trading-up.
Assim como vem acontecendo nos segmentos populares, esse
comportamento das pessoas está ditando as regras também nos
mercados mais sofisticados. “O preço está sendo pensado de
outra maneira, diferente da relação custo-benefício. O consumidor
pagará mais dependendo do que determinado produto ou serviço
signifique para ele e em qual contexto. Essa lógica está obrigando
as empresas a repensar seus conceitos”, afirma Borges. Segundo
ele, o setor hoteleiro entendeu essa relação de exclusividade e
Borges: mudanças nos fatores
distinção. Entre as companhias aéreas, a Emirates atende bem a que motivam a compra
essa necessidade de trading-up, com voos fantásticos, que contam
com suítes nas aeronaves, para quem deseja uma viagem das “mil preestabelecido, a fim de compreender os valores que o orientam
e uma noites” a Dubai. diante de um produto ou serviço. E, para atrai-lo, aqueles que eram
Para capturar esse consumidor mais exigente e seletivo, o considerados canais alternativos de comunicação passam a ser
professor recomenda a utilização de pesquisas etnográficas, nas fundamentais, como as mídias digitais e as ações de patrocínio
quais há uma imersão no contexto do público dentro de um período cultural e esportivo.
adquirir um bem diferente, fora de seu padrão econômico”, observa além da maior qualificação profissional desses cidadãos, o fe-
Jaime troiano, presidente do grupo troiano de branding. nômeno indica que eles estão mais exigentes na hora de ir às com-
se conhecer a multifacetada classe C ainda é tarefa árdua para pras e já provocaram uma revolução no marketing, com hábitos
as empresas, a d é um mistério ainda maior. uma das novidades é que estão sendo bem incorporados pelas empresas brasileiras.
o número de estudantes universitários com essa um dos exemplos clássicos aparece no uso do
origem que, segundo informações da pesquisa O “Vivo Me telefone celular. prática comum entre os usuá-
data popular, ultrapassou a classe a em institui- rios de planos pré-pagos, o ato de ligar para um
ções públicas e privadas. em 2002, havia 180 mil Liga” foi lançado telefone e pedir que a pessoa retorne a ligação
alunos da classe d no ensino superior. sete anos
depois, eles eram quase cinco vezes mais, soman-
pela Vivo por virou negócio na vivo, que lançou o vivo me
liga. Com ele, a operadora envia gratuitamente
do 887,4 mil, enquanto o total de estudantes da conta das uma mensagem de texto para o número dese-
classe a caiu pela metade, passando de 885,6 mil jado (desde que também seja da vivo) pedindo
para 423,4 mil. de acordo com Carla, as mulhe- classes C e D que o destinatário ligue para o número do re-
res das famílias da classe d que não chegaram à metente, mesmo que os créditos deste tenham
universidade agora apostam em seus filhos e se esforçam para que expirado. por sua vez, a concorrente tim, de olho na turma das lan
eles possam chegar lá, estimulando o estabelecimento da primeira houses, criou o infinity Web, serviço de internet móvel de baixo
geração de universitários nesse estrato social. custo. para os especialistas, isso é só o começo.
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