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A primeira fortaleza de Bissau teve, como origem, um acto de pirataria de três
navios franceses cuja tripulação pretendeu construir, num local da embocadura do rio
Geba - já então regularmente frequentado por comerciantes portugueses - um forte
que lhes protegesse a feitoria e porto que ali queriam edificar.
      Através de ofertas ao régulo papel da região, de nome Bacampolco, conseguiram
os nossos negociantes que fosse negada aos estrangeiros a pretendida edificação,
sendo aqueles obrigados, pelos indígenas, a embarcar os materiais de construção que
já tinham colocado em terra.
    Certamente que este acontecimento foi comunicado ao Rei de Portugal, porque D.
Pedro II se apressou, por intermédio do governador de Cabo Verde, a enviar ao régulo
Bacampolco régios presentes, que foram agradecidos por uma carta, datada de 4 de
Abril de 1687, na qual também se comunicava que os portugueses poderiam, à vontade,
construir no porto de Bissau uma fortaleza.
      Ante esta concessão, o primeiro capitão-mor de Cacheu, António Barros Bezerra, logo
enviou Manuel Teles, com alguns soldados e duas peças, para garantir a autoridade
portuguesa naquele local e iniciar a construção de um posto militar, que seria o núcleo de
uma futura fortaleza.
       Para a construção do «forte e outras despesas» foram enviados, de Lisboa,
6.000$000 réis, mas, ao que parece, esta quantia foi absorvida noutros gastos da Província
de Cabo Verde e Guiné.
       Em Lisboa, no dia 21 de Dezembro de 1695, publicou-se um decreto autorizando o
Conselho Ultramarino a encarregar a Companhia de Cacheu e Cabo Verde, recém-formada,
da «administração da fábrica da fortaleza de N.a S.a da Conceição de Bissau» (CHRISTIANO
JOSÉ DE SENNA BARCELOS, Subsídios para a história de Cabo Verde e Guiné. II. p. 114.).
       Meses depois, a 7 de Março de 1696, o Rei confirmou este decreto e, a 17 do mesmo
mês, o Conde de Alvor, como presidente do Conselho Ultramarino, e Gaspar de Andrade,
como administrador-geral da Companhia, assinaram (lbid . p. 123. ). o respectivo contrato para
a construção da fortaleza.
       Já, em 23 de Fevereiro de 1696, o engenheiro das fortificações do Alentejo, João
Coutinho, com a função de Capitão de Engenharia de Cabo Verde e Guiné, ganhando
25$000 réis por mês, tinha sido nomeado para dirigir a construção de um forte em Bissau.
       Após uma curta paragem pela ilha de Santiago, este engenheiro chegou ao seu
destino, onde, imediatamente, traçou um grandioso projecto para a fortaleza que pretendia
construir.
       Este plano não mereceu a aprovação do Capitão José Pinheiro e do Bispo D.
Vitoriano. que pretendiam - certamente guiados pela experiência e conhecimento da
Guiné - uma fortificação muito mais simples e modesta.
    Em 26 de Agosto desse ano, uns escassos dois meses após a sua chegada, morreu
o engenheiro João Coutinho e, ao que parece, com uma certa satisfação do Capitão
José Pinheiro, pois este, num dos seus escritos, comentou que aquela morte «tinha
sido uma providência, porque João Coutinho daria cabo de todos os cabedais, por querer
meia Bissau por fortaleza.
       O Capitão José Pinheiro desenhou, então, o projecto de um forte que se limitava a um
simples quadrado abaluartado, rodeado de uma cava.
       Conforme Lopes de Lima (Ensaios sobre a statistica das Posessões Portuguezas, Livro I, Parte 11, p.
104.), «desde 1690 a Companhia de Cacheu e Cabo Verde começou a fazer muito caso do
porto de Bissau aonde em 1696 por mandado d'El-Reí D. Pedro 2.° se estabelleceu uma    ,
Feitoria Portugueza fortificada, e nesse mesmo tempo allí foi, levado pelo seu zelo
apostolíco, o venerando Bispo D. Fr. Victoriano do Porto, o qual fez construir de pedra a
Igreja Matriz de Nossa Senhora da Candelaria e o Hospicio dos Capuchos, de que já ha
muito nem vestígios existem».
       No dia 16 de Outubro de 1696, com grande solenidade e na presença do bispo D.
Vitoriano da Costa, lançou-se a primeira pedra da futura fortaleza que, como a pequenina
capela construída por Fr. José de Beque, ficava sob a protecção de N.a S.a da Conceição.
       Trabalhou-se, naquelas obras, com o mesmo afinco e titânico esforço que levou os
portugueses de 1500 a espalharem pelo mundo os marcos indestrutíveis da sua presença -
as Fortalezas de Portugal. Assim, dos terrenos lateríticos das proximidades de Bissau
extraiu-se a pedra, que depois foi transportada ou a dorso, de homens, ou a baste de
pequenos burros, ou ainda através das águas nas típicas canoas guineenses, cujo formato
ainda hoje se mantém. Junto às margens do Geba fizeram-se fornos para a preparação de
cal, que ficava ao preço de 1$500 réis por pipa, sendo possível que - conforme se praticava
na construção das fortalezas da Índia - fossem também utilizadas muitas toneladas de
cascas de ostras, pacientemente esmagadas e reduzidas a pó (Segundo LOPES DE LIMA, algumas
das casas de Cacheu eram «caiadas com cal d'ostra, que alli se fabrica bem, e sahe barata». Op. clt , p. 95. Em crioulo
esta cal chama-se «combé».).
     Ao fim de quatro meses, as obras indispensáveis da fortaleza estavam prontas e, meio
ano depois do lançamento da primeira pedra - em Março de 1697 - EI-Rei D. Pedro II foi
informado pelo Capitão José Pinheiro da Câmara que «a fortaleza era importante para
aquella terra, com os seus 140 pés de cada comprimento; que faz em redondeza 560 pés,
com 4 baluartes com suas pontas de diamante, dois para a banda do mar e dois para a
terra; cada um deles pode levar 8 peças de artilharia, fora uma cortina para o mar entre os
dois baluartes, que pode levar 12 peças».
     Numa carta escrita um mês depois, a 17 de Abril, José Pinheiro dava a seguinte e
interessante notícia (SENNA BARCELOS. Subsídios para a história de Cabo Verde e Guiné. II, p. 135.):
     «... a fortaleza de Sua Magestade fica em bom terreno, porque estas águas ficam já da
banda de dentro, que lhe ffirmo a V. S.a que em Africa não tem Sua Magestade outro como
ella porque todas teem falta d'agua e se valem de cisternas; e vendo eu que este gentio
não tinha com que nos fazer mal que em tolher-nos a agua, me resolvi abrir um poço muito
largo, que quiz a minha fortuna que com quatro braças e meia achei agua com abundancia
e a melhor que tem hoje Bissau para beber, isto dentro da fortaleza, que os mesmos
gentios, vendo que abri agua, me pozeram de feiticeiro e ficaram com grande magoa.»
    Muitos anos mais tarde, quase meio século depois, em ofício de 12 de Março de 1752,
Francisco Roque de Sotto Mayor, capitão-mor de Cacheu, referiu-se a esta fortificação do
seguinte modo:
      «Era a dita fortaleza eregida em hú pequeno tezo junto ao principal porto d'aquella
ilha, regularmente feita, e neIla montadas 18 ou 20 pessas de artilharia; seguia-se a
fortificação de marinha, com sete ou outo baluartes, e em cada hü 4 ou 5 pessass
(BERNARDlNO ANTÓNIO ÁLVARES DE ANDRADE. Planta da Praça de Bissau e Suas Adjacentes, p. 73.)
      Voltando à construção da fortaleza, as obras arrastaram-se por mais alguns anos,
possivelmente em acabamentos e construções internas para habitação das guarnições,
além dos melhoramentos que a prática aconselharia.
      Em Dezembro de 1697, dois patachos ingleses fundearam nas águas lodosas do Geba
e pretenderam desembarcar vários produtos para transacções comerciais. O Capitão José
Pinheiro não consentiu e intimou-os a abandonarem o porto, o que foi cumprido.
      No entanto, este acto legítimo do Comandante da Praça de Bissau levou à primeira
revolta dos indígenas da região, que, sob a chefia de um novo régulo, chamado Incinhate,
cercaram a povoação, impedindo o reabastecimento de víveres.
      O Capitão José Pinheiro viu-se na necessidade de pedir socorro aos moradores das
margens do Geba e ao Capitão-mor de Cacheu, Vidigal Castanho, que, prontamente,
acorreu a Bissau com 92 soldados transportados em três lanchas.
     Contactado o régulo rebelde, segundo o relatório de Vidigal Castanho, datado de 21
de Março de 1698, este provou a sua amizade a Portugal e o seu consentimento para a
permanência do forte. No entanto, queria, em troca, a substituição do Capitão-mor José
Pinheiro da Câmara e que lhe fosse pago o terreno onde se construíra a fortaleza, além de
lhe ser garantido o livre comércio com a navegação estrangeira.




    É de salientar a informação do Capitão Vidigal Castanho, referindo que «a fortaleza é
de pequena capacidade, feita de pedra e terra; dizem os que entendem que promete pouca
defesa»...
     Ainda nesse relatório, Vidigal Castanho informava o Rei de Portugal que a maioria dos
soldados da guarnição de Bissau tinha desertado, pelo que deviam ser substituídos com
urgência.
      De acordo com o orçamento económico referente ao ano de 1696-1697, a guarnição da
Praça de Bissau seria constituída pelo Capitão-mor, um alferes ou tenente, um ajudante,
um sargento, três cabos de esquadra, quarenta soldados, um tambor, um condestável e
dois artilheiros, além de vários indivíduos civis com funções burocráticas.
      Em Janeiro de 1698, sendo presentes, além do Capitão-mor José Pinheiro e do
capitão-tenente João de Almeida Coimbra, os escrivães Francisco Lourenço e José Correia
de Sá e o régulo Incinhate, seus acólitos e intérprete, foi lavrado, no Livro de Registo da
Alfândega de Bissau, o auto da compra do terreno onde fora construída a fortaleza,
adquirido pela importância de 300 barafulas, ou seja. 60$000 réis.
      Precisamente um mês depois desta cerimónia, um novo episódio, relacionado com o
comércio livre, provocou outra rebelião dos indígenas.
      O comandante de uma nau holandesa, armada com 26 peças, sob o pretexto de
comerciar com os nativos da região mas com a finalidade de formar, em território sob a
nossa soberania, uma feitoria, fundeou nas águas do Geba. O comandante da fortaleza
intimou o navio estrangeiro a levantar ferro e, como não fosse obedecido, atacou-o a tiro
de canhão, obrigando-o a retirar-se.
      No dia seguinte a fortaleza estava cercada e um emissário dos rebeldes informou o
Capitão-mor que «se continuasse na sua teimosia (o régulo), derrubaria as muralhas,
cortando a cabeça aos moradores»,
      A paz só se conseguiu através de várias concessões, entre as quais a autorização de
livre comércio e a substituição do Capitão-mor José Pinheiro da Câmara pelo Capitão
Rodrigues de Oliveira Fonseca.
      O régulo Incinhate, logo que viu satisfeitas as suas pretensões, escreveu a El-Rei, em
23 de Maio de 1698, agradecendo e pedindo novas concessões, que, em parte, foram
atendidas,
      Ao iniciar-se o século XVIII, o Capitão-mor Oliveira Fonseca teve um conflito com o
gerente de uma firma francesa, estabelecida em Bissau. Esta desavença foi logo explorada
pelos franceses, que, alegando razões sem fundamento, pretenderam construir nas
margens do Geba uma feitoria e um forte com vistas a aniquilarem o comércio e poderio
português em Bissau.
      Assim, em 13 de Março de 1700, surgiu no porto de Bissau um navio de guerra
francês, o Anna, ameaçando o seu comandante que desembarcaria 200 homens para
garantir a manutenção dos direitos da firma da sua nacionalidade e salvaguarda dos seus
concidadãos.
      A semelhante arbitrariedade retorquiu Oliveira Fonseca que impediria qualquer
desembarque e, acto contínuo, mandou que os canhões da fortaleza fossem assestados
sobre o navio estrangeiro. Como um dos princípios da guerra naval daquela época era que
«poderia bastar um só tiro de uma fortaleza para afundar um navio, enquanto que nem cem
tiros de um barco destruiriam uma fortificação», o comandante francês, ante a ameaça dos
canhões portugueses, mudou de ideias. Assim, vendo que não poderia demover o Capitão
Oliveira Fonseca, procurou aliciar os Indígenas para que atacassem a fortaleza.
      Não contou, porém, com a lealdade do régulo Incinhate, que, categoricamente, se
recusou a trair a confiança que o Rei de Portugal depunha nele e nos seus súbditos.
     Foi este o último episódio da fortaleza de N.ª S.ª da Conceição de Bissau.
     Em 1707, o Capitão-mor de Cacheu, Paulo Gomes de Abreu e Lima, num relatório
sobre a Guiné - e que hoje nos parece um tanto ou quanto incompreensível - afirmava que
Bissau era «terra muito ambicionada pelos franceses, que nessa ocasião empregavam os
maiores esforços para ali levantarem uma fortaleza e se tal conseguissem tornar-se-iam
senhores de toda a Guiné». No entanto, apesar destas sensatas afirmações, acabava por
preconizar que a fortaleza de Bissau fosse arrasada.
      D. João V, embebido com o sonho das minas preciosas do Brasil, pura e
simplesmente, em 5 de Dezembro de 1707, mandou demolir a fortaleza de N.ª S.ª da
Conceição de Bissau, o que se realizou em 1708.
      O Capitão-mor de Cacheu, Francisco de Sotto-Mayor, mais tarde, em 1752 (Oficio de 12
de Março. Vide ÁLVARES DE ANDRADE op. cit . p. 74.), explicava a decisão de D. João V da seguinte
maneira:
      «A causa de demolirce foram certas dífferenças que o capitão-mor desta Praça
Santos Vidigal Castanho teve com o capitão-mor da dita ilha, Rodrigo de Oliveira da
Fonseca, sobre materia de mais ou menos interesses nos seus negócios,»
      Em breves dias foi demolida a fortaleza de N.ª S,a da Conceição de Bissau, que
representava não só 20 anos de soberania como também o sacrifício de muitas vidas de
portugueses. A sua artilharia foi enviada para Cacheu, ficando abandonadas 6 peças, que
se consideraram incapazes (Oficio de 12 de Março. Vide ÁLVARES DE ANDRADE op. cit . p. 74.).
      Assim, desapareceu a primeira fortaleza de Bissau, com grande descontentamento de
todos os residentes da região, incluindo os próprios indígenas.
      Estes, através do seu régulo, recusaram sempre aos franceses as necessárias
autorizações para construírem, nas margens do Geba, uma feitoria e forte, alegando que
«haviam dado aquele terreno ao Rei de Portugal e que não faltariam à sua palavra».
      Apesar da insistência francesa e da lealdade dos papéis, os membros do Conselho
Ultramarino, falando em nome do Rei, afirmavam em 1718, perante um pedido para a
construção de uma nova fortaleza, que:
      «Portugal não tinha meios para conservar e sustentar o presídio, e também pela
inconstância dos negros e reis de Bissau, motivos por que tinha EI-Rei mandado demoli-
lo.»
      Em 1723, só devido ao naufrágio de um navio que transportava os materiais de
construção, é que a França não viu realizadas as suas aspirações de ter a sua
bandeira a flutuar aos ventos de Bissau, onde pretendia construir um forte «à viva
força, se necessário fosse». Talvez essa a razão de o Conselho Ultramarino, pouco
tempo depois, ter emitido o parecer de «mandar-se reefícar em Bissau a fortaleza que
nelIa houve», mas o Procurador da Fazenda contrariou a ideia, alegando «não saber
qual seja a utilidade que possamos tirar desta ilha» (Cf. ÁLVARES DE Ar.llRADE. ob. cit., p. 71.). E
mais uma vez foi posta de parte a construção de uma nova fortificação.
      No mês de Abril de 1739 dois navios franceses fundearam nas águas do Geba e a
sua tripulação procurou, por todos os meios, captar as boas graças dos nativos para
poderem construir a tão almejada feitoria e forte.
      No entanto, não foram felizes e, antes de se fazerem ao mar, ameaçaram que
voltariam no ano seguinte e então, com a força dos seus canhões e das armas dos
seus soldados, a bem ou a mal, construiriam uma fortaleza.
      Numa carta escrita ao Capítâo-mor de Cacheu - e que posteriormente chegou ao
conhecimento de D. João V - o régulo de Bissau declarava que «enquanto ele fosse vivo,
jamais a França teria um forte nas suas terras». Mas também, ao que parece, enquanto D.
João V existisse não haveria em Bissau qualquer fortaleza de Portugal.
      Após a morte do régulo Incinhate, em 18 de Setembro de 1746, os franceses foram
autorizados, pelos nativos, a construir, no ilhéu do Reí, uma feitoria fortificada, mas,
apesar disso, El-Reí D. João V manteve a sua vontade, baseado no parecer do Procurador
da Fazenda de que «não se devia levantar de novo a fortaleza» e apoiado na informação do
Conselho Ultramarino de que. para a sua construção, seria «preciso mandar um
engenheiro com patente de capitão-mor e promessa de que findos os trabalhos se lhe
daria o governo de Cabo Verde, o que levava a excluir a ideia de uma nova fortaleza em
Bissau.
      Após a morte de D. João V, o seu sucessor, D. José I - certamente como
consequência do ofício de 12 de Março de 1752 do Capitão-mor Francisco Roque Sotto
Mayor - mandou, em Janeiro de 1753, uma pequena esquadra de quatro navios - N.ª S.ª da
Guia e Santo António, Santa Margarida e Ventura de Amigo - sob pavilhão do Capitão de
mar e guerra Guilherme Kínray, embarcado na nau de guerra Nossa Senhora da Estrela,
com a missão de se construir em Bissau uma fortaleza (Cf. ALVARES DE ANDRADE, ob. cit. p, 77.).
      Esta seria planeada pelo Capitão-engenheiro Francisco Xavier Pais de Menezes,
tendo-lhe sido indicado pelo Ministro da Marinha e Ultramar que: «verá V. Mercê a dita ilha,
tirará um plano della e fará o desenho da fortificação que n'ella se pode fazer, com
.defensa, e sem muitas obras exteriores, e só assim aquellas precisas e necessárias para o
poder pôr em execução quando o dito capítam-mor lhe disser que se pode executar».
      Quando o régulo Incinhate mostrava o maior interesse pela presença portuguesa no
seu chão, o Rei D. João V opunha-se a essa ideia. Após a morte destes dois personagens,
os papéis inverteram-se - o novo Rei de Portugal queria mandar edificar uma fortaleza em
Bissau e o novo Régulo papel de nome Palanca não queria, ou, pelo menos, não se
mostrava interessado.
      Embora contra a má vontade dos indígenas, em 17 de Fevereiro de 1753, .o régulo
Palanca acabou por assinar "um auto de fidelidade a Portugal e de consentimento da
construção de uma fortaleza, cuja primeira pedra foi lançada, com grande solenidade,
nesse mesmo dia.
      Durante cerca de dois meses, muitas centenas de homens trabalharam afincadamente
na construção da nova fortificação, lutando contra o mau clima da região e contra os
constantes atritos com os nativos e, ao que consta, nessas escaramuças morreram 9
europeus e, vítimas do clima, cerca de 500 indígenas e operários.
      A 22 de Março de 1753 as principais e indispensáveis obras de defesa estavam
prontas, mas, oito anos depois, ainda se trabalhava na construção da fortaleza,
desaparecendo, durante este espaço de tempo, as «pyramides com as armas reaes»
enviadas de Lisboa a bordo da nau «Nossa Senhora da Estrela» e que tinham sido
desembarcadas em Bissau.
      Talvez que a lentidão destes trabalhos fosse motivada, pela grande mortandade
dos obreiros, vitimados pelo escorbuto, paludismo e febre-amarela - a que chamavam
o «vómito negro». As mortes chegaram a ultrapassar as dezenas por dia e, entre elas
contou-se a do Capitão-engenheiro Pais de Menezes, que planeou e deu início à
fortificação.
       Em 16 de Novembro de 1753 foi atribuída a primeira guarnição à fortaleza, que ficou
sob o comando do Capitão-mor Nicolau Pinheiro de Araújo, subordinado à capitania-mor
de Cacheu. O armamento atribuído nessa ocasião foi de 34 peças de artilharia - conforme
Sotto Mayor tinha solicitado em 1752 - que foram expedidas de Lisboa em Dezembro de
1753. No entanto, em 22 de Março de 1776, o tenente António Alvares de Andrade, ao
solicitar os «reparos para a artilharia que se acha descavalgada na ditta praça de Bissau»
faz pressupor que as peças existentes eram as seguintes: 12 de calibre 18, 12 de calibre
12, 12 de calibre 6 (todas de ferro) e 6 peças colombrinas de bronze, das quais 3 de calibre
3 e as outras de calibre 6 (Cf. ÁLVARES DE ANDRADE. ob. Cit., pp. 79 e125.).
       Em Janeiro de 1754 a guarnição de Bissau recebeu uma leva de 50 soldados
degredados de Cabo Verde, mas, passados quatro anos, estes estavam reduzidos a 20 - a
maioria tinha morrido e os outros desertaram.
       Nessa ocasião, as obras concluídas em 1753 já ameaçavam ruína. Na falta de um
técnico responsável não só pela reconstrução como também pela conclusão da Fortaleza,
foi nomeado Frei Manuel Vinhais Sarmento, que se limitou a mandar fazer algumas obras,
provisórias e imperfeitas (CRISTIANQ BARCELOS. III. ob. Cit.,. p, 26, indica que «Frei Manuel V. Sarmento deu
começo à reconstrução da fortaleza. segundo um plano seu ».). Em 19 de Julho de 1755, o Conselho
Ultramarino, baseando-se numa carta do Capitão-mor de Bissau, Nicolau de Pina Araújo,
pronunciou-se que «para povoar e fortalecer aquela ilha, era necessario hum enginheiro
para delinear a fortificação e com elle officiaes para executarem e gente para a guarnição».
       Com a data de 15 de Junho de 1757, Frei Manuel Vinhais Sarmento escreveu
(Transcrita no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa. VI (1951) 979) a seguinte carta:
    «... q. está isto em hü total dezamparo: as artelharias q. he a que só existe nesta
praça estão arruinadas, mas não encravadas. som.te depois da morte do deffunto tem
os negros com gr.de ouzadía desmontado quasi todas quebrando carretas. e tirandolhe
as ferrages chamando lhe suas, o que tinhão principiado antes que morresse o cap.m mór
outras estavam em terra desde q. sahirão p' terra.»
       A 13 de Maio de 1758, o Capitão-mor de Cacheu (Cf. ÁLVARES DE ANDRADE. ob. cit.. p. 82.)
indicava para a corte de Lisboa que a direcção das obras da fortaleza devia ser entregue ao
Capitão Anastácio Domingos Pontes, pois era «sujeito em quem concorre o predicado de
ter bastante noticia da sciencia de fortificação e ser pratico d' estes países».
     A situação da Fortaleza, caminhando rapidamente para uma ruína total, foi exposta ao
Rei D. José I, tendo, em 6 de Agosto de 1765, os moradores de Bissau solicitado a
autorização para construírem uma nova fortificação a erigir «na ilha de Bissau ou no ilhéo
que fica defronte».
      E tão confiantes estavam na anuência real, que encarregaram o Capitão-mor da ilha
do Fogo, Manuel Germano da Mata - que se dizia engenheiro - de a planear, o que este fez,
mas «tão irregular, que. examinada por pessoas práticas do paiz, que foram sobre ella
ouvidas, se assentou que não se devia mandar executar» (Ibid . p. 83.).
      D. José I tomou medidas imediatas para que se abandonassem as obras em curso e,
por sua resolução de 12 de Agosto de 1765, foi determinado que se construísse uma nova
fortaleza em Bissau.
      Para isso, em fins desse ano, chegou ao porto de Santiago a corveta «Nossa Senhora
da Esperança» com ordem de arrebanhar, por todo o Cabo Verde e Guiné, os vadios e
condenados por crimes comuns e levá-los para Bissau. Aqui, em regime de liberdade,
trabalhariam nas obras da nova fortificação, recebendo um salário diário de 180 réis, além
da comida e uma ração de aguardente - na altura considerada essencial e indispensável na
luta contra as febres palustres. Muitos anos mais tarde, em 13 de Abril de 1790, João
Gomes Pereira apresentou ao Conselho Ultramarino a seguinte informação (Cí, ALVARES DE
ANDRADE, ob. Cit,. p. 147.):
    « ... (que) em 11 de Dezembro do dito ano (1765) remeti para Bissau na fragata Nossa
Senhora da Penha de França, e nas embarcações da Companhia que a acompanhavão com
720 criminosos com as suas espadas largas e zagaias muito luzentes.»
      Outros escritores referem que o efectivo era formado por 270 vadios e criminosos,
juntamente com 450 soldados retirados das 30 companhias que então existiam pela
Província, além de 1 cirurgião, 25 cabos, 10 pedreiros e 20 carpinteiros, sem contar o chefe
da construção e o seu adjunto, respectivamente João da Costa Ataíde Teive e Tenente de
granadeiros Bernardino Alvares de Almada.
      Este pessoal teria desembarcado em Bissau no dia 26 de Dezembro, tendo sido
transportado numa esquadra de cinco navios, sob o comando de Frei Luís Caetano de
Castro com o cargo de capitão de mar e guerra, constituída pela fragata Nossa Senhora da
Penha de França; nau Nossa Senhora do Cabo; galera São Sebastião, corveta Nossa
Senhora das Necessidades e a escuna (ou corveta) Nossa Senhora da Esperança, além de
um bergantim (Cf. ÁLVARES DE ANDRADE. ob. Cit., p, 87.).
      Com a ajuda de um milhar de indígenas, o então.sarqento-mor Manuel Germano da
Mata, a 30 de Dezembro de 1765, deu «princípio a cortar as árvores e mato e a limpar o
plano para se lançarem as primeiras linhas» (Ibid .. p. 97.) de uma fortaleza de que ele era o
autor do projecto.
      Pouco tempo depois, a Companhia do Grão-Pará - entidade concessionária da
exploração da Província de Cabo Verde e Guiné e cujas despesas da construção da
fortaleza corriam a seu risco - expressou por escrito o seu contentamento pelo «bom
sucesso do princípio da fundação da fortaleza», levantada junto às margens lodosas do
Geba, «a cousa de 100 passos das suas águas».
     Em 11 de Abril de 1766, Germano da Mata teria pretendido modificar o traçado,
avisando a Companhia do Grão-Pará da «mudança que fez na planta do risco que da
Fortaleza levou desta corte». Imediatamente os Directores daquela Companhia
escreveram-lhe, não concordando com essa alteração, pois «verdade he q. o discurso
natural nos quer persuadir q. um quadrado não póde defender bem os lados sem quatro
Baluartes nos anglos; os dous Baluartes q. estão á frente do mar bem defendem essa
parte; porem o baluarte, q. está só no meio do lado na frente do gentio, de q.m devemos
recear continuos assaltos, não duvidamos possão defender os dous flancos lateraes:
porem sempre nos parece q. os Lados Lateraes a esses flancos ficam com fraqueza se por
ahi forem attacados».
     Calcula-se que a primeira fase das obras de construção tivesse importado em 50
contos de réis, mas em vidas humanas, o custo foi elevadíssimo. Mais de 1000 operários e
obreiros - incluindo o cirurgião, o boticário, capatazes, etc, - ficaram para sempre
sepultados no cemitério que existia perto da fortaleza. Devido a essa mortandade -
atribuída ao paludismo e ao «vómito negro» - e ainda ao facto de a Companhia do Grão-
Pará, que pagava os salários e custeava as despesas, ter esgotado os seus recursos, as
obras diminuíram consideravelmente de ritmo, aumentando, em contrapartida, a
indisciplina de operários e tropas, a ponto de ter que desembarcar uma força de marinha,
sob o comando do Capitão-Tenente João da Costa Ataíde Teive, para «disciplinar a tropa e
organizar a gente de trabalho» (Cf. ÁLVARES DE ANDRADE. ob. cit., p. 94.).
     Segundo o tenente-coronel Germano da Mata, quatro meses após o início dos
trabalhos já se levantavam «o quadrado fortificado com 67 braças de lado e 4 baluartes,
que foram designados pelos nomes de Bandeira, Poana, Onça e Balança.




    No entanto, uma testemunha contemporânea refere-se, somente, à existência de «três
baluartes pequenos para terra, e as cortinas da mesma de três palmos de largo, feytas de
pedra e cal...» (Ibid. p. 111.).
Com a retirada de Ataíde Teíve, o autor do projecto, Germano da Mata. assumiu a
direcção da obra, sendo ajudado pelo Capitão-mor de Cacheu, Sebastião da Cunha Sotto
Mayor - visto que o tenente de granadeiros Alvares de Andrade fora chefiar a botica. Além
disso, ajudava também nas obras o Capitão-cabo da Praça de Ziguinchor, Carlos de
Carvalho Alvarenga.
     Em Agosto de 1766, Germano da Mata comunicou para Lisboa que tinha prontas a ser
inauguradas as principais obras defensivas e, meses depois - a 17 de Fevereiro do ano
seguinte - informou que «a obra da' fortaleza se vay continuando na abertura do fosso».
     Ao que parece, a abertura deste fosso deu origem a grandes problemas,
porquanto, mais tarde, numa reclamação apresentada pelo Capitão de engenheiros
Carlos Andreis, afirmava-se o seguinte(Cf. ÁLVARES DE ANDRADE, ob. cit., p. 106.):
     «... que por baxo de dois e tres dedos de terra se encontra huma pisarra e roxa,
que seria percizo, par fazer só o foço determinado, de sessenta palmos de largo e duas
braços e meia de fundo, ao menos dous annos atendendo que no tempo das agoas se
não pode trabalhar.»
     Mas, precisamente um ano após a informação de Germano da Mata, em 14 de
Fevereiro de 1768, o Capitão de mar e guerra João da Silva indicava que «os baluartes
donde se acha a artilharia montada tem dezabado muita parte dellas com as agoas
passadas, e como se não repararão, na occaslão presente pode facilmente dismontar
a artilharia, caindo por terra, pois os ditos baluartes não tem resistencia á calamidade
do tempo».
     No entanto, Germano da Mata continuava a mandar para Lisboa optimistas
informações sobre o andamento dos trabalhos, referíndo-se à conclusão da «casa do
governo a padrasto sobre a porta de armas, os quartéis dos officiaes e da guarnição,
as instalações hospitalares», além de uma pequena capela que passava a ter como
orago S. José.
      A consulta dos documentos da época mostra-nos, porém, uma situação muito
diferente daquela descrita por Germano da Mata.
     Este, ao que parece, era um indivíduo sem qualquer capacidade de trabalho,
incompetente e quezilento - a ponto de um marinheiro euro, peu lhe ter dado com uma
picareta na cabeça, que o ia matando, e, de outra vez, ter sido agredido pelos
operários. No entanto, alardeava profundos conhecimentos e prática, atributos esses
de que era destituído.
     O seu imediato, capitão com exercício de engenheiro. António Carlos Andreis,
era, de facto. muito competente mas, em contrapartida, um alcoólico crónico, de
espírito tempestuoso.
     Entre Germano da Mata e Carlos Andreis havia uma rivalidade enorme e, só
quando era de todo impossível, o que um fazia o outro não desfazia ou dizia mal.
     Esta situação ter-se-la mantido ao longo de alguns anos, até que Germano da Mata,
em 1769, foi obrigado a ir a Lisboa justificar-se dos seus trabalhos, tendo conseguido,
graças a um enorme favoritismo e protecção, juntamente com a imensa propaganda que
fazia de si próprio, obter uma alta recompensa pelos seus trabalhos na edificação da
fortaleza de São José de Bissau.
      Como consequência, o Capitão Carlos Andreis obteve, por decreto de 6 de Novembro
de 1766, o desterro para a ilha de Santiago, donde saiu trinta anos depois, sendo restituído
à liberdade, ao seu soldo e às honras do seu posto por despacho régio de 27 de Outubro
de 1799, isto é, quando já estava às portas da morte.
      Assim laureou-se um incompetente e desprezou-se um técnico de certo valor, numa
altura em que a Guiné tanto precisava de homens válidos. O Governador Sotto Mayor, num
ofício datado de 3 de Junho de 1769, dirigido ao Ministro da Marinha e Ultramar critica
abertamente a acção de Germano da Mata, referindo que a fortaleza «se achava irregular
no que respeita aos terraplenos dos baluartes e cortinas, porque achando-se os ditos
doies baluartes fronteyros à campanha em altura tão proporcionada, que ficam os tiros das
pessas de artilharia orizontaes à campanha, e em algumas partes ainda ficão mais baixos
do que a mesma campanha ... e n'esta forma se achão os ditos doies baluartes do mar com
os de campanha, é trez cortinas a ellas contíguas, que qualquer embarcação do meyo do
porto as domina, como tambem os ditos baluartes», concluindo por responsabilizar o autor
do projecto e director das obras de edificação «deste tão grande descuido achar-se agora
esta fortaleza por todos os lados arruinada. dezabando por húa e outra parte» (Cf.
BERNARDINO ÁLVARES DE ANDRADE. P/anta da Praça de Bissau e Suas Adjacentes. Pp. 107 e seguintes.).
      Aliás a planta da fortaleza de Bissau também não foi muito do agrado do Marquês de
Pombal, que, entre várias coisas, estranhou a falta de canhoneiras, pois Germano da Mata
entendera ser «mais fácil laborar com artilharia por cima dos parapeitos para todas as
partes».
    O primeiro documento que alude à conclusão da fortaleza de São José de Bissau é
datado de 30 de Novembro de 1773. No entanto, jà em 10 de Maio do mesmo ano a Junta de
Administração da Companhia Geral de Grão-Pará e Maranhão tinha providenciado para o
despedimento dos operários e demais obreiros, além de ter proposto a respectiva
guarnição. Esta foi nomeada por decreto real de 28 de Novembro de 1774, que era do
seguinte teor:
      «Relação dos officiaes que Sua Magestade he servido nomear para guarnição da
Praça de Bíssao.
      Para sargento mor da dita Praça o capitão della Luiz da Silva Cardozo.
      Para ajudante da mesma, o cadette do regimento de Setuval Antonio de Braun.
     Para capitão da primeira Companhia de infantaria da guarnição da dita Praça o cadette
do regimento de Setuval José Lufz de Braun.
      Para tenente da mesma companhia Bernardino Antonio Alvares da Andrade.
      Para alferes da mesma o sargento José Joaquim Pereira.
      Para capitão da segunda companhia de infantaria da guarnição da dita Praça Luiz da
Veiga Barros.
      Para tenente da dita companhia Domingos da Veiga.»
Assim nasceu a fortaleza de São José de Bissau. cujo custo de construção atingiu o
montante de 147690$763 réis. No entanto. para que se mantivesse de pé durante os seus
dois séculos de uma história mais ou menos agitada. foi necessário. quase de 50 em 50
anos, reconstruí-la de novo.
      A guarnição da fortaleza era da ordem dos 250 homens, distribuídos por duas
companhias de Infantaria e uma de Artilharia a 80 homens cada. No entanto, os efectivos
andavam à volta de 200 homens, sendo estes, na maioria, desterrados ou mesmo
criminosos, e, no dizer de Lopes de Lima (Ensaios sobre a statistica das Possessões Porluguezas. livro I.
cap. VI, p. 126), «mal vestidos, mal nutridos, mal disciplinados, enervados pelo vício, e pelas
doenças inseparaveis delle, que alli ha longos annos vegetam languidamente, antes para
envergonhar, que para defender a Bandeira Portugueza».
      Antes de embarcar para a Guiné, a 22 de Março de 1776, o Tenente Alvares de
Andrade deu ao Conselho Ultramarino um parecer sobre a situação da fortaleza de Bissau
(ÁLVARES DE ANDRADE. ob. Cit., pp. 79 e 125.), ao qual lhe juntou uma «Relação de que he mais
necessario para a praça de S. José de Bissau pello que pertence á artilharia e munições
para a infantaria».
      Desta relação constava que eram necessárias as seguintes peças de artilharia e
respectivos «prettences»:
      «16 Pessas de artelharia, de 24 ou 36, comlombrinas
      8 ditas de dezoito do mesmo género
      16 ditas de nove
      4 Pessas píquenas para sahirem ao campo. Bailas de 3. 6. 9. 12. 18. 24 ou 36
      Díttas meudas para ce empinharem
      Breu e pó de pedra para se fazerem as pinhas e curdel de piam
      Ferro velho para a mitralha
      Algumas bailas emcadiadas dos sobreditos calibres
      Algumas palanquettas.»
      Entretanto, a fortaleza de S. José de Bissau continuava a desmoronar-se.
      De um relatório de Dezembro de 1777 constava que «... estava completamente
acabada... porém os reparos estão arruinados». No ano seguinte, em 2 de Novembro, o
Capitão-mor de Cacheu, António Vaz de Araújo, escrevia que «a fortaleza de Bissau he de
pedra e cal, tem quatro baluartes, toda mal fabricada, e de pouca duração, e só hum
pedaço que fez o engenheiro António Félix de Amaral está bom; o mais é qualquer
parede»...
      São raras as descrições sobre a velha fortaleza de São José de Bissau onde não
constem alusões que a mesma está em ruínas, e são vários os relatórios que aludem a
importantes obras de restauro e sem os quais as suas muralhas e outras edificações ter-
se-iam desmoronado.
      A vida da fortaleza, quase se pode dizer que até aos nossos dias, decorreu entre
amotinações da sua guarnição e obras de restauro.
      A primeira insubordinação deu-se em 1783, tendo o Comandante da Praça Capitão
José António Pinto, fugido para algures do Geba, conseguindo assim salvar a vida. O seu
substituto foí o Capitão João das Neves Leão, que tomou posse em 1799, mas pouco
tempo depois abandonava aquele cargo, seguindo-se-lhe o Capitão António Cardoso Faria,
que, em 1803, foi envenenado pela soldadesca. Em princípios de 1805 foi nomeado para
comandante da capitania de Bissau e da Praça Manuel Pinto Gouveia, que trouxe uma nova
guarnição, constituída por 150 criminosos retirados da cadeia do Limoeiro, em Lisboa, e 80
vadios e condenados por crimes comuns trazidos de Cabo Verde, os quais, conforme
escreveu Cristiano Barcelos (Ob. cit.. III. P. 326.), juntamente com os «230 soldados
indisciplinados em Bissau formavam um Batalhão de 450 desordeiros».
     Esta escolha fora motivada pela razão de não haver soldados que, voluntariamente ou
por obrigação, quisessem ir prestar serviço na Guiné, nomeadamente em Bissau.
     O facto de, desde 1807, os soldos serem pagos em fazendas - e mesmo assim com
muito atraso - originava constantes protestos das guarnições militares.
     Alegando essa razão, em 14 de Abril de 1811, a tropa da fortaleza sublevou-se contra
o seu comandante, Capitão António Cardoso Figueiredo, exigindo-lhe o pagamento dos
seus soldos, «pois tinham fome e andavam rotos e descalços».
     O Governador de Cacheu teve que arranjar um empréstimo - feito a título particular,
pois não o conseguiu em nome do Governo - para pagar aos sublevados, alguns dos quais
já não recebiam há quatro anos, aliás como sucedia ao próprio Governador.
     Ao que parece, esta intentona fora fomentada pelo comerciante Tomás da Costa
Ribeiro, que, em 12 de Julho desse ano, conseguiu originar nova revolta.
     Cristiano Barcelos (Ibid., p. 173. Consulte-se também a IV parte, p. 72, onde o mesmo autor escreveu o
seguinte: «Caetano José Nozolinl reuniu 60 manjacos e com estes cahíu sobre os soldados indisciplinados, prendendo-
os e restituindo à liberdade o Governador e offíclaes, e assim se restabeleceu o sossego em Bíssau»,)       fez o
seguinte descrição da fortaleza de Bissau, referente ao ano de 1821:
     « ... tinha os muros mui damnificados; em mau estado e telhado do quartel dos
offícíaes e em ruínas o dos soldados, vivendo estes em improvisadas barracas que
construíram de paus e esteiras, estando os muros da fortaleza cheios de furos que
recebiam os paus; n'estas habitações viviam os soldados com suas mulheres gentias,
contando alguns seis mulheres; não havia hospital, nem médico; a egreja, que outrora fora
coberta de telha, estava coberta com palha e as paredes ameaçando ruínas; a artilharia
constava de cincoenta peças, estando onze desmontadas, de calibre 9, 12 e 18; cavalgadas
em reparos novos dez, e as restantes vinte e nove, de vários calibres, montadas em
reparos velhos; os soldados no effectivo de cento e setenta e sete homens formavam três
companhias de infantaria ... »
     Dez anos depois, em 16 de Junho de 1831, na ilha da Boa Vista, Manuel António
Martins, na sua Memória (Transcrita no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa. XIII (1958) 206.), faz a
seguinte descrição da fortaleza de São José de Bissau:
     «Tem huma cappela dentro da fortaleza, aonde hum padre, com o nome de vigário, vai
celebrar o Santo Sacrifício da Missa aos domingos e dias santos, a que assiste a pouca
tropa da praça, e todos os que da povoação querem entrar nesses dias, ou para a ouvir, ou
com esse pretexto, prática esta bem estranha, e que há-de resultar em grande prejuízo.
     O vigário he mandado de Cabo Verde para allí, e geralmente escolhido entre os maos
... como espécie de castigo.
      Tem a praça de Bissau 64 peças em número, famoza artilharia, muita parte della de
calibre 18, reforçadas em 24, algumas de 12, e poucas de 6: e em o numero de 64 entram 6
comlumbrinas de bronze de calibre 9, e duas de campanha de 6.
     De toda esta artilharia, não se acha huma só peça capazmente montada para dar fogo
huma hora succesiva, e assim mesmo a maior parte por terra desmontada ou cahida para a
banda com parte da carreta, excepto todas as de bronze, que nem signal de carretas tem.
     Enquanto ao armamento de tropa, entra em questão de duvida haver doze armas
perfeitas, ou capazes de cada huma dar dous tiros.»
     Devido ao estado em que se encontrava a fortaleza, não é para admirar que, nos
princípios de 1822, se tivesse dado, em pleno porto de Bissau, um ultraje à soberania
portuguesa, e que Senna Barcelos (Ob. Cit., III, p. 278.) descreve da seguinte maneira:
     «Em 25 de fevereiro de 1822 communicaram os membros da Junta da Praça de S.
José aos da Praia o ataque que um batelão e dois escaleres, com tripulantes armados
e com peças de artilharia, deram no porto da mesma Praça à escuna portugueza
Conde de ViIla Flor, alli fundeada, na noite de 21 d'aquelle mes...
     ... Estavam todos já a bordo e a escuna devia deixar esse porto em que foi
atacada por aquellas embarcações, que ficaram atracadas ao costado da refferida
escuna, ao abrigo dos tiros da Praça; cortaram-lhe a amarra e fizeram-se de vela,
sendo conduzida para o canal do Geba, onde estava fundeada uma fragata ingleza
com quarenta e oito peças. Da Praça, de que era capitão-mor João Hygino Curvo
Semedo, não foi possivel socorrel-a por falta de embarcações e pela impossibilidade
de se fazerem tiros, que poderíam metter no fundo a escuna, morrendo não só os
inglezes, mas os portuguezes...
     Parece que esta fragata fora a mesma que na manhã de 4 de Março de 1823
mandara cinco lanchões bem armados atacar a escuna franceza denominada africana,
tentando picar-lhe a amarra. Da Praça acudiram a tempo, fugindo os lanchões debaixo
de um nutrido fogo mandado fazer pelo capitão-mor interino Marcelino Pinto da
Fonseca. A fragata acima referida era a L'Owen Genndower.»
     Em 7 de Abril de 1823 foi nomeado como sarqento-mor da fortaleza o Capitão
Marcelino Pinto da Fonseca e, na ocasião, a guarnição foi reforçada com 45 soldados e
76 degredados da ilha de Santiago.
     A falta de pagamento de vencimentos e a má qualidade de rancho originaram,
em Maio de 1826, nova revolta, que só foi dominada quando fundeou no porto de
Bissau uma fragata inglesa e surgiu um destacamento vindo de Geba com 50
soldados.
     Os rebeldes, perante as imposições da força da ordem libertaram o capitão-mor e
alguns deles entregaram-se, mas a maioria fugiu para o mato. No rescaldo da
revolução, ficaram presos 5 oficiais e 38 soldados, os quais, mais tarde, foram
julgados em tribunal militar e condenados.
Em 1 de Maio de 1835, registou-se mais uma insubordinação militar.
     Os soldados sublevaram-se, prenderam os seus superiores e promoveram-se a
oficiais. Um deles, António Picadas, foi nomeado Governador, e um outro foi
promovido a general! Foi o então capitão Caetano Nozolíni que conseguiu persuadir
os revoltosos a restituírem à liberdade os seus oliciais e a desistirem dos seus
propósitos. Assim, «em 7 de Maio, para que o sossego se conseguisse na Praça,
houve unia convenção entre o governador e os amotinados, fazendo-se um
juramento. pelo qual reciprocamente se obrigaram a esquecer o passado, sendo este
gracioso juramento deferido pelo capelão» (CRISTIANO BARCELOS. ob. cit., III, p. 349.).
     No decorrer dos anos, a fortaleza foi-se arruinando e, em Dezembro de 1837, o
seu poder defensivo era muito reduzido.
     Ante a ameaça de um ataque dos papéis, o Governador Joaquim António da Mata,
após ter ouvido em conselho todas as entidades da terra - civis, militares e
eclesiásticas - e com o apoio unânime, mandou ao comandante de uma corveta
francesa, surta no Geba, um patético ofício em que pedia protecção.
     O oficial francês limitou-se a devolver o ofício e nem sequer lhe deu resposta.
     O almejado auxílio foi então solicitado ao governo da Gâmbia, que, segundo
parece, também não ligou importância ao pedido.
     Coincidência curiosa. Nessa ocasião, o Governador de Cabo Verde e Guiné,
coronel Joaquim Pereira Marinho, sem que tivesse tido conhecimento do que se
passava em Bissau, escrevia para Lisboa (lbid., IV, p.158.), aludindo que as tropas da
Guiné «eram indisciplinadas e bárbaras... caindo aqueles estabelecimentos na
anarquia mais deshonrosa e de maior miséria...» o que, no caso da fortaleza de Bissau,
era absolutamente verdadeiro. Aliás, este governador, tendo estado desterrado,
voluntariamente, em Bissau no ano de 1836, escreveu que encontrara «a Praça em
estado miserável, e que a história dos últimos governadores de Bissau e Cacheu é a
mais deshonrosa. AlIi tudo tem sido roubado, até pedras das plataformas; o
revestimento de contra-escarpa também fora arrancado para construções de casas
dos vizinhos;... a artilharia desmontada e os ouvidos das peças alegradas pelo
pessimo tratamento que tem tido...»
     Em 1840 a fortaleza contava 70 soldados (pouco disciplinados) e estava armada
com 22 peças de artilharia capazes de fazer fogo (CRISTIANO BARCELOS. em ob. cit., IV, p. 271,
indica que nove peças estavam montadas em reparos de ferro.). Mais ou menos nessa ocasião, Lopes
de Lima (em ob. cit.,Livro I, Parte II, p. 103) fez a seguinte descrição:
       «Praça de guerra de S. José de Bissau - Reduto quadrado de boa cantaria, flanqueado
por quatro Baluartes. tendo cem passos de comprido cada uma das faces, cercado todo de
boa cava (que está servindo para hortas) guarnecido com quarenta e tres Peças de ferro e
nove de bronze, de diversos calibres (quase metade dellas desmontadas por falta de
reparos em paíz aonde ha tão excelentes madeiras de graça).
      Dentro da Praça tem Quartel para o Governador - bons Quarteis para duzentos
soldados, - e para os fficiaes correspondentes; -Igreja - Alfandega; - e Grandes Armazens; -
tudo em pedra, coberto de telha; mas carecendo de grandes concertos até as muralhas
que tem quarenta pés de altura (apesar de apparecer todos os annos no Orçamento uma
verba de concertos, que não se vêem); acha-se tambem dentro no recinto um poço secco
desde tempo immemorial, sendo aliás de primeira necessidade, que dentro na Fortaleza
haja um poço, ou cisterna de agoa potavel para a guarnição;... A fortaleza dista uns cem
passos da borda da praia, tendo em frente da porta principal dois grandes Poílões, que
servem de marca aos navios, que vão dar fundo.»
      Segundo o mesmo autor, a guarnição de Bissau, em 31 de Dezembro de 1843, era de
um oficial superior, comandante da Praça, dois tenentes e dois alferes, um primeiro
sargento, quatro segundos sargentos, dois tambores, cinco cabos, três anspeçadas
(praças para impedimentos pessoais), cinquenta e seis soldados, num total de setenta e
cinco homens de força arregimentada de 1ª linha.
      Quando, em Novembro de 1840, se procedia à reconstrução dos baluartes, que
estavam em vias de desmoronamento, registou-se em Bissau, num armazém civil de
aguardente e pólvora, uma violenta explosão que provocou a queda da «casa do governo»,
da capela e de mais um ou outro edifício da fortaleza (CRISTIANO BARCELOS.. ob. cit .. IV. p. 273.).
      Em Novembro de 1842, tendo sido determinado aos indígenas de Bissau que «não se
concertassem nem se levantassem mais casas junto das muralhas da fortaleza», estes
negaram-se a cumprir essa ordem, e, segundo o relatório do governador A. José Torres,
datado de 7 de Junho de 1843(Ibid . pp. 314-315.), «emboscados pelas casas fezeram os
grumetes fogo para a Praça, que rompeu com o da artilheria, obrigando-os a retirar. Até ao
dia 4 de Janeiro atacavam todos os dias a Praça, sendo repellidos... No dia 5 mandaram,
como parlamentarios, dois homens grandes da Povoação, para tratarem da paz...»
      Em 4 de Janeiro de 1844 desembarcou em Bissau um Conselho de Investigação
(Era constituído pelo comandante do Brigue «Vouga», Francisco Assis da Silva, Chefe do Estado-maior da
Província Tenente Rosado de Faria e pelo escrivão da Junta de Fazenda de Cabo Verde, Evaristo de Almeida.)
para apreciar os casos de indisciplina da guarnição. Segundo o relatório que este
Conselho elaborou, no tocante a instalações, «os aquartelamentos estavam em
ruínas, e que os soldados haviam construído na esplanada mais de 40 palhotas, onde
viviam com as suas mulheres, ou exerciam a profissão de comerciantes. Além disso,
os muros da fortaleza estavam sem reboco e o fosso entupido e muitas palhotas da
população avançavam até junto das muralhas, impedindo o emprego da artilharia».
      Pretendeu-se então pôr em vigor varias medidas tendentes a não só impedir a
construção de mais palhotas no interior da fortificação, como também a desafrontar as
suas muralhas. Mas, precisamente cem anos depois, a situação ainda se mantinha!
Aliás, já em Abril de 1842 tinha sido recebidas em Bissau instruções do governador-
geral para que se «abrisse o fosso e a ponte levadiça na parte que dá acesso à Praça;
que (se) evitasse a construção de novas casas junto à mesma Praça que pudesse
prejudicar a sua defesa» (CRISTIANO              BARCELOS, ob. cit .. IV. p. 280. Na ocasião foi dada ordem ao
governador de Bissau que «diligenciasse ajuntar materiais para se construir no ilhéu do Rei o forte que se mostra na
planta levantada pelo tenente de engenheiros António Maria Fontes Pereira de MeIo». Cf. C. BARCELOS. ob. cit., IV, p.
280.).
     Foi a revolta dos papéis e grumetes de 1844 - e que durou poucos meses: de 11
de Setembro a 29 de Dezembro - que originou a construção de uma «palissada,
protegida interiormente por uma parede de taipa», cercando parte de Bissau, ou seja,
ligando a fortaleza ao pequeno forte do Pigiguiti, também em construção e formado
por um semibaluarte, onde se montaram velhas peças de artilharia.
        Ao que parece, duas destas peças foram, já em nossos dias, levadas para junto
do Museu de Bissau, ficando a ladear a porta principal do edifício; uma outra teve
diferente serventia: foi enterrada na avenida marginal, junto ao cais do Pigiguiti,
ficando só com o cascavel, a faixa e parte da culatra de fora, para servir de cabeço de
amarração. É possível que as restantes tivessem fim ainda mais inglório.
        Foi tal o interesse dos habitantes de Bissau na construção da «muralha», que se
levantou junto à palissada, que, segundo Cristiano Barcelos, «até as senhoras
rivalizavam com os homens, transportando ellas também pedra e barro para essa
construção da muralha».
        Para os papéis a revolta terminou três meses depois da sua eclosão, numa
cerimónia realizada na esplanada da fortaleza e que se caracterizou pela sua
originalidade(Consulte-se, para maior desenvolvimento sobre esta rebelião dos indígenas, C. BARCELOS. ob. dt ..
IV, pp. 25 a 38.).




     Seguidamente, os assistentes a semelhante cerimónia beberam aquela mixórdia
e, segundo as crenças indígenas - pelos vistos também perfiIhadas pelos europeus - a
paz ficaria feita e manter-se-ía por muitos e muitos anos.
     Mas, ao que parece, ou à mistura faltaram alguns ingredientes ou nem todos os
Num misto de religiosidade e de paganismo, um sacerdote cristão e uma
sacerdotisa (??) indígena, chamada Balobeira, benzeram uma bacia feita da casca de
uma enorme cabaça, onde tinham sido postos aguardente, balas, pólvora e outros
amuletos nativos.
     Seguidamente os assistentes a semelhante cferimónia beberam aquela mixórdia
e, segundo as crenças indígenas – pelos vistos também perfilhadas pelos europeus –
a paz ficaria feita e manter-se-ia por muitos e muitos anos.
     Mas ao que parece, ou à mistura faltaram alguns ingredientes ou nem todos os
assistentes cumpriram na íntegra todo o ritual, e o resultado foi que, passados uns
quatro meses, a paz já tinha desaparecido da região de Bissau.
     Em Maio de 1845, a guerra estava generalizada a toda a ilha, e os indígenas
içavam a bandeira francesa, salvando-a com tiros de peças (roubadas nos nossos
fortes).
     O gentio pretendeu, na ocasião, destruir a recente palissada de Bíssau, e só
perante a ameaça dos canhões da fortaleza e do brigue Vouga é que desistiram das
suas intenções.
     No ano seguinte celebrou-se um tratado de paz com os papéis e grumetes - que
não duraria muito tempo, como era habitual - e adquiriu-se o porto de Bandim. Além
disso, registou-se, ainda em 1846, a conclusão do pequeno forte do Pigiguiti,
constituído por um simples reduto quadrado: feito a pedra e cal, em que cada lado
tinha cerca de 15 metros, sendo o do lado de terra rasgado num amplo acesso. Em 7
de Abril de 1846 o tenente-coronel Nozolini enviou ao governador-geral de Cabo Verde
e Guiné o seguinte ofício:
     «Participo a V. Ex.ª que o forte que offereci fazer no sítio de Pigiguití se acha
quasi prompto, tudo de pedra e cal com casa para a guarda e arrecadação das
munições de guerra; no dia 1 de Maio pretendo arvorar alli a bandeira nacional e levar
para ali duas peças de artilharia. V. Ex.ª ordenará o nome que quer se ponha ao dito
forte» (Em CRISTIANO BARCELOS, ob. cit., p. 73.).
     Este forte devia-se aos esforços do tenente-coronel Caetano NozoIini (Este oficiaI
nasceu em 1801 na ilha do Fogo e morreu em 22 de Julho de 1850 na Vila da Praia. Assentou praça em 1 de Maio
de 1816, tendo sido promovido: a alferes em 1816; tenente em 1823; capitão em 1825; major em 1837; graduado em
tenente-coronel em 1842 e promovido a este posto em 1843. Possuía os hábitos de Aviz e da Conceição.),
                                                                                       que
há muito estava radicado em Bissau como importante homem de negócios, tendo
prestado relevantes serviços à Guiné, razão por que foi proposta para esta fortificação o
nome deste oficial, o que não foi aceite pela corte de Lisboa, por motivos políticos.
     No dia 7 de Abril de 1845 o capitão de artilharia Tavares de Almeida, com «14 artistas
entre carpinteiros de banco e de machado, pedreiros e canteiros», iniciou o trabalho para a
construção de um forte no Ilhéu do Rei. Depois de ter sido aberto um fosso e construída
uma face dos redutos, as obras foram, a 16 de Maio, interrompidas e nunca mais
continuaram.
     No início de 1847, começou-se a construir, dentro da fortaleza, um novo quartel,
substituindo as antigas edificações, que estavam completamente em ruínas. A falta de
verbas, porém, fez interromper as obras, que só foram concluídas mais tarde, em 1851,
graças a dádivas do Governador Major Lobo de Ávila, de Nicolau Monteiro Macedo e de seu
irmão João Monteiro Macedo. além de mais alguns comerciantes.
      A 5 de Julho de 1853, a guarnição da fortaleza, por um motivo fútil, revoltou-se. O
Governador interino, Major Maria Morais, na impossibilidade de dominar a rebelião, pediu
socorro a um brigue francês, de nome Pellimure, sob o comando do Capitão Augusto
Bosse.
      Uma força de marinheiros franceses desembarcou e após ter levado os revoltosos a
submeterem-se ocupou, por um escasso mês, a fortaleza de S. José, enquanto se
aguardava a chegada do vapor Mindelo, trazendo de Lisboa um contingente de tropas.
      Durante a estadia dos franceses em Bissau, o Comandante Bosse mandou içar a sua
bandeira na secular fortaleza, mas, ante a oposição de todos os portugueses, militares e
civis, teve que desistir da sua ideia.
      Como consequência da revolta da guarnição da fortaleza, faleceu, no recontro com os
revoltosos, o tenente da Marinha Imperial de França Gillardaie. O seu corpo ficou
sepultado à entrada da capela da Praça de S. José de Bissau e, mais tarde, a viúva daquele
oficial solicitou a anuência do Governo Português para que fosse colocada uma pedra,
simples mas durável, sobre a campa do seu marido.
      Ao que parece, este tão justo e humano pedido nunca se concretizou, pois não
encontramos, nem consta da tradição popular, qualquer alusão à existência de alguma
lage sepulcral na velha fortaleza, e não há, em todo o recinto da sua esplanada, a mais
pequena memória que assinale aquela sepultura.
      No dia 26 de Abril de 1859 morreu na fortaleza de Bissau o grande português e
guineense Honório Barreto, na ocasião governador da Guiné, por decreto de 30 de
Novembro de 1858 (Cf. JAIME WALTER, Honório Pereira Barreto, memória n.º 5 do Centro de Estudos da Guiné
Portuguesa, Bissau, 1947.).
      Hoje, nem uma singela placa assinala tão infausto acontecimento e recorda a memória
de um dos mais ilustres governadores desta Província - que tanto pugilou por tudo quanto
dizia respeito à Guiné e sua soberania portuguesa - e que teve um especial interesse pela
fortaleza de São José de Bissau, mandando restaurar as suas velhas muralhas e melhorar a
sua artilharia, além de lhe ter dedicado, ao longo da sua vida política, várias referências e
descrições, uma das quais na Memória (HONÓRIO BARRETO. Memória sobre o estado actual da
Senegâmbia Portuguesa, escrita em Cacheu em 1842 e publicada em Lisboa em 1843.) que publicou em Lisboa
e que, segundo um seu biógrafo (JAIME WALTER. ob. cit., p. 29.), é um «livro modelo de verdade e
patriotismo, e ainda de actualidade flagrante».
      Da referida memória transcrevem-se as seguintes palavras:
«Bissau é uma praça situada na Ilha deste nome. e construída segundo o systema de
Vauban; mas não foi acabada. Não tem obras algumas exteriores, á excepção dos
fossos já quasi entulhados, e aonde se planta algodão, milho, e indigo. Teve contra
escarpa mas parece que ella e as lages das plataformas foram arrancadas para se
fazerem algumas casas dos Particulares. - Dentro ha os edifícios seguintes: - O
Quartel da tropa, que está quasi a cair, e por isso a maior parte dos soldados moram
em palhoças; - o indecente quartel dos Offíciais, aonde chove como na rua; - o arrui-
nado armazem do Governo; - e a pequena, e destelhada Capella com invocação de S.
José, que é o Orago da Praça. O Governador mora no quartel dos Officíais com uns
quartos pequenos, e ridiculos. Deixou-se arruinar o quartel do Governo, que não era lá
muito boa cousa, e que uma explosão de pólvora apenas destelhou, e lhe abalou
algumas paredes podia então ser composto com pouca despeza.
     Até 1912, segundo Senna Barcelos, estas nove peças - cujos reparos tinham sido
adquiridos por Honório Barreto, em 1837, ao governador da Gâmbia - eram as únicas
da fortaleza de S. José de Bissau que podiam fazer fogo.
     Pouco depois da morte de Honório Barreto - que foi sentida em toda a Guiné - a
cidade de Bissau foi visitada por um diplomata e escritor, Francisco Travassos Valdez,
que fez a seguinte descrição da fortaleza de S. José (ln Africa Occidenlal. p. 313.):
     «A praça de S. José de Bissau, com os seus poílões (erio exdendron anfractorum),
árvores gigantescas que se erguem com magestade nos quatro baluartes, e que os
abrigam com a sua sombra, sendo de taes dimensões que uma d'ellas tem 18 metros
de perimetro na maior grossura, está situada na foz do rio Geba, e foi construida no
anno de 1766, reinando el-reí D. José I.
     Até 1912, segundo Senna Barcelos, estas nove peças - cujos reparos tinham sido
adquiridos por Honório Barreto, em 1837, ao governador da Gâmbia - eram as únicas
da fortaleza de S. José de Bissau que podiam fazer fogo.
     Pouco depois da morte de Honório Barreto - que foi sentida em toda a Guiné - a
cidade de Bissau foi visitada por um diplomata e escritor, Francisco Travassos Valdez,
que fez a seguinte descrição da fortaleza de S. José (ln Africa Occidenlal. p. 313.):
     «A praça de S. José de Bissau, com os seus poílões (erio exdendron anfractorum),
árvores gigantescas que se erguem com magestade nos quatro baluartes, e que os
abrigam com a sua sombra, sendo de taes dimensões que uma d'ellas tem 18 metros
de perimetro na maior grossura, está situada na foz do rio Geba, e foi construida no
anno de 1766, reinando el-reí D. José I.
     Até 1912, segundo Senna Barcelos, estas nove peças - cujos reparos tinham sido
adquiridos por Honório Barreto, em 1837, ao governador da Gâmbia - eram as únicas
da fortaleza de S. José de Bissau que podiam fazer fogo.
     Pouco depois da morte de Honório Barreto - que foi sentida em toda a Guiné - a
cidade de Bissau foi visitada por um diplomata e escritor, Francisco Travassos Valdez,
que fez a seguinte descrição da fortaleza de S. José (ln Africa Occidenlal. p. 313.):
     «A praça de S. José de Bissau, com os seus poílões (erio exdendron anfractorum),
árvores gigantescas que se erguem com magestade nos quatro baluartes, e que os
abrigam com a sua sombra, sendo de taes dimensões que uma d'ellas tem 18 metros
de perimetro na maior grossura, está situada na foz do rio Geba, e foi construida no
anno de 1766, reinando el-reí D. José I.
   Do seu princípio teve alojamento para o governador, bons quarteis para 200
homens e officíaes correspondentes, igreja da invocação de S. José, alfandega,
grandes armazéns, e um poço com água potável. Mas depois de tudo isto feito com
grossos capitaes, pela necessidade que houve de conduzir de Lisboa muitos operários
e grande parte dos materíaes, bem como os vasos de guerra contra o gentio papel e
balanta, e para proteger a edificação da praça, que referem escríptores antigos custou
a vida a mais de 2 000 portugueses, chegou este estabelecimento a uma decadência
tal que ainda ha bem pouco tempo só lhe restava um casarão construido de pedra e
barro, aonde o governador e officiaes estavam pessimamente alojados e nas peiores
condições higienicas, um quartel para soldados quasi em ruínas e em grande parte
descoberto, uma mesquinha capella, algumas miseraveis barracas cobertas de palha,
destinadas ás mulheres dos soldados, e um poço cheio de entulho!
      Ultimamente porém, além de se estabelecer uma nova tarifa para os soldos dos
officiaes da provincia de Cabo Verde, destacados na Guiné portugueza, dando-se-lhes
de augmento o equívalente á metade dos seus vencimentos, têm tido certo incremento
as obras militares.
      O governador geral Fortunato José Barreiros ordenou que se procedesse á
reparação da forte do Pigiguiti, da tabanca e da palissada, e auctorizou a construção
de uma parede (guarda fogo) no paiol da pólvora.
      Sob a direcção do activo e íntelligente governador de Guiné, Antonio Candído
Zagallo, reconstruiu-se o quartel militar, comprehendendo alojamentos para os
soldados e officiaes inferiores, arrecadação e cozinha, e começaram-se também as
obras para a reconstrução da casa de residencia dos governadores, cujo madeira-
mento foi offerecido gratuitamente pello fallecido commendador Honorio Pereira
Barreto.
      Considerada em si, aquelIa praça, formada por quatro frentes abaluartadas,
traçadas sobre um quadrado de 100 metros aproxímadamente de lado, com muralhas
de 10 a 12 palmos de elevação sobre o fosso que a circunda, não passa de uma
pequena povoação mal alinhada, com algumas casas palhoças, outras de barro, e bem
poucas de solida construção. Tem por limites nas duas extremidades de ENO e SSO,
na primeira, uma palissada, na segunda uma tabanca, que ambas fecham a fortificação
que a defende, e lhe fica superior pelo lado do N; ao NO, serve-lhe de limite o rio de
Bíssau.»
      Quase no final do século XIX, em Fevereiro de 1890, os papéis e qrumetes de
Bissau rebelaram-se e, a 22 desse mês, atacaram a povoação, tendo sido repelidos. A
luta prosseguiu até Março de 1892, tendo custado a Portugal a vida de muitos dos seus
militares, dos quais dois capitães, um tenente e um alferes.
      Em Dezembro de 1893 os papéis recomeçaram a guerra, mas no espaço de alguns
meses foram subjugados, em parte devido aos vários disparos dos canhões da
fortaleza, em parte devido ao revés que sofreram quando, a 7 de Dezembro, atacaram
Bissau e foram repelidos.
    Em 28 de Novembro de 1893 o gentio de Bissau assassinou, não muito longe dos
muros da fortaleza, um civil, natural de Cabo Verde, fornecedor de pão e de géneros
para o exército.
     Seguidamente os papéis e grumetes da ilha de Bissau sublevaram-se. Sendo, por
portaria n.º 127 de 1 de Dezembro, declarado o estado de guerra e autorizado «o
bombardeamento do interior da praça para fora da mesma contra os seus habitantes»
() Em Revista Militar, ano de 1897, p. 518.).
      Da fortaleza foram efectuados muitos disparos «dirigidos para as differentes
partes da ilha, tanto com as peças de artilharia como com as espingardas Snyder»,
parecendo então que a rebelião tinha si sufocada. No entanto,. os nativos, dias depois,
atacaram com violência a cidade de Bissau, sendo a acção descrita (Alferes MIGUEL
ANTÓNIO PIMENTEL, A guerra de Bissau em 1894, in Revista Militar, ano de 1897.) por um oficial, que tomou

parte activa na defesa, da seguinte maneira:
      «No dia 7 de Dezembro, seriam cinco horas da manhã, quando a fortaleza foi
surprehendída pelo inimigo em numero provavel de 3 000 homens (papeis e grumetes), que
durante a noite anterior, por um qualquer descuido da parte da guarnição da praça e
fortaleza, se haviam aproximado das muralhas encobertos com os tarafes (matto), a uma
distancia de 50 metros, pouco mais ou menos e entre o Pyjiguity e o baluarte da Onça;
travou-se então um renhidissimo combate entre os revoltosos e a guarnição da praça,
fazendo eu nessa ocasião parte da força postada no denominado baluarte da Onça, junto
com o meu illustrado camarada tenente Graça Falcão, o qual então se entretinha com
algumas peças Krupp de 7C m/1882 com que escangalhou ainda parte das paredes dos
muros do cemiterio e creio que as cabeças de alguns papéis, enquanto eu me entretinha
com a minha espingarda Snyder ...
      Foi tal o effeito produzido por tão renhido ataque de 7 de Dezembro, causado pelo
demasiado estrondo das bocas de fogo e fuzilaria, que aterrorizou extraordinariamente
todo o pessoal estranho áquelle serviço e que então se achava no interior da praça. e
muito especialmente o pertencente ao sexo feminino...
      Como felizmente a boa estrela favoreceu sempre as nossas forças, viram-se então os
rebeldes na dura necessidade de retirar em debandada deixando a praça e ainda o campo
livre, do que elles nada gostaram...
      Depois do referido ataque deram-se mais alguns pequenos combates de mais ou
menos importância, mas não tão importantes como aquelle, nos mezes de janeiro e
Fevereiro, e alternadamente até á saida da columna para fora da praça ...
      ...Pelas tres horas da tarde do mesmo dia (27 de Abril)... surgiram os rebeldes nas
alturas fazendo fogo vivo. A este ataque responderam os auxiliares que se portaram
razoavelmente bem, sendo o inimigo repellido pelos tiros da fortaleza e do fortim do
Pyjiguity.»
      A guerra de Bissau do ano de 1894, que foi pelo autor anteriormente citado, referida
como «uma das mais importantes que nas possessões ultramarinas portuguezas se têem
realizado nos ultimos anncs», terminou com a completa derrota dos gentios em Bassim no
dia 10 de Maio, sendo a paz assinada em 22 do mesmo mês, numa cerimónia realizada no
interior da fortaleza de S. José de Bissau, na presença do Governador, de muitos militares
e povo.
      Data sensivelmente do final do século passado a seguinte descrição do capitão
Barahona e Costa, feita na Revista de Engenharia Militar de 1901:
«A fortaleza de S. José de Bissau, quando ali cheguei, também inspirava pouca
confiança aos seus defensores. Basta dizer que o parapeito estava quase destruído, acima
do terraplano de circulação. D'este modo os pretos rebeldes podiam bem alvejar as
reduzidas tropas da guarnição que fomos encontrar exaustas por sucessivos alarmes.
     A densa vegetação que circundava a praça permitia que o inimigo se pudesse
aproximar sem ser visto.
     O artilhamento da praça era simplesmente mesquinho, para não dizer outra coisa.
Basta citar o facto de termos ido encontrar ali peças de artilharia assestadas no
parapeito sobre reparos constituídos por grossas lages postas de cutelo!
     Tanto o fortim de Pigiguiti como o forte de S. José foram convenientemente
reparados durante o tempo que estive na Guiné e o artilhamento foi muito melhorado,
o que não obstou a que poucos annos depois já ali se vissem as peças de artilharia
amarradas com cordas aos respectivos reparos!
     Os capitães de artilharia Joaquim de Freitas Ramos, Jacinto I.Santos e Silva e
     Viriato Fonseca envidaram patrióticos esforços para organizar de vez o material
de guerra da Guiné em condições favoráveis á defensa. Como se vê, porém, ali tudo
muda rapidamente...
     Tendo citado aquelles tres offícíaes, não quero deixar no olvido o nome do
valente capitão Lage, que em 1891 comandava a fortaleza de Bissau.
     Quando em 1891 fui servir na Guiné, encontrei a fortaleza de S. José de Bissau
quase completamente arruinada...
     Durante a minha estada na Guiné (1891-1892) procedi a importantes trabalhos na
fortaleza de S. José de Bissau, que restaurei em grande parte, pondo-a em condições
de resistir ás sortidas do gentio irrequieto que a rodêa.
     O forte de S. José de Bissau tem 4 faces abaluartadas, dispostas segundo os lados de
um quadrado...
     As muralhas teem 12 metros de elevação sobre o fosso que a circunda. Este fosso
tinha a escarpa revestida, mas quando ali cheguei achava-se quase entulhado com os
escombros da muralha e os revestimentos do fosso tinham desaparecido.
     Honório Barreto, que foi governador da Guiné, assevera, n'uma memória que escreveu
sobre a Guiné, que as pedras que guarneciam a contra escarpa, e as lages das plataformas
de artilharia foram roubadas para se fazerem algumas casas particulares ...
     ...em cada um dos baluartes, ao centro, havia gigantesco poilão (erio exdendron
anfractorum) que lhes dava farta sombra.
     …o tronco de um desses gigantes mede na base cerca de vinte metros de perímetro.
     ...a povoação de Bissau fica apertada entre o forte e uma cortina que liga o baluarte da
Onça ao fortim do Pigiquiti, nome pelo qual em 1891 era conhecido o antigo forte Nozolíni,
do qual, alíaz, só existia a face que olha para a campanha.»
     Durante alguns anos uma paz relativa reinou em Bissau e a fortaleza de S. José de
Bissau pouca acção teve no desenrolar das campanhas de 1908 - se bem que tivesse
alojado no seu interior grande número de militares que tomaram parte na Campanha de
Bissau, que foi, para todas as nossas tropas que até então tinham actuado na Guiné,
aquela que mais baixas causou.
Em 1913 houve grande alvoroço entre os moradores de Bissau, porquanto a paliçada
que ligava a fortaleza ao forte de Piguiti fora mandada demolir. Esta medida foi
considerada altamente prejudicial à cidade pois, segundo se escreveu ao Ministro do
Ultramar, «a defesa desta ficaria só apoiada pela velha fortaleza de S. José».
      Nos acontecimentos políticos provenientes da mudança de regime em Portugal, em
1910, e durante as guerras mundiais de 1914-1918 e 1939-1945, a acção da velha fortaleza
foi de pequeno relevo e, desde então, praticamente só serviu de aquartelamento e depósito
de tropas.
      Fotografias existentes nos arquivos do Quartel-General de Bissau, datando de há
pouco mais de um quarto de século, mostram a fortaleza de S. José com as suas muralhas
desmoronadas, as edificações em ruínas, aparecendo, entre os destroços, ou quase
cobertas pelo capim, uma ou outra peça.
      Para se celebrarem as comemorações do quinto centenário da descoberta da
Guiné, a fortaleza foi parcialmente reparada, dado que algumas das principais
cerimónias desenrolar-se-iam no interior das suas seculares muralhas.
      No dia 1 de Janeiro de 1946 começaram essas comemorações, que abrangeram
toda a Guiné e às quais Portugal inteiro, desde o Minho a Timor, se associou.
      A primeira cerimónia teve lugar às oito horas desse dia com o içar, pelo
comandante da Guarnição Militar, Major Pedro Pinto Cardoso, da Bandeira das
Descobertas (Esta bandeira encontra-se emoldurada na Biblioteca do Quartel-General do Comando Territorial
Independente da Guiné.). Ao acto prestaram honras militares forças da Armada, do Exército
e do Corpo da Polícia de Segurança Pública.
      Finda a salva de 21 tiros, Sua Excelência o Governador, Comandante Sarmento
Rodrigues, proferiu a sua célebre «Mensagem do Baluarte» (Em Boletim Cultural da Guiné
Portuguesa, I (1946) 349-352.). que começa com as seguintes palavras:
    «do alto deste baluarte, onde a bandeira portuguesa sempre com honra se
ergueu... »
     Seguidamente as forças em parada desfilaram e inaugurou-se, na esplanada da
fortaleza de S. José de Bissau, um pequeno monumento dedicado «aos heróis da
ocupação e pacificação da Guiné», iniciando-se, assim, as cerimónias comemorativas
do quinto centenário da Província.
     Em 1947 desmoronaram-se alguns lanços das muralhas da fortaleza e, no ano
seguinte, deu-se a derrocada das edificações do Pavilhão dos oficiais e arrecadações
do material de guerra.
     Dois anos foram necessários para se reconstruírem as muralhas e se demolirem
as ruínas das edificações. Depois, em 1951, começou a construção de duas moradias,
que substituíram o velho «Quartel de officiaes» que há cem anos, pouco antes da sua
morte, o governador Honório Barreto mandou reconstruir.
     Durante anos e anos os quartéis da fortaleza serviram para alojar unidades
militares, quer da guarnição de Bissau, quer em trânsito para o interior da Província,
sendo a última unidade que se abrigou no interior das velhas muralhas o Batalhão de
Intendência da Guiné.
Na luta que hoje se trava contra um inimigo alentado e bem remuniciado por
países estrangeiros, têm sido capturadas muitas toneladas de armamento. O Gabinete
Militar do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné promoveu uma exposição
pública do material capturado e escolheu como local mais representativo para a
apresentação desses troféus de guerra - que testemunham bem o inegável apoio do
mundo comunista aos terroristas da Guiné - o interior da velha fortaleza de S. José de
Bissau, espalhando pelo seu recinto, misturadas com seculares canhões, as mais
modernas armas de fogo.
Após esta exposição, em 1969, a fortaleza - vulgarmente chamada da Amura, ou seja, o
nome em crioulo de muralha - passou a servir de sede ao Comando-Chefe das Forças
Armadas da Guiné e, praticamente, a vida política e militar da Província voltou a
irradiar, para todos os pontos guineenses. da antiga «casa do governo» da fortaleza de S.
José de Bissau.
     Hoje, uma ponte de características modernas e simples, atravessa o único troço de
fosso, existente junto à face poente, dando acesso à porta de armas, que está ladeada por
dois belos exemplares de canhões belgas, fundidos em 1757 por L. Lefache, e por duas
guaritas de cimento armado, estas sem qualquer interesse artístico.
     Um portão de ferro, tão modesto e simples que talvez fosse rejeitado em qualquer
quinta um pouco mais abastada, substitui a porta que a fortaleza certamente devia ter
possuído e que a riqueza de madeiras da região impunha.
     O túnel de passagem é baixo e curto, com uma curvatura de tecto pouco pronunciada.
Nas suas paredes laterais existem duas lápides, modernas e de discutível bom gosto. A da
direita tem o escudo da Guiné, mas com a tradicional «negrinha» (D. Afonso V, como símbolo da
posse da Guiné. fazia uso de um bastão de marfim. rematado por uma cabeça de negra. Este bastão era conhecido pelo
DOme de cnegrinha,. e foi. mais tarde. adoptado como emblema heráldico da provlncla da Guiné. sendo mantido pela
portaria ministerial de 5 de Maio de 1935.)
                                 muito se assemelhando a um canhão - erro normalmente
seguido e que dá origem a outra interpretação deste símbolo tendo gravadas as seguintes
palavras:
   FORTALEZA DE S. JOSE DE
   BISSAU
   PRIMEIRAMENTE CONSTRUIDA EM
   1696 PELO CAPITAO-MOR JOSE PINHEIRO.
   FOI INICIADA A SUA RECONSTRUÇAO
   EM 1753 SEGUNDO OS PLANOS DE FREI
   MANUEL DE VINHAIS SARMENTO E CONTI
   NUADA EM 1766 COM A TRAÇA DO COR MANUEL
   GERMANO DA MATA
   RECONSTRUIDA PARCIALMENTE EM 1916
    Ao ler-se esta lápide quase se pode afirmar que, em cada linha, há um erro.
   A primeira fortaleza que existiu em Bissau tinha o nome de Nossa Senhora da
Conceição, a padroeira de Portugal e orago da capela da fortificação que foi mandada
demolir, completamente, por D. João V em 1707, e põe-se em dúvida se, meio século
depois, teria sido reconstruída.
Deve-se a traça da segunda fortaleza de Bissau ao Capitão-Engenheiro Pais de
Meneses (Cf. ofldo do Ministro da Marinha e Ultramar. transcrito por ÁLVARES DÊ ANDRADÊ. ob. cit., p. 77 e indicada na
pág. 489 deste trabalho.) e foi só após a morte deste que Freí Vinhais Sarmento, e por algum
tempo, foi nomeado para a direcção das obras da fortaleza. Mas, como se indicou,
tudo quanto construído sob a sua direcção foi provisório e ficou imperfeito. Da leitura
de vários documentos verifica-se que a segunda fortaleza de Bissau estava de pé
quando a Companhia do Grão-Pará expressou por escrito o seu contentamento pelo
«bom sucesso do princípio da fundação da fortaleza»( GERMANO DA MATA ~ categ6r1co ao
afirmar que. em 30 de Dezembro de 1765 deu «princípio a cortar as árvores e matos e a limpar o plano para se lançarem
as 'primeiras I1nhas». Cf. CUNHA SARAIVA. A Fortaleza de' Bisseu e a Companhia de Grão-Parã· é MaranMo. p. 167;
ÁLVARES ANDRADE. Planta da Praça de Bissau e suas adjacentes. p. 57.).   Portanto, esta foi construída em
local diferente das anteriores, contrariamente ao que se depreende da lápide.
      Por último, duvida-se da reconstrução da fortaleza em 1946, porquanto
reconstruir é restaurar segundo a traça primitiva, e, nesta reconstrução, só houve a
preocupação de tornar a fortaleza funcional para determinado fim, não se atendendo
ao seu passado histórico. Assim, a pequenina capelinha de evocação a S. José
desapareceu para dar origem a uma singela casa quadrada, tipo colonial, e também
desapareceram os majestosos poílões que existiam em cada um dos baluartes(No
arquivo do Quartel-General existe uma fotografia destes poilões.), além de hoje se verem nas arestas das
muralhas inestéticas guaritas de cimento, pintadas de branco, em nítido contraste com
a cor enegrecida das pedras lateríticas.
      Na parede do lado esquerdo do túnel de acesso à esplanada há uma pequena
placa de bronze indicando que a fortaleza foi
    VISITADA PELO CHEFE
    DO ESTADO, GENERAL
    FRANCISCO HIGINO
    CRAVEIRO LOPES EM
    3 DE MAIO DE 1955
      Na esplanada, mas descentrado, ergue-se, desde 1946, um pequeno monumento
dedicado aos «heróis da ocupação e pacificação da Guiné». Está rodeado de 4 canhões de
ferro, de calibre 36, montados em reparos do mesmo metal.
      Dois destes canhões, os que estão voltados para a porta de serviço, são holandeses,
um tem uma coroa que parece a sueca e o outro, provàvelmente, é de fundição inglesa.
      Junto à porta de serviço - que se vê ter sido rasgada na muralha, em ampliação da
original - há um montículo de terra, ajardinado, onde se encontram uma caronada, um
ancorote e uma hélice de avião, querendo simbolizar a união dos três ramos das Forças
Armadas. Para realização deste fim, julga-se que a caronada - canhão típico da marinha -
devia ser substituída por uma peça.
      No lado exterior da porta de serviço estão dois canhões de ferro, de calibre 24,
montados nos respectivos reparos, tendo um as armas holandesas e o outro aspecto de
ser de origem inglesa. Espalhados pelos parapeitos das muralhas encontram-se 24
canhões de ferro (Em todas as descrições sobre a fortaleza de S. José de Bissau verifica-se que o número de
canhões vem diminuindo. Conquanto em 1847 tivesse sido dada ordem, de Lisboa, para «a inexplicável medida do
desartllhamento gerai» (Revista Militar. ano de 1864. p. 128), não nos constou que, quer nessa ocasião quer em 1856 e
1877, ou datas posteriores, tivessem recolhido ao Arsenal do Exército canhões de ferro ou de bronze provenientes da
Guiné. Assim o desaparecimento dos canhões que existiram na fortaleza de Bissau só se explica, para os mais pesados,
pelo abandono e consequente enterramento natural; para os mais pequenos, em especial os de bronze, pelo roubo. Além
das 35 peças de artilharia que se encontram na fortaleza de S. José. conhecem-se, em Bissau, mais nove bocas de fogo
antigas, cujas características e locais onde se encontram resumidamente se indicam: - No Balalhão de Intendência de
Angola: - Morteiro de ferro, possivelmente de fins do século XVIII – 1. No munhão esquerdo tem a marca S BOWLING e
no fogão os números de referência 7 - I - 12. Está montado em reparo de ferro, próprio, e tem um diâmetro de boca de 230
mm. - No Museu de Bissau:      . Canhão acolumbrinado, de ferro, do inicio do século XVII – 1; . Canhão de ferro do flnal
do século XVIII – 1; . Peça de tiro de sinal, de ferro, do princípio do séc. XVIII – 1; N. B. A peça de tiro do sinal, uma das
muitas que os indígenas nos roubaram, 101, há pouco mais de cem anos, utilizada pelos mandingas suas lutas contra os
fulas. CI. Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, II (1947) 449. . Canhão de bronze com a cifra de D. Maria I – 1. Os dois
canhões de ferro parecem ser de origem inglesa. O canhão de bronze tem um corte triangular em bisel, invertido, junto ao
«ouvido», que teria sido feito para embutir um «grão», o que sucedia quando as peças tinham feito muito fogo. - No
Cemitério Municipal de Bissau: . Canhão de bronze, com o comprimento total de 96 cm e diâmetro de 10 cm. Alma com 6
estrias, slnistrorso. Na faixa da culatra tem a legenda: RUELLE-AN 1863, e nos munhões, esquerdo a direito,
respectivamente, «N.º 100» e «P 101 K». . Canhão de bronze, idêntico ao anterior, com a data de 1870, tendo no munhão
esquerdo a Indlcação: «N.º 16». . Canhão de bronze, com o comprimento total de 96 cm e o diâmetro de boca de 11.5 cm.
Tem a alma lisa e a câmara estrangulada. No munhão esquerdo tem a indicação «N.º 232» e no direito «P 98 K». Tem
marca de mira na bolada e na faixa da culatra, lado esquerdo superior, uns furos de adaptação de um aparelho,
possivelmente de pontaria. Uma peça idêntica foi roubada em' 1959, ignorando-se o seu paradeiro. - Junto ao cais do
Pigiguiti, na Avenida Marginal: . Canhão de ferro, provavelmente de calibre 36, enterrado pela boca, estando de fora o
cascavel, culatra e parte do primeiro reforço. Esta peça, bem como os dois canhões de ferro que se encontram no Museu
de Bissau, guarneciam o antigo forte do Pigiguiti. Por uma feliz determinação do Ex.º Secretário-Geral da Provinda vão
recolher ao Museu de Bissau todas as peças antigas de artilharia que se encontram espalhadas pela Guiné, mesmo
aquelas que estão a ser utilizadas como cabeços de amarração),
                                                     dos quais só um ostenta as armas
portuguesas – embora não tivesse sido feito em Portugal. Os restantes são holandeses,
um possivelmente é sueco, outro deve-se às fundições belgas de Lefache, e há ainda
um que tem, nos seus munhões, a característica «flôr de liz» francesa.
     No interior da esplanada, em parte sombreada por mangueiras, encontram-se,
além dos quatro canhões já aludidos que rodeiam o monumento e da carona da perto
da porta de serviço, mais duas peças deste tipo, uma das quais encravada com um
pelouro de maior calibre. No chão, junto a cada uma destas bocas de fogo, existem
uns quatro ou cinco pelouros de diversos tamanhos.
     Na varanda da «casa do governador», voltados para o mar, encontram-se quatro
pequenos canhões de 47 mm, que há meio século faziam parte do armamento de
algum navio de guerra.
     Exceptuando estas quatro peças, um total de 35 velhos canhões fazem imaginar, a
quem os contempla - melhor que estes simples e breves apontamentos - o que foi a
história da fortaleza de S. José de Bissau, através dos seus dois séculos de existência.
Uma história atribulada, de sucessos e insucessos, de esperanças e desânimos, indelevel-
mente ligados pela nossa constante vontade de permanecer na Guiné.
BIBLIOGRAFIA

ANTÓNIO AFONSO MENDES COUTINHO -- Apontamentos sobre a Praça de S. José de Bissau, Lisboa, 1853.
BERNARDINO ANTÓNIO ALVES DE ANDRADE- Planta da Praça de Bissau e Suas Adjacentes. Introdução e notas do
       Dr. Damião Peres. Edição da Academia Portuguesa de História. 1952.
Boletim Cultural da Guiné Portuguesa Bissau.
CHRISTIANO JOSÉ DE SENNA BARCELOS - Subsídios para a história de Cabo Verde e Guiné, Tipografia da
       Academia Real das Sciencias de Lisboa, 1899 a 1912.
FRANCISCO TRAVASSOS VALDEZ - Africa Occidenfal. Edição de Francisco .Artur da              Silva. Lisboa. 1864.
Cap. Eng. HENRIQUE C. S. BARAHONA – Carteira de um Africanista. Algumas palavras sobre as fortalezas da Guiné
       e da Africa Oriental. ln Revista de Engenharia Militar, ano de 1909.
JOÃO BARRETO – História da Guiné. Edição do Autor. Lisboa. 1938.
 JOSÉ JOAQUIM LOPES DE LIMA - Ensaios sobre a statlstica das Possessões Portuguezas, Livro I. Imprensa
       Nacional, Lisboa. 1841.
JOSÉ MENDES DA CUNHA SARAIVA - A Fortaleza de Bissau e a Companhia do Gão-Pará e Maranhão, ln
       Conqresso Comemorativo do Quinto Centenário do Descobrimento da Guiné, vol. I. pp. 157 ss.
Idem. I Congresso da História da Expensão Portuguesa no Mundo. pp. 167-170. doc. n.º 2. nota F.
MANUEL ANTÓNIO MARTINS – Memória demonstrativa do Estado Actual das. Praças de Bissau, Cacheu e suas
       dependências em África, ln Boletim Cultural da Guiné Portuguesa. XIII (1958) 203-216.
 Alf. MIGUEL ANTÓNIO PlMENTEL - A Guerra de Bissau em 1894. ln Revista Militar, ano de 1897, pp. 616 ss.
 TITO AUGUSTO DE CARVALHO -- As Compenhias Portuguesas de Colonização, Memória apresentada à Sociedade
       de Geografia de Lisboa, Lisboa, 1902.

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A construção da primeira fortaleza de Bissau

  • 1. A primeira fortaleza de Bissau teve, como origem, um acto de pirataria de três navios franceses cuja tripulação pretendeu construir, num local da embocadura do rio Geba - já então regularmente frequentado por comerciantes portugueses - um forte que lhes protegesse a feitoria e porto que ali queriam edificar. Através de ofertas ao régulo papel da região, de nome Bacampolco, conseguiram os nossos negociantes que fosse negada aos estrangeiros a pretendida edificação, sendo aqueles obrigados, pelos indígenas, a embarcar os materiais de construção que já tinham colocado em terra. Certamente que este acontecimento foi comunicado ao Rei de Portugal, porque D. Pedro II se apressou, por intermédio do governador de Cabo Verde, a enviar ao régulo Bacampolco régios presentes, que foram agradecidos por uma carta, datada de 4 de Abril de 1687, na qual também se comunicava que os portugueses poderiam, à vontade, construir no porto de Bissau uma fortaleza. Ante esta concessão, o primeiro capitão-mor de Cacheu, António Barros Bezerra, logo
  • 2. enviou Manuel Teles, com alguns soldados e duas peças, para garantir a autoridade portuguesa naquele local e iniciar a construção de um posto militar, que seria o núcleo de uma futura fortaleza. Para a construção do «forte e outras despesas» foram enviados, de Lisboa, 6.000$000 réis, mas, ao que parece, esta quantia foi absorvida noutros gastos da Província de Cabo Verde e Guiné. Em Lisboa, no dia 21 de Dezembro de 1695, publicou-se um decreto autorizando o Conselho Ultramarino a encarregar a Companhia de Cacheu e Cabo Verde, recém-formada, da «administração da fábrica da fortaleza de N.a S.a da Conceição de Bissau» (CHRISTIANO JOSÉ DE SENNA BARCELOS, Subsídios para a história de Cabo Verde e Guiné. II. p. 114.). Meses depois, a 7 de Março de 1696, o Rei confirmou este decreto e, a 17 do mesmo mês, o Conde de Alvor, como presidente do Conselho Ultramarino, e Gaspar de Andrade, como administrador-geral da Companhia, assinaram (lbid . p. 123. ). o respectivo contrato para a construção da fortaleza. Já, em 23 de Fevereiro de 1696, o engenheiro das fortificações do Alentejo, João Coutinho, com a função de Capitão de Engenharia de Cabo Verde e Guiné, ganhando 25$000 réis por mês, tinha sido nomeado para dirigir a construção de um forte em Bissau. Após uma curta paragem pela ilha de Santiago, este engenheiro chegou ao seu destino, onde, imediatamente, traçou um grandioso projecto para a fortaleza que pretendia construir. Este plano não mereceu a aprovação do Capitão José Pinheiro e do Bispo D. Vitoriano. que pretendiam - certamente guiados pela experiência e conhecimento da Guiné - uma fortificação muito mais simples e modesta. Em 26 de Agosto desse ano, uns escassos dois meses após a sua chegada, morreu o engenheiro João Coutinho e, ao que parece, com uma certa satisfação do Capitão José Pinheiro, pois este, num dos seus escritos, comentou que aquela morte «tinha sido uma providência, porque João Coutinho daria cabo de todos os cabedais, por querer meia Bissau por fortaleza. O Capitão José Pinheiro desenhou, então, o projecto de um forte que se limitava a um simples quadrado abaluartado, rodeado de uma cava. Conforme Lopes de Lima (Ensaios sobre a statistica das Posessões Portuguezas, Livro I, Parte 11, p. 104.), «desde 1690 a Companhia de Cacheu e Cabo Verde começou a fazer muito caso do porto de Bissau aonde em 1696 por mandado d'El-Reí D. Pedro 2.° se estabelleceu uma , Feitoria Portugueza fortificada, e nesse mesmo tempo allí foi, levado pelo seu zelo apostolíco, o venerando Bispo D. Fr. Victoriano do Porto, o qual fez construir de pedra a Igreja Matriz de Nossa Senhora da Candelaria e o Hospicio dos Capuchos, de que já ha muito nem vestígios existem». No dia 16 de Outubro de 1696, com grande solenidade e na presença do bispo D. Vitoriano da Costa, lançou-se a primeira pedra da futura fortaleza que, como a pequenina capela construída por Fr. José de Beque, ficava sob a protecção de N.a S.a da Conceição. Trabalhou-se, naquelas obras, com o mesmo afinco e titânico esforço que levou os portugueses de 1500 a espalharem pelo mundo os marcos indestrutíveis da sua presença - as Fortalezas de Portugal. Assim, dos terrenos lateríticos das proximidades de Bissau
  • 3. extraiu-se a pedra, que depois foi transportada ou a dorso, de homens, ou a baste de pequenos burros, ou ainda através das águas nas típicas canoas guineenses, cujo formato ainda hoje se mantém. Junto às margens do Geba fizeram-se fornos para a preparação de cal, que ficava ao preço de 1$500 réis por pipa, sendo possível que - conforme se praticava na construção das fortalezas da Índia - fossem também utilizadas muitas toneladas de cascas de ostras, pacientemente esmagadas e reduzidas a pó (Segundo LOPES DE LIMA, algumas das casas de Cacheu eram «caiadas com cal d'ostra, que alli se fabrica bem, e sahe barata». Op. clt , p. 95. Em crioulo esta cal chama-se «combé».). Ao fim de quatro meses, as obras indispensáveis da fortaleza estavam prontas e, meio ano depois do lançamento da primeira pedra - em Março de 1697 - EI-Rei D. Pedro II foi informado pelo Capitão José Pinheiro da Câmara que «a fortaleza era importante para aquella terra, com os seus 140 pés de cada comprimento; que faz em redondeza 560 pés, com 4 baluartes com suas pontas de diamante, dois para a banda do mar e dois para a terra; cada um deles pode levar 8 peças de artilharia, fora uma cortina para o mar entre os dois baluartes, que pode levar 12 peças». Numa carta escrita um mês depois, a 17 de Abril, José Pinheiro dava a seguinte e interessante notícia (SENNA BARCELOS. Subsídios para a história de Cabo Verde e Guiné. II, p. 135.): «... a fortaleza de Sua Magestade fica em bom terreno, porque estas águas ficam já da banda de dentro, que lhe ffirmo a V. S.a que em Africa não tem Sua Magestade outro como ella porque todas teem falta d'agua e se valem de cisternas; e vendo eu que este gentio não tinha com que nos fazer mal que em tolher-nos a agua, me resolvi abrir um poço muito largo, que quiz a minha fortuna que com quatro braças e meia achei agua com abundancia e a melhor que tem hoje Bissau para beber, isto dentro da fortaleza, que os mesmos gentios, vendo que abri agua, me pozeram de feiticeiro e ficaram com grande magoa.» Muitos anos mais tarde, quase meio século depois, em ofício de 12 de Março de 1752, Francisco Roque de Sotto Mayor, capitão-mor de Cacheu, referiu-se a esta fortificação do seguinte modo: «Era a dita fortaleza eregida em hú pequeno tezo junto ao principal porto d'aquella ilha, regularmente feita, e neIla montadas 18 ou 20 pessas de artilharia; seguia-se a fortificação de marinha, com sete ou outo baluartes, e em cada hü 4 ou 5 pessass (BERNARDlNO ANTÓNIO ÁLVARES DE ANDRADE. Planta da Praça de Bissau e Suas Adjacentes, p. 73.) Voltando à construção da fortaleza, as obras arrastaram-se por mais alguns anos, possivelmente em acabamentos e construções internas para habitação das guarnições, além dos melhoramentos que a prática aconselharia. Em Dezembro de 1697, dois patachos ingleses fundearam nas águas lodosas do Geba e pretenderam desembarcar vários produtos para transacções comerciais. O Capitão José Pinheiro não consentiu e intimou-os a abandonarem o porto, o que foi cumprido. No entanto, este acto legítimo do Comandante da Praça de Bissau levou à primeira revolta dos indígenas da região, que, sob a chefia de um novo régulo, chamado Incinhate, cercaram a povoação, impedindo o reabastecimento de víveres. O Capitão José Pinheiro viu-se na necessidade de pedir socorro aos moradores das margens do Geba e ao Capitão-mor de Cacheu, Vidigal Castanho, que, prontamente,
  • 4. acorreu a Bissau com 92 soldados transportados em três lanchas. Contactado o régulo rebelde, segundo o relatório de Vidigal Castanho, datado de 21 de Março de 1698, este provou a sua amizade a Portugal e o seu consentimento para a permanência do forte. No entanto, queria, em troca, a substituição do Capitão-mor José Pinheiro da Câmara e que lhe fosse pago o terreno onde se construíra a fortaleza, além de lhe ser garantido o livre comércio com a navegação estrangeira. É de salientar a informação do Capitão Vidigal Castanho, referindo que «a fortaleza é de pequena capacidade, feita de pedra e terra; dizem os que entendem que promete pouca
  • 5. defesa»... Ainda nesse relatório, Vidigal Castanho informava o Rei de Portugal que a maioria dos soldados da guarnição de Bissau tinha desertado, pelo que deviam ser substituídos com urgência. De acordo com o orçamento económico referente ao ano de 1696-1697, a guarnição da Praça de Bissau seria constituída pelo Capitão-mor, um alferes ou tenente, um ajudante, um sargento, três cabos de esquadra, quarenta soldados, um tambor, um condestável e dois artilheiros, além de vários indivíduos civis com funções burocráticas. Em Janeiro de 1698, sendo presentes, além do Capitão-mor José Pinheiro e do capitão-tenente João de Almeida Coimbra, os escrivães Francisco Lourenço e José Correia de Sá e o régulo Incinhate, seus acólitos e intérprete, foi lavrado, no Livro de Registo da Alfândega de Bissau, o auto da compra do terreno onde fora construída a fortaleza, adquirido pela importância de 300 barafulas, ou seja. 60$000 réis. Precisamente um mês depois desta cerimónia, um novo episódio, relacionado com o comércio livre, provocou outra rebelião dos indígenas. O comandante de uma nau holandesa, armada com 26 peças, sob o pretexto de comerciar com os nativos da região mas com a finalidade de formar, em território sob a nossa soberania, uma feitoria, fundeou nas águas do Geba. O comandante da fortaleza intimou o navio estrangeiro a levantar ferro e, como não fosse obedecido, atacou-o a tiro de canhão, obrigando-o a retirar-se. No dia seguinte a fortaleza estava cercada e um emissário dos rebeldes informou o Capitão-mor que «se continuasse na sua teimosia (o régulo), derrubaria as muralhas, cortando a cabeça aos moradores», A paz só se conseguiu através de várias concessões, entre as quais a autorização de livre comércio e a substituição do Capitão-mor José Pinheiro da Câmara pelo Capitão Rodrigues de Oliveira Fonseca. O régulo Incinhate, logo que viu satisfeitas as suas pretensões, escreveu a El-Rei, em 23 de Maio de 1698, agradecendo e pedindo novas concessões, que, em parte, foram atendidas, Ao iniciar-se o século XVIII, o Capitão-mor Oliveira Fonseca teve um conflito com o gerente de uma firma francesa, estabelecida em Bissau. Esta desavença foi logo explorada pelos franceses, que, alegando razões sem fundamento, pretenderam construir nas margens do Geba uma feitoria e um forte com vistas a aniquilarem o comércio e poderio português em Bissau. Assim, em 13 de Março de 1700, surgiu no porto de Bissau um navio de guerra francês, o Anna, ameaçando o seu comandante que desembarcaria 200 homens para garantir a manutenção dos direitos da firma da sua nacionalidade e salvaguarda dos seus concidadãos. A semelhante arbitrariedade retorquiu Oliveira Fonseca que impediria qualquer desembarque e, acto contínuo, mandou que os canhões da fortaleza fossem assestados sobre o navio estrangeiro. Como um dos princípios da guerra naval daquela época era que «poderia bastar um só tiro de uma fortaleza para afundar um navio, enquanto que nem cem
  • 6. tiros de um barco destruiriam uma fortificação», o comandante francês, ante a ameaça dos canhões portugueses, mudou de ideias. Assim, vendo que não poderia demover o Capitão Oliveira Fonseca, procurou aliciar os Indígenas para que atacassem a fortaleza. Não contou, porém, com a lealdade do régulo Incinhate, que, categoricamente, se recusou a trair a confiança que o Rei de Portugal depunha nele e nos seus súbditos. Foi este o último episódio da fortaleza de N.ª S.ª da Conceição de Bissau. Em 1707, o Capitão-mor de Cacheu, Paulo Gomes de Abreu e Lima, num relatório sobre a Guiné - e que hoje nos parece um tanto ou quanto incompreensível - afirmava que Bissau era «terra muito ambicionada pelos franceses, que nessa ocasião empregavam os maiores esforços para ali levantarem uma fortaleza e se tal conseguissem tornar-se-iam senhores de toda a Guiné». No entanto, apesar destas sensatas afirmações, acabava por preconizar que a fortaleza de Bissau fosse arrasada. D. João V, embebido com o sonho das minas preciosas do Brasil, pura e simplesmente, em 5 de Dezembro de 1707, mandou demolir a fortaleza de N.ª S.ª da Conceição de Bissau, o que se realizou em 1708. O Capitão-mor de Cacheu, Francisco de Sotto-Mayor, mais tarde, em 1752 (Oficio de 12 de Março. Vide ÁLVARES DE ANDRADE op. cit . p. 74.), explicava a decisão de D. João V da seguinte maneira: «A causa de demolirce foram certas dífferenças que o capitão-mor desta Praça Santos Vidigal Castanho teve com o capitão-mor da dita ilha, Rodrigo de Oliveira da Fonseca, sobre materia de mais ou menos interesses nos seus negócios,» Em breves dias foi demolida a fortaleza de N.ª S,a da Conceição de Bissau, que representava não só 20 anos de soberania como também o sacrifício de muitas vidas de portugueses. A sua artilharia foi enviada para Cacheu, ficando abandonadas 6 peças, que se consideraram incapazes (Oficio de 12 de Março. Vide ÁLVARES DE ANDRADE op. cit . p. 74.). Assim, desapareceu a primeira fortaleza de Bissau, com grande descontentamento de todos os residentes da região, incluindo os próprios indígenas. Estes, através do seu régulo, recusaram sempre aos franceses as necessárias autorizações para construírem, nas margens do Geba, uma feitoria e forte, alegando que «haviam dado aquele terreno ao Rei de Portugal e que não faltariam à sua palavra». Apesar da insistência francesa e da lealdade dos papéis, os membros do Conselho Ultramarino, falando em nome do Rei, afirmavam em 1718, perante um pedido para a construção de uma nova fortaleza, que: «Portugal não tinha meios para conservar e sustentar o presídio, e também pela inconstância dos negros e reis de Bissau, motivos por que tinha EI-Rei mandado demoli- lo.» Em 1723, só devido ao naufrágio de um navio que transportava os materiais de construção, é que a França não viu realizadas as suas aspirações de ter a sua bandeira a flutuar aos ventos de Bissau, onde pretendia construir um forte «à viva força, se necessário fosse». Talvez essa a razão de o Conselho Ultramarino, pouco tempo depois, ter emitido o parecer de «mandar-se reefícar em Bissau a fortaleza que nelIa houve», mas o Procurador da Fazenda contrariou a ideia, alegando «não saber
  • 7. qual seja a utilidade que possamos tirar desta ilha» (Cf. ÁLVARES DE Ar.llRADE. ob. cit., p. 71.). E mais uma vez foi posta de parte a construção de uma nova fortificação. No mês de Abril de 1739 dois navios franceses fundearam nas águas do Geba e a sua tripulação procurou, por todos os meios, captar as boas graças dos nativos para poderem construir a tão almejada feitoria e forte. No entanto, não foram felizes e, antes de se fazerem ao mar, ameaçaram que voltariam no ano seguinte e então, com a força dos seus canhões e das armas dos seus soldados, a bem ou a mal, construiriam uma fortaleza. Numa carta escrita ao Capítâo-mor de Cacheu - e que posteriormente chegou ao conhecimento de D. João V - o régulo de Bissau declarava que «enquanto ele fosse vivo, jamais a França teria um forte nas suas terras». Mas também, ao que parece, enquanto D. João V existisse não haveria em Bissau qualquer fortaleza de Portugal. Após a morte do régulo Incinhate, em 18 de Setembro de 1746, os franceses foram autorizados, pelos nativos, a construir, no ilhéu do Reí, uma feitoria fortificada, mas, apesar disso, El-Reí D. João V manteve a sua vontade, baseado no parecer do Procurador da Fazenda de que «não se devia levantar de novo a fortaleza» e apoiado na informação do Conselho Ultramarino de que. para a sua construção, seria «preciso mandar um engenheiro com patente de capitão-mor e promessa de que findos os trabalhos se lhe daria o governo de Cabo Verde, o que levava a excluir a ideia de uma nova fortaleza em Bissau. Após a morte de D. João V, o seu sucessor, D. José I - certamente como consequência do ofício de 12 de Março de 1752 do Capitão-mor Francisco Roque Sotto Mayor - mandou, em Janeiro de 1753, uma pequena esquadra de quatro navios - N.ª S.ª da Guia e Santo António, Santa Margarida e Ventura de Amigo - sob pavilhão do Capitão de mar e guerra Guilherme Kínray, embarcado na nau de guerra Nossa Senhora da Estrela, com a missão de se construir em Bissau uma fortaleza (Cf. ALVARES DE ANDRADE, ob. cit. p, 77.). Esta seria planeada pelo Capitão-engenheiro Francisco Xavier Pais de Menezes, tendo-lhe sido indicado pelo Ministro da Marinha e Ultramar que: «verá V. Mercê a dita ilha, tirará um plano della e fará o desenho da fortificação que n'ella se pode fazer, com .defensa, e sem muitas obras exteriores, e só assim aquellas precisas e necessárias para o poder pôr em execução quando o dito capítam-mor lhe disser que se pode executar». Quando o régulo Incinhate mostrava o maior interesse pela presença portuguesa no seu chão, o Rei D. João V opunha-se a essa ideia. Após a morte destes dois personagens, os papéis inverteram-se - o novo Rei de Portugal queria mandar edificar uma fortaleza em Bissau e o novo Régulo papel de nome Palanca não queria, ou, pelo menos, não se mostrava interessado. Embora contra a má vontade dos indígenas, em 17 de Fevereiro de 1753, .o régulo Palanca acabou por assinar "um auto de fidelidade a Portugal e de consentimento da construção de uma fortaleza, cuja primeira pedra foi lançada, com grande solenidade, nesse mesmo dia. Durante cerca de dois meses, muitas centenas de homens trabalharam afincadamente na construção da nova fortificação, lutando contra o mau clima da região e contra os constantes atritos com os nativos e, ao que consta, nessas escaramuças morreram 9
  • 8. europeus e, vítimas do clima, cerca de 500 indígenas e operários. A 22 de Março de 1753 as principais e indispensáveis obras de defesa estavam prontas, mas, oito anos depois, ainda se trabalhava na construção da fortaleza, desaparecendo, durante este espaço de tempo, as «pyramides com as armas reaes» enviadas de Lisboa a bordo da nau «Nossa Senhora da Estrela» e que tinham sido desembarcadas em Bissau. Talvez que a lentidão destes trabalhos fosse motivada, pela grande mortandade dos obreiros, vitimados pelo escorbuto, paludismo e febre-amarela - a que chamavam o «vómito negro». As mortes chegaram a ultrapassar as dezenas por dia e, entre elas contou-se a do Capitão-engenheiro Pais de Menezes, que planeou e deu início à fortificação. Em 16 de Novembro de 1753 foi atribuída a primeira guarnição à fortaleza, que ficou sob o comando do Capitão-mor Nicolau Pinheiro de Araújo, subordinado à capitania-mor de Cacheu. O armamento atribuído nessa ocasião foi de 34 peças de artilharia - conforme Sotto Mayor tinha solicitado em 1752 - que foram expedidas de Lisboa em Dezembro de 1753. No entanto, em 22 de Março de 1776, o tenente António Alvares de Andrade, ao solicitar os «reparos para a artilharia que se acha descavalgada na ditta praça de Bissau» faz pressupor que as peças existentes eram as seguintes: 12 de calibre 18, 12 de calibre 12, 12 de calibre 6 (todas de ferro) e 6 peças colombrinas de bronze, das quais 3 de calibre 3 e as outras de calibre 6 (Cf. ÁLVARES DE ANDRADE. ob. Cit., pp. 79 e125.). Em Janeiro de 1754 a guarnição de Bissau recebeu uma leva de 50 soldados degredados de Cabo Verde, mas, passados quatro anos, estes estavam reduzidos a 20 - a maioria tinha morrido e os outros desertaram. Nessa ocasião, as obras concluídas em 1753 já ameaçavam ruína. Na falta de um técnico responsável não só pela reconstrução como também pela conclusão da Fortaleza, foi nomeado Frei Manuel Vinhais Sarmento, que se limitou a mandar fazer algumas obras, provisórias e imperfeitas (CRISTIANQ BARCELOS. III. ob. Cit.,. p, 26, indica que «Frei Manuel V. Sarmento deu começo à reconstrução da fortaleza. segundo um plano seu ».). Em 19 de Julho de 1755, o Conselho Ultramarino, baseando-se numa carta do Capitão-mor de Bissau, Nicolau de Pina Araújo, pronunciou-se que «para povoar e fortalecer aquela ilha, era necessario hum enginheiro para delinear a fortificação e com elle officiaes para executarem e gente para a guarnição». Com a data de 15 de Junho de 1757, Frei Manuel Vinhais Sarmento escreveu (Transcrita no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa. VI (1951) 979) a seguinte carta: «... q. está isto em hü total dezamparo: as artelharias q. he a que só existe nesta praça estão arruinadas, mas não encravadas. som.te depois da morte do deffunto tem os negros com gr.de ouzadía desmontado quasi todas quebrando carretas. e tirandolhe as ferrages chamando lhe suas, o que tinhão principiado antes que morresse o cap.m mór outras estavam em terra desde q. sahirão p' terra.» A 13 de Maio de 1758, o Capitão-mor de Cacheu (Cf. ÁLVARES DE ANDRADE. ob. cit.. p. 82.) indicava para a corte de Lisboa que a direcção das obras da fortaleza devia ser entregue ao Capitão Anastácio Domingos Pontes, pois era «sujeito em quem concorre o predicado de
  • 9. ter bastante noticia da sciencia de fortificação e ser pratico d' estes países». A situação da Fortaleza, caminhando rapidamente para uma ruína total, foi exposta ao
  • 10. Rei D. José I, tendo, em 6 de Agosto de 1765, os moradores de Bissau solicitado a autorização para construírem uma nova fortificação a erigir «na ilha de Bissau ou no ilhéo que fica defronte». E tão confiantes estavam na anuência real, que encarregaram o Capitão-mor da ilha do Fogo, Manuel Germano da Mata - que se dizia engenheiro - de a planear, o que este fez, mas «tão irregular, que. examinada por pessoas práticas do paiz, que foram sobre ella ouvidas, se assentou que não se devia mandar executar» (Ibid . p. 83.). D. José I tomou medidas imediatas para que se abandonassem as obras em curso e, por sua resolução de 12 de Agosto de 1765, foi determinado que se construísse uma nova fortaleza em Bissau. Para isso, em fins desse ano, chegou ao porto de Santiago a corveta «Nossa Senhora da Esperança» com ordem de arrebanhar, por todo o Cabo Verde e Guiné, os vadios e condenados por crimes comuns e levá-los para Bissau. Aqui, em regime de liberdade, trabalhariam nas obras da nova fortificação, recebendo um salário diário de 180 réis, além da comida e uma ração de aguardente - na altura considerada essencial e indispensável na luta contra as febres palustres. Muitos anos mais tarde, em 13 de Abril de 1790, João Gomes Pereira apresentou ao Conselho Ultramarino a seguinte informação (Cí, ALVARES DE ANDRADE, ob. Cit,. p. 147.): « ... (que) em 11 de Dezembro do dito ano (1765) remeti para Bissau na fragata Nossa Senhora da Penha de França, e nas embarcações da Companhia que a acompanhavão com 720 criminosos com as suas espadas largas e zagaias muito luzentes.» Outros escritores referem que o efectivo era formado por 270 vadios e criminosos, juntamente com 450 soldados retirados das 30 companhias que então existiam pela Província, além de 1 cirurgião, 25 cabos, 10 pedreiros e 20 carpinteiros, sem contar o chefe da construção e o seu adjunto, respectivamente João da Costa Ataíde Teive e Tenente de granadeiros Bernardino Alvares de Almada. Este pessoal teria desembarcado em Bissau no dia 26 de Dezembro, tendo sido transportado numa esquadra de cinco navios, sob o comando de Frei Luís Caetano de Castro com o cargo de capitão de mar e guerra, constituída pela fragata Nossa Senhora da Penha de França; nau Nossa Senhora do Cabo; galera São Sebastião, corveta Nossa Senhora das Necessidades e a escuna (ou corveta) Nossa Senhora da Esperança, além de um bergantim (Cf. ÁLVARES DE ANDRADE. ob. Cit., p, 87.). Com a ajuda de um milhar de indígenas, o então.sarqento-mor Manuel Germano da Mata, a 30 de Dezembro de 1765, deu «princípio a cortar as árvores e mato e a limpar o plano para se lançarem as primeiras linhas» (Ibid .. p. 97.) de uma fortaleza de que ele era o autor do projecto. Pouco tempo depois, a Companhia do Grão-Pará - entidade concessionária da exploração da Província de Cabo Verde e Guiné e cujas despesas da construção da fortaleza corriam a seu risco - expressou por escrito o seu contentamento pelo «bom sucesso do princípio da fundação da fortaleza», levantada junto às margens lodosas do Geba, «a cousa de 100 passos das suas águas». Em 11 de Abril de 1766, Germano da Mata teria pretendido modificar o traçado, avisando a Companhia do Grão-Pará da «mudança que fez na planta do risco que da
  • 11. Fortaleza levou desta corte». Imediatamente os Directores daquela Companhia escreveram-lhe, não concordando com essa alteração, pois «verdade he q. o discurso natural nos quer persuadir q. um quadrado não póde defender bem os lados sem quatro Baluartes nos anglos; os dous Baluartes q. estão á frente do mar bem defendem essa parte; porem o baluarte, q. está só no meio do lado na frente do gentio, de q.m devemos recear continuos assaltos, não duvidamos possão defender os dous flancos lateraes: porem sempre nos parece q. os Lados Lateraes a esses flancos ficam com fraqueza se por ahi forem attacados». Calcula-se que a primeira fase das obras de construção tivesse importado em 50 contos de réis, mas em vidas humanas, o custo foi elevadíssimo. Mais de 1000 operários e obreiros - incluindo o cirurgião, o boticário, capatazes, etc, - ficaram para sempre sepultados no cemitério que existia perto da fortaleza. Devido a essa mortandade - atribuída ao paludismo e ao «vómito negro» - e ainda ao facto de a Companhia do Grão- Pará, que pagava os salários e custeava as despesas, ter esgotado os seus recursos, as obras diminuíram consideravelmente de ritmo, aumentando, em contrapartida, a indisciplina de operários e tropas, a ponto de ter que desembarcar uma força de marinha, sob o comando do Capitão-Tenente João da Costa Ataíde Teive, para «disciplinar a tropa e organizar a gente de trabalho» (Cf. ÁLVARES DE ANDRADE. ob. cit., p. 94.). Segundo o tenente-coronel Germano da Mata, quatro meses após o início dos trabalhos já se levantavam «o quadrado fortificado com 67 braças de lado e 4 baluartes, que foram designados pelos nomes de Bandeira, Poana, Onça e Balança. No entanto, uma testemunha contemporânea refere-se, somente, à existência de «três baluartes pequenos para terra, e as cortinas da mesma de três palmos de largo, feytas de pedra e cal...» (Ibid. p. 111.).
  • 12. Com a retirada de Ataíde Teíve, o autor do projecto, Germano da Mata. assumiu a direcção da obra, sendo ajudado pelo Capitão-mor de Cacheu, Sebastião da Cunha Sotto Mayor - visto que o tenente de granadeiros Alvares de Andrade fora chefiar a botica. Além disso, ajudava também nas obras o Capitão-cabo da Praça de Ziguinchor, Carlos de Carvalho Alvarenga. Em Agosto de 1766, Germano da Mata comunicou para Lisboa que tinha prontas a ser inauguradas as principais obras defensivas e, meses depois - a 17 de Fevereiro do ano seguinte - informou que «a obra da' fortaleza se vay continuando na abertura do fosso». Ao que parece, a abertura deste fosso deu origem a grandes problemas, porquanto, mais tarde, numa reclamação apresentada pelo Capitão de engenheiros Carlos Andreis, afirmava-se o seguinte(Cf. ÁLVARES DE ANDRADE, ob. cit., p. 106.): «... que por baxo de dois e tres dedos de terra se encontra huma pisarra e roxa, que seria percizo, par fazer só o foço determinado, de sessenta palmos de largo e duas braços e meia de fundo, ao menos dous annos atendendo que no tempo das agoas se não pode trabalhar.» Mas, precisamente um ano após a informação de Germano da Mata, em 14 de Fevereiro de 1768, o Capitão de mar e guerra João da Silva indicava que «os baluartes donde se acha a artilharia montada tem dezabado muita parte dellas com as agoas passadas, e como se não repararão, na occaslão presente pode facilmente dismontar a artilharia, caindo por terra, pois os ditos baluartes não tem resistencia á calamidade do tempo». No entanto, Germano da Mata continuava a mandar para Lisboa optimistas informações sobre o andamento dos trabalhos, referíndo-se à conclusão da «casa do governo a padrasto sobre a porta de armas, os quartéis dos officiaes e da guarnição, as instalações hospitalares», além de uma pequena capela que passava a ter como orago S. José. A consulta dos documentos da época mostra-nos, porém, uma situação muito diferente daquela descrita por Germano da Mata. Este, ao que parece, era um indivíduo sem qualquer capacidade de trabalho, incompetente e quezilento - a ponto de um marinheiro euro, peu lhe ter dado com uma picareta na cabeça, que o ia matando, e, de outra vez, ter sido agredido pelos operários. No entanto, alardeava profundos conhecimentos e prática, atributos esses de que era destituído. O seu imediato, capitão com exercício de engenheiro. António Carlos Andreis, era, de facto. muito competente mas, em contrapartida, um alcoólico crónico, de espírito tempestuoso. Entre Germano da Mata e Carlos Andreis havia uma rivalidade enorme e, só quando era de todo impossível, o que um fazia o outro não desfazia ou dizia mal. Esta situação ter-se-la mantido ao longo de alguns anos, até que Germano da Mata, em 1769, foi obrigado a ir a Lisboa justificar-se dos seus trabalhos, tendo conseguido, graças a um enorme favoritismo e protecção, juntamente com a imensa propaganda que fazia de si próprio, obter uma alta recompensa pelos seus trabalhos na edificação da
  • 13. fortaleza de São José de Bissau. Como consequência, o Capitão Carlos Andreis obteve, por decreto de 6 de Novembro de 1766, o desterro para a ilha de Santiago, donde saiu trinta anos depois, sendo restituído à liberdade, ao seu soldo e às honras do seu posto por despacho régio de 27 de Outubro de 1799, isto é, quando já estava às portas da morte. Assim laureou-se um incompetente e desprezou-se um técnico de certo valor, numa altura em que a Guiné tanto precisava de homens válidos. O Governador Sotto Mayor, num ofício datado de 3 de Junho de 1769, dirigido ao Ministro da Marinha e Ultramar critica abertamente a acção de Germano da Mata, referindo que a fortaleza «se achava irregular no que respeita aos terraplenos dos baluartes e cortinas, porque achando-se os ditos doies baluartes fronteyros à campanha em altura tão proporcionada, que ficam os tiros das pessas de artilharia orizontaes à campanha, e em algumas partes ainda ficão mais baixos do que a mesma campanha ... e n'esta forma se achão os ditos doies baluartes do mar com os de campanha, é trez cortinas a ellas contíguas, que qualquer embarcação do meyo do porto as domina, como tambem os ditos baluartes», concluindo por responsabilizar o autor do projecto e director das obras de edificação «deste tão grande descuido achar-se agora esta fortaleza por todos os lados arruinada. dezabando por húa e outra parte» (Cf. BERNARDINO ÁLVARES DE ANDRADE. P/anta da Praça de Bissau e Suas Adjacentes. Pp. 107 e seguintes.). Aliás a planta da fortaleza de Bissau também não foi muito do agrado do Marquês de Pombal, que, entre várias coisas, estranhou a falta de canhoneiras, pois Germano da Mata entendera ser «mais fácil laborar com artilharia por cima dos parapeitos para todas as partes». O primeiro documento que alude à conclusão da fortaleza de São José de Bissau é datado de 30 de Novembro de 1773. No entanto, jà em 10 de Maio do mesmo ano a Junta de Administração da Companhia Geral de Grão-Pará e Maranhão tinha providenciado para o despedimento dos operários e demais obreiros, além de ter proposto a respectiva guarnição. Esta foi nomeada por decreto real de 28 de Novembro de 1774, que era do seguinte teor: «Relação dos officiaes que Sua Magestade he servido nomear para guarnição da Praça de Bíssao. Para sargento mor da dita Praça o capitão della Luiz da Silva Cardozo. Para ajudante da mesma, o cadette do regimento de Setuval Antonio de Braun. Para capitão da primeira Companhia de infantaria da guarnição da dita Praça o cadette do regimento de Setuval José Lufz de Braun. Para tenente da mesma companhia Bernardino Antonio Alvares da Andrade. Para alferes da mesma o sargento José Joaquim Pereira. Para capitão da segunda companhia de infantaria da guarnição da dita Praça Luiz da Veiga Barros. Para tenente da dita companhia Domingos da Veiga.»
  • 14.
  • 15. Assim nasceu a fortaleza de São José de Bissau. cujo custo de construção atingiu o montante de 147690$763 réis. No entanto. para que se mantivesse de pé durante os seus dois séculos de uma história mais ou menos agitada. foi necessário. quase de 50 em 50 anos, reconstruí-la de novo. A guarnição da fortaleza era da ordem dos 250 homens, distribuídos por duas companhias de Infantaria e uma de Artilharia a 80 homens cada. No entanto, os efectivos andavam à volta de 200 homens, sendo estes, na maioria, desterrados ou mesmo criminosos, e, no dizer de Lopes de Lima (Ensaios sobre a statistica das Possessões Porluguezas. livro I. cap. VI, p. 126), «mal vestidos, mal nutridos, mal disciplinados, enervados pelo vício, e pelas doenças inseparaveis delle, que alli ha longos annos vegetam languidamente, antes para envergonhar, que para defender a Bandeira Portugueza». Antes de embarcar para a Guiné, a 22 de Março de 1776, o Tenente Alvares de Andrade deu ao Conselho Ultramarino um parecer sobre a situação da fortaleza de Bissau (ÁLVARES DE ANDRADE. ob. Cit., pp. 79 e 125.), ao qual lhe juntou uma «Relação de que he mais necessario para a praça de S. José de Bissau pello que pertence á artilharia e munições para a infantaria». Desta relação constava que eram necessárias as seguintes peças de artilharia e respectivos «prettences»: «16 Pessas de artelharia, de 24 ou 36, comlombrinas 8 ditas de dezoito do mesmo género 16 ditas de nove 4 Pessas píquenas para sahirem ao campo. Bailas de 3. 6. 9. 12. 18. 24 ou 36 Díttas meudas para ce empinharem Breu e pó de pedra para se fazerem as pinhas e curdel de piam Ferro velho para a mitralha Algumas bailas emcadiadas dos sobreditos calibres Algumas palanquettas.» Entretanto, a fortaleza de S. José de Bissau continuava a desmoronar-se. De um relatório de Dezembro de 1777 constava que «... estava completamente acabada... porém os reparos estão arruinados». No ano seguinte, em 2 de Novembro, o Capitão-mor de Cacheu, António Vaz de Araújo, escrevia que «a fortaleza de Bissau he de pedra e cal, tem quatro baluartes, toda mal fabricada, e de pouca duração, e só hum pedaço que fez o engenheiro António Félix de Amaral está bom; o mais é qualquer parede»... São raras as descrições sobre a velha fortaleza de São José de Bissau onde não constem alusões que a mesma está em ruínas, e são vários os relatórios que aludem a importantes obras de restauro e sem os quais as suas muralhas e outras edificações ter- se-iam desmoronado. A vida da fortaleza, quase se pode dizer que até aos nossos dias, decorreu entre amotinações da sua guarnição e obras de restauro. A primeira insubordinação deu-se em 1783, tendo o Comandante da Praça Capitão José António Pinto, fugido para algures do Geba, conseguindo assim salvar a vida. O seu
  • 16. substituto foí o Capitão João das Neves Leão, que tomou posse em 1799, mas pouco tempo depois abandonava aquele cargo, seguindo-se-lhe o Capitão António Cardoso Faria, que, em 1803, foi envenenado pela soldadesca. Em princípios de 1805 foi nomeado para comandante da capitania de Bissau e da Praça Manuel Pinto Gouveia, que trouxe uma nova guarnição, constituída por 150 criminosos retirados da cadeia do Limoeiro, em Lisboa, e 80 vadios e condenados por crimes comuns trazidos de Cabo Verde, os quais, conforme escreveu Cristiano Barcelos (Ob. cit.. III. P. 326.), juntamente com os «230 soldados indisciplinados em Bissau formavam um Batalhão de 450 desordeiros». Esta escolha fora motivada pela razão de não haver soldados que, voluntariamente ou por obrigação, quisessem ir prestar serviço na Guiné, nomeadamente em Bissau. O facto de, desde 1807, os soldos serem pagos em fazendas - e mesmo assim com muito atraso - originava constantes protestos das guarnições militares. Alegando essa razão, em 14 de Abril de 1811, a tropa da fortaleza sublevou-se contra o seu comandante, Capitão António Cardoso Figueiredo, exigindo-lhe o pagamento dos seus soldos, «pois tinham fome e andavam rotos e descalços». O Governador de Cacheu teve que arranjar um empréstimo - feito a título particular, pois não o conseguiu em nome do Governo - para pagar aos sublevados, alguns dos quais já não recebiam há quatro anos, aliás como sucedia ao próprio Governador. Ao que parece, esta intentona fora fomentada pelo comerciante Tomás da Costa Ribeiro, que, em 12 de Julho desse ano, conseguiu originar nova revolta. Cristiano Barcelos (Ibid., p. 173. Consulte-se também a IV parte, p. 72, onde o mesmo autor escreveu o seguinte: «Caetano José Nozolinl reuniu 60 manjacos e com estes cahíu sobre os soldados indisciplinados, prendendo- os e restituindo à liberdade o Governador e offíclaes, e assim se restabeleceu o sossego em Bíssau»,) fez o seguinte descrição da fortaleza de Bissau, referente ao ano de 1821: « ... tinha os muros mui damnificados; em mau estado e telhado do quartel dos offícíaes e em ruínas o dos soldados, vivendo estes em improvisadas barracas que construíram de paus e esteiras, estando os muros da fortaleza cheios de furos que recebiam os paus; n'estas habitações viviam os soldados com suas mulheres gentias, contando alguns seis mulheres; não havia hospital, nem médico; a egreja, que outrora fora coberta de telha, estava coberta com palha e as paredes ameaçando ruínas; a artilharia constava de cincoenta peças, estando onze desmontadas, de calibre 9, 12 e 18; cavalgadas em reparos novos dez, e as restantes vinte e nove, de vários calibres, montadas em reparos velhos; os soldados no effectivo de cento e setenta e sete homens formavam três companhias de infantaria ... » Dez anos depois, em 16 de Junho de 1831, na ilha da Boa Vista, Manuel António Martins, na sua Memória (Transcrita no Boletim Cultural da Guiné Portuguesa. XIII (1958) 206.), faz a seguinte descrição da fortaleza de São José de Bissau: «Tem huma cappela dentro da fortaleza, aonde hum padre, com o nome de vigário, vai celebrar o Santo Sacrifício da Missa aos domingos e dias santos, a que assiste a pouca tropa da praça, e todos os que da povoação querem entrar nesses dias, ou para a ouvir, ou com esse pretexto, prática esta bem estranha, e que há-de resultar em grande prejuízo. O vigário he mandado de Cabo Verde para allí, e geralmente escolhido entre os maos
  • 17. ... como espécie de castigo. Tem a praça de Bissau 64 peças em número, famoza artilharia, muita parte della de calibre 18, reforçadas em 24, algumas de 12, e poucas de 6: e em o numero de 64 entram 6
  • 18. comlumbrinas de bronze de calibre 9, e duas de campanha de 6. De toda esta artilharia, não se acha huma só peça capazmente montada para dar fogo huma hora succesiva, e assim mesmo a maior parte por terra desmontada ou cahida para a banda com parte da carreta, excepto todas as de bronze, que nem signal de carretas tem. Enquanto ao armamento de tropa, entra em questão de duvida haver doze armas perfeitas, ou capazes de cada huma dar dous tiros.» Devido ao estado em que se encontrava a fortaleza, não é para admirar que, nos princípios de 1822, se tivesse dado, em pleno porto de Bissau, um ultraje à soberania portuguesa, e que Senna Barcelos (Ob. Cit., III, p. 278.) descreve da seguinte maneira: «Em 25 de fevereiro de 1822 communicaram os membros da Junta da Praça de S. José aos da Praia o ataque que um batelão e dois escaleres, com tripulantes armados e com peças de artilharia, deram no porto da mesma Praça à escuna portugueza Conde de ViIla Flor, alli fundeada, na noite de 21 d'aquelle mes... ... Estavam todos já a bordo e a escuna devia deixar esse porto em que foi atacada por aquellas embarcações, que ficaram atracadas ao costado da refferida escuna, ao abrigo dos tiros da Praça; cortaram-lhe a amarra e fizeram-se de vela, sendo conduzida para o canal do Geba, onde estava fundeada uma fragata ingleza com quarenta e oito peças. Da Praça, de que era capitão-mor João Hygino Curvo Semedo, não foi possivel socorrel-a por falta de embarcações e pela impossibilidade de se fazerem tiros, que poderíam metter no fundo a escuna, morrendo não só os inglezes, mas os portuguezes... Parece que esta fragata fora a mesma que na manhã de 4 de Março de 1823 mandara cinco lanchões bem armados atacar a escuna franceza denominada africana, tentando picar-lhe a amarra. Da Praça acudiram a tempo, fugindo os lanchões debaixo de um nutrido fogo mandado fazer pelo capitão-mor interino Marcelino Pinto da Fonseca. A fragata acima referida era a L'Owen Genndower.» Em 7 de Abril de 1823 foi nomeado como sarqento-mor da fortaleza o Capitão Marcelino Pinto da Fonseca e, na ocasião, a guarnição foi reforçada com 45 soldados e 76 degredados da ilha de Santiago. A falta de pagamento de vencimentos e a má qualidade de rancho originaram, em Maio de 1826, nova revolta, que só foi dominada quando fundeou no porto de Bissau uma fragata inglesa e surgiu um destacamento vindo de Geba com 50 soldados. Os rebeldes, perante as imposições da força da ordem libertaram o capitão-mor e alguns deles entregaram-se, mas a maioria fugiu para o mato. No rescaldo da revolução, ficaram presos 5 oficiais e 38 soldados, os quais, mais tarde, foram julgados em tribunal militar e condenados.
  • 19. Em 1 de Maio de 1835, registou-se mais uma insubordinação militar. Os soldados sublevaram-se, prenderam os seus superiores e promoveram-se a oficiais. Um deles, António Picadas, foi nomeado Governador, e um outro foi promovido a general! Foi o então capitão Caetano Nozolíni que conseguiu persuadir os revoltosos a restituírem à liberdade os seus oliciais e a desistirem dos seus propósitos. Assim, «em 7 de Maio, para que o sossego se conseguisse na Praça, houve unia convenção entre o governador e os amotinados, fazendo-se um juramento. pelo qual reciprocamente se obrigaram a esquecer o passado, sendo este gracioso juramento deferido pelo capelão» (CRISTIANO BARCELOS. ob. cit., III, p. 349.). No decorrer dos anos, a fortaleza foi-se arruinando e, em Dezembro de 1837, o seu poder defensivo era muito reduzido. Ante a ameaça de um ataque dos papéis, o Governador Joaquim António da Mata, após ter ouvido em conselho todas as entidades da terra - civis, militares e eclesiásticas - e com o apoio unânime, mandou ao comandante de uma corveta francesa, surta no Geba, um patético ofício em que pedia protecção. O oficial francês limitou-se a devolver o ofício e nem sequer lhe deu resposta. O almejado auxílio foi então solicitado ao governo da Gâmbia, que, segundo parece, também não ligou importância ao pedido. Coincidência curiosa. Nessa ocasião, o Governador de Cabo Verde e Guiné, coronel Joaquim Pereira Marinho, sem que tivesse tido conhecimento do que se passava em Bissau, escrevia para Lisboa (lbid., IV, p.158.), aludindo que as tropas da Guiné «eram indisciplinadas e bárbaras... caindo aqueles estabelecimentos na anarquia mais deshonrosa e de maior miséria...» o que, no caso da fortaleza de Bissau, era absolutamente verdadeiro. Aliás, este governador, tendo estado desterrado, voluntariamente, em Bissau no ano de 1836, escreveu que encontrara «a Praça em estado miserável, e que a história dos últimos governadores de Bissau e Cacheu é a mais deshonrosa. AlIi tudo tem sido roubado, até pedras das plataformas; o revestimento de contra-escarpa também fora arrancado para construções de casas dos vizinhos;... a artilharia desmontada e os ouvidos das peças alegradas pelo pessimo tratamento que tem tido...» Em 1840 a fortaleza contava 70 soldados (pouco disciplinados) e estava armada com 22 peças de artilharia capazes de fazer fogo (CRISTIANO BARCELOS. em ob. cit., IV, p. 271, indica que nove peças estavam montadas em reparos de ferro.). Mais ou menos nessa ocasião, Lopes de Lima (em ob. cit.,Livro I, Parte II, p. 103) fez a seguinte descrição: «Praça de guerra de S. José de Bissau - Reduto quadrado de boa cantaria, flanqueado por quatro Baluartes. tendo cem passos de comprido cada uma das faces, cercado todo de boa cava (que está servindo para hortas) guarnecido com quarenta e tres Peças de ferro e nove de bronze, de diversos calibres (quase metade dellas desmontadas por falta de reparos em paíz aonde ha tão excelentes madeiras de graça). Dentro da Praça tem Quartel para o Governador - bons Quarteis para duzentos soldados, - e para os fficiaes correspondentes; -Igreja - Alfandega; - e Grandes Armazens; - tudo em pedra, coberto de telha; mas carecendo de grandes concertos até as muralhas que tem quarenta pés de altura (apesar de apparecer todos os annos no Orçamento uma
  • 20. verba de concertos, que não se vêem); acha-se tambem dentro no recinto um poço secco desde tempo immemorial, sendo aliás de primeira necessidade, que dentro na Fortaleza haja um poço, ou cisterna de agoa potavel para a guarnição;... A fortaleza dista uns cem passos da borda da praia, tendo em frente da porta principal dois grandes Poílões, que servem de marca aos navios, que vão dar fundo.» Segundo o mesmo autor, a guarnição de Bissau, em 31 de Dezembro de 1843, era de um oficial superior, comandante da Praça, dois tenentes e dois alferes, um primeiro sargento, quatro segundos sargentos, dois tambores, cinco cabos, três anspeçadas (praças para impedimentos pessoais), cinquenta e seis soldados, num total de setenta e cinco homens de força arregimentada de 1ª linha. Quando, em Novembro de 1840, se procedia à reconstrução dos baluartes, que estavam em vias de desmoronamento, registou-se em Bissau, num armazém civil de aguardente e pólvora, uma violenta explosão que provocou a queda da «casa do governo», da capela e de mais um ou outro edifício da fortaleza (CRISTIANO BARCELOS.. ob. cit .. IV. p. 273.). Em Novembro de 1842, tendo sido determinado aos indígenas de Bissau que «não se concertassem nem se levantassem mais casas junto das muralhas da fortaleza», estes negaram-se a cumprir essa ordem, e, segundo o relatório do governador A. José Torres, datado de 7 de Junho de 1843(Ibid . pp. 314-315.), «emboscados pelas casas fezeram os grumetes fogo para a Praça, que rompeu com o da artilheria, obrigando-os a retirar. Até ao dia 4 de Janeiro atacavam todos os dias a Praça, sendo repellidos... No dia 5 mandaram, como parlamentarios, dois homens grandes da Povoação, para tratarem da paz...» Em 4 de Janeiro de 1844 desembarcou em Bissau um Conselho de Investigação (Era constituído pelo comandante do Brigue «Vouga», Francisco Assis da Silva, Chefe do Estado-maior da Província Tenente Rosado de Faria e pelo escrivão da Junta de Fazenda de Cabo Verde, Evaristo de Almeida.) para apreciar os casos de indisciplina da guarnição. Segundo o relatório que este Conselho elaborou, no tocante a instalações, «os aquartelamentos estavam em ruínas, e que os soldados haviam construído na esplanada mais de 40 palhotas, onde viviam com as suas mulheres, ou exerciam a profissão de comerciantes. Além disso, os muros da fortaleza estavam sem reboco e o fosso entupido e muitas palhotas da população avançavam até junto das muralhas, impedindo o emprego da artilharia». Pretendeu-se então pôr em vigor varias medidas tendentes a não só impedir a construção de mais palhotas no interior da fortificação, como também a desafrontar as suas muralhas. Mas, precisamente cem anos depois, a situação ainda se mantinha! Aliás, já em Abril de 1842 tinha sido recebidas em Bissau instruções do governador- geral para que se «abrisse o fosso e a ponte levadiça na parte que dá acesso à Praça; que (se) evitasse a construção de novas casas junto à mesma Praça que pudesse prejudicar a sua defesa» (CRISTIANO BARCELOS, ob. cit .. IV. p. 280. Na ocasião foi dada ordem ao governador de Bissau que «diligenciasse ajuntar materiais para se construir no ilhéu do Rei o forte que se mostra na planta levantada pelo tenente de engenheiros António Maria Fontes Pereira de MeIo». Cf. C. BARCELOS. ob. cit., IV, p. 280.). Foi a revolta dos papéis e grumetes de 1844 - e que durou poucos meses: de 11 de Setembro a 29 de Dezembro - que originou a construção de uma «palissada, protegida interiormente por uma parede de taipa», cercando parte de Bissau, ou seja,
  • 21. ligando a fortaleza ao pequeno forte do Pigiguiti, também em construção e formado por um semibaluarte, onde se montaram velhas peças de artilharia. Ao que parece, duas destas peças foram, já em nossos dias, levadas para junto do Museu de Bissau, ficando a ladear a porta principal do edifício; uma outra teve diferente serventia: foi enterrada na avenida marginal, junto ao cais do Pigiguiti, ficando só com o cascavel, a faixa e parte da culatra de fora, para servir de cabeço de amarração. É possível que as restantes tivessem fim ainda mais inglório. Foi tal o interesse dos habitantes de Bissau na construção da «muralha», que se levantou junto à palissada, que, segundo Cristiano Barcelos, «até as senhoras rivalizavam com os homens, transportando ellas também pedra e barro para essa construção da muralha». Para os papéis a revolta terminou três meses depois da sua eclosão, numa cerimónia realizada na esplanada da fortaleza e que se caracterizou pela sua originalidade(Consulte-se, para maior desenvolvimento sobre esta rebelião dos indígenas, C. BARCELOS. ob. dt .. IV, pp. 25 a 38.). Seguidamente, os assistentes a semelhante cerimónia beberam aquela mixórdia e, segundo as crenças indígenas - pelos vistos também perfiIhadas pelos europeus - a paz ficaria feita e manter-se-ía por muitos e muitos anos. Mas, ao que parece, ou à mistura faltaram alguns ingredientes ou nem todos os
  • 22. Num misto de religiosidade e de paganismo, um sacerdote cristão e uma sacerdotisa (??) indígena, chamada Balobeira, benzeram uma bacia feita da casca de uma enorme cabaça, onde tinham sido postos aguardente, balas, pólvora e outros amuletos nativos. Seguidamente os assistentes a semelhante cferimónia beberam aquela mixórdia e, segundo as crenças indígenas – pelos vistos também perfilhadas pelos europeus – a paz ficaria feita e manter-se-ia por muitos e muitos anos. Mas ao que parece, ou à mistura faltaram alguns ingredientes ou nem todos os assistentes cumpriram na íntegra todo o ritual, e o resultado foi que, passados uns quatro meses, a paz já tinha desaparecido da região de Bissau. Em Maio de 1845, a guerra estava generalizada a toda a ilha, e os indígenas içavam a bandeira francesa, salvando-a com tiros de peças (roubadas nos nossos fortes). O gentio pretendeu, na ocasião, destruir a recente palissada de Bíssau, e só perante a ameaça dos canhões da fortaleza e do brigue Vouga é que desistiram das suas intenções. No ano seguinte celebrou-se um tratado de paz com os papéis e grumetes - que não duraria muito tempo, como era habitual - e adquiriu-se o porto de Bandim. Além disso, registou-se, ainda em 1846, a conclusão do pequeno forte do Pigiguiti, constituído por um simples reduto quadrado: feito a pedra e cal, em que cada lado tinha cerca de 15 metros, sendo o do lado de terra rasgado num amplo acesso. Em 7 de Abril de 1846 o tenente-coronel Nozolini enviou ao governador-geral de Cabo Verde e Guiné o seguinte ofício: «Participo a V. Ex.ª que o forte que offereci fazer no sítio de Pigiguití se acha quasi prompto, tudo de pedra e cal com casa para a guarda e arrecadação das munições de guerra; no dia 1 de Maio pretendo arvorar alli a bandeira nacional e levar para ali duas peças de artilharia. V. Ex.ª ordenará o nome que quer se ponha ao dito forte» (Em CRISTIANO BARCELOS, ob. cit., p. 73.). Este forte devia-se aos esforços do tenente-coronel Caetano NozoIini (Este oficiaI nasceu em 1801 na ilha do Fogo e morreu em 22 de Julho de 1850 na Vila da Praia. Assentou praça em 1 de Maio de 1816, tendo sido promovido: a alferes em 1816; tenente em 1823; capitão em 1825; major em 1837; graduado em tenente-coronel em 1842 e promovido a este posto em 1843. Possuía os hábitos de Aviz e da Conceição.), que há muito estava radicado em Bissau como importante homem de negócios, tendo prestado relevantes serviços à Guiné, razão por que foi proposta para esta fortificação o nome deste oficial, o que não foi aceite pela corte de Lisboa, por motivos políticos. No dia 7 de Abril de 1845 o capitão de artilharia Tavares de Almeida, com «14 artistas entre carpinteiros de banco e de machado, pedreiros e canteiros», iniciou o trabalho para a construção de um forte no Ilhéu do Rei. Depois de ter sido aberto um fosso e construída uma face dos redutos, as obras foram, a 16 de Maio, interrompidas e nunca mais continuaram. No início de 1847, começou-se a construir, dentro da fortaleza, um novo quartel, substituindo as antigas edificações, que estavam completamente em ruínas. A falta de verbas, porém, fez interromper as obras, que só foram concluídas mais tarde, em 1851,
  • 23. graças a dádivas do Governador Major Lobo de Ávila, de Nicolau Monteiro Macedo e de seu irmão João Monteiro Macedo. além de mais alguns comerciantes. A 5 de Julho de 1853, a guarnição da fortaleza, por um motivo fútil, revoltou-se. O Governador interino, Major Maria Morais, na impossibilidade de dominar a rebelião, pediu socorro a um brigue francês, de nome Pellimure, sob o comando do Capitão Augusto Bosse. Uma força de marinheiros franceses desembarcou e após ter levado os revoltosos a submeterem-se ocupou, por um escasso mês, a fortaleza de S. José, enquanto se aguardava a chegada do vapor Mindelo, trazendo de Lisboa um contingente de tropas. Durante a estadia dos franceses em Bissau, o Comandante Bosse mandou içar a sua bandeira na secular fortaleza, mas, ante a oposição de todos os portugueses, militares e civis, teve que desistir da sua ideia. Como consequência da revolta da guarnição da fortaleza, faleceu, no recontro com os revoltosos, o tenente da Marinha Imperial de França Gillardaie. O seu corpo ficou sepultado à entrada da capela da Praça de S. José de Bissau e, mais tarde, a viúva daquele oficial solicitou a anuência do Governo Português para que fosse colocada uma pedra, simples mas durável, sobre a campa do seu marido. Ao que parece, este tão justo e humano pedido nunca se concretizou, pois não encontramos, nem consta da tradição popular, qualquer alusão à existência de alguma lage sepulcral na velha fortaleza, e não há, em todo o recinto da sua esplanada, a mais pequena memória que assinale aquela sepultura. No dia 26 de Abril de 1859 morreu na fortaleza de Bissau o grande português e guineense Honório Barreto, na ocasião governador da Guiné, por decreto de 30 de Novembro de 1858 (Cf. JAIME WALTER, Honório Pereira Barreto, memória n.º 5 do Centro de Estudos da Guiné Portuguesa, Bissau, 1947.). Hoje, nem uma singela placa assinala tão infausto acontecimento e recorda a memória de um dos mais ilustres governadores desta Província - que tanto pugilou por tudo quanto dizia respeito à Guiné e sua soberania portuguesa - e que teve um especial interesse pela fortaleza de São José de Bissau, mandando restaurar as suas velhas muralhas e melhorar a sua artilharia, além de lhe ter dedicado, ao longo da sua vida política, várias referências e descrições, uma das quais na Memória (HONÓRIO BARRETO. Memória sobre o estado actual da Senegâmbia Portuguesa, escrita em Cacheu em 1842 e publicada em Lisboa em 1843.) que publicou em Lisboa e que, segundo um seu biógrafo (JAIME WALTER. ob. cit., p. 29.), é um «livro modelo de verdade e patriotismo, e ainda de actualidade flagrante». Da referida memória transcrevem-se as seguintes palavras: «Bissau é uma praça situada na Ilha deste nome. e construída segundo o systema de Vauban; mas não foi acabada. Não tem obras algumas exteriores, á excepção dos fossos já quasi entulhados, e aonde se planta algodão, milho, e indigo. Teve contra escarpa mas parece que ella e as lages das plataformas foram arrancadas para se fazerem algumas casas dos Particulares. - Dentro ha os edifícios seguintes: - O Quartel da tropa, que está quasi a cair, e por isso a maior parte dos soldados moram em palhoças; - o indecente quartel dos Offíciais, aonde chove como na rua; - o arrui-
  • 24. nado armazem do Governo; - e a pequena, e destelhada Capella com invocação de S. José, que é o Orago da Praça. O Governador mora no quartel dos Officíais com uns quartos pequenos, e ridiculos. Deixou-se arruinar o quartel do Governo, que não era lá muito boa cousa, e que uma explosão de pólvora apenas destelhou, e lhe abalou algumas paredes podia então ser composto com pouca despeza. Até 1912, segundo Senna Barcelos, estas nove peças - cujos reparos tinham sido adquiridos por Honório Barreto, em 1837, ao governador da Gâmbia - eram as únicas da fortaleza de S. José de Bissau que podiam fazer fogo. Pouco depois da morte de Honório Barreto - que foi sentida em toda a Guiné - a cidade de Bissau foi visitada por um diplomata e escritor, Francisco Travassos Valdez, que fez a seguinte descrição da fortaleza de S. José (ln Africa Occidenlal. p. 313.): «A praça de S. José de Bissau, com os seus poílões (erio exdendron anfractorum), árvores gigantescas que se erguem com magestade nos quatro baluartes, e que os abrigam com a sua sombra, sendo de taes dimensões que uma d'ellas tem 18 metros de perimetro na maior grossura, está situada na foz do rio Geba, e foi construida no anno de 1766, reinando el-reí D. José I. Até 1912, segundo Senna Barcelos, estas nove peças - cujos reparos tinham sido adquiridos por Honório Barreto, em 1837, ao governador da Gâmbia - eram as únicas da fortaleza de S. José de Bissau que podiam fazer fogo. Pouco depois da morte de Honório Barreto - que foi sentida em toda a Guiné - a cidade de Bissau foi visitada por um diplomata e escritor, Francisco Travassos Valdez, que fez a seguinte descrição da fortaleza de S. José (ln Africa Occidenlal. p. 313.): «A praça de S. José de Bissau, com os seus poílões (erio exdendron anfractorum), árvores gigantescas que se erguem com magestade nos quatro baluartes, e que os abrigam com a sua sombra, sendo de taes dimensões que uma d'ellas tem 18 metros de perimetro na maior grossura, está situada na foz do rio Geba, e foi construida no anno de 1766, reinando el-reí D. José I. Até 1912, segundo Senna Barcelos, estas nove peças - cujos reparos tinham sido adquiridos por Honório Barreto, em 1837, ao governador da Gâmbia - eram as únicas da fortaleza de S. José de Bissau que podiam fazer fogo. Pouco depois da morte de Honório Barreto - que foi sentida em toda a Guiné - a cidade de Bissau foi visitada por um diplomata e escritor, Francisco Travassos Valdez, que fez a seguinte descrição da fortaleza de S. José (ln Africa Occidenlal. p. 313.): «A praça de S. José de Bissau, com os seus poílões (erio exdendron anfractorum), árvores gigantescas que se erguem com magestade nos quatro baluartes, e que os abrigam com a sua sombra, sendo de taes dimensões que uma d'ellas tem 18 metros de perimetro na maior grossura, está situada na foz do rio Geba, e foi construida no anno de 1766, reinando el-reí D. José I. Do seu princípio teve alojamento para o governador, bons quarteis para 200 homens e officíaes correspondentes, igreja da invocação de S. José, alfandega, grandes armazéns, e um poço com água potável. Mas depois de tudo isto feito com grossos capitaes, pela necessidade que houve de conduzir de Lisboa muitos operários
  • 25.
  • 26. e grande parte dos materíaes, bem como os vasos de guerra contra o gentio papel e balanta, e para proteger a edificação da praça, que referem escríptores antigos custou a vida a mais de 2 000 portugueses, chegou este estabelecimento a uma decadência tal que ainda ha bem pouco tempo só lhe restava um casarão construido de pedra e barro, aonde o governador e officiaes estavam pessimamente alojados e nas peiores condições higienicas, um quartel para soldados quasi em ruínas e em grande parte descoberto, uma mesquinha capella, algumas miseraveis barracas cobertas de palha, destinadas ás mulheres dos soldados, e um poço cheio de entulho! Ultimamente porém, além de se estabelecer uma nova tarifa para os soldos dos officiaes da provincia de Cabo Verde, destacados na Guiné portugueza, dando-se-lhes de augmento o equívalente á metade dos seus vencimentos, têm tido certo incremento as obras militares. O governador geral Fortunato José Barreiros ordenou que se procedesse á reparação da forte do Pigiguiti, da tabanca e da palissada, e auctorizou a construção de uma parede (guarda fogo) no paiol da pólvora. Sob a direcção do activo e íntelligente governador de Guiné, Antonio Candído Zagallo, reconstruiu-se o quartel militar, comprehendendo alojamentos para os soldados e officiaes inferiores, arrecadação e cozinha, e começaram-se também as obras para a reconstrução da casa de residencia dos governadores, cujo madeira- mento foi offerecido gratuitamente pello fallecido commendador Honorio Pereira Barreto. Considerada em si, aquelIa praça, formada por quatro frentes abaluartadas, traçadas sobre um quadrado de 100 metros aproxímadamente de lado, com muralhas de 10 a 12 palmos de elevação sobre o fosso que a circunda, não passa de uma pequena povoação mal alinhada, com algumas casas palhoças, outras de barro, e bem poucas de solida construção. Tem por limites nas duas extremidades de ENO e SSO, na primeira, uma palissada, na segunda uma tabanca, que ambas fecham a fortificação que a defende, e lhe fica superior pelo lado do N; ao NO, serve-lhe de limite o rio de Bíssau.» Quase no final do século XIX, em Fevereiro de 1890, os papéis e qrumetes de Bissau rebelaram-se e, a 22 desse mês, atacaram a povoação, tendo sido repelidos. A luta prosseguiu até Março de 1892, tendo custado a Portugal a vida de muitos dos seus militares, dos quais dois capitães, um tenente e um alferes. Em Dezembro de 1893 os papéis recomeçaram a guerra, mas no espaço de alguns meses foram subjugados, em parte devido aos vários disparos dos canhões da fortaleza, em parte devido ao revés que sofreram quando, a 7 de Dezembro, atacaram Bissau e foram repelidos. Em 28 de Novembro de 1893 o gentio de Bissau assassinou, não muito longe dos muros da fortaleza, um civil, natural de Cabo Verde, fornecedor de pão e de géneros para o exército. Seguidamente os papéis e grumetes da ilha de Bissau sublevaram-se. Sendo, por
  • 27. portaria n.º 127 de 1 de Dezembro, declarado o estado de guerra e autorizado «o bombardeamento do interior da praça para fora da mesma contra os seus habitantes» () Em Revista Militar, ano de 1897, p. 518.). Da fortaleza foram efectuados muitos disparos «dirigidos para as differentes partes da ilha, tanto com as peças de artilharia como com as espingardas Snyder», parecendo então que a rebelião tinha si sufocada. No entanto,. os nativos, dias depois, atacaram com violência a cidade de Bissau, sendo a acção descrita (Alferes MIGUEL ANTÓNIO PIMENTEL, A guerra de Bissau em 1894, in Revista Militar, ano de 1897.) por um oficial, que tomou parte activa na defesa, da seguinte maneira: «No dia 7 de Dezembro, seriam cinco horas da manhã, quando a fortaleza foi surprehendída pelo inimigo em numero provavel de 3 000 homens (papeis e grumetes), que durante a noite anterior, por um qualquer descuido da parte da guarnição da praça e fortaleza, se haviam aproximado das muralhas encobertos com os tarafes (matto), a uma distancia de 50 metros, pouco mais ou menos e entre o Pyjiguity e o baluarte da Onça; travou-se então um renhidissimo combate entre os revoltosos e a guarnição da praça, fazendo eu nessa ocasião parte da força postada no denominado baluarte da Onça, junto com o meu illustrado camarada tenente Graça Falcão, o qual então se entretinha com algumas peças Krupp de 7C m/1882 com que escangalhou ainda parte das paredes dos muros do cemiterio e creio que as cabeças de alguns papéis, enquanto eu me entretinha com a minha espingarda Snyder ... Foi tal o effeito produzido por tão renhido ataque de 7 de Dezembro, causado pelo demasiado estrondo das bocas de fogo e fuzilaria, que aterrorizou extraordinariamente todo o pessoal estranho áquelle serviço e que então se achava no interior da praça. e muito especialmente o pertencente ao sexo feminino... Como felizmente a boa estrela favoreceu sempre as nossas forças, viram-se então os rebeldes na dura necessidade de retirar em debandada deixando a praça e ainda o campo livre, do que elles nada gostaram... Depois do referido ataque deram-se mais alguns pequenos combates de mais ou menos importância, mas não tão importantes como aquelle, nos mezes de janeiro e Fevereiro, e alternadamente até á saida da columna para fora da praça ... ...Pelas tres horas da tarde do mesmo dia (27 de Abril)... surgiram os rebeldes nas alturas fazendo fogo vivo. A este ataque responderam os auxiliares que se portaram razoavelmente bem, sendo o inimigo repellido pelos tiros da fortaleza e do fortim do Pyjiguity.» A guerra de Bissau do ano de 1894, que foi pelo autor anteriormente citado, referida como «uma das mais importantes que nas possessões ultramarinas portuguezas se têem realizado nos ultimos anncs», terminou com a completa derrota dos gentios em Bassim no dia 10 de Maio, sendo a paz assinada em 22 do mesmo mês, numa cerimónia realizada no interior da fortaleza de S. José de Bissau, na presença do Governador, de muitos militares e povo. Data sensivelmente do final do século passado a seguinte descrição do capitão Barahona e Costa, feita na Revista de Engenharia Militar de 1901:
  • 28. «A fortaleza de S. José de Bissau, quando ali cheguei, também inspirava pouca confiança aos seus defensores. Basta dizer que o parapeito estava quase destruído, acima do terraplano de circulação. D'este modo os pretos rebeldes podiam bem alvejar as reduzidas tropas da guarnição que fomos encontrar exaustas por sucessivos alarmes. A densa vegetação que circundava a praça permitia que o inimigo se pudesse aproximar sem ser visto. O artilhamento da praça era simplesmente mesquinho, para não dizer outra coisa. Basta citar o facto de termos ido encontrar ali peças de artilharia assestadas no parapeito sobre reparos constituídos por grossas lages postas de cutelo! Tanto o fortim de Pigiguiti como o forte de S. José foram convenientemente reparados durante o tempo que estive na Guiné e o artilhamento foi muito melhorado, o que não obstou a que poucos annos depois já ali se vissem as peças de artilharia amarradas com cordas aos respectivos reparos! Os capitães de artilharia Joaquim de Freitas Ramos, Jacinto I.Santos e Silva e Viriato Fonseca envidaram patrióticos esforços para organizar de vez o material de guerra da Guiné em condições favoráveis á defensa. Como se vê, porém, ali tudo muda rapidamente... Tendo citado aquelles tres offícíaes, não quero deixar no olvido o nome do valente capitão Lage, que em 1891 comandava a fortaleza de Bissau. Quando em 1891 fui servir na Guiné, encontrei a fortaleza de S. José de Bissau quase completamente arruinada... Durante a minha estada na Guiné (1891-1892) procedi a importantes trabalhos na fortaleza de S. José de Bissau, que restaurei em grande parte, pondo-a em condições de resistir ás sortidas do gentio irrequieto que a rodêa. O forte de S. José de Bissau tem 4 faces abaluartadas, dispostas segundo os lados de um quadrado... As muralhas teem 12 metros de elevação sobre o fosso que a circunda. Este fosso tinha a escarpa revestida, mas quando ali cheguei achava-se quase entulhado com os escombros da muralha e os revestimentos do fosso tinham desaparecido. Honório Barreto, que foi governador da Guiné, assevera, n'uma memória que escreveu sobre a Guiné, que as pedras que guarneciam a contra escarpa, e as lages das plataformas de artilharia foram roubadas para se fazerem algumas casas particulares ... ...em cada um dos baluartes, ao centro, havia gigantesco poilão (erio exdendron anfractorum) que lhes dava farta sombra. …o tronco de um desses gigantes mede na base cerca de vinte metros de perímetro. ...a povoação de Bissau fica apertada entre o forte e uma cortina que liga o baluarte da Onça ao fortim do Pigiquiti, nome pelo qual em 1891 era conhecido o antigo forte Nozolíni, do qual, alíaz, só existia a face que olha para a campanha.» Durante alguns anos uma paz relativa reinou em Bissau e a fortaleza de S. José de Bissau pouca acção teve no desenrolar das campanhas de 1908 - se bem que tivesse alojado no seu interior grande número de militares que tomaram parte na Campanha de Bissau, que foi, para todas as nossas tropas que até então tinham actuado na Guiné, aquela que mais baixas causou.
  • 29.
  • 30. Em 1913 houve grande alvoroço entre os moradores de Bissau, porquanto a paliçada que ligava a fortaleza ao forte de Piguiti fora mandada demolir. Esta medida foi considerada altamente prejudicial à cidade pois, segundo se escreveu ao Ministro do Ultramar, «a defesa desta ficaria só apoiada pela velha fortaleza de S. José». Nos acontecimentos políticos provenientes da mudança de regime em Portugal, em 1910, e durante as guerras mundiais de 1914-1918 e 1939-1945, a acção da velha fortaleza foi de pequeno relevo e, desde então, praticamente só serviu de aquartelamento e depósito de tropas. Fotografias existentes nos arquivos do Quartel-General de Bissau, datando de há pouco mais de um quarto de século, mostram a fortaleza de S. José com as suas muralhas desmoronadas, as edificações em ruínas, aparecendo, entre os destroços, ou quase cobertas pelo capim, uma ou outra peça. Para se celebrarem as comemorações do quinto centenário da descoberta da Guiné, a fortaleza foi parcialmente reparada, dado que algumas das principais cerimónias desenrolar-se-iam no interior das suas seculares muralhas. No dia 1 de Janeiro de 1946 começaram essas comemorações, que abrangeram toda a Guiné e às quais Portugal inteiro, desde o Minho a Timor, se associou. A primeira cerimónia teve lugar às oito horas desse dia com o içar, pelo comandante da Guarnição Militar, Major Pedro Pinto Cardoso, da Bandeira das Descobertas (Esta bandeira encontra-se emoldurada na Biblioteca do Quartel-General do Comando Territorial Independente da Guiné.). Ao acto prestaram honras militares forças da Armada, do Exército e do Corpo da Polícia de Segurança Pública. Finda a salva de 21 tiros, Sua Excelência o Governador, Comandante Sarmento Rodrigues, proferiu a sua célebre «Mensagem do Baluarte» (Em Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, I (1946) 349-352.). que começa com as seguintes palavras: «do alto deste baluarte, onde a bandeira portuguesa sempre com honra se ergueu... » Seguidamente as forças em parada desfilaram e inaugurou-se, na esplanada da fortaleza de S. José de Bissau, um pequeno monumento dedicado «aos heróis da ocupação e pacificação da Guiné», iniciando-se, assim, as cerimónias comemorativas do quinto centenário da Província. Em 1947 desmoronaram-se alguns lanços das muralhas da fortaleza e, no ano seguinte, deu-se a derrocada das edificações do Pavilhão dos oficiais e arrecadações do material de guerra. Dois anos foram necessários para se reconstruírem as muralhas e se demolirem as ruínas das edificações. Depois, em 1951, começou a construção de duas moradias, que substituíram o velho «Quartel de officiaes» que há cem anos, pouco antes da sua morte, o governador Honório Barreto mandou reconstruir. Durante anos e anos os quartéis da fortaleza serviram para alojar unidades militares, quer da guarnição de Bissau, quer em trânsito para o interior da Província, sendo a última unidade que se abrigou no interior das velhas muralhas o Batalhão de Intendência da Guiné.
  • 31. Na luta que hoje se trava contra um inimigo alentado e bem remuniciado por países estrangeiros, têm sido capturadas muitas toneladas de armamento. O Gabinete Militar do Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné promoveu uma exposição pública do material capturado e escolheu como local mais representativo para a apresentação desses troféus de guerra - que testemunham bem o inegável apoio do mundo comunista aos terroristas da Guiné - o interior da velha fortaleza de S. José de Bissau, espalhando pelo seu recinto, misturadas com seculares canhões, as mais modernas armas de fogo. Após esta exposição, em 1969, a fortaleza - vulgarmente chamada da Amura, ou seja, o nome em crioulo de muralha - passou a servir de sede ao Comando-Chefe das Forças Armadas da Guiné e, praticamente, a vida política e militar da Província voltou a irradiar, para todos os pontos guineenses. da antiga «casa do governo» da fortaleza de S. José de Bissau. Hoje, uma ponte de características modernas e simples, atravessa o único troço de fosso, existente junto à face poente, dando acesso à porta de armas, que está ladeada por dois belos exemplares de canhões belgas, fundidos em 1757 por L. Lefache, e por duas guaritas de cimento armado, estas sem qualquer interesse artístico. Um portão de ferro, tão modesto e simples que talvez fosse rejeitado em qualquer quinta um pouco mais abastada, substitui a porta que a fortaleza certamente devia ter possuído e que a riqueza de madeiras da região impunha. O túnel de passagem é baixo e curto, com uma curvatura de tecto pouco pronunciada. Nas suas paredes laterais existem duas lápides, modernas e de discutível bom gosto. A da direita tem o escudo da Guiné, mas com a tradicional «negrinha» (D. Afonso V, como símbolo da posse da Guiné. fazia uso de um bastão de marfim. rematado por uma cabeça de negra. Este bastão era conhecido pelo DOme de cnegrinha,. e foi. mais tarde. adoptado como emblema heráldico da provlncla da Guiné. sendo mantido pela portaria ministerial de 5 de Maio de 1935.) muito se assemelhando a um canhão - erro normalmente seguido e que dá origem a outra interpretação deste símbolo tendo gravadas as seguintes palavras: FORTALEZA DE S. JOSE DE BISSAU PRIMEIRAMENTE CONSTRUIDA EM 1696 PELO CAPITAO-MOR JOSE PINHEIRO. FOI INICIADA A SUA RECONSTRUÇAO EM 1753 SEGUNDO OS PLANOS DE FREI MANUEL DE VINHAIS SARMENTO E CONTI NUADA EM 1766 COM A TRAÇA DO COR MANUEL GERMANO DA MATA RECONSTRUIDA PARCIALMENTE EM 1916 Ao ler-se esta lápide quase se pode afirmar que, em cada linha, há um erro. A primeira fortaleza que existiu em Bissau tinha o nome de Nossa Senhora da Conceição, a padroeira de Portugal e orago da capela da fortificação que foi mandada demolir, completamente, por D. João V em 1707, e põe-se em dúvida se, meio século depois, teria sido reconstruída.
  • 32.
  • 33. Deve-se a traça da segunda fortaleza de Bissau ao Capitão-Engenheiro Pais de Meneses (Cf. ofldo do Ministro da Marinha e Ultramar. transcrito por ÁLVARES DÊ ANDRADÊ. ob. cit., p. 77 e indicada na pág. 489 deste trabalho.) e foi só após a morte deste que Freí Vinhais Sarmento, e por algum tempo, foi nomeado para a direcção das obras da fortaleza. Mas, como se indicou, tudo quanto construído sob a sua direcção foi provisório e ficou imperfeito. Da leitura de vários documentos verifica-se que a segunda fortaleza de Bissau estava de pé quando a Companhia do Grão-Pará expressou por escrito o seu contentamento pelo «bom sucesso do princípio da fundação da fortaleza»( GERMANO DA MATA ~ categ6r1co ao afirmar que. em 30 de Dezembro de 1765 deu «princípio a cortar as árvores e matos e a limpar o plano para se lançarem as 'primeiras I1nhas». Cf. CUNHA SARAIVA. A Fortaleza de' Bisseu e a Companhia de Grão-Parã· é MaranMo. p. 167; ÁLVARES ANDRADE. Planta da Praça de Bissau e suas adjacentes. p. 57.). Portanto, esta foi construída em local diferente das anteriores, contrariamente ao que se depreende da lápide. Por último, duvida-se da reconstrução da fortaleza em 1946, porquanto reconstruir é restaurar segundo a traça primitiva, e, nesta reconstrução, só houve a preocupação de tornar a fortaleza funcional para determinado fim, não se atendendo ao seu passado histórico. Assim, a pequenina capelinha de evocação a S. José desapareceu para dar origem a uma singela casa quadrada, tipo colonial, e também desapareceram os majestosos poílões que existiam em cada um dos baluartes(No arquivo do Quartel-General existe uma fotografia destes poilões.), além de hoje se verem nas arestas das muralhas inestéticas guaritas de cimento, pintadas de branco, em nítido contraste com a cor enegrecida das pedras lateríticas. Na parede do lado esquerdo do túnel de acesso à esplanada há uma pequena placa de bronze indicando que a fortaleza foi VISITADA PELO CHEFE DO ESTADO, GENERAL FRANCISCO HIGINO CRAVEIRO LOPES EM 3 DE MAIO DE 1955 Na esplanada, mas descentrado, ergue-se, desde 1946, um pequeno monumento dedicado aos «heróis da ocupação e pacificação da Guiné». Está rodeado de 4 canhões de ferro, de calibre 36, montados em reparos do mesmo metal. Dois destes canhões, os que estão voltados para a porta de serviço, são holandeses, um tem uma coroa que parece a sueca e o outro, provàvelmente, é de fundição inglesa. Junto à porta de serviço - que se vê ter sido rasgada na muralha, em ampliação da original - há um montículo de terra, ajardinado, onde se encontram uma caronada, um ancorote e uma hélice de avião, querendo simbolizar a união dos três ramos das Forças Armadas. Para realização deste fim, julga-se que a caronada - canhão típico da marinha - devia ser substituída por uma peça. No lado exterior da porta de serviço estão dois canhões de ferro, de calibre 24, montados nos respectivos reparos, tendo um as armas holandesas e o outro aspecto de ser de origem inglesa. Espalhados pelos parapeitos das muralhas encontram-se 24 canhões de ferro (Em todas as descrições sobre a fortaleza de S. José de Bissau verifica-se que o número de canhões vem diminuindo. Conquanto em 1847 tivesse sido dada ordem, de Lisboa, para «a inexplicável medida do
  • 34. desartllhamento gerai» (Revista Militar. ano de 1864. p. 128), não nos constou que, quer nessa ocasião quer em 1856 e 1877, ou datas posteriores, tivessem recolhido ao Arsenal do Exército canhões de ferro ou de bronze provenientes da Guiné. Assim o desaparecimento dos canhões que existiram na fortaleza de Bissau só se explica, para os mais pesados, pelo abandono e consequente enterramento natural; para os mais pequenos, em especial os de bronze, pelo roubo. Além das 35 peças de artilharia que se encontram na fortaleza de S. José. conhecem-se, em Bissau, mais nove bocas de fogo antigas, cujas características e locais onde se encontram resumidamente se indicam: - No Balalhão de Intendência de Angola: - Morteiro de ferro, possivelmente de fins do século XVIII – 1. No munhão esquerdo tem a marca S BOWLING e no fogão os números de referência 7 - I - 12. Está montado em reparo de ferro, próprio, e tem um diâmetro de boca de 230 mm. - No Museu de Bissau: . Canhão acolumbrinado, de ferro, do inicio do século XVII – 1; . Canhão de ferro do flnal do século XVIII – 1; . Peça de tiro de sinal, de ferro, do princípio do séc. XVIII – 1; N. B. A peça de tiro do sinal, uma das muitas que os indígenas nos roubaram, 101, há pouco mais de cem anos, utilizada pelos mandingas suas lutas contra os fulas. CI. Boletim Cultural da Guiné Portuguesa, II (1947) 449. . Canhão de bronze com a cifra de D. Maria I – 1. Os dois canhões de ferro parecem ser de origem inglesa. O canhão de bronze tem um corte triangular em bisel, invertido, junto ao «ouvido», que teria sido feito para embutir um «grão», o que sucedia quando as peças tinham feito muito fogo. - No Cemitério Municipal de Bissau: . Canhão de bronze, com o comprimento total de 96 cm e diâmetro de 10 cm. Alma com 6 estrias, slnistrorso. Na faixa da culatra tem a legenda: RUELLE-AN 1863, e nos munhões, esquerdo a direito, respectivamente, «N.º 100» e «P 101 K». . Canhão de bronze, idêntico ao anterior, com a data de 1870, tendo no munhão esquerdo a Indlcação: «N.º 16». . Canhão de bronze, com o comprimento total de 96 cm e o diâmetro de boca de 11.5 cm. Tem a alma lisa e a câmara estrangulada. No munhão esquerdo tem a indicação «N.º 232» e no direito «P 98 K». Tem marca de mira na bolada e na faixa da culatra, lado esquerdo superior, uns furos de adaptação de um aparelho, possivelmente de pontaria. Uma peça idêntica foi roubada em' 1959, ignorando-se o seu paradeiro. - Junto ao cais do Pigiguiti, na Avenida Marginal: . Canhão de ferro, provavelmente de calibre 36, enterrado pela boca, estando de fora o cascavel, culatra e parte do primeiro reforço. Esta peça, bem como os dois canhões de ferro que se encontram no Museu de Bissau, guarneciam o antigo forte do Pigiguiti. Por uma feliz determinação do Ex.º Secretário-Geral da Provinda vão recolher ao Museu de Bissau todas as peças antigas de artilharia que se encontram espalhadas pela Guiné, mesmo aquelas que estão a ser utilizadas como cabeços de amarração), dos quais só um ostenta as armas portuguesas – embora não tivesse sido feito em Portugal. Os restantes são holandeses, um possivelmente é sueco, outro deve-se às fundições belgas de Lefache, e há ainda um que tem, nos seus munhões, a característica «flôr de liz» francesa. No interior da esplanada, em parte sombreada por mangueiras, encontram-se, além dos quatro canhões já aludidos que rodeiam o monumento e da carona da perto da porta de serviço, mais duas peças deste tipo, uma das quais encravada com um pelouro de maior calibre. No chão, junto a cada uma destas bocas de fogo, existem uns quatro ou cinco pelouros de diversos tamanhos. Na varanda da «casa do governador», voltados para o mar, encontram-se quatro pequenos canhões de 47 mm, que há meio século faziam parte do armamento de algum navio de guerra. Exceptuando estas quatro peças, um total de 35 velhos canhões fazem imaginar, a quem os contempla - melhor que estes simples e breves apontamentos - o que foi a história da fortaleza de S. José de Bissau, através dos seus dois séculos de existência. Uma história atribulada, de sucessos e insucessos, de esperanças e desânimos, indelevel- mente ligados pela nossa constante vontade de permanecer na Guiné.
  • 35. BIBLIOGRAFIA ANTÓNIO AFONSO MENDES COUTINHO -- Apontamentos sobre a Praça de S. José de Bissau, Lisboa, 1853. BERNARDINO ANTÓNIO ALVES DE ANDRADE- Planta da Praça de Bissau e Suas Adjacentes. Introdução e notas do Dr. Damião Peres. Edição da Academia Portuguesa de História. 1952. Boletim Cultural da Guiné Portuguesa Bissau. CHRISTIANO JOSÉ DE SENNA BARCELOS - Subsídios para a história de Cabo Verde e Guiné, Tipografia da Academia Real das Sciencias de Lisboa, 1899 a 1912. FRANCISCO TRAVASSOS VALDEZ - Africa Occidenfal. Edição de Francisco .Artur da Silva. Lisboa. 1864. Cap. Eng. HENRIQUE C. S. BARAHONA – Carteira de um Africanista. Algumas palavras sobre as fortalezas da Guiné e da Africa Oriental. ln Revista de Engenharia Militar, ano de 1909. JOÃO BARRETO – História da Guiné. Edição do Autor. Lisboa. 1938. JOSÉ JOAQUIM LOPES DE LIMA - Ensaios sobre a statlstica das Possessões Portuguezas, Livro I. Imprensa Nacional, Lisboa. 1841. JOSÉ MENDES DA CUNHA SARAIVA - A Fortaleza de Bissau e a Companhia do Gão-Pará e Maranhão, ln Conqresso Comemorativo do Quinto Centenário do Descobrimento da Guiné, vol. I. pp. 157 ss. Idem. I Congresso da História da Expensão Portuguesa no Mundo. pp. 167-170. doc. n.º 2. nota F. MANUEL ANTÓNIO MARTINS – Memória demonstrativa do Estado Actual das. Praças de Bissau, Cacheu e suas dependências em África, ln Boletim Cultural da Guiné Portuguesa. XIII (1958) 203-216. Alf. MIGUEL ANTÓNIO PlMENTEL - A Guerra de Bissau em 1894. ln Revista Militar, ano de 1897, pp. 616 ss. TITO AUGUSTO DE CARVALHO -- As Compenhias Portuguesas de Colonização, Memória apresentada à Sociedade de Geografia de Lisboa, Lisboa, 1902.