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Este artigo tem a função de trazer ao leitor
um conhecimento geral da história do cinema
de animação como estudo da representação
gráfica do movimento, tendo como
principal personagem o fotógrafo Eadweard
Muybridge, autor da maior pesquisa de
fotografia seqüencial já realizada. Seu
trabalho foi considerado um marco para
o desenvolvimento das técnicas do cinema
de animação, sendo utilizado até hoje como
referência para diversos animadores.
Estudos históricos mostram que desde a
Idade Média o Homem se preocupou em
representar o movimento. Aproximadamente
no ano de 12.000 a.C., o Homem ainda não
conhecia a escrita e para narrar um fato ou
registrar um acontecimento, era comum
pintá-losnasparedesdasgrutas.Aprovadisto
está escondida nas Grutas de Altamira, na
Espanha, onde foram encontradas pinturas
rupestres de animais com o dobro do número
depatasquepossui,representandoatentativa
de demonstrar o movimento. A linguagem
desses desenhos podia ser compreendida por
um grande número de pessoas e assim os
fatos não foram esquecidos dentro daquela
sociedade.
Devido a grande preocupação em representar
o movimento nessas pinturas, os Egípcios
criaram, em 1.120 a.C. aproximadamente,
o que foi chamado pelos pesquisadores de
Código Social. Esse “código” nada mais era
do que uma espécie de padrão gráfico de
representação que era facilmente reconhecido
por todos. Dessa forma, todo podiam
compreender a narrativa proposta pelo autor
proporcionando sua conservação para novas
gerações.
Com o tempo o Homem desenvolveu novas
formas de comunicação e novos meios de
narrativas nas quais a representação do
movimento muitas vezes estava presente,
como nas artes, na pintura, na escultura, na
escrita e no teatro.
Paola Gama & Fernanda Sendra
Em Junho de 1878
na Califórnia,
Eadweard Muybridge
fotografou a primeira
de uma série de
imagens sequenciais
em movimento
(cinematografia).
01
Eadweard Muybridge, o pai da fotografia seqüencial.
A fotografia seqüencial de
Eadweard Muybridge
e o cinema de animação
No teatro, os primeiros ensaios registrados
na Idade Média, narravam histórias através
da interação dos personagens, dos cenários e
da platéia. Há quem acredite que a história
era contada não só através do diálogo dos
personagens, mas também pelo cenário onde
a história se passava e o figurino que o elenco
utilizava. Porém, aproximadamente em
5.000 a.C. na china, o teatro era apresentado
apenas pela projeção das silhuetas (sombras)
dos personagens em uma parede: nascia o
Teatro de Sombras Chinesas. A narrativa era
apresentada à platéia apenas pela projeção
do movimento, sem vozes, sem figurino, e
na maioria das vezes, sem cenário. Talvez as
Sombras Chinesas provem a importância da
descrição do movimento para a compreensão
da narrativa e explica o porquê o Homem
sempre tentou representá-lo.
Osanossepassaramemuitasoutraspesquisas
sobre a decomposição do movimento foram
feitas. No século II, por exemplo, o astrônomo
grego Cláudio Ptolomeu observou e estudou
a persistência das impressões visuais na
retina. Este estudo mostrou que nossa retina
não é capaz de ver o movimento por inteiro,
mas apenas uma seqüência fragmentada,
ou seja, imagens estáticas em seqüência,
que são unidas pelo cérebro, nos dando a
impressão de estarmos vendo o movimento.
Tal descoberta abriu espaço para a pesquisa e
para o desenvolvimento de novas tecnologias
que permitiram estudos mais aprofundados
sobre o assunto.
Estes fatos fizeram do século XIX, um
período marcado pela criação de diversos
aparelhos que tinham como objetivo narrar
histórias através da projeção de desenhos
que criavam a ilusão de movimento,
sendo os principais: Fenasquistoscópio,
Zootrópico, Praxinoscópio, Zoopraxinoscópio
e Taumatroscópio. Esses aparelhos já tinham
a capacidade de projetar o movimento a
partir da sucessão de imagens (desenhos
sequênciais). Essa decomposição do
movimento desenhada por artistas só era
possível após um minucioso trabalho de
observação e compreensão do movimento.
Essas projeções fizeram grande sucesso na
época, tornando-se a principal forma de
entretenimento. Este foi o início da história
da animação. Além disso, essas imagens
revelavam um enorme avanço estético da
representação gráfica do movimento.
Em 1820, os franceses Niecephore Niepse
e Louis Daguerre inventaram a fotografia.
Esse avanço tecnológico permitiu o início
de análises e pesquisas aprofundadas sobre
a decomposição do movimento humano e
animal, através da captura real das diversas
fases do movimento. A fotografia permitia
agora o desenvolvimento de uma nova forma
de expressão gráfica: estava nascendo o
cinema.
Em 1872, sob a encomenda do Governador
da Califórnia Leland Standford, o fotógrafo
Eadweard Muybridge desenvolveu uma
pesquisa que mais tarde seria considerada o
trabalhomaisimportantedefotosseqüenciais
da história. Nascido em Kingston-on-Thames
(Inglaterra) em 1830, Eadweard Muybridge
foi trabalhar como fotógrafo nos EUA, onde
ganhava a vida retratando paisagens do Oeste
americano.
Em 1872, já reconhecido por seu trabalho,
foi convidado pelo Governador da Califórnia
para fotografar o galope de um cavalo,
com o objetivo de mostrar que este, em um
determinado momento da ação, retirava
as quatro patas do chão (tratava-se de uma
Muybridge instala
24 máquinas
fotográficas em
intervalos regulares
ao longo de uma
pista de corrida e
liga a cada máquina
fios que atravessam
a pista. Com a
passagem do cavalo,
os fios são rompidos,
desencadeando o
disparo sucessivo
dos obturadores, que
produzem 24 poses
consecutivas.
02
Fotografia seqüencial de Eadweard Muybridge.
Paola Gama & Fernanda Sendra
O “bullet time” é
um efeito especial
cinematográfico em
que enquanto uma
ação se desenrola, o
tempo é desacelerado
e conseguimos ver
a trajetória de um
movimento em 360
graus, como
se fosse em
câmera lenta.
03
aposta, na qual Standford estaria envolvido, e
as fotos serviriam de provas para a apuração
dos resultados).
Muybridge,auxiliadopeloengenheiroJohnD.
Isaacs,criouumsistemacompreendidopor24
câmeras escuras, cada qual com uma chapa
emulsionada, que eram acionadas por fios
devidamente esticados no local onde o cavalo
correria. À medida que o cavalo passava, ele
tocava nos fios e acionava sucessivamente
as câmeras, capturando posições chaves do
movimento do galope. Esse experimento foi
tão bem sucedido que não só provou que o
cavalo em determinado momento do galope
retirava as quatro patas do chão, como
deu a Muybridge e a Standford as honras
da descoberta do processo de a ánalise do
movimento fotograficamente.
Muybridge ficou tão entusiasmado com o
resultado do trabalho que dedicou o resto
de sua carreira à fotografia seqüencial do
movimento. Sua pesquisa foi tão completa
que até hoje é utilizada como referência por
animadores do mundo inteiro.
Nãohádúvidassobreaimportânciadotrabalho
de Muybridge para o desenvolvimento do
cinema. Sua pesquisa unida à descoberta da
emulsão sensível à luz sobre película flexível
de celulose, criada em 1887 pelo fotógrafo
amador Hannibal Goodwin, foi o ponto de
partida para que em 1895, os irmãos Auguste
eLouisLumiéreapósanalisaremosaparelhos
de projeção já existentes, puderam criar o
cinematógrafo. Este aparelho apresentava
um sistema de captura e de projeção à partir
de películas emulsionadas. As imagens
seqüenciais das películas eram projetadas
com uma freqüência capaz de dar a ilusão de
movimento contínuo. Estava criado então, o
cinema de animação.
Ao longo do tempo o cinema foi evoluindo
cada vez mais e novas tecnologias foram sendo
desenvolvidas e aplicadas. No século XX,
surgiu então, uma nova forma de demonstrar a
ação, que é a tridimensionalidade à 360 graus.
Esseefeitoespecialpôdeservistopelaprimeira
vez em “Matrix” e foi um dos elementos que
mais chamaram a atenção do público no
lançamento do filme. Cenas jamais vistas e
efeitos criados especialmente para o filme
provocaram uma verdadeira revolução na
técnica cinematográfica. Não seria exagero
dizer que, pelo menos no aspecto técnico,
o cinema nunca mais foi o mesmo depois
de “Matrix”.
A principal inovação do filme era o chamado
“bullet time”, um efeito que ilustrava a
manipulação do tempo pelo personagem
Neo (Keanu Reeves). Enquanto a ação se
desenrola, o tempo é desacelerado a ponto de
vermos a trajetória das balas numa espécie de
câmera lenta. Enquanto o personagem desvia
dasbalas,manipulandoagravidade,câmeras
mostram a ação em 360 graus.
Praticamente todas as produções de aventura
lançadas depois de “Matrix” copiavam, de
uma forma ou de outra, este efeito. O “bullet
time” virou mote até mesmo de comerciais
para a TV e paródias como “Todo Mundo
em Pânico”. As inesquecíveis cenas de luta,
misturando golpes de kung fu com câmeras
lentas e acrobacias inovadoras, também
caíram nas mãos dos plagiadores de filmes e
desenhos animados.
O efeito “bullet time” em uma cena de Matrix.
04
Após analisar a história do cinema de
animação, pode-se perceber então, a
importância do trabalho de fotografias
seqüenciais de Eadweard Muybridge. Elas
ajudaram os animadores a compreender
melhor o movimento e suas posições
chaves, afinal é muito mais fácil estudar
um movimento decomposto em uma série
de fotografias do que tentar fazê-los a “olho
nú” e em tempo real. Esse estudo permitiu o
desenvolvimento cinematográfico e permitiu
a evolução na forma de representar uma
ação, que é o caso do filme “Matrix”. O
estudo fotográfico do movimento foi a maior
importância do trabalho de Muybridge para o
desenvolvimento do cinema.
Hoje, pode-se dizer que as evoluções
cinematográficas não têm limites. A cada dia
quepassaohomemdesenvolvenovastécnicas,
novos efeitos especiais, novas formas de
demonstrar os movimentos e as ações, que se
tornamcadavezmaisreaisenosfazconfundir
muitas vezes a ficção com a realidade.
	
BIBLIOGRAFIA
BARBOSA JÚNIOR, Alberto Lucena. Arte da
Animação Técnica e Estética através da
História, São Paulo: Editora SENAC SP,
2002. 456 p.
JANSON, H. W. & JANSON, Antony F. Iniciação
à História da Arte - 2ª ed. São Paulo:
Martins Fontes, 1996. 475 p.
LAYBOURNE, Kit. The Animation book:
A complete guide animated filmmarking
from flip-books to sound cartoons to 3-D
animation. new digital edition. New York:
Three Rivers Press, 1998. 426 p.
MORENO, Antonio. A experiência brasileira no
cinema de animação, Rio de Janeiro:
Artenova, 1978. 127 p.
PERISIC, Zoran. Guia prático do cinema de
animação. Lisboa: Presença; São Paulo:
Martins Fontes, 1979. 238 p.
1826
Thaumatrópo
1812
Fenacistoscópio
1834
Zootrópo
1877
Praxinoscópio
1878
Zoopraxinoscópio
1878
Fuzil fotográfico
1890
Cinetoscópio
1895
Cinematógrafo
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História do cinema de animação desde as pinturas rupestres até o efeito bullet time em Matrix

  • 1. Este artigo tem a função de trazer ao leitor um conhecimento geral da história do cinema de animação como estudo da representação gráfica do movimento, tendo como principal personagem o fotógrafo Eadweard Muybridge, autor da maior pesquisa de fotografia seqüencial já realizada. Seu trabalho foi considerado um marco para o desenvolvimento das técnicas do cinema de animação, sendo utilizado até hoje como referência para diversos animadores. Estudos históricos mostram que desde a Idade Média o Homem se preocupou em representar o movimento. Aproximadamente no ano de 12.000 a.C., o Homem ainda não conhecia a escrita e para narrar um fato ou registrar um acontecimento, era comum pintá-losnasparedesdasgrutas.Aprovadisto está escondida nas Grutas de Altamira, na Espanha, onde foram encontradas pinturas rupestres de animais com o dobro do número depatasquepossui,representandoatentativa de demonstrar o movimento. A linguagem desses desenhos podia ser compreendida por um grande número de pessoas e assim os fatos não foram esquecidos dentro daquela sociedade. Devido a grande preocupação em representar o movimento nessas pinturas, os Egípcios criaram, em 1.120 a.C. aproximadamente, o que foi chamado pelos pesquisadores de Código Social. Esse “código” nada mais era do que uma espécie de padrão gráfico de representação que era facilmente reconhecido por todos. Dessa forma, todo podiam compreender a narrativa proposta pelo autor proporcionando sua conservação para novas gerações. Com o tempo o Homem desenvolveu novas formas de comunicação e novos meios de narrativas nas quais a representação do movimento muitas vezes estava presente, como nas artes, na pintura, na escultura, na escrita e no teatro. Paola Gama & Fernanda Sendra Em Junho de 1878 na Califórnia, Eadweard Muybridge fotografou a primeira de uma série de imagens sequenciais em movimento (cinematografia). 01 Eadweard Muybridge, o pai da fotografia seqüencial. A fotografia seqüencial de Eadweard Muybridge e o cinema de animação
  • 2. No teatro, os primeiros ensaios registrados na Idade Média, narravam histórias através da interação dos personagens, dos cenários e da platéia. Há quem acredite que a história era contada não só através do diálogo dos personagens, mas também pelo cenário onde a história se passava e o figurino que o elenco utilizava. Porém, aproximadamente em 5.000 a.C. na china, o teatro era apresentado apenas pela projeção das silhuetas (sombras) dos personagens em uma parede: nascia o Teatro de Sombras Chinesas. A narrativa era apresentada à platéia apenas pela projeção do movimento, sem vozes, sem figurino, e na maioria das vezes, sem cenário. Talvez as Sombras Chinesas provem a importância da descrição do movimento para a compreensão da narrativa e explica o porquê o Homem sempre tentou representá-lo. Osanossepassaramemuitasoutraspesquisas sobre a decomposição do movimento foram feitas. No século II, por exemplo, o astrônomo grego Cláudio Ptolomeu observou e estudou a persistência das impressões visuais na retina. Este estudo mostrou que nossa retina não é capaz de ver o movimento por inteiro, mas apenas uma seqüência fragmentada, ou seja, imagens estáticas em seqüência, que são unidas pelo cérebro, nos dando a impressão de estarmos vendo o movimento. Tal descoberta abriu espaço para a pesquisa e para o desenvolvimento de novas tecnologias que permitiram estudos mais aprofundados sobre o assunto. Estes fatos fizeram do século XIX, um período marcado pela criação de diversos aparelhos que tinham como objetivo narrar histórias através da projeção de desenhos que criavam a ilusão de movimento, sendo os principais: Fenasquistoscópio, Zootrópico, Praxinoscópio, Zoopraxinoscópio e Taumatroscópio. Esses aparelhos já tinham a capacidade de projetar o movimento a partir da sucessão de imagens (desenhos sequênciais). Essa decomposição do movimento desenhada por artistas só era possível após um minucioso trabalho de observação e compreensão do movimento. Essas projeções fizeram grande sucesso na época, tornando-se a principal forma de entretenimento. Este foi o início da história da animação. Além disso, essas imagens revelavam um enorme avanço estético da representação gráfica do movimento. Em 1820, os franceses Niecephore Niepse e Louis Daguerre inventaram a fotografia. Esse avanço tecnológico permitiu o início de análises e pesquisas aprofundadas sobre a decomposição do movimento humano e animal, através da captura real das diversas fases do movimento. A fotografia permitia agora o desenvolvimento de uma nova forma de expressão gráfica: estava nascendo o cinema. Em 1872, sob a encomenda do Governador da Califórnia Leland Standford, o fotógrafo Eadweard Muybridge desenvolveu uma pesquisa que mais tarde seria considerada o trabalhomaisimportantedefotosseqüenciais da história. Nascido em Kingston-on-Thames (Inglaterra) em 1830, Eadweard Muybridge foi trabalhar como fotógrafo nos EUA, onde ganhava a vida retratando paisagens do Oeste americano. Em 1872, já reconhecido por seu trabalho, foi convidado pelo Governador da Califórnia para fotografar o galope de um cavalo, com o objetivo de mostrar que este, em um determinado momento da ação, retirava as quatro patas do chão (tratava-se de uma Muybridge instala 24 máquinas fotográficas em intervalos regulares ao longo de uma pista de corrida e liga a cada máquina fios que atravessam a pista. Com a passagem do cavalo, os fios são rompidos, desencadeando o disparo sucessivo dos obturadores, que produzem 24 poses consecutivas. 02 Fotografia seqüencial de Eadweard Muybridge.
  • 3. Paola Gama & Fernanda Sendra O “bullet time” é um efeito especial cinematográfico em que enquanto uma ação se desenrola, o tempo é desacelerado e conseguimos ver a trajetória de um movimento em 360 graus, como se fosse em câmera lenta. 03 aposta, na qual Standford estaria envolvido, e as fotos serviriam de provas para a apuração dos resultados). Muybridge,auxiliadopeloengenheiroJohnD. Isaacs,criouumsistemacompreendidopor24 câmeras escuras, cada qual com uma chapa emulsionada, que eram acionadas por fios devidamente esticados no local onde o cavalo correria. À medida que o cavalo passava, ele tocava nos fios e acionava sucessivamente as câmeras, capturando posições chaves do movimento do galope. Esse experimento foi tão bem sucedido que não só provou que o cavalo em determinado momento do galope retirava as quatro patas do chão, como deu a Muybridge e a Standford as honras da descoberta do processo de a ánalise do movimento fotograficamente. Muybridge ficou tão entusiasmado com o resultado do trabalho que dedicou o resto de sua carreira à fotografia seqüencial do movimento. Sua pesquisa foi tão completa que até hoje é utilizada como referência por animadores do mundo inteiro. Nãohádúvidassobreaimportânciadotrabalho de Muybridge para o desenvolvimento do cinema. Sua pesquisa unida à descoberta da emulsão sensível à luz sobre película flexível de celulose, criada em 1887 pelo fotógrafo amador Hannibal Goodwin, foi o ponto de partida para que em 1895, os irmãos Auguste eLouisLumiéreapósanalisaremosaparelhos de projeção já existentes, puderam criar o cinematógrafo. Este aparelho apresentava um sistema de captura e de projeção à partir de películas emulsionadas. As imagens seqüenciais das películas eram projetadas com uma freqüência capaz de dar a ilusão de movimento contínuo. Estava criado então, o cinema de animação. Ao longo do tempo o cinema foi evoluindo cada vez mais e novas tecnologias foram sendo desenvolvidas e aplicadas. No século XX, surgiu então, uma nova forma de demonstrar a ação, que é a tridimensionalidade à 360 graus. Esseefeitoespecialpôdeservistopelaprimeira vez em “Matrix” e foi um dos elementos que mais chamaram a atenção do público no lançamento do filme. Cenas jamais vistas e efeitos criados especialmente para o filme provocaram uma verdadeira revolução na técnica cinematográfica. Não seria exagero dizer que, pelo menos no aspecto técnico, o cinema nunca mais foi o mesmo depois de “Matrix”. A principal inovação do filme era o chamado “bullet time”, um efeito que ilustrava a manipulação do tempo pelo personagem Neo (Keanu Reeves). Enquanto a ação se desenrola, o tempo é desacelerado a ponto de vermos a trajetória das balas numa espécie de câmera lenta. Enquanto o personagem desvia dasbalas,manipulandoagravidade,câmeras mostram a ação em 360 graus. Praticamente todas as produções de aventura lançadas depois de “Matrix” copiavam, de uma forma ou de outra, este efeito. O “bullet time” virou mote até mesmo de comerciais para a TV e paródias como “Todo Mundo em Pânico”. As inesquecíveis cenas de luta, misturando golpes de kung fu com câmeras lentas e acrobacias inovadoras, também caíram nas mãos dos plagiadores de filmes e desenhos animados. O efeito “bullet time” em uma cena de Matrix.
  • 4. 04 Após analisar a história do cinema de animação, pode-se perceber então, a importância do trabalho de fotografias seqüenciais de Eadweard Muybridge. Elas ajudaram os animadores a compreender melhor o movimento e suas posições chaves, afinal é muito mais fácil estudar um movimento decomposto em uma série de fotografias do que tentar fazê-los a “olho nú” e em tempo real. Esse estudo permitiu o desenvolvimento cinematográfico e permitiu a evolução na forma de representar uma ação, que é o caso do filme “Matrix”. O estudo fotográfico do movimento foi a maior importância do trabalho de Muybridge para o desenvolvimento do cinema. Hoje, pode-se dizer que as evoluções cinematográficas não têm limites. A cada dia quepassaohomemdesenvolvenovastécnicas, novos efeitos especiais, novas formas de demonstrar os movimentos e as ações, que se tornamcadavezmaisreaisenosfazconfundir muitas vezes a ficção com a realidade. BIBLIOGRAFIA BARBOSA JÚNIOR, Alberto Lucena. Arte da Animação Técnica e Estética através da História, São Paulo: Editora SENAC SP, 2002. 456 p. JANSON, H. W. & JANSON, Antony F. Iniciação à História da Arte - 2ª ed. São Paulo: Martins Fontes, 1996. 475 p. LAYBOURNE, Kit. The Animation book: A complete guide animated filmmarking from flip-books to sound cartoons to 3-D animation. new digital edition. New York: Three Rivers Press, 1998. 426 p. MORENO, Antonio. A experiência brasileira no cinema de animação, Rio de Janeiro: Artenova, 1978. 127 p. PERISIC, Zoran. Guia prático do cinema de animação. Lisboa: Presença; São Paulo: Martins Fontes, 1979. 238 p. 1826 Thaumatrópo 1812 Fenacistoscópio 1834 Zootrópo 1877 Praxinoscópio 1878 Zoopraxinoscópio 1878 Fuzil fotográfico 1890 Cinetoscópio 1895 Cinematógrafo Linha do Tempo das invenções dos principais aparelhos da história da evolução do cinema.