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Morrer.
E depois?
Endereço do autor para correspondência:
Waldo Lima do Valle
Av. Gov. Argemiro de Figueirêdo, 3711 – Bessa
João Pessoa – Paraíba – Brasil
CEP: 58036–030 – Fone: (83) 3246 11 40
E-mail: waldolimadovalle@gmail.com
Waldo Lima do Valle
Morrer.
E depois?
Laser Plus Studio Gráfico
Copyright © 1997 by Waldo Lima do Valle	
Capa:
Waldo L. V. Filho
Ilustração da capa:
Fotoarte
Revisão:
Waldemir Lopes de Andrade
Impressão
Laser Plus Studio Gráfico
CIP – Brasil Catalogação na fonte
218
V181m	 Valle, Waldo Lima do
Morrer… e depois?: como vivem os que morrem / Waldo Lima do Valle.
João Pessoa, 1997.
324 p.
1.Imortalidade 2.Espiritismo
I–Título
Aos simples de coração,
Que amam a verdade,
E buscam,
Na ânsia de encontrá-la…
Ao filho Waldo, que leu este livro antes de ele ser escrito…
Agradecimentos
Meu agradecimento especial vai para Nelson Eduardo Lima Ribeiro e
esposa, Solange Venâncio Travassos, pelo apoio logístico e incentivo à edi-
ção deste trabalho.
Sou sinceramente grato a Marcelo de Sousa Santos, que digitou o texto,
e o fez com extrema dedicação e amor.
Agradeço ao Professor Waldemir Lopes de Andrade que, com rara com-
petência e habilidade, fez toda a revisão de linguagem, ajustando e melho-
rando a estrutura formal, o que contribuiu para a maior clareza dos temas
abordados.
Finalmente, minha gratidão a Maria da Conceição Moura dos Santos,
por um gesto nobre e silencioso de Amor-Cristão.
O Autor.
Dois Esclarecimentos
O autor, embora escreva sobre a morte, somente crê na Vida. Por isso,
decidiu, numa liberdade ortográfica, enfatizar a palavra Vida, grafando-a
com inicial maiúscula, no decorrer de todo o livro.
Ao leitor espírita
Este livro é ecumênico. Nada tem de polêmico. Consequentemente, não
visa converter ninguém. Por isso, na redação dos Capítulos sobre as visões
de outras religiões (Parte III), respeitamos, integralmente, as exposições dos
entrevistados, na justificação dos seus pontos de vista. Daí, resultaram textos
redigidos pelo autor, sem qualquer análise crítica.
A “Visão Espírita” foi exposta pelo autor em mais de 200 páginas, em que
justificou, com argumentos, as suas convicções.
Desse modo, o leitor espírita terá a oportunidade de conhecer as “visões”
de outras religiões e o leitor em geral ficará inteiramente livre para a escolha
e o aceite daquela “visão” mais lógica e convincente.
“Examinai tudo. Retende o bem.” (I Tess. 5, 21)
“Não reclames, da Terra
os seres que partiram…
Olha a planta que volta,
na semente, a morrer.
Chora, de vez que o pranto
purifica a visão;
No entanto, continua
agindo para o bem.
Lágrima sem revolta,
é orvalho de esperança…
A morte é a própria Vida,
numa nova edição!…”
(Emmanuel / Francisco Cândido Xavier)
“O pássaro é livre,
na prisão do ar.
O espírito é livre,
na prisão do corpo.
Mas livre, bem livre,
é mesmo estar morto…”
(Carlos Drummond de Andrade)
Por que a irmã gêmea da Vida se chama morte?
Morte: palavra pesada, semelhante a toneladas de escuridão, esmagando-
nos…
A morte poderia muito bem ser chamada de “passagem”. É leve. É suave.
Chegando ao final da viagem, encontramos a “passagem”…
Depositamos no chão a roupagem física.
Não morremos.
“Passamos”.
Que tranqüilidade!…
Hélia F. Barata (Ely)
Ao leitor:
Preciso dar-lhe uma notícia que, talvez, você ainda não saiba.
Pensei em suavizar esta notícia, pintá-la com cores mais brilhan-
tes, enchê-la com promessas de Paraíso, visões do Absoluto, explicações
esotéricas.
Mas, embora tudo isto exista, não vem ao caso tocar, agora, nesses
assuntos.
Respire fundo e prepare-se.
Sou obrigado a ser direto e franco e, posso assegurar-lhe, tenho absoluta
certeza do que vou dizer.
É uma previsão infalível, sem qualquer margem de dúvidas.
A notícia é a seguinte: “você vai morrer”!
Pode ser hoje, amanhã, daqui a cinqüenta anos… mas, cedo ou tarde,
“você vai morrer”.
Mesmo que não concorde.
Mesmo que tenha outros planos.
Pense com todo o cuidado no que você irá fazer hoje. E amanhã.
E no resto dos seus dias…
Paulo Coelho
(In “Maktub”, secção diária do jornal O correio da Paraíba, edição do dia 29 de dezem-
bro de 1996)
Súmario
I
Preâmbulo
À Guisa de Prefácio 21
Os Que Não Devem Ler Este Livro 25
II
Antes da Morte
Considerações Gerais Sobre a Morte e o Morrer 29
Da Morte Para a Vida… Da Vida Para a Morte… 37
À Espera da Morte – O Doente Terminal 43
Experiências de Quase-morte 47
Experiências de Quase-morte: um Enfoque Espírita 53
O Melhor Lugar Para Morrer 59
A Melhor e a Pior Forma de Morrer 63
III
A Morte e o Morrer
A Visão Contemporânea de Cinco Religiões
A Visão Católica 69
A Visão Evangélica 79
A Visão Judaica 87
A Visão Islâmica 91
A Visão Budista 97
IV
Depois da Morte – A Visão Espírita
Como Vivem os Que Morrem
A Matéria e Seus Estados Mais Sutis 107
Esferas Espirituais 111
Cidades Espirituais 115
Solos Espirituais 123
As Trevosas Regiões Subcrostais 125
Regiões Purgatoriais e Infernais 127
Céu e Céus – Regiões Felizes 133
Anjos e Demônios 135
O Instante da Morte 139
Os Técnicos da Morte 143
Visão Retrospectiva, no Instante da Morte 147
O Cordão Prateado 149
O Sono Após a Morte 152
O Despertar do Espírito no Outro Lado da Vida 155
Reencontros nos Planos Espirituais 159
O Retorno dos Bons à Vida Espiritual 163
Religiões no Mundo dos Espíritos 167
O Trabalho dos Espíritos 173
Alimentação dos Espíritos 177
Como se Vestem os Espíritos 181
Locomoção dos Espíritos – Volitação 185
Trânsito dos Espíritos Entre Esferas Espirituais 187
Aeronaves Espirituais 191
Famílias Espirituais 197
Amor e Afetividade Entre os Espíritos 201
Namoro, Noivado e Matrimônio no Além 205
Sexo nos Planos Espirituais 209
Vida Social nos Planos do Espírito 213
A Arte no Além-vida 217
Enfermidades Espirituais 221
Recordação de Existências Passadas 225
Crianças nos Planos Espirituais 227
Selvagens – Como Vivem no Além 229
Ateus e Agnósticos na Vida Espiritual 233
A Outra Vida dos Animais 237
Morte por Eutanásia 241
Morte por Aborto 245
Morte por Suicídio (I) 255
Morte por Suicídio (II) 261
Morte por Suicídio (III) – Depoimentos 265
Mortes Violentas 273
Mortes Coletivas 277
Espíritos Inferiores – O Que Fazem no Além 281
Vampirismo Entre Dois Mundos 287
Legião É o Meu Nome, Porque Somos Muitos 291
Como Vivem os Bons Espíritos 293
Espíritos de Luz 297
O Estado Glorioso dos Puros Espíritos 301
A Aura dos Espíritos 305
A Visão de Deus e de Jesus 309
Envoltórios Espirituais 313
Vidas e Mortes na Caminhada Evolutiva do Espírito 317
Ação dos Espíritos no Mundo em Que Vivemos 321
Assombrações – Por Que Acontecem 323
Missões de Amor nas Regiões Inferiores do Astral 327
Justiça nos Planos Espirituais 329
Prisões e Confinamentos nos Planos Espirituais 333
Deixemos os Que Morrem em Paz 337
Epílogo 341
I
Preâmbulo
1
À Guisa de Prefácio
Poderá parecer aos que vão ler estas páginas que o seu autor seja um “filo-
tânato” – permitam-me o neologismo – isto é, um amante do mórbido
ou do macabro, para escrever, com tanta riqueza de detalhes, sobre “a morte
e o morrer”.
Puro engano!
Vejo-me, pelo contrário, um “biófilo”, isto é, um amante da Vida, na sua
gama infinita de manifestações, escrevendo sobre a morte por nela não acre-
ditar e por considerá-la a antecâmara da Vida.
Sem a morte, jamais haveria ressurreição e nunca poderíamos penetrar
na “Vida Abundante” das promessas de Jesus no Seu Evangelho de luz e de
redenção.
Foi Ele quem afirmou: “— Eu vim a este mundo para que todos tenham
Vida e a tenham em abundância” (Jo. 10, 10), como quem diz: Vim anunciar
que, além das fronteiras deste mundo, existem outras dimensões de Vida,
onde a Verdade, a Beleza, a Bondade e a Justiça acontecem em níveis ainda
desconhecidos, aqui, na Terra.
Este livro, cujo subtítulo é Como vivem os que morrem visa, acima de tudo,
esclarecer e confortar os que temem a morte, aqueles que jamais a querem
ver, os que dela sentem aversão e pavor. Nele, procuramos demonstrar, atra-
vés de sólida argumentação e com base em relatos recebidos do Além por
médiuns idôneos, que, para lá do sepulcro, a Vida continua em dimensões
ainda desconhecidas da grande maioria dos que, aqui, habitam.
O livro que escrevi procura elucidar, consolar e fazer luz sobre o ou-
tro lado da Vida, mostrando que, neste mundo, nada mais somos do que
Espíritos revestidos de carne. Morrer, portanto, é deixar, sob os túmulos
de pedra, o invólucro carnal, partindo o espírito, livre, para as Mansões da
Casa do Pai.
O próprio Jesus afirmou: “— Não se turbe o vosso coração. Crede em
21
Deus. Crede também em mim. Na Casa de meu Pai há muitas moradas.” (Jo.
14, 2)
Entretanto, este livro encerra, também, uma grave advertência: tal Vida,
tal morte! Ou, como escreveu Paulo, em sua Carta aos Gálatas: “Não vos
enganeis. De Deus não se zomba. Pois aquilo que o homem semear, isso
também ceifará” (Gal. 6, 7), o que significa dizer: Vida reta, neste mundo,
pautada nos ditames do Evangelho do Mestre, equivale, para o espírito, a
portas abertas nos Planos Espirituais superiores. Vida errada, voltada tão so-
mente para as baixas paixões e interesses mesquinhos do mundo, representa,
para a alma, dores e sofrimentos atrozes em seu reingresso aos páramos da
Eternidade.
O livro tem, portanto, um nobre objetivo: despertar as consciências hu-
manas para as vantagens de um viver digno, reto, nos braços da Lei de Deus,
na certeza de que, somente assim, seremos felizes, tanto nesta, quanto na
outra Vida.
“A morte não nos faz o que a Vida não nos fez…!” – afirmou o grande
filósofo cristão Huberto Rohden.
Finalmente, poderíamos sintetizar toda a filosofia que inspirou este tra-
balho, na afirmação de Rudyard Kipling, em Se, seu célebre poema: “Diante
da morte, nem desejo de a ver, nem temor de vê-la.”
Não queremos, evidentemente, estimular ninguém a buscar a morte, en-
curtando, voluntariamente, seus anos de Vida, na Terra. Não! Absolutamente,
não! Pelo contrário, queremos que todos aproveitem, e muito bem, os mi-
nutos e segundos de suas vidas na construção de si mesmos e na reedifica-
ção do mundo, considerando a oportunidade da existência, na carne, uma
bênção de Deus, e a permanência, neste orbe, um aprendizado dos mais
valiosos que, se levado a sério, guindará o ser humano aos Altos Cimos da
Vida Espiritual.
Este livro escancara as portas da Eternidade, exprimindo como devemos
viver na Terra para entrar no Além, de fronte erguida pela consciência do
dever cumprido. Estimula cada um a criar o céu dentro de si mesmo: “O
Reino de Deus está dentro de cada um de vós” (Lc. 17, 21), disse o Cristo.
Quem não constrói esse paraíso interior, jamais penetrará, um dia, no
Paraíso Celestial, isto porque, como diz Richard Bach em sua obra-prima
– A história de Fernão Capelo Gaivota: “O Paraíso não é um lugar nem é um
tempo… O Paraíso é ser perfeito e você o encontrará quando houver atin-
gido a perfeição.”1
O Autor
1	 Richard Bach, A história de Fernão Capelo Gaivota, p. 89.
2322
2
Os Que Não Devem Ler Este Livro
Este é um livro sobre a morte e o morrer. Um estudo tanatológico, sob
um prisma religioso.
O autor é ecumênico por convicção. Sua religião está sintetizada em qua-
tro afirmações do filósofo francês Léon Denis: “Por templo, o Universo. Por
altar, a consciência. Por imagem, Deus. Por lei, o amor”. Entretanto, sua for-
mação religiosa básica é a espírita. E foi exatamente essa religião que o levou
ao ecumenismo, vez que o Espiritismo tem como um dos seus postulados
básicos o de que “fora do amor não há salvação”.
A Doutrina Espírita, síntese da sabedoria dos séculos e dos milênios, pos-
sui um tríplice aspecto: é ciência, filosofia e religião.
No seu aspecto religioso, fundamenta-se na mensagem de Jesus, por Ele
próprio sintetizada numa máxima ética de validade universal: “Tudo quan-
to, pois, quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles
porque esta é a Lei e os Profetas.” (Mt. 7, 12)
Em verdade, isto é amor, e amor na expressão mais sublime desse
sentimento.
Por tratar-se de um livro quase todo baseado em princípios espíritas,
somente deve ser lido por pessoas sem preconceitos, abertas ao novo, que
realmente “pensam para saber”; pessoas não satisfeitas, em caráter absoluto,
com as respostas que as suas crenças, sistemas e ideologias têm dado aos
magnos problemas do existir humano, e do Além-túmulo.
Como seu autor, desaconselho a sua leitura a todos os profitentes orto-
doxos de qualquer religião. Que o leiam os que têm fome e sede da Verdade
que liberta; os que anseiam conhecer como vivem os Espíritos no outro
lado da Vida; os que possuem uma fé fundamentada no raciocínio; em suma,
os inquietos por respostas mais plausíveis sobre o futuro eterno do espírito
humano.
Asseguro a esses últimos que o livro que irão ler valerá como uma “gi-
24 25
nástica do espírito”2
expressão que tomo de empréstimo do autor espiritual
André Luiz, e muito os ajudará nos seus primeiros passos, após a transição
inelutável para a Vida Espiritual.
Trata-se de um livro sobre a morte, mas que, paradoxalmente, só trata
da Vida, da Vida Plena e Abundante que, segundo as promessas de Jesus, os
que “morrem” haverão de encontrar quando deixarem, aqui, bem enterrados,
seus corpos de carne, envoltórios grosseiros da individualidade imortal.
A proposta do autor visa levar todos os seres humanos a encarar a mor-
te com naturalidade, de tal sorte que medos e pavores restem vencidos so-
bre essa “passagem” tão natural para novas e mais autênticas dimensões de
Vida.
E, ao encarar assim a morte como prenúncio da verdadeira Vida, o autor
pretende estimular a todos que vivam intensamente o seu dia a dia, na cer-
teza de que um futuro de paz e de alegria, no amanhã, depende de um hoje
bem vivido, dentro dos princípios sacrossantos da ética cristã, nos braços da
Lei de Deus! •
O Autor
2	 Francisco Cândido Xavier  Espírito André Luiz, Os mensageiros, p. 120.
II
Antes da Morte
26 27
3
Considerações Gerais Sobre
a Morte e o Morrer
Na Natureza existem milhões de seres vivos, numa versátil e imensa va-
riedade. Os seres vivos têm suas características próprias, bem como
suas atividades básicas: nascem, crescem, respiram, alimentam-se, excretam,
procriam e morrem.
Tais seres, para que possam continuar vivos, integram-se a outros seres –
os não vivos – e dessa integração resulta o milagre da plenitude da Vida.
Os seres vivos não vivem para sempre. Todos, sem exceção, fatalmente,
morrerão, um dia. Aliás – ressalte-se – esta é uma de suas características bási-
cas. E, embora possa parecer uma tautologia, seres vivos só morrem porque
estão vivos. Minerais não morrem. Também nunca tiveram a experiência
da Vida.
O ser humano é um ser vivo e, portanto, um ser que morre.
Os corpos dos seres vivos, inclusive os dos seres humanos, são formados
pelas substâncias minerais, espalhadas no solo do mundo. No livro “Gênesis”,
o primeiro da Bíblia sagrada, atribuído a Moisés, está escrito: “E então for-
mou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e lhe soprou nas narinas o
fôlego da Vida, e o homem passou a ser alma vivente!” (Gen. 2, 7)
Nada mais verdadeiro.
Por ocasião da morte, pela decomposição, todas as substâncias minerais
que constituíam os corpos dos seres vivos, inclusive os humanos, retornam
à Natureza para dar Vida a outros seres. Conseqüentemente, é a morte que
torna possível a continuidade da Vida.
Nascer e morrer, portanto, são os acontecimentos mais naturais, dentro
do viver. E a morte não é um fenômeno exterior, mas um acontecimento
imanente aos seres vivos, presente, a todo instante, no existir humano.
No rico cancioneiro popular do nosso país, há uma música de autoria de
Alberto Luiz, interpretada por Moacir Franco, onde ele afirma em dois dos
28 29
seus versos: “Só se vive mesmo nove meses… pois o resto, amiga, a gente
morre…”3
E, em verdade, o ser humano começa a morrer no dia em que vê,
pela primeira vez, a luz da Vida. Conseqüentemente, deveria, desde cedo,
aprender a conviver, diuturnamente, com a morte, aceitando-a com natura-
lidade, como um fato indispensável ao prosseguimento da Vida.
Por que, então, o medo ou o quase pavor da morte na maior parte dos
seres humanos? Por que a rejeição ou a negação desse acontecimento, espe-
cialmente no mundo ocidental?
Religiões prometem o Paraíso aos bons, aos nobres, aos limpos de co-
ração, mas todos eles, geralmente, resistem em aceitar o aniquilamento do
corpo, com naturalidade, mesmo que um céu de beatitudes os esteja aguar-
dando. Por quê?
Jesus veio ao mundo para eliminar, definitivamente, o medo da morte e
do morrer. A saga do Cristianismo tem o seu início com um túmulo vazio
— “Ele não está aqui. Ressuscitou, como havia dito. Vinde ver onde Ele jazia”
(Lc. 24, 5). Foram palavras de um varão, vestido de branco, anjo dos céus, di-
rigidas a três santas mulheres que, num domingo de luz, foram à tumba de
Jesus, levando-lhe aromas e ungüentos para embalsamá-lo.
Paulo de Tarso, o arauto do Cristianismo nascente, disse em uma de suas
cartas: “— O último inimigo a vencer é a morte…” (I Cor. 15, 26) Em verdade,
aquele que venceu a morte, passa a melhor saborear a Vida, degustando-
a muito mais intensamente. Por isso mesmo, a realidade da morte deveria
despojar-se de suas características tétricas e apavorantes, para se constituir
uma fonte de crescimento integral do ser humano.
Como dissemos, linhas atrás, os ocidentais, ao contrário dos povos
do Oriente, têm deixado em aberto o problema da morte. A cultura do
Ocidente, pragmática e materialista, mais voltada para a ânsia incontida do
“ter mais” do que para a busca do “ser mais”, prefere negar a morte, evitando
qualquer referência a seu respeito.
Até médicos que lidam, diariamente, com a morte e o morrer, viram
as costas para o problema, e quando, dentro de um hospital, um paciente
expira em uma mesa de cirurgia ou mesmo de morte natural, eles evitam,
3	 Moacir Franco, ‘Balada n.º 7’, Aquelas antigas, letra de Alberto Luiz e música de Moacir
Franco.
por todos os meios, contatos mais demorados com o corpo sem Vida. Nos
nosocômios, há os encarregados de, imediatamente, após a morte do pa-
ciente, fazer “desaparecer” o cadáver, através de compartimentos especiais,
adredemente projetados pelos arquitetos, a fim de que os outros doentes, ou
mesmo os serventuários, não presenciem o acontecido.
A preocupação central dos que integram a equipe hospitalar é a de mer-
gulhar o fato no bojo do esquecimento. Querem levar as pessoas presentes
ou envolvidas a se absorverem com outras atividades, a fim de “esquecerem”
que alguém morreu, deixando o rol dos vivos para penetrar nos umbrais do
Além-túmulo.
É a rejeição mais feroz, a recusa mais flagrante do “morrer”, semelhante
a uma atitude muito curiosa, própria do avestruz que, ante a perseguição ou
o perigo iminente, afunda a sua cabeça dentro de um buraco, achando que,
assim, pode se livrar da ameaça que paira sobre ele.
Ledo engano! Mais dia, menos dia, a morte atinge a todos, sem exceção,
e de nada adianta enganar-se a si mesmo, buscando evasivas para esse fato
inevitável a todo ser vivo.
No Ocidente, insistimos, a morte é, ainda, um tabu. Evita-se falar dela
aos que estão com doenças incuráveis e terminais. Médicos e familiares fa-
zem os maiores arrodeios para não tratarem do assunto com os “desengana-
dos”, e isto por um ato de “caridade” para com os enfermos incuráveis, a fim
de que, iludidos, possam eles “desfrutar” os últimos dias de suas existências,
mesmo com uma péssima qualidade de Vida.
Sempre a rejeição e a recusa em aceitar uma ocorrência que, desde o nas-
cimento, acompanha o ser humano em todas as fases de sua existência.
O Dr. Evaldo A. D’Assumpção, professor de Ética Profissional da PUC,
de Minas Gerais, em excelente artigo publicado na revista Diálogo, o qual
me tem servido de inspiração para a redação do presente texto, diz, a certa
altura do seu trabalho:
Enfrentar a morte de uma pessoa é confrontar-se com a realidade de sua própria
morte, pois a cada ser humano que morre, eu também morro um pouco com ele, e,
na medida em que eu negar a morte de uma pessoa, estarei criando a minha própria
imortalidade. Se um ser humano igual a mim não morrer, ficará a certeza de que eu
30 31
também não morrerei. (Evaldo A. D’Assumpção, ‘Tanatologia e o Doente Terminal’,
Diálogo médico, 10 (2): pp. 22–36, 1984)
Na cultura oriental, a morte não é encarada como uma megera de manto
negro, portadora de uma foice e caminhando pelo mundo em sua faina de
segadora de Vidas. Nessa cultura e em outras, a morte é algo tão natural que,
por vezes, chega a ser até encarada com descontração e alegria. Antológica é
a pequena estória integrante do filme Sonhos, de Akira Kurosawa, o grande
e genial cineasta japonês, retratando a morte de um camponês, cujo fére-
tro é conduzido com regozijo, ao som de músicas e danças, ao seu último
destino.
Na cultura ocidental, a morte tem tudo a ver com tristeza, revolta, dor,
perda irreparável, desolação e luto. Em suma, algo trágico, terrível, macabro
e até repugnante. Onde a morte acontece, aqui no Ocidente, as crianças são,
imediatamente, afastadas das casas ou locais onde ocorreu o óbito e, quando,
na sua curiosidade natural, indagam sobre o acontecido, recebem respostas
evasivas e até mentirosas, confirmando a tese da recusa e da rejeição.
As cerimônias fúnebres, por sua vez, retratam, com fidelidade, o horror
que o homem ocidental tem à morte e ao morrer. Lágrimas inestancáveis,
olheiras fundas, ataques histéricos, gritos lancinantes, beijos sucessivos nos
cadáveres e até a ministração de drogas estupefacientes aos familiares do
morto, a pretexto de mantê-los calmos e “desligados”.
Acrescente-se a tudo isto, a busca de uma pretensa “imortalidade” pelos
integrantes das Academias de Letras, e a ânsia de “imortalizar” os defuntos
com a construção de imponentes mausoléus em pedra granito ou em már-
more, materiais de durabilidade quase indefinida.
Por que tanto horror a um fato tão presente no âmago da Vida? No exces-
sivo apego à existência material reside, no nosso entender, a causa principal
da rejeição à morte.
Pessoas ricas e abastadas, gozadoras da Vida, com os seus bolsos cheios
de dinheiro, amantes dos prazeres da mesa e do sexo, detentores de bens
materiais em abundância, não querem, nem de longe, pensar em trocar tudo
isto pelo “desconhecido”. E, mesmo pertencentes às fileiras das religiões
cristãs, não cogitam de permutar essa Vida prazerosa por outra que se lhes
afigura um lusco-fusco impreciso, um mistério insondável, cercado de mil
incógnitas e interrogações…
Para os “apegados” a esta Vida, não há opção possível entre “viver e mor-
rer”. Mergulhados no mais ferrenho materialismo, vêem a morte como a ex-
tinção de todas as emoções e prazeres proporcionados pela Vida da matéria.
A quase unanimidade desses sibaritas gostaria de viver a Eternidade aqui
mesmo, sendo o seu céu, o próprio inferno pintado pelas teologias tradi-
cionais. Todos os pecados seriam, então, permitidos e a ausência de Deus
não os inibiria de revelar a plenitude de seus instintos, na prática de todas
as misérias morais.
Neste mundo, ninguém, a rigor, é proprietário de nada. Todos os bens
são concedidos ao ser humano a título de empréstimo, por um determinado
lapso de tempo. Vão passando de umas para outras mãos, numa silenciosa
lição de desapego a todos os caminhantes da Vida.
No mesmo artigo acima mencionado, lê-se esta feliz colocação do seu
autor:
A Natureza não se dobra às pessoas. As posições, os bens materiais se esvaem como
areia por entre os dedos que se fecham para dominá-los. A morte não se importa
com nossas pretensões. Ela nos tira as pessoas que pretendíamos controlar e a nós
mesmos dos cargos e posições que pretendíamos manter. Daí, ante essa realidade
terrível que tudo devora e nada respeita, é preferível a negação, a rejeição, a ojeriza
à morte. (Evaldo A. D’Assumpção, ‘Tanatologia e o Doente Terminal’, Diálogo mé-
dico, 10 (2): pp. 22–36, 1984)
Existencialistas contemporâneos consideram situações privilegiadas aquelas
em que está presente a ameaça imprevista da morte ou o perigo iminente de
Vida. Nessas ocasiões, como num passe de mágica, descobre-se que se está
vivo, e esse reencontro com o viver é considerado pelos filósofos da existên-
cia, altamente benéfico para o ser humano, conduzindo-o, por vezes, a uma
reformulação completa de sua Vida.
Pessoas que morreram clinicamente ou que escaparam de graves aciden-
tes, tendo perdido a consciência por lapsos variáveis de tempo, dão depoi-
mentos de que esse fato alterou, profundamente, a sua tábua de valores. Daí
por diante, passaram a vivenciar uma nova e salutar filosofia de Vida.
32 33
E, mais uma vez, temos de reconhecer que, também nesse sentido, sem
qualquer conotação religiosa, a Vida emerge, de uma forma inesperada, do
bojo escuro da morte. Nesses casos, a Vida passa a ter um novo sentido, nes-
te mundo. A pessoa deixa de sentir-se “materialmente” imortal, atingindo
toda a contingência, fragilidade e efemeridade do viver.
Conviver, conscientemente, com a morte, é profundamente benéfico
para o ser humano. É encarar a Vida numa dimensão muito mais rica, en-
contrando, numa hora, milênios de Vida interior. Em suma, “é existir por
minutos e segundos numa dimensão de Eternidade!”, na expressão feliz do
Dr. Ivo Pitanguy, em recente entrevista à televisão brasileira.
A perspectiva de morrer leva o ser humano a tentar responder, satisfa-
toriamente, a esta singular pergunta: — Por que existo? Por que e para que
estou neste mundo? Sem uma resposta cabal a essas indagações, o viver
torna-se uma caminhada louca e desvairada, sem rumo, sem destino. Que
bom, quando a morte ou a perspectiva de morrer ajuda o ser humano, nesse
reencontro decisivo com o real sentido de sua própria Vida?!
Todas as religiões primam em apontar o crescimento moral e espiritual
do ser humano como o objetivo maior da existência. Crescer, nesse sentido,
significa evoluir, hierarquizar valores, optando pelos espirituais sem, entre-
tanto, qualquer desprezo maniqueísta pelos materiais.
Muito poética e real a exclamação do Cristo, no Sermão da Montanha:
Ah! Homens de pouca fé, não andeis ansiosos pela vossa Vida, quanto ao que ha-
veis de comer e beber. Nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não
é a Vida mais do que o alimento, e o corpo mais do que as vestes? Observai as
aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros, contudo, vos-
so Pai Celeste as sustenta. (…) E por que andais ansiosos quanto ao vestuário?
Considerai como crescem os lírios do campo, eles não trabalham nem fiam. Eu,
contudo, vos afirmo que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qual-
quer deles. (…) Buscai, pois, em primeiro lugar, o Reino de Deus e a Sua Justiça e
todas estas coisas vos serão dadas por misericórdia e de acréscimo. (Mt. 6, 25-33)
A morte deveria ser para o homem o coroamento final de um processo
evolutivo de hierarquização de valores e teria o seu início com o desper-
tar da consciência para o que, de fato, é valioso, nesta Vida. Tal processo
prosseguiria durante toda a existência até o seu termo. Felizes – para citar,
mais uma vez, o Cristo – os que tiveram a felicidade de, nessa caminhada,
“ajuntar tesouros nos céus” (Mt. 6, 20), sendo que esse Reino Celeste segundo,
ainda, os Seus ensinamentos, reside na interioridade do ser humano.
Jesus revela-se o fundador de uma nova religião. Não queremos, aqui, re-
ferir-nos ao “Cristianismo” – criação humana – nem a nenhum outro “ismo”
derivado da mensagem cristã.
A Boa Nova que o Cristo veio trazer ao mundo foi a Religião do Amor:
amor a Deus, amor ao irmão de humanidade, amor aos bons, amor aos maus,
aos justos, aos injustos, amor em todas as suas múltiplas faces, única condi-
ção, para Jesus, de o ser humano crescer e tornar-se, um dia, “um com Ele e
com o próprio Deus” que, ainda segundo Jesus, é o próprio Amor.
Este é o verdadeiro crescimento que deveremos todos buscar, nesta Vida.
Somente assim criaremos, aqui mesmo, o nosso céu. Passaremos, então, a
viver, no contigente, a Vida Eterna em que já estamos mergulhados e que
continuaremos a desfrutar depois da morte.
Diante dessa concepção maior de uma Vida Eterna, já possível de ser
experimentada dentro do efêmero e do contingente, acaba-se, por inteiro,
todo o pavor da morte! Tudo se esvai como a sombra diante da luz, como o
mal diante do bem, como a tempestade, ante a bonança que a sucede.
Eis porque, crescer em amor e sabedoria significa vencer a morte e passar
a viver, por antecipação, a Vida Abundante das promessas do Senhor.
Então, o que passa a importar mesmo, em nosso viver, não é a quanti-
dade dos anos vividos, mas a qualidade desses anos. Nesse sentido, uma
criança ou um jovem, arrebatado pela morte no verdor dos anos, pode ter
tido uma existência muito mais fecunda do que um velho de noventa anos,
se este resumiu todo o seu viver no usufruto dos gozos fugazes que a Vida
carnal proporciona.
Há entes humanos que, à semelhança dos seres inferiores da criação,
“nascem, crescem, respiram, comem, bebem, procriam e morrem…” e nisto
e apenas nisto, resumiu-se o carreiro de suas vidas…
O grande poeta português Fernando Pessoa oferece-nos, com o seu gê-
nio e a sua sensibilidade acutíssima, uma página de luz acerca da morte e do
morrer. Com ela, concluiremos estas considerações:
34 35
Nem tudo é dia de Sol!
E a chuva, quando falta muito, pede-se.
Por isso, tomo a infelicidade como a felicidade.
Naturalmente.
Como quem não estranha que haja montanhas e planícies
E que haja rochedos e ervas.
O que é preciso é ser-se natural e calmo…
Sentir como quem olha…
Pensar como quem anda…
E quando se vai morrer, lembrar-se que o dia também morre,
E que o poente é belo…
E é bela a noite que fica…
4
Da Morte Para a Vida…
Da Vida Para a Morte…
Lemos no Evangelho de Mateus que, certa feita, um dos seguidores de
Jesus fez-lhe a seguinte ponderação: “— Senhor, permite que antes de
seguir-te eu vá, primeiro, sepultar meu pai”, ao que o Cristo respondeu: “—
Segue-me! E deixa aos mortos o cuidado de sepultar seus próprios mortos!”
(Mt. 8, 21-22)
Em outra ocasião, afirmou Jesus: “— Eu vim para que todos tenham Vida
e a tenham em abundância.” (Jo. 10, 10)
No primeiro texto, o Cristo chamou de “mortos” aos vivos deste mun-
do e, no segundo, ao afirmar que veio trazer a Vida, implicitamente, mais
uma vez, considerou “mortos” muitos dos que peregrinam na superfície da
Terra.
Segundo o Apóstolo Paulo, com a queda do espírito em sua trajetória
evolutiva, “entrou o pecado no nosso mundo e, com o pecado, a morte”.
(Rom. 5, 12)
Por conseguinte, mortos, neste mundo, estão todos os que não crêem
na alma e na sua imortalidade. Mortos são os que jazem mergulhados no
abismo do erro e do pecado. Mortos são os apegados, excessivamente, aos
bens materiais, pensando, enganosamente, que tudo possuem quando, na
realidade, eles é que são os “possuídos…” pelo que possuem. Mortos, em
suma, estão os que caminham pelo mundo sem divisar um ponto de chega-
da em Deus e, conseqüentemente, sem norte, sem direção.
Entretanto, parafraseando o texto bíblico, “Deus não quer a morte do
pecador, mas que ele se converta e viva!” (II Pe. 3, 9) Foi o próprio Cristo
quem afirmou, ao contar a parábola da ovelha desgarrada: “— Haverá maior
júbilo no céu por um pecador que se arrependa do que por noventa e nove
que não necessitem de arrependimento.” (Lc. 15, 7) E isto soa, coerentemente,
36 37
com toda a Sua mensagem, que é dirigida, em primeiro lugar, aos “doentes”
e não aos “sãos”. Estes últimos não necessitam de médico…
Conhecer o Cristo, mergulhar fundo em Sua mensagem, vivenciar os
Seus divinos ensinamentos, é passar da morte à Vida e, já neste mundo, pre-
ludiar a ventura celeste.
Morrer com o Cristo é ressuscitar para a Vida verdadeira que estua, em
promessas de luz, na gloriosa imortalidade! É voltar à Pátria do Espírito! É
retornar ao paraíso perdido…
Conseqüentemente, as palavras mais adequadas para o fenômeno mor-
te são: “passagem”, “transição”, “mudança”. Com Jesus, “passaremos” da
morte para a Vida. Mudaremos de residência. Trocaremos de vestuário,
permutando os farrapos perecíveis do corpo carnal pela “veste nupcial” da
incorruptibilidade.
Nesta Vida, semeamos. Na outra, colheremos. Por vezes, aqui mesmo, já
segamos o que plantamos. Entretanto, na Vida Maior é que as contas nos
serão pedidas mais rigorosamente. Por isso, o retorno à Pátria Espiritual po-
derá trazer-nos grandes alegrias e, também, enormes frustrações.
Os descrentes – agnósticos, materialistas e ateus – se foram bons, neste
mundo, ao despertarem no outro e comprovarem a continuidade da Vida,
reformularão, aos poucos, seus conceitos negativistas. Serão tratados com
muita compreensão, consoante a palavra evangélica de que “aquele que não
soube a vontade de Deus e fez coisas dignas de repreensão, levará poucos
açoites…” (Lc. 12,48) Todavia, terão de recomeçar, nos Planos Espirituais, um
longo e paciente aprendizado acerca das Leis da Vida. Se foram maus, sofre-
rão, atrozmente, em regiões sombrias e inferiores, até despertarem para os
valores superiores do espírito.
Quanto aos que, aqui, na Terra, sempre acreditaram na continuidade da
Vida e que, também, foram bons, ao despertarem, em outras dimensões da
existência, sentir-se-ão “em casa”. Assim como, ao nascermos, há sempre
alguém por perto para testemunhar a nossa entrada na luz desta Vida, do
mesmo modo, os que nos antecederam na “grande viagem” – pais, mães, pa-
rentes e amigos – estarão a nossa espera no outro lado. E pelo nosso bom
ou mau desempenho, na “escola do mundo”, receber-nos-ão, festivamente,
ou plenos de compaixão, no caso de havermos estacionado na evolução por
nossa desídia e deserção dos deveres capitais.
Na Vida além da morte valem tão somente os “tesouros da alma” (Mt.
6, 20), isto é, as aquisições morais e espirituais que tenhamos feito, o “novo
nascimento”, traduzido, neste mundo, numa Vida de amor a nós mesmos e
aos nossos semelhantes.
E quando nos referimos ao amor a nós mesmos, recomendado pelo pró-
prio Cristo, está claro que não queremos identificar qualquer tipo de ego-
centrismo exacerbado, mas sim o respeito que devemos ter pelo nosso cor-
po – “o templo do espírito” (I Cor. 6, 19) –, pela nossa Vida, que deve ser toda
consagrada a realizações nobres, numa valorização, em todos os sentidos, da
grande oportunidade que Deus, em Sua infinita misericórdia, nos concedeu,
de uma reencarnação terrena.
Disse o Cristo: “Se o grão de trigo não cair em terra e morrer, não dará
frutos, mas, se morrer, dará muitos frutos.” (Jo. 12, 24) Aludia o Senhor, de
forma premonitória, a Sua morte e ressurreição; todavia, assim como Ele
ressuscitou, todos nós ressuscitaremos, um dia, para a Vida Eterna.
Encaremos, pois, a morte, com destemor, entusiasmo e até com alegria.
Será ela que nos abrirá as portas da Eternidade!
Da Vida também se pode retornar à morte. A volta a este mundo, pelas por-
tas da reencarnação, é uma “morte” para a alma.
Espíritos de mediana evolução, já despertos para as realidades da Vida
Espiritual, nela engajados em múltiplas atividades, com um círculo bem am-
plo de irmãos formando a sua família espiritual, sofrem, e muito, antes da
retomada de um novo corpo físico. É que a Vida livre do espírito constitui
uma fonte permanente de inefável prazer. Lá, as percepções são muito mais
dilatadas. A sensibilidade, apuradíssima. Permutar essa Vida verdadeira pela
prisão da carne, é “morrer”, na sua mais lídima expressão.
Reencarnam os que ainda não saldaram os seus compromissos para com
o nosso mundo e, mais cedo ou mais tarde, têm de a ele retornar, a fim de
quitarem débitos perante a Lei. Erros cometidos na Terra têm de ser repara-
dos aqui mesmo. Faltas praticadas contra seres humanos têm de ser saldadas
em contato com a humanidade terrestre.
Após o despertar no outro lado da Vida, permanece o espírito, por um
período de tempo variável, naqueles planos compatíveis com o seu nível
evolutivo. Um dia, chega o momento de analisar o seu “deve” e o seu “haver”
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perante a Lei. Geralmente, pesa mais o débito do que o crédito e, por conta
disto, pede-se uma nova oportunidade de retornar à Terra.
Muitas vacilações, nessa hora, estarão presentes ao espírito reencarnante.
Há um medo real de recair nas mesmas faltas cometidas em passadas exis-
tências. Há receios, bem fundados, de que o mergulho no escafandro de
carne, leve-os a esquecer compromissos assumidos nos Planos Espirituais,
e muitos, por isso mesmo, ficam adiando, por tempo indeterminado, a sua
volta à esfera física.
Entretanto, não obstante essas protelações, o dia do retorno, fatalmente,
chegará e o espírito terá de retomar o indumento carnal com uma destas
três finalidades: 1) expiar faltas cometidas em reencarnações pregressas; 2)
passar pelas mais variadas provas, de cujo sucesso vai depender o seu futuro
espiritual; e 3) desempenhar as mais diversificadas missões, de maior ou
de menor relevo, em prol da construção de um mundo melhor e mais feliz.
Às vezes, dentro da programação reencarnatória de cada um, muitas dessas
últimas tarefas estão mescladas, também, com provas e expiações.
Quanto aos Espíritos atrasados, ainda involuídos, com grandes débitos
perante a Lei, voltam à carne, automaticamente, sem qualquer direito de
opinar sobre os seus novos projetos de Vida. E que a liberdade somente
cresce na proporção da evolução conquistada.
Despedir-se de parentes, amigos, instrutores espirituais, companheiros
de trabalho; mergulhar na inconsciência, por um certo número de anos, nos
primeiros tempos da infância carnal; mudar de envoltório, revestindo-se de
um corpo grosseiro e denso; perder a antiga apresentação, assumindo outra
que lhe será inteiramente desconhecida, porque dependente de fatores cár-
micos e hereditários; deixar o ambiente espiritual a que já se adaptara com-
pletamente; renunciar a todos os bens espirituais que já reunira no outro
lado; em suma, reduzir percepções e sensibilidade, sendo o seu amanhã uma
interrogação… isto é reencarnar, isto é retomar à experiência terrestre, ver
de novo a luz deste mundo… e é, também, “morrer” para a Vida Espiritual.
E, de resto, mais uma vez, Vida e morte, como diz Pietro Ubaldi, “são
dois contrários que se compensam, dois impulsos que resultam em equilí-
brio, duas fases complementares de um mesmo ciclo”.4
4	 Pietro Ubaldi, A grande síntese, p. 286.
E a Vida na matéria torna-se, assim, uma morte para o espírito. •
40 41
5
À Espera da Morte – O
Doente Terminal
Quem quer que escreva sobre a morte e o morrer, na atualidade, não
poderá deixar de fazer referência aos estudos de uma notável psiquia-
tra suíça, radicada nos Estados Unidos – Dra. Elisabeth Kübler-Ross.5
Suas
pesquisas, nessa área, deram origem a uma nova ciência: a Tanatologia.
Lidando, por muito tempo, com doentes terminais, ao lado de enfermei-
ros, religiosos e médicos, essa pesquisadora chegou a conclusões que redun-
daram em grandes benefícios para os próprios doentes. Estes passaram a ser
melhor conhecidos em sua interioridade, o que lhes proporcionou novas e
melhores formas de assistência.
Tais conclusões são, além de interessantes, deveras surpreendentes.
Pacientes terminais desenganados, embora não pareçam à primeira vista,
têm plena consciência da dimensão de suas enfermidades. Sentem uma
vontade íntima de conversar abertamente sobre os seus males com aqueles
que os rodeiam: a equipe médica, bem como parentes e amigos. Entretanto,
como aqueles que deles se aproximam fecham-se a esse respeito, eles, embo-
ra conscientes de que estão a um passo da morte, silenciam.
Muitos desses doentes, diante do silêncio e das palavras de conforto e
otimismo dos amigos e familiares, não abordam, com eles, o quadro real de
suas doenças, tão somente para não fazê-los sofrer (?). E, diante da triste-
za, da aflição e, até, do desespero dos que deles se aproximam, chegam ao
ponto de confortá-los, mentindo sobre a gravidade do seu estado de saúde.
5	 Elisabeth Kübler-Ross, psiquiatra suíça, radicada nos Estados Unidos. Em 1960 deu
início a um trabalho com doentes terminais que viria dar origem a uma nova ciência: a
Tanatologia. É autora de livros, hoje, traduzidos em várias línguas, três dos quais para o
português: Morte, estágio final da evolução, Sobre a morte e o morrer e A roda da eternidade,
os dois primeiros publicados pela Editora Record e o último pela Editora Sextante.
42 43
Invertem-se, assim, os papéis, e aquele que deveria receber consolo e alívio,
passa a ser quem conforta e desoprime.
As conclusões da Dra. Elisabeth Kübler-Ross foram muito importantes
para a adoção de uma nova metodologia no trato com pacientes terminais.
Uma abordagem clara, transparente, do quadro real das enfermidades, foi
introduzida, em nada alterando a serenidade desses pacientes, ante o pre-
núncio da morte.
O doente terminal, via de regra, intui que vai morrer e, depois de um
certo tempo, aceita esse fato como um alívio, diante do desconforto propor-
cionado pelas enfermidades incuráveis. Eis porque, médicos e parentes que
mentem para confortar esses doentes, são alvos, por vezes, até de uma espé-
cie de zombaria silenciosa por parte dos próprios enfermos que já “sabem”
toda a verdade acerca da evolução inelutável de suas enfermidades.
A Dra. Elisabeth Kübler-Ross assinala cinco fases por que passa, geral-
mente, o doente desenganado, desde o momento em que intui ou lhe é re-
velado que possui uma doença incurável e terminal.
Analisemo-las:
A primeira é a da “negação” da enfermidade. Nessa fase, o doente recusa,
por todos os meios, que esteja com uma doença incurável, precursora da
morte. Prefere, então, enganar-se a si mesmo, achando que houve um erro
de diagnóstico e quejandos. Recorre a todo tipo de tratamento, mesmo que
seja com charlatães e feiticeiros, a fim de alimentar a esperança de que não é
verdade que os seus dias estejam contados.
Nessa fase, o paciente terminal necessita de muito apoio médico e ajuda
familiar. Negando a sua enfermidade e, numa expectativa esperançosa de
cura, ele pode eximir-se de tomar a medicação que lhe foi prescrita pelos
médicos, e esta lhe dará melhor qualidade de Vida nos estágios progressivos
da doença insidiosa e fatal.
A segunda fase é a da “raiva” ou “indignação”. O enfermo revolta-se con-
tra tudo e contra todos. Contra médicos que diagnosticaram a sua enfermi-
dade ou que a insinuaram, utilizando-se de eufemismos. Contra os familia-
res e amigos que o procuram para confortá-lo. A sua revolta vai até contra
Deus, se ele não possui uma sólida fé religiosa. E toda essa revolta reside no
fato de a doença fatal tê-lo atingido e não a outra pessoa. Muito apoio, amor,
paciência e compreensão necessita o doente, nesse estágio. Afinal de contas,
o seu viver sofreu um violento choque e torna-se necessário algum tempo
para que ele possa adaptar-se ao seu novo estado.
A terceira fase é a da “negociação” ou “regateio”. Nesse estágio, o doente
terminal promete tudo à equipe médica que o assiste, se ela conseguir a cura
de sua enfermidade. A blasfêmia contra Deus é esquecida, dando lugar a
“promessas” de todos os tipos, a santos de sua devoção ou não. Trata-se de
uma espécie de “barganha” que o doente faz, à semelhança de um náufrago
que procura se agarrar a qualquer coisa que lhe impeça o mergulho definiti-
vo nas profundezas do desconhecido.
A quarta fase é a da “compreensão gradativa”, também chamada de “in-
teriorização da enfermidade”. Nesse estágio, começa a acontecer a com-
preensão gradual do paciente acerca do seu estado. Tem início, então, um
processo de interiorização do grave problema que está vivenciando. Ele já
intui que o seu quadro patológico é, realmente inelutável e trata de ultimar
providências para deixar resolvidos todos os problemas pendentes, antes
de sua partida deste mundo. E isto ele faz com extrema frieza e disposição,
sendo até impertinente com familiares e amigos que relutam em dar curso
àquelas medidas por ele sugeridas e/ou planejadas. Trata-se de uma fase
muito importante, porque, preparatória para a última que vem a seguir. Aqui,
ele costuma fazer uma revisão de toda a sua Vida e, por vezes, mergulha num
silêncio e num isolamento singulares, evitando visitas e mesmo a convivên-
cia com outras pessoas, provocando a inquietação dos familiares.
Esse é um estágio muito positivo, de preparação interior para o desfecho
final. São momentos de reencontro do enfermo consigo mesmo, e se ele pos-
sui um forte sentimento religioso, aproveitará a ocasião para uma tentativa
de reconciliação com antigos inimigos ou simples desafetos e, também, para
gestos de generosidade, adiados freqüentemente, no decurso de sua Vida.
Segue-se a essa, a última fase – a de “aceitação”, em que se desenvolve,
no doente terminal, uma grande confiança em si mesmo e onde ele se sente
completamente preparado para viver os últimos instantes de sua existência,
neste mundo.
Todas as providências para o amanhã dos familiares foram tomadas. As
tarefas inacabadas estão concluídas. As reconciliações foram tentadas ou
concretizadas. Nada mais resta a fazer aqui. É aceitar a fatalidade e aguardar
serenamente o lance final: a morte.
44 45
Essa última fase nada tem de sofrida ou desoladora. Por isso mesmo, ela
costuma surpreender os parentes próximos do doente. Antes, é uma atitude
de profunda maturidade quando o ser humano como que “desperta” para a
realidade inevitável de que “toda Vida”, na Terra, termina com a morte! Ele
partirá agora, mas todos os que o cercam, sem exceção, bem assim toda a
humanidade que lhe foi contemporânea, também deixará este mundo, hoje
ou amanhã, pelas mesmas portas que ele vai atravessar brevemente.
Nesse estágio, cabe apenas aos que o cercam serem solidários com o
enfermo, mantendo junto a ele uma atmosfera de serenidade e equilíbrio
diante do inevitável.
Os que deixam esta Vida, nessa fase, realizam a passagem para o outro
lado de uma forma tranqüila e feliz. Nos ataúdes, seus rostos parecem sorrir,
no mergulho profundo num oceano de silêncio e de paz.
Façamos, por último, uma reflexão mais profunda acerca dessas cinco fases
por que passa o doente terminal, aplicando-as ao nosso viver diário.
É perfeitamente possível a qualquer ser humano amadurecido, mesmo
não possuindo uma robusta fé religiosa, nem sendo portador de qualquer
doença terminal, começar a viver no seu “aqui e agora”, as cinco fases apon-
tadas pela Dra. Elisabeth Kübler-Ross. Isto implica numa plena consciência
de que todo o mundo vai morrer um dia. Por que, então, não começar, desde
já, a vivenciar as cinco etapas mencionadas?
Assim procedendo, o ser humano passará a conviver, diuturnamente,
com a morte, o que vai significar um maior e mais saudável reencontro com
a Vida. Cada minuto e cada segundo do seu existir será encarado como se
fosse o último, e isto dará lugar a um autêntico e verdadeiro viver!
Vivenciadas as cinco fases, no dia a dia, a morte estará vencida e a paz
interior, definitivamente, conquistada. •
6
Experiências de Quase-morte
Num livro sobre a morte e o morrer, cabem perfeitamente algumas bre-
ves considerações acerca das pesquisas de um psiquiatra norte-ame-
ricano, também Doutor em Filosofia – Dr. Raymond A. Moody Jr.6
– feitas
com pessoas que sofreram a chamada “morte clínica”, ou que estiveram bem
próximas da morte, em virtude de graves ferimentos em acidentes diversos.
Nos declarados clinicamente mortos, o coração pára por segundos
ou minutos, sem ocorrer, entretanto, a morte cerebral. Daí a possibili-
dade do retorno à Vida, após processos sofisticados de reanimação ou
ressuscitamento.
Esse ilustre pesquisador, cujos trabalhos são, hoje, reconhecidos em todo
o mundo, reuniu em dois livros – Vida depois da vida e Reflexões sobre vida
depois da vida – depoimentos dessas pessoas que perderam a consciência e
depois a retomaram. Comparando esses relatos, pôde ele traçar um perfil,
tanto quanto fiel, do que se passou com todos aqueles que deixaram esta
Vida, embora por momentos, para depois retomá-la, num símile aproxima-
do da morte verdadeira.
A “morte clínica” seria, assim, uma espécie de amostra da morte real. Daí
o extraordinário valor das conclusões desse notável psiquiatra, por entrever,
com as suas pesquisas, o que a alma vai encontrar “no outro lado”, após o
decesso do corpo físico.
As conclusões dessas pesquisas confirmam, de forma convincente, a tese
da Doutrina Espírita e de algumas correntes evangélicas, de que a morte, a
rigor, não existe, sendo tão somente uma “transição” ou uma “passagem”, em
suma, uma crise repentina que redundará na transferência da individualida-
de imortal para novas esferas de Vida.
6	 Raymond A. Moody Jr., psiquiatra norte-americano e também Doutor em Filosofia.
Autor de dois livros “best-sellers”: Vida depois da vida e Reflexões sobre vida depois da vida,
ambos publicados no Brasil pela Editorial Nórdica.
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Por ser um homem de ciência, o Dr. Raymond A. Moody Jr. recolheu
depoimentos de centenas de pessoas, procedentes dos mais diferentes países,
filiadas a diversas religiões e possuidoras de níveis culturais bastante diferen-
tes. Todos os relatos coincidem em vários pontos, segundo as conclusões
desse pesquisador:7
Os que vivenciaram a “experiência de quase-morte” disseram ser muito
difícil descrevê-la na linguagem comum. Foi algo sentido e vivido subjeti-
vamente, impossibilitando o seu relato, dada a imperfeição e os limites da
linguagem humana. O que lhes aconteceu – todos são unânimes em afirmar
– foi uma vivência tão profunda e intensa que somente um grande silêncio
seria capaz de exprimir. Entretanto, mesmo mergulhados num estado de
quase inconsciência, todos foram capazes de lembrar de palavras, comen-
tários e juízos emitidos pelos que lhes estavam perto ou em salas contíguas,
onde os seus corpos se encontravam sendo objeto de ressuscitamento ou
reanimação.
Muitos, ao tentarem descrever o que sentiram fora do corpo físico, afir-
maram ter experimentado estados muito agradáveis de quietude e alívio, que
os estimulava a permanecer, no outro lado, sem desejo de retornar ao corpo
da carne.
A grande maioria ouviu os mais variados sons, uns muito agradáveis
como música fina, suave, quase celestial. Outros, ouviram sinos e acordes
semelhantes ao de harpas celestiais. Já outros, escutaram ruídos fortes, sons
de campainhas e assobios cortantes, cuja natureza não podiam precisar com
segurança.
Os que passaram por esse transe, sentiram-se ainda como se tivessem
sendo “sugados” através de um túnel escuro, em alta velocidade, experi-
mentando uma sensação indefinível de “estar metade aqui e metade noutro
lugar”,8
mas, depois dessa passagem, todos sentiram agradáveis sensações de
euforia e liberdade.
Nessa singular “experiência” quase todos se sentiram “fora do cor-
po”, suspensos do solo a uma curta distância, de onde podiam observar,
7	 Segue-se uma síntese, feita pelo autor, dos acontecimentos comuns nas experiências de
morte segundo as conclusões do Dr. Raymond A. Moody Jr., relatadas em seu livro Vida
depois da vida, pp. 26 e seg.
8	 Idem, ibidem, p. 32.
perfeitamente, seus corpos carnais deitados em leitos, em pedras de necro-
tério, ou vagando sobre a água, nos casos de afogamento. Muitos assistiram,
de cima, as tentativas bem sucedidas de reanimação de seus indumentos
carnais, e a sensação que tinham era a de que estavam na posse de um outro
corpo, em tudo semelhante ao de carne, mas de natureza sutil e imponderá-
vel. Um dos entrevistados pelo Dr. Moody, tendo sofrido um grave acidente
em que, inclusive, perdeu a maior parte da perna, assim descreveu, entre
outras coisas, o que lhe aconteceu:
“Eu sentia o meu corpo (o corpo espiritual) e estava inteiro. Sabia disso. Sentia-
me inteiro e percebia que estava com todas as partes ali, embora não estivesse.”
(Raymond A. Moody Jr., Vida depois da vida, p. 50)
Os que viveram a “experiência” narraram, quase à unanimidade, o encontro
com Espíritos de parentes, amigos ou mesmo desconhecidos, cuja disposi-
ção era a de ajudá-los naquela situação. Doutras vezes, esses seres os avisa-
vam de que ainda não era daquela vez que eles deixariam, definitivamente, o
corpo de carne e que, por isso mesmo, deveriam retornar a este mundo.
Eis um pequeno trecho de um depoimento dessa natureza registrado
pelo Dr. Moody:
— Percebi, naquele momento, minha avó e uma menina que eu tinha conhecido na
escola (ambas já haviam morrido). Pareciam felizes. Senti que tinham vindo me
proteger e me guiar. Era como se eu estivesse voltando para casa e eles estivessem
lá para saudar-me com boas vindas. Nessa ocasião, tive a sensação de que tudo era
luz e beleza. Foi um momento lindo e glorioso! (Idem, ibidem, p. 52)
Um dos pontos mais comuns, considerado pelo próprio Dr. Moody como
dos mais incríveis é o encontro com um “ser de luz”. A luz que desse ser se
irradia não incomoda a vista, muito embora seja de um brilho incandescen-
te. Desse ser – e todos foram unânimes em seus relatos – irradiava-se muito
amor, sendo que esse sentimento não era expresso por palavras.
Quem estava vivenciando a “experiência”, sentia-se atraído por esse “ser
de luz” que se comunicava telepaticamente com o “morto”, formulando, em
silêncio, indagações relacionadas com a qualidade de Vida levada por ele até
48 49
aquele momento. Era como se fosse uma suave advertência sobre a impor-
tância do existir humano, implicando em sérias responsabilidades de cresci-
mento pessoal através do amor a todos os irmãos de humanidade. E o mais
interessante era que esse “ser de luz” não acusava nem incriminava ninguém.
Todos sentiam, vindos dessa “luz”, somente amor e compaixão.
O fenômeno da visão retrospectiva da Vida, desde a primeira infância
até o instante da singular “experiência”, foi, também, um ponto comum em
todos os entrevistados. As lembranças aconteciam sempre de uma forma
vertiginosa, numa percepção abrangente de toda a existência, desde os fatos
menos importantes aos mais significativos. Tudo era relembrado com uma
abundante riqueza de detalhes, induzindo a uma espécie de “auto-julgamen-
to” da Vida levada até então.
Geralmente, isto acontecia dentro de uma ordenação no tempo. Às vezes
não. As imagens eram muito vivas, como num filme cinematográfico, em três
dimensões. O “ser de luz” sempre estava presente a essa experiência reme-
morativa, e todos foram acordes em expressar que, a partir daquela presença
luminosa, é que se havia desencadeado todo o processo de revisão de vida.
Em todos os entrevistados pelo Dr. Moody, sempre aparece um espaço-
limite entre os dois planos – o material e o espiritual. Ele é descrito de várias
maneiras, representando um último obstáculo a ser vencido. Um estado ge-
ral de leveza e de liberdade foi também assinalado por todas essas pessoas e,
quando pareciam estar fadadas a ultrapassar esse último obstáculo, eis que
se sentiam arrastadas, impetuosamente, de volta aos seus corpos, “renascen-
do”, assim, para a Vida que estivera prestes a extinguir-se.
Todas as pessoas, envolvidas nessas “experiências” obviamente retorna-
ram aos seus corpos, senão inexistiria qualquer registro. Entretanto, o que
é mais interessante em tudo isto é o seguinte: quando a experiência atingia
uma profundidade maior, com a quase ultrapassagem do último limite, as
pessoas sentiam-se num estado geral de tamanha satisfação, paz e liberdade
que, às vezes, resistiam, até, ao retorno à prisão do corpo. Segundo as con-
clusões do Dr. Moody, isto sempre aconteceu àqueles que chegaram a ter
contato com “o ser de luz”. Ele cita o depoimento de um homem que chegou
a declarar: “— Eu não queria ter nunca saído da presença desse ser.”9
9	 Raymond A. Moody Jr., Vida depois da vida, p. 73.
Retornando à vida física, muitas pessoas disseram ao Dr. Moody que te-
miam contar às pessoas do seu círculo íntimo o que lhes acontecera. Embora
a “experiência” tivesse sido absolutamente real, nada tendo de alucinante ou
fantasiosa, essas pessoas temiam serem alvo do ridículo pelos outros. Alguns
receavam que as tomassem por desequilibradas mentais. Desse modo, mui-
tos preferiram permanecer em silêncio acerca dos fatos que lhes acontece-
ram, relatando-os, agora, ao Dr. Moody, estimuladas por testemunhos seme-
lhantes. Uma das entrevistadas chegou a dizer:
— Quando eu tentava contar a minha experiência, eles ouviam com interesse, mas
depois eu descobria que ficavam dizendo: — Essa aí pirou mesmo! Quando desco-
bri que, para eles, era tudo uma grande piada, parei de tentar comunicar qualquer
coisa. (Raymond A. Moody Jr., Vida depois da vida, p. 80)
Nos momentos de emancipação do espírito, todos foram capazes de fazer
uma auto-avaliação de suas vidas, em termos do bem que estavam espalhan-
do, ou não, em tomo dos seus passos. Todos como que submetiam os seus
atos ao tribunal interior de suas consciências. Assim, ao retomarem os seus
corpos, passaram a ver a Vida humana sob um novo prisma, retificando ca-
minhos e alterando, substancialmente, a tábua de valores que, até então, ti-
nha norteado o seu viver.
Passaram a ter inclusive, depois de tão singular transe, uma nova visão da
morte, perdendo qualquer receio do morrer. Evidentemente, essas pessoas
não passaram a desejar a morte. Simplesmente, o “morrer” não lhes causava
mais nenhum espanto ou pavor. Todos robusteceram a sua fé no além-vida
e muitos que, por medo, nunca estavam presentes a cerimônias fúnebres,
passaram a encarar os velórios com toda a naturalidade. Agora, tinham a
certeza de que a sua individualidade era imortal e de que a morte verdadei-
ra iria ser uma experiência, em tudo por tudo, semelhante àquela por que
haviam passado.
Por último, surgia a necessidade da confirmação desses relatos por pes-
soas presentes nos ressuscitamentos ou nos graves acidentes. E isto foi per-
feitamente possível, com o testemunho de pessoas que confirmaram em vá-
rios pontos os relatos dos entrevistados. Muitos médicos ficaram estupefatos
50 51
com os testemunhos dos “quase-mortos”. Vamos, aqui, transcrever um deles,
dentre os mais interessantes narrados pelo Dr. Raymond A. Moody Jr.:
— Quando eu acordei, depois do acidente, meu pai estava lá (…). Contei a ele
quem tinha puxado o meu corpo para fora do prédio e até a cor das roupas que
essa pessoa estava usando. Contei, ainda, como me tiraram de lá e, até, sobre todas
as conversas que estavam ocorrendo naquela área. E meu pai me disse: — Bem!
Sim! Essas coisas aconteceram de verdade! (Raymond A. Moody Jr., Vida depois
da vida, p. 92)
Os estudos e pesquisas do Dr. Raymond A. Moody Jr. ratificam o conteú-
do de inúmeros relatos mediúnicos, documentados pela Doutrina Espírita,
acerca dos fenômenos que envolvem a morte corporal e a entrada do espíri-
to liberto nos planos de uma outra Vida.
Todos os pontos coincidentes desses relatos de “experiências de quase-
morte” são explicados pela Doutrina Espírita, e em sua maioria estão regis-
trados em livros e mensagens mediúnicos, através de instrumentos da maior
respeitabilidade, como Francisco Cândido Xavier e Yvonne do Amaral
Pereira.
Tentaremos fazer uma análise comparativa no próximo capítulo. •
7
Experiências de Quase-morte:
um Enfoque Espírita
Os Espíritos, ao tentarem descrever situações e paisagens de Além-
túmulo, insistem sempre na grande dificuldade que encontram em
traduzir, na linguagem humana, o que se passa “do lado de lá”. Como ser
possível reduzir a três o que acontece em quatro ou mais dimensões? Como
encontrar termos de comparação?
Diante de tais dificuldades, eles utilizam-se de analogias e metáforas que
resultam sempre imperfeitas, reduzindo-se, assim, a sombras o que acontece
em plena luz, como no mito platônico da caverna.
Mesmo em nosso mundo, poetas de hiper-sensibilidade sempre encon-
traram a maior dificuldade em expressar verbalmente os seus “estalos” de
inspiração que mais se assemelham a relâmpagos de contemplação extática
da beleza. Isto, Augusto dos Anjos, poeta paraibano, traduziu, em poema
antológico. No soneto A Idéia, diz ele nos tercetos finais:
…vem (a idéia) do encéfalo absconso que a estringe e chega às cordas da laringe, pá-
lida, tênue, muda, raquítica… Quebra a força centrípeta que a amarra e, finalmente,
quase morta, esbarra, no molambo da língua paralítica… (Augusto dos Anjos, Eu
e outras poesias, p. 61)
Se, neste mundo, seres humanos encontram tais empeços na linguagem ver-
bal, dá para aquilatar as dificuldades dos Espíritos e daqueles que visualiza-
ram “o outro lado da Vida” nas “experiências de quase-morte”, para contar o
que, efetivamente, viram por lá. Compreende-se.
Livros e mensagens recebidos por médiuns idôneos narram que, por ocasião
da morte, o espírito em processo de liberação, sente-se num estado deve-
ras singular, vivendo uma Vida dupla: uma, na esfera física onde o corpo
52 53
material está prestes a consumir-se; outra, na Esfera Espiritual, onde está
penetrando, aos poucos, de volta a sua verdadeira morada.
Nessas condições, a individualidade eterna, em processo de liberação,
sente-se pertencente a dois mundos – o da matéria e o do espírito. Daí, po-
der ouvir tudo quanto está ocorrendo em torno de seu corpo físico, como,
por exemplo, vozes, opiniões, comentários, exclamações, prantos, etc.
Enfermos graves, em estado de coma, ao retornarem, por instantes, à lu-
cidez, costumam tecer comentários acerca do que estava acontecendo em
torno dos seus leitos. Reproduzem com fidelidade, comentários feitos a res-
peito deles. É que a morte somente se consuma quando o laço fluídico que
une corpo e espírito é desfeito. Enquanto isto não ocorre, ainda é possível
o retorno à Vida.
As regiões superiores do Mundo Espiritual caracterizam-se por uma paz
permanente.
Humberto de Campos, no livro mediúnico Reportagens de além-túmulo,
afirma ser “o bulício próprio dos homens e o silêncio próprio de Deus”.10
A calma que experimentaram todos os que estiveram “mortos”, por mo-
mentos, representa uma pequena amostra do clima de serenidade e quietu-
de das Esferas Espirituais mais altas, reflexo do céu interior que os Espíritos
elevados construíram dentro de si mesmos. Sentem-se serenos e tranqüilos,
“no outro lado”, os que, aqui, na Terra, já desfrutavam daquela imperturbável
paz interior.
“O Reino de Deus está dentro de cada um de vós”, disse Jesus. (Lc. 17, 21)
Quanto à audiência de sons de múltipla natureza, no instante da morte, isto
deve-se à imersão do espírito, em transe liberatório, numa espécie de dupli-
cidade de Vida.
Esses sons, ora são do próprio mundo material que a alma está dei-
xando, ora do Mundo Espiritual, onde ela está ingressando. Assim como,
neste mundo, há sons, luzes e cores dos mais variados matizes, o mesmo
ocorre “no outro mundo”, onde esses fenômenos atingem as raias do ini-
maginável. Daí, muitos dos que vislumbraram o Além, nas “experiências de
10	 Francisco Cândido Xavier  Espírito Humberto de Campos, Boa nova, p. 141.
quase-morte”, poderem ouvir e ver sons e luzes cuja natureza não puderam
precisar corretamente.
Oportuno lembrar, aqui, como ilustração, o Apóstolo Paulo em sua se-
gunda Epístola aos Coríntios:
Conheço um homem em Cristo (deve ter sido ele mesmo; por modéstia, torna o re-
lato impessoal) que, há catorze anos, foi arrebata do até ao terceiro céu, se no corpo
ou fora do corpo, não sei, Deus o sabe. Sei que tal homem foi arrebatado ao Paraíso
e lá ouviu ditos indizíveis os quais não é lícito ao homem referir. (II Cor. 2-4)
Quase todos os que passaram pela “experiência de quase-morte” dizem ter
sentido, nesse momento, uma sensação de “estarem sendo puxados através
de uma espécie de espaço escuro”. Segundo o Dr. Raymond A. Moody Jr.,
esse espaço é descrito em múltiplas entrevistas, como “caverna, poço, buraco,
cercado, funil, túnel, vácuo, vazio, bueiro, vale e cilindro”.11
Por ocasião da “morte verdadeira”, sensações semelhantes também po-
dem acontecer. É que a morte, embora um fenômeno natural, não deixa
de ser uma crise, isto é, um momento decisivo em que o espírito deixa um
envoltório grosseiro de que se serviu por largo espaço de tempo – o corpo
carnal – para assumir um outro, tênue e imponderável. Daí, as imagens uti-
lizadas pelos que estiveram, por momentos, “no outro lado”, associando o
instante da transição a “espaço escuro, vazio, vale, vácuo”, e, também, a “tú-
nel, funil, bueiro e cilindro”.12
Todos esses termos têm perfeita analogia com
“passagem entre dois pontos”. São sensações inusitadas, próprias do momen-
to em que o espírito transpõe o plano da matéria grosseira para adentrar a
outra Vida.
Nesses momentos, o ser espiritual sente-se “sugado” para outras dimen-
sões de Vida e, ao mesmo tempo, “puxa do” para o corpo físico, sensações
que sugerem transição entre dois planos, fenômeno que, efetivamente, está
se processando, em virtude do “cordão de prata” não se ter rompido ainda.
11	 Raymond A. Moody Jr., Vida depois da vida, p. 30.
12	 Idem, ibidem.
54 55
A contemplação do corpo físico pela alma recém-liberta é fato muito co-
mum nos casos de “morte verdadeira”. Nesse momento, a individualidade
sente-se em duplicata e observa, em corpo espiritual, o indumento material,
a certa distância, nos estertores da agonia, prenunciadora da libertação.
Relato impressionante pela abundância de detalhes é o do espírito Irmão
Jacob, pseudônimo de Frederico Figner, um dos diretores da Federação
Espírita Brasileira, há cinco décadas atrás. Em livro psicografado pelo mé-
dium Francisco Cândido Xavier, esse espírito descreve, com pormenores,
como ocorreu a sua morte. Eis alguns trechos desse relato, onde ele fala so-
bre a visão do seu corpo físico, confirmando, mais uma vez, tudo o que foi
visualizado pelos que tiveram a “experiência de quase-morte”:
Assombrado, vi-me em duplicata. (…) Fixei meu corpo a enrijecer-se, num misto
de espanto e amargura. (…) A contemplação do corpo imóvel, não obstante agu-
çar-me o propósito de observar e aprender, era-me aflitiva. O cadáver perturbava-
me com as sugestões da morte. (…) Alongando o raio do meu olhar, verifiquei
a existência de prateado fio ligando-me o novo organismo (o corpo espiritual) à
cabeça imobilizada (do corpo material) (…) Eu seria o cadáver ou o cadáver seria
eu? Por intermédio de que boca pretendia falar? Da que se fechara no corpo ou da
que me servia agora? (Francisco Cândido Xavier e Espírito Irmão Jacob, Voltei, pp.
38–39)
Depoimentos semelhantes a este são freqüentes em todos os relatos mediú-
nicos de pessoas em processo de morte iminente.
Espíritos amigos, Espíritos parentes que já se encontram nos Planos
Espirituais, costumam vir receber os que estão deixando este mundo.
Ninguém estará sozinho nessa hora. Pode acontecer que muitos não per-
cebam a assistência que estão recebendo, em virtude do apego excessivo ao
mundo que estão deixando, mas essa presença é fato sobejamente compro-
vado e revelado nos comunicados mediúnicos.
A sabedoria popular nos diz que quando o moribundo começa a ver e
a chamar pelos que morreram, é que está bem próxima a sua partida desta
para a outra Vida. Isto é uma grande verdade.
Freqüentemente, dependendo do nível de evolução dos que estão
morrendo, muitos desses Espíritos se dão a conhecer, conversam com o mo-
ribundo, dirigindo-lhe palavras de conforto e de otimismo para tranqüilizá-
los, naquele transe.
Em outros casos, quando acontece “o sono da alma” e esta acorda em
instituições da Espiritualidade, é muito comum ali se encontrarem Espíritos
amigos e protetores, prontos para ajudá-la no seu despertar no berço da ou-
tra Vida. Esse fenômeno é uma prova evidente de que as almas, no Além,
não estão confinadas em determinados “lugares”. Elas habitam todo o es-
paço cósmico, podendo transitar livremente em múltiplas atividades, como
nas missões de amor, junto aos que estão deixando a Vida material.
O que viria a ser um encontro com “um ser de luz”? Evidentemente que
esse ser não é o Cristo. Trata-se de Espíritos luminosos, guias, anjos guardi-
ães e protetores que vêm ao encontro dos que estão deixando este mundo,
mormente daqueles que cumpriram a sua missão dentro dos ditames da Lei
Divina. Pessoas que se iluminaram, aqui, na Terra, merecem ser recebidas,
nos pórticos do Além, por seres, também, iluminados.
A apresentação dos Espíritos superiores é sempre muito nobre e bela.
Usam eles túnicas luminescentes de cores variadas, com belíssimas nuanças,
e a sua presença sempre irradia amor e paz. Esses Espíritos, pelo seu porte
e majestade, são, por vezes, confundidos com o Cristo pelos que estão às
portas da Eternidade.
Esses seres de luz são habitantes de esferas superiores, mas não desde-
nham em descer aos planos inferiores para virem receber seus entes que-
ridos, em especial os que venceram, galhardamente, na Terra as provas e
expiações a que se submeteram.
O fenômeno da recapitulação da existência vivida é um fato comum em
todos casos de morte real e quando o decesso ocorre por causas naturais.
Todos revêem a sua existência, desde a mais tenra infância até o instante
final, com uma riqueza impressionante de pormenores. Nada escapa a esse
registro extraordinário que se radica no corpo espiritual, verdadeiro arquivo
da individualidade eterna: a alma humana.
Como já tecemos considerações, alhures, em torno desse tópico, nos li-
56 57
mitaremos, agora, a transcrever um extraordinário depoimento obtido, via
mediúnica, acerca do singular fenômeno:
Vi-me diante de tudo o que eu havia sonhado, arquitetado e realizado na Vida.
Insignificantes idéias que emitira, tanto quanto meus atos mínimos, desfilavam,
absolutamente precisos, ante meus olhos aflitos, como se me fossem revelados de
roldão, por estranho poder, numa câmara ultra rápida, instalada dentro de mim.
Transformara-se-me o pensamento num filme cinematográfico, misteriosa e ino-
pinadamente desenrolado, a desdobrar-se, com espantosa elasticidade, para o seu
criador assombrado que era eu mesmo. (Francisco Cândido Xavier e Espírito
Irmão Jacob, Voltei, p. 31)
No livro Obreiros da vida eterna, de autoria do espírito André Luiz, pela me-
diunidade de Francisco Cândido Xavier, vamos encontrar uma referência a
esse mesmo fenômeno, por ocasião da morte do personagem Dimas.
Antes de cortar o cordão fluídico que ainda prendia o espírito ao corpo,
o Assistente Jerônimo dirige-se à mãe do desencarnante que viera recebê-lo,
nestes termos:
“Por enquanto, repousará ele (Dimas) na contemplação do passado, que se lhe des-
cortinará, em visão panorâmica, no campo interior.” (Francisco Cândido Xavier e
Espírito André Luiz, Obreiros da vida eterna, p. 212)
A grande maioria dos que tiveram a “experiência de quase-morte” retornou
à Vida, porque não ultrapassou uma barreira por eles visualizada. Na “morte
verdadeira”, esse limite é transposto. O “cordão de prata” que une o espírito
ao corpo carnal é rompido definitivamente, e a alma alça vôo para a Esfera
Espiritual compatível com o seu nível evolutivo.
As sensações de paz, leveza e liberdade que os entrevistados do Dr.
Raymond A. Moody Jr. experimentaram, constituem uma pálida e inex-
pressiva amostra do que está reservado, de forma perene, às almas nobres e
cristificadas que deixaram a Vida terrena.
Transposta a “barreira”, o espírito não retornará mais ao corpo. A morte
acontece… mas a Vida continua!… •
8
O Melhor Lugar Para Morrer
Omelhor lugar para morrer é em casa, com a plena consciência do “mor-
rer”, cercado do carinho e da assistência dos parentes, amigos e vizi-
nhos, todos orando por aquele que está deixando este mundo. Jamais em
leitos, por mais macios e sofisticados que sejam, de hospitais e uteís ou em
“confortáveis” abrigos-depósitos para idosos.
Era assim que se morria antigamente, mesmo no Ocidente, sendo o cor-
po – vestimenta do espírito – velado, respeitosamente, nos lares onde ocor-
ria o óbito. Era dali que o féretro saía para as necrópoles.
O que vemos, agora, nos dias que correm?
Exceção feita das pequenas cidades do interior, em 95% dos casos, morre-
se em hospitais públicos e particulares. Ocorrido o decesso do corpo, é este
imediatamente retirado dos nosocômios, de uma forma disfarçada. São as
casas funerárias que se encarregam, por vezes, até de vestir ou de “maquiar”
o morto, como é costume nos Estados Unidos da América, a fim de que o
cadáver seja apresentado nas solenidades fúnebres que precedem o sepulta-
mento ou cremação, com o melhor aspecto possível.
Certa vez, anos atrás, estudando nos Estados Unidos, na Universidade
de Houston, Texas, tive a oportunidade de participar das cerimônias fúne-
bres pelo falecimento de um inquilino do complexo de apartamentos em
que morava. Aconteceu a morte. Nenhum dos vizinhos estava presente aos
instantes finais do falecido. Imediatamente, a empresa especializada em ser-
viços fúnebres foi acionada, e o morto levado às pressas para destino de
todos ignorado. A família, chorosa e entristecida, comunicou-nos que, no
dia seguinte, haveria uma cerimônia íntima que precederia a cremação do
cadáver. No outro dia, lá estive. Era um cemitério-parque, belíssimo, onde
não se via nenhuma cova aberta ou mausoléu sobre os restos mortais dos se-
pultados. Apenas os seus nomes em pequeninas placas de metal, quase invi-
síveis, espalhadas por uma área imensa. A cerimônia estava marcada para as
16 horas. Às 15 horas cheguei. Havia muitos parentes e alguns poucos amigos
58 59
especialmente convidados. Acerquei-me de todos. A maioria comentava a
perfeição da maquiagem do morto. Realmente, o seu rosto estava impecavel-
mente retocado, revelando uma beleza que não possuía em Vida. Era um ve-
lho e parecia um jovem! Aos presentes, foi servida uma rodada de uísque e
refrigerantes, de acordo com o gosto de cada um. Muitos fumavam, e até os
fósforos, distribuídos como brindes, imitavam o fogo fátuo tão comum nos
cemitérios. Precisamente, às 16 horas, o caixão foi levado até uma espécie de
altar. Uma cortina foi fechada. Diante dele, um botão acionado. Desceram
o esquife e o cadáver ao forno crematório subterrâneo, e, de volta, quando
descerrada a cortina, surgiu uma bela urna já com as cinzas do morto. Esta
foi entregue, solenemente, aos familiares. Estava encerrada a cerimônia. Sem
choros, sem lamentações. Mais uma festa do que um enterro!
Nada teríamos a comentar sobre o fato se, nas entrelinhas de tal sole-
nidade, não vislumbrássemos aquilo que já dissertamos anteriormente: a
tentativa de negação da morte e isto bem presente nas exclamações admira-
tivas dos visitantes, parentes e curiosos: “— Não está morto! Parece dormir!
Como está bonito depois de morto! Parece que está sorrindo para nós!”, e
quejandos…
A transferência do corpo para as casas funerárias, como já é costume em
nosso país, encerra um objetivo: o de não se encarar a morte de frente. Daí a
escolha de um lugar “mais conveniente”, em que haja um espaço maior para
visitantes e convidados, numa verdadeira festa macabra onde, por vezes, os
aperitivos estão sempre presentes com o objetivo de “dopar” um pouquinho
as pessoas, ante a presença da morte.
Não se morre mais em casa. Quando a família pressente a ronda da mor-
te sobre o seu ente querido, desloca-o, mesmo contra os seus desejos, ex-
pressos verbalmente ou por escrito, para hospitais e uteís, onde eles ultima-
rão os seus dias, neste mundo.
É fato notório que a medicina atingiu, hoje em dia, níveis de progresso
tecnológico admiráveis. Aparelhagens sofisticadas substituíram, aos poucos,
as apalpadelas do bonachão e paternal médico da família. São instrumentos
de última geração, capazes de detectar tudo o que se passa na intimidade do
organismo humano, com grandes e inegáveis benefícios para os pacientes,
portadores das mais diversas enfermidades.
Todavia, nenhum desses instrumentos é capaz de substituir a presença
humana daquele que exterioriza amor pelo moribundo e se transforma, em-
paticamente, mesmo em silêncio, num apoio moral e espiritual para quem
está vivendo os seus últimos dias de experiência terrestre.
A frieza dos hospitais e das uteís pode causar aos que vão morrer, uma
agonia e, até certo pavor nunca presentes nos ambientes domésticos, onde
a atmosfera da casa proporciona tranqüilidade e confiança ao moribundo,
pelas ricas inter-relações pessoais que favorece. Tais ambientes podem pro-
longar, por um tempo variável e até indeterminado, a Vida dos doentes, mas
não lhes oferece o calor humano e a solidariedade de que tanto eles neces-
sitam, nessa hora.
Um caso bem recente e que ficará nos anais da Tanatologia, é o do pro-
fessor e senador Darci Ribeiro, doente terminal, portador de câncer gene-
ralizado. Literalmente, ele “fugiu” de uma uteí, onde estava confinado e, lá
fora, livre e consciente da ronda da morte em sua Vida, optou por viver. E
na hora em que escrevo este texto (1.º/dez./1996), esse homem admirável já
escreveu dois livros e ultimou a elaboração de mais um; promete um quarto
e está sempre presente em programas de TV, comparecendo em determina-
dos dias, ao Senado, numa programação de Vida, rica, fecunda e plena de
realizações.
Nas uteís, o moribundo é apenas um número. Ali não está uma pessoa,
um amigo, um pai ou uma mãe, nas suas despedidas deste mundo. Não! Ele
é um estranho entre estranhos. As visitas, quando permitidas, não são vistas
com bons olhos pelas equipes médicas nem pelas administrações hospitala-
res, porque podem flagrar algum desrespeito ou negligência ao doente. E os
parentes e amigos permanecem de fora, curtindo a sua angústia e inquieta-
ção e contentando se com boletins de informações sobre o estado geral do
paciente.
Nessas unidades o revezamento das equipes hospitalares faz com que os
seus ambientes sejam visitados, semanalmente, por dezenas de profissionais,
todos especialistas, sem a criação de quaisquer vínculos pessoais, afetivos ou
de simpatia com qualquer um dos pacientes. Por isso mesmo, muitos doen-
tes entram e saem dessas unidades sem criar laços de amizade com nenhum
membro dessas equipes. Diga-se o mesmo das enfermarias coletivas, nos
hospitais públicos e particulares, com visitas restritas a determinados dias da
semana; das indigências hospitalares e dos abrigos para idosos, onde todos
60 61
estão matriculados para um “morrer solitário”, em lugares que se transforma-
ram, em depósitos de doentes à espera angustiante da hora da morte!…
Por outro lado, médicos, enfermeiros e outros profissionais que atendem
nas uteís e enfermarias coletivas, lidando com doentes graves, nem sempre
possuem o tato psicológico para cuidar desse tipo de pacientes que estão a
exigir tratamento delicado e especial.
E, assim, prevalece a tecnologia médica em detrimento do calor humano.
A aparelhagem sofisticada e fria substitui o aperto de mão, a solidariedade
do médico de família ou a presença confortadora dos familiares.
Aos poucos, vai-se instalando em nossa sociedade capitalista a “indús-
tria da morte”, tentando-se prolongar vidas que já se extinguiram. Estas são
mantidas, indefinidamente, por meios artificiais, criando uma situação des-
confortável para as famílias dos pacientes, mas, que rende milhões aos cofres
dos donos das empresas hospitalares.
Infelizmente, é assim que se morre, atualmente, no mundo ocidental.
Sem consciência de que se vai morrer. Sem a presença dos familiares e ami-
gos. Na frieza das uteís. Na companhia de estranhos e sem o conforto da
atmosfera doméstica que traz confiança e paz ao moribundo.
Muito triste morrer em tais condições… •
9
A Melhor e a Pior Forma de Morrer
Amorte atinge o ser humano de múltiplas maneiras. Morre-se de doen-
ças incuráveis, de acidentes de várias naturezas, em conseqüência de
cataclismos naturais e, ainda, por homicídio, suicídio e até de velhice.
Qual seria, dentre as inúmeras formas de morrer, aquela menos trauma-
tizante para o espírito que está prestes a partir deste mundo?
É o que tentaremos responder neste capítulo.
Muita gente pensa que a morte de maior merecimento é a repentina. Um
violento ataque do coração, o rompimento de um aneurisma, um trombo no
cérebro, e pronto: acontece a morte inopinada e libertadora. Outros chegam
a ansiar que a morte lhes aconteça num acidente aéreo ou automobilístico,
que, pela sua violência, implicaria num aniquilamento rápido e indolor do
corpo carnal. Outros, ainda, gostariam de que a morte lhes chegasse duran-
te o sono corporal. Sabe-se que, por ocasião do sono, a alma das pessoas
de mediana evolução libera-se, parcialmente, das amarras carnais. A mor-
te, nesse caso, dar-se-ía pelo corte do “cordão de prata”, durante a inconsci-
ência do sono, possibilitando uma passagem tranqüila e suave para a Vida
Espiritual. Esta, em nossa opinião, é uma das melhores formas de morrer,
senão a melhor.
As mortes ocasionadas por doenças incuráveis, geralmente, configuram
resgates cármicos. São mortes aflitivas e dolorosas. Todavia, passados os
maus momentos, oriundos desses sofrimentos, em especial se eles forem
estoicamente suportados, a alma entra na Pátria Espiritual, luminosa e redi-
mida. Excetuam-se, nesse caso, as doenças desse tipo contraídas por insânia
e irresponsabilidade, bem assim aquelas devidas a comportamentos anor-
mais, gerando torpes viciações, comprometedoras da saúde física e mental
da pessoa.
A morte natural, como o próprio termo expressa, é a forma que, em tese,
a Natureza estabeleceu para a liberação do espírito. Nela, mesmo que acon-
62 63
teça em virtude de doenças dolorosas e traumatizantes, há o “desate” do
“cordão de prata”, este, elo de ligação entre o espírito e o corpo.
Já nas mortes subitâneas e violentas, em acidentes inesperados, não há
o desatamento desse cordão e essa providência liberatória vai exigir a in-
tervenção de Espíritos benfeitores e amigos, treinados para isto. Eis porque,
nas mortes inopinadas, o estado de perturbação do espírito perdura por um
tempo variável, consoante o nível evolutivo de cada um. Já na morte natural,
mormente se ela ocorre na idade provecta, o estado de perturbação é bem
menor, e chega quase a inexistir se a pessoa que se está transferindo para a
outra margem da Vida, tem fé na imortalidade da alma e pautou a sua exis-
tência pelos padrões éticos da mensagem de Jesus.
Aquele que, nesta Vida, foi temperante na alimentação, sereno emocio-
nalmente, controlado na prática do sexo, possuidor de nobres sentimentos,
enfrentará a morte com sobranceria, transferindo-se para o outro lado numa
atmosfera de paz e serenidade.
O mesmo não ocorre com os intemperantes na mesa, no sexo ou que se
escravizaram a viciações deletérias como o fumo e o álcool. Estes, se forem
nobres de caráter e bons de coração, poderão até atingir a longevidade, mas
sofrerão nessa fase de suas Vidas, as conseqüências fatais de suas levianda-
des e irreflexões. Terão, em suma, uma velhice de má qualidade e, conse-
qüentemente, uma morte mais lenta, penosa e angustiante.
É de se concluir, portanto, que, em tese, a melhor forma de morrer é na
senectude do corpo, com o espírito vígil, em plena lucidez, não obstante o
natural esgotamento das forças físicas.
E essa forma de morrer nada tem de dolorosa ou desesperadora. É a cha-
mada morte do passarinho, ou seja, uma passagem feliz para as moradas de
luz do infinito, com um despertar luminoso no Além. Melhor, ainda, seria
dizer que essa forma de morrer é uma volta, uma retomada do caminho
de casa, vez que a verdadeira morada do ser humano – espírito revestido
de carne – não é aqui, neste mundo, mas sim, no outro. A Terra é o exílio
temporário da alma.
Nas suas despedidas dos Apóstolos, Jesus foi muito claro quando lhes
disse: “— Vós não sois do mundo, assim como eu, também, não sou do
mundo.” (Jo. 17, 16)
Importantíssima, portanto, é a manutenção permanente do equilíbrio
físico e mental. Isto gera uma excelente qualidade de Vida e também uma
extraordinária qualidade de morte. Vivendo assim, a morte não será uma
ruptura, mas um desenlace; não será uma angústia, mas uma forma de re-
nascer; não será um empeço, mas uma transição calma de uma margem para
a outra do grande e perene rio da Eternidade.
Morrer, assim, vale a pena. É como um sono de paz que termina com o
mais venturoso despertar.
Temos falado, até agora, na melhor forma de morrer. Existiria, então, uma
pior? Claro que sim. Vejamos.
Sem sombra de dúvida, a pior forma de morrer é por suicídio, voluntário
ou não.
Dedicamos, neste livro, três dos seus capítulos ao suicídio, essa maneira
ofensiva a Deus de desertar da Vida. Nesses capítulos, analisamos as dolo-
rosas e inimagináveis conseqüências, no outro lado da existência, desse ato
tresloucado. Remetemos o leitor a esses capítulos (52, 53 e 54).
Seguem-se, como formas mais indesejáveis de morte, aquelas caracteri-
zadas pela violência, como nos homicídios e acidentes de variada espécie.
Por último, nessa gradação dos piores tipos de morte, estão as mortes por
cataclismos naturais, também muito dolorosas e angustiantes, mas sempre
devidas a programações reencarnatórias de natureza cármica.
Todavia, em todos esses casos, embora traumatizantes, o auxilio do Alto
sempre far-se-á sentir, por ser infinita a misericórdia de Deus. •
64 65
III
A Morte e o Morrer
A Visão Contemporânea
de Cinco Religiões
66 67
10
A Visão Católica
(Texto baseado em entrevista com o Prof. Francisco Pereira Nóbrega, líder católico, Doutor em
Filosofia pela Universidade de Paris, e por ele revisto)
Amorte não tem a última palavra. Ela não é o fim. Existe outra Vida de-
pois dela. E esta certeza – temos de convir – é muito maior para os cris-
tãos, uma vez que Jesus ressuscitou. O seu sepulcro, vazio até hoje, é a maior
prova da inexistência da morte como algo definitivo. Ao vencer a morte, o
Cristo de Deus deu todo sentido à Vida humana.
Referindo-se à morte de seu amigo, Lázaro, o Cristo disse: “— Lázaro
não morreu. Ele dorme, mas vou para despertá-lo” (Jo. 11, 11). Com isto, o
Cristo significou que a morte é algo tão precário, passageiro, quanto o sono
físico que leva ao despertar de amanhã.
O que seria a Vida Eterna?
O que o cristão chama de “Vida Eterna” é, acima de tudo, a sociabilidade
no amor. Descartado está que a Vida Eterna do ser humano seja um “estar
sozinho”. A outra Vida será um “estar com Cristo”, um “estar com Deus”.
Onde estariam as almas após a morte?
Os conceitos “onde” e “quando” referem-se à matéria e só a ela convém.
Precisaríamos de outras categorias de pensamento para podermos falar da
realidade da Vida Eterna. O ser material, porque tem extensão, ocupa um
“onde”, que a alma, o espírito, Deus, não ocupam.
Se falarmos do “quando”, a dificuldade é a mesma. Digamos que Deus e o
mundo têm suas durações. Mas a duração da matéria é sucessiva, enquanto a
de Deus é simultânea. À sucessiva denominamos tempo. A simultânea, cha-
mamos de Eternidade. O tempo entende-se em termos de “antes” e “depois”.
Eternidade não tem “antes” nem “depois”. A duração de Deus é toda ela em
um instante só que não passa jamais.
Falemos de almas e Espíritos. Não são a mesma coisa. A alma humana é
uma espécie de espírito que tem apetência pela matéria. Seu modo natural
68 69
de existir é animando a matéria. Toda alma humana implora a corporeidade,
mesmo depois da morte.
A alma é “forma” cujo conteúdo é a matéria. É essa “forma” que dá unida-
de, sustentação, permanência, na existência do ser humano. É ela que vitaliza,
anima, humaniza a matéria. A alma é princípio de unidade e de sustentação
do ser humano.
Em que parte do corpo está a alma?
Existem realidades que nunca estão nas partes, mas no todo. A Vida, a
existência, a unidade do corpo humano não estão em nenhuma de suas par-
tes. A alma também é assim.
Após a ressurreição, cada alma terá uma corporeidade, conforme sua ap-
tidão natural de existir. Não será um corpo físico, como o atual, sujeito ao
calor, à fome, ao sono, a todas as necessidades materiais da Vida. Paulo fala
de um corpo glorioso, “incorruptível”, como aquele do Cristo que, após res-
suscitado, entrou em uma sala, onde todas as portas e janelas estavam fecha-
das. Esse corpo glorioso, portanto, não tem necessidades materiais mesmo
sublimadas. Não tem necessidade física nenhuma.
Qual é a identidade do ser humano que tombou na Eternidade?
Seremos, eternamente, o que fomos. Nossa identidade é nossa história,
nossas virtudes e fraquezas, acrescentadas ao arrependimento nosso e ao
perdão de Deus. Tudo isto se eternizará. Tudo isto será a nossa face, eterna-
mente. Não há outra coisa para se eternizar, no Além, senão esse “eu”, com a
sua história e as intervenções de Deus.
Moisés e Elias aparecem, no Tabor, ao lado de Jesus. Ambos estão com as
vestes judaicas, com os mesmos traços fisionômicos do seu povo. Estavam
ali revelando suas identidades. Se não aparecessem assim, não seriam Moisés
nem Elias.
Quando seremos julgados?
Cada um, isoladamente, após a morte? Todos, simultaneamente, no juízo
final?
Voltamos a falar do “quando”.
“Tempo”, como o entendemos, só existe, aqui, no mundo, porque tempo
é medida de mudanças em termos de “antes” e “depois”. Na Eternidade não
existe “antes” nem “depois”.
Teólogos católicos, e das igrejas reformadas, inclinam-se, atualmente, a
entender que é esta a condição do ser humano, ao tombar na Eternidade:
morreu, ressuscitou. No próprio instante da morte, aconteceria a ressurrei-
ção, também o julgamento.
Isto não invalidaria o juízo final, porque algo existe, além de cada homem,
chamado civilização, cultura, a “História Humana”, afinal. É esta dimensão
de realidades coletivas que passa a merecer o julgamento final.
Os textos bíblicos que falam desse julgamento, aludem a uma ressurrei-
ção dos corpos que, até aquela data, estariam em suas condições mortais.
Reconhecemos que isto oferece resistência à tese teológica de “morreu, res-
suscitou”. A questão continua em aberto para o debate dos teólogos.
Quais são as condições que nos fazem merecer o céu?
De imediato, digamos que nenhum ser humano tem direito ao céu pelos
seus próprios méritos. O homem chegará a Deus gratuitamente, mesmo o
herói, o santo, o altruísta, o que deu a Vida pelos outros. O ser humano não
chegará a Deus como chegam, aos seus espetáculos, os faquires, em virtude
de seus longos jejuns. Nenhuma força humana levará o homem a Deus. Os
que atingirem o céu, lá aportarão pela graça de Deus.
Como seria este “estar no céu”?
Todas as palavras do vocabulário humano são pobres para traduzir essa
visão de Deus, esse êxtase em Deus. Não serão os olhos da matéria que ve-
rão a Deus.
Nas primeiras páginas do livro do “Gênesis”, lê-se: “— E disse Deus, faça-
mos o homem a nossa imagem e semelhança” (Gen. 1, 26), o que significa di-
zer que o ser então criado, poderá, um dia, ter a visão de Deus sem os olhos
da carne, de maneira semelhante a que Deus nos vê. É o espírito perante o
espírito. Eis o máximo a que poderemos chegar acerca da visão de Deus.
O que seria o inferno?
É um estado de alma negativo, violento. É o estado de quem eternizou o
ódio, o mal, a perseguição aos outros, a calúnia, a hipocrisia.
A morte revela o que a Vida fotografou. Na Eternidade, tudo é consciên-
cia. O inferno é a consciência infeliz. É a infelicidade ontológica do ser que
não se aceita e que não tem como fugir de si mesmo. O inferno não é algo
imposto por Deus ao homem. E a história da verdade de cada um, de suas
opções, contada pela própria consciência.
Que é o purgatório?
70 71
E um estado intermediário, mas transitório, de dor, e arrependimento. E
só isto. O que mais se disser sobre esse assunto é pura imaginação.
Os teólogos contemporâneos tendem a colocar o purgatório no tempo,
não na Eternidade. Seria, talvez, o último instante de tempo de cada um,
quando se toma a consciência do que se é, no limiar da Eternidade. Haverá
dor se a consciência é infeliz.
Que é o limbo?
Esta palavra não aparece no Velho, nem no Novo Testamento. Durante
séculos de fé cristã, nunca se pronunciou esta palavra. Alguns teólogos se
questionaram sobre a história de determinados seres humanos que não po-
diam ir para o inferno nem, talvez, para o céu. Imaginemos crianças abor-
tadas, mortas nos primeiros meses de existência. Imaginemos seres anor-
mais, como os mongolóides, na inconsciência de si próprios. Não pecaram.
Acrescente-se, ainda, que nem sequer foram batizados. Certa Teologia ca-
tólica imaginou para eles um lugar que a Bíblia não revela, chamado limbo.
Hoje, no catecismo católico, não se menciona limbo. Ele não existe. Nunca
existiu. Crianças ou adultos que tenham passado por esta Vida, nestas con-
dições, certamente estão no céu. Deus criou o ser humano para o Paraíso. Só
quem pode violar este plano de Deus é a liberdade humana. Se esses seres
não tiveram consciência nem liberdade, se nunca optaram contra Deus, a
criação é positiva e eles estão salvos.
Trabalha-se, no outro lado da Vida?
A Teologia católica responde que, na Eternidade, não há lugar para o tra-
balho, como o entendemos, aqui, na Terra. Na condição humana atual, o
trabalho resulta de uma necessidade. Na Vida Eterna, a única necessidade é
de Deus. Quem tem a visão direta Dele, de mais nada precisa. Deus é amor
e a Eternidade é apenas o êxtase do amor em Deus, sem necessidade nenhu-
ma das coisas terrenas.
Nossos relacionamentos recíprocos de amizade, amor, continuariam no
Além?
Segundo a tradição católica, a Vida Eterna não nos faz desconhecidos
uns dos outros – o parente, o amigo. Todavia, o homem biológico não exis-
te mais no Além. Ele se encerra nesta Vida. Na Eterna, não há fome, sede,
sono, sexo. Relações de marido e mulher também acabam-se na Eternidade.
Lá, não mais existe a amizade marital. Os laços conjugais estão desfeitos.
A amizade e o amor continuam. Assim como, ao olharmos num espelho,
vemos tudo o que nele está refletido, do mesmo modo, e muito mais radi-
calmente, quem contempla Deus, face a face, também conhece e reconhece
todos aqueles que Nele estão refletidos. Em suma, na Vida Eterna nós nos
conheceremos melhor ainda do que aqui na Terra.
Deus estaria indiferente ao sofrimento dos que estão no purgatório ou
no inferno?
Deus é profundamente solícito para com toda a Sua criação, e especial-
mente para com o destino final do ser humano. A grande paixão de Deus é
o homem. Esta paixão do Criador pelo ser humano revela-se, ainda mais,
quando o Cristo nos fala da “ovelha perdida”, do “filho pródigo” e, sobretudo,
quando Ele próprio diz: “— Eu vim para salvar as ovelhas perdidos da Casa
de Israel.” (Mt. 15, 24)
Tudo isto seja dito do que Deus pode fazer pelo ser humano, no tempo.
Na Eternidade – repitamos – não há “antes” nem “depois”. Se não há “depois”,
não há como alterar a situação do condenado. Do lado que a árvore cai, ali
ela fica. Do mesmo modo, do jeito que o ser humano tomba na Eternidade,
desse jeito ele se eterniza. Ele é a sua identidade. Ele é a consciência infeliz.
Ele é o remorso de si próprio, eternamente se mordendo e se remoendo.
Deus não acende uma só chama para queimar esse ser. Deus, também, está
impossibilitado de alterar essa situação. Há, sim, “impossíveis” perante Deus,
senão não existiriam nem verdade, nem justiça. O inferno, repito, é a cons-
ciência que o condenado tem de si, sem se aceitar.
E qual seria, na Eternidade, a sorte dos suicidas?
A Bíblia nada diz de específico sobre os suicidas. Estão os teólogos, por-
tanto, a considerar esta morte sob a mesma categoria de todas as outras.
Nada de especial. Entretanto, convém ajuntar a estas reflexões o que, hoje,
nos diz a Psicologia, a Psiquiatria e a Psicanálise. Estas ciências tendem a ad-
mitir que, talvez, nem exista culpa nos que se suicidam. Eles, ao praticarem
esse ato tresloucado, fizeram-no em virtude de tendências congênitas ou de
depressões profundas. Não estariam mais na posse plena de sua consciência,
de sua liberdade.
O Cristo não destacou categorias especiais de sofrimento para nenhum
tipo de morte. E a morte por suicídio não seria uma exceção.
Existem anjos e demônios?
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Morrer e depois
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Morrer e depois

  • 1.
  • 3. Endereço do autor para correspondência: Waldo Lima do Valle Av. Gov. Argemiro de Figueirêdo, 3711 – Bessa João Pessoa – Paraíba – Brasil CEP: 58036–030 – Fone: (83) 3246 11 40 E-mail: waldolimadovalle@gmail.com Waldo Lima do Valle Morrer. E depois? Laser Plus Studio Gráfico
  • 4. Copyright © 1997 by Waldo Lima do Valle Capa: Waldo L. V. Filho Ilustração da capa: Fotoarte Revisão: Waldemir Lopes de Andrade Impressão Laser Plus Studio Gráfico CIP – Brasil Catalogação na fonte 218 V181m Valle, Waldo Lima do Morrer… e depois?: como vivem os que morrem / Waldo Lima do Valle. João Pessoa, 1997. 324 p. 1.Imortalidade 2.Espiritismo I–Título Aos simples de coração, Que amam a verdade, E buscam, Na ânsia de encontrá-la… Ao filho Waldo, que leu este livro antes de ele ser escrito…
  • 5. Agradecimentos Meu agradecimento especial vai para Nelson Eduardo Lima Ribeiro e esposa, Solange Venâncio Travassos, pelo apoio logístico e incentivo à edi- ção deste trabalho. Sou sinceramente grato a Marcelo de Sousa Santos, que digitou o texto, e o fez com extrema dedicação e amor. Agradeço ao Professor Waldemir Lopes de Andrade que, com rara com- petência e habilidade, fez toda a revisão de linguagem, ajustando e melho- rando a estrutura formal, o que contribuiu para a maior clareza dos temas abordados. Finalmente, minha gratidão a Maria da Conceição Moura dos Santos, por um gesto nobre e silencioso de Amor-Cristão. O Autor. Dois Esclarecimentos O autor, embora escreva sobre a morte, somente crê na Vida. Por isso, decidiu, numa liberdade ortográfica, enfatizar a palavra Vida, grafando-a com inicial maiúscula, no decorrer de todo o livro. Ao leitor espírita Este livro é ecumênico. Nada tem de polêmico. Consequentemente, não visa converter ninguém. Por isso, na redação dos Capítulos sobre as visões de outras religiões (Parte III), respeitamos, integralmente, as exposições dos entrevistados, na justificação dos seus pontos de vista. Daí, resultaram textos redigidos pelo autor, sem qualquer análise crítica. A “Visão Espírita” foi exposta pelo autor em mais de 200 páginas, em que justificou, com argumentos, as suas convicções. Desse modo, o leitor espírita terá a oportunidade de conhecer as “visões” de outras religiões e o leitor em geral ficará inteiramente livre para a escolha e o aceite daquela “visão” mais lógica e convincente. “Examinai tudo. Retende o bem.” (I Tess. 5, 21)
  • 6. “Não reclames, da Terra os seres que partiram… Olha a planta que volta, na semente, a morrer. Chora, de vez que o pranto purifica a visão; No entanto, continua agindo para o bem. Lágrima sem revolta, é orvalho de esperança… A morte é a própria Vida, numa nova edição!…” (Emmanuel / Francisco Cândido Xavier) “O pássaro é livre, na prisão do ar. O espírito é livre, na prisão do corpo. Mas livre, bem livre, é mesmo estar morto…” (Carlos Drummond de Andrade) Por que a irmã gêmea da Vida se chama morte? Morte: palavra pesada, semelhante a toneladas de escuridão, esmagando- nos… A morte poderia muito bem ser chamada de “passagem”. É leve. É suave. Chegando ao final da viagem, encontramos a “passagem”… Depositamos no chão a roupagem física. Não morremos. “Passamos”. Que tranqüilidade!… Hélia F. Barata (Ely)
  • 7. Ao leitor: Preciso dar-lhe uma notícia que, talvez, você ainda não saiba. Pensei em suavizar esta notícia, pintá-la com cores mais brilhan- tes, enchê-la com promessas de Paraíso, visões do Absoluto, explicações esotéricas. Mas, embora tudo isto exista, não vem ao caso tocar, agora, nesses assuntos. Respire fundo e prepare-se. Sou obrigado a ser direto e franco e, posso assegurar-lhe, tenho absoluta certeza do que vou dizer. É uma previsão infalível, sem qualquer margem de dúvidas. A notícia é a seguinte: “você vai morrer”! Pode ser hoje, amanhã, daqui a cinqüenta anos… mas, cedo ou tarde, “você vai morrer”. Mesmo que não concorde. Mesmo que tenha outros planos. Pense com todo o cuidado no que você irá fazer hoje. E amanhã. E no resto dos seus dias… Paulo Coelho (In “Maktub”, secção diária do jornal O correio da Paraíba, edição do dia 29 de dezem- bro de 1996) Súmario I Preâmbulo À Guisa de Prefácio 21 Os Que Não Devem Ler Este Livro 25 II Antes da Morte Considerações Gerais Sobre a Morte e o Morrer 29 Da Morte Para a Vida… Da Vida Para a Morte… 37 À Espera da Morte – O Doente Terminal 43 Experiências de Quase-morte 47 Experiências de Quase-morte: um Enfoque Espírita 53 O Melhor Lugar Para Morrer 59 A Melhor e a Pior Forma de Morrer 63 III A Morte e o Morrer A Visão Contemporânea de Cinco Religiões A Visão Católica 69 A Visão Evangélica 79 A Visão Judaica 87 A Visão Islâmica 91 A Visão Budista 97 IV Depois da Morte – A Visão Espírita Como Vivem os Que Morrem
  • 8. A Matéria e Seus Estados Mais Sutis 107 Esferas Espirituais 111 Cidades Espirituais 115 Solos Espirituais 123 As Trevosas Regiões Subcrostais 125 Regiões Purgatoriais e Infernais 127 Céu e Céus – Regiões Felizes 133 Anjos e Demônios 135 O Instante da Morte 139 Os Técnicos da Morte 143 Visão Retrospectiva, no Instante da Morte 147 O Cordão Prateado 149 O Sono Após a Morte 152 O Despertar do Espírito no Outro Lado da Vida 155 Reencontros nos Planos Espirituais 159 O Retorno dos Bons à Vida Espiritual 163 Religiões no Mundo dos Espíritos 167 O Trabalho dos Espíritos 173 Alimentação dos Espíritos 177 Como se Vestem os Espíritos 181 Locomoção dos Espíritos – Volitação 185 Trânsito dos Espíritos Entre Esferas Espirituais 187 Aeronaves Espirituais 191 Famílias Espirituais 197 Amor e Afetividade Entre os Espíritos 201 Namoro, Noivado e Matrimônio no Além 205 Sexo nos Planos Espirituais 209 Vida Social nos Planos do Espírito 213 A Arte no Além-vida 217 Enfermidades Espirituais 221 Recordação de Existências Passadas 225 Crianças nos Planos Espirituais 227 Selvagens – Como Vivem no Além 229 Ateus e Agnósticos na Vida Espiritual 233 A Outra Vida dos Animais 237 Morte por Eutanásia 241 Morte por Aborto 245 Morte por Suicídio (I) 255 Morte por Suicídio (II) 261 Morte por Suicídio (III) – Depoimentos 265 Mortes Violentas 273 Mortes Coletivas 277 Espíritos Inferiores – O Que Fazem no Além 281 Vampirismo Entre Dois Mundos 287 Legião É o Meu Nome, Porque Somos Muitos 291 Como Vivem os Bons Espíritos 293 Espíritos de Luz 297 O Estado Glorioso dos Puros Espíritos 301 A Aura dos Espíritos 305 A Visão de Deus e de Jesus 309 Envoltórios Espirituais 313 Vidas e Mortes na Caminhada Evolutiva do Espírito 317 Ação dos Espíritos no Mundo em Que Vivemos 321 Assombrações – Por Que Acontecem 323 Missões de Amor nas Regiões Inferiores do Astral 327 Justiça nos Planos Espirituais 329 Prisões e Confinamentos nos Planos Espirituais 333 Deixemos os Que Morrem em Paz 337 Epílogo 341
  • 10. 1 À Guisa de Prefácio Poderá parecer aos que vão ler estas páginas que o seu autor seja um “filo- tânato” – permitam-me o neologismo – isto é, um amante do mórbido ou do macabro, para escrever, com tanta riqueza de detalhes, sobre “a morte e o morrer”. Puro engano! Vejo-me, pelo contrário, um “biófilo”, isto é, um amante da Vida, na sua gama infinita de manifestações, escrevendo sobre a morte por nela não acre- ditar e por considerá-la a antecâmara da Vida. Sem a morte, jamais haveria ressurreição e nunca poderíamos penetrar na “Vida Abundante” das promessas de Jesus no Seu Evangelho de luz e de redenção. Foi Ele quem afirmou: “— Eu vim a este mundo para que todos tenham Vida e a tenham em abundância” (Jo. 10, 10), como quem diz: Vim anunciar que, além das fronteiras deste mundo, existem outras dimensões de Vida, onde a Verdade, a Beleza, a Bondade e a Justiça acontecem em níveis ainda desconhecidos, aqui, na Terra. Este livro, cujo subtítulo é Como vivem os que morrem visa, acima de tudo, esclarecer e confortar os que temem a morte, aqueles que jamais a querem ver, os que dela sentem aversão e pavor. Nele, procuramos demonstrar, atra- vés de sólida argumentação e com base em relatos recebidos do Além por médiuns idôneos, que, para lá do sepulcro, a Vida continua em dimensões ainda desconhecidas da grande maioria dos que, aqui, habitam. O livro que escrevi procura elucidar, consolar e fazer luz sobre o ou- tro lado da Vida, mostrando que, neste mundo, nada mais somos do que Espíritos revestidos de carne. Morrer, portanto, é deixar, sob os túmulos de pedra, o invólucro carnal, partindo o espírito, livre, para as Mansões da Casa do Pai. O próprio Jesus afirmou: “— Não se turbe o vosso coração. Crede em 21
  • 11. Deus. Crede também em mim. Na Casa de meu Pai há muitas moradas.” (Jo. 14, 2) Entretanto, este livro encerra, também, uma grave advertência: tal Vida, tal morte! Ou, como escreveu Paulo, em sua Carta aos Gálatas: “Não vos enganeis. De Deus não se zomba. Pois aquilo que o homem semear, isso também ceifará” (Gal. 6, 7), o que significa dizer: Vida reta, neste mundo, pautada nos ditames do Evangelho do Mestre, equivale, para o espírito, a portas abertas nos Planos Espirituais superiores. Vida errada, voltada tão so- mente para as baixas paixões e interesses mesquinhos do mundo, representa, para a alma, dores e sofrimentos atrozes em seu reingresso aos páramos da Eternidade. O livro tem, portanto, um nobre objetivo: despertar as consciências hu- manas para as vantagens de um viver digno, reto, nos braços da Lei de Deus, na certeza de que, somente assim, seremos felizes, tanto nesta, quanto na outra Vida. “A morte não nos faz o que a Vida não nos fez…!” – afirmou o grande filósofo cristão Huberto Rohden. Finalmente, poderíamos sintetizar toda a filosofia que inspirou este tra- balho, na afirmação de Rudyard Kipling, em Se, seu célebre poema: “Diante da morte, nem desejo de a ver, nem temor de vê-la.” Não queremos, evidentemente, estimular ninguém a buscar a morte, en- curtando, voluntariamente, seus anos de Vida, na Terra. Não! Absolutamente, não! Pelo contrário, queremos que todos aproveitem, e muito bem, os mi- nutos e segundos de suas vidas na construção de si mesmos e na reedifica- ção do mundo, considerando a oportunidade da existência, na carne, uma bênção de Deus, e a permanência, neste orbe, um aprendizado dos mais valiosos que, se levado a sério, guindará o ser humano aos Altos Cimos da Vida Espiritual. Este livro escancara as portas da Eternidade, exprimindo como devemos viver na Terra para entrar no Além, de fronte erguida pela consciência do dever cumprido. Estimula cada um a criar o céu dentro de si mesmo: “O Reino de Deus está dentro de cada um de vós” (Lc. 17, 21), disse o Cristo. Quem não constrói esse paraíso interior, jamais penetrará, um dia, no Paraíso Celestial, isto porque, como diz Richard Bach em sua obra-prima – A história de Fernão Capelo Gaivota: “O Paraíso não é um lugar nem é um tempo… O Paraíso é ser perfeito e você o encontrará quando houver atin- gido a perfeição.”1 O Autor 1 Richard Bach, A história de Fernão Capelo Gaivota, p. 89. 2322
  • 12. 2 Os Que Não Devem Ler Este Livro Este é um livro sobre a morte e o morrer. Um estudo tanatológico, sob um prisma religioso. O autor é ecumênico por convicção. Sua religião está sintetizada em qua- tro afirmações do filósofo francês Léon Denis: “Por templo, o Universo. Por altar, a consciência. Por imagem, Deus. Por lei, o amor”. Entretanto, sua for- mação religiosa básica é a espírita. E foi exatamente essa religião que o levou ao ecumenismo, vez que o Espiritismo tem como um dos seus postulados básicos o de que “fora do amor não há salvação”. A Doutrina Espírita, síntese da sabedoria dos séculos e dos milênios, pos- sui um tríplice aspecto: é ciência, filosofia e religião. No seu aspecto religioso, fundamenta-se na mensagem de Jesus, por Ele próprio sintetizada numa máxima ética de validade universal: “Tudo quan- to, pois, quereis que os homens vos façam, assim fazei-o vós também a eles porque esta é a Lei e os Profetas.” (Mt. 7, 12) Em verdade, isto é amor, e amor na expressão mais sublime desse sentimento. Por tratar-se de um livro quase todo baseado em princípios espíritas, somente deve ser lido por pessoas sem preconceitos, abertas ao novo, que realmente “pensam para saber”; pessoas não satisfeitas, em caráter absoluto, com as respostas que as suas crenças, sistemas e ideologias têm dado aos magnos problemas do existir humano, e do Além-túmulo. Como seu autor, desaconselho a sua leitura a todos os profitentes orto- doxos de qualquer religião. Que o leiam os que têm fome e sede da Verdade que liberta; os que anseiam conhecer como vivem os Espíritos no outro lado da Vida; os que possuem uma fé fundamentada no raciocínio; em suma, os inquietos por respostas mais plausíveis sobre o futuro eterno do espírito humano. Asseguro a esses últimos que o livro que irão ler valerá como uma “gi- 24 25
  • 13. nástica do espírito”2 expressão que tomo de empréstimo do autor espiritual André Luiz, e muito os ajudará nos seus primeiros passos, após a transição inelutável para a Vida Espiritual. Trata-se de um livro sobre a morte, mas que, paradoxalmente, só trata da Vida, da Vida Plena e Abundante que, segundo as promessas de Jesus, os que “morrem” haverão de encontrar quando deixarem, aqui, bem enterrados, seus corpos de carne, envoltórios grosseiros da individualidade imortal. A proposta do autor visa levar todos os seres humanos a encarar a mor- te com naturalidade, de tal sorte que medos e pavores restem vencidos so- bre essa “passagem” tão natural para novas e mais autênticas dimensões de Vida. E, ao encarar assim a morte como prenúncio da verdadeira Vida, o autor pretende estimular a todos que vivam intensamente o seu dia a dia, na cer- teza de que um futuro de paz e de alegria, no amanhã, depende de um hoje bem vivido, dentro dos princípios sacrossantos da ética cristã, nos braços da Lei de Deus! • O Autor 2 Francisco Cândido Xavier Espírito André Luiz, Os mensageiros, p. 120. II Antes da Morte 26 27
  • 14. 3 Considerações Gerais Sobre a Morte e o Morrer Na Natureza existem milhões de seres vivos, numa versátil e imensa va- riedade. Os seres vivos têm suas características próprias, bem como suas atividades básicas: nascem, crescem, respiram, alimentam-se, excretam, procriam e morrem. Tais seres, para que possam continuar vivos, integram-se a outros seres – os não vivos – e dessa integração resulta o milagre da plenitude da Vida. Os seres vivos não vivem para sempre. Todos, sem exceção, fatalmente, morrerão, um dia. Aliás – ressalte-se – esta é uma de suas características bási- cas. E, embora possa parecer uma tautologia, seres vivos só morrem porque estão vivos. Minerais não morrem. Também nunca tiveram a experiência da Vida. O ser humano é um ser vivo e, portanto, um ser que morre. Os corpos dos seres vivos, inclusive os dos seres humanos, são formados pelas substâncias minerais, espalhadas no solo do mundo. No livro “Gênesis”, o primeiro da Bíblia sagrada, atribuído a Moisés, está escrito: “E então for- mou o Senhor Deus o homem do pó da terra, e lhe soprou nas narinas o fôlego da Vida, e o homem passou a ser alma vivente!” (Gen. 2, 7) Nada mais verdadeiro. Por ocasião da morte, pela decomposição, todas as substâncias minerais que constituíam os corpos dos seres vivos, inclusive os humanos, retornam à Natureza para dar Vida a outros seres. Conseqüentemente, é a morte que torna possível a continuidade da Vida. Nascer e morrer, portanto, são os acontecimentos mais naturais, dentro do viver. E a morte não é um fenômeno exterior, mas um acontecimento imanente aos seres vivos, presente, a todo instante, no existir humano. No rico cancioneiro popular do nosso país, há uma música de autoria de Alberto Luiz, interpretada por Moacir Franco, onde ele afirma em dois dos 28 29
  • 15. seus versos: “Só se vive mesmo nove meses… pois o resto, amiga, a gente morre…”3 E, em verdade, o ser humano começa a morrer no dia em que vê, pela primeira vez, a luz da Vida. Conseqüentemente, deveria, desde cedo, aprender a conviver, diuturnamente, com a morte, aceitando-a com natura- lidade, como um fato indispensável ao prosseguimento da Vida. Por que, então, o medo ou o quase pavor da morte na maior parte dos seres humanos? Por que a rejeição ou a negação desse acontecimento, espe- cialmente no mundo ocidental? Religiões prometem o Paraíso aos bons, aos nobres, aos limpos de co- ração, mas todos eles, geralmente, resistem em aceitar o aniquilamento do corpo, com naturalidade, mesmo que um céu de beatitudes os esteja aguar- dando. Por quê? Jesus veio ao mundo para eliminar, definitivamente, o medo da morte e do morrer. A saga do Cristianismo tem o seu início com um túmulo vazio — “Ele não está aqui. Ressuscitou, como havia dito. Vinde ver onde Ele jazia” (Lc. 24, 5). Foram palavras de um varão, vestido de branco, anjo dos céus, di- rigidas a três santas mulheres que, num domingo de luz, foram à tumba de Jesus, levando-lhe aromas e ungüentos para embalsamá-lo. Paulo de Tarso, o arauto do Cristianismo nascente, disse em uma de suas cartas: “— O último inimigo a vencer é a morte…” (I Cor. 15, 26) Em verdade, aquele que venceu a morte, passa a melhor saborear a Vida, degustando- a muito mais intensamente. Por isso mesmo, a realidade da morte deveria despojar-se de suas características tétricas e apavorantes, para se constituir uma fonte de crescimento integral do ser humano. Como dissemos, linhas atrás, os ocidentais, ao contrário dos povos do Oriente, têm deixado em aberto o problema da morte. A cultura do Ocidente, pragmática e materialista, mais voltada para a ânsia incontida do “ter mais” do que para a busca do “ser mais”, prefere negar a morte, evitando qualquer referência a seu respeito. Até médicos que lidam, diariamente, com a morte e o morrer, viram as costas para o problema, e quando, dentro de um hospital, um paciente expira em uma mesa de cirurgia ou mesmo de morte natural, eles evitam, 3 Moacir Franco, ‘Balada n.º 7’, Aquelas antigas, letra de Alberto Luiz e música de Moacir Franco. por todos os meios, contatos mais demorados com o corpo sem Vida. Nos nosocômios, há os encarregados de, imediatamente, após a morte do pa- ciente, fazer “desaparecer” o cadáver, através de compartimentos especiais, adredemente projetados pelos arquitetos, a fim de que os outros doentes, ou mesmo os serventuários, não presenciem o acontecido. A preocupação central dos que integram a equipe hospitalar é a de mer- gulhar o fato no bojo do esquecimento. Querem levar as pessoas presentes ou envolvidas a se absorverem com outras atividades, a fim de “esquecerem” que alguém morreu, deixando o rol dos vivos para penetrar nos umbrais do Além-túmulo. É a rejeição mais feroz, a recusa mais flagrante do “morrer”, semelhante a uma atitude muito curiosa, própria do avestruz que, ante a perseguição ou o perigo iminente, afunda a sua cabeça dentro de um buraco, achando que, assim, pode se livrar da ameaça que paira sobre ele. Ledo engano! Mais dia, menos dia, a morte atinge a todos, sem exceção, e de nada adianta enganar-se a si mesmo, buscando evasivas para esse fato inevitável a todo ser vivo. No Ocidente, insistimos, a morte é, ainda, um tabu. Evita-se falar dela aos que estão com doenças incuráveis e terminais. Médicos e familiares fa- zem os maiores arrodeios para não tratarem do assunto com os “desengana- dos”, e isto por um ato de “caridade” para com os enfermos incuráveis, a fim de que, iludidos, possam eles “desfrutar” os últimos dias de suas existências, mesmo com uma péssima qualidade de Vida. Sempre a rejeição e a recusa em aceitar uma ocorrência que, desde o nas- cimento, acompanha o ser humano em todas as fases de sua existência. O Dr. Evaldo A. D’Assumpção, professor de Ética Profissional da PUC, de Minas Gerais, em excelente artigo publicado na revista Diálogo, o qual me tem servido de inspiração para a redação do presente texto, diz, a certa altura do seu trabalho: Enfrentar a morte de uma pessoa é confrontar-se com a realidade de sua própria morte, pois a cada ser humano que morre, eu também morro um pouco com ele, e, na medida em que eu negar a morte de uma pessoa, estarei criando a minha própria imortalidade. Se um ser humano igual a mim não morrer, ficará a certeza de que eu 30 31
  • 16. também não morrerei. (Evaldo A. D’Assumpção, ‘Tanatologia e o Doente Terminal’, Diálogo médico, 10 (2): pp. 22–36, 1984) Na cultura oriental, a morte não é encarada como uma megera de manto negro, portadora de uma foice e caminhando pelo mundo em sua faina de segadora de Vidas. Nessa cultura e em outras, a morte é algo tão natural que, por vezes, chega a ser até encarada com descontração e alegria. Antológica é a pequena estória integrante do filme Sonhos, de Akira Kurosawa, o grande e genial cineasta japonês, retratando a morte de um camponês, cujo fére- tro é conduzido com regozijo, ao som de músicas e danças, ao seu último destino. Na cultura ocidental, a morte tem tudo a ver com tristeza, revolta, dor, perda irreparável, desolação e luto. Em suma, algo trágico, terrível, macabro e até repugnante. Onde a morte acontece, aqui no Ocidente, as crianças são, imediatamente, afastadas das casas ou locais onde ocorreu o óbito e, quando, na sua curiosidade natural, indagam sobre o acontecido, recebem respostas evasivas e até mentirosas, confirmando a tese da recusa e da rejeição. As cerimônias fúnebres, por sua vez, retratam, com fidelidade, o horror que o homem ocidental tem à morte e ao morrer. Lágrimas inestancáveis, olheiras fundas, ataques histéricos, gritos lancinantes, beijos sucessivos nos cadáveres e até a ministração de drogas estupefacientes aos familiares do morto, a pretexto de mantê-los calmos e “desligados”. Acrescente-se a tudo isto, a busca de uma pretensa “imortalidade” pelos integrantes das Academias de Letras, e a ânsia de “imortalizar” os defuntos com a construção de imponentes mausoléus em pedra granito ou em már- more, materiais de durabilidade quase indefinida. Por que tanto horror a um fato tão presente no âmago da Vida? No exces- sivo apego à existência material reside, no nosso entender, a causa principal da rejeição à morte. Pessoas ricas e abastadas, gozadoras da Vida, com os seus bolsos cheios de dinheiro, amantes dos prazeres da mesa e do sexo, detentores de bens materiais em abundância, não querem, nem de longe, pensar em trocar tudo isto pelo “desconhecido”. E, mesmo pertencentes às fileiras das religiões cristãs, não cogitam de permutar essa Vida prazerosa por outra que se lhes afigura um lusco-fusco impreciso, um mistério insondável, cercado de mil incógnitas e interrogações… Para os “apegados” a esta Vida, não há opção possível entre “viver e mor- rer”. Mergulhados no mais ferrenho materialismo, vêem a morte como a ex- tinção de todas as emoções e prazeres proporcionados pela Vida da matéria. A quase unanimidade desses sibaritas gostaria de viver a Eternidade aqui mesmo, sendo o seu céu, o próprio inferno pintado pelas teologias tradi- cionais. Todos os pecados seriam, então, permitidos e a ausência de Deus não os inibiria de revelar a plenitude de seus instintos, na prática de todas as misérias morais. Neste mundo, ninguém, a rigor, é proprietário de nada. Todos os bens são concedidos ao ser humano a título de empréstimo, por um determinado lapso de tempo. Vão passando de umas para outras mãos, numa silenciosa lição de desapego a todos os caminhantes da Vida. No mesmo artigo acima mencionado, lê-se esta feliz colocação do seu autor: A Natureza não se dobra às pessoas. As posições, os bens materiais se esvaem como areia por entre os dedos que se fecham para dominá-los. A morte não se importa com nossas pretensões. Ela nos tira as pessoas que pretendíamos controlar e a nós mesmos dos cargos e posições que pretendíamos manter. Daí, ante essa realidade terrível que tudo devora e nada respeita, é preferível a negação, a rejeição, a ojeriza à morte. (Evaldo A. D’Assumpção, ‘Tanatologia e o Doente Terminal’, Diálogo mé- dico, 10 (2): pp. 22–36, 1984) Existencialistas contemporâneos consideram situações privilegiadas aquelas em que está presente a ameaça imprevista da morte ou o perigo iminente de Vida. Nessas ocasiões, como num passe de mágica, descobre-se que se está vivo, e esse reencontro com o viver é considerado pelos filósofos da existên- cia, altamente benéfico para o ser humano, conduzindo-o, por vezes, a uma reformulação completa de sua Vida. Pessoas que morreram clinicamente ou que escaparam de graves aciden- tes, tendo perdido a consciência por lapsos variáveis de tempo, dão depoi- mentos de que esse fato alterou, profundamente, a sua tábua de valores. Daí por diante, passaram a vivenciar uma nova e salutar filosofia de Vida. 32 33
  • 17. E, mais uma vez, temos de reconhecer que, também nesse sentido, sem qualquer conotação religiosa, a Vida emerge, de uma forma inesperada, do bojo escuro da morte. Nesses casos, a Vida passa a ter um novo sentido, nes- te mundo. A pessoa deixa de sentir-se “materialmente” imortal, atingindo toda a contingência, fragilidade e efemeridade do viver. Conviver, conscientemente, com a morte, é profundamente benéfico para o ser humano. É encarar a Vida numa dimensão muito mais rica, en- contrando, numa hora, milênios de Vida interior. Em suma, “é existir por minutos e segundos numa dimensão de Eternidade!”, na expressão feliz do Dr. Ivo Pitanguy, em recente entrevista à televisão brasileira. A perspectiva de morrer leva o ser humano a tentar responder, satisfa- toriamente, a esta singular pergunta: — Por que existo? Por que e para que estou neste mundo? Sem uma resposta cabal a essas indagações, o viver torna-se uma caminhada louca e desvairada, sem rumo, sem destino. Que bom, quando a morte ou a perspectiva de morrer ajuda o ser humano, nesse reencontro decisivo com o real sentido de sua própria Vida?! Todas as religiões primam em apontar o crescimento moral e espiritual do ser humano como o objetivo maior da existência. Crescer, nesse sentido, significa evoluir, hierarquizar valores, optando pelos espirituais sem, entre- tanto, qualquer desprezo maniqueísta pelos materiais. Muito poética e real a exclamação do Cristo, no Sermão da Montanha: Ah! Homens de pouca fé, não andeis ansiosos pela vossa Vida, quanto ao que ha- veis de comer e beber. Nem pelo vosso corpo, quanto ao que haveis de vestir. Não é a Vida mais do que o alimento, e o corpo mais do que as vestes? Observai as aves do céu: não semeiam, não colhem, nem ajuntam em celeiros, contudo, vos- so Pai Celeste as sustenta. (…) E por que andais ansiosos quanto ao vestuário? Considerai como crescem os lírios do campo, eles não trabalham nem fiam. Eu, contudo, vos afirmo que nem Salomão, em toda a sua glória, se vestiu como qual- quer deles. (…) Buscai, pois, em primeiro lugar, o Reino de Deus e a Sua Justiça e todas estas coisas vos serão dadas por misericórdia e de acréscimo. (Mt. 6, 25-33) A morte deveria ser para o homem o coroamento final de um processo evolutivo de hierarquização de valores e teria o seu início com o desper- tar da consciência para o que, de fato, é valioso, nesta Vida. Tal processo prosseguiria durante toda a existência até o seu termo. Felizes – para citar, mais uma vez, o Cristo – os que tiveram a felicidade de, nessa caminhada, “ajuntar tesouros nos céus” (Mt. 6, 20), sendo que esse Reino Celeste segundo, ainda, os Seus ensinamentos, reside na interioridade do ser humano. Jesus revela-se o fundador de uma nova religião. Não queremos, aqui, re- ferir-nos ao “Cristianismo” – criação humana – nem a nenhum outro “ismo” derivado da mensagem cristã. A Boa Nova que o Cristo veio trazer ao mundo foi a Religião do Amor: amor a Deus, amor ao irmão de humanidade, amor aos bons, amor aos maus, aos justos, aos injustos, amor em todas as suas múltiplas faces, única condi- ção, para Jesus, de o ser humano crescer e tornar-se, um dia, “um com Ele e com o próprio Deus” que, ainda segundo Jesus, é o próprio Amor. Este é o verdadeiro crescimento que deveremos todos buscar, nesta Vida. Somente assim criaremos, aqui mesmo, o nosso céu. Passaremos, então, a viver, no contigente, a Vida Eterna em que já estamos mergulhados e que continuaremos a desfrutar depois da morte. Diante dessa concepção maior de uma Vida Eterna, já possível de ser experimentada dentro do efêmero e do contingente, acaba-se, por inteiro, todo o pavor da morte! Tudo se esvai como a sombra diante da luz, como o mal diante do bem, como a tempestade, ante a bonança que a sucede. Eis porque, crescer em amor e sabedoria significa vencer a morte e passar a viver, por antecipação, a Vida Abundante das promessas do Senhor. Então, o que passa a importar mesmo, em nosso viver, não é a quanti- dade dos anos vividos, mas a qualidade desses anos. Nesse sentido, uma criança ou um jovem, arrebatado pela morte no verdor dos anos, pode ter tido uma existência muito mais fecunda do que um velho de noventa anos, se este resumiu todo o seu viver no usufruto dos gozos fugazes que a Vida carnal proporciona. Há entes humanos que, à semelhança dos seres inferiores da criação, “nascem, crescem, respiram, comem, bebem, procriam e morrem…” e nisto e apenas nisto, resumiu-se o carreiro de suas vidas… O grande poeta português Fernando Pessoa oferece-nos, com o seu gê- nio e a sua sensibilidade acutíssima, uma página de luz acerca da morte e do morrer. Com ela, concluiremos estas considerações: 34 35
  • 18. Nem tudo é dia de Sol! E a chuva, quando falta muito, pede-se. Por isso, tomo a infelicidade como a felicidade. Naturalmente. Como quem não estranha que haja montanhas e planícies E que haja rochedos e ervas. O que é preciso é ser-se natural e calmo… Sentir como quem olha… Pensar como quem anda… E quando se vai morrer, lembrar-se que o dia também morre, E que o poente é belo… E é bela a noite que fica… 4 Da Morte Para a Vida… Da Vida Para a Morte… Lemos no Evangelho de Mateus que, certa feita, um dos seguidores de Jesus fez-lhe a seguinte ponderação: “— Senhor, permite que antes de seguir-te eu vá, primeiro, sepultar meu pai”, ao que o Cristo respondeu: “— Segue-me! E deixa aos mortos o cuidado de sepultar seus próprios mortos!” (Mt. 8, 21-22) Em outra ocasião, afirmou Jesus: “— Eu vim para que todos tenham Vida e a tenham em abundância.” (Jo. 10, 10) No primeiro texto, o Cristo chamou de “mortos” aos vivos deste mun- do e, no segundo, ao afirmar que veio trazer a Vida, implicitamente, mais uma vez, considerou “mortos” muitos dos que peregrinam na superfície da Terra. Segundo o Apóstolo Paulo, com a queda do espírito em sua trajetória evolutiva, “entrou o pecado no nosso mundo e, com o pecado, a morte”. (Rom. 5, 12) Por conseguinte, mortos, neste mundo, estão todos os que não crêem na alma e na sua imortalidade. Mortos são os que jazem mergulhados no abismo do erro e do pecado. Mortos são os apegados, excessivamente, aos bens materiais, pensando, enganosamente, que tudo possuem quando, na realidade, eles é que são os “possuídos…” pelo que possuem. Mortos, em suma, estão os que caminham pelo mundo sem divisar um ponto de chega- da em Deus e, conseqüentemente, sem norte, sem direção. Entretanto, parafraseando o texto bíblico, “Deus não quer a morte do pecador, mas que ele se converta e viva!” (II Pe. 3, 9) Foi o próprio Cristo quem afirmou, ao contar a parábola da ovelha desgarrada: “— Haverá maior júbilo no céu por um pecador que se arrependa do que por noventa e nove que não necessitem de arrependimento.” (Lc. 15, 7) E isto soa, coerentemente, 36 37
  • 19. com toda a Sua mensagem, que é dirigida, em primeiro lugar, aos “doentes” e não aos “sãos”. Estes últimos não necessitam de médico… Conhecer o Cristo, mergulhar fundo em Sua mensagem, vivenciar os Seus divinos ensinamentos, é passar da morte à Vida e, já neste mundo, pre- ludiar a ventura celeste. Morrer com o Cristo é ressuscitar para a Vida verdadeira que estua, em promessas de luz, na gloriosa imortalidade! É voltar à Pátria do Espírito! É retornar ao paraíso perdido… Conseqüentemente, as palavras mais adequadas para o fenômeno mor- te são: “passagem”, “transição”, “mudança”. Com Jesus, “passaremos” da morte para a Vida. Mudaremos de residência. Trocaremos de vestuário, permutando os farrapos perecíveis do corpo carnal pela “veste nupcial” da incorruptibilidade. Nesta Vida, semeamos. Na outra, colheremos. Por vezes, aqui mesmo, já segamos o que plantamos. Entretanto, na Vida Maior é que as contas nos serão pedidas mais rigorosamente. Por isso, o retorno à Pátria Espiritual po- derá trazer-nos grandes alegrias e, também, enormes frustrações. Os descrentes – agnósticos, materialistas e ateus – se foram bons, neste mundo, ao despertarem no outro e comprovarem a continuidade da Vida, reformularão, aos poucos, seus conceitos negativistas. Serão tratados com muita compreensão, consoante a palavra evangélica de que “aquele que não soube a vontade de Deus e fez coisas dignas de repreensão, levará poucos açoites…” (Lc. 12,48) Todavia, terão de recomeçar, nos Planos Espirituais, um longo e paciente aprendizado acerca das Leis da Vida. Se foram maus, sofre- rão, atrozmente, em regiões sombrias e inferiores, até despertarem para os valores superiores do espírito. Quanto aos que, aqui, na Terra, sempre acreditaram na continuidade da Vida e que, também, foram bons, ao despertarem, em outras dimensões da existência, sentir-se-ão “em casa”. Assim como, ao nascermos, há sempre alguém por perto para testemunhar a nossa entrada na luz desta Vida, do mesmo modo, os que nos antecederam na “grande viagem” – pais, mães, pa- rentes e amigos – estarão a nossa espera no outro lado. E pelo nosso bom ou mau desempenho, na “escola do mundo”, receber-nos-ão, festivamente, ou plenos de compaixão, no caso de havermos estacionado na evolução por nossa desídia e deserção dos deveres capitais. Na Vida além da morte valem tão somente os “tesouros da alma” (Mt. 6, 20), isto é, as aquisições morais e espirituais que tenhamos feito, o “novo nascimento”, traduzido, neste mundo, numa Vida de amor a nós mesmos e aos nossos semelhantes. E quando nos referimos ao amor a nós mesmos, recomendado pelo pró- prio Cristo, está claro que não queremos identificar qualquer tipo de ego- centrismo exacerbado, mas sim o respeito que devemos ter pelo nosso cor- po – “o templo do espírito” (I Cor. 6, 19) –, pela nossa Vida, que deve ser toda consagrada a realizações nobres, numa valorização, em todos os sentidos, da grande oportunidade que Deus, em Sua infinita misericórdia, nos concedeu, de uma reencarnação terrena. Disse o Cristo: “Se o grão de trigo não cair em terra e morrer, não dará frutos, mas, se morrer, dará muitos frutos.” (Jo. 12, 24) Aludia o Senhor, de forma premonitória, a Sua morte e ressurreição; todavia, assim como Ele ressuscitou, todos nós ressuscitaremos, um dia, para a Vida Eterna. Encaremos, pois, a morte, com destemor, entusiasmo e até com alegria. Será ela que nos abrirá as portas da Eternidade! Da Vida também se pode retornar à morte. A volta a este mundo, pelas por- tas da reencarnação, é uma “morte” para a alma. Espíritos de mediana evolução, já despertos para as realidades da Vida Espiritual, nela engajados em múltiplas atividades, com um círculo bem am- plo de irmãos formando a sua família espiritual, sofrem, e muito, antes da retomada de um novo corpo físico. É que a Vida livre do espírito constitui uma fonte permanente de inefável prazer. Lá, as percepções são muito mais dilatadas. A sensibilidade, apuradíssima. Permutar essa Vida verdadeira pela prisão da carne, é “morrer”, na sua mais lídima expressão. Reencarnam os que ainda não saldaram os seus compromissos para com o nosso mundo e, mais cedo ou mais tarde, têm de a ele retornar, a fim de quitarem débitos perante a Lei. Erros cometidos na Terra têm de ser repara- dos aqui mesmo. Faltas praticadas contra seres humanos têm de ser saldadas em contato com a humanidade terrestre. Após o despertar no outro lado da Vida, permanece o espírito, por um período de tempo variável, naqueles planos compatíveis com o seu nível evolutivo. Um dia, chega o momento de analisar o seu “deve” e o seu “haver” 38 39
  • 20. perante a Lei. Geralmente, pesa mais o débito do que o crédito e, por conta disto, pede-se uma nova oportunidade de retornar à Terra. Muitas vacilações, nessa hora, estarão presentes ao espírito reencarnante. Há um medo real de recair nas mesmas faltas cometidas em passadas exis- tências. Há receios, bem fundados, de que o mergulho no escafandro de carne, leve-os a esquecer compromissos assumidos nos Planos Espirituais, e muitos, por isso mesmo, ficam adiando, por tempo indeterminado, a sua volta à esfera física. Entretanto, não obstante essas protelações, o dia do retorno, fatalmente, chegará e o espírito terá de retomar o indumento carnal com uma destas três finalidades: 1) expiar faltas cometidas em reencarnações pregressas; 2) passar pelas mais variadas provas, de cujo sucesso vai depender o seu futuro espiritual; e 3) desempenhar as mais diversificadas missões, de maior ou de menor relevo, em prol da construção de um mundo melhor e mais feliz. Às vezes, dentro da programação reencarnatória de cada um, muitas dessas últimas tarefas estão mescladas, também, com provas e expiações. Quanto aos Espíritos atrasados, ainda involuídos, com grandes débitos perante a Lei, voltam à carne, automaticamente, sem qualquer direito de opinar sobre os seus novos projetos de Vida. E que a liberdade somente cresce na proporção da evolução conquistada. Despedir-se de parentes, amigos, instrutores espirituais, companheiros de trabalho; mergulhar na inconsciência, por um certo número de anos, nos primeiros tempos da infância carnal; mudar de envoltório, revestindo-se de um corpo grosseiro e denso; perder a antiga apresentação, assumindo outra que lhe será inteiramente desconhecida, porque dependente de fatores cár- micos e hereditários; deixar o ambiente espiritual a que já se adaptara com- pletamente; renunciar a todos os bens espirituais que já reunira no outro lado; em suma, reduzir percepções e sensibilidade, sendo o seu amanhã uma interrogação… isto é reencarnar, isto é retomar à experiência terrestre, ver de novo a luz deste mundo… e é, também, “morrer” para a Vida Espiritual. E, de resto, mais uma vez, Vida e morte, como diz Pietro Ubaldi, “são dois contrários que se compensam, dois impulsos que resultam em equilí- brio, duas fases complementares de um mesmo ciclo”.4 4 Pietro Ubaldi, A grande síntese, p. 286. E a Vida na matéria torna-se, assim, uma morte para o espírito. • 40 41
  • 21. 5 À Espera da Morte – O Doente Terminal Quem quer que escreva sobre a morte e o morrer, na atualidade, não poderá deixar de fazer referência aos estudos de uma notável psiquia- tra suíça, radicada nos Estados Unidos – Dra. Elisabeth Kübler-Ross.5 Suas pesquisas, nessa área, deram origem a uma nova ciência: a Tanatologia. Lidando, por muito tempo, com doentes terminais, ao lado de enfermei- ros, religiosos e médicos, essa pesquisadora chegou a conclusões que redun- daram em grandes benefícios para os próprios doentes. Estes passaram a ser melhor conhecidos em sua interioridade, o que lhes proporcionou novas e melhores formas de assistência. Tais conclusões são, além de interessantes, deveras surpreendentes. Pacientes terminais desenganados, embora não pareçam à primeira vista, têm plena consciência da dimensão de suas enfermidades. Sentem uma vontade íntima de conversar abertamente sobre os seus males com aqueles que os rodeiam: a equipe médica, bem como parentes e amigos. Entretanto, como aqueles que deles se aproximam fecham-se a esse respeito, eles, embo- ra conscientes de que estão a um passo da morte, silenciam. Muitos desses doentes, diante do silêncio e das palavras de conforto e otimismo dos amigos e familiares, não abordam, com eles, o quadro real de suas doenças, tão somente para não fazê-los sofrer (?). E, diante da triste- za, da aflição e, até, do desespero dos que deles se aproximam, chegam ao ponto de confortá-los, mentindo sobre a gravidade do seu estado de saúde. 5 Elisabeth Kübler-Ross, psiquiatra suíça, radicada nos Estados Unidos. Em 1960 deu início a um trabalho com doentes terminais que viria dar origem a uma nova ciência: a Tanatologia. É autora de livros, hoje, traduzidos em várias línguas, três dos quais para o português: Morte, estágio final da evolução, Sobre a morte e o morrer e A roda da eternidade, os dois primeiros publicados pela Editora Record e o último pela Editora Sextante. 42 43
  • 22. Invertem-se, assim, os papéis, e aquele que deveria receber consolo e alívio, passa a ser quem conforta e desoprime. As conclusões da Dra. Elisabeth Kübler-Ross foram muito importantes para a adoção de uma nova metodologia no trato com pacientes terminais. Uma abordagem clara, transparente, do quadro real das enfermidades, foi introduzida, em nada alterando a serenidade desses pacientes, ante o pre- núncio da morte. O doente terminal, via de regra, intui que vai morrer e, depois de um certo tempo, aceita esse fato como um alívio, diante do desconforto propor- cionado pelas enfermidades incuráveis. Eis porque, médicos e parentes que mentem para confortar esses doentes, são alvos, por vezes, até de uma espé- cie de zombaria silenciosa por parte dos próprios enfermos que já “sabem” toda a verdade acerca da evolução inelutável de suas enfermidades. A Dra. Elisabeth Kübler-Ross assinala cinco fases por que passa, geral- mente, o doente desenganado, desde o momento em que intui ou lhe é re- velado que possui uma doença incurável e terminal. Analisemo-las: A primeira é a da “negação” da enfermidade. Nessa fase, o doente recusa, por todos os meios, que esteja com uma doença incurável, precursora da morte. Prefere, então, enganar-se a si mesmo, achando que houve um erro de diagnóstico e quejandos. Recorre a todo tipo de tratamento, mesmo que seja com charlatães e feiticeiros, a fim de alimentar a esperança de que não é verdade que os seus dias estejam contados. Nessa fase, o paciente terminal necessita de muito apoio médico e ajuda familiar. Negando a sua enfermidade e, numa expectativa esperançosa de cura, ele pode eximir-se de tomar a medicação que lhe foi prescrita pelos médicos, e esta lhe dará melhor qualidade de Vida nos estágios progressivos da doença insidiosa e fatal. A segunda fase é a da “raiva” ou “indignação”. O enfermo revolta-se con- tra tudo e contra todos. Contra médicos que diagnosticaram a sua enfermi- dade ou que a insinuaram, utilizando-se de eufemismos. Contra os familia- res e amigos que o procuram para confortá-lo. A sua revolta vai até contra Deus, se ele não possui uma sólida fé religiosa. E toda essa revolta reside no fato de a doença fatal tê-lo atingido e não a outra pessoa. Muito apoio, amor, paciência e compreensão necessita o doente, nesse estágio. Afinal de contas, o seu viver sofreu um violento choque e torna-se necessário algum tempo para que ele possa adaptar-se ao seu novo estado. A terceira fase é a da “negociação” ou “regateio”. Nesse estágio, o doente terminal promete tudo à equipe médica que o assiste, se ela conseguir a cura de sua enfermidade. A blasfêmia contra Deus é esquecida, dando lugar a “promessas” de todos os tipos, a santos de sua devoção ou não. Trata-se de uma espécie de “barganha” que o doente faz, à semelhança de um náufrago que procura se agarrar a qualquer coisa que lhe impeça o mergulho definiti- vo nas profundezas do desconhecido. A quarta fase é a da “compreensão gradativa”, também chamada de “in- teriorização da enfermidade”. Nesse estágio, começa a acontecer a com- preensão gradual do paciente acerca do seu estado. Tem início, então, um processo de interiorização do grave problema que está vivenciando. Ele já intui que o seu quadro patológico é, realmente inelutável e trata de ultimar providências para deixar resolvidos todos os problemas pendentes, antes de sua partida deste mundo. E isto ele faz com extrema frieza e disposição, sendo até impertinente com familiares e amigos que relutam em dar curso àquelas medidas por ele sugeridas e/ou planejadas. Trata-se de uma fase muito importante, porque, preparatória para a última que vem a seguir. Aqui, ele costuma fazer uma revisão de toda a sua Vida e, por vezes, mergulha num silêncio e num isolamento singulares, evitando visitas e mesmo a convivên- cia com outras pessoas, provocando a inquietação dos familiares. Esse é um estágio muito positivo, de preparação interior para o desfecho final. São momentos de reencontro do enfermo consigo mesmo, e se ele pos- sui um forte sentimento religioso, aproveitará a ocasião para uma tentativa de reconciliação com antigos inimigos ou simples desafetos e, também, para gestos de generosidade, adiados freqüentemente, no decurso de sua Vida. Segue-se a essa, a última fase – a de “aceitação”, em que se desenvolve, no doente terminal, uma grande confiança em si mesmo e onde ele se sente completamente preparado para viver os últimos instantes de sua existência, neste mundo. Todas as providências para o amanhã dos familiares foram tomadas. As tarefas inacabadas estão concluídas. As reconciliações foram tentadas ou concretizadas. Nada mais resta a fazer aqui. É aceitar a fatalidade e aguardar serenamente o lance final: a morte. 44 45
  • 23. Essa última fase nada tem de sofrida ou desoladora. Por isso mesmo, ela costuma surpreender os parentes próximos do doente. Antes, é uma atitude de profunda maturidade quando o ser humano como que “desperta” para a realidade inevitável de que “toda Vida”, na Terra, termina com a morte! Ele partirá agora, mas todos os que o cercam, sem exceção, bem assim toda a humanidade que lhe foi contemporânea, também deixará este mundo, hoje ou amanhã, pelas mesmas portas que ele vai atravessar brevemente. Nesse estágio, cabe apenas aos que o cercam serem solidários com o enfermo, mantendo junto a ele uma atmosfera de serenidade e equilíbrio diante do inevitável. Os que deixam esta Vida, nessa fase, realizam a passagem para o outro lado de uma forma tranqüila e feliz. Nos ataúdes, seus rostos parecem sorrir, no mergulho profundo num oceano de silêncio e de paz. Façamos, por último, uma reflexão mais profunda acerca dessas cinco fases por que passa o doente terminal, aplicando-as ao nosso viver diário. É perfeitamente possível a qualquer ser humano amadurecido, mesmo não possuindo uma robusta fé religiosa, nem sendo portador de qualquer doença terminal, começar a viver no seu “aqui e agora”, as cinco fases apon- tadas pela Dra. Elisabeth Kübler-Ross. Isto implica numa plena consciência de que todo o mundo vai morrer um dia. Por que, então, não começar, desde já, a vivenciar as cinco etapas mencionadas? Assim procedendo, o ser humano passará a conviver, diuturnamente, com a morte, o que vai significar um maior e mais saudável reencontro com a Vida. Cada minuto e cada segundo do seu existir será encarado como se fosse o último, e isto dará lugar a um autêntico e verdadeiro viver! Vivenciadas as cinco fases, no dia a dia, a morte estará vencida e a paz interior, definitivamente, conquistada. • 6 Experiências de Quase-morte Num livro sobre a morte e o morrer, cabem perfeitamente algumas bre- ves considerações acerca das pesquisas de um psiquiatra norte-ame- ricano, também Doutor em Filosofia – Dr. Raymond A. Moody Jr.6 – feitas com pessoas que sofreram a chamada “morte clínica”, ou que estiveram bem próximas da morte, em virtude de graves ferimentos em acidentes diversos. Nos declarados clinicamente mortos, o coração pára por segundos ou minutos, sem ocorrer, entretanto, a morte cerebral. Daí a possibili- dade do retorno à Vida, após processos sofisticados de reanimação ou ressuscitamento. Esse ilustre pesquisador, cujos trabalhos são, hoje, reconhecidos em todo o mundo, reuniu em dois livros – Vida depois da vida e Reflexões sobre vida depois da vida – depoimentos dessas pessoas que perderam a consciência e depois a retomaram. Comparando esses relatos, pôde ele traçar um perfil, tanto quanto fiel, do que se passou com todos aqueles que deixaram esta Vida, embora por momentos, para depois retomá-la, num símile aproxima- do da morte verdadeira. A “morte clínica” seria, assim, uma espécie de amostra da morte real. Daí o extraordinário valor das conclusões desse notável psiquiatra, por entrever, com as suas pesquisas, o que a alma vai encontrar “no outro lado”, após o decesso do corpo físico. As conclusões dessas pesquisas confirmam, de forma convincente, a tese da Doutrina Espírita e de algumas correntes evangélicas, de que a morte, a rigor, não existe, sendo tão somente uma “transição” ou uma “passagem”, em suma, uma crise repentina que redundará na transferência da individualida- de imortal para novas esferas de Vida. 6 Raymond A. Moody Jr., psiquiatra norte-americano e também Doutor em Filosofia. Autor de dois livros “best-sellers”: Vida depois da vida e Reflexões sobre vida depois da vida, ambos publicados no Brasil pela Editorial Nórdica. 46 47
  • 24. Por ser um homem de ciência, o Dr. Raymond A. Moody Jr. recolheu depoimentos de centenas de pessoas, procedentes dos mais diferentes países, filiadas a diversas religiões e possuidoras de níveis culturais bastante diferen- tes. Todos os relatos coincidem em vários pontos, segundo as conclusões desse pesquisador:7 Os que vivenciaram a “experiência de quase-morte” disseram ser muito difícil descrevê-la na linguagem comum. Foi algo sentido e vivido subjeti- vamente, impossibilitando o seu relato, dada a imperfeição e os limites da linguagem humana. O que lhes aconteceu – todos são unânimes em afirmar – foi uma vivência tão profunda e intensa que somente um grande silêncio seria capaz de exprimir. Entretanto, mesmo mergulhados num estado de quase inconsciência, todos foram capazes de lembrar de palavras, comen- tários e juízos emitidos pelos que lhes estavam perto ou em salas contíguas, onde os seus corpos se encontravam sendo objeto de ressuscitamento ou reanimação. Muitos, ao tentarem descrever o que sentiram fora do corpo físico, afir- maram ter experimentado estados muito agradáveis de quietude e alívio, que os estimulava a permanecer, no outro lado, sem desejo de retornar ao corpo da carne. A grande maioria ouviu os mais variados sons, uns muito agradáveis como música fina, suave, quase celestial. Outros, ouviram sinos e acordes semelhantes ao de harpas celestiais. Já outros, escutaram ruídos fortes, sons de campainhas e assobios cortantes, cuja natureza não podiam precisar com segurança. Os que passaram por esse transe, sentiram-se ainda como se tivessem sendo “sugados” através de um túnel escuro, em alta velocidade, experi- mentando uma sensação indefinível de “estar metade aqui e metade noutro lugar”,8 mas, depois dessa passagem, todos sentiram agradáveis sensações de euforia e liberdade. Nessa singular “experiência” quase todos se sentiram “fora do cor- po”, suspensos do solo a uma curta distância, de onde podiam observar, 7 Segue-se uma síntese, feita pelo autor, dos acontecimentos comuns nas experiências de morte segundo as conclusões do Dr. Raymond A. Moody Jr., relatadas em seu livro Vida depois da vida, pp. 26 e seg. 8 Idem, ibidem, p. 32. perfeitamente, seus corpos carnais deitados em leitos, em pedras de necro- tério, ou vagando sobre a água, nos casos de afogamento. Muitos assistiram, de cima, as tentativas bem sucedidas de reanimação de seus indumentos carnais, e a sensação que tinham era a de que estavam na posse de um outro corpo, em tudo semelhante ao de carne, mas de natureza sutil e imponderá- vel. Um dos entrevistados pelo Dr. Moody, tendo sofrido um grave acidente em que, inclusive, perdeu a maior parte da perna, assim descreveu, entre outras coisas, o que lhe aconteceu: “Eu sentia o meu corpo (o corpo espiritual) e estava inteiro. Sabia disso. Sentia- me inteiro e percebia que estava com todas as partes ali, embora não estivesse.” (Raymond A. Moody Jr., Vida depois da vida, p. 50) Os que viveram a “experiência” narraram, quase à unanimidade, o encontro com Espíritos de parentes, amigos ou mesmo desconhecidos, cuja disposi- ção era a de ajudá-los naquela situação. Doutras vezes, esses seres os avisa- vam de que ainda não era daquela vez que eles deixariam, definitivamente, o corpo de carne e que, por isso mesmo, deveriam retornar a este mundo. Eis um pequeno trecho de um depoimento dessa natureza registrado pelo Dr. Moody: — Percebi, naquele momento, minha avó e uma menina que eu tinha conhecido na escola (ambas já haviam morrido). Pareciam felizes. Senti que tinham vindo me proteger e me guiar. Era como se eu estivesse voltando para casa e eles estivessem lá para saudar-me com boas vindas. Nessa ocasião, tive a sensação de que tudo era luz e beleza. Foi um momento lindo e glorioso! (Idem, ibidem, p. 52) Um dos pontos mais comuns, considerado pelo próprio Dr. Moody como dos mais incríveis é o encontro com um “ser de luz”. A luz que desse ser se irradia não incomoda a vista, muito embora seja de um brilho incandescen- te. Desse ser – e todos foram unânimes em seus relatos – irradiava-se muito amor, sendo que esse sentimento não era expresso por palavras. Quem estava vivenciando a “experiência”, sentia-se atraído por esse “ser de luz” que se comunicava telepaticamente com o “morto”, formulando, em silêncio, indagações relacionadas com a qualidade de Vida levada por ele até 48 49
  • 25. aquele momento. Era como se fosse uma suave advertência sobre a impor- tância do existir humano, implicando em sérias responsabilidades de cresci- mento pessoal através do amor a todos os irmãos de humanidade. E o mais interessante era que esse “ser de luz” não acusava nem incriminava ninguém. Todos sentiam, vindos dessa “luz”, somente amor e compaixão. O fenômeno da visão retrospectiva da Vida, desde a primeira infância até o instante da singular “experiência”, foi, também, um ponto comum em todos os entrevistados. As lembranças aconteciam sempre de uma forma vertiginosa, numa percepção abrangente de toda a existência, desde os fatos menos importantes aos mais significativos. Tudo era relembrado com uma abundante riqueza de detalhes, induzindo a uma espécie de “auto-julgamen- to” da Vida levada até então. Geralmente, isto acontecia dentro de uma ordenação no tempo. Às vezes não. As imagens eram muito vivas, como num filme cinematográfico, em três dimensões. O “ser de luz” sempre estava presente a essa experiência reme- morativa, e todos foram acordes em expressar que, a partir daquela presença luminosa, é que se havia desencadeado todo o processo de revisão de vida. Em todos os entrevistados pelo Dr. Moody, sempre aparece um espaço- limite entre os dois planos – o material e o espiritual. Ele é descrito de várias maneiras, representando um último obstáculo a ser vencido. Um estado ge- ral de leveza e de liberdade foi também assinalado por todas essas pessoas e, quando pareciam estar fadadas a ultrapassar esse último obstáculo, eis que se sentiam arrastadas, impetuosamente, de volta aos seus corpos, “renascen- do”, assim, para a Vida que estivera prestes a extinguir-se. Todas as pessoas, envolvidas nessas “experiências” obviamente retorna- ram aos seus corpos, senão inexistiria qualquer registro. Entretanto, o que é mais interessante em tudo isto é o seguinte: quando a experiência atingia uma profundidade maior, com a quase ultrapassagem do último limite, as pessoas sentiam-se num estado geral de tamanha satisfação, paz e liberdade que, às vezes, resistiam, até, ao retorno à prisão do corpo. Segundo as con- clusões do Dr. Moody, isto sempre aconteceu àqueles que chegaram a ter contato com “o ser de luz”. Ele cita o depoimento de um homem que chegou a declarar: “— Eu não queria ter nunca saído da presença desse ser.”9 9 Raymond A. Moody Jr., Vida depois da vida, p. 73. Retornando à vida física, muitas pessoas disseram ao Dr. Moody que te- miam contar às pessoas do seu círculo íntimo o que lhes acontecera. Embora a “experiência” tivesse sido absolutamente real, nada tendo de alucinante ou fantasiosa, essas pessoas temiam serem alvo do ridículo pelos outros. Alguns receavam que as tomassem por desequilibradas mentais. Desse modo, mui- tos preferiram permanecer em silêncio acerca dos fatos que lhes acontece- ram, relatando-os, agora, ao Dr. Moody, estimuladas por testemunhos seme- lhantes. Uma das entrevistadas chegou a dizer: — Quando eu tentava contar a minha experiência, eles ouviam com interesse, mas depois eu descobria que ficavam dizendo: — Essa aí pirou mesmo! Quando desco- bri que, para eles, era tudo uma grande piada, parei de tentar comunicar qualquer coisa. (Raymond A. Moody Jr., Vida depois da vida, p. 80) Nos momentos de emancipação do espírito, todos foram capazes de fazer uma auto-avaliação de suas vidas, em termos do bem que estavam espalhan- do, ou não, em tomo dos seus passos. Todos como que submetiam os seus atos ao tribunal interior de suas consciências. Assim, ao retomarem os seus corpos, passaram a ver a Vida humana sob um novo prisma, retificando ca- minhos e alterando, substancialmente, a tábua de valores que, até então, ti- nha norteado o seu viver. Passaram a ter inclusive, depois de tão singular transe, uma nova visão da morte, perdendo qualquer receio do morrer. Evidentemente, essas pessoas não passaram a desejar a morte. Simplesmente, o “morrer” não lhes causava mais nenhum espanto ou pavor. Todos robusteceram a sua fé no além-vida e muitos que, por medo, nunca estavam presentes a cerimônias fúnebres, passaram a encarar os velórios com toda a naturalidade. Agora, tinham a certeza de que a sua individualidade era imortal e de que a morte verdadei- ra iria ser uma experiência, em tudo por tudo, semelhante àquela por que haviam passado. Por último, surgia a necessidade da confirmação desses relatos por pes- soas presentes nos ressuscitamentos ou nos graves acidentes. E isto foi per- feitamente possível, com o testemunho de pessoas que confirmaram em vá- rios pontos os relatos dos entrevistados. Muitos médicos ficaram estupefatos 50 51
  • 26. com os testemunhos dos “quase-mortos”. Vamos, aqui, transcrever um deles, dentre os mais interessantes narrados pelo Dr. Raymond A. Moody Jr.: — Quando eu acordei, depois do acidente, meu pai estava lá (…). Contei a ele quem tinha puxado o meu corpo para fora do prédio e até a cor das roupas que essa pessoa estava usando. Contei, ainda, como me tiraram de lá e, até, sobre todas as conversas que estavam ocorrendo naquela área. E meu pai me disse: — Bem! Sim! Essas coisas aconteceram de verdade! (Raymond A. Moody Jr., Vida depois da vida, p. 92) Os estudos e pesquisas do Dr. Raymond A. Moody Jr. ratificam o conteú- do de inúmeros relatos mediúnicos, documentados pela Doutrina Espírita, acerca dos fenômenos que envolvem a morte corporal e a entrada do espíri- to liberto nos planos de uma outra Vida. Todos os pontos coincidentes desses relatos de “experiências de quase- morte” são explicados pela Doutrina Espírita, e em sua maioria estão regis- trados em livros e mensagens mediúnicos, através de instrumentos da maior respeitabilidade, como Francisco Cândido Xavier e Yvonne do Amaral Pereira. Tentaremos fazer uma análise comparativa no próximo capítulo. • 7 Experiências de Quase-morte: um Enfoque Espírita Os Espíritos, ao tentarem descrever situações e paisagens de Além- túmulo, insistem sempre na grande dificuldade que encontram em traduzir, na linguagem humana, o que se passa “do lado de lá”. Como ser possível reduzir a três o que acontece em quatro ou mais dimensões? Como encontrar termos de comparação? Diante de tais dificuldades, eles utilizam-se de analogias e metáforas que resultam sempre imperfeitas, reduzindo-se, assim, a sombras o que acontece em plena luz, como no mito platônico da caverna. Mesmo em nosso mundo, poetas de hiper-sensibilidade sempre encon- traram a maior dificuldade em expressar verbalmente os seus “estalos” de inspiração que mais se assemelham a relâmpagos de contemplação extática da beleza. Isto, Augusto dos Anjos, poeta paraibano, traduziu, em poema antológico. No soneto A Idéia, diz ele nos tercetos finais: …vem (a idéia) do encéfalo absconso que a estringe e chega às cordas da laringe, pá- lida, tênue, muda, raquítica… Quebra a força centrípeta que a amarra e, finalmente, quase morta, esbarra, no molambo da língua paralítica… (Augusto dos Anjos, Eu e outras poesias, p. 61) Se, neste mundo, seres humanos encontram tais empeços na linguagem ver- bal, dá para aquilatar as dificuldades dos Espíritos e daqueles que visualiza- ram “o outro lado da Vida” nas “experiências de quase-morte”, para contar o que, efetivamente, viram por lá. Compreende-se. Livros e mensagens recebidos por médiuns idôneos narram que, por ocasião da morte, o espírito em processo de liberação, sente-se num estado deve- ras singular, vivendo uma Vida dupla: uma, na esfera física onde o corpo 52 53
  • 27. material está prestes a consumir-se; outra, na Esfera Espiritual, onde está penetrando, aos poucos, de volta a sua verdadeira morada. Nessas condições, a individualidade eterna, em processo de liberação, sente-se pertencente a dois mundos – o da matéria e o do espírito. Daí, po- der ouvir tudo quanto está ocorrendo em torno de seu corpo físico, como, por exemplo, vozes, opiniões, comentários, exclamações, prantos, etc. Enfermos graves, em estado de coma, ao retornarem, por instantes, à lu- cidez, costumam tecer comentários acerca do que estava acontecendo em torno dos seus leitos. Reproduzem com fidelidade, comentários feitos a res- peito deles. É que a morte somente se consuma quando o laço fluídico que une corpo e espírito é desfeito. Enquanto isto não ocorre, ainda é possível o retorno à Vida. As regiões superiores do Mundo Espiritual caracterizam-se por uma paz permanente. Humberto de Campos, no livro mediúnico Reportagens de além-túmulo, afirma ser “o bulício próprio dos homens e o silêncio próprio de Deus”.10 A calma que experimentaram todos os que estiveram “mortos”, por mo- mentos, representa uma pequena amostra do clima de serenidade e quietu- de das Esferas Espirituais mais altas, reflexo do céu interior que os Espíritos elevados construíram dentro de si mesmos. Sentem-se serenos e tranqüilos, “no outro lado”, os que, aqui, na Terra, já desfrutavam daquela imperturbável paz interior. “O Reino de Deus está dentro de cada um de vós”, disse Jesus. (Lc. 17, 21) Quanto à audiência de sons de múltipla natureza, no instante da morte, isto deve-se à imersão do espírito, em transe liberatório, numa espécie de dupli- cidade de Vida. Esses sons, ora são do próprio mundo material que a alma está dei- xando, ora do Mundo Espiritual, onde ela está ingressando. Assim como, neste mundo, há sons, luzes e cores dos mais variados matizes, o mesmo ocorre “no outro mundo”, onde esses fenômenos atingem as raias do ini- maginável. Daí, muitos dos que vislumbraram o Além, nas “experiências de 10 Francisco Cândido Xavier Espírito Humberto de Campos, Boa nova, p. 141. quase-morte”, poderem ouvir e ver sons e luzes cuja natureza não puderam precisar corretamente. Oportuno lembrar, aqui, como ilustração, o Apóstolo Paulo em sua se- gunda Epístola aos Coríntios: Conheço um homem em Cristo (deve ter sido ele mesmo; por modéstia, torna o re- lato impessoal) que, há catorze anos, foi arrebata do até ao terceiro céu, se no corpo ou fora do corpo, não sei, Deus o sabe. Sei que tal homem foi arrebatado ao Paraíso e lá ouviu ditos indizíveis os quais não é lícito ao homem referir. (II Cor. 2-4) Quase todos os que passaram pela “experiência de quase-morte” dizem ter sentido, nesse momento, uma sensação de “estarem sendo puxados através de uma espécie de espaço escuro”. Segundo o Dr. Raymond A. Moody Jr., esse espaço é descrito em múltiplas entrevistas, como “caverna, poço, buraco, cercado, funil, túnel, vácuo, vazio, bueiro, vale e cilindro”.11 Por ocasião da “morte verdadeira”, sensações semelhantes também po- dem acontecer. É que a morte, embora um fenômeno natural, não deixa de ser uma crise, isto é, um momento decisivo em que o espírito deixa um envoltório grosseiro de que se serviu por largo espaço de tempo – o corpo carnal – para assumir um outro, tênue e imponderável. Daí, as imagens uti- lizadas pelos que estiveram, por momentos, “no outro lado”, associando o instante da transição a “espaço escuro, vazio, vale, vácuo”, e, também, a “tú- nel, funil, bueiro e cilindro”.12 Todos esses termos têm perfeita analogia com “passagem entre dois pontos”. São sensações inusitadas, próprias do momen- to em que o espírito transpõe o plano da matéria grosseira para adentrar a outra Vida. Nesses momentos, o ser espiritual sente-se “sugado” para outras dimen- sões de Vida e, ao mesmo tempo, “puxa do” para o corpo físico, sensações que sugerem transição entre dois planos, fenômeno que, efetivamente, está se processando, em virtude do “cordão de prata” não se ter rompido ainda. 11 Raymond A. Moody Jr., Vida depois da vida, p. 30. 12 Idem, ibidem. 54 55
  • 28. A contemplação do corpo físico pela alma recém-liberta é fato muito co- mum nos casos de “morte verdadeira”. Nesse momento, a individualidade sente-se em duplicata e observa, em corpo espiritual, o indumento material, a certa distância, nos estertores da agonia, prenunciadora da libertação. Relato impressionante pela abundância de detalhes é o do espírito Irmão Jacob, pseudônimo de Frederico Figner, um dos diretores da Federação Espírita Brasileira, há cinco décadas atrás. Em livro psicografado pelo mé- dium Francisco Cândido Xavier, esse espírito descreve, com pormenores, como ocorreu a sua morte. Eis alguns trechos desse relato, onde ele fala so- bre a visão do seu corpo físico, confirmando, mais uma vez, tudo o que foi visualizado pelos que tiveram a “experiência de quase-morte”: Assombrado, vi-me em duplicata. (…) Fixei meu corpo a enrijecer-se, num misto de espanto e amargura. (…) A contemplação do corpo imóvel, não obstante agu- çar-me o propósito de observar e aprender, era-me aflitiva. O cadáver perturbava- me com as sugestões da morte. (…) Alongando o raio do meu olhar, verifiquei a existência de prateado fio ligando-me o novo organismo (o corpo espiritual) à cabeça imobilizada (do corpo material) (…) Eu seria o cadáver ou o cadáver seria eu? Por intermédio de que boca pretendia falar? Da que se fechara no corpo ou da que me servia agora? (Francisco Cândido Xavier e Espírito Irmão Jacob, Voltei, pp. 38–39) Depoimentos semelhantes a este são freqüentes em todos os relatos mediú- nicos de pessoas em processo de morte iminente. Espíritos amigos, Espíritos parentes que já se encontram nos Planos Espirituais, costumam vir receber os que estão deixando este mundo. Ninguém estará sozinho nessa hora. Pode acontecer que muitos não per- cebam a assistência que estão recebendo, em virtude do apego excessivo ao mundo que estão deixando, mas essa presença é fato sobejamente compro- vado e revelado nos comunicados mediúnicos. A sabedoria popular nos diz que quando o moribundo começa a ver e a chamar pelos que morreram, é que está bem próxima a sua partida desta para a outra Vida. Isto é uma grande verdade. Freqüentemente, dependendo do nível de evolução dos que estão morrendo, muitos desses Espíritos se dão a conhecer, conversam com o mo- ribundo, dirigindo-lhe palavras de conforto e de otimismo para tranqüilizá- los, naquele transe. Em outros casos, quando acontece “o sono da alma” e esta acorda em instituições da Espiritualidade, é muito comum ali se encontrarem Espíritos amigos e protetores, prontos para ajudá-la no seu despertar no berço da ou- tra Vida. Esse fenômeno é uma prova evidente de que as almas, no Além, não estão confinadas em determinados “lugares”. Elas habitam todo o es- paço cósmico, podendo transitar livremente em múltiplas atividades, como nas missões de amor, junto aos que estão deixando a Vida material. O que viria a ser um encontro com “um ser de luz”? Evidentemente que esse ser não é o Cristo. Trata-se de Espíritos luminosos, guias, anjos guardi- ães e protetores que vêm ao encontro dos que estão deixando este mundo, mormente daqueles que cumpriram a sua missão dentro dos ditames da Lei Divina. Pessoas que se iluminaram, aqui, na Terra, merecem ser recebidas, nos pórticos do Além, por seres, também, iluminados. A apresentação dos Espíritos superiores é sempre muito nobre e bela. Usam eles túnicas luminescentes de cores variadas, com belíssimas nuanças, e a sua presença sempre irradia amor e paz. Esses Espíritos, pelo seu porte e majestade, são, por vezes, confundidos com o Cristo pelos que estão às portas da Eternidade. Esses seres de luz são habitantes de esferas superiores, mas não desde- nham em descer aos planos inferiores para virem receber seus entes que- ridos, em especial os que venceram, galhardamente, na Terra as provas e expiações a que se submeteram. O fenômeno da recapitulação da existência vivida é um fato comum em todos casos de morte real e quando o decesso ocorre por causas naturais. Todos revêem a sua existência, desde a mais tenra infância até o instante final, com uma riqueza impressionante de pormenores. Nada escapa a esse registro extraordinário que se radica no corpo espiritual, verdadeiro arquivo da individualidade eterna: a alma humana. Como já tecemos considerações, alhures, em torno desse tópico, nos li- 56 57
  • 29. mitaremos, agora, a transcrever um extraordinário depoimento obtido, via mediúnica, acerca do singular fenômeno: Vi-me diante de tudo o que eu havia sonhado, arquitetado e realizado na Vida. Insignificantes idéias que emitira, tanto quanto meus atos mínimos, desfilavam, absolutamente precisos, ante meus olhos aflitos, como se me fossem revelados de roldão, por estranho poder, numa câmara ultra rápida, instalada dentro de mim. Transformara-se-me o pensamento num filme cinematográfico, misteriosa e ino- pinadamente desenrolado, a desdobrar-se, com espantosa elasticidade, para o seu criador assombrado que era eu mesmo. (Francisco Cândido Xavier e Espírito Irmão Jacob, Voltei, p. 31) No livro Obreiros da vida eterna, de autoria do espírito André Luiz, pela me- diunidade de Francisco Cândido Xavier, vamos encontrar uma referência a esse mesmo fenômeno, por ocasião da morte do personagem Dimas. Antes de cortar o cordão fluídico que ainda prendia o espírito ao corpo, o Assistente Jerônimo dirige-se à mãe do desencarnante que viera recebê-lo, nestes termos: “Por enquanto, repousará ele (Dimas) na contemplação do passado, que se lhe des- cortinará, em visão panorâmica, no campo interior.” (Francisco Cândido Xavier e Espírito André Luiz, Obreiros da vida eterna, p. 212) A grande maioria dos que tiveram a “experiência de quase-morte” retornou à Vida, porque não ultrapassou uma barreira por eles visualizada. Na “morte verdadeira”, esse limite é transposto. O “cordão de prata” que une o espírito ao corpo carnal é rompido definitivamente, e a alma alça vôo para a Esfera Espiritual compatível com o seu nível evolutivo. As sensações de paz, leveza e liberdade que os entrevistados do Dr. Raymond A. Moody Jr. experimentaram, constituem uma pálida e inex- pressiva amostra do que está reservado, de forma perene, às almas nobres e cristificadas que deixaram a Vida terrena. Transposta a “barreira”, o espírito não retornará mais ao corpo. A morte acontece… mas a Vida continua!… • 8 O Melhor Lugar Para Morrer Omelhor lugar para morrer é em casa, com a plena consciência do “mor- rer”, cercado do carinho e da assistência dos parentes, amigos e vizi- nhos, todos orando por aquele que está deixando este mundo. Jamais em leitos, por mais macios e sofisticados que sejam, de hospitais e uteís ou em “confortáveis” abrigos-depósitos para idosos. Era assim que se morria antigamente, mesmo no Ocidente, sendo o cor- po – vestimenta do espírito – velado, respeitosamente, nos lares onde ocor- ria o óbito. Era dali que o féretro saía para as necrópoles. O que vemos, agora, nos dias que correm? Exceção feita das pequenas cidades do interior, em 95% dos casos, morre- se em hospitais públicos e particulares. Ocorrido o decesso do corpo, é este imediatamente retirado dos nosocômios, de uma forma disfarçada. São as casas funerárias que se encarregam, por vezes, até de vestir ou de “maquiar” o morto, como é costume nos Estados Unidos da América, a fim de que o cadáver seja apresentado nas solenidades fúnebres que precedem o sepulta- mento ou cremação, com o melhor aspecto possível. Certa vez, anos atrás, estudando nos Estados Unidos, na Universidade de Houston, Texas, tive a oportunidade de participar das cerimônias fúne- bres pelo falecimento de um inquilino do complexo de apartamentos em que morava. Aconteceu a morte. Nenhum dos vizinhos estava presente aos instantes finais do falecido. Imediatamente, a empresa especializada em ser- viços fúnebres foi acionada, e o morto levado às pressas para destino de todos ignorado. A família, chorosa e entristecida, comunicou-nos que, no dia seguinte, haveria uma cerimônia íntima que precederia a cremação do cadáver. No outro dia, lá estive. Era um cemitério-parque, belíssimo, onde não se via nenhuma cova aberta ou mausoléu sobre os restos mortais dos se- pultados. Apenas os seus nomes em pequeninas placas de metal, quase invi- síveis, espalhadas por uma área imensa. A cerimônia estava marcada para as 16 horas. Às 15 horas cheguei. Havia muitos parentes e alguns poucos amigos 58 59
  • 30. especialmente convidados. Acerquei-me de todos. A maioria comentava a perfeição da maquiagem do morto. Realmente, o seu rosto estava impecavel- mente retocado, revelando uma beleza que não possuía em Vida. Era um ve- lho e parecia um jovem! Aos presentes, foi servida uma rodada de uísque e refrigerantes, de acordo com o gosto de cada um. Muitos fumavam, e até os fósforos, distribuídos como brindes, imitavam o fogo fátuo tão comum nos cemitérios. Precisamente, às 16 horas, o caixão foi levado até uma espécie de altar. Uma cortina foi fechada. Diante dele, um botão acionado. Desceram o esquife e o cadáver ao forno crematório subterrâneo, e, de volta, quando descerrada a cortina, surgiu uma bela urna já com as cinzas do morto. Esta foi entregue, solenemente, aos familiares. Estava encerrada a cerimônia. Sem choros, sem lamentações. Mais uma festa do que um enterro! Nada teríamos a comentar sobre o fato se, nas entrelinhas de tal sole- nidade, não vislumbrássemos aquilo que já dissertamos anteriormente: a tentativa de negação da morte e isto bem presente nas exclamações admira- tivas dos visitantes, parentes e curiosos: “— Não está morto! Parece dormir! Como está bonito depois de morto! Parece que está sorrindo para nós!”, e quejandos… A transferência do corpo para as casas funerárias, como já é costume em nosso país, encerra um objetivo: o de não se encarar a morte de frente. Daí a escolha de um lugar “mais conveniente”, em que haja um espaço maior para visitantes e convidados, numa verdadeira festa macabra onde, por vezes, os aperitivos estão sempre presentes com o objetivo de “dopar” um pouquinho as pessoas, ante a presença da morte. Não se morre mais em casa. Quando a família pressente a ronda da mor- te sobre o seu ente querido, desloca-o, mesmo contra os seus desejos, ex- pressos verbalmente ou por escrito, para hospitais e uteís, onde eles ultima- rão os seus dias, neste mundo. É fato notório que a medicina atingiu, hoje em dia, níveis de progresso tecnológico admiráveis. Aparelhagens sofisticadas substituíram, aos poucos, as apalpadelas do bonachão e paternal médico da família. São instrumentos de última geração, capazes de detectar tudo o que se passa na intimidade do organismo humano, com grandes e inegáveis benefícios para os pacientes, portadores das mais diversas enfermidades. Todavia, nenhum desses instrumentos é capaz de substituir a presença humana daquele que exterioriza amor pelo moribundo e se transforma, em- paticamente, mesmo em silêncio, num apoio moral e espiritual para quem está vivendo os seus últimos dias de experiência terrestre. A frieza dos hospitais e das uteís pode causar aos que vão morrer, uma agonia e, até certo pavor nunca presentes nos ambientes domésticos, onde a atmosfera da casa proporciona tranqüilidade e confiança ao moribundo, pelas ricas inter-relações pessoais que favorece. Tais ambientes podem pro- longar, por um tempo variável e até indeterminado, a Vida dos doentes, mas não lhes oferece o calor humano e a solidariedade de que tanto eles neces- sitam, nessa hora. Um caso bem recente e que ficará nos anais da Tanatologia, é o do pro- fessor e senador Darci Ribeiro, doente terminal, portador de câncer gene- ralizado. Literalmente, ele “fugiu” de uma uteí, onde estava confinado e, lá fora, livre e consciente da ronda da morte em sua Vida, optou por viver. E na hora em que escrevo este texto (1.º/dez./1996), esse homem admirável já escreveu dois livros e ultimou a elaboração de mais um; promete um quarto e está sempre presente em programas de TV, comparecendo em determina- dos dias, ao Senado, numa programação de Vida, rica, fecunda e plena de realizações. Nas uteís, o moribundo é apenas um número. Ali não está uma pessoa, um amigo, um pai ou uma mãe, nas suas despedidas deste mundo. Não! Ele é um estranho entre estranhos. As visitas, quando permitidas, não são vistas com bons olhos pelas equipes médicas nem pelas administrações hospitala- res, porque podem flagrar algum desrespeito ou negligência ao doente. E os parentes e amigos permanecem de fora, curtindo a sua angústia e inquieta- ção e contentando se com boletins de informações sobre o estado geral do paciente. Nessas unidades o revezamento das equipes hospitalares faz com que os seus ambientes sejam visitados, semanalmente, por dezenas de profissionais, todos especialistas, sem a criação de quaisquer vínculos pessoais, afetivos ou de simpatia com qualquer um dos pacientes. Por isso mesmo, muitos doen- tes entram e saem dessas unidades sem criar laços de amizade com nenhum membro dessas equipes. Diga-se o mesmo das enfermarias coletivas, nos hospitais públicos e particulares, com visitas restritas a determinados dias da semana; das indigências hospitalares e dos abrigos para idosos, onde todos 60 61
  • 31. estão matriculados para um “morrer solitário”, em lugares que se transforma- ram, em depósitos de doentes à espera angustiante da hora da morte!… Por outro lado, médicos, enfermeiros e outros profissionais que atendem nas uteís e enfermarias coletivas, lidando com doentes graves, nem sempre possuem o tato psicológico para cuidar desse tipo de pacientes que estão a exigir tratamento delicado e especial. E, assim, prevalece a tecnologia médica em detrimento do calor humano. A aparelhagem sofisticada e fria substitui o aperto de mão, a solidariedade do médico de família ou a presença confortadora dos familiares. Aos poucos, vai-se instalando em nossa sociedade capitalista a “indús- tria da morte”, tentando-se prolongar vidas que já se extinguiram. Estas são mantidas, indefinidamente, por meios artificiais, criando uma situação des- confortável para as famílias dos pacientes, mas, que rende milhões aos cofres dos donos das empresas hospitalares. Infelizmente, é assim que se morre, atualmente, no mundo ocidental. Sem consciência de que se vai morrer. Sem a presença dos familiares e ami- gos. Na frieza das uteís. Na companhia de estranhos e sem o conforto da atmosfera doméstica que traz confiança e paz ao moribundo. Muito triste morrer em tais condições… • 9 A Melhor e a Pior Forma de Morrer Amorte atinge o ser humano de múltiplas maneiras. Morre-se de doen- ças incuráveis, de acidentes de várias naturezas, em conseqüência de cataclismos naturais e, ainda, por homicídio, suicídio e até de velhice. Qual seria, dentre as inúmeras formas de morrer, aquela menos trauma- tizante para o espírito que está prestes a partir deste mundo? É o que tentaremos responder neste capítulo. Muita gente pensa que a morte de maior merecimento é a repentina. Um violento ataque do coração, o rompimento de um aneurisma, um trombo no cérebro, e pronto: acontece a morte inopinada e libertadora. Outros chegam a ansiar que a morte lhes aconteça num acidente aéreo ou automobilístico, que, pela sua violência, implicaria num aniquilamento rápido e indolor do corpo carnal. Outros, ainda, gostariam de que a morte lhes chegasse duran- te o sono corporal. Sabe-se que, por ocasião do sono, a alma das pessoas de mediana evolução libera-se, parcialmente, das amarras carnais. A mor- te, nesse caso, dar-se-ía pelo corte do “cordão de prata”, durante a inconsci- ência do sono, possibilitando uma passagem tranqüila e suave para a Vida Espiritual. Esta, em nossa opinião, é uma das melhores formas de morrer, senão a melhor. As mortes ocasionadas por doenças incuráveis, geralmente, configuram resgates cármicos. São mortes aflitivas e dolorosas. Todavia, passados os maus momentos, oriundos desses sofrimentos, em especial se eles forem estoicamente suportados, a alma entra na Pátria Espiritual, luminosa e redi- mida. Excetuam-se, nesse caso, as doenças desse tipo contraídas por insânia e irresponsabilidade, bem assim aquelas devidas a comportamentos anor- mais, gerando torpes viciações, comprometedoras da saúde física e mental da pessoa. A morte natural, como o próprio termo expressa, é a forma que, em tese, a Natureza estabeleceu para a liberação do espírito. Nela, mesmo que acon- 62 63
  • 32. teça em virtude de doenças dolorosas e traumatizantes, há o “desate” do “cordão de prata”, este, elo de ligação entre o espírito e o corpo. Já nas mortes subitâneas e violentas, em acidentes inesperados, não há o desatamento desse cordão e essa providência liberatória vai exigir a in- tervenção de Espíritos benfeitores e amigos, treinados para isto. Eis porque, nas mortes inopinadas, o estado de perturbação do espírito perdura por um tempo variável, consoante o nível evolutivo de cada um. Já na morte natural, mormente se ela ocorre na idade provecta, o estado de perturbação é bem menor, e chega quase a inexistir se a pessoa que se está transferindo para a outra margem da Vida, tem fé na imortalidade da alma e pautou a sua exis- tência pelos padrões éticos da mensagem de Jesus. Aquele que, nesta Vida, foi temperante na alimentação, sereno emocio- nalmente, controlado na prática do sexo, possuidor de nobres sentimentos, enfrentará a morte com sobranceria, transferindo-se para o outro lado numa atmosfera de paz e serenidade. O mesmo não ocorre com os intemperantes na mesa, no sexo ou que se escravizaram a viciações deletérias como o fumo e o álcool. Estes, se forem nobres de caráter e bons de coração, poderão até atingir a longevidade, mas sofrerão nessa fase de suas Vidas, as conseqüências fatais de suas levianda- des e irreflexões. Terão, em suma, uma velhice de má qualidade e, conse- qüentemente, uma morte mais lenta, penosa e angustiante. É de se concluir, portanto, que, em tese, a melhor forma de morrer é na senectude do corpo, com o espírito vígil, em plena lucidez, não obstante o natural esgotamento das forças físicas. E essa forma de morrer nada tem de dolorosa ou desesperadora. É a cha- mada morte do passarinho, ou seja, uma passagem feliz para as moradas de luz do infinito, com um despertar luminoso no Além. Melhor, ainda, seria dizer que essa forma de morrer é uma volta, uma retomada do caminho de casa, vez que a verdadeira morada do ser humano – espírito revestido de carne – não é aqui, neste mundo, mas sim, no outro. A Terra é o exílio temporário da alma. Nas suas despedidas dos Apóstolos, Jesus foi muito claro quando lhes disse: “— Vós não sois do mundo, assim como eu, também, não sou do mundo.” (Jo. 17, 16) Importantíssima, portanto, é a manutenção permanente do equilíbrio físico e mental. Isto gera uma excelente qualidade de Vida e também uma extraordinária qualidade de morte. Vivendo assim, a morte não será uma ruptura, mas um desenlace; não será uma angústia, mas uma forma de re- nascer; não será um empeço, mas uma transição calma de uma margem para a outra do grande e perene rio da Eternidade. Morrer, assim, vale a pena. É como um sono de paz que termina com o mais venturoso despertar. Temos falado, até agora, na melhor forma de morrer. Existiria, então, uma pior? Claro que sim. Vejamos. Sem sombra de dúvida, a pior forma de morrer é por suicídio, voluntário ou não. Dedicamos, neste livro, três dos seus capítulos ao suicídio, essa maneira ofensiva a Deus de desertar da Vida. Nesses capítulos, analisamos as dolo- rosas e inimagináveis conseqüências, no outro lado da existência, desse ato tresloucado. Remetemos o leitor a esses capítulos (52, 53 e 54). Seguem-se, como formas mais indesejáveis de morte, aquelas caracteri- zadas pela violência, como nos homicídios e acidentes de variada espécie. Por último, nessa gradação dos piores tipos de morte, estão as mortes por cataclismos naturais, também muito dolorosas e angustiantes, mas sempre devidas a programações reencarnatórias de natureza cármica. Todavia, em todos esses casos, embora traumatizantes, o auxilio do Alto sempre far-se-á sentir, por ser infinita a misericórdia de Deus. • 64 65
  • 33. III A Morte e o Morrer A Visão Contemporânea de Cinco Religiões 66 67
  • 34. 10 A Visão Católica (Texto baseado em entrevista com o Prof. Francisco Pereira Nóbrega, líder católico, Doutor em Filosofia pela Universidade de Paris, e por ele revisto) Amorte não tem a última palavra. Ela não é o fim. Existe outra Vida de- pois dela. E esta certeza – temos de convir – é muito maior para os cris- tãos, uma vez que Jesus ressuscitou. O seu sepulcro, vazio até hoje, é a maior prova da inexistência da morte como algo definitivo. Ao vencer a morte, o Cristo de Deus deu todo sentido à Vida humana. Referindo-se à morte de seu amigo, Lázaro, o Cristo disse: “— Lázaro não morreu. Ele dorme, mas vou para despertá-lo” (Jo. 11, 11). Com isto, o Cristo significou que a morte é algo tão precário, passageiro, quanto o sono físico que leva ao despertar de amanhã. O que seria a Vida Eterna? O que o cristão chama de “Vida Eterna” é, acima de tudo, a sociabilidade no amor. Descartado está que a Vida Eterna do ser humano seja um “estar sozinho”. A outra Vida será um “estar com Cristo”, um “estar com Deus”. Onde estariam as almas após a morte? Os conceitos “onde” e “quando” referem-se à matéria e só a ela convém. Precisaríamos de outras categorias de pensamento para podermos falar da realidade da Vida Eterna. O ser material, porque tem extensão, ocupa um “onde”, que a alma, o espírito, Deus, não ocupam. Se falarmos do “quando”, a dificuldade é a mesma. Digamos que Deus e o mundo têm suas durações. Mas a duração da matéria é sucessiva, enquanto a de Deus é simultânea. À sucessiva denominamos tempo. A simultânea, cha- mamos de Eternidade. O tempo entende-se em termos de “antes” e “depois”. Eternidade não tem “antes” nem “depois”. A duração de Deus é toda ela em um instante só que não passa jamais. Falemos de almas e Espíritos. Não são a mesma coisa. A alma humana é uma espécie de espírito que tem apetência pela matéria. Seu modo natural 68 69
  • 35. de existir é animando a matéria. Toda alma humana implora a corporeidade, mesmo depois da morte. A alma é “forma” cujo conteúdo é a matéria. É essa “forma” que dá unida- de, sustentação, permanência, na existência do ser humano. É ela que vitaliza, anima, humaniza a matéria. A alma é princípio de unidade e de sustentação do ser humano. Em que parte do corpo está a alma? Existem realidades que nunca estão nas partes, mas no todo. A Vida, a existência, a unidade do corpo humano não estão em nenhuma de suas par- tes. A alma também é assim. Após a ressurreição, cada alma terá uma corporeidade, conforme sua ap- tidão natural de existir. Não será um corpo físico, como o atual, sujeito ao calor, à fome, ao sono, a todas as necessidades materiais da Vida. Paulo fala de um corpo glorioso, “incorruptível”, como aquele do Cristo que, após res- suscitado, entrou em uma sala, onde todas as portas e janelas estavam fecha- das. Esse corpo glorioso, portanto, não tem necessidades materiais mesmo sublimadas. Não tem necessidade física nenhuma. Qual é a identidade do ser humano que tombou na Eternidade? Seremos, eternamente, o que fomos. Nossa identidade é nossa história, nossas virtudes e fraquezas, acrescentadas ao arrependimento nosso e ao perdão de Deus. Tudo isto se eternizará. Tudo isto será a nossa face, eterna- mente. Não há outra coisa para se eternizar, no Além, senão esse “eu”, com a sua história e as intervenções de Deus. Moisés e Elias aparecem, no Tabor, ao lado de Jesus. Ambos estão com as vestes judaicas, com os mesmos traços fisionômicos do seu povo. Estavam ali revelando suas identidades. Se não aparecessem assim, não seriam Moisés nem Elias. Quando seremos julgados? Cada um, isoladamente, após a morte? Todos, simultaneamente, no juízo final? Voltamos a falar do “quando”. “Tempo”, como o entendemos, só existe, aqui, no mundo, porque tempo é medida de mudanças em termos de “antes” e “depois”. Na Eternidade não existe “antes” nem “depois”. Teólogos católicos, e das igrejas reformadas, inclinam-se, atualmente, a entender que é esta a condição do ser humano, ao tombar na Eternidade: morreu, ressuscitou. No próprio instante da morte, aconteceria a ressurrei- ção, também o julgamento. Isto não invalidaria o juízo final, porque algo existe, além de cada homem, chamado civilização, cultura, a “História Humana”, afinal. É esta dimensão de realidades coletivas que passa a merecer o julgamento final. Os textos bíblicos que falam desse julgamento, aludem a uma ressurrei- ção dos corpos que, até aquela data, estariam em suas condições mortais. Reconhecemos que isto oferece resistência à tese teológica de “morreu, res- suscitou”. A questão continua em aberto para o debate dos teólogos. Quais são as condições que nos fazem merecer o céu? De imediato, digamos que nenhum ser humano tem direito ao céu pelos seus próprios méritos. O homem chegará a Deus gratuitamente, mesmo o herói, o santo, o altruísta, o que deu a Vida pelos outros. O ser humano não chegará a Deus como chegam, aos seus espetáculos, os faquires, em virtude de seus longos jejuns. Nenhuma força humana levará o homem a Deus. Os que atingirem o céu, lá aportarão pela graça de Deus. Como seria este “estar no céu”? Todas as palavras do vocabulário humano são pobres para traduzir essa visão de Deus, esse êxtase em Deus. Não serão os olhos da matéria que ve- rão a Deus. Nas primeiras páginas do livro do “Gênesis”, lê-se: “— E disse Deus, faça- mos o homem a nossa imagem e semelhança” (Gen. 1, 26), o que significa di- zer que o ser então criado, poderá, um dia, ter a visão de Deus sem os olhos da carne, de maneira semelhante a que Deus nos vê. É o espírito perante o espírito. Eis o máximo a que poderemos chegar acerca da visão de Deus. O que seria o inferno? É um estado de alma negativo, violento. É o estado de quem eternizou o ódio, o mal, a perseguição aos outros, a calúnia, a hipocrisia. A morte revela o que a Vida fotografou. Na Eternidade, tudo é consciên- cia. O inferno é a consciência infeliz. É a infelicidade ontológica do ser que não se aceita e que não tem como fugir de si mesmo. O inferno não é algo imposto por Deus ao homem. E a história da verdade de cada um, de suas opções, contada pela própria consciência. Que é o purgatório? 70 71
  • 36. E um estado intermediário, mas transitório, de dor, e arrependimento. E só isto. O que mais se disser sobre esse assunto é pura imaginação. Os teólogos contemporâneos tendem a colocar o purgatório no tempo, não na Eternidade. Seria, talvez, o último instante de tempo de cada um, quando se toma a consciência do que se é, no limiar da Eternidade. Haverá dor se a consciência é infeliz. Que é o limbo? Esta palavra não aparece no Velho, nem no Novo Testamento. Durante séculos de fé cristã, nunca se pronunciou esta palavra. Alguns teólogos se questionaram sobre a história de determinados seres humanos que não po- diam ir para o inferno nem, talvez, para o céu. Imaginemos crianças abor- tadas, mortas nos primeiros meses de existência. Imaginemos seres anor- mais, como os mongolóides, na inconsciência de si próprios. Não pecaram. Acrescente-se, ainda, que nem sequer foram batizados. Certa Teologia ca- tólica imaginou para eles um lugar que a Bíblia não revela, chamado limbo. Hoje, no catecismo católico, não se menciona limbo. Ele não existe. Nunca existiu. Crianças ou adultos que tenham passado por esta Vida, nestas con- dições, certamente estão no céu. Deus criou o ser humano para o Paraíso. Só quem pode violar este plano de Deus é a liberdade humana. Se esses seres não tiveram consciência nem liberdade, se nunca optaram contra Deus, a criação é positiva e eles estão salvos. Trabalha-se, no outro lado da Vida? A Teologia católica responde que, na Eternidade, não há lugar para o tra- balho, como o entendemos, aqui, na Terra. Na condição humana atual, o trabalho resulta de uma necessidade. Na Vida Eterna, a única necessidade é de Deus. Quem tem a visão direta Dele, de mais nada precisa. Deus é amor e a Eternidade é apenas o êxtase do amor em Deus, sem necessidade nenhu- ma das coisas terrenas. Nossos relacionamentos recíprocos de amizade, amor, continuariam no Além? Segundo a tradição católica, a Vida Eterna não nos faz desconhecidos uns dos outros – o parente, o amigo. Todavia, o homem biológico não exis- te mais no Além. Ele se encerra nesta Vida. Na Eterna, não há fome, sede, sono, sexo. Relações de marido e mulher também acabam-se na Eternidade. Lá, não mais existe a amizade marital. Os laços conjugais estão desfeitos. A amizade e o amor continuam. Assim como, ao olharmos num espelho, vemos tudo o que nele está refletido, do mesmo modo, e muito mais radi- calmente, quem contempla Deus, face a face, também conhece e reconhece todos aqueles que Nele estão refletidos. Em suma, na Vida Eterna nós nos conheceremos melhor ainda do que aqui na Terra. Deus estaria indiferente ao sofrimento dos que estão no purgatório ou no inferno? Deus é profundamente solícito para com toda a Sua criação, e especial- mente para com o destino final do ser humano. A grande paixão de Deus é o homem. Esta paixão do Criador pelo ser humano revela-se, ainda mais, quando o Cristo nos fala da “ovelha perdida”, do “filho pródigo” e, sobretudo, quando Ele próprio diz: “— Eu vim para salvar as ovelhas perdidos da Casa de Israel.” (Mt. 15, 24) Tudo isto seja dito do que Deus pode fazer pelo ser humano, no tempo. Na Eternidade – repitamos – não há “antes” nem “depois”. Se não há “depois”, não há como alterar a situação do condenado. Do lado que a árvore cai, ali ela fica. Do mesmo modo, do jeito que o ser humano tomba na Eternidade, desse jeito ele se eterniza. Ele é a sua identidade. Ele é a consciência infeliz. Ele é o remorso de si próprio, eternamente se mordendo e se remoendo. Deus não acende uma só chama para queimar esse ser. Deus, também, está impossibilitado de alterar essa situação. Há, sim, “impossíveis” perante Deus, senão não existiriam nem verdade, nem justiça. O inferno, repito, é a cons- ciência que o condenado tem de si, sem se aceitar. E qual seria, na Eternidade, a sorte dos suicidas? A Bíblia nada diz de específico sobre os suicidas. Estão os teólogos, por- tanto, a considerar esta morte sob a mesma categoria de todas as outras. Nada de especial. Entretanto, convém ajuntar a estas reflexões o que, hoje, nos diz a Psicologia, a Psiquiatria e a Psicanálise. Estas ciências tendem a ad- mitir que, talvez, nem exista culpa nos que se suicidam. Eles, ao praticarem esse ato tresloucado, fizeram-no em virtude de tendências congênitas ou de depressões profundas. Não estariam mais na posse plena de sua consciência, de sua liberdade. O Cristo não destacou categorias especiais de sofrimento para nenhum tipo de morte. E a morte por suicídio não seria uma exceção. Existem anjos e demônios? 72 73