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O computador como ferramenta e como linguagem na
                     intervenção artística


                                    Luciana Martha Silveira


        A presença da tecnologia tem-se mostrado uma realidade que se
multiplica em diferentes aspectos. Várias áreas do conhecimento se
preocupam em estudar e compreender seu desenvolvimento e influências
em atitudes sociais, principalmente no que diz respeito à velocidade e
inovação.
       O termo Tecnologia não é abstrato ou de difícil definição prática.
Pelo contrário, a prática da tecnologia está registrada na história. Neste
contexto, tendo a tecnologia sob o ângulo das novas perspectivas que se
apresentam em forma de transformações tecnológicas no âmbito social e,
sem a pretensão de esgotar o assunto, pensaremos a tecnologia dentro
do fazer artístico, questionando sua utilização como linguagem ou como
ferramenta.
       Diante de todos os questionamentos advindos da presença da
tecnologia no fazer artístico, começamos pensando o papel do artista
diante de uma época marcada pelo tecnocentrismo.
         Desde muito tempo, no círculo de artistas, se discute a validade da
experimentação que parte de dispositivos ou processos tecnológicos. Essa
discussão, logicamente, atravessa a própria natureza da intervenção
artística nos dias atuais e, por isso mesmo, está longe de apontar uma
definição mais consistente.
       Uma questão primeiramente, assola a mente desses artistas: a que
nível a tecnologia deve interferir ou talvez interagir na criação ou
intervenção artística? Qual deve ser o papel a ser desenvolvido pelo artista
verdadeiramente interventor?
        Segundo Arlindo Machado [Machado, 199?] em seu artigo intitulado
“Repensando Flusser e as Imagens Técnicas”, existem algumas opções, a
princípio, que se apresentam ao artista cercado pela tecnologia: A primeira
seria agir apenas e tão somente como um usuário; a Segunda, viria de
encontro ao desejo de muitos artistas, que seria obter conhecimentos em
engenharia ou programação de computadores, independendo da ajuda de
qualquer outra pessoa.

                           REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA
    Periodico Técnico Científico dos Programas de Pós -Graduação em Tecnologia dos CEFETs - PR/MG/RJ
                                                 111
Uma terceira opção, dentro do quadro que hora se apresenta, seria
negar a tecnologia, tentando se afastar de sua necessidade o mais rápido
possível, quase sem deixar rastro.
        E, finalmente, uma última opção que se coloca a disposição do
artista hoje, seria trabalhar em parceria. Logicamente, uma parceria
especial, que prevê alguém com conhecimentos nos trâmites
aparentemente intrincados dos aparelhos tecnológicos.
        Comentando cada uma dessas opções, temos este panorama
ampliado. A primeira opção, onde o artista agiria como usuário, estaria
apenas se preocupando em explorar todos os aspectos, que não são
poucos, dos produtos colocados no mercado pela indústria da eletrônica,
deixando para trás a intervenção ou questionamento da máquina. A opção
artista-usuário é um fato tão enraizado no lidar com a tecnologia que,
muitas vezes, este aspecto nem é notado por quem está trabalhando
frente a um computador, por exemplo.
        Vilém Flusser, em seu livro A Filosofia da Caixa Preta [Flusser,
19??], critica as pessoas que apenas utilizam as máquinas e programas
sem intervir ou questionar seu funcionamento, quer dizer, sem branquear o
que ele chama de caixas pretas da tecnologia. Agindo como usuário, o
artista passa a não ser verdadeiramente interventor. Estaria demonstrando
ou apenas repetindo o que a máquina lhe sugere, sem ser o verdadeiro
sujeito da transformação criadora, que é o pressuposto por uma
experimentação inovadora, também no que diz respeito à utilização da
máquina.
       O perfil do trabalho artístico que é construído utilizando-se a
tecnologia, faz uma mistura interessante entre o intelecto e a intuição,
exigindo uma postura mais interativa e interventiva do artista.
        A segunda opção que se apresenta ao artista é se transformar
também num engenheiro ou programador. Este fato traria como
conseqüência imediata o prazer, que muitos artistas sentem, em trabalhar
isolado, reforçando a idéia Renascentista de que o artista é um gênio
criador, e sua criação é produto de um processo criativo individual, não
dependendo de alguém que traduza as suas idéias estéticas em tecnologia
operacional, podendo construir e destruir as máquinas por ele mesmo.
Enfim, se tornar um engenheiro-artista, ou um programador-artista
afastaria os problemas advindos da interação de um grupo interdisciplinar
que se propõe a criar, problemas estes que começam já na formação do
tal grupo. Por outro lado, apresentaria um fato bastante preocupante, que
seria o tempo a ser gasto no estudo da engenharia ou programação de
computadores e máquinas, suficiente para livrá-lo de qualquer interação.

                           REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA
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                                                 112
A terceira opção parece ser a mais radical. Seria possível hoje,
alguém simplesmente negar a tecnologia e se recusar a fazer parte, ou
ainda, não deixar que a tecnologia faça parte de suas ações imaginativas e
criativas? Em termos de uma legitimação da tecnologia, talvez haja essa
possibilidade, mas ainda aqui o artista teria de trabalhar com outras
pessoas, que fizessem a ponte entre sua obra e o mundo tecnológico que
hoje se molda, quando necessário fosse.
       Por fim, a última opção: trabalhar em parceria. Criar um ambiente
de interação com a máquina e com o outro, ou outros seres-humanos,
formando um grupo de artistas, que envolveria pessoas de várias áreas.
Como visto na Segunda opção comentada anteriormente, essa parceria
pode se transformar num problema, se visto de um ângulo fora da
interação, pois exige uma outra, ou outras partes, dispostas a participar de
processos alternativos e inovadores, que nem sempre se encontram
facilmente disponíveis.
       Seria, idealizadamente, um grupo inter/multi/transdisciplinar, que
abrigaria pessoas capazes em várias áreas, trabalhando em torno de uma
ou muitas idéias estéticas.
        Segundo Paulo Laurentiz, em seu livro “A Holarquia do
Pensamento Artístico” [Laurentiz, 1991], o artista da era eletrônica
comunga com um tempo em que há o sentido de cooperação entre homem
e natureza, traduzido em arte. Esse tempo traduz a passagem da relação
olho-mão do artista da era industrial para a relação mente-mundo do artista
da era eletrônica. Esse seria o papel do artista, que estaria assim
branqueando, usando aqui termos de Flusser, a caixa preta da tecnologia
e a transformaria em linguagem de comunicação?
        Ainda sobre trabalhar em parceria, Arlindo Machado, no mesmo
artigo citado acima [ Machado, 199?], comenta que “nos territórios da arte
que lida com processos tecnológicos, a parceria possibilita dar forma
orgânica aos vários talentos diferenciados e equacionar certeiramente as
atuais demandas do trabalho artístico, que são conhecimento e intuição,
sensibilidade e rigor, disciplina e anarquia criativa. Artistas, em geral, não
dominam problemas científicos e tecnológicos; cientistas e engenheiros,
em contrapartida, não estão a par do complexo intrincado de motivações
da arte contemporânea. Conjuntamente, ambos podem superar suas
respectivas deficiências e contribuir para recuperar a antiga idéia grega de
téchne, que compreendia tanto a invenção técnica quanto a expressão
artística”.
       A opção a ser feita pelo artista não é coisa simples e nem se
apresenta de forma objetiva. Geralmente, os artistas acabam
experimentando uma, duas, ou mais destas opções durante sua vida
                           REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA
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                                                 113
profissional, inclusive experimentando a formação e a sua integração em
grupos formados em torno de uma idéia estética, até encontrarem o nível
de competência tecnológica em que devem atuar.
        Mas, ainda dentro da discussão que hora se inicia, existe uma outra
questão que permeia todo o problema: os dispositivos eletrônicos
utilizados pelos artistas (grupo-artista ou somente artista) em suas criações
estéticas, devem ser encarados como ferramentas ou como linguagem?
       Segundo Edmond Couchot [Couchot, 199?], a questão é bastante
complexa: A primeira vez que um dispositivo eletrônico é apresentado a
um artista, a impressão inicial é de caixas pretas, quer dizer, seu
funcionamento ainda lhes parece deveras misterioso e intrincado,
forçando-os até a se aproximar por mera curiosidade. Assim, neste
momento, o artista está comungando com a primeira opção: são apenas
usuários, e estariam somente experimentando as possíveis combinações
que a própria fábrica dos equipamentos lhes oferecem. Estariam utilizando
a tecnologia como ferramenta, quer dizer, sem grandes intervenções ou
questionamentos.
       Como cita Couchot [Couchot, 199?], o fotógrafo, por exemplo,
sempre tem presente, mesmo inconscientemente, que quando direciona
uma câmera para um modelo e aperta determinado botão, seu resultado
será uma imagem bidimensional interpretada pela mesma câmera,
partindo daquilo que serviu de motivo tridimensional e que pousou alguns
segundos. Então, mesmo não conhecendo todas as equações que
envolvem a engenhoca das objetivas e nem as reações químicas que
ocorrem nos componentes da emulsão fotográfica, ele terá a sua
fotografia, pois, rigorosamente, pode-se fotografar sem conhecer as leis da
óptica fisiológica e nem as propriedades fotoquímicas da película, nem
ainda as regras da perspectiva. As câmeras modernas estão equipadas, e
já vêm de fábrica com essa configuração, com fotômetros e foco ajustados
automaticamente.
      Quando pensamos no artista frente ao computador, pode acontecer
a mesma coisa. Objetos de arte que mais parecem uma demons tração do
programa instalado dentro daquela máquina que está sendo utilizada.
       Como usuários, tanto o fotógrafo quanto o artista que utiliza o
computador, estão utilizando os dispositivos tecnológicos apenas como
ferramenta.
       Utilizar os dispositivos para a construção de trabalhos artísticos
como ferramenta significa explorar o que já estava previsto na fábrica,
como opção de trabalho artístico. É subestimar o instrumento e a
capacidade do artista.

                           REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA
    Periodico Técnico Científico dos Programas de Pós -Graduação em Tecnologia dos CEFETs - PR/MG/RJ
                                                 114
Segundo o mesmo Couchot [ ], acontece que a caixa preta
chamada computador não é uma caixa preta comum. Ela não é
constituída apenas de circuitos eletrônicos de hardware. O computador
tem também as chamadas linguagens formais, os softwares, os
programas, os algoritmos. Assim, o computador tem apenas uma parte
que está programada em fábrica, a outra se deixa programar de muitas
maneiras diferentes, sendo assim o que Couchot chama de uma máquina
genérica, isto é, uma máquina com quase infinitas maneiras de ser
programada. Este fato o capacita a ter duas interpretações: o computador
pode ser utilizado como ferramenta ou como linguagem.
        Já o vimos como ferramenta. Por outro lado, utilizar o computador
como linguagem é se tornar verdadeiramente interventor. É penetrar no
interior da caixa preta, para interferir em seu funcionamento interno (seja
positivamente, no sentido de colocar a máquina a trabalhar em benefício
de suas idéias estéticas, seja negativamente, no sentido de desvelar as
determinações que ela impõe). Esse procedimento não é somente possível
a uma classe muito especial de artistas, aquela dotada também de
competência científica e tecnológica, mas aqueles menos dotados em
termos de formação técnica, que também descobrem os seus próprios
caminhos, e acabam por explorar a caixa preta a seu modo.
        Porém, como todos sabemos, em alguns momentos, o computador
ainda é utilizado apenas como ferramenta. Podemos citar, por exemplo, o
tão falado e estudado caso do computador em sala-de-aula.
        Geralmente, ainda o computador é utilizado apenas como
ferramenta pelo professor , que acaba impondo a seus alunos sua
utilização como sendo a única opção possível e inovadora, reduzindo-se
ao adestramento do indivíduo para que execute bem uma determinada
técnica ou tarefa. Seria ter o computador como lousa e giz. Então, porque
a presença do computador?
        Na utilização do computador colocada como linguagem, o aluno
pode compreender os fundamentos da máquina e, consequentemente, a
sua dinâmica em relação aos processos tecnológicos, sem separação
entre outras dimensões, tais como as d   imensões econômicas, sociais,
culturais, ambientais e éticas do nosso mundo de tecnocentrismos,
ajudando no desenvolvimento de uma consciência crítica e capaz de se
comunicar abertamente. Significa encarar a tecnologia como parte
integrante do conteúdo programático desenvolvido em cada disciplina,
desenvolvendo nos alunos o prazer de viver livremente num mundo
povoado pela tecnologia.
        Em forma de conclusão, os dispositivos eletrônicos utilizados tanto
por artistas quanto por funcionários em fábrica ou alunos e professores em
                           REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA
    Periodico Técnico Científico dos Programas de Pós -Graduação em Tecnologia dos CEFETs - PR/MG/RJ
                                                 115
sala de aula, interferem, como muitos já disseram, em nosso modo de vida
e de construção do pensamento, além de interferir também em nossa
capacidade criadora e nas formas de percepção do mundo.
       Os artistas têm um grande e nobre papel dentro disso tudo que
seria ajudar a desvendar e desencadear todas as conseqüências
referentes à produção e inovação tecnológica, que de outro modo passaria
despercebido ou disfarçado.

        Referência

FLUSSER, V. A Filosofia da Caixa Preta, São Paulo: Hucitec,
LAURENTIZ, P. A Holarquia do Pensamento Artístico, Campinas: Ed. da
     UNICAMP, 1991.
MACHADO, A. Repensando Flusser e as Imagens Técnicas




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Computador como ferramenta e linguagem na arte

  • 1. O computador como ferramenta e como linguagem na intervenção artística Luciana Martha Silveira A presença da tecnologia tem-se mostrado uma realidade que se multiplica em diferentes aspectos. Várias áreas do conhecimento se preocupam em estudar e compreender seu desenvolvimento e influências em atitudes sociais, principalmente no que diz respeito à velocidade e inovação. O termo Tecnologia não é abstrato ou de difícil definição prática. Pelo contrário, a prática da tecnologia está registrada na história. Neste contexto, tendo a tecnologia sob o ângulo das novas perspectivas que se apresentam em forma de transformações tecnológicas no âmbito social e, sem a pretensão de esgotar o assunto, pensaremos a tecnologia dentro do fazer artístico, questionando sua utilização como linguagem ou como ferramenta. Diante de todos os questionamentos advindos da presença da tecnologia no fazer artístico, começamos pensando o papel do artista diante de uma época marcada pelo tecnocentrismo. Desde muito tempo, no círculo de artistas, se discute a validade da experimentação que parte de dispositivos ou processos tecnológicos. Essa discussão, logicamente, atravessa a própria natureza da intervenção artística nos dias atuais e, por isso mesmo, está longe de apontar uma definição mais consistente. Uma questão primeiramente, assola a mente desses artistas: a que nível a tecnologia deve interferir ou talvez interagir na criação ou intervenção artística? Qual deve ser o papel a ser desenvolvido pelo artista verdadeiramente interventor? Segundo Arlindo Machado [Machado, 199?] em seu artigo intitulado “Repensando Flusser e as Imagens Técnicas”, existem algumas opções, a princípio, que se apresentam ao artista cercado pela tecnologia: A primeira seria agir apenas e tão somente como um usuário; a Segunda, viria de encontro ao desejo de muitos artistas, que seria obter conhecimentos em engenharia ou programação de computadores, independendo da ajuda de qualquer outra pessoa. REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA Periodico Técnico Científico dos Programas de Pós -Graduação em Tecnologia dos CEFETs - PR/MG/RJ 111
  • 2. Uma terceira opção, dentro do quadro que hora se apresenta, seria negar a tecnologia, tentando se afastar de sua necessidade o mais rápido possível, quase sem deixar rastro. E, finalmente, uma última opção que se coloca a disposição do artista hoje, seria trabalhar em parceria. Logicamente, uma parceria especial, que prevê alguém com conhecimentos nos trâmites aparentemente intrincados dos aparelhos tecnológicos. Comentando cada uma dessas opções, temos este panorama ampliado. A primeira opção, onde o artista agiria como usuário, estaria apenas se preocupando em explorar todos os aspectos, que não são poucos, dos produtos colocados no mercado pela indústria da eletrônica, deixando para trás a intervenção ou questionamento da máquina. A opção artista-usuário é um fato tão enraizado no lidar com a tecnologia que, muitas vezes, este aspecto nem é notado por quem está trabalhando frente a um computador, por exemplo. Vilém Flusser, em seu livro A Filosofia da Caixa Preta [Flusser, 19??], critica as pessoas que apenas utilizam as máquinas e programas sem intervir ou questionar seu funcionamento, quer dizer, sem branquear o que ele chama de caixas pretas da tecnologia. Agindo como usuário, o artista passa a não ser verdadeiramente interventor. Estaria demonstrando ou apenas repetindo o que a máquina lhe sugere, sem ser o verdadeiro sujeito da transformação criadora, que é o pressuposto por uma experimentação inovadora, também no que diz respeito à utilização da máquina. O perfil do trabalho artístico que é construído utilizando-se a tecnologia, faz uma mistura interessante entre o intelecto e a intuição, exigindo uma postura mais interativa e interventiva do artista. A segunda opção que se apresenta ao artista é se transformar também num engenheiro ou programador. Este fato traria como conseqüência imediata o prazer, que muitos artistas sentem, em trabalhar isolado, reforçando a idéia Renascentista de que o artista é um gênio criador, e sua criação é produto de um processo criativo individual, não dependendo de alguém que traduza as suas idéias estéticas em tecnologia operacional, podendo construir e destruir as máquinas por ele mesmo. Enfim, se tornar um engenheiro-artista, ou um programador-artista afastaria os problemas advindos da interação de um grupo interdisciplinar que se propõe a criar, problemas estes que começam já na formação do tal grupo. Por outro lado, apresentaria um fato bastante preocupante, que seria o tempo a ser gasto no estudo da engenharia ou programação de computadores e máquinas, suficiente para livrá-lo de qualquer interação. REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA Periodico Técnico Científico dos Programas de Pós -Graduação em Tecnologia dos CEFETs - PR/MG/RJ 112
  • 3. A terceira opção parece ser a mais radical. Seria possível hoje, alguém simplesmente negar a tecnologia e se recusar a fazer parte, ou ainda, não deixar que a tecnologia faça parte de suas ações imaginativas e criativas? Em termos de uma legitimação da tecnologia, talvez haja essa possibilidade, mas ainda aqui o artista teria de trabalhar com outras pessoas, que fizessem a ponte entre sua obra e o mundo tecnológico que hoje se molda, quando necessário fosse. Por fim, a última opção: trabalhar em parceria. Criar um ambiente de interação com a máquina e com o outro, ou outros seres-humanos, formando um grupo de artistas, que envolveria pessoas de várias áreas. Como visto na Segunda opção comentada anteriormente, essa parceria pode se transformar num problema, se visto de um ângulo fora da interação, pois exige uma outra, ou outras partes, dispostas a participar de processos alternativos e inovadores, que nem sempre se encontram facilmente disponíveis. Seria, idealizadamente, um grupo inter/multi/transdisciplinar, que abrigaria pessoas capazes em várias áreas, trabalhando em torno de uma ou muitas idéias estéticas. Segundo Paulo Laurentiz, em seu livro “A Holarquia do Pensamento Artístico” [Laurentiz, 1991], o artista da era eletrônica comunga com um tempo em que há o sentido de cooperação entre homem e natureza, traduzido em arte. Esse tempo traduz a passagem da relação olho-mão do artista da era industrial para a relação mente-mundo do artista da era eletrônica. Esse seria o papel do artista, que estaria assim branqueando, usando aqui termos de Flusser, a caixa preta da tecnologia e a transformaria em linguagem de comunicação? Ainda sobre trabalhar em parceria, Arlindo Machado, no mesmo artigo citado acima [ Machado, 199?], comenta que “nos territórios da arte que lida com processos tecnológicos, a parceria possibilita dar forma orgânica aos vários talentos diferenciados e equacionar certeiramente as atuais demandas do trabalho artístico, que são conhecimento e intuição, sensibilidade e rigor, disciplina e anarquia criativa. Artistas, em geral, não dominam problemas científicos e tecnológicos; cientistas e engenheiros, em contrapartida, não estão a par do complexo intrincado de motivações da arte contemporânea. Conjuntamente, ambos podem superar suas respectivas deficiências e contribuir para recuperar a antiga idéia grega de téchne, que compreendia tanto a invenção técnica quanto a expressão artística”. A opção a ser feita pelo artista não é coisa simples e nem se apresenta de forma objetiva. Geralmente, os artistas acabam experimentando uma, duas, ou mais destas opções durante sua vida REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA Periodico Técnico Científico dos Programas de Pós -Graduação em Tecnologia dos CEFETs - PR/MG/RJ 113
  • 4. profissional, inclusive experimentando a formação e a sua integração em grupos formados em torno de uma idéia estética, até encontrarem o nível de competência tecnológica em que devem atuar. Mas, ainda dentro da discussão que hora se inicia, existe uma outra questão que permeia todo o problema: os dispositivos eletrônicos utilizados pelos artistas (grupo-artista ou somente artista) em suas criações estéticas, devem ser encarados como ferramentas ou como linguagem? Segundo Edmond Couchot [Couchot, 199?], a questão é bastante complexa: A primeira vez que um dispositivo eletrônico é apresentado a um artista, a impressão inicial é de caixas pretas, quer dizer, seu funcionamento ainda lhes parece deveras misterioso e intrincado, forçando-os até a se aproximar por mera curiosidade. Assim, neste momento, o artista está comungando com a primeira opção: são apenas usuários, e estariam somente experimentando as possíveis combinações que a própria fábrica dos equipamentos lhes oferecem. Estariam utilizando a tecnologia como ferramenta, quer dizer, sem grandes intervenções ou questionamentos. Como cita Couchot [Couchot, 199?], o fotógrafo, por exemplo, sempre tem presente, mesmo inconscientemente, que quando direciona uma câmera para um modelo e aperta determinado botão, seu resultado será uma imagem bidimensional interpretada pela mesma câmera, partindo daquilo que serviu de motivo tridimensional e que pousou alguns segundos. Então, mesmo não conhecendo todas as equações que envolvem a engenhoca das objetivas e nem as reações químicas que ocorrem nos componentes da emulsão fotográfica, ele terá a sua fotografia, pois, rigorosamente, pode-se fotografar sem conhecer as leis da óptica fisiológica e nem as propriedades fotoquímicas da película, nem ainda as regras da perspectiva. As câmeras modernas estão equipadas, e já vêm de fábrica com essa configuração, com fotômetros e foco ajustados automaticamente. Quando pensamos no artista frente ao computador, pode acontecer a mesma coisa. Objetos de arte que mais parecem uma demons tração do programa instalado dentro daquela máquina que está sendo utilizada. Como usuários, tanto o fotógrafo quanto o artista que utiliza o computador, estão utilizando os dispositivos tecnológicos apenas como ferramenta. Utilizar os dispositivos para a construção de trabalhos artísticos como ferramenta significa explorar o que já estava previsto na fábrica, como opção de trabalho artístico. É subestimar o instrumento e a capacidade do artista. REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA Periodico Técnico Científico dos Programas de Pós -Graduação em Tecnologia dos CEFETs - PR/MG/RJ 114
  • 5. Segundo o mesmo Couchot [ ], acontece que a caixa preta chamada computador não é uma caixa preta comum. Ela não é constituída apenas de circuitos eletrônicos de hardware. O computador tem também as chamadas linguagens formais, os softwares, os programas, os algoritmos. Assim, o computador tem apenas uma parte que está programada em fábrica, a outra se deixa programar de muitas maneiras diferentes, sendo assim o que Couchot chama de uma máquina genérica, isto é, uma máquina com quase infinitas maneiras de ser programada. Este fato o capacita a ter duas interpretações: o computador pode ser utilizado como ferramenta ou como linguagem. Já o vimos como ferramenta. Por outro lado, utilizar o computador como linguagem é se tornar verdadeiramente interventor. É penetrar no interior da caixa preta, para interferir em seu funcionamento interno (seja positivamente, no sentido de colocar a máquina a trabalhar em benefício de suas idéias estéticas, seja negativamente, no sentido de desvelar as determinações que ela impõe). Esse procedimento não é somente possível a uma classe muito especial de artistas, aquela dotada também de competência científica e tecnológica, mas aqueles menos dotados em termos de formação técnica, que também descobrem os seus próprios caminhos, e acabam por explorar a caixa preta a seu modo. Porém, como todos sabemos, em alguns momentos, o computador ainda é utilizado apenas como ferramenta. Podemos citar, por exemplo, o tão falado e estudado caso do computador em sala-de-aula. Geralmente, ainda o computador é utilizado apenas como ferramenta pelo professor , que acaba impondo a seus alunos sua utilização como sendo a única opção possível e inovadora, reduzindo-se ao adestramento do indivíduo para que execute bem uma determinada técnica ou tarefa. Seria ter o computador como lousa e giz. Então, porque a presença do computador? Na utilização do computador colocada como linguagem, o aluno pode compreender os fundamentos da máquina e, consequentemente, a sua dinâmica em relação aos processos tecnológicos, sem separação entre outras dimensões, tais como as d imensões econômicas, sociais, culturais, ambientais e éticas do nosso mundo de tecnocentrismos, ajudando no desenvolvimento de uma consciência crítica e capaz de se comunicar abertamente. Significa encarar a tecnologia como parte integrante do conteúdo programático desenvolvido em cada disciplina, desenvolvendo nos alunos o prazer de viver livremente num mundo povoado pela tecnologia. Em forma de conclusão, os dispositivos eletrônicos utilizados tanto por artistas quanto por funcionários em fábrica ou alunos e professores em REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA Periodico Técnico Científico dos Programas de Pós -Graduação em Tecnologia dos CEFETs - PR/MG/RJ 115
  • 6. sala de aula, interferem, como muitos já disseram, em nosso modo de vida e de construção do pensamento, além de interferir também em nossa capacidade criadora e nas formas de percepção do mundo. Os artistas têm um grande e nobre papel dentro disso tudo que seria ajudar a desvendar e desencadear todas as conseqüências referentes à produção e inovação tecnológica, que de outro modo passaria despercebido ou disfarçado. Referência FLUSSER, V. A Filosofia da Caixa Preta, São Paulo: Hucitec, LAURENTIZ, P. A Holarquia do Pensamento Artístico, Campinas: Ed. da UNICAMP, 1991. MACHADO, A. Repensando Flusser e as Imagens Técnicas REVISTA EDUCAÇÃO & TECNOLOGIA Periodico Técnico Científico dos Programas de Pós -Graduação em Tecnologia dos CEFETs - PR/MG/RJ 116