SlideShare uma empresa Scribd logo
1 de 4
Baixar para ler offline
VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR PRATICADA CONTRA A CRIANÇA: A
                     QUEM COMPETE PRODUZIR A PROVA?


                                                     Maria Regina Fay de Azambuja1


     A condição de sujeito de direitos é uma conquista recente da criança. A
infância, historicamente vista como objeto a serviço dos interesses dos adultos, a
partir do século XX, passa a ser compreendida como etapa do desenvolvimento
humano. Vários documentos internacionais alertam para a sua relevância,
desencadeando a revisão das legislações, condutas e procedimentos adotados com
o intuito de garantir direitos àqueles que ainda não atingiram dezoito anos. No Brasil,
a Constituição Federal de 1988, em consonância com a Convenção das Nações
Unidas sobre os Direitos da Criança, é o divisor de águas, seguida, em 1990, pelo
Estatuto da Criança e do Adolescente. O princípio do interesse superior da criança
encontra seu fundamento no reconhecimento da peculiar condição de pessoa
humana em desenvolvimento atribuída à infância, valendo lembrar que “os atributos
da personalidade infanto-juvenil têm conteúdo distinto dos da personalidade dos
adultos”, trazem uma carga maior de vulnerabilidade, autorizando a quebra do
princípio da igualdade; enquanto os primeiros estão em fase de formação e
desenvolvimento de suas potencialidades humanas, os segundos estão na plenitude
de suas forças2.
     Devido à vulnerabilidade, as crianças estão expostas a várias formas de
violência, sendo que a violência sexual intrafamiliar é a que traz maiores dificuldades
de manejo, responsável por seqüelas que podem acompanhar a sua vida, com
reflexos no campo físico, social e psíquico, justificando o envolvimento de
profissionais de várias áreas do conhecimento na busca de alternativas de minorar
os danos. É comum a violência sexual intrafamiliar praticada contra a criança vir
desacompanhada de vestígios físicos, acarretando para o Sistema de Justiça
inúmeras dificuldades para desvendar os comunicados e ocorrências que chegam
ao Conselho Tutelar e à Delegacia de Polícia, assim como as denúncias que
aportam nas Varas Criminais e nos litígios que se deflagram nas Varas de Família,
através de disputas de guarda e regulamentação de visitas. A inexistência de
vestígios físicos, aliada à falta de testemunhas presenciais, uma vez que a violência
sexual intrafamiliar praticada contra a criança geralmente se dá na clandestinidade,
2
levaram os Tribunais a valorizar a palavra da vítima, favorecendo a sua exposição a
inúmeros depoimentos no afã de produzir a prova e possibilitar a condenação do
réu.
       Exigir da vítima a responsabilidade pela produção da prova da violência sexual,
através do depoimento judicial, como costumeiramente se faz, não seria uma nova
violência contra a criança? Estaria a criança obrigada a depor? Estes e outros
questionamentos precisam ser enfrentados sob a ótica da Doutrina da Proteção
Integral.
       O reconhecimento dos direitos humanos e o avanço dos conhecimentos na
área da saúde mental exigem novas formas de proceder visando assegurar à
criança o desenvolvimento, em condições de dignidade, passando a ser dever de
todos evitar qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência,
crueldade e opressão (artigos 5º e 70 do ECA). Inquirir a vítima, ainda que através
de métodos que visam dar outra roupagem à inquirição3, com o intuito de produzir
prova e elevar os índices de condenação, não assegura a credibilidade pretendida,
além de expor, a criança, a nova violência, ao forçá-la a reviver situação traumática,
renovando o dano psíquico produzido pelo abuso. Enquanto a primeira violência foi
de origem sexual, a segunda passa a ser psíquica e jurídica, na medida em que se
espera que a materialidade, que deveria ser produzida por peritos capacitados,
venha ao bojo dos autos através do depoimento da criança, sem qualquer respeito
às suas condições de imaturidade. Direito de ser “ouvida”, como prevê a Convenção
(art. 12), não tem o mesmo significado de ser “inquirida”. Considerar a “fala” da
criança necessariamente não exige o uso da palavra falada, porquanto o sentido da
norma é muito mais amplo, estando a significar a necessidade de respeito
incondicional à criança em face de suas condições de desenvolvimento. A inquirição
destina-se a produzir prova, podendo levar o abusador, com quem tem laços
afetivos, ainda que distorcidos, à cadeia, recaindo sobre a ela a responsabilidade
pelo evento. É comum, a criança avistar o abusador, no ambiente forense, por
ocasião de sua inquirição, ainda que o depoimento não seja prestado na sua
presença, fato que contribui para reacender o conflito e a ambivalência de seus
sentimentos, porquanto, em muitos casos, “nutre forte apego pelo abusador, com
quem, no mais das vezes, mantém vínculos parentais significativos”4. Delegacias de
Polícia, Fóruns e Tribunais não são locais apropriados para crianças; são,
essencialmente, espaços de resolução de litígios envolvendo adultos.
3
     A perícia, levada a efeito por psicólogos e/ou psiquiatras, especialistas na
infância e adolescência, no lugar da inquirição judicial da criança, nos crimes
envolvendo violência sexual, com ou sem vestígios físicos, mostra-se a melhor
alternativa, permitindo ao Julgador obter a prova através da constatação das
lesões ou danos ao aparelho psíquico da vítima, podendo a autoridade judiciária
e as partes oferecerem quesitos a serem respondidos pelo Perito5. Quando a
violência deixa vestígios físicos, não é a autoridade judicial que faz a constatação
direta das lesões, na sala de audiências, cabendo ao médico perito examinar o
corpo da vítima, em ambiente preservado, descrevendo os achados que serão
disponibilizados não só ao Julgador como também às partes, assegurado o
contraditório e a ampla defesa preconizados na Constituição Federal.
     Sustentamos que a autoridade judicial, diante de pedido dos representantes
legais da vítima, da própria vítima ou do Ministério Público, devidamente justificado,
de dispensa de prestar depoimento, poderá deferi-lo, levando em consideração as
condições pessoais da criança, como idade, aspectos emocionais, existência de
vínculo familiar ou afetivo com o réu. Ademais, “a criança pode sempre se recusar a
falar diante do juiz”, “o direito à oitiva tem como corolário o direito de recusar de
exprimir-se, isto é, o direito ao silêncio”, garantido expressamente na Carta Maior,
inclusive, ao réu (artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal)6.
     Substituir a inquirição da criança vítima de violência sexual intrafamiliar pela
perícia psicológica e/ou psiquiátrica, através de profissionais especializados na área
da infância, aliada a outros elementos de prova, como o estudo social e a avaliação
do próprio abusador (via de regra poupado até mesmo de uma criteriosa avaliação),
é o caminho capaz de assegurar à criança a proteção integral que a lei lhe confere,
reservando-se a medida apenas aos casos em que a criança manifesta o desejo de
ser ouvida pela autoridade judicial.
     É momento de pensar em instrumentos para averiguar o dano psíquico7,
situado no campo da proteção à saúde, em substituição à exigência da inquirição da
vítima, quando criança, evitando a reedição do trauma já experimentado.
Profissionais de várias áreas começam a perceber a relevância de sua atuação na
proteção à criança, repensando procedimentos e investindo em ações abraçadas
pelo manto da interdisciplinaridade. A mudança é lenta e há de começar por aqueles
que acreditam na possibilidade de avançar, mantendo acessa a chama da
esperança e preservando espaço para o sonho de uma vida mais digna à criança.
4

                                      Notas
1
  Procuradora de Justiça, Especialista em Violência Doméstica pela USP, Mestre em
Direito pela UNISINOS, Professora de Direito da Criança e do Adolescente e Direito
de Família na PUCRS, Palestrante na Fundação Escola Superior do Ministério
Público e Escola da Magistratura, Voluntária no Programa de Proteção à Criança do
Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Sócia do IBDFAM, IARGS, SORBI, ABMCJ,
CELG.
2
   MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e
adolescentes e os direitos humanos. Baruere: Manole, 2003, p. 115.
3
  No Senado Federal, encontra-se em andamento o Projeto de Lei da Câmara nº
35/2007, versando sobre o Depoimento sem Dano (andamento em 28/7/08:
Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania – Relatora Senadora Lúcia Vânia).
4
  BORBA, Maria Rosi de Meira. O duplo processo de vitimização da criança abusada
sexualmente: pelo abusador e pelo agente estatal, na apuração do evento delituoso.
Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 59, out. 2002, p. 3. Disponível em:
<http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3246> Acesso em: 1º dez. 2005.
5
  PEREIRA GOMES, Celeste Leite dos Santos; LEITE SANTOS, Maria Celeste
Cordeiro; SANTOS, José Américo dos. Dano Psíquico. São Paulo: Oliveira Mendes,
1998, p. 21.
6
  OLIVEIRA LEITE, Eduardo de. A oitiva de crianças nos processos de família.
Revista Jurídica, n. 278, dez. 2000, p. 33.
7
  Dano psíquico, ligado à noção de sofrimento psíquico e de dano moral, enseja
responsabilidade civil. Ver Apelações Cíveis nos 70011567195 (Quinta Câmara Cível,
Relator Dr. Antonio Vinicius Amaro da Silveira, 23 de junho de 2005, Porto Alegre) e
70010597631 (Nona Câmara Cível, Relator Des. Odone Sanguiné, 15 de junho de
2005, Porto Alegre) do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.

Mais conteúdo relacionado

Destaque

Los inicio de internet nos remontan a los
Los inicio de internet nos remontan a losLos inicio de internet nos remontan a los
Los inicio de internet nos remontan a losJohaan Guaarin
 
Ap 1. lettre de cadrage - v.2016.08 4-1029
Ap   1. lettre de cadrage - v.2016.08 4-1029Ap   1. lettre de cadrage - v.2016.08 4-1029
Ap 1. lettre de cadrage - v.2016.08 4-1029Mhammed Hamdaoui
 
Calendario de competición Alevín de 1º
Calendario de competición Alevín de 1ºCalendario de competición Alevín de 1º
Calendario de competición Alevín de 1ºJordi Masnou
 
Temas taller micro practico
Temas taller micro practicoTemas taller micro practico
Temas taller micro practicoJanny Melo
 
Curso de programação para iniciantes: Afinal, o que é uma linguagem de progra...
Curso de programação para iniciantes: Afinal, o que é uma linguagem de progra...Curso de programação para iniciantes: Afinal, o que é uma linguagem de progra...
Curso de programação para iniciantes: Afinal, o que é uma linguagem de progra...Curso de Programação
 
Informatica como crear base de datos
Informatica como crear base de datosInformatica como crear base de datos
Informatica como crear base de datosEdin Barcelona
 
사용자리서치 김승원, 박지은, 이서현 복사본
사용자리서치   김승원, 박지은, 이서현 복사본사용자리서치   김승원, 박지은, 이서현 복사본
사용자리서치 김승원, 박지은, 이서현 복사본서현 이
 
Miguel rojas portafolio_2013
Miguel rojas portafolio_2013Miguel rojas portafolio_2013
Miguel rojas portafolio_2013Miguel Rojas
 
Apostila informatica-para-concurso
Apostila informatica-para-concursoApostila informatica-para-concurso
Apostila informatica-para-concursodesueira
 
Detecting BGP Instability Using RQA
Detecting BGP Instability Using RQADetecting BGP Instability Using RQA
Detecting BGP Instability Using RQAUniversity of Kufa
 

Destaque (20)

Formato hoja de vida (2)
Formato hoja de vida (2)Formato hoja de vida (2)
Formato hoja de vida (2)
 
Planetaren ordua
Planetaren orduaPlanetaren ordua
Planetaren ordua
 
Los inicio de internet nos remontan a los
Los inicio de internet nos remontan a losLos inicio de internet nos remontan a los
Los inicio de internet nos remontan a los
 
Ap 1. lettre de cadrage - v.2016.08 4-1029
Ap   1. lettre de cadrage - v.2016.08 4-1029Ap   1. lettre de cadrage - v.2016.08 4-1029
Ap 1. lettre de cadrage - v.2016.08 4-1029
 
De citit
De cititDe citit
De citit
 
Calendario de competición Alevín de 1º
Calendario de competición Alevín de 1ºCalendario de competición Alevín de 1º
Calendario de competición Alevín de 1º
 
Temas taller micro practico
Temas taller micro practicoTemas taller micro practico
Temas taller micro practico
 
Hp de la apendice
Hp de la apendiceHp de la apendice
Hp de la apendice
 
резюме 12.16
резюме 12.16резюме 12.16
резюме 12.16
 
Curso de programação para iniciantes: Afinal, o que é uma linguagem de progra...
Curso de programação para iniciantes: Afinal, o que é uma linguagem de progra...Curso de programação para iniciantes: Afinal, o que é uma linguagem de progra...
Curso de programação para iniciantes: Afinal, o que é uma linguagem de progra...
 
Informatica como crear base de datos
Informatica como crear base de datosInformatica como crear base de datos
Informatica como crear base de datos
 
Pollito(1)
Pollito(1)Pollito(1)
Pollito(1)
 
사용자리서치 김승원, 박지은, 이서현 복사본
사용자리서치   김승원, 박지은, 이서현 복사본사용자리서치   김승원, 박지은, 이서현 복사본
사용자리서치 김승원, 박지은, 이서현 복사본
 
Miguel rojas portafolio_2013
Miguel rojas portafolio_2013Miguel rojas portafolio_2013
Miguel rojas portafolio_2013
 
Apostila informatica-para-concurso
Apostila informatica-para-concursoApostila informatica-para-concurso
Apostila informatica-para-concurso
 
Prezi
PreziPrezi
Prezi
 
Educación abierta re
Educación abierta reEducación abierta re
Educación abierta re
 
lf1-actsheet
lf1-actsheetlf1-actsheet
lf1-actsheet
 
Gestão da inovação
Gestão da inovaçãoGestão da inovação
Gestão da inovação
 
Detecting BGP Instability Using RQA
Detecting BGP Instability Using RQADetecting BGP Instability Using RQA
Detecting BGP Instability Using RQA
 

Semelhante a Abuso.sexual.intrafamiliar

Resenha trabalho final Psicologia Jurídica
Resenha trabalho final Psicologia JurídicaResenha trabalho final Psicologia Jurídica
Resenha trabalho final Psicologia JurídicaÁtila Lutz
 
Leitor de PDF(1).pptx
Leitor de PDF(1).pptxLeitor de PDF(1).pptx
Leitor de PDF(1).pptxssuser2ceaf21
 
.,.,.,.,.,. -----Tramaus
.,.,.,.,.,. -----Tramaus.,.,.,.,.,. -----Tramaus
.,.,.,.,.,. -----TramausRui Oliveira
 
Violência sexual infantil
Violência sexual infantilViolência sexual infantil
Violência sexual infantilEmanuel Oliveira
 
Monografia - Inquirição de crianças e adolescentes nos processos judiciais em...
Monografia - Inquirição de crianças e adolescentes nos processos judiciais em...Monografia - Inquirição de crianças e adolescentes nos processos judiciais em...
Monografia - Inquirição de crianças e adolescentes nos processos judiciais em...Joelma Barros
 
Adoção aspectos gerais no brasil
Adoção aspectos gerais no brasil Adoção aspectos gerais no brasil
Adoção aspectos gerais no brasil MatheusFagundes20
 
Pré projeto depoimento sem dano
Pré projeto   depoimento sem danoPré projeto   depoimento sem dano
Pré projeto depoimento sem danoJoelma Barros
 
Escuta crianca-adolescente
Escuta crianca-adolescenteEscuta crianca-adolescente
Escuta crianca-adolescenteACECTALCT
 
Oficina de preparação para os conselheiros tutelares
Oficina de preparação para os conselheiros tutelaresOficina de preparação para os conselheiros tutelares
Oficina de preparação para os conselheiros tutelaresRoberta Barros Barros
 
Estatuto da Criança e do Adolescente completa 22 Anos
Estatuto da Criança e do Adolescente completa 22 AnosEstatuto da Criança e do Adolescente completa 22 Anos
Estatuto da Criança e do Adolescente completa 22 Anosctpocoes
 
Meios de comunicação social e identificação de crianças envolvidas em process...
Meios de comunicação social e identificação de crianças envolvidas em process...Meios de comunicação social e identificação de crianças envolvidas em process...
Meios de comunicação social e identificação de crianças envolvidas em process...Ana Paula Pinto Lourenco
 

Semelhante a Abuso.sexual.intrafamiliar (20)

Resenha trabalho final Psicologia Jurídica
Resenha trabalho final Psicologia JurídicaResenha trabalho final Psicologia Jurídica
Resenha trabalho final Psicologia Jurídica
 
Presunção absoluta de violência no estupro de menor de 14 anos
Presunção absoluta de violência no estupro de menor de 14 anosPresunção absoluta de violência no estupro de menor de 14 anos
Presunção absoluta de violência no estupro de menor de 14 anos
 
SINDROME DA ALINEAÇÃO PARENTAL
SINDROME DA ALINEAÇÃO PARENTALSINDROME DA ALINEAÇÃO PARENTAL
SINDROME DA ALINEAÇÃO PARENTAL
 
Leitor de PDF(1).pptx
Leitor de PDF(1).pptxLeitor de PDF(1).pptx
Leitor de PDF(1).pptx
 
.,.,.,.,.,. -----Tramaus
.,.,.,.,.,. -----Tramaus.,.,.,.,.,. -----Tramaus
.,.,.,.,.,. -----Tramaus
 
Modelo parecer técnico - redução sem danos
Modelo   parecer técnico - redução sem danosModelo   parecer técnico - redução sem danos
Modelo parecer técnico - redução sem danos
 
Violência sexual infantil
Violência sexual infantilViolência sexual infantil
Violência sexual infantil
 
Monografia - Inquirição de crianças e adolescentes nos processos judiciais em...
Monografia - Inquirição de crianças e adolescentes nos processos judiciais em...Monografia - Inquirição de crianças e adolescentes nos processos judiciais em...
Monografia - Inquirição de crianças e adolescentes nos processos judiciais em...
 
Adoção aspectos gerais no brasil
Adoção aspectos gerais no brasil Adoção aspectos gerais no brasil
Adoção aspectos gerais no brasil
 
Vitimas de abuso
Vitimas de abusoVitimas de abuso
Vitimas de abuso
 
abuso sexxual
abuso sexxualabuso sexxual
abuso sexxual
 
Lei do menino bernardo
Lei do menino bernardoLei do menino bernardo
Lei do menino bernardo
 
Lei do menino bernardo
Lei do menino bernardoLei do menino bernardo
Lei do menino bernardo
 
Pré projeto depoimento sem dano
Pré projeto   depoimento sem danoPré projeto   depoimento sem dano
Pré projeto depoimento sem dano
 
Amaz 6 7_dom_esp (1)
Amaz 6 7_dom_esp (1)Amaz 6 7_dom_esp (1)
Amaz 6 7_dom_esp (1)
 
Escuta crianca-adolescente
Escuta crianca-adolescenteEscuta crianca-adolescente
Escuta crianca-adolescente
 
Oficina de preparação para os conselheiros tutelares
Oficina de preparação para os conselheiros tutelaresOficina de preparação para os conselheiros tutelares
Oficina de preparação para os conselheiros tutelares
 
Estatuto da Criança e do Adolescente completa 22 Anos
Estatuto da Criança e do Adolescente completa 22 AnosEstatuto da Criança e do Adolescente completa 22 Anos
Estatuto da Criança e do Adolescente completa 22 Anos
 
Alienação Parental
Alienação ParentalAlienação Parental
Alienação Parental
 
Meios de comunicação social e identificação de crianças envolvidas em process...
Meios de comunicação social e identificação de crianças envolvidas em process...Meios de comunicação social e identificação de crianças envolvidas em process...
Meios de comunicação social e identificação de crianças envolvidas em process...
 

Último

Apresente de forma sucinta as atividades realizadas ao longo do semestre, con...
Apresente de forma sucinta as atividades realizadas ao longo do semestre, con...Apresente de forma sucinta as atividades realizadas ao longo do semestre, con...
Apresente de forma sucinta as atividades realizadas ao longo do semestre, con...Colaborar Educacional
 
1. CIENCIAS-HUMANAS-GLOBALIZAÇÃO, TEMPO E ESPAÇO-V1.pdf
1. CIENCIAS-HUMANAS-GLOBALIZAÇÃO, TEMPO E ESPAÇO-V1.pdf1. CIENCIAS-HUMANAS-GLOBALIZAÇÃO, TEMPO E ESPAÇO-V1.pdf
1. CIENCIAS-HUMANAS-GLOBALIZAÇÃO, TEMPO E ESPAÇO-V1.pdfRitoneltonSouzaSanto
 
Depende De Nós! José Ernesto Ferraresso.ppsx
Depende De Nós! José Ernesto Ferraresso.ppsxDepende De Nós! José Ernesto Ferraresso.ppsx
Depende De Nós! José Ernesto Ferraresso.ppsxLuzia Gabriele
 
Ressonancia_magnetica_basica_slide_da_net.pptx
Ressonancia_magnetica_basica_slide_da_net.pptxRessonancia_magnetica_basica_slide_da_net.pptx
Ressonancia_magnetica_basica_slide_da_net.pptxPatriciaFarias81
 
A Congregação de Jesus e Maria, conhecida também como os Eudistas, foi fundad...
A Congregação de Jesus e Maria, conhecida também como os Eudistas, foi fundad...A Congregação de Jesus e Maria, conhecida também como os Eudistas, foi fundad...
A Congregação de Jesus e Maria, conhecida também como os Eudistas, foi fundad...Unidad de Espiritualidad Eudista
 
Poder do convencimento,........... .
Poder do convencimento,...........         .Poder do convencimento,...........         .
Poder do convencimento,........... .WAGNERJESUSDACUNHA
 
Cruzadinha da dengue - Mosquito Aedes aegypti
Cruzadinha da dengue - Mosquito Aedes aegyptiCruzadinha da dengue - Mosquito Aedes aegypti
Cruzadinha da dengue - Mosquito Aedes aegyptiMary Alvarenga
 
Poema sobre o mosquito Aedes aegipyti -
Poema sobre o mosquito Aedes aegipyti  -Poema sobre o mosquito Aedes aegipyti  -
Poema sobre o mosquito Aedes aegipyti -Mary Alvarenga
 
AS REBELIÕES NA AMERICA IBERICA (Prof. Francisco Leite)
AS REBELIÕES NA AMERICA IBERICA (Prof. Francisco Leite)AS REBELIÕES NA AMERICA IBERICA (Prof. Francisco Leite)
AS REBELIÕES NA AMERICA IBERICA (Prof. Francisco Leite)profesfrancleite
 
autismo conhecer.pptx, Conhecer para entender
autismo conhecer.pptx, Conhecer para entenderautismo conhecer.pptx, Conhecer para entender
autismo conhecer.pptx, Conhecer para entenderLucliaResende1
 
Verbos - transitivos e intransitivos.pdf
Verbos -  transitivos e intransitivos.pdfVerbos -  transitivos e intransitivos.pdf
Verbos - transitivos e intransitivos.pdfKarinaSouzaCorreiaAl
 
Como fazer um Feedback Eficaz - Comitê de Gestores
Como fazer um Feedback Eficaz - Comitê de GestoresComo fazer um Feedback Eficaz - Comitê de Gestores
Como fazer um Feedback Eficaz - Comitê de GestoresEu Prefiro o Paraíso.
 
QUIZ - GEOGRAFIA - 8º ANO - FASES DO CAPITALISMO.pptx
QUIZ - GEOGRAFIA - 8º ANO - FASES DO CAPITALISMO.pptxQUIZ - GEOGRAFIA - 8º ANO - FASES DO CAPITALISMO.pptx
QUIZ - GEOGRAFIA - 8º ANO - FASES DO CAPITALISMO.pptxAntonioVieira539017
 
ARTE BARROCA E ROCOCO BRASILEIRO-min.pdf
ARTE BARROCA E ROCOCO BRASILEIRO-min.pdfARTE BARROCA E ROCOCO BRASILEIRO-min.pdf
ARTE BARROCA E ROCOCO BRASILEIRO-min.pdfItaloAtsoc
 
arte retrato de um povo - Expressão Cultural e Identidade Nacional
arte retrato de um povo - Expressão Cultural e Identidade Nacionalarte retrato de um povo - Expressão Cultural e Identidade Nacional
arte retrato de um povo - Expressão Cultural e Identidade Nacionalidicacia
 
FORMAÇÃO POVO BRASILEIRO atividade de história
FORMAÇÃO POVO BRASILEIRO atividade de históriaFORMAÇÃO POVO BRASILEIRO atividade de história
FORMAÇÃO POVO BRASILEIRO atividade de históriaBenigno Andrade Vieira
 
Caça palavras - BULLYING
Caça palavras  -  BULLYING  Caça palavras  -  BULLYING
Caça palavras - BULLYING Mary Alvarenga
 
A CONCEPÇÃO FILO/SOCIOLÓGICA DE KARL MARX
A CONCEPÇÃO FILO/SOCIOLÓGICA DE KARL MARXA CONCEPÇÃO FILO/SOCIOLÓGICA DE KARL MARX
A CONCEPÇÃO FILO/SOCIOLÓGICA DE KARL MARXHisrelBlog
 

Último (20)

Apresente de forma sucinta as atividades realizadas ao longo do semestre, con...
Apresente de forma sucinta as atividades realizadas ao longo do semestre, con...Apresente de forma sucinta as atividades realizadas ao longo do semestre, con...
Apresente de forma sucinta as atividades realizadas ao longo do semestre, con...
 
1. CIENCIAS-HUMANAS-GLOBALIZAÇÃO, TEMPO E ESPAÇO-V1.pdf
1. CIENCIAS-HUMANAS-GLOBALIZAÇÃO, TEMPO E ESPAÇO-V1.pdf1. CIENCIAS-HUMANAS-GLOBALIZAÇÃO, TEMPO E ESPAÇO-V1.pdf
1. CIENCIAS-HUMANAS-GLOBALIZAÇÃO, TEMPO E ESPAÇO-V1.pdf
 
Depende De Nós! José Ernesto Ferraresso.ppsx
Depende De Nós! José Ernesto Ferraresso.ppsxDepende De Nós! José Ernesto Ferraresso.ppsx
Depende De Nós! José Ernesto Ferraresso.ppsx
 
Ressonancia_magnetica_basica_slide_da_net.pptx
Ressonancia_magnetica_basica_slide_da_net.pptxRessonancia_magnetica_basica_slide_da_net.pptx
Ressonancia_magnetica_basica_slide_da_net.pptx
 
Abordagem 3. Análise interpretativa (Severino, 2013)_PdfToPowerPoint.pdf
Abordagem 3. Análise interpretativa (Severino, 2013)_PdfToPowerPoint.pdfAbordagem 3. Análise interpretativa (Severino, 2013)_PdfToPowerPoint.pdf
Abordagem 3. Análise interpretativa (Severino, 2013)_PdfToPowerPoint.pdf
 
A Congregação de Jesus e Maria, conhecida também como os Eudistas, foi fundad...
A Congregação de Jesus e Maria, conhecida também como os Eudistas, foi fundad...A Congregação de Jesus e Maria, conhecida também como os Eudistas, foi fundad...
A Congregação de Jesus e Maria, conhecida também como os Eudistas, foi fundad...
 
Poder do convencimento,........... .
Poder do convencimento,...........         .Poder do convencimento,...........         .
Poder do convencimento,........... .
 
Cruzadinha da dengue - Mosquito Aedes aegypti
Cruzadinha da dengue - Mosquito Aedes aegyptiCruzadinha da dengue - Mosquito Aedes aegypti
Cruzadinha da dengue - Mosquito Aedes aegypti
 
Poema sobre o mosquito Aedes aegipyti -
Poema sobre o mosquito Aedes aegipyti  -Poema sobre o mosquito Aedes aegipyti  -
Poema sobre o mosquito Aedes aegipyti -
 
AS REBELIÕES NA AMERICA IBERICA (Prof. Francisco Leite)
AS REBELIÕES NA AMERICA IBERICA (Prof. Francisco Leite)AS REBELIÕES NA AMERICA IBERICA (Prof. Francisco Leite)
AS REBELIÕES NA AMERICA IBERICA (Prof. Francisco Leite)
 
autismo conhecer.pptx, Conhecer para entender
autismo conhecer.pptx, Conhecer para entenderautismo conhecer.pptx, Conhecer para entender
autismo conhecer.pptx, Conhecer para entender
 
Verbos - transitivos e intransitivos.pdf
Verbos -  transitivos e intransitivos.pdfVerbos -  transitivos e intransitivos.pdf
Verbos - transitivos e intransitivos.pdf
 
Como fazer um Feedback Eficaz - Comitê de Gestores
Como fazer um Feedback Eficaz - Comitê de GestoresComo fazer um Feedback Eficaz - Comitê de Gestores
Como fazer um Feedback Eficaz - Comitê de Gestores
 
QUIZ - GEOGRAFIA - 8º ANO - FASES DO CAPITALISMO.pptx
QUIZ - GEOGRAFIA - 8º ANO - FASES DO CAPITALISMO.pptxQUIZ - GEOGRAFIA - 8º ANO - FASES DO CAPITALISMO.pptx
QUIZ - GEOGRAFIA - 8º ANO - FASES DO CAPITALISMO.pptx
 
ARTE BARROCA E ROCOCO BRASILEIRO-min.pdf
ARTE BARROCA E ROCOCO BRASILEIRO-min.pdfARTE BARROCA E ROCOCO BRASILEIRO-min.pdf
ARTE BARROCA E ROCOCO BRASILEIRO-min.pdf
 
arte retrato de um povo - Expressão Cultural e Identidade Nacional
arte retrato de um povo - Expressão Cultural e Identidade Nacionalarte retrato de um povo - Expressão Cultural e Identidade Nacional
arte retrato de um povo - Expressão Cultural e Identidade Nacional
 
FORMAÇÃO POVO BRASILEIRO atividade de história
FORMAÇÃO POVO BRASILEIRO atividade de históriaFORMAÇÃO POVO BRASILEIRO atividade de história
FORMAÇÃO POVO BRASILEIRO atividade de história
 
Caça palavras - BULLYING
Caça palavras  -  BULLYING  Caça palavras  -  BULLYING
Caça palavras - BULLYING
 
A CONCEPÇÃO FILO/SOCIOLÓGICA DE KARL MARX
A CONCEPÇÃO FILO/SOCIOLÓGICA DE KARL MARXA CONCEPÇÃO FILO/SOCIOLÓGICA DE KARL MARX
A CONCEPÇÃO FILO/SOCIOLÓGICA DE KARL MARX
 
Abordagem 1. Análise textual (Severino, 2013).pdf
Abordagem 1. Análise textual (Severino, 2013).pdfAbordagem 1. Análise textual (Severino, 2013).pdf
Abordagem 1. Análise textual (Severino, 2013).pdf
 

Abuso.sexual.intrafamiliar

  • 1. VIOLÊNCIA SEXUAL INTRAFAMILIAR PRATICADA CONTRA A CRIANÇA: A QUEM COMPETE PRODUZIR A PROVA? Maria Regina Fay de Azambuja1 A condição de sujeito de direitos é uma conquista recente da criança. A infância, historicamente vista como objeto a serviço dos interesses dos adultos, a partir do século XX, passa a ser compreendida como etapa do desenvolvimento humano. Vários documentos internacionais alertam para a sua relevância, desencadeando a revisão das legislações, condutas e procedimentos adotados com o intuito de garantir direitos àqueles que ainda não atingiram dezoito anos. No Brasil, a Constituição Federal de 1988, em consonância com a Convenção das Nações Unidas sobre os Direitos da Criança, é o divisor de águas, seguida, em 1990, pelo Estatuto da Criança e do Adolescente. O princípio do interesse superior da criança encontra seu fundamento no reconhecimento da peculiar condição de pessoa humana em desenvolvimento atribuída à infância, valendo lembrar que “os atributos da personalidade infanto-juvenil têm conteúdo distinto dos da personalidade dos adultos”, trazem uma carga maior de vulnerabilidade, autorizando a quebra do princípio da igualdade; enquanto os primeiros estão em fase de formação e desenvolvimento de suas potencialidades humanas, os segundos estão na plenitude de suas forças2. Devido à vulnerabilidade, as crianças estão expostas a várias formas de violência, sendo que a violência sexual intrafamiliar é a que traz maiores dificuldades de manejo, responsável por seqüelas que podem acompanhar a sua vida, com reflexos no campo físico, social e psíquico, justificando o envolvimento de profissionais de várias áreas do conhecimento na busca de alternativas de minorar os danos. É comum a violência sexual intrafamiliar praticada contra a criança vir desacompanhada de vestígios físicos, acarretando para o Sistema de Justiça inúmeras dificuldades para desvendar os comunicados e ocorrências que chegam ao Conselho Tutelar e à Delegacia de Polícia, assim como as denúncias que aportam nas Varas Criminais e nos litígios que se deflagram nas Varas de Família, através de disputas de guarda e regulamentação de visitas. A inexistência de vestígios físicos, aliada à falta de testemunhas presenciais, uma vez que a violência sexual intrafamiliar praticada contra a criança geralmente se dá na clandestinidade,
  • 2. 2 levaram os Tribunais a valorizar a palavra da vítima, favorecendo a sua exposição a inúmeros depoimentos no afã de produzir a prova e possibilitar a condenação do réu. Exigir da vítima a responsabilidade pela produção da prova da violência sexual, através do depoimento judicial, como costumeiramente se faz, não seria uma nova violência contra a criança? Estaria a criança obrigada a depor? Estes e outros questionamentos precisam ser enfrentados sob a ótica da Doutrina da Proteção Integral. O reconhecimento dos direitos humanos e o avanço dos conhecimentos na área da saúde mental exigem novas formas de proceder visando assegurar à criança o desenvolvimento, em condições de dignidade, passando a ser dever de todos evitar qualquer forma de negligência, discriminação, exploração, violência, crueldade e opressão (artigos 5º e 70 do ECA). Inquirir a vítima, ainda que através de métodos que visam dar outra roupagem à inquirição3, com o intuito de produzir prova e elevar os índices de condenação, não assegura a credibilidade pretendida, além de expor, a criança, a nova violência, ao forçá-la a reviver situação traumática, renovando o dano psíquico produzido pelo abuso. Enquanto a primeira violência foi de origem sexual, a segunda passa a ser psíquica e jurídica, na medida em que se espera que a materialidade, que deveria ser produzida por peritos capacitados, venha ao bojo dos autos através do depoimento da criança, sem qualquer respeito às suas condições de imaturidade. Direito de ser “ouvida”, como prevê a Convenção (art. 12), não tem o mesmo significado de ser “inquirida”. Considerar a “fala” da criança necessariamente não exige o uso da palavra falada, porquanto o sentido da norma é muito mais amplo, estando a significar a necessidade de respeito incondicional à criança em face de suas condições de desenvolvimento. A inquirição destina-se a produzir prova, podendo levar o abusador, com quem tem laços afetivos, ainda que distorcidos, à cadeia, recaindo sobre a ela a responsabilidade pelo evento. É comum, a criança avistar o abusador, no ambiente forense, por ocasião de sua inquirição, ainda que o depoimento não seja prestado na sua presença, fato que contribui para reacender o conflito e a ambivalência de seus sentimentos, porquanto, em muitos casos, “nutre forte apego pelo abusador, com quem, no mais das vezes, mantém vínculos parentais significativos”4. Delegacias de Polícia, Fóruns e Tribunais não são locais apropriados para crianças; são, essencialmente, espaços de resolução de litígios envolvendo adultos.
  • 3. 3 A perícia, levada a efeito por psicólogos e/ou psiquiatras, especialistas na infância e adolescência, no lugar da inquirição judicial da criança, nos crimes envolvendo violência sexual, com ou sem vestígios físicos, mostra-se a melhor alternativa, permitindo ao Julgador obter a prova através da constatação das lesões ou danos ao aparelho psíquico da vítima, podendo a autoridade judiciária e as partes oferecerem quesitos a serem respondidos pelo Perito5. Quando a violência deixa vestígios físicos, não é a autoridade judicial que faz a constatação direta das lesões, na sala de audiências, cabendo ao médico perito examinar o corpo da vítima, em ambiente preservado, descrevendo os achados que serão disponibilizados não só ao Julgador como também às partes, assegurado o contraditório e a ampla defesa preconizados na Constituição Federal. Sustentamos que a autoridade judicial, diante de pedido dos representantes legais da vítima, da própria vítima ou do Ministério Público, devidamente justificado, de dispensa de prestar depoimento, poderá deferi-lo, levando em consideração as condições pessoais da criança, como idade, aspectos emocionais, existência de vínculo familiar ou afetivo com o réu. Ademais, “a criança pode sempre se recusar a falar diante do juiz”, “o direito à oitiva tem como corolário o direito de recusar de exprimir-se, isto é, o direito ao silêncio”, garantido expressamente na Carta Maior, inclusive, ao réu (artigo 5º, inciso LXIII, da Constituição Federal)6. Substituir a inquirição da criança vítima de violência sexual intrafamiliar pela perícia psicológica e/ou psiquiátrica, através de profissionais especializados na área da infância, aliada a outros elementos de prova, como o estudo social e a avaliação do próprio abusador (via de regra poupado até mesmo de uma criteriosa avaliação), é o caminho capaz de assegurar à criança a proteção integral que a lei lhe confere, reservando-se a medida apenas aos casos em que a criança manifesta o desejo de ser ouvida pela autoridade judicial. É momento de pensar em instrumentos para averiguar o dano psíquico7, situado no campo da proteção à saúde, em substituição à exigência da inquirição da vítima, quando criança, evitando a reedição do trauma já experimentado. Profissionais de várias áreas começam a perceber a relevância de sua atuação na proteção à criança, repensando procedimentos e investindo em ações abraçadas pelo manto da interdisciplinaridade. A mudança é lenta e há de começar por aqueles que acreditam na possibilidade de avançar, mantendo acessa a chama da esperança e preservando espaço para o sonho de uma vida mais digna à criança.
  • 4. 4 Notas 1 Procuradora de Justiça, Especialista em Violência Doméstica pela USP, Mestre em Direito pela UNISINOS, Professora de Direito da Criança e do Adolescente e Direito de Família na PUCRS, Palestrante na Fundação Escola Superior do Ministério Público e Escola da Magistratura, Voluntária no Programa de Proteção à Criança do Hospital de Clínicas de Porto Alegre, Sócia do IBDFAM, IARGS, SORBI, ABMCJ, CELG. 2 MACHADO, Martha de Toledo. A proteção constitucional de crianças e adolescentes e os direitos humanos. Baruere: Manole, 2003, p. 115. 3 No Senado Federal, encontra-se em andamento o Projeto de Lei da Câmara nº 35/2007, versando sobre o Depoimento sem Dano (andamento em 28/7/08: Comissão de Constituição, Justiça e Cidadania – Relatora Senadora Lúcia Vânia). 4 BORBA, Maria Rosi de Meira. O duplo processo de vitimização da criança abusada sexualmente: pelo abusador e pelo agente estatal, na apuração do evento delituoso. Jus Navigandi, Teresina, ano 6, n. 59, out. 2002, p. 3. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=3246> Acesso em: 1º dez. 2005. 5 PEREIRA GOMES, Celeste Leite dos Santos; LEITE SANTOS, Maria Celeste Cordeiro; SANTOS, José Américo dos. Dano Psíquico. São Paulo: Oliveira Mendes, 1998, p. 21. 6 OLIVEIRA LEITE, Eduardo de. A oitiva de crianças nos processos de família. Revista Jurídica, n. 278, dez. 2000, p. 33. 7 Dano psíquico, ligado à noção de sofrimento psíquico e de dano moral, enseja responsabilidade civil. Ver Apelações Cíveis nos 70011567195 (Quinta Câmara Cível, Relator Dr. Antonio Vinicius Amaro da Silveira, 23 de junho de 2005, Porto Alegre) e 70010597631 (Nona Câmara Cível, Relator Des. Odone Sanguiné, 15 de junho de 2005, Porto Alegre) do Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul.