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[POESIAS]
Meu tempo
MARCO A. ROSSI
2015
MARCO A. ROSSI
[POESIAS]
Meu tempo
SUMÁRIO
4	 O tempo da poesia
5	Marighellianas
6	 As estrelas do mar
7	 Sob a chuva
8	 Na ponte, a flor
9	 Sexto round
10	Ela
11	Esquerda
12	 Coração do mundo
13	 Coração do mundo II
14	 A gente
15	Sartreana
16	 Novas últimas
17	 Orgulho do vagabundo
18	 Sétimo (e melhor) round
19	 Coração vermelho
20	 Visita íntima
21	 Últimos versos
22	Milagre
23	 Tão minha quanto as estrelas
24	Liberdade
25	 Depois do abismo
26	 Matei minhas musas
27	Todas
28	 Fim da linha
29	 Pedaço de beijo
30	 A moça que sorri
31	 Sol e Lua
32	 Um Cafajeste Latino
33	 Quatro letras
34	 Meus versos de adeus
35	 Meus erros
36	Havia
37	 Pugilista invisível
O tempo da poesia
	 Tentei desistir de fazer poesia, depois que lancei meu livro “Nas ruas do mundo”, em 2012, com os
versos que reuni nos dez anos que antecederam sua publicação.
	 Desistência inútil.
	 O poeta é uma vítima dos versos. As palavras o aprisionam e sufocam. Ao esboçar um poema, liber-
ta-se, para, em seguida, tornar-se mais uma vez refém de uma expressão poética sempre exigente e, ao que
parece, imortal.
	 Este e-book, cujo nome se refere à principal de nossas intransponibilidades, Meu tempo, é o fracas-
so de minha desistência de ser poeta. Quanto mais me dedico a outras formas da escrita (e tenho praticado
bastante esse exercício), mais estrofes me surgem, intrigam, induzem a revelá-las.
	 Desisti, então, de desistir.
	 Vou permanecer poeta para que o tempo não desista de mim.
Marco A. Rossi
5
Marighellianas
Livre iniciativa,
fluxos do grande capital,
ficção,
o dinheiro como centro do mundo,
o mundo como refém do dinheiro (de alguns).
Propriedade privada,
todo poder aos
mercados e bolsas,
aos epígonos e odes de
gestão, foco, clientes...
As tabelas e os
números, as
frequências e os dados.
Nada humano,
nenhum ser.
A orquestra toca uma
só canção: a da acumulação,
fácil e sem obstáculos,
pueril, uma estratégia de
gente infante, infame:
maldita ostentação.
Além do horizonte
(já se cantou tanto),
dentro do peito e no
sonho que não se cansa,
há vida, há muito mais.
Marighella corre em
nossa direção: não tenhamos
nunca tempo para
ter medo.
Nunca (Sempre ao nunca!).
6
As estrelas do mar
A insistência vem
da crença intensa
no ser que
está no mundo e faz
o chão que
pisa e
fortifica.
Os olhos limpos nascem
como a fruta que
se vê bela,
desejada e
deslumbrante,
o doce enigma da vida.
Entre lágrimas surge
a pergunta inquietante
e muitas vezes paralisante,
aquela que interpela
o mundo de ontem,
fracassado como lugar do humano.
Imagens são pré-conceitos,
ilusões que se disfarçam
na nossa pressa,
no pouco afinco de
rejeitar o profundo.
Minha luta é por
conceitos robustos que
ampliem e somem,
costurem convergências,
aceitem e desejem
mudar,
mudarem-se,
conjugar,
conjugarem-se.
A estrada é a das
estrelas, iluminada pela diversidade,
o mundo inteiro por que
passa a esperança e
o sorriso da vida
- as estrelas que guiam nosso olhar
pelo amanhã,
sinônimo do mar.
7
Sob a chuva
Em meio aos mundos
d’água, dou passos
leves e evito
molhar os sonhos.
Andar sob a chuva é
um itinerário entre
o pensamento que quer
e a reflexão sobre o que se quis
um dia, todo dia,
pelos dias...
A boca seca é
o paradoxo das sensações
e a negação do alívio.
Engulo sem querer
tido tipo de profanação,
da recusa da mulher
mais bonita do mundo aos
desejos que insistem em
me castigar.
Andar sob a chuva
é não esquecer que
um amor novo explode
todo dia no meu peito -
um amor que só vê, sente e quer a Lua.
8
Na ponte, a flor
Uma flor de amor existe
dentro e fora dos
jardins.
Nas ruas e nos
caminhos
vividos,
flores perfumam
os sonhos e adoçam
os dias.
Lembrei, então, que
vi na lua uma linda
flor, uma inesquecível
ponte.
Ao desenhar em minhas
ideias o sorriso
daquela flor
(sim, flores sorriem),
permiti que um
imenso jardim ilustrasse
meu dia, colorisse
minhas horas, reinventasse
meu tempo.
Uma flor na lua, uma ponte
linda, florida,
deslumbrante.
9
Sexto round
Em meus braços
a lua sorria,
o mais brilhante e
encantador sorriso
do universo.
Enquanto o beijo
nos ensinava seus caminhos,
nós, jovens aprendizes
de um amor intenso,
pretenso,
escandaloso consenso,
fitávamos a alma um do outro -
ela, olhos da lua,
jurava ser ali seu lugar,
em braços meus;
eu, coração menino,
apenas concordava e
ampliava o aconchego.
A boca da lua,
ilustrada pelo olhar,
profundo, livre,
feminino,
injetava ânimo:
um, dois, três,
quatro, cinco,
seis rounds -
tarde, noite,
manhã seguinte,
só houve tempo
para o exercício
do amor.
Aos quarenta
descobri amar
na lua de vinte anos,
tão menina, tão viva.
O mistério, a fonte
de uma juventude
que ainda está em mim,
no peito, na raça,
na ponte em que a vi,
logo amei, a lua
devolveu a mim
a poesia perdida.
Ah, a boca da lua,
o sorriso de tanto
brilho, júbilo,
pureza...
O cheiro, o gosto
da lua, a suave camada
de pele que fez tremer
meu corpo, fluir o
desejo por minhas mãos,
de um sujeito,
de vida, só êxtase...
Na ponte, sonhei
amar a lua.
Agora, vivo
acordado,
à espera, confiante,
a fitar a boca
do céu -
horizonte.
10
Ela
O que mais penso
é se ela pensa em mim.
O que mais quero
é saber se ela apanha
os sinais que
envio,
nos quais insisto,
que se tornaram
o ar que,
já faz algum tempo,
todo o tempo,
eu respiro.
Ela é jovem demais,
uma menina-mãe,
aura de anjo;
corpo inteiro,
mulher dos pés
à cabeça...
Aliás, que pés!
Os mais lindos,
com os quais
desejo, lado a lado,
caminhar,
até o fim,
com um fim,
nosso,
inteiramente nosso.
Já versei sobre
seus olhos,
sua boca,
o olhar penetrante,
o sorriso mágico.
Menina,
tão menina,
uma mulher de
paradoxos, histórias
insolúveis, atraentes,
sedutoras até perder
de vista,
as vistas,
todo o juízo.
Ela é o doce que me dá
água na boca,
no tempo,
na paixão platônica
da minha vida.
11
Esquerda
Um pra cá
Dois pra lá
“Pra lá”, que são dois
pra mim
sempre foi à esquerda
Nunca mudei o ritmo
sempre na mesma batida
observando
anotando
criticando
melhorando
mas sempre dois
e pra lá
pra esquerda
Nova, a festa
troco a música
outras são as personagens
histórias inéditas então vêm
O som, contudo
corre solto
pulso das ruas
trilha da esquerda
12
Coração do mundo
Eu sonho sobrevoar o mar,
o mar que há em mim,
avistá-lo, tentar decifrá-lo,
anunciá-lo ao porvir.
No mar do mundo,
com as mãos que para sempre
serão tricolores,
antecipo a viagem da esperança -
ela vive em mim,
num interminável itinerário,
entre os meus sentidos
e os gritos do povo.
Atravessando nevoeiros,
pressinto a força que me move,
uma implacável disputa entre gigantes,
siameses,
que vivem no peito,
na coragem que ousa,
forja,
partilha um olhar solidário,
um coração do mundo.
No geral e
no particular,
eu só sei ser assim,
a fim,
o velho menino
de sonhos novos -
e eternos, na vitalidade
de seu longo tempo.
13
Coração do mundo II
Era só um pedaço de mim
que se perdeu,
do todo, de tudo,
daquela longa
caminhada.
Por anos,
um tempo maior que o necessário,
o pedaço voou solitário,
sem desconfiar
que ele era mais
do que o próprio tempo,
menos do que um castigo,
superior à dor do coração.
Tricolor, um cavaleiro de paz,
vigor e esperança,
encontrou seu tudo,
aquele todo,
no sorriso gigantesco
da lua,
que viu na ponte,
dançando,
menina,
a exalar paixão,
contagiar o mundo
de um coração-menino.
Agora
seu itinerário é a calmaria,
cabelos mágicos,
que se deliciam sobre o peito a amar,
dão sombra de proteção ao olhar,
que se fixa,
abraça,
faz um amor monumental.
O coração do mundo
tem seu sol
e também sua lua,
na passagem,
no caminho inevitável da vida,
por onde passam
aqueles
que souberam
perder
para
mais tarde
ganhar.
E, esplendidamente,
amar.
14
A gente
Rindo, a gente aprendeu
que o amor é feito
de gargalhadas.
Amando, a gente descobriu
que só faz sentido
a vida que sorri,
tira uma onda,
de tudo,
dos dias,
dos casos,
da gente,
por que não?
A gente faz do tempo
uma toca de diversão.
Tem um pouco do mundo
no jeito de a gente brincar:
tem bola, tem carta,
tem desenho, tem figurinha...
Mas o que não falta nunca,
nunca jamais,
é a certeza de que a gente
não vai parar,
nem que o mundo acabe.
A gente está muito junto nisso,
pelo sim,
pelo sim também.
“Não” não tem, não!
Fazendo história e arte
(muito mais arte, é claro),
a gente segue firme,
colorindo mapas,
pingando os “is” e
atrasando o tempo.
Para a gente
blecautes não existem:
a única coisa que há
é o amor,
daquele tipo que é
puro jeito de aprender,
sorrir,
brincar,
até quando o assunto é sério.
15
Sartreana
Meu versos são
meus tantos
inversos,
um espesso avesso,
travesso,
que me cutuca,
incomoda,
tira do sério.
Eu deliro
diante das palavras
antes de escrevê-las.
Elas são uma visão,
a matéria-prima
da imaginação.
Elas existem antes
de aparecer -
são o tempo de Sartre
que vive em mim.
Meus versos
quase sempre
são meus reflexos;
minha garantia
de sobrevida,
sobretudo,
sobre absolutamente
nada -
um longo tempo de nada,
uma náusea,
outra de minhas vertigens
sartreanas.
Minhas palavras
me condenam
à liberdade.
Elas são implacáveis:
é amá-las ou morrer.
Sigo, então,
morrendo nelas
(talvez),
amando-as ilícita
e desconjuradamente -
e livre.
16
Novas últimas
Estavam lá
sobre o criado-mudo
as últimas quatro palavras:
te amei,
agora cansei.
No dia seguinte,
no fim de uma noite
de longa tarde e insuportáveis horas,
um bilhete passou por debaixo da porta.
Novas últimas três palavras:
morro
sem
ti.
17
Orgulho do vagabundo
Independentemente,
os rios encheram meus olhos,
com sonhos
e muita, muita
esperança.
Flanei,
vagabundo como nunca,
orgulhoso de não ceder
à tentação
do fácil,
do muito fácil e
cômodo
regresso.
18
Sétimo (e melhor) round
A noite alternava
calor e frio,
chuva e lua cheia -
uma magia esplendorosa
rasgava o céu,
enchia os olhos,
brindava corações.
A menina
que por mim passava
dia depois de dia
(e lançava aquele sorriso),
esquentava
o corpo trêmulo,
esfriava
o desejo fervilhante.
Houve uma longa hora
de beijo,
só beijo,
de olhos
entreabertos,
sempre perplexos -
nenhum de nós
acreditava naquele sonho -
era real,
porém.
A doce vida nos enviou
uma mensagem:
a palavra certa,
na hora mais improvável,
precipitou tudo,
aos montes.
Uma avalanche
de paixão nos
tomou,
inebriou,
pulsou
o peito,
a têmpora,
a poesia da menina
que amou um homem
e a prosa de um homem
que se desnudou para
a mais linda das meninas.
Estávamos
muito longe,
próximos um
do outro,
escondidos do
mundo.
Fomos à sétima
estrela (round?)
das mais inacreditáveis
sensações.
Desvendamo-nos,
demo-nos
algo mais
daquelas preciosidades
que o infinito
guarda somente
a quem nunca
desiste de
amar.
19
Coração vermelho
(para Salvador Allende)
Descobri
que meu coração
e frágil
quando percebi
que ele atropela
meus passos.
Há um enorme
descompasso
entre o ânimo das ideias
e a batida dentro do peito,
entre os planos da cabeça
e a realidade na contramão.
Com o tempo
(numa luta sem aliados)
os ponteiros se acertam -
o do ritmo das coisas
e o da vontade de viver,
bela,
transbordante de si.
O velho coração vermelho,
abatido e cansado,
não quer parar:
bate dizendo
que ainda tem
um mundo
a sonhar.
20
Visita íntima
O amor que nunca fizemos
(que nunca fugiu à pura imaginação)
aqueceu o sonho desta noite
(tudo que ainda tenho de real sobre você).
Ainda demora para aceitar que não seremos,
não poderemos,
não ousaremos,
não faremos.
Nem mesmo um beijo
nossos insinuantes olhares trocados se permitiram.
Presos às armadilhas das convenções,
agredimos nosso desejo,
impedimos o melhor momento,
aquele presente que se eterniza,
faz do tempo um agora infinito.
Esta madrugada você me visitou,
morena mais bonita do mundo!
Mais uma vez,
você se fez real
na ilimitada irrealidade
em que sinto seu cheiro,
num sonho profundamente
excitante e perturbador.
21
Últimos versos
Já fiz versos errados
múltiplos e até infelizes
apressados, impensados
imperdoáveis deslizes
Musas falsas de última hora
frêmitos tardios
espírito em busca da desforra
beco escuro, sentidos vazios
Hoje sei que o poema certo
no traço, no laço, eu faço
nada de agruras no deserto
somente do meu mundo um pedaço
O amor maior é canto
uma viagem pelo que ainda há em nós
um humano encontro de pranto
entre incontáveis contras e prós
22
Milagre
Não sei se há um poema
sobre as estrelas por aí.
Desconfio que o brilho delas
seja o verso em si.
Em nome delas
- as estrelas -
já amei,
chorei,
perdi,
quase desisti.
Agora,
porque soube insistir,
conheci um sorriso
inexplicável,
um amor
imponderado,
um sentimento
que me põe ao vento,
coração desmesurado.
Como todo amor em minha vida,
sempre tão benjaminiano,
este será só meu,
eu acho,
sem ponte até
o sorriso da paixão,
o fogo insinuante
do delírio na contramão.
Adoro a ideia de amá-la,
mulher de doce lábio,
e faço isso em refúgio,
em minha alma latina,
à espera de um milagre,
de uma loucura repentina
- e eterna, por que não?
23
Tão minha quanto as estrelas
Ela é síntese de todas as belezas
amor imaginário
uma paixão de épicas realezas
viva, pulsante, guardada em meu relicário
Ora romance
ora libido exaltante
seu corpo é meu porto-seguro
beijo, provocação, o exalar vibrante
Em seus olhos repouso
nos lábios encontro leveza
meu espírito em seus detalhes se realiza
diante da vida, ergo-me fortaleza
Nada em mim existe longe dela
embora ela não exista
povoa meus sonhos apenas
reitera o que sou, sugere que eu insista
Sou, então, movido pelo vir-a-ser
pela necessidade de não desistir
tenho algum receio do amanhã
condenado ao presente sem sentir
Se ela vier, será vida que transborda
amor louco em lances sem fim
companheira de prazer e mundo
pedaço quente do céu dado a mim
24
Liberdade
Não há nada
mais intenso
que a liberdade.
Ela arrebata,
encanta,
torna tudo
diferente.
A sensação
de ser (estar) livre
(algo indescritível)
é real,
quando conquista,
surreal,
como justiça,
humana,
se bendita.
É doce
o sabor da
liberdade.
É suave
o aroma da
liberdade.
É pleno
o ser
que (re)conhece
a liberdade.
O melhor
tempo é
o tempo
da liberdade.
25
Depois do abismo
(para a UEL, com um amor maior que eu)
Existem reticências
à beira do abismo,
um medo das coisas,
uma crença quase
insultuosa
no pior.
Melhor então
é não se mover,
correr da história,
capturar o que há,
conformar-se com
o que não há,
nunca houve,
poderia até haver,
não fossem os três pontinhos
à beira do abismo...
Por que o medo?
(esta é a melhor palavra?)
Defronte dos sonhos,
a realidade precisa
vencer?
Volto no tempo,
revejo minhas velhas certezas
maximalistas,
e indago:
Que fazer?
Preciso confessar
que já chorei diante
do abismo,
que já tive medo de
sentir medo.
Ao contrário de meus heróis,
tive tempo de sobra para
ter medo...
Mas pude aprender com
o tempo, com as noites
intermináveis
à beira do abismo, fitando
as profundezas, desafiando
meus fantasmas, iludindo
meus demônios.
Um grande eco,
com som de provérbio,
sempre me repetiu
que tudo viria aos quarenta –
e do primeiro tempo.
Que bom ter tido tempo,
ter poupado um pouco
de seus enigmas.
Agora é hora de gastá-lo
(ganhando-o ainda mais)
longe do abismo,
depois do seu final.
26
Matei minhas musas
Não tenho mais musas.
Matei-as de uma só vez.
Nem de papel, nem de telas virtuais:
sou agora das criaturas de alma.
Não farei mais homenagens
àquelas que não têm voz,
não se dão às paixões,
não se permitem ousar.
Mulheres sem carne,
além de não ter vida,
não têm cheiro,
volúpia,
olhar.
Tudo é falso,
artificial na artificialidade
de suas palavras vazias,
tristes,
desamorosas.
Não tenho mais musas.
Matei e enterrei todas.
Longe de mim.
27
Todas
Todas povoam
minha imaginação;
é um arco-íris
de tons, uma geometria
infinita
de curvas sempre
sedutoras.
Não me abandonam
um só instante;
falam comigo sem
nada dizer,
apenas insinuação,
existência,
coração batendo
insanamente.
Gosto
das que são
belas
de todas as
formas –
imprescindível
é que digam
à minha imaginação
que irão me amar
até o fim,
até o início
de tudo.
Dedico minhas
melhores energias
a todas,
uma de cada vez,
várias ao mesmo
tempo,
uma homenagem que
nunca cessa
(precisarei
parar um dia?)
Seu veneno mata
e alimenta
meu corpo,
meu espírito:
desconcentra-me,
impede-me
aniquila-me –
ao mesmo tempo,
o prazer que sinto
jamais poderá
ser castigado.
Há delírio
no mundo
inteiro
de suor
e paixão que
faz girar o vício,
a dança
e o beijo inexistente.
28
Fim da linha
Não irei mais achar
Houve um desencontro
Que agora é destino
Da solidão terei de tirar lições
Só não me culpo
Por não ter tentado
Vasculhei fundos e mundos
Recorri a todos os expedientes
Poucas vezes
De modo quase pueril
Obtive alguma sorte
O fracasso é uma desilusão necessária
Escrevi poemas
Inventei tudo que é cenário
Contei todo tipo de história
E nada, nada mesmo
Agora vou encarar a desistência
Como a vitória da sanidade
Só de imaginação
Vou viver perdido
Quando eu fechar os olhos
Lá estará você
Sempre um mistério
Pulsão e pecado
Não há chances no acaso
Só a dor do inevitável
Sozinho neste planeta ao avesso
Meu velho travesseiro me aproxima de você
29
Pedaço de beijo
Houve um pedação
de um beijo
que se perdeu
Vivi acreditando
em beijos roubados
e no prazer
indescritível
do ato da paixão
proibido
Soube depois
de viver um
bom tanto
que não existem
paixões secretas
nem beijos roubados
que sobrevivam
à falta de coragem
O único
e insubstituível
ímpeto de
amor é a
coragem
Se beijos
não se roubam
lábios
não se sentem
prazeres
não se prolongam
é da falta de
coragem
que se fala
que se percebe
que se tudo
um pouco muito
O pedaço do
beijo que me
ficou
decidiu então
navegar
e foi buscar
uma nova
e só sua
utopia
30
A moça que sorri
Sorrisos derrubam
muros e controem
pontes
De um sorriso
espera-se leveza
e todo o peso
suave de
uma grande
paixão
Para sorrisos que
inebriam e disparam
o que há
no peito
dedicamos versos
inquietos gestos
olhos fechados
mente
bem aberta
Se um sorriso parar
à sua frente
contemple-o
toque-o
conduza-o até
seu coração -
de lá permita-se
um corpo explodir
Pelos sorrisos
que conferem
sentido à escuridão
vale a pena viver
tranbordar em si
trilhar até pelo
incerto
que é certo
no desejo humano
que move o
mundo
Enfim,
cace sorrisos
desvende
fantasias
31
Sol e Lua
Havia uma
palavra simples
na voz rouca
e tranquila
do grande
e inusitado
amor
Uma onda
de paixões
múltiplas
levava meu
coração
e o deixava
à beira-mar
do outro
lado
do mundo
Acordado
percebi que
o sol
e a lua
confabulavam
à meia-luz
abrindo mão
do que podiam
para inspirar
vida no
coração
da Terra -
e de mim
um ser feito
de esperança
e muito amor
32
Um Cafajeste Latino
Vivo tentando
beijar as bocas
que não me veem
e fitar os olhos
que não me beijam.
Vivo desejando ser
o corpo latino
que aquece e incendeia,
em vez da mente iluminista
que aplaudem (e já nem tanto)
Quero aquelas
que não me percebem
para além de ideias e palavras.
Não sou para o gozo,
o delírio,
a premeditada perda
absoluta dos sentidos.
Nem Galileu, nem Marx;
nada de Bourdieu ou Foucault:
sonho ser amante do
festejo das curvas,
da dança das línguas,
do pulo da pele
que sua,
nua,
despudoradamente,
na rua.
Topo fazer poesia
com as mãos livres,
percorrendo
corpos inteiros,
sem nenhum verso,
nenhuma rima.
Troco tudo por tesão,
sem hesitação,
tão somente
um velho cafajeste.
33
Quatro letras
É preciso
que seja sempre
mágico.
Não há como ser
só por ser.
Senão, não é,
não se faz,
a ninguém realiza.
Talvez um dia
eu faça outra vez.
Ao fazê-lo,
poderei,
enfim,
reviver um pouco
do melhor
que já pude sentir.
Certo é que
tem mesmo de ser
forte,
instintivo,
implacável,
um arrebate
do corpo,
um incêndio
n’alma.
O problema é que
meu tempo
parece ter findado,
minhas oportunidades,
todas perdidas.
Ainda assim,
irmão que é
da esperança,
ele só morre
quando o olhar
sobre a beleza
perde graça,
gracejo.
Até lá,
a memória
mantém vivo
o desejo
de sonhar.
34
Meus versos de adeus
Chama-me o mundo,
gritam-me as gentes
de alma e carne,
carne viva e quente,
alma leve e atrevida.
Vou lá e volto se der,
pois preciso abraçar
o outono da vida,
o tempo bom,
o sereno ar
de amor e
ideias livres.
Enfim, assistirei ao
florir de mim.
35
Meus erros
Errei tanto por aí
e por aqui também.
Cansei de tanto erro,
de tanto tentar não errar,
de tanto errar tentando.
Descobri, então,
que os erros ensinam
muita coisa,
prestam enorme
serviço à imaginação,
à paz de espírito.
A cada erro -
e hoje errei de novo -
reaprendo a amar,
a mim,
a quem está próximo,
aos sonhos que
não morrem,
apesar dos erros
que os entristecem.
Meus maiores erros
são pessoas,
indivíduos
que partejo
para depois
me arrepender -
são os erros
que nada ensinam.
Mas o erro de
considerar
um acerto quem
nada pode nos dar
é um acerto
de contas,
um alívio
também -
é um erro que
frustra,
mas não incrusta:
a alma segue leve,
limpa,
sem vergonha de ser
o que é e daquilo que
ainda sonha ser.
36
Havia
Havia um pouco
de menino naquilo tudo,
naquela vontade
de encontrar um pouco
mais de si
em braços quentes,
abertos, generosos.
Havia muito de homem,
de sujeito maduro,
naquela imaginação
amorosa,
sincera,
rara -
capaz de fazer
a paixão lhe sorrir
uma vez mais,
definitivamente.
37
Pugilista invisível
Acima do que sinto
existem nuvens
que encobrem
um ímpeto incontrolável
pelo sonho bom.
Na busca do sonho,
trombo na chuva grossa
que as nuvens
não deixam ver.
Espero,
digo,
planto uma semente
de rebeldia e palavras,
e a chuva desaba
sobre mim,
encharcando
meus sonhos,
zombando
da minha imaginação.
É como seu eu estivesse
predestinado
a lutar no escuro
com um pugilista
invencível,
um Rocky Marciano,
algo para sempre
muito maior,
melhor e mais real
do que eu.
38
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Diagramação e ilustrações: Kátia Midori Kimura

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Meu tempo 2015

  • 3. SUMÁRIO 4 O tempo da poesia 5 Marighellianas 6 As estrelas do mar 7 Sob a chuva 8 Na ponte, a flor 9 Sexto round 10 Ela 11 Esquerda 12 Coração do mundo 13 Coração do mundo II 14 A gente 15 Sartreana 16 Novas últimas 17 Orgulho do vagabundo 18 Sétimo (e melhor) round 19 Coração vermelho 20 Visita íntima 21 Últimos versos 22 Milagre 23 Tão minha quanto as estrelas 24 Liberdade 25 Depois do abismo 26 Matei minhas musas 27 Todas 28 Fim da linha 29 Pedaço de beijo 30 A moça que sorri 31 Sol e Lua 32 Um Cafajeste Latino 33 Quatro letras 34 Meus versos de adeus 35 Meus erros 36 Havia 37 Pugilista invisível
  • 4. O tempo da poesia Tentei desistir de fazer poesia, depois que lancei meu livro “Nas ruas do mundo”, em 2012, com os versos que reuni nos dez anos que antecederam sua publicação. Desistência inútil. O poeta é uma vítima dos versos. As palavras o aprisionam e sufocam. Ao esboçar um poema, liber- ta-se, para, em seguida, tornar-se mais uma vez refém de uma expressão poética sempre exigente e, ao que parece, imortal. Este e-book, cujo nome se refere à principal de nossas intransponibilidades, Meu tempo, é o fracas- so de minha desistência de ser poeta. Quanto mais me dedico a outras formas da escrita (e tenho praticado bastante esse exercício), mais estrofes me surgem, intrigam, induzem a revelá-las. Desisti, então, de desistir. Vou permanecer poeta para que o tempo não desista de mim. Marco A. Rossi
  • 5. 5 Marighellianas Livre iniciativa, fluxos do grande capital, ficção, o dinheiro como centro do mundo, o mundo como refém do dinheiro (de alguns). Propriedade privada, todo poder aos mercados e bolsas, aos epígonos e odes de gestão, foco, clientes... As tabelas e os números, as frequências e os dados. Nada humano, nenhum ser. A orquestra toca uma só canção: a da acumulação, fácil e sem obstáculos, pueril, uma estratégia de gente infante, infame: maldita ostentação. Além do horizonte (já se cantou tanto), dentro do peito e no sonho que não se cansa, há vida, há muito mais. Marighella corre em nossa direção: não tenhamos nunca tempo para ter medo. Nunca (Sempre ao nunca!).
  • 6. 6 As estrelas do mar A insistência vem da crença intensa no ser que está no mundo e faz o chão que pisa e fortifica. Os olhos limpos nascem como a fruta que se vê bela, desejada e deslumbrante, o doce enigma da vida. Entre lágrimas surge a pergunta inquietante e muitas vezes paralisante, aquela que interpela o mundo de ontem, fracassado como lugar do humano. Imagens são pré-conceitos, ilusões que se disfarçam na nossa pressa, no pouco afinco de rejeitar o profundo. Minha luta é por conceitos robustos que ampliem e somem, costurem convergências, aceitem e desejem mudar, mudarem-se, conjugar, conjugarem-se. A estrada é a das estrelas, iluminada pela diversidade, o mundo inteiro por que passa a esperança e o sorriso da vida - as estrelas que guiam nosso olhar pelo amanhã, sinônimo do mar.
  • 7. 7 Sob a chuva Em meio aos mundos d’água, dou passos leves e evito molhar os sonhos. Andar sob a chuva é um itinerário entre o pensamento que quer e a reflexão sobre o que se quis um dia, todo dia, pelos dias... A boca seca é o paradoxo das sensações e a negação do alívio. Engulo sem querer tido tipo de profanação, da recusa da mulher mais bonita do mundo aos desejos que insistem em me castigar. Andar sob a chuva é não esquecer que um amor novo explode todo dia no meu peito - um amor que só vê, sente e quer a Lua.
  • 8. 8 Na ponte, a flor Uma flor de amor existe dentro e fora dos jardins. Nas ruas e nos caminhos vividos, flores perfumam os sonhos e adoçam os dias. Lembrei, então, que vi na lua uma linda flor, uma inesquecível ponte. Ao desenhar em minhas ideias o sorriso daquela flor (sim, flores sorriem), permiti que um imenso jardim ilustrasse meu dia, colorisse minhas horas, reinventasse meu tempo. Uma flor na lua, uma ponte linda, florida, deslumbrante.
  • 9. 9 Sexto round Em meus braços a lua sorria, o mais brilhante e encantador sorriso do universo. Enquanto o beijo nos ensinava seus caminhos, nós, jovens aprendizes de um amor intenso, pretenso, escandaloso consenso, fitávamos a alma um do outro - ela, olhos da lua, jurava ser ali seu lugar, em braços meus; eu, coração menino, apenas concordava e ampliava o aconchego. A boca da lua, ilustrada pelo olhar, profundo, livre, feminino, injetava ânimo: um, dois, três, quatro, cinco, seis rounds - tarde, noite, manhã seguinte, só houve tempo para o exercício do amor. Aos quarenta descobri amar na lua de vinte anos, tão menina, tão viva. O mistério, a fonte de uma juventude que ainda está em mim, no peito, na raça, na ponte em que a vi, logo amei, a lua devolveu a mim a poesia perdida. Ah, a boca da lua, o sorriso de tanto brilho, júbilo, pureza... O cheiro, o gosto da lua, a suave camada de pele que fez tremer meu corpo, fluir o desejo por minhas mãos, de um sujeito, de vida, só êxtase... Na ponte, sonhei amar a lua. Agora, vivo acordado, à espera, confiante, a fitar a boca do céu - horizonte.
  • 10. 10 Ela O que mais penso é se ela pensa em mim. O que mais quero é saber se ela apanha os sinais que envio, nos quais insisto, que se tornaram o ar que, já faz algum tempo, todo o tempo, eu respiro. Ela é jovem demais, uma menina-mãe, aura de anjo; corpo inteiro, mulher dos pés à cabeça... Aliás, que pés! Os mais lindos, com os quais desejo, lado a lado, caminhar, até o fim, com um fim, nosso, inteiramente nosso. Já versei sobre seus olhos, sua boca, o olhar penetrante, o sorriso mágico. Menina, tão menina, uma mulher de paradoxos, histórias insolúveis, atraentes, sedutoras até perder de vista, as vistas, todo o juízo. Ela é o doce que me dá água na boca, no tempo, na paixão platônica da minha vida.
  • 11. 11 Esquerda Um pra cá Dois pra lá “Pra lá”, que são dois pra mim sempre foi à esquerda Nunca mudei o ritmo sempre na mesma batida observando anotando criticando melhorando mas sempre dois e pra lá pra esquerda Nova, a festa troco a música outras são as personagens histórias inéditas então vêm O som, contudo corre solto pulso das ruas trilha da esquerda
  • 12. 12 Coração do mundo Eu sonho sobrevoar o mar, o mar que há em mim, avistá-lo, tentar decifrá-lo, anunciá-lo ao porvir. No mar do mundo, com as mãos que para sempre serão tricolores, antecipo a viagem da esperança - ela vive em mim, num interminável itinerário, entre os meus sentidos e os gritos do povo. Atravessando nevoeiros, pressinto a força que me move, uma implacável disputa entre gigantes, siameses, que vivem no peito, na coragem que ousa, forja, partilha um olhar solidário, um coração do mundo. No geral e no particular, eu só sei ser assim, a fim, o velho menino de sonhos novos - e eternos, na vitalidade de seu longo tempo.
  • 13. 13 Coração do mundo II Era só um pedaço de mim que se perdeu, do todo, de tudo, daquela longa caminhada. Por anos, um tempo maior que o necessário, o pedaço voou solitário, sem desconfiar que ele era mais do que o próprio tempo, menos do que um castigo, superior à dor do coração. Tricolor, um cavaleiro de paz, vigor e esperança, encontrou seu tudo, aquele todo, no sorriso gigantesco da lua, que viu na ponte, dançando, menina, a exalar paixão, contagiar o mundo de um coração-menino. Agora seu itinerário é a calmaria, cabelos mágicos, que se deliciam sobre o peito a amar, dão sombra de proteção ao olhar, que se fixa, abraça, faz um amor monumental. O coração do mundo tem seu sol e também sua lua, na passagem, no caminho inevitável da vida, por onde passam aqueles que souberam perder para mais tarde ganhar. E, esplendidamente, amar.
  • 14. 14 A gente Rindo, a gente aprendeu que o amor é feito de gargalhadas. Amando, a gente descobriu que só faz sentido a vida que sorri, tira uma onda, de tudo, dos dias, dos casos, da gente, por que não? A gente faz do tempo uma toca de diversão. Tem um pouco do mundo no jeito de a gente brincar: tem bola, tem carta, tem desenho, tem figurinha... Mas o que não falta nunca, nunca jamais, é a certeza de que a gente não vai parar, nem que o mundo acabe. A gente está muito junto nisso, pelo sim, pelo sim também. “Não” não tem, não! Fazendo história e arte (muito mais arte, é claro), a gente segue firme, colorindo mapas, pingando os “is” e atrasando o tempo. Para a gente blecautes não existem: a única coisa que há é o amor, daquele tipo que é puro jeito de aprender, sorrir, brincar, até quando o assunto é sério.
  • 15. 15 Sartreana Meu versos são meus tantos inversos, um espesso avesso, travesso, que me cutuca, incomoda, tira do sério. Eu deliro diante das palavras antes de escrevê-las. Elas são uma visão, a matéria-prima da imaginação. Elas existem antes de aparecer - são o tempo de Sartre que vive em mim. Meus versos quase sempre são meus reflexos; minha garantia de sobrevida, sobretudo, sobre absolutamente nada - um longo tempo de nada, uma náusea, outra de minhas vertigens sartreanas. Minhas palavras me condenam à liberdade. Elas são implacáveis: é amá-las ou morrer. Sigo, então, morrendo nelas (talvez), amando-as ilícita e desconjuradamente - e livre.
  • 16. 16 Novas últimas Estavam lá sobre o criado-mudo as últimas quatro palavras: te amei, agora cansei. No dia seguinte, no fim de uma noite de longa tarde e insuportáveis horas, um bilhete passou por debaixo da porta. Novas últimas três palavras: morro sem ti.
  • 17. 17 Orgulho do vagabundo Independentemente, os rios encheram meus olhos, com sonhos e muita, muita esperança. Flanei, vagabundo como nunca, orgulhoso de não ceder à tentação do fácil, do muito fácil e cômodo regresso.
  • 18. 18 Sétimo (e melhor) round A noite alternava calor e frio, chuva e lua cheia - uma magia esplendorosa rasgava o céu, enchia os olhos, brindava corações. A menina que por mim passava dia depois de dia (e lançava aquele sorriso), esquentava o corpo trêmulo, esfriava o desejo fervilhante. Houve uma longa hora de beijo, só beijo, de olhos entreabertos, sempre perplexos - nenhum de nós acreditava naquele sonho - era real, porém. A doce vida nos enviou uma mensagem: a palavra certa, na hora mais improvável, precipitou tudo, aos montes. Uma avalanche de paixão nos tomou, inebriou, pulsou o peito, a têmpora, a poesia da menina que amou um homem e a prosa de um homem que se desnudou para a mais linda das meninas. Estávamos muito longe, próximos um do outro, escondidos do mundo. Fomos à sétima estrela (round?) das mais inacreditáveis sensações. Desvendamo-nos, demo-nos algo mais daquelas preciosidades que o infinito guarda somente a quem nunca desiste de amar.
  • 19. 19 Coração vermelho (para Salvador Allende) Descobri que meu coração e frágil quando percebi que ele atropela meus passos. Há um enorme descompasso entre o ânimo das ideias e a batida dentro do peito, entre os planos da cabeça e a realidade na contramão. Com o tempo (numa luta sem aliados) os ponteiros se acertam - o do ritmo das coisas e o da vontade de viver, bela, transbordante de si. O velho coração vermelho, abatido e cansado, não quer parar: bate dizendo que ainda tem um mundo a sonhar.
  • 20. 20 Visita íntima O amor que nunca fizemos (que nunca fugiu à pura imaginação) aqueceu o sonho desta noite (tudo que ainda tenho de real sobre você). Ainda demora para aceitar que não seremos, não poderemos, não ousaremos, não faremos. Nem mesmo um beijo nossos insinuantes olhares trocados se permitiram. Presos às armadilhas das convenções, agredimos nosso desejo, impedimos o melhor momento, aquele presente que se eterniza, faz do tempo um agora infinito. Esta madrugada você me visitou, morena mais bonita do mundo! Mais uma vez, você se fez real na ilimitada irrealidade em que sinto seu cheiro, num sonho profundamente excitante e perturbador.
  • 21. 21 Últimos versos Já fiz versos errados múltiplos e até infelizes apressados, impensados imperdoáveis deslizes Musas falsas de última hora frêmitos tardios espírito em busca da desforra beco escuro, sentidos vazios Hoje sei que o poema certo no traço, no laço, eu faço nada de agruras no deserto somente do meu mundo um pedaço O amor maior é canto uma viagem pelo que ainda há em nós um humano encontro de pranto entre incontáveis contras e prós
  • 22. 22 Milagre Não sei se há um poema sobre as estrelas por aí. Desconfio que o brilho delas seja o verso em si. Em nome delas - as estrelas - já amei, chorei, perdi, quase desisti. Agora, porque soube insistir, conheci um sorriso inexplicável, um amor imponderado, um sentimento que me põe ao vento, coração desmesurado. Como todo amor em minha vida, sempre tão benjaminiano, este será só meu, eu acho, sem ponte até o sorriso da paixão, o fogo insinuante do delírio na contramão. Adoro a ideia de amá-la, mulher de doce lábio, e faço isso em refúgio, em minha alma latina, à espera de um milagre, de uma loucura repentina - e eterna, por que não?
  • 23. 23 Tão minha quanto as estrelas Ela é síntese de todas as belezas amor imaginário uma paixão de épicas realezas viva, pulsante, guardada em meu relicário Ora romance ora libido exaltante seu corpo é meu porto-seguro beijo, provocação, o exalar vibrante Em seus olhos repouso nos lábios encontro leveza meu espírito em seus detalhes se realiza diante da vida, ergo-me fortaleza Nada em mim existe longe dela embora ela não exista povoa meus sonhos apenas reitera o que sou, sugere que eu insista Sou, então, movido pelo vir-a-ser pela necessidade de não desistir tenho algum receio do amanhã condenado ao presente sem sentir Se ela vier, será vida que transborda amor louco em lances sem fim companheira de prazer e mundo pedaço quente do céu dado a mim
  • 24. 24 Liberdade Não há nada mais intenso que a liberdade. Ela arrebata, encanta, torna tudo diferente. A sensação de ser (estar) livre (algo indescritível) é real, quando conquista, surreal, como justiça, humana, se bendita. É doce o sabor da liberdade. É suave o aroma da liberdade. É pleno o ser que (re)conhece a liberdade. O melhor tempo é o tempo da liberdade.
  • 25. 25 Depois do abismo (para a UEL, com um amor maior que eu) Existem reticências à beira do abismo, um medo das coisas, uma crença quase insultuosa no pior. Melhor então é não se mover, correr da história, capturar o que há, conformar-se com o que não há, nunca houve, poderia até haver, não fossem os três pontinhos à beira do abismo... Por que o medo? (esta é a melhor palavra?) Defronte dos sonhos, a realidade precisa vencer? Volto no tempo, revejo minhas velhas certezas maximalistas, e indago: Que fazer? Preciso confessar que já chorei diante do abismo, que já tive medo de sentir medo. Ao contrário de meus heróis, tive tempo de sobra para ter medo... Mas pude aprender com o tempo, com as noites intermináveis à beira do abismo, fitando as profundezas, desafiando meus fantasmas, iludindo meus demônios. Um grande eco, com som de provérbio, sempre me repetiu que tudo viria aos quarenta – e do primeiro tempo. Que bom ter tido tempo, ter poupado um pouco de seus enigmas. Agora é hora de gastá-lo (ganhando-o ainda mais) longe do abismo, depois do seu final.
  • 26. 26 Matei minhas musas Não tenho mais musas. Matei-as de uma só vez. Nem de papel, nem de telas virtuais: sou agora das criaturas de alma. Não farei mais homenagens àquelas que não têm voz, não se dão às paixões, não se permitem ousar. Mulheres sem carne, além de não ter vida, não têm cheiro, volúpia, olhar. Tudo é falso, artificial na artificialidade de suas palavras vazias, tristes, desamorosas. Não tenho mais musas. Matei e enterrei todas. Longe de mim.
  • 27. 27 Todas Todas povoam minha imaginação; é um arco-íris de tons, uma geometria infinita de curvas sempre sedutoras. Não me abandonam um só instante; falam comigo sem nada dizer, apenas insinuação, existência, coração batendo insanamente. Gosto das que são belas de todas as formas – imprescindível é que digam à minha imaginação que irão me amar até o fim, até o início de tudo. Dedico minhas melhores energias a todas, uma de cada vez, várias ao mesmo tempo, uma homenagem que nunca cessa (precisarei parar um dia?) Seu veneno mata e alimenta meu corpo, meu espírito: desconcentra-me, impede-me aniquila-me – ao mesmo tempo, o prazer que sinto jamais poderá ser castigado. Há delírio no mundo inteiro de suor e paixão que faz girar o vício, a dança e o beijo inexistente.
  • 28. 28 Fim da linha Não irei mais achar Houve um desencontro Que agora é destino Da solidão terei de tirar lições Só não me culpo Por não ter tentado Vasculhei fundos e mundos Recorri a todos os expedientes Poucas vezes De modo quase pueril Obtive alguma sorte O fracasso é uma desilusão necessária Escrevi poemas Inventei tudo que é cenário Contei todo tipo de história E nada, nada mesmo Agora vou encarar a desistência Como a vitória da sanidade Só de imaginação Vou viver perdido Quando eu fechar os olhos Lá estará você Sempre um mistério Pulsão e pecado Não há chances no acaso Só a dor do inevitável Sozinho neste planeta ao avesso Meu velho travesseiro me aproxima de você
  • 29. 29 Pedaço de beijo Houve um pedação de um beijo que se perdeu Vivi acreditando em beijos roubados e no prazer indescritível do ato da paixão proibido Soube depois de viver um bom tanto que não existem paixões secretas nem beijos roubados que sobrevivam à falta de coragem O único e insubstituível ímpeto de amor é a coragem Se beijos não se roubam lábios não se sentem prazeres não se prolongam é da falta de coragem que se fala que se percebe que se tudo um pouco muito O pedaço do beijo que me ficou decidiu então navegar e foi buscar uma nova e só sua utopia
  • 30. 30 A moça que sorri Sorrisos derrubam muros e controem pontes De um sorriso espera-se leveza e todo o peso suave de uma grande paixão Para sorrisos que inebriam e disparam o que há no peito dedicamos versos inquietos gestos olhos fechados mente bem aberta Se um sorriso parar à sua frente contemple-o toque-o conduza-o até seu coração - de lá permita-se um corpo explodir Pelos sorrisos que conferem sentido à escuridão vale a pena viver tranbordar em si trilhar até pelo incerto que é certo no desejo humano que move o mundo Enfim, cace sorrisos desvende fantasias
  • 31. 31 Sol e Lua Havia uma palavra simples na voz rouca e tranquila do grande e inusitado amor Uma onda de paixões múltiplas levava meu coração e o deixava à beira-mar do outro lado do mundo Acordado percebi que o sol e a lua confabulavam à meia-luz abrindo mão do que podiam para inspirar vida no coração da Terra - e de mim um ser feito de esperança e muito amor
  • 32. 32 Um Cafajeste Latino Vivo tentando beijar as bocas que não me veem e fitar os olhos que não me beijam. Vivo desejando ser o corpo latino que aquece e incendeia, em vez da mente iluminista que aplaudem (e já nem tanto) Quero aquelas que não me percebem para além de ideias e palavras. Não sou para o gozo, o delírio, a premeditada perda absoluta dos sentidos. Nem Galileu, nem Marx; nada de Bourdieu ou Foucault: sonho ser amante do festejo das curvas, da dança das línguas, do pulo da pele que sua, nua, despudoradamente, na rua. Topo fazer poesia com as mãos livres, percorrendo corpos inteiros, sem nenhum verso, nenhuma rima. Troco tudo por tesão, sem hesitação, tão somente um velho cafajeste.
  • 33. 33 Quatro letras É preciso que seja sempre mágico. Não há como ser só por ser. Senão, não é, não se faz, a ninguém realiza. Talvez um dia eu faça outra vez. Ao fazê-lo, poderei, enfim, reviver um pouco do melhor que já pude sentir. Certo é que tem mesmo de ser forte, instintivo, implacável, um arrebate do corpo, um incêndio n’alma. O problema é que meu tempo parece ter findado, minhas oportunidades, todas perdidas. Ainda assim, irmão que é da esperança, ele só morre quando o olhar sobre a beleza perde graça, gracejo. Até lá, a memória mantém vivo o desejo de sonhar.
  • 34. 34 Meus versos de adeus Chama-me o mundo, gritam-me as gentes de alma e carne, carne viva e quente, alma leve e atrevida. Vou lá e volto se der, pois preciso abraçar o outono da vida, o tempo bom, o sereno ar de amor e ideias livres. Enfim, assistirei ao florir de mim.
  • 35. 35 Meus erros Errei tanto por aí e por aqui também. Cansei de tanto erro, de tanto tentar não errar, de tanto errar tentando. Descobri, então, que os erros ensinam muita coisa, prestam enorme serviço à imaginação, à paz de espírito. A cada erro - e hoje errei de novo - reaprendo a amar, a mim, a quem está próximo, aos sonhos que não morrem, apesar dos erros que os entristecem. Meus maiores erros são pessoas, indivíduos que partejo para depois me arrepender - são os erros que nada ensinam. Mas o erro de considerar um acerto quem nada pode nos dar é um acerto de contas, um alívio também - é um erro que frustra, mas não incrusta: a alma segue leve, limpa, sem vergonha de ser o que é e daquilo que ainda sonha ser.
  • 36. 36 Havia Havia um pouco de menino naquilo tudo, naquela vontade de encontrar um pouco mais de si em braços quentes, abertos, generosos. Havia muito de homem, de sujeito maduro, naquela imaginação amorosa, sincera, rara - capaz de fazer a paixão lhe sorrir uma vez mais, definitivamente.
  • 37. 37 Pugilista invisível Acima do que sinto existem nuvens que encobrem um ímpeto incontrolável pelo sonho bom. Na busca do sonho, trombo na chuva grossa que as nuvens não deixam ver. Espero, digo, planto uma semente de rebeldia e palavras, e a chuva desaba sobre mim, encharcando meus sonhos, zombando da minha imaginação. É como seu eu estivesse predestinado a lutar no escuro com um pugilista invencível, um Rocky Marciano, algo para sempre muito maior, melhor e mais real do que eu.
  • 38. 38 In my work I’m using free vector silhouettes from all-silhouettes.com, vectorlady.com and freepik.com Diagramação e ilustrações: Kátia Midori Kimura