A série de mangá Ōoku explora uma linha temporal alternativa onde uma praga dizimou a população masculina do Japão no século XVII, forçando as mulheres a assumirem cargos de poder tradicionalmente masculinos. A obra discute questões de gênero e poder de forma realista e sem simplificações.
Gênero, Shoujo Mangá e História Alternativa: Reflexões sobre Ōoku de Fumi Yoshinaga
1. Gênero, Shoujo
Mangá e História
Alternativa:
Reflexões sobre
Ōoku de Fumi
Yoshinaga
Prof.ª Dr.ª Valéria Fernandes da Silva
2. No início do século XVII, uma
praga, a varíola vermelha,
dizimou a população
masculina do Japão.
A proporção é de 1 homem
para 5 mulheres.
Com o tempo, todos os
cargos de mando são
transferidos para as mãos
das mulheres.
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3. 80 anos depois, a velha ordem foi esquecida. A praga
recuou ligeiramente e a proporção é de 1 homem para
cada 4 mulheres.
A shogun Yoshimune decide investigar porque os títulos
são masculinos, apesar das mulheres estarem no poder.
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4. Ōoku ( 大 奥 ), de Fumi
Yoshinaga, é publicado na
revista Melody desde 2005 e
tem sete volumes até o
momento.
Indicado e vencedor de vários
prêmios, recebeu o James
Tiptree, Jr. Award que premia
a ficção científica feminista.
No Ocidente a série é
publicada na França e Estados
Unidos. 4
5. Ōoku se passa no período Edo
(1603-1868), dominado pelo
clã Tokugawa e auge do
Shogunato ou Bakufu.
O período Edo sucedeu
sangrentas guerras civis
(Período Sengoku) e foi
marcado pela relativa paz
interna e isolamento do Japão
em relação a outros países.
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6. O Ōoku (Grande Interior) foi estabelecido pelo
segundo shogun, Tokugawa Hidetada, em 1607. Era
a residência das concubinas e da esposa do shogun e
totalmente isolado do mundo exterior. Tal
realidade, entretanto, é relativa. (Hisako Hata, 2008)
6
7. Em Ōoku é utilizada uma
linha temporal alternativa.
O factual da história japonesa
é ajustado às necessidades
da série.
Exemplo: o isolamento do
país visa impedir que os
estrangeiros descubram que
boa parte da população
masculina foi dizimada.
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8. A praga é o motor das mudanças
sociais e a falta de homens força
as mulheres a ocuparem os
postos masculinos.
Os volumes 2 e 3, em
especial, mostram as
transformações e resistências.
“(...) embora o sexo biológico
atinja os corpos sexuados, o
sexo social, o que chamamos de
‘gênero’ atinge tudo”. (Susan
Paulson, 2002) 8
9. A autora enfatiza o papel das
mulheres idosas na manutenção
da velha ordem e dos papéis de
gênero tradicionais.
Somente quando a geração
nascida antes da praga perece, o
poder é ocupado pelas mulheres
definitivamente.
A idéia, no entanto, é que tal
situação seria temporária.
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10. As mudanças nos papéis de
gênero não são apresentadas
como automáticas.
A nova ordem dominada pelas
mulheres não é mostrada como
melhor em si mesma que a
anterior ou desprovida de
violência.
Não existe a exaltação de uma
ordem matriarcal, mas um painel
de como a sociedade se
reorganiza para sobreviver. 10
11. O Ōoku – o harém – demonstra
o poder e riqueza da soberana.
A maioria das mulheres não tem
marido próprio e precisa
recorrer a prostitutos.
A prostituição forçada dos
homens é um dos temas
discutidos na série.
Entrar para o Ōoku é uma das
formas de fugir deste destino e
obter recursos para a família.
11
12. "Nossas vidas inteiras são em
vão e um desperdício. Somos
mantidos como peixes dourados
em um aquário, (...) sem outra
finalidade a não a ser o próprio
ato em si. Ter tantos homens em
um só lugar, sem nenhum uso
real, e deixar a sua preciosa
semente ir para o lixo. É um
grande desperdício, este luxo, é
evidência da força e do poder do
Shogun, não é mesmo?"
Ōoku, Volume #1.
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13. A maternidade é outra questão
central na série.
Apesar de todo o seu poder, as
shogun precisam procriar, em
alguns casos destruindo-se
física e emocionalmente no
processo.
A autora advoga que a
necessidade da maternidade
não deveria subordinar a vida
de uma mulher, suas relações
afetivas e/ou sexuais. 13
14. No volume 7, encerra-se o longo
flashback e a shogun Yoshimune
questiona a validade e a lógica do
patriarcado.
A crítica não significa um rejeição
da velha ordem como um todo.
O governo cabe às
mulheres, mas a shogun
considera que a guerra é
atividade masculina.
Na série, a polícia é composta
por mulheres; já o exército 14
15. As autoras de mangás produzem
muito material na área de ficção
científica e fantasia.
Por exemplo, Marginal, de Hagio
Moto, mostra um futuro no qual
só existe uma única mulher
sobrevivente.
Ōoku se distingue pelo recorte
realista, muito mais presente em
distopias futuristas, do que nas
representações de um passado
alternativo. 15
16. Distopias nas quais os homens
desaparecem não são novidade.
Y The Last Man é um exemplo.
Ōoku traz um olhar feminino para
a questão, utilizando-a para
discutir papéis de gênero sem
simplificações e maniqueísmos.
Como a obra está em
andamento, outras considerações
só poderão ser feitas quando do
seu término previsto para 12
volumes. 16
17. REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS:
• YOSHINAGA, Fumi. Ōoku: The Inner
Chambers. Viz Signature Edition. São
Francisco: VIZ, 2009-2012, vol. 1-7.
• HATA, Hisako. Servants of the Inner
Quarters – The Women of the Shogun’s
Great Interior. In WALTHALL, Anne
(ed.). Servants od the Dinasty –
Palace Women in World History. Los
Angeles: UCLA, 2008, p. 172-190.
• PAULSON, Susan. Sexo e Gênero
através das culturas. In:
ADELMAN, Miriam, SILVESTRIN, Celsi
Brönstrup (org.). Gênero Plural –
Coletânea. Curitiba: UFPR, 2002, p. 23-
32.
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