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GRUPOS...alguns referenciais teórico-práticos

NOELIZA LIMA



       O objetivo deste trabalho é trazer formas de se abordar o grupo, buscando
criar denominadores comuns entre a visão de Eric Berne (1977) e outros aportes
da psicanálise tradicional de grupos e a análise das configuração vinculares. É
parte da dissertação de mestrado: ‘Experiência de Um Grupo de Mulheres na Luta
pela Cidadania’ (PUC-Campinas SP – Brasil – Pós graduação em Psicologia
Clínica, Orientadora: prof. Dra. Maria Regina Leme Lopes Carvalho – Apoio
CAPES-DS, 2000)


     INTRODUÇÃO

      Entende-se que o grupo se refere a:
   reunião de pessoas, coisas ou objetos que se abrangem no mesmo lance de
-
   olhos, ou formam um todo; pequenas pessoas reunidas para um fim comum.
  ( Ferreira, Aurélio, 1993).
- qualquer agregado social que tenha uma fronteira externa e pelo menos uma
   fronteira interna. (Berne, 97)
- conjunto restrito de pessoas, compartilhando o mesmo local ao mesmo tempo,
   fazendo mútua representação interna e se atribuindo-assumindo papéis
   complexamente, tendo uma tarefa ( explicitada ou não), segundo Pichon
   Riviere (1977).

     REVISÃO DA DINÂMICA DE GRUPOS DE BERNE

I.     ESTRUTURA GRUPAL PRINCIPAL

 Região do Líder: espaço destinado ao líder ou por este ocupado. Exemplo – em
escolas tradicionais, o professor fica em um pequeno palco em frente a lousa –
seu espaço é restrito. Nas universidades o líder professor passeia entre as
carteiras. Depende muito do caráter do grupo. Os grupos terapêuticos têm mais
espaço, tanto para o líder, como para os membros.


 Fronteira Interna Principal: limite físico entre líder e membros. Em grupos de
cidadania e terapêuticos, embora de finalidade diversa, a fronteira interna principal
é bem flexível.

Região dos Membros: Espaço físico onde os participantes se movem.

Fronteira Externa: Limite do grupo (uma porta ou algo que delimite o espaço do
grupo). No Paço Municipal há uma delimitação em dias de reunião da câmara.


                                                                                   1
Quando há palestras de direitos humanos este espaço é aumentado até a porta de
entrada.

Ambiente externo : o local além ou externo a fronteira externa do grupo.




•   FORÇAS QUE OPERAM EM UM GRUPO


B - Processo Grupal Interno: ente líder e membros

      Agitação Interna: ações dos membros que desorganizam o grupo através
das inclinações individuais. É quando emergem os “acting-out”. Se o grupo não sai
do pressuposto luta-fuga, quando há a regressão narcísica primária, por falta de
objetos saudáveis internalizados, há a projeção no grupo (líder e/ou membros)

      Coesão grupal: força que se opõe tanto à pressão quanto à agitação. Ou
pela tendência básica à coesão (pertinência)/ ou idealização do líder
(dependência)/ ou pela identificação com outro membro em sistema de pares .


C - Processo Grupal Interno Secundário: entre membros
       Os interesses individuais e busca de afinidades podem conflitar com os de
    outros participantes do grupo. Ao mesmo tempo, se há afinidades, pode
    auxiliar a coesão. Porisso é importante que as várias opiniões sejam
    valorizadas.

D – Processo Grupal Externo

       Pressão por parte de forças externas ao grupo, cujo objetivo é destruir a
liderança, ou fronteira principal interna. Se o grupo é destruído é porque seu
aparato é mais fraco que as forças opositoras.
Quando há a existência de forças externas, há uma solidariedade maior (coesão)
entre os membros, e uma tendência a combater as forças externas, ou tendência
à retração grupal frente a força externa.

                                                                       Só
quando a liderança desiste ou é seriamente ameaçada ocorre a ruptura. Neste
caso cedem as fronteiras externas, e o grupo se dissipa. Exemplo: o
reaparecimento dos grupos religiosos no Iraque após a guerra (2203). Exemplo de
coesão grupal: os grupos que efetivamente auxiliam em direitos humanos.

PRINCIPAIS APORTES DE GRUPOS



                                                                               2
Segundo Lancetti (1994), o diagnóstico de grupos consiste em apontar as
noções fundamentais que armam seu discurso, passando pela caracterização dos
fenômenos que produzem a eficácia no suceder grupal. Os membros de um grupo
certamente o constituem por possuírem, psiquicamente, elementos que
encontram, neste habitat grupal, por meio das relações transferenciais, um
continente que possibilita sua expressão e conseqüente elaboração. Não é por
acaso que uma pessoa escolhe um grupo ao qual pertencer. O grupo é um grupo
de interesse, de motivação e também reflete um movimento interno necessário
naquele momento para cada pessoa.
     Tudo o que ocorre no grupo é material de diagnóstico. O psicólogo * , sendo
aglutinador das ocorrências, coloca seu conhecimento, sua disposição e
principalmente seus sentidos para que a análise seja possível (Tucket, 1994). Sem
a empatia e a sensibilidade do pesquisador, em sendo o facilitador do mesmo,
qualquer evento grupal perde seu significado.


   PROJEÇÃO E IDENTIFICAÇÃO

     Entre os mecanismos de defesa, a projeção se mostra eficaz no equilíbrio
frente a sentimentos desconhecidos que são sentidos como ameaçadores para o
próprio self. A projeção nos assegura a proteção contra sentimentos penosos de
ataque e desamparo.
A projeção é a primeira reação do bebê ao sofrimento, e provavelmente
permanece em nós como a reação mais expontânea a qualquer sentimento
penoso, ao longo de toda a nossa vida ( Klein, Riviere, 1975).
        Quando dentro de nós existem forças que operam emoções dolorosas,
reconhecidas internamente como destrutivas, a tendência é nos livrarmos delas.
Negamo-las e as colocamos em outra(s) pessoa(s), objeto ou grupo, favorecendo
em nós o equilíbrio interno. Expulsamos então o perigo, responsabilizando um
objeto externo pelo que estamos sentindo, e neste quot;enxergar o objeto como mauquot;
jogamos sobre ele nossas angústias e frustrações.
        Neste sentido o grupo é visto como o continente e o conjunto das projeções
individuais. O grupo que defende algo que acreditamos é visto como quot;o seio bomquot;,
e qualquer ameaça a ele, por elementos externos ao grupo, ou forças internas tais
como a pressão e agitação, desencadeiam em nós mais arcaicos temores de
destruição .
        Mas por que acontece isto? Porque existe entre o eu e o grupo a
identificação projetiva, isto é, o eu idealiza o grupo vendo-o com capacidade de
sustentar o eu conferindo-lhe segurança. Aí surge a confiança, o respeito e a
admiração, pessoa - pessoa(as) e pessoa - grupo.
        Introjetamos as necessidades, expectativas e valores do grupo com o qual
Temos afinidade, vorazes em colocar dentro de nós estas idealizações que o
grupo contém. Sim, porque cada pessoa joga para o grupo a imago (imagem
idealizada) que constrói a respeito dele e as imagos que faz a respeito dos
integrantes deste grupo, e com essas imagos se identifica. E o grupo se torna a



                                                                                3
integração das imagos dos membros, ou seja, o receptáculo das transferencias
individuais, e o espaço onde estas relações vão se configurar.

       Vamos refletir um pouco sobre o que pode acontecer no contexto grupal em
termos de projeção/identificação, e como se manifestam no grupo, em momentos
de atividade transferencial, ligando ao conceito de Berne (1977) a respeito de
grupo de processo, agitação, pressão interna e externa e fronteiras


a) Acontece um fato externo ao grupo sentido como ameaça(um calor excessivo),
ou como um ato de amor (o grupo é homenageado). Aumenta a coesão grupal. As
pessoas se sentem gratificadas pelo fato do grupo corresponder aos seus anseios,
quer se cotizando para comprar um ventilador ( no primeiro caso), quer se
reunindo ( no segundo caso). A fronteira externa do grupo foi rompida pelo calor
excessivo, mas logo se restabelece pela coesão grupal.

b) Se é um fato interno de grupo, isto é, a reclamação de alguém a respeito da
figura do líder( ainda a projeção) também aumenta a coesão grupal. Surgem os
quot;salvadoresquot; da mãe boa (representada pelo líder), que se colocam contra aquela
pessoa que reclamou, pois na medida em que ajudam o líder estão salvando a
imagem que fazem do mesmo, para não se sentirem ameaçados - e continuarem
em segurança. Salvaguardam o continente grupal. A fronteira interna principal é
ameaçada por um integrante. A coesão grupal restabelece a harmonia. No caso
sente-se injuriado o querelante. Se estiver em intensa turbulência emocional
poderá sair por uns dias, voltando depois quieto e envergonhado por ter invadido
um limite e infringido um cânone (norma inquestionável) grupal - reclamar da
liderança.

c) Se a projeção é feita por um membro em cima de outro membro do grupo, aí a
agitação é maior. Pode levar á cisão do grupo, se o líder não souber dividir suas
atenções entre seus liderados ( é o mesmo mecanismo da briga entre irmãos). As
pessoas tomam partidos, mas prevalece a opinião do membro mais antigo, pois
antigüidade é um cânone grupal. O líder aberto a mudanças é flexível e age firme
e afetuosamente ( liderança efetiva: liderança de lei e liderança de fato) de forma a
assegurar a acolhida dos membros do grupo para ambos.


   FATO CLÍNICO, TRANSFERENCIA, CONFIGURAÇÕES VINCULARES

       Segundo Meimes ( et allis, 1998), o termo vínculo tem sua origem no latim
– vinculum, de vencire – que significa atar, juntar com ligaduras e nós fortes. A
pessoa a partir de sua primeira ligação com a mãe irá na vida estruturar um ego
saudável a partir de vínculos que sustentem e representem sua(s) escolha(s)
objetais, tornando-se o grupo um continente de configurações vinculares.
        O grupo chega a uma totalização através da pertinência e cooperação
(Peguin, 1997). Podemos então dizer que a missão do grupo, as necessidades
individuais e o grau de vinculação formam o continente grupal.


                                                                                   4
Para entender melhor a situação do psicólogo em um grupo, quer como
psicanalista, observador clínico, facilitador e/ou observador participante
necessitamos conceituar “fato clínico”.
       Quando o pesquisador observa que algum membro do grupo expressa um
sentimento não relacionado ao assunto em pauta, suspeita de que algo acontece
a nível inconsciente sendo trazido ao real através deste símbolo que é a emoção,
não pertinente ao contexto grupal. Isto é um fato clínico. Se este sentimento
desconectado com o real relaciona-se com o facilitador - torna-se um fato clínico
psicanalítico (Quinodoz, 1994).
       Em Análise Transacional estes momentos são vividos como ‘processo
grupal’. Segundo Berne (1962) correspondem as relações transferenciais ao
ajustamento da imago grupal, sendo importante escutar-se a comunicação latente,
que não é o discurso concreto, e sim o latente que se manifesta através de sinais
não verbais.

Exemplo:

     Maria (líder de um grupo de mulheres) pede que Mô (uma das conselheiras)
faça um verso para o Dia da Não Violência Contra a Mulher, com 15 dias de
antecedência. Mô diz que vai enviar por e-mail daí a dois dias para Milita (que é a
única que tem computador). Milita é a mulher que mais faz restrições a Mô
enquanto psicóloga. Mô se compromete a enviar os versos, sentindo-se
desconfortável com este fato. Envia o e-mail no dia marcado. Não obtém resposta
de Mel (que seria o ponto de contato). Liga para Milita que diz não ter aberto ainda
a Internet, apesar de já se terem passado dois dias. Isto é um fato clínico e um
fato clínico psicanalítico.
        Fato clínico porque Milita sabe da urgência do envio da mensagem para a
vice-presidente (Mar) que então, aprovando-os, os enviaria para Mel (que faria os
folhetos). Há aí alguma relação entre o comportamento de Milita e um conteúdo
psíquico projetado no grupo (atrapalhando a missão do grupo),o que contextua o
fato clínico.
        É também um fato clínico psicanalítico tendo-se em conta que há
antecedentes descritos do sentimento de rejeição por parte de Milita em relação a
Mô, e Milita saber da urgência do envio da mensagem para Mar, a fim de se
planejar a movimentação. Mô viajou e só veio a saber que não haveria
movimentação 10 dias após enviar a mensagem. O atraso da mensagem em toda
a rede de comunicações iniciou-se com o e-mail de Mô, que, embora feito no dia
certo não contou com o respaldo de Milita. Assim Milita consegue implicar Mô no
atraso (projeção de agressividade) e impossibilita a missão do grupo (do qual se
vinga por aceitar Mô como psicóloga conselheira).No próximo encontro
provavelmente o grupo ao invés de um grupo de atividade, entrará em processo e
Milita se esquivará da responsabilidade.
        Em análise transacional conceitua-se a atitude de Milita como ‘isca de jogo’.
Poderia esta conversa terminar com briga, como um provável fim de jogo de
Devedor.




                                                                                   5
Para entender de onde vem receios que ocorrem em um grupo é
necessário entender a cultura grupal, a seguir.

       Segundo Barnes (1977), o grupo sofre interferências dos cânones e caráter
grupal.

-      cânones grupais - dificilmente mulheres que não estejam na movimentação
de direitos humanos há muito tempo - são aceitas.
-      caráter grupal. - neste grupo geralmente as pessoas não falam diretamente
o que necessitam, são sensíveis a críticas e necessitadas de valorização pessoal.
Os grupos que defendem minorias têm esta característica geral, devido a
discriminação sócio cultural que sofrem.
       Desta forma quando surge um fato clínico abre-se espaço para a leitura do
emergente pelo líder.

        No caso de um grupo operativo, a leitura das transferências está aberta ao
facilitador interessado. Neste caso o mais comum é que o fato clínico ao se tornar
um fato clínico psicanalítico fale das relações transferenciais entre participante -
participante e/ou participante - líder. O analista (e/ou observador participante) é,
portanto, elemento configurador dos vínculos e ao mesmo tempo o intérprete das
demandas do grupo. É então que podemos por meio da relação transferencial
tentar estabelecer o significado ordenador do discurso real enquanto mediador do
inconsciente, pela palavra. O discurso e o que perpassa pelo discurso (fatos
clínicos) contam o que o grupo representa para o membro, e como o membro
estrutura a si mesmo através do movimento do grupo.
      Em um grupo operativo algumas vezes é necessário evitar interpretações e
movimentos terapêuticos, mesmo que o grupo se torne: um grupo de suposto
básico para Bion (1975) ou um grupo de processo (Berne, 1966/ 1997), momentos
em que o grupo se revela no campo das relações transferenciais (quando emerge
o fato clínico)
    Podemos então, se for nosso propósito, utilizar esta intensa atividade
transferencial para analisar o conteúdo das demandas do grupo e das pessoas
dentro do grupo, por meio da projeção e identificação.
    Mas só será devolvida esta análise , através da interpretação, se for um grupo
de caráter terapêutico, ou um workshop onde a dinâmica grupal e o contrato com
o psicólogo assim o permita.


   INTEGRAÇÃO DE CONCEITOS


    Berne (1966) define os grupos como formais ou informais, conforme tenham ou
não objetivos e organização estruturados. Tanto os formais como os informais
podem ser grupos de processos conforma apareçam ou não situações
transferencias (situações não resolvidas do passado, que são trazidas ao aquí e
agora grupal). O grupo de atividade é chamado por Bion (1975) de grupo de
trabalho, diferenciando de grupo de processo ou de suposto básico. Quando o


                                                                                  6
grupo está em atividade, é um grupo de trabalho e está dirigido a um objetivo, com
organização. Se em algum momento surgem emoções que denunciam o vivenciar
no “aqui e agora” de situações inacabadas de infância, o grupo se torna um grupo
de processo.

    Segundo Pichon Rivière (1980): o grupo sempre é operativo (de atividade ou
de trabalho). Quando se forma um grupo cada um dos integrantes projeta suas
fantasias no grupo, relacionando-se com as pessoas conforme suas projeções. As
fantasias grupais são reveladas pelo porta voz, denominado ‘alcagüete’, que é o
que fala das demandas do grupo.
    Exemplo: Maria, a líder deste grupo de mulheres, diz que se sente mal por ter
que fazer todo o trabalho do grupo, que não tem ajuda, etc. Duas mulheres saem
naquele momento alegando compromissos em casa. As outras ficam consolando
e incentivando Maria. Esta delata o caráter do grupo, tornando-se o alcagüete.
Delata o latente que perpassa todo o discurso real. Sendo este um grupo de
trabalho, cada uma das mulheres têm afazeres pessoais, profissionais e a sua
dedicação à luta pelos direitos da mulher. Portanto, a situação que Maria retrata
na verdade é comum a todas. As que saem têm dificuldade em enfrentar o fato de
que necessitam dar tempo a elas mesmas. As que ficam incentivam a Criança
Interior de Maria, dando sustentação e apoio, e cuidando de si mesmas no
aspecto psíquico. Revelam a não permissão para cuidar de si mesmas. Está aí
presente a Injunção ‘Primeiro os Demais’, e ‘Não desfrute’, em que as pessoas
mostram um roteiro de vida em que só podem desfrutar depois de todo o trabalho
realizado, e depois que os outros estiverem bem.
    As interações representam a possibilidade de o integrante reviver situações do
passado, penosamente reprimidas, reexperimentando-as na relação com o
coordenador, com a tarefa, com outros integrantes.

   Segundo Bion (1975), sendo este neste momento um grupo de processo,
significa que o grupo traz uma crença emocional da qual todos participam, tendo o
grupo um pressuposto básico, conforme o instante:

    Dependência: quando o grupo apoia e venera seu líder, que é idealizado
-
    assumindo características de deidade, reforçando as fantasias de onipotência
    do grupo. É neste momento que o líder ocuparia a posição existencial OK –
    Não OK. A dependência do líder leva a momentos de agitação por parte do
    mesmo, como o exemplo acima. O desabafo da líder provocou agitação e fuga,
    e entramos no pressuposto seguinte.

    Luta e fuga: quando se fantasia a existência de um perseguidor, o que leva o
-
    grupo a defender-se ou agredir. O grupo de uma forma geral adota a posição
    OK – Não OK e se chegar a actings - outs, ou sejam, exteriorizações de muita
    agitação, por estarem vivenciando a impotência e o abandono (Não OK – Não
    OK). No exemplo acima, o grupo não era capaz de sustentar as demandas
    internas das participantes – não tinha secretaria efetiva, material de apoio, e
    havia muito trabalho. Na parte psicológica, o fato de o grupo se preocupar mais
    com as mulheres de fora do que com as do próprio grupo levava as


                                                                                 7
participantes a se sentirem frágeis, sem acolhida, sem consciência deste
    processo. Algum tempo este grupo viveu o pressuposto básico luta – fuga.

    Emparelhamento ou Acasalamento ( paring: por de acordo, convir): o grupo
-
    tende a centrar-se em torno de um par, criando um clima emocional de
    expectativa e esperança. No exemplo acima, em momentos de vitória o grupo
    se sente irmanado ao líder, sentindo que tudo é possível. É uma fantasia
    messiânica e o grupo se coloca numa tríplice posição: OK - OK – NÂO OK. Ou
    seja : ‘somos ótimas, e embora a sociedade
    seja patriarcal e não esteja sensibilizada aos direitos da mulher,
    conseguiremos tudo e logo’.

    Cortesão (In Angeli, 1994), considera o grupo como Matrix, a terra - mãe onde
idéias são semeadas e germinadas pelos seus integrantes. Tem também o caráter
de continência e pertinência, provendo a quem dele participa de intensa
criatividade e produção concreta e psicológica. Este conceito explica o grupo
feminista aquí citado como exemplo, na medida em que estas mulheres levam
suas idéias a outros grupos em contínua fertilização, germinação e nascimento.
Este conceito na verdade traduz a idéia geral de grupos. É um centro de
alimentação e renovação para todos que deles participam, quer na condição de
líderes, quer na condição de participantes.

   A conceituação de Berne a respeito de processo de grupo não foge as
colocações atuais de grupanálise. Na grupanálise o grupo é um todo, com ego,
superergo e id. Existe uma protomentalidade grupal (Terzis, 1994). O enfoque é
dado ao grupo e não ao indivíduo. Este é somente um emissário da voz grupal,
voz que nasce do inconsciente grupal. Algumas coisas podem ser mais bem
entendidas, como a organização psíquica do grupo e a análise das configurações
vinculares (Lima, 1999).
   O que se torna diferente é que Berne analisa as transações ocorridas, tendo o
analista transacional uma atitude diretiva, no tocante a colocar conceitos de AT e
exercícios. Este procedimento torna o método grupal , no conhecimento
psicanalítico, em grupo de crescimento emocional .

    O estabelecimento do contrato terapêutico diz a respeito do enquadre e setting
terapêuticos. Isto possibilita que os sentimentos aflorem em segurança, e qualquer
quebra em relação ao contrato de tratamento é encarado como ‘gancho’ de jogo
ou como designativo do processo da pessoa ou grupo, em psicoterapia analítica..
Berne (1966) coloca no primeiro capítulo a necessidade do enquadre, com
respeito a estabelecimento de dia, hora, número de participantes, honorários,
local, regras.
     O contato de pacientes e terapeuta fora do conceito grupal, em grupos de
psicoterapia transacional é incentivado e/ou aceito como necessidade grupal.
      Na grupanálise e na psicoterapia grupal de base analítica, isto é
desencorajado, para que o analista possa ver melhor as transferencias ocorridas,
já que a análise trabalha em cima das relações transferenciais.



                                                                                8
A questão do ‘setting’ (espaço temporal e espacial onde ocorrem as reuniões
– que corresponde também a um espaço atemporal onde o discurso latente
aparece) é muito importante na abordagem analítica. A mudança do setting
implica em mudança no processo do grupo, o que acarreta desvio no processo em
andamento de análise.

    Ficam aquí as idéias básicas compartilhadas, efetivas ao lidar com grupos.

1. O grupo como continência e fermentação de idéias e sentimentos,
   possibilitando maturação, crescimento e exteriorização das necessidades e
   idéias no ambiente externo.

2. A força da coesão grupal e da possibilidade da identidade e convivência em
   um grupo.

3. Todo grupo, mesmo de atividade e formal, tem a possibilidade de em algum
   momento se tornar um grupo de processo. Isto é saudável, para que as
   demandas de um objeto saudáveis sejam expresso e interpretado no nível real.
   O líder do grupo precisa estar preparado para lidar com isto em qualquer
   instituição ou área que atue. Além disto instituir grupos de reflexão é uma
   forma de estar lidando com este conteúdo latente sem prejuízo da função
   operativa (de trabalho) do grupo.


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     Grupoterapia: Teoria e Prática, Jair Franklin Jr. (Org.), Campinas, edição da
     Sociedade de Psicoterapia Analítica de Grupo de Campinas, pp. 245 –
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TUCKETT, David, Conceituação e Comunicação de Fatos Clínicos em
       Psicanálise, Revista Brasileira de Psicanálise, vol. XXVIII, n.4, 1994,
       Prefácio


NOTAS
•   Os termos psicólogo , facilitador, professor, analista, terapeuta, são usados
    com o mesmo significado, ou seja, aquele que presta ajuda, assim como
    analisando, treinando, aluno, cliente e paciente têm a conotação daquele que
    pede e/ou recebe ajuda ou orientação.

                                                                                 10
•   As palavras independem de sexo e/ou gênero – o uso do masculino é uma
    questão gramatical.

•    Posição OK – OK designa decisões infantis onde aprendemos (ou não) que
    todos temos nossas qualidades e defeitos, e podemos seguir juntos, apesar de
    dificuldades. OK-Não OK é uma posição existencial projetiva, onde o OK se
    sente responsável e/ou mais capacitado que o outro (Não OK).

•   Injunções são mensagens enviadas de forma não consciente pelos genitores e
    pessoas importantes para a criança, ensinando-os o que fazer perante
    situações as mais diversas. Exemplo: familiares que não conseguiram ser
    felizes tendem a se mostrarem assim, de tal forma que a criança pode intuir
    que é culpada pelo sofrimento dos pais. Assim, a injunção pode ser alguma
    frase que relate um ‘auto castigo’ como NÃO DESFRUTE, ou VOCÊ NÃO
    MERECE. A criança intui e faz disto uma regra a ser obedecida, ad eternum.


RESUMO


I. ESTRUTURA GRUPAL PRINCIPAL

 Região do Líder: espaço destinado ao líder ou por este ocupado. Exemplo – em
escolas tradicionais, o professor fica em um pequeno palco em frente a lousa –
seu espaço é restrito. Nas universidades o líder professor passeia entre as
carteiras. Depende muito do caráter do grupo. Os grupos terapêuticos têm mais
espaço, tanto para o líder, como para os membros.


 Fronteira Interna Principal: LIMITE FÍSICO ENTRE LÍDER E MEMBROS. Em
grupos de cidadania e terapêuticos, embora de finalidade diversa, a fronteira
interna principal é bem flexível. Em psicoterapia depende também da abordagem.


Região dos Membros: Espaço físico onde os participantes se movem.

Fronteira Externa: Limite do grupo (uma porta ou algo que delimite o espaço do
grupo). No Paço Municipal há uma delimitação em dias de reunião da câmara.
Quando há palestras de direitos humanos este espaço é aumentado até a porta de
entrada.


Ambiente externo : o local além ou externo a fronteira externa do grupo.




                                                                             11
----------------------------------------------------------------------

II. PROCESSO GRUPAL EXTERNO

Quando há a existência de forças externas, há uma solidariedade maior (coesão)
entre os membros, e uma tendência a combater as forças externas, ou tendência
à retração grupal frente a força externa.


Só quando a liderança desiste ou é seriamente ameaçada ocorre a ruptura. Neste
caso cedem as fronteiras externas, e o grupo se dissipa. Exemplo: Movimento
Estudantil na Ditadura. Exemplo de coesão grupal: os grupos que efetivamente
auxiliam em direitos humanos.

...............................................................................


III. FORÇAS QUE OPERAM EM UM GRUPO


A - Processo Grupal Externo: Pressão por parte de FORÇAS EXTERNAS ao
grupo, cujo objetivo é destruir a liderança, ou fronteira principal interna. Se o grupo
é destruído é porque seu aparato é mais fraco que as forças opositoras.


B - Processo Grupal Interno: ENTRE LÍDER E MEMBROS
       Agitação (Bion - luta/fuga)

      Agitação Interna: ações dos membros que desorganizam o grupo através
das inclinações individuais. É quando emergem os “acting-out”. Se o grupo não sai
do pressuposto luta-fuga, quando há a regressão narcísica primária, por falta de
objetos saudáveis internalizados, há a projeção no grupo (líder e/ou membros)

          Coesão (Bion - dependência/acasalamento)

      Coesão grupal: força que se opõe tanto à pressão quanto à agitação. Ou
pela tendência básica à coesão (pertinência)/ ou idealização do líder
(dependência)/ ou pela identificação com outro membro em sistema de pares .


C - Processo Grupal Interno Secundário: ENTRE MEMBROS
       Os interesses individuais e busca de afinidades podem conflitar com os de
outros participantes do grupo. Ao mesmo tempo, se há afinidades, pode auxiliar a
coesão. Porisso é importante que as várias opiniões sejam valorizadas.

            ------------------------------------------------------------------



                                                                                    12
Noeliza Bianchini de Lima é psicóloga, Mestre em Psicologia Clínica (PUCCAMP,
2000), professora universitária, analista transacional didata. ngroupsy@yahoo.com




                                                                              13

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Grupos Aportes

  • 1. GRUPOS...alguns referenciais teórico-práticos NOELIZA LIMA O objetivo deste trabalho é trazer formas de se abordar o grupo, buscando criar denominadores comuns entre a visão de Eric Berne (1977) e outros aportes da psicanálise tradicional de grupos e a análise das configuração vinculares. É parte da dissertação de mestrado: ‘Experiência de Um Grupo de Mulheres na Luta pela Cidadania’ (PUC-Campinas SP – Brasil – Pós graduação em Psicologia Clínica, Orientadora: prof. Dra. Maria Regina Leme Lopes Carvalho – Apoio CAPES-DS, 2000) INTRODUÇÃO Entende-se que o grupo se refere a: reunião de pessoas, coisas ou objetos que se abrangem no mesmo lance de - olhos, ou formam um todo; pequenas pessoas reunidas para um fim comum. ( Ferreira, Aurélio, 1993). - qualquer agregado social que tenha uma fronteira externa e pelo menos uma fronteira interna. (Berne, 97) - conjunto restrito de pessoas, compartilhando o mesmo local ao mesmo tempo, fazendo mútua representação interna e se atribuindo-assumindo papéis complexamente, tendo uma tarefa ( explicitada ou não), segundo Pichon Riviere (1977). REVISÃO DA DINÂMICA DE GRUPOS DE BERNE I. ESTRUTURA GRUPAL PRINCIPAL Região do Líder: espaço destinado ao líder ou por este ocupado. Exemplo – em escolas tradicionais, o professor fica em um pequeno palco em frente a lousa – seu espaço é restrito. Nas universidades o líder professor passeia entre as carteiras. Depende muito do caráter do grupo. Os grupos terapêuticos têm mais espaço, tanto para o líder, como para os membros. Fronteira Interna Principal: limite físico entre líder e membros. Em grupos de cidadania e terapêuticos, embora de finalidade diversa, a fronteira interna principal é bem flexível. Região dos Membros: Espaço físico onde os participantes se movem. Fronteira Externa: Limite do grupo (uma porta ou algo que delimite o espaço do grupo). No Paço Municipal há uma delimitação em dias de reunião da câmara. 1
  • 2. Quando há palestras de direitos humanos este espaço é aumentado até a porta de entrada. Ambiente externo : o local além ou externo a fronteira externa do grupo. • FORÇAS QUE OPERAM EM UM GRUPO B - Processo Grupal Interno: ente líder e membros Agitação Interna: ações dos membros que desorganizam o grupo através das inclinações individuais. É quando emergem os “acting-out”. Se o grupo não sai do pressuposto luta-fuga, quando há a regressão narcísica primária, por falta de objetos saudáveis internalizados, há a projeção no grupo (líder e/ou membros) Coesão grupal: força que se opõe tanto à pressão quanto à agitação. Ou pela tendência básica à coesão (pertinência)/ ou idealização do líder (dependência)/ ou pela identificação com outro membro em sistema de pares . C - Processo Grupal Interno Secundário: entre membros Os interesses individuais e busca de afinidades podem conflitar com os de outros participantes do grupo. Ao mesmo tempo, se há afinidades, pode auxiliar a coesão. Porisso é importante que as várias opiniões sejam valorizadas. D – Processo Grupal Externo Pressão por parte de forças externas ao grupo, cujo objetivo é destruir a liderança, ou fronteira principal interna. Se o grupo é destruído é porque seu aparato é mais fraco que as forças opositoras. Quando há a existência de forças externas, há uma solidariedade maior (coesão) entre os membros, e uma tendência a combater as forças externas, ou tendência à retração grupal frente a força externa. Só quando a liderança desiste ou é seriamente ameaçada ocorre a ruptura. Neste caso cedem as fronteiras externas, e o grupo se dissipa. Exemplo: o reaparecimento dos grupos religiosos no Iraque após a guerra (2203). Exemplo de coesão grupal: os grupos que efetivamente auxiliam em direitos humanos. PRINCIPAIS APORTES DE GRUPOS 2
  • 3. Segundo Lancetti (1994), o diagnóstico de grupos consiste em apontar as noções fundamentais que armam seu discurso, passando pela caracterização dos fenômenos que produzem a eficácia no suceder grupal. Os membros de um grupo certamente o constituem por possuírem, psiquicamente, elementos que encontram, neste habitat grupal, por meio das relações transferenciais, um continente que possibilita sua expressão e conseqüente elaboração. Não é por acaso que uma pessoa escolhe um grupo ao qual pertencer. O grupo é um grupo de interesse, de motivação e também reflete um movimento interno necessário naquele momento para cada pessoa. Tudo o que ocorre no grupo é material de diagnóstico. O psicólogo * , sendo aglutinador das ocorrências, coloca seu conhecimento, sua disposição e principalmente seus sentidos para que a análise seja possível (Tucket, 1994). Sem a empatia e a sensibilidade do pesquisador, em sendo o facilitador do mesmo, qualquer evento grupal perde seu significado. PROJEÇÃO E IDENTIFICAÇÃO Entre os mecanismos de defesa, a projeção se mostra eficaz no equilíbrio frente a sentimentos desconhecidos que são sentidos como ameaçadores para o próprio self. A projeção nos assegura a proteção contra sentimentos penosos de ataque e desamparo. A projeção é a primeira reação do bebê ao sofrimento, e provavelmente permanece em nós como a reação mais expontânea a qualquer sentimento penoso, ao longo de toda a nossa vida ( Klein, Riviere, 1975). Quando dentro de nós existem forças que operam emoções dolorosas, reconhecidas internamente como destrutivas, a tendência é nos livrarmos delas. Negamo-las e as colocamos em outra(s) pessoa(s), objeto ou grupo, favorecendo em nós o equilíbrio interno. Expulsamos então o perigo, responsabilizando um objeto externo pelo que estamos sentindo, e neste quot;enxergar o objeto como mauquot; jogamos sobre ele nossas angústias e frustrações. Neste sentido o grupo é visto como o continente e o conjunto das projeções individuais. O grupo que defende algo que acreditamos é visto como quot;o seio bomquot;, e qualquer ameaça a ele, por elementos externos ao grupo, ou forças internas tais como a pressão e agitação, desencadeiam em nós mais arcaicos temores de destruição . Mas por que acontece isto? Porque existe entre o eu e o grupo a identificação projetiva, isto é, o eu idealiza o grupo vendo-o com capacidade de sustentar o eu conferindo-lhe segurança. Aí surge a confiança, o respeito e a admiração, pessoa - pessoa(as) e pessoa - grupo. Introjetamos as necessidades, expectativas e valores do grupo com o qual Temos afinidade, vorazes em colocar dentro de nós estas idealizações que o grupo contém. Sim, porque cada pessoa joga para o grupo a imago (imagem idealizada) que constrói a respeito dele e as imagos que faz a respeito dos integrantes deste grupo, e com essas imagos se identifica. E o grupo se torna a 3
  • 4. integração das imagos dos membros, ou seja, o receptáculo das transferencias individuais, e o espaço onde estas relações vão se configurar. Vamos refletir um pouco sobre o que pode acontecer no contexto grupal em termos de projeção/identificação, e como se manifestam no grupo, em momentos de atividade transferencial, ligando ao conceito de Berne (1977) a respeito de grupo de processo, agitação, pressão interna e externa e fronteiras a) Acontece um fato externo ao grupo sentido como ameaça(um calor excessivo), ou como um ato de amor (o grupo é homenageado). Aumenta a coesão grupal. As pessoas se sentem gratificadas pelo fato do grupo corresponder aos seus anseios, quer se cotizando para comprar um ventilador ( no primeiro caso), quer se reunindo ( no segundo caso). A fronteira externa do grupo foi rompida pelo calor excessivo, mas logo se restabelece pela coesão grupal. b) Se é um fato interno de grupo, isto é, a reclamação de alguém a respeito da figura do líder( ainda a projeção) também aumenta a coesão grupal. Surgem os quot;salvadoresquot; da mãe boa (representada pelo líder), que se colocam contra aquela pessoa que reclamou, pois na medida em que ajudam o líder estão salvando a imagem que fazem do mesmo, para não se sentirem ameaçados - e continuarem em segurança. Salvaguardam o continente grupal. A fronteira interna principal é ameaçada por um integrante. A coesão grupal restabelece a harmonia. No caso sente-se injuriado o querelante. Se estiver em intensa turbulência emocional poderá sair por uns dias, voltando depois quieto e envergonhado por ter invadido um limite e infringido um cânone (norma inquestionável) grupal - reclamar da liderança. c) Se a projeção é feita por um membro em cima de outro membro do grupo, aí a agitação é maior. Pode levar á cisão do grupo, se o líder não souber dividir suas atenções entre seus liderados ( é o mesmo mecanismo da briga entre irmãos). As pessoas tomam partidos, mas prevalece a opinião do membro mais antigo, pois antigüidade é um cânone grupal. O líder aberto a mudanças é flexível e age firme e afetuosamente ( liderança efetiva: liderança de lei e liderança de fato) de forma a assegurar a acolhida dos membros do grupo para ambos. FATO CLÍNICO, TRANSFERENCIA, CONFIGURAÇÕES VINCULARES Segundo Meimes ( et allis, 1998), o termo vínculo tem sua origem no latim – vinculum, de vencire – que significa atar, juntar com ligaduras e nós fortes. A pessoa a partir de sua primeira ligação com a mãe irá na vida estruturar um ego saudável a partir de vínculos que sustentem e representem sua(s) escolha(s) objetais, tornando-se o grupo um continente de configurações vinculares. O grupo chega a uma totalização através da pertinência e cooperação (Peguin, 1997). Podemos então dizer que a missão do grupo, as necessidades individuais e o grau de vinculação formam o continente grupal. 4
  • 5. Para entender melhor a situação do psicólogo em um grupo, quer como psicanalista, observador clínico, facilitador e/ou observador participante necessitamos conceituar “fato clínico”. Quando o pesquisador observa que algum membro do grupo expressa um sentimento não relacionado ao assunto em pauta, suspeita de que algo acontece a nível inconsciente sendo trazido ao real através deste símbolo que é a emoção, não pertinente ao contexto grupal. Isto é um fato clínico. Se este sentimento desconectado com o real relaciona-se com o facilitador - torna-se um fato clínico psicanalítico (Quinodoz, 1994). Em Análise Transacional estes momentos são vividos como ‘processo grupal’. Segundo Berne (1962) correspondem as relações transferenciais ao ajustamento da imago grupal, sendo importante escutar-se a comunicação latente, que não é o discurso concreto, e sim o latente que se manifesta através de sinais não verbais. Exemplo: Maria (líder de um grupo de mulheres) pede que Mô (uma das conselheiras) faça um verso para o Dia da Não Violência Contra a Mulher, com 15 dias de antecedência. Mô diz que vai enviar por e-mail daí a dois dias para Milita (que é a única que tem computador). Milita é a mulher que mais faz restrições a Mô enquanto psicóloga. Mô se compromete a enviar os versos, sentindo-se desconfortável com este fato. Envia o e-mail no dia marcado. Não obtém resposta de Mel (que seria o ponto de contato). Liga para Milita que diz não ter aberto ainda a Internet, apesar de já se terem passado dois dias. Isto é um fato clínico e um fato clínico psicanalítico. Fato clínico porque Milita sabe da urgência do envio da mensagem para a vice-presidente (Mar) que então, aprovando-os, os enviaria para Mel (que faria os folhetos). Há aí alguma relação entre o comportamento de Milita e um conteúdo psíquico projetado no grupo (atrapalhando a missão do grupo),o que contextua o fato clínico. É também um fato clínico psicanalítico tendo-se em conta que há antecedentes descritos do sentimento de rejeição por parte de Milita em relação a Mô, e Milita saber da urgência do envio da mensagem para Mar, a fim de se planejar a movimentação. Mô viajou e só veio a saber que não haveria movimentação 10 dias após enviar a mensagem. O atraso da mensagem em toda a rede de comunicações iniciou-se com o e-mail de Mô, que, embora feito no dia certo não contou com o respaldo de Milita. Assim Milita consegue implicar Mô no atraso (projeção de agressividade) e impossibilita a missão do grupo (do qual se vinga por aceitar Mô como psicóloga conselheira).No próximo encontro provavelmente o grupo ao invés de um grupo de atividade, entrará em processo e Milita se esquivará da responsabilidade. Em análise transacional conceitua-se a atitude de Milita como ‘isca de jogo’. Poderia esta conversa terminar com briga, como um provável fim de jogo de Devedor. 5
  • 6. Para entender de onde vem receios que ocorrem em um grupo é necessário entender a cultura grupal, a seguir. Segundo Barnes (1977), o grupo sofre interferências dos cânones e caráter grupal. - cânones grupais - dificilmente mulheres que não estejam na movimentação de direitos humanos há muito tempo - são aceitas. - caráter grupal. - neste grupo geralmente as pessoas não falam diretamente o que necessitam, são sensíveis a críticas e necessitadas de valorização pessoal. Os grupos que defendem minorias têm esta característica geral, devido a discriminação sócio cultural que sofrem. Desta forma quando surge um fato clínico abre-se espaço para a leitura do emergente pelo líder. No caso de um grupo operativo, a leitura das transferências está aberta ao facilitador interessado. Neste caso o mais comum é que o fato clínico ao se tornar um fato clínico psicanalítico fale das relações transferenciais entre participante - participante e/ou participante - líder. O analista (e/ou observador participante) é, portanto, elemento configurador dos vínculos e ao mesmo tempo o intérprete das demandas do grupo. É então que podemos por meio da relação transferencial tentar estabelecer o significado ordenador do discurso real enquanto mediador do inconsciente, pela palavra. O discurso e o que perpassa pelo discurso (fatos clínicos) contam o que o grupo representa para o membro, e como o membro estrutura a si mesmo através do movimento do grupo. Em um grupo operativo algumas vezes é necessário evitar interpretações e movimentos terapêuticos, mesmo que o grupo se torne: um grupo de suposto básico para Bion (1975) ou um grupo de processo (Berne, 1966/ 1997), momentos em que o grupo se revela no campo das relações transferenciais (quando emerge o fato clínico) Podemos então, se for nosso propósito, utilizar esta intensa atividade transferencial para analisar o conteúdo das demandas do grupo e das pessoas dentro do grupo, por meio da projeção e identificação. Mas só será devolvida esta análise , através da interpretação, se for um grupo de caráter terapêutico, ou um workshop onde a dinâmica grupal e o contrato com o psicólogo assim o permita. INTEGRAÇÃO DE CONCEITOS Berne (1966) define os grupos como formais ou informais, conforme tenham ou não objetivos e organização estruturados. Tanto os formais como os informais podem ser grupos de processos conforma apareçam ou não situações transferencias (situações não resolvidas do passado, que são trazidas ao aquí e agora grupal). O grupo de atividade é chamado por Bion (1975) de grupo de trabalho, diferenciando de grupo de processo ou de suposto básico. Quando o 6
  • 7. grupo está em atividade, é um grupo de trabalho e está dirigido a um objetivo, com organização. Se em algum momento surgem emoções que denunciam o vivenciar no “aqui e agora” de situações inacabadas de infância, o grupo se torna um grupo de processo. Segundo Pichon Rivière (1980): o grupo sempre é operativo (de atividade ou de trabalho). Quando se forma um grupo cada um dos integrantes projeta suas fantasias no grupo, relacionando-se com as pessoas conforme suas projeções. As fantasias grupais são reveladas pelo porta voz, denominado ‘alcagüete’, que é o que fala das demandas do grupo. Exemplo: Maria, a líder deste grupo de mulheres, diz que se sente mal por ter que fazer todo o trabalho do grupo, que não tem ajuda, etc. Duas mulheres saem naquele momento alegando compromissos em casa. As outras ficam consolando e incentivando Maria. Esta delata o caráter do grupo, tornando-se o alcagüete. Delata o latente que perpassa todo o discurso real. Sendo este um grupo de trabalho, cada uma das mulheres têm afazeres pessoais, profissionais e a sua dedicação à luta pelos direitos da mulher. Portanto, a situação que Maria retrata na verdade é comum a todas. As que saem têm dificuldade em enfrentar o fato de que necessitam dar tempo a elas mesmas. As que ficam incentivam a Criança Interior de Maria, dando sustentação e apoio, e cuidando de si mesmas no aspecto psíquico. Revelam a não permissão para cuidar de si mesmas. Está aí presente a Injunção ‘Primeiro os Demais’, e ‘Não desfrute’, em que as pessoas mostram um roteiro de vida em que só podem desfrutar depois de todo o trabalho realizado, e depois que os outros estiverem bem. As interações representam a possibilidade de o integrante reviver situações do passado, penosamente reprimidas, reexperimentando-as na relação com o coordenador, com a tarefa, com outros integrantes. Segundo Bion (1975), sendo este neste momento um grupo de processo, significa que o grupo traz uma crença emocional da qual todos participam, tendo o grupo um pressuposto básico, conforme o instante: Dependência: quando o grupo apoia e venera seu líder, que é idealizado - assumindo características de deidade, reforçando as fantasias de onipotência do grupo. É neste momento que o líder ocuparia a posição existencial OK – Não OK. A dependência do líder leva a momentos de agitação por parte do mesmo, como o exemplo acima. O desabafo da líder provocou agitação e fuga, e entramos no pressuposto seguinte. Luta e fuga: quando se fantasia a existência de um perseguidor, o que leva o - grupo a defender-se ou agredir. O grupo de uma forma geral adota a posição OK – Não OK e se chegar a actings - outs, ou sejam, exteriorizações de muita agitação, por estarem vivenciando a impotência e o abandono (Não OK – Não OK). No exemplo acima, o grupo não era capaz de sustentar as demandas internas das participantes – não tinha secretaria efetiva, material de apoio, e havia muito trabalho. Na parte psicológica, o fato de o grupo se preocupar mais com as mulheres de fora do que com as do próprio grupo levava as 7
  • 8. participantes a se sentirem frágeis, sem acolhida, sem consciência deste processo. Algum tempo este grupo viveu o pressuposto básico luta – fuga. Emparelhamento ou Acasalamento ( paring: por de acordo, convir): o grupo - tende a centrar-se em torno de um par, criando um clima emocional de expectativa e esperança. No exemplo acima, em momentos de vitória o grupo se sente irmanado ao líder, sentindo que tudo é possível. É uma fantasia messiânica e o grupo se coloca numa tríplice posição: OK - OK – NÂO OK. Ou seja : ‘somos ótimas, e embora a sociedade seja patriarcal e não esteja sensibilizada aos direitos da mulher, conseguiremos tudo e logo’. Cortesão (In Angeli, 1994), considera o grupo como Matrix, a terra - mãe onde idéias são semeadas e germinadas pelos seus integrantes. Tem também o caráter de continência e pertinência, provendo a quem dele participa de intensa criatividade e produção concreta e psicológica. Este conceito explica o grupo feminista aquí citado como exemplo, na medida em que estas mulheres levam suas idéias a outros grupos em contínua fertilização, germinação e nascimento. Este conceito na verdade traduz a idéia geral de grupos. É um centro de alimentação e renovação para todos que deles participam, quer na condição de líderes, quer na condição de participantes. A conceituação de Berne a respeito de processo de grupo não foge as colocações atuais de grupanálise. Na grupanálise o grupo é um todo, com ego, superergo e id. Existe uma protomentalidade grupal (Terzis, 1994). O enfoque é dado ao grupo e não ao indivíduo. Este é somente um emissário da voz grupal, voz que nasce do inconsciente grupal. Algumas coisas podem ser mais bem entendidas, como a organização psíquica do grupo e a análise das configurações vinculares (Lima, 1999). O que se torna diferente é que Berne analisa as transações ocorridas, tendo o analista transacional uma atitude diretiva, no tocante a colocar conceitos de AT e exercícios. Este procedimento torna o método grupal , no conhecimento psicanalítico, em grupo de crescimento emocional . O estabelecimento do contrato terapêutico diz a respeito do enquadre e setting terapêuticos. Isto possibilita que os sentimentos aflorem em segurança, e qualquer quebra em relação ao contrato de tratamento é encarado como ‘gancho’ de jogo ou como designativo do processo da pessoa ou grupo, em psicoterapia analítica.. Berne (1966) coloca no primeiro capítulo a necessidade do enquadre, com respeito a estabelecimento de dia, hora, número de participantes, honorários, local, regras. O contato de pacientes e terapeuta fora do conceito grupal, em grupos de psicoterapia transacional é incentivado e/ou aceito como necessidade grupal. Na grupanálise e na psicoterapia grupal de base analítica, isto é desencorajado, para que o analista possa ver melhor as transferencias ocorridas, já que a análise trabalha em cima das relações transferenciais. 8
  • 9. A questão do ‘setting’ (espaço temporal e espacial onde ocorrem as reuniões – que corresponde também a um espaço atemporal onde o discurso latente aparece) é muito importante na abordagem analítica. A mudança do setting implica em mudança no processo do grupo, o que acarreta desvio no processo em andamento de análise. Ficam aquí as idéias básicas compartilhadas, efetivas ao lidar com grupos. 1. O grupo como continência e fermentação de idéias e sentimentos, possibilitando maturação, crescimento e exteriorização das necessidades e idéias no ambiente externo. 2. A força da coesão grupal e da possibilidade da identidade e convivência em um grupo. 3. Todo grupo, mesmo de atividade e formal, tem a possibilidade de em algum momento se tornar um grupo de processo. Isto é saudável, para que as demandas de um objeto saudáveis sejam expresso e interpretado no nível real. O líder do grupo precisa estar preparado para lidar com isto em qualquer instituição ou área que atue. Além disto instituir grupos de reflexão é uma forma de estar lidando com este conteúdo latente sem prejuízo da função operativa (de trabalho) do grupo. BIBLIOGRAFIA ANGELI, O, (1977), Experiências de Grupos de Reflexão com Alunos Médicos: Um Estudo Psicológico, Campinas, Dissertação (Mestrado) – Instituto de Psicologia, Pontifícia Universidade Católica de Campinas. BARNES, G., (1977), Introduction, In G. Barnes (Org.), T.A. After Berne, San Francisco, Harper’s College Press, Chapter One. BERNE, E., (1966), Principles of Group Treatment, New York, Grove Press, Inc. ____ Estrutura e Dinâmica das Organizações e Grupos, Belo Horizonte, trad. e publicação UNAT-Brasil, 1997. _____(1962), Intuition and Ego States, San Francisco, Trans-Pub, ITAA, 1962. BION,W.R.(1975), Experiências Com Grupos: Os Fundamentos da Psicoterapia De Grupo, Trad. Walderedo Oliveira, São Paulo, Imago. FERREIRA, A. (1997), Mini Dicionário Aurélio da Língua Portuguesa, Rio de Janeiro, Nova Fronteira S.A 9
  • 10. KLEIN, M., RIVIERE, J. (1975), Amor, Ódio e Reparação, São Paulo, Imago. LANCETTI, A.( 1995), Para Uma Reformulação da Experiência Grupal, In G. Baremblit (Org), In G. Baremblit, Grupos: Teoria e Técnica, Rio de Janeiro, Col. Ibrapsi Graal, 83-88. LIMA, N., Women Rights: Berne’s Groups Dynamic [trabalho apresentado In: ITAA August Conference, San Francisco, 1999]. Resumo em Anais, 1999. MEIMES et al., (1998), Repercussão de Um Projeto Político Social na Vincularidade, In FLAPAG (Org.) Anais, Montevidéu, Anais, Mosca Hnos S.A., v. 3, p. 71. PEGUIN, R., Concepção Operativa de Grupos. In: FRANKLIN J.( Org), Grupoterapia, Teoria e Prática, Campinas, Sociedade de Psicanálise de Grupo de Campinas, cap. 3, 1997, pp. 79 – 107. PICHON-RIVIÉRE, E., (1980) O Processo Grupal, São Paulo, Martins Fontes. QUINODOZ, (1994, Jean-Michel, Fatos Clínicos ou Fatos Clínicos Psicanalíticos, Revista Brasileira de Psicanálise, vol. XXVIII, n.4, pp.613 a 634. TERZIS, Antonios, Dimensões Teóricas e Técnicas da Grupanálise, In Grupoterapia: Teoria e Prática, Jair Franklin Jr. (Org.), Campinas, edição da Sociedade de Psicoterapia Analítica de Grupo de Campinas, pp. 245 – 271. TUCKETT, David, Conceituação e Comunicação de Fatos Clínicos em Psicanálise, Revista Brasileira de Psicanálise, vol. XXVIII, n.4, 1994, Prefácio NOTAS • Os termos psicólogo , facilitador, professor, analista, terapeuta, são usados com o mesmo significado, ou seja, aquele que presta ajuda, assim como analisando, treinando, aluno, cliente e paciente têm a conotação daquele que pede e/ou recebe ajuda ou orientação. 10
  • 11. As palavras independem de sexo e/ou gênero – o uso do masculino é uma questão gramatical. • Posição OK – OK designa decisões infantis onde aprendemos (ou não) que todos temos nossas qualidades e defeitos, e podemos seguir juntos, apesar de dificuldades. OK-Não OK é uma posição existencial projetiva, onde o OK se sente responsável e/ou mais capacitado que o outro (Não OK). • Injunções são mensagens enviadas de forma não consciente pelos genitores e pessoas importantes para a criança, ensinando-os o que fazer perante situações as mais diversas. Exemplo: familiares que não conseguiram ser felizes tendem a se mostrarem assim, de tal forma que a criança pode intuir que é culpada pelo sofrimento dos pais. Assim, a injunção pode ser alguma frase que relate um ‘auto castigo’ como NÃO DESFRUTE, ou VOCÊ NÃO MERECE. A criança intui e faz disto uma regra a ser obedecida, ad eternum. RESUMO I. ESTRUTURA GRUPAL PRINCIPAL Região do Líder: espaço destinado ao líder ou por este ocupado. Exemplo – em escolas tradicionais, o professor fica em um pequeno palco em frente a lousa – seu espaço é restrito. Nas universidades o líder professor passeia entre as carteiras. Depende muito do caráter do grupo. Os grupos terapêuticos têm mais espaço, tanto para o líder, como para os membros. Fronteira Interna Principal: LIMITE FÍSICO ENTRE LÍDER E MEMBROS. Em grupos de cidadania e terapêuticos, embora de finalidade diversa, a fronteira interna principal é bem flexível. Em psicoterapia depende também da abordagem. Região dos Membros: Espaço físico onde os participantes se movem. Fronteira Externa: Limite do grupo (uma porta ou algo que delimite o espaço do grupo). No Paço Municipal há uma delimitação em dias de reunião da câmara. Quando há palestras de direitos humanos este espaço é aumentado até a porta de entrada. Ambiente externo : o local além ou externo a fronteira externa do grupo. 11
  • 12. ---------------------------------------------------------------------- II. PROCESSO GRUPAL EXTERNO Quando há a existência de forças externas, há uma solidariedade maior (coesão) entre os membros, e uma tendência a combater as forças externas, ou tendência à retração grupal frente a força externa. Só quando a liderança desiste ou é seriamente ameaçada ocorre a ruptura. Neste caso cedem as fronteiras externas, e o grupo se dissipa. Exemplo: Movimento Estudantil na Ditadura. Exemplo de coesão grupal: os grupos que efetivamente auxiliam em direitos humanos. ............................................................................... III. FORÇAS QUE OPERAM EM UM GRUPO A - Processo Grupal Externo: Pressão por parte de FORÇAS EXTERNAS ao grupo, cujo objetivo é destruir a liderança, ou fronteira principal interna. Se o grupo é destruído é porque seu aparato é mais fraco que as forças opositoras. B - Processo Grupal Interno: ENTRE LÍDER E MEMBROS Agitação (Bion - luta/fuga) Agitação Interna: ações dos membros que desorganizam o grupo através das inclinações individuais. É quando emergem os “acting-out”. Se o grupo não sai do pressuposto luta-fuga, quando há a regressão narcísica primária, por falta de objetos saudáveis internalizados, há a projeção no grupo (líder e/ou membros) Coesão (Bion - dependência/acasalamento) Coesão grupal: força que se opõe tanto à pressão quanto à agitação. Ou pela tendência básica à coesão (pertinência)/ ou idealização do líder (dependência)/ ou pela identificação com outro membro em sistema de pares . C - Processo Grupal Interno Secundário: ENTRE MEMBROS Os interesses individuais e busca de afinidades podem conflitar com os de outros participantes do grupo. Ao mesmo tempo, se há afinidades, pode auxiliar a coesão. Porisso é importante que as várias opiniões sejam valorizadas. ------------------------------------------------------------------ 12
  • 13. Noeliza Bianchini de Lima é psicóloga, Mestre em Psicologia Clínica (PUCCAMP, 2000), professora universitária, analista transacional didata. ngroupsy@yahoo.com 13