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TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA
Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana




A          Salvação vem pela Fé

        A fé é uma palavra eminentemente cristã. A palavra fé e seus derivados
perpassam a Bíblia. No Novo Testamento o substantivo fé (pístis) aparece 243 vezes,
o verbo crer (pistéuo) ocorre 241 vezes e o adjetivo fiel (pistós) aparece 67 vezes. A
fé se relaciona com a esperança, com o futuro, mas também com o presente, com a
história, é compromisso de vida fiel. O apóstolo Paulo em suas cartas sublinha a
relação pessoal entre o crente e o seu Senhor a partir da fé. A Carta de Tiago fala da
inseparabilidade entre a fé autêntica e a coerência de vida testemunhada pelas boas
obras (Tg 2,14.26). O que está de acordo com a afirmação paulina de que a fé opera
pela caridade (Gl 5,6). A fé em Paulo é o modo de acolher o Evangelho de Jesus Cristo
e comporta níveis de adesão sucessivos e crescentes. O primeiro nível diz respeito à
aceitação de Cristo morto e ressuscitado na própria vida. A fé é abertura total,
incondicionada, ao dom de Deus. Trata-se de aceitar e querer Deus na própria vida
como Ele se revelou, sem a pretensão de controlar Deus e seu Evangelho. Implica
saída do próprio sistema de vida para realizar-se plenamente, encontrando-se a si
mesmo e alcançando o ser como deve ser. Não é alienação, mas libertação. Trata-se
da fé das comunidades cristãs desde o princípio (1 Cor 15,1-11) e que implica o
batismo (Rm 6,1-11). No batizado a morte e a ressurreição de Cristo são ativadas e,
liberto do pecado, o fiel vive em Deus por meio de Cristo, como o ramo que se
alimenta da seiva conforme Jo 15,1-17. A fé exige conversão, abandono dos ídolos
(1Ts 1,9).

        O dom o Espírito Santo recebido no batismo permite ao cristão se configurar a
Cristo, passando ao segundo nível da fé que é a personalização ou encarnação
crescente do Evangelho em todas as dimensões da vida. Cresce a vitalidade de Cristo
em nós e se pode dizer com o Apóstolo: Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive
em mim. Minha vida presente na carne vivo-a pela fé no Filho de Deus, que me amou
e se entregou a si mesmo por mim (Gl 2,20); Pois para mim o viver é Cristo e o morrer
é lucro (Fl 1,21); Mais ainda: tudo considero perda pela excelência do conhecimento
de Cristo Jesus, meu Senhor.Por ele, perdi tudo e tudo tenho como esterco, para
ganhar a Cristo e ser achado nele, não tendo como minha justiça aquela que vem da
Lei, mas aquela pela fé em Cristo, aquela que vem de Deus e se apóia na fé, para
conhecê-lo, conhecer o poder da sua ressurreição e a participação nos seus
sofrimentos, conformando-me com ele na sua morte, para ver se alcanço a
ressurreição de entre os mortos (Fl 3,8-11); Combati o bom combate, terminei a
TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA
Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana
minha carreira, guardei a fé (2 Tm 4,7). Experimenta-se a convicção de que nada
pode nos separar do amor de Deus manifestado em Cristo Jesus, nosso Senhor (Rm
8,39).

        O terceiro nível é o contexto comunitário da fé, que impulsiona e faz crescer a
experiência de fé pessoal. O nível comunitário da fé é o das assembléias litúrgicas ou
reuniões motivadas pela fé, onde a fé se alarga e cresce na confissão comum
conforme Rm 10,9-10: com o coração se crê (responsabilidade pessoal) e com a boca
se confessa (profissão da assembleia litúrgica). No Novo Testamento temos vários
hinos ou profissões de fé litúrgicas: Fl 2,6-11; Ef 1,3-14; Cl 1,15-20; 1 Tm 3,16; 1 Tm
6,15-16; 2 Tm 2,11-13. O quarto nível é experimentado juntamente com o nível
comunitário e diz respeito à exigência missionária da fé. A comunidade é o ponto de
partida e de chegada da missão. Na missão cresce a fé e a fidelidade ao Evangelho
(cf. 1 Cor 9,19-23). Mediante o ato de fé Deus nos torna justos e santos pela sua
graça, capazes de amar gratuitamente. Tornamo-nos participantes da vida divina.
Somos salvos pelo amor misericordioso de Deus.

                                                    Pe. Lauro Sérgio Versiani Barbosa.
TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA
Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana




H          omilia para a Formatura da FAM 15/12/
           2012
        Alegramo-nos hoje com formatura dos Bacharéis em Filosofia da Faculdade
Arquidiocesana Dom Luciano Mendes de Almeida e bendizemos a Deus por tantos
benefícios alcançados ao longo desses anos de estudos! Estudar na FAM é um
privilégio, uma responsabilidade e um compromisso. O privilégio vem não só do
reconhecimento alcançado por instrumentos avaliativos do Ministério da Educação
dando conta da excelência educacional da Faculdade Dom Luciano, mas da longa
tradição educacional do Seminário de Mariana com 262 anos de existência e da
atmosfera intelectual cultivada de harmonia entre fé e razão. Estudar Filosofia na
FAM implica responsabilidade e compromisso no uso audacioso da razão com rigor
metodológico e amplitude de horizonte a serviço da verdade, da vida e da esperança.
A Faculdade que carrega a tradição do Seminário de Mariana e o nome ilustre de
Dom Luciano Mendes de Almeida está compromissada com o uso responsável,
amplo e integral da razão. No horizonte de uma cultura racionalista, fé e razão se
opõem. Na verdade, o racionalismo reduz a razão à forma de “razão instrumental”,
de caráter “técnico-científico”.

       Em seu famoso opúsculo Resposta à Pergunta: Que é o Esclarecimento?, Kant 1
define o projeto da Ilustração (razão moderna) a partir de dois vetores básicos:
posição crítica em relação à tradição e a autoridade e comprometimento com o
interesse emancipatório do homem. Sair do estado de menoridade é recusar as
tutelas e afirmar-se como capaz de pensar e se conduzir autonomamente. Há uma
relação indispensável entre esclarecimento e liberdade. Kant não advoga o
individualismo ao defender a autonomia, mas insiste na liberdade de se fazer um uso
público da razão em todas as questões. Aponta para a busca do consenso obtido pelo
trabalho de uma razão crítica. Todas as pessoas e épocas têm direito a esse exercício,
ao esclarecimento. O problema é que Kant estabeleceu uma cisão ao recusar a
metafísica no nível da razão pura e aceitá-la só no nível da razão prática. O idealismo
alemão rejeitou a solução kantiana e tentou uma reconstrução sistemática da
metafísica nas modalidades de Fichte, Schelling e Hegel. Mas a partir do século XIX a
posição crítica em relação à metafísica foi radicalizada.



       1
          Cf I. KANT, Resposta à Pergunta: “Que é o Esclarecimento”?, in, ID., Textos
Seletos, Petrópolis 1985, 100-116.
TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA
Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana
       Os “enciclopedistas franceses”, Nietzsche, Adorno, Horkheimer e, no Brasil, o
ensaísta Sérgio Paulo Rouanet2, compreendem a “Ilustração” do século XVIII como
parte (para alguns privilegiada) de uma “família espiritual” batizada como “corrente
iluminista”, com raízes na Antigüidade, passando pela Renascença, para chegar até
Marx, Freud, Adorno, Michel Foucault, Habermas e outros. O “iluminismo” seria uma
tendência intelectual “trans-epocal” que combate o mito e o poder a partir da razão.

        Na Dialética do Esclarecimento3, Adorno e Horkheimer observam uma
dialética no iluminismo: “o mito já é esclarecimento e o esclarecimento acaba por
reverter à mitologia”4. O iluminismo nasce de uma ruptura com a natureza, no
sentido de dominá-la, dando início a uma incessante trabalho da razão que combate
todo pensamento que contém traços de sua pré-história. Assim o animismo é
criticado pelo mito, o mito pela metafísica, a metafísica pela ciência matematizada.
Atualmente o iluminismo absolutiza a ciência como única forma de verdade. E a
razão instrumental, própria do iluminismo e fruto da luta contra a magia e o mito,
transforma-se em mito. Observa-se em todo o processo, desde o seu início, um uso
redutor da razão a par do “progresso” alcançado.

                Segundo Clodovis Boff em sua Teoria do Método Teológico a razão
moderna só admite duas funções: demonstrativa (argumentos necessários, como na
matemática e na lógica silogística) e científica empírico-formal5. Embora a “razão
moderna” esteja em crise, como demonstram discussões epistemológicas6, pesquisas
neurológicas7, pensamento pós-moderno8, ainda é hegemônica, sendo necessária

       2
         Diplomata brasileiro, foi Ministro da Cultura; ensaísta, possui diversas
publicações e pode ser considerado um habermasiano. Aqui a referência é: S. P.
ROUANET, As Razões do Iluminismo, São Paulo 1987.
       3
         Cf T. W. ADORNO – M. HORKHEIMER, Dialética do Esclarecimento, Belo
Horizonte 1986.
       4
           T.W. ADORNO – M. HORKHEIMER, Dialética do Esclarecimento, 15, 23 e 39.
       5
           Afirmava David Hume: “Se tomarmos nas mãos um volume qualquer de
Teologia ou de Metafísica escolástica, por exemplo, perguntemos: ‘Este livro contém
algum raciocínio abstrato sobre quantidade ou número?’ Não. ‘Contém algum
raciocínio experimental sobre questões de fato ou de existência?’ Não. Para o fogo com
ele, pois outra coisa não pode encerrar senão sofismas e ilusões”. D. HUME, “Investigação
sobre o Entendimento Humano”, in Col. Os Pensadores 23, São Paulo 1973, 198.
       6
           L.C. SUSIN , ed., Mysterium Creationis – Um Olhar Interdisciplinar sobre o
Universo, São Paulo 1999; J. GUITTON – G. BOGDANOV – IG. BOGDANOV, Deus e a
Ciência. Em direção ao metarrealismo, Rio de Janeiro 1992; R. WEBER, Diálogos com
cientistas e sábios. A busca da unidade, São Paulo s.d. (orig. 1986).
       7
         D. GOLEMAN, Inteligência emocional, São Paulo 1996; A. DAMÁSIO, O erro de
Descartes, São Paulo 1996.
       8
         G. VATTIMO, Credere di credere, Milano 1996; O. MADURO, Mapas para a festa.
Reflexões latino-americanas sobre a crise e o conhecimento, Petrópolis 1994.
TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA
Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana
uma ampliação da ideia de razão. Além da razão formal (lógica) e empírico-formal
(científica) existe a razão discursiva em geral e que pode ser denominada “razão
crítica” em sentido amplo porque busca o sentido das coisas e revista tudo. Abarca
desde a razão simples e direta do cotidiano (o “bom senso”) até a “razão
hermenêutica” utilizada pelas ciências humanas (também para estas, o racionalismo
hegemônico produz uma certa hesitação epistemológica). Alargando-se o conceito
de razão,       supera-se o     racionalismo   científico   estreito,   conhecido   como
“cientificismo”9. Mas é preciso ir além e superar toda forma de racionalismo. É
preciso considerar a “razão intuitiva”(noûs para os gregos, intellectus para os
latinos). Em linguagem atual se pode chamar esta “razão intuitiva” de
“pensamento”, “mente” ou “espírito” e até mesmo “consciência”. O noûs é intuição,
percepção, apreensão do ser, contemplação e saber imediato da verdade. Na medida
em que é abertura-ao-mundo, é coextensivo ao ser humano. O conhecimento que
proporciona é atemático, isto é, supraconceitual e supraconsciente10. É justamente
através do noûs que se pode chegar ao mistério do Ser, a uma contemplação
amorosa da Realidade. O noûs é, no dizer de Heidegger, o pensamento que deixa o
Ser ser Ser (das Sein seinlassen)11. Entram em cena as “razões do coração” de que
fala Pascal (Pensées, 277). O nôus ou intellectus é o princípio e fundamento do
pensar, é o pensamento pensante. É a fonte da ratio (pensamento pensado).

       O pensamento cristão em geral, seja na perspectiva do platonismo cristão ou
do aristotelismo cristão, com os seus expoentes maiores, respectivamente Santo
Agostinho e Santo Tomás de Aquino, seja na vertente mais contemporânea, sempre
cultivou uma visão ampla e positiva da razão, uma razão amiga da fé e da vida.
Talvez a problemática mais dramática de nossa época seja a questão do sentido
diante do vazio do niilismo metafísico e ético característico do imanentismo
antropocêntrico e expresso no relativismo difundido no mundo contemporâneo.
Sem dúvida nós podemos constatar dois problemas gravíssimos no mundo à nossa
volta: a fome decorrente da miséria e das injustiças sociais e a violência, muitas
       9
           JOÃO PAULO II, Fides et Ratio 88.
       10
          Karl Rahner trata deste tipo de conhecimento transcendental proporcionado
pela “originária possessão de si”, de sua relação com o saber temático ou reflexivo e das
conseqüências para o conhecimento religioso. K. RAHNER, Curso Fundamental da Fé,
São Paulo 1989, especialmente p. 26-36.
        M. HEIDEGGER, Ser e Tempo – Parte I, Parágrafo 44, Petrópolis 1989, 280-300;
       11

M. HEIDEGGER, Que é isto – a filosofia?, São Paulo 1971.
TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA
Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana
vezes carregada de um ódio disseminado e que explode em atos de terror. Mas o
eixo da crise epocal passa pela questão do sentido. E a questão do sentido deve ser
enfrentada com a razão e com a fé.

       Estamos no tempo litúrgico do Advento. Contemplamos o Logos que se fez
carne e habitou entre nós (cf. Jo 1,14). Podemos dizer que o cristianismo é uma
família espiritual trans-epocal que combate o mito e o poder através da emergência
de Deus transcendente na experiência cultural por meio da kénosis de seu Filho
Unigênito, rompendo a atemporalidade do mito através da historicidade da ação.
Deus se revelou em Jesus de Nazaré: na sua vida, paixão, morte e ressurreição. Mas
só os simples, os que têm o coração de pobre, o percebem, como ouvimos no
Evangelho hoje proclamado: “Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque
ocultastes estas coisas aos sábios e doutores e as revelastes aos pequeninos. Sim,
Pai, porque assim foi do teu agrado. Tudo me foi entregue por meu Pai, e ninguém
conhece o Filho senão o Pai, e ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a que o
Filho o quiser revelar” (Mt 11,25-27). Jesus é a Sabedoria em pessoa como o Filho
Unigênito de Deus que assumiu a condição humana. Ele é o Logos do universo, Ele é
a imagem do Deus invisível, primogênito de toda a criação...tudo foi criado por ele e
para ele, ele é anterior a tudo e nele tudo tem a própria consistência (Cl 1,15.17).
Jesus confere sentido à existência humana: Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida (Jo
14,6), Ele é o pão da vida (Jo 6,35), a luz do mundo (Jo 8,12). O Evangelho do Reino
proclamado por Jesus ensina como enfrentar os grandes desafios do mundo atual
que apontamos anteriormente. Diante da fome, da miséria e da injustiça ele nos
ensina a partilha, a solidariedade. Diante da violência e do ódio, ele nos ensina o
perdão e a reconciliação. Mas nada disso se faz só com a conduta pessoal. A fé e a
caridade não dispensam a razão. O trabalho da razão é necessário para que a
partilha e o perdão cheguem às comunidades, às sociedades e a todos os povos.

       O Beato Papa João Paulo II nos ensina em sua Carta Fides et Ratio que a fé e a
razão constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para
a contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração do homem o desejo
de conhecer a verdade e, em última análise, de conhecer a Ele, para que,
conhecendo-O e amando-O, possa chegar também à verdade plena sobre si próprio.
A Filosofia deve, portanto, recuperar a sua vocação primeira de busca da verdade,
não se contentando com verdades parciais e provisórias, mas enfrentado as
TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA
Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana
perguntas radicais sobre o sentido e o fundamento último da vida humana, pessoal e
social (FR 5). O homem, por sua natureza, procura a verdade. Esta busca não se
destina apenas à conquista de verdades parciais, físicas ou científicas; não busca só o
verdadeiro bem em cada uma de suas decisões. Mas a sua pesquisa aponta para
uma verdade superior, que seja capaz de explicar o sentido da vida; trata-se, por
conseguinte, de algo que não pode desembocar senão no absoluto (FR 33).

        Também o magistério do Papa Bento XVI12 tem insistido na importância da
razão para a fé e da fé para a razão. Para o Papa Bento XVI não agir segundo a razão
é contrário à natureza de Deus. O Evangelho segundo João começa qual novo
Gênesis: No princípio era o Logos (Jo1,1). Logos, lembra Bento XVI, significa ao
mesmo tempo razão e palavra – uma razão que é criadora e capaz precisamente de
se comunicar, mas como razão. Assim, não é por acaso que se encontraram o
pensamento bíblico e o pensamento grego, terra de nascimento da filosofia. Sócrates
combateu o mito com a razão. Já no Antigo Testamento a revelação de Deus a
Moisés na sarça ardente contestou o mito na afirmação do “Eu Sou”. Para Bento XVI
há um autêntico iluminismo que se encontra com a fé cristã. O Papa Bento XVI
combate a autolimitação da razão e defende uma razão aberta, dialogal, integral.
Certamente a razão é ultrapassada pelo amor como ensina São Paulo no seguimento
de Cristo, mas sempre, recorda Bento XVI, estaremos diante do amor do Deus-Logos
para o qual se dirigem o culto e a práxis cristãs.

        Caríssimos novos Bacharéis em Filosofia é neste horizonte delineado que
vocês são chamados ao exercício do pensar e do agir. Como ouvimos na primeira
leitura da missa de hoje: como eleitos de Deus, santos e amados, revesti-vos de
sentimentos de compaixão de bondade, humildade, mansidão, longanimidade (...)
Mas sobre tudo isso, revesti-vos da caridade, que é o vínculo da perfeição. E reine nos
vossos corações a paz de Cristo, à qual fostes chamados em um só corpo. E sede
agradecidos. A Palavra de Cristo habite em vós ricamente: com toda a sabedoria
ensinai e admoestai-vos uns aos outros e, em ação de graças a Deus, entoem vossos
corações salmos, hinos e cânticos espirituais. E tudo o que fizerdes de palavra ou de



12
     Cf. especialmente BENTO XVI, Fé, razão e universidade. Recordações e reflexões.
Discurso na Universidade de Regensburg, 12/09/2006.
TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA
Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana


ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, por ele dando graças a Deus, o Pai (Cl
3,12.14-17).




O              Cristão vive da Fé

       Celebramos o Ano da Fé proclamado pelo Papa Bento XVI, de 11 de outubro
de 2012 (cinqüentenário da abertura do Concílio Ecumênico Vaticano II e vinte anos
da publicação do Catecismo da Igreja Católica) a 24 de novembro de 2013
(Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo). A fé nos introduz na vida
de Jesus Cristo, fazendo-nos mergulhar no mistério da Santíssima Trindade, através
do Sacramento do Batismo. A fé é uma adesão pessoal a Deus e que tem por
conteúdo a Revelação feita pelo próprio Deus, dando-nos a conhecer o seu desígnio
de salvação sobre a pessoa humana. Quanto maior for a fé, mais nos abrimos ao
mistério de Deus e à sua presença em nossa vida. A fé é, ao mesmo tempo, acolhida
do dom de Deus que se revela e aceitação do conteúdo dessa Revelação, expresso na
vida, paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo. Jesus nos mostrou que Deus é Pai
e o quanto o Pai nos ama. Jesus nos mostrou o quanto ele ama o Pai e também a
nós, ao ponto de doar a sua vida pela humanidade. Jesus nos comunicou o Espírito
Santo que procede do Pai para que sejamos realmente filhos de Deus pela graça e
irmãos uns dos outros sem qualquer discriminação ou exclusão.

        O ato de fé é pessoal e comunitário. A Revelação de Deus foi confiada à
comunidade de fé, não se dirigindo a cada um separadamente. Ter fé cristã é abraçar
a fé da Igreja. A profissão de fé nasce do coração e se expressa na confissão de fé
eclesial: Porque, se confessares com a tua boca que Jesus é o Senhor e creres em teu
coração que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. Pois quem crê de
coração obtém a justiça, e quem confessa com a boca, a salvação (Rm 10,9-10). A fé
nos abre ao Transcendente (Deus) e nos liberta do egocentrismo individualista e
consumista. A plenitude da fé se encontra na Igreja e é dentro da Igreja que
confessamos: eu creio! Nós cremos! A fé é uma realidade eclesial: a experiência da
Igreja nos precede e se torna a nossa própria experiência. O Espírito Santo é quem
atua na fé dos fiéis e constitui a Igreja na sua realidade mais profunda como “o povo
congregado na unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (Lumen Gentium 4).
TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA
Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana
        A fé é celebrada na liturgia da Igreja, que é a ação sagrada por excelência. A fé
é graça celebrada nos sacramentos da Igreja. Os sacramentos da Igreja são a
celebração do mistério pascal de Cristo na vida dos cristãos. O cristão que vive da fé
é uma criatura nova que só se compreende no relacionamento livre, gratuito,
explícito e comunitário com Jesus Cristo, autor e consumador de sua fé (cf. Hb 12,2).
O sacramento é o encontro propiciado pela graça de Deus entre Jesus Cristo e o seu
Corpo Místico, que é a Igreja, a comunidade de fé. Na Igreja e como Igreja se vive a
comunhão com Jesus Cristo na concretude histórica, na celebração do sentido
profundo da vida, em perspectiva escatológica. Trata-se de celebração radicalmente
orientada para a construção do Reino de Deus inaugurado por Jesus Cristo. Nos
sacramentos a vida é afirmada em gesto simbólico realizado em nome do Senhor
pela comunidade que vive na mesma fé, testemunhando a presença e proclamando a
plenitude do Reino que há de vir.

        A fé celebrada deve ser testemunhada na vida cotidiana, segundo o estado de
vida e a vocação de cada pessoa. Devemos estar prontos para dar as razões da nossa
esperança cristã a todos e em nosso tempo (cf. 1 Pd 3,15), com firmeza e serenidade,
em atitude aberta e dialogal. E, sobretudo, devemos dar o testemunho da caridade,
pois a fé opera pela caridade (Gl 5,6) e a fé sem obras é morta (Tg 2,17). A fé é
necessária para a verdadeira caridade, que procede de Deus que é amor (cf. 1 Jo
4,8.16) e nos conduz ao amor misericordioso para com todos, critério de salvação (cf.
Mt 25,31-46). Impulsionados pela caridade de Cristo (cf. 2 Cor 5,14), fortalecidos pelo
testemunho de fé de tantos na história da salvação (cf. Hb 11), somos conduzidos
pelo Espírito Santo à plenitude de nossa vocação no amor (cf. 1 Cor 13) para a glória
do Pai!

                                                     Pe. Lauro Sérgio Versiani Barbosa.

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A Fé e os Níveis de Adesão à Salvação

  • 1. TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana A Salvação vem pela Fé A fé é uma palavra eminentemente cristã. A palavra fé e seus derivados perpassam a Bíblia. No Novo Testamento o substantivo fé (pístis) aparece 243 vezes, o verbo crer (pistéuo) ocorre 241 vezes e o adjetivo fiel (pistós) aparece 67 vezes. A fé se relaciona com a esperança, com o futuro, mas também com o presente, com a história, é compromisso de vida fiel. O apóstolo Paulo em suas cartas sublinha a relação pessoal entre o crente e o seu Senhor a partir da fé. A Carta de Tiago fala da inseparabilidade entre a fé autêntica e a coerência de vida testemunhada pelas boas obras (Tg 2,14.26). O que está de acordo com a afirmação paulina de que a fé opera pela caridade (Gl 5,6). A fé em Paulo é o modo de acolher o Evangelho de Jesus Cristo e comporta níveis de adesão sucessivos e crescentes. O primeiro nível diz respeito à aceitação de Cristo morto e ressuscitado na própria vida. A fé é abertura total, incondicionada, ao dom de Deus. Trata-se de aceitar e querer Deus na própria vida como Ele se revelou, sem a pretensão de controlar Deus e seu Evangelho. Implica saída do próprio sistema de vida para realizar-se plenamente, encontrando-se a si mesmo e alcançando o ser como deve ser. Não é alienação, mas libertação. Trata-se da fé das comunidades cristãs desde o princípio (1 Cor 15,1-11) e que implica o batismo (Rm 6,1-11). No batizado a morte e a ressurreição de Cristo são ativadas e, liberto do pecado, o fiel vive em Deus por meio de Cristo, como o ramo que se alimenta da seiva conforme Jo 15,1-17. A fé exige conversão, abandono dos ídolos (1Ts 1,9). O dom o Espírito Santo recebido no batismo permite ao cristão se configurar a Cristo, passando ao segundo nível da fé que é a personalização ou encarnação crescente do Evangelho em todas as dimensões da vida. Cresce a vitalidade de Cristo em nós e se pode dizer com o Apóstolo: Já não sou eu que vivo, mas é Cristo que vive em mim. Minha vida presente na carne vivo-a pela fé no Filho de Deus, que me amou e se entregou a si mesmo por mim (Gl 2,20); Pois para mim o viver é Cristo e o morrer é lucro (Fl 1,21); Mais ainda: tudo considero perda pela excelência do conhecimento de Cristo Jesus, meu Senhor.Por ele, perdi tudo e tudo tenho como esterco, para ganhar a Cristo e ser achado nele, não tendo como minha justiça aquela que vem da Lei, mas aquela pela fé em Cristo, aquela que vem de Deus e se apóia na fé, para conhecê-lo, conhecer o poder da sua ressurreição e a participação nos seus sofrimentos, conformando-me com ele na sua morte, para ver se alcanço a ressurreição de entre os mortos (Fl 3,8-11); Combati o bom combate, terminei a
  • 2. TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana minha carreira, guardei a fé (2 Tm 4,7). Experimenta-se a convicção de que nada pode nos separar do amor de Deus manifestado em Cristo Jesus, nosso Senhor (Rm 8,39). O terceiro nível é o contexto comunitário da fé, que impulsiona e faz crescer a experiência de fé pessoal. O nível comunitário da fé é o das assembléias litúrgicas ou reuniões motivadas pela fé, onde a fé se alarga e cresce na confissão comum conforme Rm 10,9-10: com o coração se crê (responsabilidade pessoal) e com a boca se confessa (profissão da assembleia litúrgica). No Novo Testamento temos vários hinos ou profissões de fé litúrgicas: Fl 2,6-11; Ef 1,3-14; Cl 1,15-20; 1 Tm 3,16; 1 Tm 6,15-16; 2 Tm 2,11-13. O quarto nível é experimentado juntamente com o nível comunitário e diz respeito à exigência missionária da fé. A comunidade é o ponto de partida e de chegada da missão. Na missão cresce a fé e a fidelidade ao Evangelho (cf. 1 Cor 9,19-23). Mediante o ato de fé Deus nos torna justos e santos pela sua graça, capazes de amar gratuitamente. Tornamo-nos participantes da vida divina. Somos salvos pelo amor misericordioso de Deus. Pe. Lauro Sérgio Versiani Barbosa.
  • 3. TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana H omilia para a Formatura da FAM 15/12/ 2012 Alegramo-nos hoje com formatura dos Bacharéis em Filosofia da Faculdade Arquidiocesana Dom Luciano Mendes de Almeida e bendizemos a Deus por tantos benefícios alcançados ao longo desses anos de estudos! Estudar na FAM é um privilégio, uma responsabilidade e um compromisso. O privilégio vem não só do reconhecimento alcançado por instrumentos avaliativos do Ministério da Educação dando conta da excelência educacional da Faculdade Dom Luciano, mas da longa tradição educacional do Seminário de Mariana com 262 anos de existência e da atmosfera intelectual cultivada de harmonia entre fé e razão. Estudar Filosofia na FAM implica responsabilidade e compromisso no uso audacioso da razão com rigor metodológico e amplitude de horizonte a serviço da verdade, da vida e da esperança. A Faculdade que carrega a tradição do Seminário de Mariana e o nome ilustre de Dom Luciano Mendes de Almeida está compromissada com o uso responsável, amplo e integral da razão. No horizonte de uma cultura racionalista, fé e razão se opõem. Na verdade, o racionalismo reduz a razão à forma de “razão instrumental”, de caráter “técnico-científico”. Em seu famoso opúsculo Resposta à Pergunta: Que é o Esclarecimento?, Kant 1 define o projeto da Ilustração (razão moderna) a partir de dois vetores básicos: posição crítica em relação à tradição e a autoridade e comprometimento com o interesse emancipatório do homem. Sair do estado de menoridade é recusar as tutelas e afirmar-se como capaz de pensar e se conduzir autonomamente. Há uma relação indispensável entre esclarecimento e liberdade. Kant não advoga o individualismo ao defender a autonomia, mas insiste na liberdade de se fazer um uso público da razão em todas as questões. Aponta para a busca do consenso obtido pelo trabalho de uma razão crítica. Todas as pessoas e épocas têm direito a esse exercício, ao esclarecimento. O problema é que Kant estabeleceu uma cisão ao recusar a metafísica no nível da razão pura e aceitá-la só no nível da razão prática. O idealismo alemão rejeitou a solução kantiana e tentou uma reconstrução sistemática da metafísica nas modalidades de Fichte, Schelling e Hegel. Mas a partir do século XIX a posição crítica em relação à metafísica foi radicalizada. 1 Cf I. KANT, Resposta à Pergunta: “Que é o Esclarecimento”?, in, ID., Textos Seletos, Petrópolis 1985, 100-116.
  • 4. TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana Os “enciclopedistas franceses”, Nietzsche, Adorno, Horkheimer e, no Brasil, o ensaísta Sérgio Paulo Rouanet2, compreendem a “Ilustração” do século XVIII como parte (para alguns privilegiada) de uma “família espiritual” batizada como “corrente iluminista”, com raízes na Antigüidade, passando pela Renascença, para chegar até Marx, Freud, Adorno, Michel Foucault, Habermas e outros. O “iluminismo” seria uma tendência intelectual “trans-epocal” que combate o mito e o poder a partir da razão. Na Dialética do Esclarecimento3, Adorno e Horkheimer observam uma dialética no iluminismo: “o mito já é esclarecimento e o esclarecimento acaba por reverter à mitologia”4. O iluminismo nasce de uma ruptura com a natureza, no sentido de dominá-la, dando início a uma incessante trabalho da razão que combate todo pensamento que contém traços de sua pré-história. Assim o animismo é criticado pelo mito, o mito pela metafísica, a metafísica pela ciência matematizada. Atualmente o iluminismo absolutiza a ciência como única forma de verdade. E a razão instrumental, própria do iluminismo e fruto da luta contra a magia e o mito, transforma-se em mito. Observa-se em todo o processo, desde o seu início, um uso redutor da razão a par do “progresso” alcançado. Segundo Clodovis Boff em sua Teoria do Método Teológico a razão moderna só admite duas funções: demonstrativa (argumentos necessários, como na matemática e na lógica silogística) e científica empírico-formal5. Embora a “razão moderna” esteja em crise, como demonstram discussões epistemológicas6, pesquisas neurológicas7, pensamento pós-moderno8, ainda é hegemônica, sendo necessária 2 Diplomata brasileiro, foi Ministro da Cultura; ensaísta, possui diversas publicações e pode ser considerado um habermasiano. Aqui a referência é: S. P. ROUANET, As Razões do Iluminismo, São Paulo 1987. 3 Cf T. W. ADORNO – M. HORKHEIMER, Dialética do Esclarecimento, Belo Horizonte 1986. 4 T.W. ADORNO – M. HORKHEIMER, Dialética do Esclarecimento, 15, 23 e 39. 5 Afirmava David Hume: “Se tomarmos nas mãos um volume qualquer de Teologia ou de Metafísica escolástica, por exemplo, perguntemos: ‘Este livro contém algum raciocínio abstrato sobre quantidade ou número?’ Não. ‘Contém algum raciocínio experimental sobre questões de fato ou de existência?’ Não. Para o fogo com ele, pois outra coisa não pode encerrar senão sofismas e ilusões”. D. HUME, “Investigação sobre o Entendimento Humano”, in Col. Os Pensadores 23, São Paulo 1973, 198. 6 L.C. SUSIN , ed., Mysterium Creationis – Um Olhar Interdisciplinar sobre o Universo, São Paulo 1999; J. GUITTON – G. BOGDANOV – IG. BOGDANOV, Deus e a Ciência. Em direção ao metarrealismo, Rio de Janeiro 1992; R. WEBER, Diálogos com cientistas e sábios. A busca da unidade, São Paulo s.d. (orig. 1986). 7 D. GOLEMAN, Inteligência emocional, São Paulo 1996; A. DAMÁSIO, O erro de Descartes, São Paulo 1996. 8 G. VATTIMO, Credere di credere, Milano 1996; O. MADURO, Mapas para a festa. Reflexões latino-americanas sobre a crise e o conhecimento, Petrópolis 1994.
  • 5. TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana uma ampliação da ideia de razão. Além da razão formal (lógica) e empírico-formal (científica) existe a razão discursiva em geral e que pode ser denominada “razão crítica” em sentido amplo porque busca o sentido das coisas e revista tudo. Abarca desde a razão simples e direta do cotidiano (o “bom senso”) até a “razão hermenêutica” utilizada pelas ciências humanas (também para estas, o racionalismo hegemônico produz uma certa hesitação epistemológica). Alargando-se o conceito de razão, supera-se o racionalismo científico estreito, conhecido como “cientificismo”9. Mas é preciso ir além e superar toda forma de racionalismo. É preciso considerar a “razão intuitiva”(noûs para os gregos, intellectus para os latinos). Em linguagem atual se pode chamar esta “razão intuitiva” de “pensamento”, “mente” ou “espírito” e até mesmo “consciência”. O noûs é intuição, percepção, apreensão do ser, contemplação e saber imediato da verdade. Na medida em que é abertura-ao-mundo, é coextensivo ao ser humano. O conhecimento que proporciona é atemático, isto é, supraconceitual e supraconsciente10. É justamente através do noûs que se pode chegar ao mistério do Ser, a uma contemplação amorosa da Realidade. O noûs é, no dizer de Heidegger, o pensamento que deixa o Ser ser Ser (das Sein seinlassen)11. Entram em cena as “razões do coração” de que fala Pascal (Pensées, 277). O nôus ou intellectus é o princípio e fundamento do pensar, é o pensamento pensante. É a fonte da ratio (pensamento pensado). O pensamento cristão em geral, seja na perspectiva do platonismo cristão ou do aristotelismo cristão, com os seus expoentes maiores, respectivamente Santo Agostinho e Santo Tomás de Aquino, seja na vertente mais contemporânea, sempre cultivou uma visão ampla e positiva da razão, uma razão amiga da fé e da vida. Talvez a problemática mais dramática de nossa época seja a questão do sentido diante do vazio do niilismo metafísico e ético característico do imanentismo antropocêntrico e expresso no relativismo difundido no mundo contemporâneo. Sem dúvida nós podemos constatar dois problemas gravíssimos no mundo à nossa volta: a fome decorrente da miséria e das injustiças sociais e a violência, muitas 9 JOÃO PAULO II, Fides et Ratio 88. 10 Karl Rahner trata deste tipo de conhecimento transcendental proporcionado pela “originária possessão de si”, de sua relação com o saber temático ou reflexivo e das conseqüências para o conhecimento religioso. K. RAHNER, Curso Fundamental da Fé, São Paulo 1989, especialmente p. 26-36. M. HEIDEGGER, Ser e Tempo – Parte I, Parágrafo 44, Petrópolis 1989, 280-300; 11 M. HEIDEGGER, Que é isto – a filosofia?, São Paulo 1971.
  • 6. TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana vezes carregada de um ódio disseminado e que explode em atos de terror. Mas o eixo da crise epocal passa pela questão do sentido. E a questão do sentido deve ser enfrentada com a razão e com a fé. Estamos no tempo litúrgico do Advento. Contemplamos o Logos que se fez carne e habitou entre nós (cf. Jo 1,14). Podemos dizer que o cristianismo é uma família espiritual trans-epocal que combate o mito e o poder através da emergência de Deus transcendente na experiência cultural por meio da kénosis de seu Filho Unigênito, rompendo a atemporalidade do mito através da historicidade da ação. Deus se revelou em Jesus de Nazaré: na sua vida, paixão, morte e ressurreição. Mas só os simples, os que têm o coração de pobre, o percebem, como ouvimos no Evangelho hoje proclamado: “Eu te louvo, ó Pai, Senhor do céu e da terra, porque ocultastes estas coisas aos sábios e doutores e as revelastes aos pequeninos. Sim, Pai, porque assim foi do teu agrado. Tudo me foi entregue por meu Pai, e ninguém conhece o Filho senão o Pai, e ninguém conhece o Pai senão o Filho e aquele a que o Filho o quiser revelar” (Mt 11,25-27). Jesus é a Sabedoria em pessoa como o Filho Unigênito de Deus que assumiu a condição humana. Ele é o Logos do universo, Ele é a imagem do Deus invisível, primogênito de toda a criação...tudo foi criado por ele e para ele, ele é anterior a tudo e nele tudo tem a própria consistência (Cl 1,15.17). Jesus confere sentido à existência humana: Ele é o Caminho, a Verdade e a Vida (Jo 14,6), Ele é o pão da vida (Jo 6,35), a luz do mundo (Jo 8,12). O Evangelho do Reino proclamado por Jesus ensina como enfrentar os grandes desafios do mundo atual que apontamos anteriormente. Diante da fome, da miséria e da injustiça ele nos ensina a partilha, a solidariedade. Diante da violência e do ódio, ele nos ensina o perdão e a reconciliação. Mas nada disso se faz só com a conduta pessoal. A fé e a caridade não dispensam a razão. O trabalho da razão é necessário para que a partilha e o perdão cheguem às comunidades, às sociedades e a todos os povos. O Beato Papa João Paulo II nos ensina em sua Carta Fides et Ratio que a fé e a razão constituem como que as duas asas pelas quais o espírito humano se eleva para a contemplação da verdade. Foi Deus quem colocou no coração do homem o desejo de conhecer a verdade e, em última análise, de conhecer a Ele, para que, conhecendo-O e amando-O, possa chegar também à verdade plena sobre si próprio. A Filosofia deve, portanto, recuperar a sua vocação primeira de busca da verdade, não se contentando com verdades parciais e provisórias, mas enfrentado as
  • 7. TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana perguntas radicais sobre o sentido e o fundamento último da vida humana, pessoal e social (FR 5). O homem, por sua natureza, procura a verdade. Esta busca não se destina apenas à conquista de verdades parciais, físicas ou científicas; não busca só o verdadeiro bem em cada uma de suas decisões. Mas a sua pesquisa aponta para uma verdade superior, que seja capaz de explicar o sentido da vida; trata-se, por conseguinte, de algo que não pode desembocar senão no absoluto (FR 33). Também o magistério do Papa Bento XVI12 tem insistido na importância da razão para a fé e da fé para a razão. Para o Papa Bento XVI não agir segundo a razão é contrário à natureza de Deus. O Evangelho segundo João começa qual novo Gênesis: No princípio era o Logos (Jo1,1). Logos, lembra Bento XVI, significa ao mesmo tempo razão e palavra – uma razão que é criadora e capaz precisamente de se comunicar, mas como razão. Assim, não é por acaso que se encontraram o pensamento bíblico e o pensamento grego, terra de nascimento da filosofia. Sócrates combateu o mito com a razão. Já no Antigo Testamento a revelação de Deus a Moisés na sarça ardente contestou o mito na afirmação do “Eu Sou”. Para Bento XVI há um autêntico iluminismo que se encontra com a fé cristã. O Papa Bento XVI combate a autolimitação da razão e defende uma razão aberta, dialogal, integral. Certamente a razão é ultrapassada pelo amor como ensina São Paulo no seguimento de Cristo, mas sempre, recorda Bento XVI, estaremos diante do amor do Deus-Logos para o qual se dirigem o culto e a práxis cristãs. Caríssimos novos Bacharéis em Filosofia é neste horizonte delineado que vocês são chamados ao exercício do pensar e do agir. Como ouvimos na primeira leitura da missa de hoje: como eleitos de Deus, santos e amados, revesti-vos de sentimentos de compaixão de bondade, humildade, mansidão, longanimidade (...) Mas sobre tudo isso, revesti-vos da caridade, que é o vínculo da perfeição. E reine nos vossos corações a paz de Cristo, à qual fostes chamados em um só corpo. E sede agradecidos. A Palavra de Cristo habite em vós ricamente: com toda a sabedoria ensinai e admoestai-vos uns aos outros e, em ação de graças a Deus, entoem vossos corações salmos, hinos e cânticos espirituais. E tudo o que fizerdes de palavra ou de 12 Cf. especialmente BENTO XVI, Fé, razão e universidade. Recordações e reflexões. Discurso na Universidade de Regensburg, 12/09/2006.
  • 8. TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana ação, fazei-o em nome do Senhor Jesus, por ele dando graças a Deus, o Pai (Cl 3,12.14-17). O Cristão vive da Fé Celebramos o Ano da Fé proclamado pelo Papa Bento XVI, de 11 de outubro de 2012 (cinqüentenário da abertura do Concílio Ecumênico Vaticano II e vinte anos da publicação do Catecismo da Igreja Católica) a 24 de novembro de 2013 (Solenidade de Nosso Senhor Jesus Cristo Rei do Universo). A fé nos introduz na vida de Jesus Cristo, fazendo-nos mergulhar no mistério da Santíssima Trindade, através do Sacramento do Batismo. A fé é uma adesão pessoal a Deus e que tem por conteúdo a Revelação feita pelo próprio Deus, dando-nos a conhecer o seu desígnio de salvação sobre a pessoa humana. Quanto maior for a fé, mais nos abrimos ao mistério de Deus e à sua presença em nossa vida. A fé é, ao mesmo tempo, acolhida do dom de Deus que se revela e aceitação do conteúdo dessa Revelação, expresso na vida, paixão, morte e ressurreição de Jesus Cristo. Jesus nos mostrou que Deus é Pai e o quanto o Pai nos ama. Jesus nos mostrou o quanto ele ama o Pai e também a nós, ao ponto de doar a sua vida pela humanidade. Jesus nos comunicou o Espírito Santo que procede do Pai para que sejamos realmente filhos de Deus pela graça e irmãos uns dos outros sem qualquer discriminação ou exclusão. O ato de fé é pessoal e comunitário. A Revelação de Deus foi confiada à comunidade de fé, não se dirigindo a cada um separadamente. Ter fé cristã é abraçar a fé da Igreja. A profissão de fé nasce do coração e se expressa na confissão de fé eclesial: Porque, se confessares com a tua boca que Jesus é o Senhor e creres em teu coração que Deus o ressuscitou dentre os mortos, serás salvo. Pois quem crê de coração obtém a justiça, e quem confessa com a boca, a salvação (Rm 10,9-10). A fé nos abre ao Transcendente (Deus) e nos liberta do egocentrismo individualista e consumista. A plenitude da fé se encontra na Igreja e é dentro da Igreja que confessamos: eu creio! Nós cremos! A fé é uma realidade eclesial: a experiência da Igreja nos precede e se torna a nossa própria experiência. O Espírito Santo é quem atua na fé dos fiéis e constitui a Igreja na sua realidade mais profunda como “o povo congregado na unidade do Pai e do Filho e do Espírito Santo” (Lumen Gentium 4).
  • 9. TEXTOS DO PE. LAURO SÉRGIO VERSIANI BARBOSA Reitor do Seminário São José da Arquidiocese de Mariana A fé é celebrada na liturgia da Igreja, que é a ação sagrada por excelência. A fé é graça celebrada nos sacramentos da Igreja. Os sacramentos da Igreja são a celebração do mistério pascal de Cristo na vida dos cristãos. O cristão que vive da fé é uma criatura nova que só se compreende no relacionamento livre, gratuito, explícito e comunitário com Jesus Cristo, autor e consumador de sua fé (cf. Hb 12,2). O sacramento é o encontro propiciado pela graça de Deus entre Jesus Cristo e o seu Corpo Místico, que é a Igreja, a comunidade de fé. Na Igreja e como Igreja se vive a comunhão com Jesus Cristo na concretude histórica, na celebração do sentido profundo da vida, em perspectiva escatológica. Trata-se de celebração radicalmente orientada para a construção do Reino de Deus inaugurado por Jesus Cristo. Nos sacramentos a vida é afirmada em gesto simbólico realizado em nome do Senhor pela comunidade que vive na mesma fé, testemunhando a presença e proclamando a plenitude do Reino que há de vir. A fé celebrada deve ser testemunhada na vida cotidiana, segundo o estado de vida e a vocação de cada pessoa. Devemos estar prontos para dar as razões da nossa esperança cristã a todos e em nosso tempo (cf. 1 Pd 3,15), com firmeza e serenidade, em atitude aberta e dialogal. E, sobretudo, devemos dar o testemunho da caridade, pois a fé opera pela caridade (Gl 5,6) e a fé sem obras é morta (Tg 2,17). A fé é necessária para a verdadeira caridade, que procede de Deus que é amor (cf. 1 Jo 4,8.16) e nos conduz ao amor misericordioso para com todos, critério de salvação (cf. Mt 25,31-46). Impulsionados pela caridade de Cristo (cf. 2 Cor 5,14), fortalecidos pelo testemunho de fé de tantos na história da salvação (cf. Hb 11), somos conduzidos pelo Espírito Santo à plenitude de nossa vocação no amor (cf. 1 Cor 13) para a glória do Pai! Pe. Lauro Sérgio Versiani Barbosa.