Este documento apresenta um resumo sobre o princípio da indução matemática em três partes:
1) Introduz o conceito de números naturais e apresenta três propriedades que caracterizam o conjunto dos números naturais.
2) Define o princípio da indução matemática como a propriedade de que, dado um subconjunto S dos números naturais contendo 1 e tal que sempre que um número n pertence a S, o número n+1 também pertence, então S é igual ao conjunto dos números naturais.
3) Explica que o princ
Introdução à indução matemática com exemplos do mundo real
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Indução Matemática
Abramo Hefez
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Texto já revisado pela nova ortografia.
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Sobre o Autor
Abramo Hefez nasceu no Egito, mas é brasileiro por opção e ca-
rioca de coração. Cursou o ginasial e científico no Rio de Janeiro,
graduou-se na PUC-Rio em Matemática e prosseguiu seus estudos
na Universidade de Pisa, Itália e nos Estados Unidos, doutorando-se,
em Geometria Algébrica no Massachusetts Institute of Technology.
É Professor Titular no Instituto de Matemática da Universidade Fe-
deral Fluminense, onde desenvolve atividades de pesquisa e leciona
na graduação e pós-graduação. Foi eleito recentemente membro da
Academia Brasileira de Ciências.
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Sumário
1 Indução Matemática 1
1.1 O Princípio de Indução Matemática . . . . . . . . . . 1
1.2 Definição por Recorrência . . . . . . . . . . . . . . . . 14
1.3 Progressões . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 24
2 Indução e Mundo Material 31
2.1 A Torre de Hanói . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 31
2.2 O Enigma do Cavalo de Alexandre . . . . . . . . . . . 35
2.3 Descobrindo a Moeda Falsa . . . . . . . . . . . . . . . 37
2.4 A Pizza de Steiner . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 38
2.5 Os Coelhos de Fibonacci . . . . . . . . . . . . . . . . . 40
3 Indução e Matemática 45
3.1 Somatórios . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 45
3.2 Binômio de Newton . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 54
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ii SUMÁRIO
3.3 Princípio do Menor Inteiro . . . . . . . . . . . . . . . . 59
3.4 O Princípio das Gavetas . . . . . . . . . . . . . . . . . 68
3.5 Desigualdades . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . . 73
Respostas 83
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Introdução
Se alguém me perguntasse o que é que todo estudante de Ensino
Médio deveria saber de matemática, sem sombra de dúvida, o tema
Indução figuraria na minha lista.
É com o conceito de Indução que se estabelece o primeiro con-
tato com a noção de infinito em Matemática, e por isso ele é muito
importante; porém, é, ao mesmo tempo, sutil e delicado.
O material aqui apresentado é uma pequena seleção de assuntos
relacionados com esse tema, cujo desenvolvimento se espalha por cerca
de dois mil anos, originando-se nos magníficos trabalhos dos Gregos
Antigos, que têm em Os Elementos de Euclides, de aproximadamente
300 a.C., o seu ponto culminante.
Estas notas se destinam a você, aluno do Ensino Médio, que está
envolvido em atividades promovidas pela OBMEP. Elas cobrem as-
suntos que provavelmente não lhe foram ensinados, pelo menos com
este grau de detalhe nem de profundidade, na escola, mas que, na
minha opinião, como mencionado acima, deveriam fazer parte de sua
bagagem cultural.
Não tenho a expectativa de que você absorva todo o material
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aqui apresentado numa primeira leitura, pois ele possui um grau de
abstração um pouco maior do que o costumeiro nessa fase de sua
formação. Estude estas notas, procure entender os exemplos e, sobre-
tudo, tente seriamente resolver os problemas, pois nunca esqueça que
a Matemática só se aprende fazendo. Se necessário, volte a elas depois
de algum tempo, pois, assim procedendo, você estará plantando uma
semente que lhe trará valiosos frutos.
Finalmente, não poderia encerrar essa introdução antes de agrade-
cer à Coordenação da OBMEP pelo convite para escrever este texto e
ao meu colega Dinamérico Pereira Pombo Jr. pela leitura cuidadosa
do manuscrito.
Niterói, julho de 2007.
Abramo Hefez
Departamento de Matemática Aplicada
Universidade Federal Fluminense
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Para o Professor
O nosso ponto de vista, nessas notas, é que o estudante do Ensino
Médio tem, de modo intuitivo e bastante vago, uma certa familiari-
dade com os números, sejam eles naturais, inteiros, racionais ou reais.
Apesar disso, ele não tem a menor dúvida sobre a sua existência (as
dúvidas são em geral de outra natureza: racionais versus irracionais)
e conhece bem algumas de suas propriedades como, por exemplo, o
fato desses conjuntos possuírem uma adição e uma multiplicação com
as propriedades usuais. Optamos por não ignorar esse conhecimento;
muito pelo contrário, utilizá-lo-emos como ponto de partida (ou seja,
implicitamente, como axioma zero) do nosso estudo.
Enfatizamos, logo no início do texto, que esse conhecimento é in-
suficiente para provar qualquer fato significativo. Mostramos então,
na melhor tradição das teorias axiomáticas, como, isolando algumas
propriedades (no nosso caso, as propriedades (1), (2) e (3), no iní-
cio do Capítulo 1) que caracterizam os números naturais dentro do
conjunto dos números reais, é possível demonstrar muitas das suas
demais propriedades. Assim, esperamos convencer o jovem leitor da
necessidade de fundamentar melhor os seus conceitos e das vantagens
do método axiomático.
Decidimos, deliberadamente, nessas notas não descrever a tra-
jetória do desenvolvimento dos números reais e de sua fundamen-
tação rigorosa, pois, nesse caso, o caminho seria longo e certamente
prematuro para a grande maioria dos leitores aos quais se destinam
estas notas. Por outro lado, se tivéssemos iniciado a exposição com
os axiomas de Peano, teríamos que arcar com o ônus da construção
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das operações de adição e de multiplicação e da prova de suas pro-
priedades, trabalho esse que consumiria algum esforço e desinteres-
saria a maioria dos leitores. Por outro lado, para poder prosseguir
com as notas, a um certo momento, teríamos de aceitar a existência
dos números reais, pois estes são livremente utilizados no texto, o que
recairia no mesmo impasse do início.
A título de conforto para os mais ortodoxos sobre os Fundamentos
da Matemática, pedimos que imaginem que o que estamos fazendo
moralmente (i.e. de modo implícito) nestas notas é axiomatizar a
existência dos números reais como corpo ordenado completo (veja
Elon Lages Lima, Análise Real, Volume 1, Seção 3, Capítulo 2) e
admitir que N é subconjunto de R (ib. Teorema 3 (i), página 17),
que será por nós caracterizado univocamente por três propriedades
explicitadas logo no início do texto.
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Capítulo 1
Indução Matemática
Dentre todos os números que o ser humano já considerou, os
números naturais foram os primeiros a serem criados, inicialmente
com o intuito de contar. Apesar desses números serem os mais sim-
ples, isso, absolutamente, não quer dizer que eles sejam totalmente
entendidos, havendo ainda muitos mistérios que os cercam a serem
desvendados.
1.1 O Princípio de Indução Matemática
Mas, afinal, o que é o conjunto N dos números naturais?
Bem, podemos intuitivamente descrevê-lo dizendo quais são os
seus elementos; eles são os números reais da forma:
1, 2 = 1 + 1, 3 = 2 + 1 = (1 + 1) + 1, 4 = 3 + 1 = (1 + 1 + 1) + 1, · · ·
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2 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
Ocorre, porém, que dificilmente poderemos provar alguma pro-
priedade desses números utilizando apenas esta descrição, pois, ape-
sar de sabermos intuitivamente quais são os números que os pontinhos
acima representam, teríamos dificuldade de descrevê-los de modo su-
ficientemente explícito.
Uma alternativa consiste em dar algumas propriedades que carac-
terizem de modo inequívoco o conjunto dos naturais dentro do con-
junto dos números reais.
Inicialmente, considere um subconjunto S dos números reais que
possui as seguintes propriedades:
(1) S contém o número 1.
(2) Toda vez que S contém um número n, ele necessariamente contém
o número n + 1.
(3) Não existe subconjunto próprio de S satisfazendo as condições (1)
e (2).
Em outras palavras, (3) nos diz que se S possui as propriedades
(1), (2) e (3), acima, e se S é um subconjunto de S que possui as
propriedades (1) e (2), então S = S.
Vamos provar que se existe um subconjunto S dos números reais
satisfazendo às três condições acima, então esse conjunto é único. De
fato, se S1 e S2 são dois os subconjuntos, temos que S1 ∩ S2 possui
as propriedades (1) e (2), logo pela propriedade (3) segue que
S1 = S1 ∩ S2 = S2 .
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No estágio em que estamos não temos como provar que tal con-
junto S existe. Portanto, admitiremos o seguinte axioma:
Axioma: Existe um subconjunto dos reais que possui as propriedades
(1), (2) e (3).
Esse único subconjunto será chamado de conjunto dos números
naturais e denotado por N.
A propriedade (3) é o que se chama de Princípio de Indução
Matemática. Mais precisamente:
Princípio de Indução Matemática: Dado um subconjunto S do
conjunto dos números naturais N, tal que 1 pertence a S e sempre
que um número n pertence a S, o número n + 1 também pertence a
S, tem-se que S = N.
Esta simples propriedade fornece uma das mais poderosas técnicas
de demonstração em Matemática: a demonstração por indução.
Suponha que seja dada uma sentença matemática P (n) que de-
penda de uma variável natural n, a qual se torna verdadeira ou falsa
quando substituímos n por um número natural dado qualquer. Tais
sentenças serão ditas sentenças abertas definidas sobre o conjunto dos
naturais.
A seguir damos alguns exemplos de sentenças abertas definidas
sobre N:
(a) P (n) : n é par.
É claro que a afirmação P (1) é falsa, pois ela diz que 1 é par;
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4 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
P (3), P (5) e P (9) são falsas, pois afirmam, respectivamente, que 3, 5
e 9 são pares.
Por outro lado, é também claro que P (2), P (4), P (8) e P (22) são
verdadeiras, pois 2, 4, 8 e 22 são pares.
(b) P (n) : n é múltiplo de 3.
Temos, por exemplo, que P (1), P (2), P (4) e P (5) são falsas, en-
quanto P (3) e P (6) são verdadeiras.
(c) P (n) : 1 + 3 + 5 + 7 + · · · + (2n − 1) = n2 .
Temos que P (1), P (2), P (3), P (4), . . . , P (10) são verdadeiras.
Aqui sabemos precisamente o que significa a sentença aberta P (n),
apesar dos pontinhos na sua definição. Ela significa:
“A soma dos n primeiros números ímpares é igual a n2 .”
Você consegue visualizar algum número natural m tal que P (m)
seja falsa? Bem, após mais algumas tentativas, você se convencerá
de que esta fórmula tem grandes chances de ser verdadeira para todo
número natural n; ou seja, P (n) é verdadeira para todo n ∈ N.
(d) P (n) : n2 − n + 41 é um número primo, para todo n ∈ N.
É fácil verificar que as sentenças P (1), P (2), P (3) são verdadeiras.
Com algum trabalho, é possível ir além, verificando também que P (4),
P (5), . . ., P (35) são verdadeiras.
Portanto, é plausível que tenhamos encontrado um polinômio cu-
jos valores nos números inteiros sejam sempre números primos.
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Mais alguns testes para confirmar a nossa suspeita? Lá vai, P (36),
P (37), P (38) e P (40) são verdadeiras.
Podemos parar por aqui e nos sentir felizes com a nossa descober-
ta? Bom, para satisfazer os mais céticos, faremos só mais um teste
com n = 41.
Note que 412 − 41 + 41 = 412 não é primo. Logo, para a nossa
desilusão, P (41) é falsa!
Para a sua informação, pode-se provar que não existe nenhum
polinômio em uma variável com coeficientes inteiros cujos valores nos
naturais sejam sempre números primos. Portanto, não havia a priori
nenhuma chance de P (n) ser verdadeira para todo número natural n.
Como provar então que uma sentença aberta definida sobre os
naturais é sempre verdadeira? Você há de convir que não seria possível
testar, um por um, todos os números naturais, pois eles são em número
infinito. Portanto, será preciso encontrar algum outro método.
Vamos a seguir expor a técnica da demonstração por indução
matemática que resolverá esse nosso problema.
Seja P (n) uma sentença aberta sobre os naturais e denote por V o
seu conjunto verdade em N, isto é, o subconjunto de N, definido como
V = {n ∈ N; P (n) é verdadeira}.
Para provar que P (n) é verdadeira para todo n ∈ N, basta mostrar
que V = N.
Isso pode ser feito usando o Princípio de Indução Matemática.
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6 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
Basta, para isto, mostrar que 1 pertence a V e que n + 1 pertence a
V , toda vez que n pertence a V .
Provamos, assim, o seguinte teorema:
Teorema 1.1.1 (Prova por Indução Matemática). Seja P (n) uma
sentença aberta sobre N. Suponha que
(i) P (1) é verdadeira; e
(ii) qualquer que seja n ∈ N, sempre que P (n) é verdadeira, segue que
P (n + 1) é verdadeira.
Então, P (n) é verdadeira para todo n ∈ N.
Vejamos como usar esse método para mostrar a validade, para
todo natural n, da fórmula
1 + 3 + · · · + (2n − 1) = n2 .
Observe que P (1) é verdadeira, já que a fórmula é trivialmente
válida para n = 1. Suponha agora que, para algum n natural, P (n)
seja verdadeira; ou seja, que
1 + 3 + · · · + (2n − 1) = n2 .
Queremos provar que P (n + 1) é verdadeira. Somando 2n + 1, que
é o próximo número ímpar após 2n−1, a ambos os lados da igualdade
acima, obtemos a igualdade também verdadeira:
1 + 3 + · · · + (2n − 1) + (2n + 1) = n2 + (2n + 1) = (n + 1)2 .
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Isso mostra que P (n + 1) é verdadeira, toda vez que P (n) é verda-
deira. Pelo teorema, a fórmula é válida para todo número natural n.
Você tem ideia de quando foi feita pela primeira vez a demons-
tração acima? Bem, o primeiro registro que se tem é de 1575 e foi
realizada por Francesco Maurolycos.
Note que, na demonstração acima, poderia parecer que estamos
usando o fato de P (n) ser verdadeira para deduzir que P (n + 1) é
verdadeira para em seguida concluir que P (n) é verdadeira. O que
está ocorrendo? Estamos usando a tese para provar o teorema?
A resposta é não! Preste bem atenção, pois essa é a parte mais
delicada de toda a história.
Dado um número natural n, temos duas possibilidades:
(a) P (n) é verdadeira, ou (b) P (n) é falsa.
A hipótese (ii) do Teorema não exige em absoluto que assumamos
P (n) verdadeira para todo n ∈ N, podendo eventualmente ser falsa
para algum valor de n, ou mesmo para todos os valores de n. O que
a hipótese (ii) exige é que sempre que algum n pertença à categoria
(a) acima, então n + 1 também pertença a essa mesma categoria; não
exigindo nada quando n pertencer à categoria (b).
Por exemplo, a sentença aberta P (n) : n = n + 1 satisfaz (por
vacuidade) à hipótese (ii) do Teorema, já que nenhum n ∈ N pertence
à categoria (a). O que falha para que o Teorema nos garanta que
P (n) é verdadeira para todo n é que a hipótese (i) não é verificada,
pois P (1) : 1 = 2 é falsa!
É preciso ter clareza que a Indução Matemática é diferente da
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8 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
indução empírica das ciências naturais, em que é comum, após um
certo número, necessariamente finito, de experimentos, enunciar leis
gerais que governam o fenômeno em estudo. Essas leis são tidas como
verdades, até prova em contrário. Na matemática, não há lugar para
afirmações verdadeiras até prova em contrário. A Prova por Indução
Matemática trata de estabelecer que determinada sentença aberta
sobre os naturais é sempre verdadeira.
A indução empírica foi batizada, de modo irônico, pelo
matemático, filósofo e grande humanista inglês do século passado,
Bertrand Russel (1872-1970), de indução galinácea, com base na
seguinte historinha:
Havia uma galinha nova no quintal de uma velha senhora. Dia-
riamente, ao entardecer, a boa senhora levava milho às galinhas. No
primeiro dia, a galinha, desconfiada, esperou que a senhora se reti-
rasse para se alimentar. No segundo dia, a galinha, prudentemente,
foi se alimentando enquanto a senhora se retirava. No nonagésimo
dia, a galinha, cheia de intimidade, já não fazia caso da velha se-
nhora. No centésimo dia, ao se aproximar a senhora, a galinha, por
indução, foi ao encontro dela para reclamar o seu milho. Qual não foi
a sua surpresa quando a senhora pegou-a pelo pescoço com a intenção
de pô-la na panela.
Exemplo 1.1.1. Queremos determinar uma fórmula para a soma
dos n primeiros números naturais.
Conta-se a seguinte história sobre o matemático alemão Carl
Friedrich Gauss (1777-1855)1 , quando ainda garoto. Na escola, o pro-
1
Gauss é considerado um dos maiores gênios da matemática de todos os tempos.
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fessor, para aquietar a turma de Gauss, mandou os alunos calcularem
a soma de todos os números naturais de 1 a 100. Qual não foi a sur-
presa quando, pouco tempo depois, o menino deu a resposta: 5 050.
Indagado como tinha descoberto tão rapidamente o resultado, Gauss,
então com nove anos de idade, descreveu o método a seguir.
Sendo
Sn = 1 + 2 + · · · + n,
o objetivo é encontrar uma fórmula fechada2 para Sn .
Somando a igualdade acima, membro a membro, com ela mesma,
porém com as parcelas do segundo membro em ordem invertida, temos
que
Sn = 1 + 2 + ··· + n
Sn = n + (n − 1) + · · · + 1
.
2Sn = (n + 1) + (n + 1) + · · · + (n + 1)
Daí segue-se que 2Sn = n(n + 1) e, portanto,
n(n + 1)
Sn = .
2
Vamos ser críticos com relação à prova acima. Para a maioria das
pessoas, essa prova parece impecável, mas se alguém nos perguntasse
o que está escondido atrás dos pontinhos, talvez nos sentíssemos em-
baraçados. Também, como ter absoluta certeza de que nada acontece
2
Uma fórmula fechada, a grosso modo, é uma fórmula que depende dos dados
iniciais do problema e que permite calcular diretamente os valores do objeto em
estudo fazendo um número pequeno de contas.
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10 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
fora do nosso controle, exatamente na imensa região coberta pelos
pontinhos?
Para não pairar nenhuma dúvida sobre o nosso resultado, vamos
provar a fórmula utilizando Indução Matemática.
Considere a sentença aberta sobre os naturais
n(n + 1)
P (n) : 1 + 2 + · · · + n = . (1.1)
2
Note que
1(1 + 1)
P (1) : 1=
2
é verdadeira.
Observe também que
(n + 1)(n + 2)
P (n + 1) : 1 + 2 + · · · + n + (n + 1) = .
2
Agora, suponhamos que para algum n ∈ N, tenhamos P (n) ver-
dadeira, isto é, a fórmula (1.1) é válida para tal valor de n. Somando
n + 1 a ambos os lados dessa igualdade, temos que é verdadeira a
igualdade
n(n + 1)
1 + 2 + · · · + n + (n + 1) = +n+1
2
n(n + 1) + 2(n + 1)
=
2
(n + 1)(n + 2)
= ,
2
o que estabelece a veracidade de P (n + 1).
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Pelo teorema, tem-se que a fórmula P (n) é verdadeira para todo
n ∈ N.
Exemplo 1.1.2. Queremos validar a fórmula
n(n + 1)(2n + 1)
P (n) : 12 + 22 + · · · + n2 = . (1.2)
6
Note que
1(1 + 1)(2 + 1)
P (1) : 12 =
6
é verdadeira.
Suponha que, para algum n ∈ N, se tenha que P (n) é verdadeira,
isto é, (1.2) é válida. Somando (n + 1)2 a ambos os lados da igualdade
(1.2), temos que
n(n + 1)(2n + 1)
12 + 22 + · · · + n2 + (n + 1)2 = + (n + 1)2
6
n(n + 1)(2n + 1) + 6(n + 1)2
=
6
(n + 1)[n(2n + 1) + 6(n + 1)]
=
6
(n + 1)[(n + 1) + 1][2(n + 1) + 1]
= ,
6
estabelecendo assim a veracidade de P (n + 1).
Portanto, a fórmula é válida para todo n ∈ N.
Exemplo 1.1.3. Vamos provar que é verdadeira, para todo n ∈ N, a
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12 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
fórmula:
1 1 1 n
P (n) : + + ··· + = . (1.3)
1.2 2.3 n(n + 1) n+1
Observemos inicialmente que
1 1
P (1) : =
1.2 1+1
é verdadeira.
Suponhamos que, para algum n, tem-se que P (n) é verdadeira,
ou seja, que a fórmula (1.3) seja verdadeira para esse valor de n.
1
Somando a ambos os lados dessa igualdade , temos
(n + 1)(n + 2)
que
1 1 1 1 n 1
+ + ··· + + = +
1.2 2.3 n(n + 1) (n + 1)(n + 2) n + 1 (n + 1)(n + 2)
n+1
= ,
n+2
mostrando, assim, que P (n + 1) é verdadeira.
Portanto, pelo Teorema 1.1.1, temos que a fórmula vale para todo
n ∈ N.
Problemas
1.1.1 Mostre, por indução, a validade das seguintes fórmulas:
n(n + 1)
(a) 1 − 22 + 32 − · · · + (−1)n−1 n2 = (−1)n−1 .
2
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1
(b) 12 + 32 + · · · + (2n − 1)2 = n(2n − 1)(2n + 1).
3
2
n(n + 1)
(c) 13 + 23 + · · · + n3 = .
2
1.1.2 Mostre, por indução, a validade das seguintes fórmulas:
1 1 1 n
(a) + + ··· + = .
1.3 3.5 (2n − 1)(2n + 1) 2n + 1
1 1 1 1 n
(b) + + + ··· + = .
1.4 4.7 7.10 (3n − 2)(3n + 1) 3n + 1
1 1 1 1 n
(c) + + + ··· + = .
1.5 5.9 9.13 (4n − 3)(4n + 1) 4n + 1
1 1 1 n(n + 3)
(d) + + ··· + = .
1.2.3 2.3.4 n(n + 1)(n + 2) 4(n + 1)(n + 2)
12 22 n2 n(n + 1)
(e) + + ··· + = .
1.3 3.5 (2n − 1)(2n + 1) 2(2n + 1)
1.1.3 Mostre, para n, m ∈ N, que
1 · 2 · · · m + 2 · 3 · · · m(m + 1) + · · · + n(n + 1) · · · (n + m − 1) =
1
n(n + 1) · · · (n + m).
m+1
Sugestão: Fixe m arbitrário e proceda por indução sobre n.
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14 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
1.1.4 Mostre que a soma dos cubos de três números naturais conse-
cutivos é sempre divisível por 9.
Sugestão: Considere a sentença aberta
P (n) : n3 + (n + 1)3 + (n + 2)3 é divisível por 9,
e mostre, por indução, que ela é verdadeira para todo n ∈ N.
1.1.5 Dada a sentença aberta em N:
n(n + 1)
P (n) : 1 + 2 + · · · + n = + 1,
2
mostre que:
(i) Qualquer que seja n ∈ N, se P (n) é verdadeira, então P (n + 1) é
verdadeira.
(ii) P (n) não é verdadeira para nenhum valor de n ∈ N.
1.2 Definição por Recorrência
Recorde que fizemos objeções na seção anterior ao uso dos ponti-
nhos nas demonstrações de algumas fórmulas; não que sejamos con-
tra, eles ajudam muito a representar situações em que há um número
grande (eventualmente infinito) de objetos a serem descritos e a visu-
alizar propriedades desses objetos.
Nessas notas, estamos tentando mostrar como se pode estabele-
cer um maior padrão de rigor no tratamento de certos problemas
matemáticos, mas isso não deve ser tomado ao pé da letra. Certos ar-
gumentos informais, quando acompanhados de um raciocínio correto,
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25. “inducaofinal”
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SEC. 1.2: DEFINIÇÃO POR RECORRÊNCIA 15
são corriqueiramente aceitos. Por exemplo, o argumento utilizado por
Gauss para somar os n primeiros números naturais é perfeitamente
aceitável. Portanto, um conselho: use o formalismo para ajudar e não
para atrapalhar; nunca deixe ele se sobrepor à criatividade, pois, em
regra, primeiro vem a descoberta, e depois, a formalização.
Voltemos agora ao problema que queremos abordar. O que real-
mente significa uma expressão da forma
1 + 3 + 5 + · · · + (2n − 1),
que consideramos no Exemplo 1.1.1?
Apesar de intuirmos o que se quer dizer, isso formalmente ainda
não faz sentido, pois a operação de adição de números é definida para
um par de números, e aqui temos n números sendo somados de uma
só vez, além do “inconveniente” dos pontinhos, é claro. Para dar um
sentido preciso a esse tipo de expressão, vamos ver como a Indução
Matemática pode nos ajudar.
Para definir uma expressão En , para todo número natural n, basta
definirmos E1 e mostrar como obter En+1 a partir de En , para todo
n ∈ N.
De fato, para verificar que temos efetivamente uma definição para
todo número natural n, consideremos a sentença aberta
P (n) : En está definido
e provemos, por Indução Matemática, que P (n) é verdadeira para
todo n ∈ N.
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16 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
Por construção dos En , temos que:
(i) P (1) é verdadeira.
(ii) Qualquer que seja n ∈ N, se P (n) é verdadeira, então P (n + 1)
é também verdadeira.
Portanto, pelo Teorema 1.1.1, temos que P (n) é verdadeira para
todo número natural n.
Nesse caso, dizemos que En foi definido por recorrência.
Para continuarmos a nossa discussão, precisaremos de um conceito
que não introduzimos ainda, mas do qual você certamente já ouviu
falar.
Você sabe o que é uma sequência? Certamente você já foi apre-
sentado à seguinte definição:
“Seja a1 , a2 , . . . , an , . . . uma sequência de números em que cada
elemento an , a partir do segundo, é igual ao anterior an−1 somado
com um número constante r.”
Isso é o que se chama de Progressão Aritmética.
Mas, o que é uma sequência em geral? Uma sequência, como
sugere o nome, é uma “coleção de elementos” de natureza qualquer,
ordenados. Na verdade, trata-se apenas de elementos de um conjunto
etiquetados com os números naturais.
Etiquetar com os números naturais os elementos de um conjunto
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SEC. 1.2: DEFINIÇÃO POR RECORRÊNCIA 17
A, significa dar uma função
a : N −→ A
n → a(n)
A definição formal de uma sequência em um conjunto A é apenas
uma função a de N em A.
Como uma função é dada quando se conhece a imagem de todos
os elementos do seu domínio, uma sequência a pode ser representada
como
a(1), a(2), . . . , a(n), . . . ;
ou ainda, denotando a(n) por an , podemos representá-la por
(an ) : a1 , a2 , . . . , an , . . .
Quando dissermos que um conjunto A possui uma adição ou uma
multiplicação satisfazendo às leis básicas da aritmética, estaremos
supondo que em A está definida uma operação com propriedades
semelhantes à correspondente operação nos reais.
Exemplo 1.2.1. Seja (an ) uma sequência de elementos de um con-
junto munido de uma adição sujeita às leis básicas da aritmética. Para
dar sentido às somas
Sn = a1 + a2 + · · · + an ,
basta definir recorrentemente Sn .
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18 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
Pomos S1 = a1 e, supondo Sn definido, definimos
Sn+1 = Sn + an+1 .
Somas como Sn serão também denotadas com a notação de so-
matórios:
n
Sn = ai ,
i=1
que se lê como “somatório quando i varia de 1 até n de ai ”.
Um conceito que se define naturalmente por recorrência é o fatorial
de um número natural.
Exemplo 1.2.2. Define-se o fatorial n! de um número natural n
como:
1! = 1, e (n + 1)! = n! · (n + 1).
Outro conceito que, naturalmente, é definido por recorrência é o
de potência.
Exemplo 1.2.3. Seja a um elemento de um conjunto A munido de
uma multiplicação sujeita às leis básicas da aritmética. Vamos definir
as potências an , com n ∈ N, por recorrência.
Ponhamos a1 = a. Supondo an definido, defina
an+1 = an · a.
Vamos estabelecer, por meio de indução, as propriedades usuais
das potências.
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SEC. 1.2: DEFINIÇÃO POR RECORRÊNCIA 19
Proposição 1.2.1. Sejam a, b ∈ A e m, n ∈ N. Então,
(i) am · an = an+m ;
(ii) (am )n = amn ;
(iii) (a · b)n = an · bn .
Demonstração. Provaremos (i), deixando o restante como exercício.
Fixemos a ∈ A e m ∈ N, arbitrariamente. Demonstremos a pro-
priedade por indução sobre n.
Para n = 1, a propriedade é válida, pois, pelas definições,
am · a1 = am · a = am+1 .
Por outro lado, supondo que am · an = am+n , temos que:
am · an+1 = am · (an · a) = (am · an ) · a = am+n · a = am+n+1 .
Isso, pelo Teorema 1.1.1, prova a nossa propriedade.
Exemplo 1.2.4. Vamos provar que 3 divide 5n +2 ·11n , nos inteiros,
para todo n ∈ N.
De fato, para n = 1, temos que 3 divide 51 + 2 · 111 = 27.
Suponha, agora, que, para algum n ≥ 1, saibamos que 3 divide
5n + 2 · 11n . Logo, existe um número inteiro a tal que
5n + 2 · 11n = 3a.
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20 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
Multiplicando por 5 ambos os lados da igualdade acima, temos
5 · 3a = 5n+1 + 5 · 2 · 11n = 5n+1 + 2 · 11 · 11n − 12 · 11n .
Daí segue a igualdade
5n+1 + 2 · 11n+1 = 5 · 3a + 12 · 11n ,
cujo segundo membro é divisível por 3 por ser igual a 3(5a + 4 · 11n ).
Assim, provamos que 3 divide 5n+1 +2·11n+1 , o que, pelo Teorema
1.1.1, acarreta que 3 divide 5n + 2 · 11n , para todo número natural n.
Pode ocorrer que uma determinada propriedade seja válida para
todos os números naturais a partir de um determinado valor a, mas
não necessariamente para valores menores. Como proceder nesses
casos?
Por exemplo, como provar que a desigualdade 2n > n2 é verdadeira
para todo valor de n natural maior do que ou igual a 5?
Fazemos isso baseados na seguinte pequena generalização do Teo-
rema 1.1.1:
Teorema 1.2.1. Seja P (n) uma sentença aberta sobre N, e seja
a ∈ N. Suponha que
(i) P (a) é verdadeira, e
(ii) qualquer que seja n ∈ N, com n ≥ a, sempre que P (n) é ver-
dadeira, segue-se que P (n + 1) é verdadeira.
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SEC. 1.2: DEFINIÇÃO POR RECORRÊNCIA 21
Então, P (n) é verdadeira para todo número natural n ≥ a.
Demonstração. Defina o conjunto
S = {m ∈ N; P (m + a − 1) é verdadeira}.
Por (i) temos que 1 ∈ S. Por outro lado, se m ∈ S, temos que
P (m+a−1) é verdadeira. Logo, por (ii), P (m+1+a−1) é verdadeira.
Portanto, m + 1 ∈ S. Em vista do Teorema 1.1.1, temos que S = N.
Consequentemente, P (n) é verdadeira para todo n ≥ a.
Exemplo 1.2.5. Vamos mostrar que a desigualdade na sentença
aberta P (n) : 2n > n2 é verdadeira, para todo número natural n ≥ 5.
Note que P (1) : 21 > 12 é verdadeira, P (2) : 22 > 22 é falsa,
P (3) : 23 > 32 é falsa e P (4) : 24 > 42 é falsa. Tudo isso não importa,
pois queremos verificar a veracidade dessa desigualdade para n ≥ 5.
De fato, temos que P (5) : 25 > 52 é verdadeira. Seja n ≥ 5 tal
que 2n > n2 . Multiplicando ambos os lados da desigualdade acima
por 2, obtemos 2n+1 > 2n2 . Note que 2n2 > (n + 1)2 , se n ≥ 3, pois
tal desigualdade é equivalente a n(n − 2) > 1. Daí, deduzimos que
2n+1 > (n + 1)2 , o que significa que P (n + 1) é verdadeira, estabele-
cendo o resultado em vista do Teorema 1.2.1.
Exemplo 1.2.6. Vamos mostrar que a sentença aberta:
a equação 3x + 5y = n tem solução em (N ∪ {0})2 ,
é verdadeira para todo n ≥ 8.
De fato, ela é verdadeira para n = 8, pois a equação 3x + 5y = 8
admite a solução (x, y) = (1, 1).
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22 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
Suponha agora que a equação 3x + 5y = n tenha uma solução
(a, b) para algum n ≥ 8; isto é, 3a + 5b = n. Note que, para qualquer
solução (a, b), devemos ter a ≥ 1 ou b ≥ 1.
Se b ≥ 1, observando que 3 × 2 − 5 × 1 = 1, segue que
3(a + 2) + 5(b − 1) = 3a + 5b + 3 × 2 − 5 × 1 = 3a + 5b + 1 = n + 1,
o que mostra que a equação 3x + 5y = n + 1 admite a solução
(a + 2, b − 1) em (N ∪ {0})2 .
Se, por acaso, b = 0, então, a ≥ 3; usando a igualdade
−3 × 3 + 5 × 2 = 1,
temos
3(a − 3) + 5 × 2 = 3a − 3 × 3 + 5 × 2 = 3a + 5b + 1 = n + 1,
o que mostra que a equação 3x + 5y = n + 1 admite a solução
(a − 3, b + 2) em (N ∪ {0})2 .
Mostramos assim que, em qualquer caso, a equação 3x+5y = n+1
admite solução, sempre que a equação 3x+5y = n, para algum n ≥ 8,
tenha solução. Como o resultado vale para n = 8, segue a conclusão
desejada pelo Teorema 1.2.1.
Note que n0 = 8 é o menor valor de n para o qual a equação tem
solução para todo n ≥ n0 .
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SEC. 1.2: DEFINIÇÃO POR RECORRÊNCIA 23
Problemas
1.2.1 Mostre, por indução, a validade das seguintes fórmulas:
(a) 1.20 + 2.21 + 3.22 + · · · + n.2n−1 = 1 + (n − 1)2n .
2 n−1
1 1 1 nn−1
(b) 1+ 1+ ··· 1 + = .
1 2 n−1 (n − 1)!
(c) 1.1! + 2.2! + 3.3! + · · · + n.n! = (n + 1)! − 1.
1.2.2 Sejam a e b números reais distintos. Mostre que, para todo
n ∈ N, vale a igualdade:
bn+1 − an+1
bn + abn−1 + a2 bn−2 + · · · + an−1 b + an = .
b−a
1.2.3 Se sen α = 0, mostre que, para todo n ∈ N, vale a igualdade:
sen 2n+1 α
cos α · cos 2α · cos 22 α · · · cos 2n α =
2n+1 sen α
Sugestão: Use a fórmula sen 2β = 2 sen β cos β.
1.2.4 Para todo n ∈ N, mostre que, nos inteiros,
(a) 80 divide 34n − 1; (b) 9 divide 4n + 6n − 1;
(c) 8 divide 32n + 7; (d) 9 divide n4n+1 − (n + 1)4n + 1.
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24 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
1.2.5 Mostre que:
(a) n! > 2n , se n ≥ 4.
(b) n! > 3n , se n ≥ 7.
(c) n! > 4n , se n ≥ 9.
1.2.6 Prove que, para todo n natural, vale a desigualdade:
1 3 5 2n − 1 1
· · ··· ≤√ .
2 4 6 2n 3n + 1
1.2.7 Mostre que o número de diagonais de um polígono convexo de
n lados é dado por
n(n − 3)
dn = .
2
1.2.8 Mostre que n0 = 32 é o menor valor para o qual a equação
5x + 9y = n possui solução em (N ∪ {0})2 para todo n ≥ n0 .
1.3 Progressões
Iremos agora, usando recorrência, definir progressões aritméticas
e progressões geométricas.
Exemplo 1.3.1. Uma Progressão Aritmética (P.A.) é uma sequência
de números (an ) tal que, a partir do segundo termo, cada termo an é
igual ao anterior an−1 somado a um número fixo r chamado de razão.
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SEC. 1.3: PROGRESSÕES 25
Portanto, é dado o primeiro termo a1 e define-se recorrentemente
an = an−1 + r, se n ≥ 2.
Para achar uma fórmula fechada para o termo de ordem n da
sequência, observe que
a2 = a1 + r, a3 = a2 + r = a1 + 2r, a4 = a3 + r = a1 + 3r.
Pelo “método da galinha” de Bertrand Russel, já podemos adivi-
nhar os próximos termos:
a5 = a4 + r = a1 + 4r, a6 = a1 + 5r, . . . , an = a1 + (n − 1)r, . . .
Portanto, parece plausível que a fórmula para o termo geral de
uma P.A. de primeiro termo a1 e razão r seja
an = a1 + (n − 1)r, para todo n ∈ N.
Vamos agora demonstrar essa fórmula por indução.
Inicialmente, observe que a fórmula é verdadeira para n = 1, pois
ela se reduz à igualdade a1 = a1 .
Suponha agora que a fórmula seja correta para algum n ∈ N;
isto é, que an = a1 + (n − 1)r. Somando r a ambos os lados dessa
igualdade, segue a igualdade:
an+1 = an + r = a1 + (n − 1)r + r = a1 + nr,
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26 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
o que mostra que a fórmula é verdadeira para n + 1. Portanto, ela é
correta para todo n ∈ N.
Note que, numa P.A., tem-se que
ai + an−i+1 = [a1 + (i − 1)r] + [a1 + (n − i)r]
= a1 + a1 + (n − 1)r (1.4)
= a1 + an .
Agora, nos propomos a achar uma fórmula para a soma
Sn = a1 + a2 + · · · + an
dos n primeiros termos de uma P.A. (an ).
Vamos usar, para isso, o método de Gauss que exibimos no Exem-
plo 1.1.1.
Somando a igualdade acima, membro a membro, com ela mesma,
porém com as parcelas do segundo membro em ordem invertida,
temos, por (1.4) que
Sn = a1 + a2 + ··· + an
Sn = an + an−1 + ··· + a1
.
2Sn = (a1 + an ) + (a2 + an−1 ) + · · · + (an + a1 )
Daí, segue-se que 2Sn = (a1 + an )n e, portanto,
(a1 + an )n
Sn = .
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SEC. 1.3: PROGRESSÕES 27
Deixamos a validação dessa fórmula por indução como exercício.
Exemplo 1.3.2. Uma Progressão Geométrica (P.G.) é uma sequên-
cia de números (an ) tal que, a partir do segundo termo, cada termo an
é igual ao anterior an−1 multiplicado por um número fixo q chamado
de razão.
Portanto, é dado o primeiro termo a1 e define-se recorrentemente
an = an−1 q, se n ≥ 2.
Para achar uma fórmula fechada para o termo de ordem n da
sequência, observe que
a2 = a1 q, a3 = a2 q = a1 q 2 , a4 = a3 q = a1 q 3 , a5 = a4 q = a1 q 4 .
Novamente, pelo “método da galinha” de Bertrand Russel, pode-
mos adivinhar os próximos termos:
a6 = a1 q 5 , a7 = a1 q 6 , ..., an = a1 q n−1 , ...
Portanto, é plausível que a fórmula para o termo geral de uma
P.G. de primeiro termo a1 e razão q seja an = a1 q n−1 , para todo
n ∈ N.
Vamos demonstrar essa fórmula por indução.
Inicialmente, observe que a fórmula é verdadeira para n = 1, pois
ela se reduz à igualdade a1 = a1 .
Suponha, agora, que a fórmula seja correta para algum n ∈ N,
isto é, que an = a1 q n−1 . Multiplicando por q ambos os lados dessa
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28 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
igualdade, segue que
an+1 = an q = a1 q n−1 q = a1 q n ,
o que mostra que a fórmula é correta para n + 1. Portanto, ela é
correta para todo n ∈ N.
Vamos, a seguir, achar uma fórmula para a soma Sn dos n
primeiros termos de uma P.G.
Vejamos se, animados pelo “truque” de Gauss, achamos uma
solução inteligente para esse problema.
Escreva
Sn = a1 + a1 q + a1 q 2 + · · · + a1 q n−1 .
Note que
qSn − Sn = a1 q + a1 q 2 + · · · + a1 q n−1 + a1 q n
−a1 − a1 q − a1 q 2 − · · · − a1 q n−1
= a1 q n − a1 .
Portanto,
a1 q n − a1 an q − a1
Sn = = .
q−1 q−1
Problemas
1.3.1 Ache uma fórmula fechada para cada uma das somas:
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39. “inducaofinal”
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SEC. 1.3: PROGRESSÕES 29
(a) 2 + 4 + · · · + 2n.
(b) 2 + 5 + 8 + · · · + (3n − 1).
1.3.2 Ache uma fórmula fechada para cada uma das somas:
(a) 2 + 4 + · · · + 2n .
1 1 1
(b) + + ··· + n.
2 4 2
Para quanto tende a soma em (b) quando o número de parcelas au-
menta indefinidamente?
1.3.3 Uma vitória régia encontra-se em um tanque de água. Sabendo
que ela dobra de área a cada dia e que, no final de 20 dias, ocupa toda
a superfície do tanque, em qual dia ela ocupará a metade da superfície
do tanque?
Comentário: Esse problema admite duas soluções, uma usando fór-
mulas, outra usando a cabeça.
1.3.4 Em uma cidade de 5 000 habitantes, alguém resolve espalhar
um boato. Considerando que, a cada 10 minutos, uma pessoa é capaz
de contar o caso para 3 pessoas desinformadas, determine em quanto
tempo toda a cidade fica conhecendo o boato.
1.3.5 Uma progressão aritmético-geométrica é uma sequência (an )
tal que a1 , q e r são números reais dados, com q = 1, e, para todo
n ∈ N, tem-se que
an+1 = qan + r.
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30 CAP. 1: INDUÇÃO MATEMÁTICA
q n−1 − 1
(a) Mostre que an = a1 · q n−1 + r .
q−1
(b) Se Sn = a1 + · · · + an , mostre que
qn − 1 qn − 1 n
Sn = a1 +r 2
+r .
q−1 (q − 1) 1−q
(c) Ache o termo geral e a soma dos n primeiros termos da pro-
gressão aritmético-geométrica onde a1 = 1, q = 2 e r = 1.
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Capítulo 2
Indução e Mundo Material
Neste capítulo, mostraremos algumas aplicações da indução
matemática ao mundo material.
2.1 A Torre de Hanói
Você provavelmente já conhece esse jogo, pois trata-se de um jogo
bastante popular que pode ser facilmente fabricado ou ainda encon-
trado em lojas de brinquedos de madeira.
O jogo é formado por n discos de diâmetros distintos com um furo
no seu centro e uma base onde estão fincadas três hastes. Numa das
hastes, estão enfiados os discos, de modo que nenhum disco esteja
sobre um outro de diâmetro menor (veja figura a seguir).
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32 CAP. 2: INDUÇÃO E MUNDO MATERIAL
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O jogo consiste em transferir a pilha de discos para uma outra
haste, deslocando um disco de cada vez, de modo que, a cada passo,
a regra acima seja observada.
As perguntas naturais que surgem são as seguintes:
1. O jogo tem solução para cada n ∈ N?
2. Em caso afirmativo, qual é o número mínimo jn de movimentos
para resolver o problema com n discos?
Usando Indução Matemática, vamos ver que a resposta à primeira
pergunta é afirmativa, qualquer que seja o valor de n. Em seguida,
deduziremos uma fórmula que nos fornecerá o número jn .
Considere a sentença aberta
P (n) : O jogo com n discos tem solução.
Obviamente, P (1) é verdade. Suponha que P (n) seja verdadeiro,
para algum n; ou seja, que o jogo com n discos tem solução. Vamos
provar que o jogo com n + 1 discos tem solução.
Para ver isso, resolva inicialmente o problema para os n discos
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SEC. 2.1: A TORRE DE HANÓI 33
superiores da pilha, transferindo-os para uma das hastes livre (isso é
possível, pois estamos admitindo que o problema com n discos possua
solução):
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Em seguida, transfira o disco que restou na pilha original (o maior
dos discos) para a haste vazia:
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Feito isto, resolva novamente o problema para os n discos que
estão juntos, transferindo-os para a haste que contém o maior dos
discos:
Isso mostra que o problema com n + 1 discos também possui
solução, e, portanto, por Indução Matemática, que P (n) é verdadeira
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34 CAP. 2: INDUÇÃO E MUNDO MATERIAL
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para todo n ∈ N.
Para determinar uma fórmula para jn , veja que, para resolver o
problema para n + 1 discos com o menor número de passos, temos,
necessariamente, que passar duas vezes pela solução mínima do pro-
blema com n discos. Temos, então, que
jn+1 = 2jn + 1.
Obtemos, assim, uma progressão aritmético-geométrica (jn ) cujo
termo geral é, pelo Problema 1.3.5 (c), dado por
jn = 2n − 1.
Esse jogo foi idealizado e publicado pelo matemático francês
Edouard Lucas, em 1882, que, para dar mais sabor à sua criação,
inventou a seguinte lenda:
Na origem do tempo, num templo oriental, Deus colocou 64 discos
perfurados de ouro puro ao redor de uma de três colunas de diamante
e ordenou a um grupo de sacerdotes que movessem os discos de uma
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SEC. 2.2: O ENIGMA DO CAVALO DE ALEXANDRE 35
coluna para outra, respeitando as regras acima explicadas. Quando
todos os 64 discos fossem transferidos para uma outra coluna, o mundo
acabaria.
Você não deve se preocupar com a iminência do fim do mundo,
pois, se, a cada segundo, um sacerdote movesse um disco, o tempo
mínimo para que ocorresse a fatalidade seria de 264 − 1 segundos e
isto daria, aproximadamente, um bilhão de séculos!
2.2 O Enigma do Cavalo de Alexandre
Num mosaico romano, Bucéfalo, o cavalo de Alexandre, o Grande,
é representado como um fogoso corcel cor de bronze. Nesse exemplo,
vamos “provar” que isso é uma falácia (uma grande mentira).
Inicialmente, “provaremos” que todos os cavalos têm mesma cor.
De fato, considere a sentença aberta:
P (n) : Num conjunto com n cavalos, todos têm a mesma cor.
Note que P (1) é obviamente verdadeira. Agora, suponha o resul-
tado válido para conjuntos contendo n cavalos. Considere um con-
junto
C = {C1 , C2 , . . . , Cn , Cn+1 }
com n + 1 cavalos. Decompomos o conjunto C numa união de dois
conjuntos:
C = C ∪ C = {C1 , . . . , Cn } ∪ {C2 , . . . , Cn+1 },
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36 CAP. 2: INDUÇÃO E MUNDO MATERIAL
cada um dos quais contém n cavalos.
Pela hipótese indutiva, segue-se que os cavalos em C têm mesma
cor, ocorrendo o mesmo para os cavalos em C . Como
C2 ∈ C ∩ C ,
segue-se que os cavalos de C têm a mesma cor dos cavalos de C ,
permitindo assim concluir que todos os cavalos em C têm a mesma
cor.
Assim, a nossa “demonstração” por indução está terminada,
provando que P (n) é verdadeira para todo n ∈ N.
Agora, todo mundo sabe (você sabia?) que Marengo, o famoso
cavalo de Napoleão, era branco. Logo, Bucéfalo deveria ser branco.
Onde está o erro nessa prova? Para achá-lo, sugerimos que você
tente provar que, se P (1) é verdadeira, então P (2) é verdadeira.
Esse problema foi inventado pelo matemático húngaro George
Pólya (1887-1985).
Problemas
2.2.1 Ache o erro na “prova” do seguinte “Teorema”:
Todos os numeros naturais são iguais.
Demonstração. Vamos provar o resultado mostrando que, para todo
n ∈ N, é verdadeira a sentença aberta
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SEC. 2.3: DESCOBRINDO A MOEDA FALSA 37
P (n): Dado n ∈ N, todos os número naturais menores ou iguais
do que n são iguais.
(i) P (1) é claramente verdadeira.
(ii) Suponha que P (n) seja verdadeira, logo n − 1 = n. Somando 1
a ambos os lados dessa igualdade, obtemos n = n + 1. Como n era
igual a todos os naturais anteriores, segue que P (n + 1) é verdadeira.
Portanto, P (n) é verdadeira para todo n ∈ N .
2.3 Descobrindo a Moeda Falsa
Têm-se 2n moedas de ouro, sendo uma delas falsa, com peso menor
do que as demais. Dispõe-se de uma balança de dois pratos, sem ne-
nhum peso. Vamos mostrar, por indução sobre n, que é possível achar
a moeda falsa com n pesagens.
Para n = 1, isso é fácil de ver, pois, dadas as duas moedas, basta
pôr uma moeda em cada prato da balança e descobre-se imediata-
mente qual é a moeda falsa.
Suponha, agora, que o resultado seja válido para algum valor de
n e que se tenha que achar a moeda falsa dentre 2n+1 moedas dadas.
Separemos as 2n+1 moedas em 2 grupos de 2n moedas cada. Coloca-se
um grupo de 2n moedas em cada prato da balança. Assim, poderemos
descobrir em que grupo de 2n moedas encontra-se a moeda falsa.
Agora, pela hipótese de indução, descobre-se a moeda falsa com n
pesagens, que, junto com a pesagem já efetuada, perfazem o total de
n + 1 pesagens.
No Capítulo 3, iremos generalizar esse problema, resolvendo-o
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38 CAP. 2: INDUÇÃO E MUNDO MATERIAL
para um número qualquer de moedas.
Problemas
2.3.1 Mostre que o problema da moeda falsa para 3n moedas também
se resolve com n pesagens.
2.4 A Pizza de Steiner
O grande geômetra alemão Jacob Steiner (1796-1863) propôs e
resolveu, em 1826, o seguinte problema:
Qual é o maior número de partes em que se pode dividir o plano
com n cortes retos?
Pensando o plano como se fosse uma grande pizza, temos uma
explicação para o nome do problema.
Denotando o número máximo de pedaços com n cortes por pn ,
vamos provar por indução a fórmula:
n(n + 1)
pn = + 1.
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Para n = 1, ou seja, com apenas um corte, é claro que só podemos
obter dois pedaços. Portanto, a fórmula está correta, pois
1(1 + 1)
p1 = + 1 = 2.
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Admitamos agora que, para algum valor de n, a fórmula para pn
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SEC. 2.4: A PIZZA DE STEINER 39
esteja correta. Vamos mostrar que a fórmula para pn+1 também está
correta.
Suponhamos que, com n cortes, obtivemos o número máximo
n(n + 1)/2 + 1 de pedaços e queremos fazer mais um corte, de modo
a obter o maior número possível de pedaços.
Vamos conseguir isso se o (n + 1)-ésimo corte encontrar cada um
dos n cortes anteriores em pontos que não são de interseção de dois
cortes (faça um desenho para se convencer disso).
Por outro lado, se o (n + 1)-ésimo corte encontra todos os n cortes
anteriores, ele produz n + 1 novos pedaços: o corte começa em um
determinado pedaço e, ao encontrar o primeiro corte, ele separa em
dois o pedaço em que está, entrando em outro pedaço. Ao encontrar
o segundo corte, ele separa em dois o pedaço em que está, entrando
em outro pedaço, e assim sucessivamente, até encontrar o n-ésimo
corte separando o último pedaço em que entrar em dois. Assim, são
obtidos n + 1 pedaços a mais dos que já existiam; logo,
n(n + 1) (n + 1)(n + 2)
pn+1 = pn + n + 1 = +1+n+1= + 1,
2 2
mostrando que a fórmula está correta para n + 1 cortes. O resultado
segue então do Teorema 1.1.1.
Problemas
2.4.1 (O queijo de Steiner) Para fazer a sua pizza, Steiner teve que
cortar, primeiro, o queijo. Imaginando que o espaço é um enorme
queijo, você seria capaz de achar uma fórmula para o número máximo
de pedaços que poderíamos obter ao cortá-lo por n planos?
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40 CAP. 2: INDUÇÃO E MUNDO MATERIAL
2.5 Os Coelhos de Fibonacci
Trata-se do seguinte problema proposto e resolvido pelo
matemático italiano Leonardo de Pisa em seu livro Liber Abacci, de
1202:
Quot paria coniculorum in uno anno ex uno pario germinentur.
Como não se ensina mais latim nas escolas, aí vai uma explicação:
um casal de coelhos recém-nascidos foi posto num lugar cercado. De-
terminar quantos casais de coelhos ter-se-ão após um ano, supondo
que, a cada mês, um casal de coelhos produz outro casal e que um
casal começa a procriar dois meses após o seu nascimento.
Leonardo apresenta a seguinte solução:
número de casais número de casais
mês total
do mês anterior recém-nascidos
1o 0 1 1
2o 1 0 1
3o 1 1 2
4o 2 1 3
5o 3 2 5
6o 5 3 8
7o 8 5 13
8o 13 8 21
9o 21 13 34
10o 34 21 55
11o 55 34 89
12o 89 55 144
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