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PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS
NÚCLEO DE EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA
Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Público
HELDER PAULO DE ANDRADE
PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA DE TRÂNSITO:
Limites à Discricionariedade do Agente
Belo Horizonte
2016
HELDER PAULO DE ANDRADE
PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA DE TRÂNSITO:
Limites à Discricionariedade do Agente
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Programa de Pós-Graduação em Direito
Público da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção
do título de Especialista em Direito Público.
Orientador: Prof. Me. Jair Eduardo Santana
Belo Horizonte
2016
HELDER PAULO DE ANDRADE
PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA DE TRÂNSITO:
Limites à Discricionariedade do Agente
Trabalho de Conclusão de Curso apresentado
ao Programa de Pós-Graduação em Direito
Público da Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção
do título de Especialista em Direito Público.
_________________________________________________
Prof. Me. Jair Eduardo Santana – PUC Minas (Orientador)
_________________________________________________
Prof. Dr. Diogo Luna Moureira – PUC Minas (Banca Examinadora)
Belo Horizonte, 25 de abril de 2016.
À Glória do Grande Arquiteto do Universo,
que tem me permitido viver com
justiça e perfeição.
AGRADECIMENTOS
A finalização deste trabalho e a obtenção do título de Especialista em Direito
Público só se concretiza graças à colaboração de muitos, aos quais sou muito grato.
Dentre inúmeros, destaco: Deus, pela centelha divina que me ilumina; os meus
pais – Maria do Carmo e José Paulo – pelo incondicional apoio; a Polícia Militar de
Minas Gerais, fonte do meu trabalho e renda; e a Pontifícia Universidade Católica de
Minas Gerais – na pessoa do meu Orientador, Professor Jair Santana – por ofertar
esse curso na modalidade à distância, facilitando sobremaneira o aprendizado.
Por fim, agradeço de forma especial a minha namorada – Rosane Aparecida
Miranda – pela amizade, compreensão e, principalmente, pela constante ajuda na
superação dos meus desafios nessa incessante busca pelo conhecimento.
Tudo aquilo que o homem ignora, não existe
para ele. Por isso o universo de cada um,
se resume no tamanho de seu saber.
(Albert Einstein, 1879-1955)
RESUMO
Este estudo teve por objetivo conceituar o Poder de Polícia delegado pela
Administração Pública aos servidores que executam a função de fiscalizadores de
trânsito e os requisitos para que estes se tornem Agentes da Autoridade de Trânsito.
Por meio de revisão literária no direito positivo, bem como em doutrinas e em
jurisprudências, procurou-se identificar e definir o poder discricionário do Agente de
Trânsito durante sua atuação investido no Poder de Polícia Administrativa de Trânsito.
Além disso, este estudo buscou analisar essa discricionariedade, conhecida
popularmente como bom senso, com intuito de definir seus limites legais. O
aprofundamento do estudo desta matéria foi importante porque não há uma
padronização de condutas no que se refere à discricionariedade da atuação do agente
público no trânsito. Enquanto alguns agem com demasiada restrição, aplicando com
exacerbado rigor as normas, outros são deliberadamente complacentes e tolerantes
para com os infratores da lei de trânsito. Essas atuações discrepantes e convergentes
trazem uma certa insegurança jurídica ao cidadão administrado, pois enquanto um
infrator é punido com o rigor da lei, outro, que ocasionalmente cometera o mesmo
delito, sai isento de qualquer punição. Observou-se que a discricionariedade enrustida
no Poder de Polícia Administrativa deve ser aplicada de acordo com os requisitos
exigidos pela norma, além da conveniência e oportunidade. Concluiu-se que o agente
público não tem a liberdade de decidir, por suas meras convicções, sobre fazer ou não
uma autuação de trânsito, pois trata-se de um ato vinculado à sua função. Pôde-se
perceber que a discricionariedade existente em seu Poder de Polícia de Trânsito
restringe-se à aplicação das medidas administrativas, mas não quanto à autuação.
Palavras-chave: Poder de polícia administrativa de trânsito. Poder discricionário do
agente de trânsito. Limites à discricionariedade do agente de trânsito.
ABSTRACT
This study aimed to conceptualize the delegate Police Power by the Public
Administration to servers running the traffic supervisory function and the requirements
for them to become agents of the Transit Authority. Through literature review in positive
law and in doctrine and jurisprudence, we tried to identify and define the discretion of
the Traffic Agent during its operations invested in the Power of Administrative Police
Traffic. In addition, this study investigates this discretion, popularly known as common
sense, in order to define their legal limits. The study of deepening this matter was
important because there is no standardization of procedures in relation to the discretion
of the performance of the public official in traffic. While some act with too much
restriction, applying with rigor exacerbated the rules, others are deliberately
complacent and tolerant of violators of traffic law. These disparate and convergent
actions bring legal uncertainty given to citizens, because while an offender is punished
with the rigor of the law, one that occasionally committed the same offense, comes out
free of any punishment. It was observed that the closeted discretion in Administrative
Police Power must be applied in accordance with the requirements of the standard,
plus the convenience and opportunity. It was concluded that the public official does not
have the freedom to decide, by their mere beliefs, about doing or not a traffic
assessment, because it is an act linked to its function. It could be perceived that the
existing discretion in its Traffic Police Power is limited to the application of
administrative measures, but not as to the assessment.
Keywords: Power of administrative police traffic. Discretion traffic agent. Limits the
discretion of the traffic agent.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AIT – Auto de Infração de Trânsito
CNT – Código Nacional de Trânsito
CONTRAN – Conselho Nacional de Trânsito
CR – Constituição da República Federativa do Brasil
CTB – Código de Trânsito Brasileiro
IPVA – Imposto sobre a Propriedade de Veículo Automotor
JARI – Junta Administrativa de Recursos de Infrações
NA – Notificação da Autuação
NP – Notificação da Penalidade
PRF – Polícia Rodoviária Federal
PUC Minas – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais
RENAVAM – Registro Nacional de Veículos Automotores
SNT – Sistema Nacional de Trânsito
TJ – Tribunal de Justiça
SUMÁRIO
1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................10
2 DESENVOLVIMENTO ...........................................................................................11
2.1 A Administração Pública...............................................................................11
2.2 Poderes da Administração Pública ..............................................................11
2.3 Poder de Polícia da Administração Pública ................................................14
2.3.1 Definição de Poder de Polícia....................................................................16
2.3.2 Objeto do Poder de Polícia.........................................................................18
2.3.3 Finalidade do Poder de Polícia ..................................................................19
2.3.4 Fundamento do Poder de Polícia ..............................................................20
2.3.5 Características do Poder de Polícia ..........................................................21
2.3.6 Vinculação do Poder de Polícia.................................................................24
2.3.7 Discricionariedade do Poder de Polícia....................................................27
2.3.8 Sanção do Poder de Polícia .......................................................................29
2.4 A Legislação de Trânsito no Brasil ..............................................................31
2.4.1 O Sistema Nacional de Trânsito ................................................................33
2.4.2 Competência das Autoridades de Trânsito ..............................................34
2.5 Poder de Polícia Administrativa de Trânsito ...............................................38
2.5.1 Limites à Discricionariedade do Agente de Trânsito...............................40
3 CONCLUSÃO ........................................................................................................46
REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................47
10
1 INTRODUÇÃO
O trânsito é um tema de grande relevância não só pelo alarmante número de
acidentes automobilísticos que ocorrem todos os dias, mas principalmente por estar
diretamente ligado ao nosso direito de locomoção. Atualmente tem-se discutido
incessantemente o tema mobilidade urbana com intuito de melhorar as condições de
vida dos cidadãos que vivem nos grandes centros urbanos, cujas ruas não comportam
tantos veículos, o que ocasiona gigantescas filas em determinados horários.
Com base nisso, este trabalho visa primeiramente trazer à tona a intervenção
da Administração Pública no trânsito por meio do conceito e aplicação do Poder de
Polícia Administrativa de trânsito, alcançando a sua delegação aos servidores
públicos que atuam nesta atividade.
Em seguida buscar-se-á definir o poder discricionário dos agentes e se há
limites à essa discricionariedade durante o controle e a fiscalização de trânsito. O
aprofundamento nesse estudo é necessário diante da ausência de uma padronização
de condutas por parte dos agentes públicos que atuam no trânsito, pois, enquanto
alguns agem com demasiada restrição, aplicando com exacerbado rigor as normas,
outros são deliberadamente complacentes e tolerantes para com os infratores.
Essas atuações discrepantes e convergentes trazem uma certa insegurança
jurídica ao cidadão administrado, pois enquanto um infrator é punido com o rigor da
lei de trânsito, outro, que ocasionalmente cometera o mesmo delito, sai isento de
qualquer sanção por parte do agente fiscalizador.
Assim, este estudo tem o escopo de conceituar o Poder de Polícia
Administrativa de Trânsito, definir e delimitar a discricionariedade de atuação do
Agente de Trânsito durante a aplicação do instituto conhecido popularmente como
bom senso. Faz-se necessário verificar se esse bom senso pode ser aplicado de
acordo com a vontade do servidor ou se há regras que disciplinam o seu uso.
11
2 DESENVOLVIMENTO
O Estado dispõe de meios legais de coordenação e controle para agir junto aos
administrados. Esses meios legais são poderes conferidos à Administração Pública
pelo ordenamento jurídico, como bem afirma Medauar (2009).
Não é desconhecido o fato de que o Estado deve atuar à sombra do princípio
da supremacia do interesse público. Significa dizer que o interesse particular
há de curvar-se diante do interesse coletivo. É fácil imaginar que, não fora
assim, se implantaria o caos na sociedade (CARVALHO FILHO, 2009, p. 71).
Esses poderes conferidos à Administração Pública visam a restrição dos
direitos do indivíduo em prol da coletividade ou do interesse público. Antes de citar
esses poderes, faz-se necessário conceituar a Administração Pública.
2.1 A Administração Pública
O termo Administração Pública pode ser definido, segundo Gasparini (2009)
como um complexo de atividades concretas e imediatas desempenhadas pelo Estado
sob os termos e condições da lei, visando o atendimento das necessidades coletivas
dos administrados.
Teixeira (2012) conceitua a Administração Pública como o conjunto de
entidades, órgãos e agentes que executam a função administrativa do Estado, bem
como a atividade administrativa propriamente dita.
Em suma a Administração Pública pode ser entendida como o conjunto de
órgãos do Estado que visam o controle das atividades estatais e a fiscalização das
ações dos cidadãos, resguardados os seus direitos e garantias individuais e coletivos.
2.2 Poderes da Administração Pública
Definida a Administração Pública, pode-se afirmar que ela possui certos
poderes que facilitam a obtenção de seus objetivos. É necessário que a administração
mantenha sua supremacia sobre os administrados visando a preponderância do
interesse público e da coletividade.
12
Coadunando com essa ideia, Di Pietro (2010, p. 211), disse que “[...] a
administração pública dispõe de poderes que lhe asseguram posição de supremacia
sobre o particular e sem os quais ela não conseguiria atingir seus fins”.
Meirelles (2004) ensina que, para haver um bom atendimento aos
administrados, faz-se necessário que a Administração Pública seja dotada de poderes
proporcionais aos seus encargos. Medauar (2009, p. 109) afirma que “para que a
Administração possa realizar o conjunto das atividades que lhe cabem, no
cumprimento de seu papel na vida coletiva, o ordenamento lhe confere poderes”.
Ainda que o foco deste estudo seja somente um dos poderes da Administração
Pública, que é o Poder de Polícia de Trânsito, será apresentada uma breve definição
dos outros poderes para um melhor entendimento. Assim, de acordo com o Direito
Administrativo os poderes podem ser divididos em:
Poder Disciplinar: é o meio que a administração tem de controlar, fiscalizar e
sancionar, se necessário for, os seus servidores. Esse poder é definido por Meirelles
(2004, p. 122) como:
Poder disciplinar é a faculdade de punir internamente as infrações funcionais
dos servidores e demais pessoas sujeitas à disciplina dos órgãos e serviços
da Administração. É uma supremacia especial que o Estado exerce sobre
todos aqueles que se vinculam à Administração por relações de qualquer
natureza, subordinando-se às normas de funcionamento do serviço ou do
estabelecimento que passam a integrar definitiva ou transitoriamente.
Poder Hierárquico: define a organização dos órgãos que compõem a
administração com base na hierarquização das competências. Ele é conceituado por
Gasparini (2009, p. 52) como:
A estrutura da Administração Pública, compreendida como a instituição dos
órgãos encarregados da execução de certas e determinadas atribuições, faz-
se com a observância do princípio da hierarquia, que é a relação de
subordinação existente entre os órgãos públicos com competência
administrativa e, por conseguinte, entre seus titulares, decorrente do
exercício da atribuição hierárquica, chamada por alguns de poder hierárquico.
[destaque do autor]
13
Poder Regulamentar: permite ao administrador editar normas complementares
às leis vigentes com intuito de facilitar ou até mesmo viabilizar a aplicação delas. É
ensinado por Di Pietro (2010, p. 90) como:
[...] uma das formas pelas quais se expressa a função normativa do Poder
Executivo. Pode ser definido como o que cabe ao Chefe do Poder Executivo
da União, dos Estados e dos Municípios, de editar normas complementares
à lei, para a sua fiel execução.
Poder Vinculado: restringe sobremaneira a atuação do agente público ao
disciplinar e moldar a sua atuação. Meirelles (2004, p. 115) ensina que nesse poder:
[...] o agente público fica inteiramente preso ao enunciado da lei, em todas as
suas especificações. Nessa categoria de atos administrativos a liberdade de
ação do administrador é mínima, pois terá que se ater à enumeração
minuciosa do Direito Positivo para realizá-lo eficazmente. Deixando de
atender a qualquer dado expresso na lei, o ato é nulo, por desvinculado de
seu tipo-padrão.
Poder Discricionário: permite ao agente público atuar com certa liberdade,
possibilitando-lhe agir de acordo com a conveniência e a oportunidade. Está muito
definido por Carlin, citado por Teixeira (2012, p. 15), quando afirma:
Numa prerrogativa de valoração, a lei não é capaz de regular todas as
condutas de um agente administrativo. Por isso, ela lhe confere a prerrogativa
de avaliar a conveniência e a oportunidade dos atos administrativos que ele
vai praticar como administrador do interesse público.
Poder de Polícia: possibilita ao administrador restringir certos direitos do
cidadão em prol da coletividade ou do interesse público. Bacellar (2001, p. 11) ensina:
Em suma, as prerrogativas da Administração traduzem-se em poderes
especiais, os quais possibilitam a sua atuação, impondo limites aos
interesses do particular (poder de polícia). Como resultado, temos como
regular a possibilidade de um policial de trânsito aplicar uma multa, de o
Poder Público Municipal sancionar empresas poluidoras do meio-ambiente,
desapropriar bens para a reforma agrária, entre outras.
14
O Poder de Polícia é um dos principais poderes da Administração Pública, tanto
que será o foco deste trabalho de agora em diante e será feito um estudo
pormenorizado a seu respeito.
2.3 Poder de Polícia da Administração Pública
Pode-se perceber que a Administração Pública é refém de seus poderes para
exercer suas atividades. Dentre os diversos citados, o Poder de Polícia ganha
destaque porque visa fiscalizar, e ocasionalmente sancionar, o administrado,
restringindo o gozo de seus direitos e exigindo o cumprimento de seus deveres legais.
A origem histórica do Poder de Polícia foi muito bem apresentada por Andrade
(2013, p. 15-16), como se pode observar a seguir:
Para entendermos o termo poder de polícia, faz-se necessário o estudo de
sua evolução histórica, a começar pelo desmembramento das palavras que
o compõem. No que se refere às definições afetas ao tema deste estudo, o
Dicionário Online de Português [Internet] assim explica:
Poder: origina-se do latim potere. Significa direito de agir, de decidir, de
mandar; autoridade, governo de um país; mandato, procuração. É sinônimo
de autoridade, domínio, mando.
Polícia: origina-se do latim politia, procedente do grego politeia, que
originalmente se referia a organização política, sistema de governo.
Atualmente pode ser definida como o conjunto de regras impostas aos
membros de uma coletividade com o objetivo de garantir a ordem, a
tranquilidade e a segurança públicas. Seu sinônimo mais adequado é
fiscalização. [destaque do autor]
Há séculos que o termo polícia vem sendo vinculado às atuações da
Administração Pública. “No século XVIII, o termo polícia designava o conjunto das
atividades estatais, e denotava o conceito mais amplo de administração estatal”,
completa Carlin citado por Teixeira (2012, p. 17).
Entretanto, a dimensão com que se utilizava a expressão polícia passou a ser
rejeitada a partir no mesmo século XVIII, como assegura Teixeira (2012, p. 17) citando
Faria: “Esse entendimento amplo sobre o conceito de polícia foi mais tarde refutado
pelo movimento cultural que culminou com a Revolução Francesa de 1789”.
15
A partir de então houve uma certa restrição ao emprego do termo polícia, que
passou a ser vinculado à segurança propriamente dita. Comunga com essa afirmação
Carlin, citado por Teixeira (2012, p. 17), acrescentando que, com a chegada da
Revolução Francesa:
[...] o conceito de polícia passou a se restringir, valorizando os direitos
individuais e as concepções de Estado de Direito. Polícia passou, então, a
designar parte das atividades de Administração, destinada a manter a ordem.
Seu caráter fundamental é a vigilância.
No entanto, os administrados não estavam satisfeitos porque eram obrigados
a cumprir rígidas leis, enquanto os administradores não se submetiam a elas.
Posteriormente, com o Estado de Direito, afirma Di Pietro (2010, p. 115) que:
[...] inaugura-se nova fase em que já não se aceita a ideia de existirem leis a
que o próprio príncipe não se submeta. Um dos princípios básicos do Estado
de Direito é precisamente o da legalidade, em consonância com o qual o
próprio Estado se submete às leis por ele mesmo postas.
Até então não havia distinção entre a polícia que praticava a segurança e a
polícia que tinha como objetivo a fiscalização do cumprimento das normas
administrativas. “Surgiram, então, na França, a polícia administrativa e a polícia
repressiva ou auxiliar, em contraponto com a judiciária, que preparava e impunha as
ordens emanadas dos juízes”, como bem ensina Teixeira (2012, p. 17) citando Carlin.
É categórico Di Pietro (2010, p. 116) ao dizer que “antes já de iniciar o século
XX, os autores começam a falar em uma polícia geral, relativa à segurança pública, e
em polícias especiais, que atuam nos mais variados setores da atividade dos
particulares”.
Assim, começou-se a diferenciar os tipos de polícia, cuja distinção ficou mais
evidente no início do século XX, mais precisamente “em 1915 [quando] Ruy Barbosa,
num parecer, utiliza a expressão poder de polícia. Aurelino Leal publica em 1918 o
livro Polícia e poder de polícia. A partir daí firma-se no direito pátrio o uso da locução”,
conclui Medauar (2009, p. 342).
É importante diferenciar o Poder de Polícia Administrativa do Poder da Polícia
de segurança pública. O primeiro se trata do poder fiscalizatório aplicado pela
16
Administração Pública, objeto de nosso estudo; o segundo é o poder que as forças
policiais detêm para a garantia da ordem e da segurança públicas.
Ressalta-se que geralmente os policiais, detentores do Poder da Polícia, é que
garantem o uso do Poder de Polícia dos agentes públicos, sendo que a polícia pode
atuar utilizando esses dois poderes simultaneamente. Exemplo: em uma blitz policial,
ao fiscalizar os documentos do condutor e do veículo, o policial utiliza o seu Poder de
Polícia Administrativa de Trânsito; ao vistoriar o automóvel e os ocupantes em busca
de algo ilícito, o policial exerce o seu Poder da Polícia, originário de sua função.
2.3.1 Definição de Poder de Polícia
O autoritarismo foi lentamente perdendo espaço e o poder público passou a
intervir de forma mais moderada na vida do cidadão. Entretanto, fazia-se necessário
um controle estatal para que não houvesse excesso do administrado ao exercer seus
direitos, podendo vir a prejudicar a coletividade.
Pois, “quando o Poder Público interfere na órbita do interesse privado para
salvaguardar o interesse público, restringindo direitos individuais, atua no exercício do
poder de polícia”, ensina Carvalho Filho (2009, p. 71).
Cunha Júnior (2008) afirma que o poder de polícia tem origem na segunda
metade do século XVIII, quando os cidadãos conquistaram seus primeiros direitos
individuais, afastando assim, parte da opressão imposta pelo Estado. A Revolução
Industrial teve grande colaboração na conquista desses primeiros direitos.
Um conceito simples, porém, completo, de Poder de Polícia da Administração
Pública foi emitido pelo professor Carvalho Filho (2009, p. 73):
[...] entendemos que se possa conceituar o poder de polícia como a
prerrogativa de direito público que, calcada na lei, autoriza a
Administração Pública a restringir o uso e o gozo da liberdade e da
propriedade em favor do interesse da coletividade. [destaque do autor]
Atualmente, a Constituição da República (1988) traz expressos, principalmente
no seu artigo 5º, os principais direitos e garantias individuais e coletivos do cidadão.
Mas, apesar de estarem petrificados em nossa CR, os direitos e garantias não são
absolutos, podendo o poder público restringir o seu uso de acordo o interesse maior.
17
Destaca o professor Cunha Júnior (2008) que ao Estado é autorizado apenas
restringir o exercício dos direitos individuais, mas jamais poderá extinguir ou anular
qualquer desses direitos. E ainda assim, entende-se que essa restrição só é lícita
quando aplicada com vistas ao bem da coletividade ou da própria administração.
Igualmente lembra Gasparini (2009, p. 126) que: “O exercício desses direitos
[...] não é ilimitado. Ao contrário, deve ser compatível com o bem-estar social ou com
o próprio interesse do Poder Público, não podendo, assim, constituir obstáculo à
realização dos objetivos do Estado ou da sociedade”.
Há de se destacar que, em decorrência desse poder do Estado de intervir nas
ações do administrado, os direitos e garantias do cidadão deixam de ser absolutos e
tornam-se relativos, como explicado abaixo:
Com base nisto, pode-se dizer que os direitos e garantias individuais
supracitados não são absolutos, mas sim relativos; pois, se o seu exercício
individual estiver colidindo com o ordenamento jurídico em vigor, o Estado
poderá intervir. Mas essa intervenção estatal não é discricionária, ela está
vinculada aos atos individuais nocivos aos demais membros da sociedade.
(ANDRADE, 2013, p. 18)
“O poder de polícia é uma faculdade de que dispõe o Estado de condicionar e
restringir os bens, as atividades e os direitos individuais, visando ajustá-los aos
interesses da coletividade”, afirma Meirelles citado por Cunha Júnior (2008, p. 80). Em
que pese o autor ter usado o termo “faculdade” neste texto, pode-se entender que a
ação do Estado está vinculada à necessidade de intervenção na vida do administrado.
No que se refere ao alcance dessa interferência da Administração Pública na
vida do cidadão, os doutrinadores são unânimes em afirmar que: “As limitações, os
condicionamentos, as restrições incidem sobre a liberdade e a propriedade, não sobre
os respectivos direitos” (GASPARINI, 2009, p. 127); “O poder de polícia não incide
sobre o direito, mas sim sobre o seu exercício. Não limita o direito de liberdade ou o
direito de propriedade, mas a liberdade ou a propriedade” (CUNHA JÚNIOR, 2008, p.
81). [destaque do autor]
No direito positivo pátrio o poder de polícia está conceituado no artigo 78 do
Código Tributário Nacional (CTN), in verbis:
18
Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que,
limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de
ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à
segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do
mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão
ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à
propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. [destaque meu]
Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando
desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com
observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha
como discricionária, sem abuso ou desvio de poder. [destaque meu]
Por meio deste conceito trazido pelo CTN, Andrade (2013, p. 19) conclui:
[...] o Estado só pode intervir na individualidade do cidadão quando houver
interesse coletivo. E, para se efetivar esta intervenção, torna-se
imprescindível a competência legal do órgão detentor do poder de polícia e
que este seja exercido nos limites da lei.
Assim, considerando o princípio da intervenção mínima, pode-se encerrar
afirmando que o Poder de Polícia da Administração Pública é imprescindível para que
o Estado consiga obter os resultados do qual se espera. Contudo, esse poder não
pode ser aplicado de maneira arbitrária e nem tampouco de acordo com a vontade
pessoal do agente público, faz-se necessário um anseio coletivo ou o descumprimento
de norma legal por parte do coagido.
2.3.2 Objeto do Poder de Polícia
O objeto do Poder de Polícia pode ser entendido como toda ação ou omissão
praticadas pelo administrado, que carece de um determinado controle por parte da
administração pública para que não venha a ferir os direitos de terceiros.
Igualmente Teixeira (2012, p. 20) entende como objeto do poder de polícia:
“todo direito, bem ou atividade individual que possa prejudicar a sociedade, havendo
assim a necessidade de controle pela Administração Pública”.
Em outras palavras ensina Meirelles (2004, p. 131):
O objeto do poder de polícia administrativa é todo o bem, direito ou atividade
individual que possa afetar a coletividade ou pôr em risco a segurança
19
nacional, exigindo, por isso mesmo, regulamentação, controle e contenção
do Poder Público. [destaque do autor]
E ainda no mesmo sentido, percebe-se que o objeto do Poder de Polícia
obrigatoriamente tem que ser lícito, moral e possível:
O objeto há de ser lícito, isto é, o resultado pretendido dever ser aceito pelo
ordenamento, porque pautado na lei; moral – conforme a [sic] princípios
éticos e todas as regras de conduta extraídas da disciplina geral da
Administração; possível – referente a algo realizável de fato e de direito.
(MEDAUAR, 2009, p. 140) [destaque do autor]
“O objeto é [...] a liberdade e a propriedade dos administrados, sem alcançar
os respectivos direitos. Aquela, no que respeita ao seu exercício; está no que se
relaciona com o uso, gozo e disposição”, é a tese de Gasparini (2009, p. 129).
2.3.3 Finalidade do Poder de Polícia
A finalidade do Poder de Polícia Administrativa está diretamente ligada à
normalidade do uso e gozo dos direitos pelos cidadãos. Havendo eventual excesso
que poderia trazer transtorno à administração ou ao terceiro administrado, faz-se
necessária a intervenção estatal, que se efetiva por meio desse poder.
Meirelles (2004, p. 132) explica com minúcias a finalidade do poder de polícia:
A finalidade do poder de polícia [...] é a proteção ao interesse público no seu
sentido mais amplo. Nesse interesse superior da comunidade entram não só
os valores materiais como, também, o patrimônio moral e espiritual do povo,
expresso na tradição, nas instituições e nas aspirações nacionais da maioria
que sustenta o regime político adotado e consagrado na Constituição e na
ordem jurídica vigente.
O Professor Gasparini (2009, p. 129) complementa afirmando que o interesse
particular jamais pode se sobrepor ao interesse coletivo ou público:
O uso, gozo e disposição da propriedade e o exercício da liberdade não
podem impedir a realização do interesse público nem o pleno alcance do
bem-estar social. Destina-se a polícia administrativa a prevenir o surgimento
(quando ainda não aconteceu) de atividades particulares nocivas aos
interesses sociais ou públicos ou a obstar (paralisar, impedir) seu
desenvolvimento. Estes os seus fins.
20
O poder de polícia tem por finalidade “[...] propiciar a convivência social mais
harmoniosa possível, para evitar ou atenuar conflitos no exercício dos direitos e
atividades dos indivíduos entre si e ante o interesse de toda a população”, leciona
Medauar (2009, p. 346). Esta é a adoção da teoria da intervenção mínima, um dos
princípios basilares da relação administração – administrado.
Entretanto, havendo conflito entre o interesse individual e o coletivo, não há
dúvidas de que o Estado deverá intervir visando satisfazer o interesse da maioria. Esta
é a tese sustentada por Viegas (2012):
Vale trazer à baila a existência do princípio da supremacia do interesse
público, o qual informa todo o Direito Administrativo direcionando as condutas
dos agentes. Ocorre que, no âmbito das relações sociais, vão surgir conflitos
entre o interesse público e o interesse privado, de forma que, ocorrendo esse
conflito, há de prevalecer o interesse público, isto é, aquele que atende um
maior número de pessoas.
Concluindo, Teixeira (2012) resume a finalidade do poder de polícia como
sendo o intuito da Administração Pública de resguardar o interesse público, ou seja,
da coletividade em detrimento do particular.
Cabe salientar que, se a intervenção estatal trouxer algum prejuízo ao
particular, como perda patrimonial definitiva, por exemplo, ele deverá ser ressarcido
dos valores correspondentes. Isto porque, como foi dito, o Estado não pode extinguir
o direito do cidadão, mas tão somente limitar o seu direito de uso.
2.3.4 Fundamento do Poder de Polícia
O Poder de Polícia se fundamenta na manutenção da soberania dos interesses
da coletividade em relação ao indivíduo. Gasparini (2009, p. 127) afirma que o Poder
de Polícia tem fundamento na supremacia da Administração Pública em relação aos
interesses individuais:
O fundamento da atribuição de polícia administrativa está centrado num
vínculo geral, existente entre a Administração Pública e os administrados, que
autoriza o condicionamento do uso, gozo e disposição da propriedade e do
exercício da liberdade em benefício do interesse público ou social. Alguns
autores chamam-no de supremacia geral da Administração Pública em
relação aos administrados. [destaque do autor]
21
É do mesmo entendimento Mello (2009, p. 826), que ensina:
O poder, pois, que a Administração exerce ao desempenhar seus encargos
de polícia administrativa repousa nesta, assim chamada, ‘supremacia geral’,
que, no fundo, não é senão a própria supremacia das leis em geral,
concretizadas através de atos da Administração. [destaque do autor]
Há ainda o professor Meirelles (2004, p. 130-131), afirmando que:
[...] seu fundamento está na supremacia geral que o Estado exerce em seu
território sobre todas as pessoas, bens e atividades, supremacia que se
revela nos mandamentos constitucionais e nas normas de ordem pública, que
a cada passo opõem condicionamentos e restrições aos direitos individuais
em favor da coletividade, incumbindo ao Poder Público o seu policiamento
administrativo.
2.3.5 Características do Poder de Polícia
O Poder de Polícia Administrativa possui certas características que viabilizam
a sua aplicação de modo efetivo. Teixeira (2012, p. 22) ensina que “o poder de polícia
administrativo tem atributos próprios e específicos ao exercício e à sua validade, tais
como a discricionariedade, a auto-executoriedade [sic], a coercibilidade e a tipicidade”.
Diante disso, necessário se faz definir, ainda que sucintamente, estas
características do Poder de Polícia. Destaca-se dentre elas a discricionariedade, que
ganhará tópico especial mais adiante neste estudo.
Passe-se, então, a definir os demais atributos do Poder de Polícia.
A autoexecutoriedade pode-se conceituar como sendo a desnecessidade de
qualquer autorização formal para que a Administração Pública exerça seus trabalhos
e tome suas decisões. Corroborando com este entendimento, Teixeira (2012, p. 24),
cintando Carlin, ensina que a autoexecutoriedade:
[...] o poder que a Administração tem de executar suas decisões sem
consentimento prévio, lançando mão de meios próprios para executar o ato,
considerando-se a proporcionalidade, o que significa a exigência de uma
relação de limites entre o direito individual e o prejuízo a ser evitado.
Também Maffini, citado por Teixeira (2012, p. 24), explica assim: “[...] o poder
de polícia é concretizável independentemente de qualquer participação (autorização,
22
permissão, deferimento etc.) do Poder Judiciário ou de qualquer outro órgão estatal
que não seja a própria Administração Pública".
Igualmente, outro professor comunga com a ideia de que o Estado prescinde
de autorização para exigir do seu cidadão a moldagem de sua conduta de acordo com
as normas legais editadas pelo primeiro:
A Administração Pública pode promover, por seus próprios meios, humanos
e materiais, a submissão do administrado às determinações editadas, para
vê-lo conformado à legislação a que deve obediência, sem necessidade de
recorrer a qualquer outro poder. (GASPARINI, 2009, p. 134)
E conclui Meirelles (2004, p. 135) com outras palavras: “Destarte, para garantir
a proteção dos administrados, a Administração pode efetuar diretamente os atos de
seu poder de polícia sem necessitar da autorização de outro poder”.
Quanto à coercibilidade, está ligada de certa forma ao uso da força estatal
sobre o administrado até que sua conduta se enquadre no que disciplina as normas
vigentes. Explica Mello (2009, p. 836) que se trata da “utilização de meios coativos
por parte da Administração Pública, conforme o indicado, é uma necessidade imposta
em nome da defesa dos interesses públicos”.
Meirelles (2004, p. 136) vai mais além ao afirmar:
A coercibilidade, isto é, a imposição coativa das medidas adotadas pela
Administração, constitui também atributo do poder de polícia. Realmente,
todo ato de polícia é imperativo (obrigatório para seu destinatário), admitindo
até o emprego da força pública para seu cumprimento, quando resistido pelo
administrado.
A Administração Pública pode utilizar a força para com seus administrados,
mas que essa força deve ser estritamente proporcional à resistência encontrada, sob
pena de se cometer um abuso por parte da autoridade. Assim leciona Maffini citado
por Teixeira (2012, p. 25):
Além disso, se os policiados opuserem indevida resistência à atuação de
polícia administrativa, poderá a Administração Pública valer-se de força
pública, para a efetivação das medidas cabíveis, desde que sejam tais
mecanismos de força pública legalmente previstos e proporcionais à
23
resistência que buscam ultrapassar. Não se admite, por certo, qualquer
manifestação de violência gratuita, mesmo que em nome do interesse público
inerente ao poder de polícia.
Por fim, o atributo da coercibilidade do poder de polícia é indispensável para a
Administração Pública, já que esta pode e deve atuar com autoridade protegendo o
interesse público em detrimento do particular, conclui Teixeira (2012).
No que se refere à tipicidade, toda ação da Administração Pública deve estar
amparada na norma legal, pois não basta a ela fazer o que a lei não proíbe, é
necessário que sua conduta seja legalmente autorizada. Ensina Di Pietro (2010, p.
201) que “é o atributo pelo qual o ato administrativo deve corresponder a figuras
definidas previamente pela lei como aptas a produzir determinados resultados”.
“Moraes elucida que se trata de atributo [...] absolutamente necessário em
um Estado de Direito, uma vez que se refuta a possibilidade de a
Administração Pública praticar atos administrativos inominados, em
desrespeito ao princípio da legalidade, e, consequentemente, obrigar os
administrados a cumpri-los, em função dos atributos da imperatividade e
executoriedade”. (TEIXEIRA, 2012, p. 25)
Esta característica do Poder de Polícia traz segurança jurídica aos
administrados, uma vez que é vedado à administração executar qualquer ato sem que
haja expressa previsão legal. Detalhadamente, Teixeira (2012, p. 25) afirma que:
Alexandrino e Paulo mencionam que Di Pietro aponta duas consequências
decorrentes de atributo:
a) representa uma garantia para o administrado, pois impede que a
Administração pratique ato unilateral e coercitivo, sem prévia previsão;
b) afasta a possibilidade de ser praticado ato totalmente discricionário, pois a
lei, ao prever o ato, já define os limites em que a discricionariedade poderá
ser exercida.
E Mazza, aludido por Teixeira (2012, p. 25), conclui: “Trata-se, portanto, de uma
derivação do princípio da legalidade, impedindo a Administração Pública de praticar
atos atípicos ou inominados”. Qualquer ato público praticado sem uma previsão legal
anterior é nulo, resguardado o direito do cidadão atingido por ele de buscar junto ao
poder público uma reparação pelos danos eventualmente sofridos.
24
2.3.6 Vinculação do Poder de Polícia
O Poder de Polícia apresenta-se como um poder-dever, pois a quase totalidade
de sua aplicação está vinculada à obediência às normas que o permeiam. Pode-se
dizer que há uma parcela mínima de discricionariedade na atuação do agente,
conforme será exposto em tópico posterior.
Ensina Teixeira (2012, p. 46) que “O Poder vinculado é aquele exercido pelo
agente público impondo-lhe o dever de praticar o ato, o qual tem previsão legal”; e
completa citando Medauar: “Há poder vinculado, também denominado competência
vinculada, quando a autoridade, ante determinada circunstância, é obrigada a tomar
decisão determinada, pois sua conduta é ditada previamente pela norma jurídica”.
A omissão no atendimento de qualquer requisito legal na aplicação do Poder
de Polícia torna o ato jurídico nulo. É isto que explica Meirelles (2004, p. 115):
Nessa categoria de atos administrativos a liberdade de ação do administrador
é mínima, pois terá que ater à enumeração minuciosa do Direito Positivo para
realizá-los eficazmente. Deixando de atender a qualquer dado expresso na
lei, o ato é nulo, por desvinculado de seu tipo-padrão.
Apesar de alguns doutrinadores usarem a palavra “faculdade” para conceituar
o poder de polícia, destaca Cunha Júnior (2008) que ele não é uma faculdade da
administração pública, mas sim um dever, um poder-dever, que o Estado não pode
renunciar ou transigir.
Gasparini (2009) chama a atenção ao enfatizar que esses poderes
administrativos são deveres-poderes e vinculam a atuação do agente público
proporcionalmente às normas previstas no ordenamento jurídico, repudiando qualquer
tipo de excesso da parte do Estado.
De acordo ainda com Teixeira (2012, p. 23), fazendo alusão a Maffini, “[...] a
concretização do poder de polícia será vinculada ou discricionária dependendo tão-
somente [sic] da regra legal de atribuição de competência”. Nesse caso, a autora se
refere às normas legais que abrem uma certa brecha para a que o agente atue com
mais liberdade, dispondo de uma certa discricionariedade.
25
Tem-se também que há normas originalmente vinculadas e outras
discricionárias, como se percebe nos exemplos a seguir. Porém, até mesmo as leis
ditas discricionárias contêm vinculação em seu bojo:
A atividade de polícia ora é discricionária, a exemplo do que ocorre quando a
Administração Pública outorga a alguém autorização para portar arma de
fogo, ora é vinculada, nos moldes do que aconteceu quando a Administração
Pública licencia uma construção (alvará ou licença de construção).
(GASPARINI, 2009, p. 131)
E continua o professor aprofundando sua lição sobre poder vinculado e poder
discricionário:
A lei prescreve em princípio, se, quando e como deve a Administração
Pública agir ou decidir. A vontade da lei só estará satisfeita com esse
comportamento, já que não permite à Administração Pública qualquer outro.
Esses atos decorrem do exercício de uma atribuição vinculada ou, como
prefere boa parte dos autores, do desempenho do poder vinculado, em cuja
prática a Administração Pública não tem qualquer margem de liberdade.
(GASPARINI, 2009, p. 96) [destaque do autor]
Teixeira (2012, p. 47) destaca o entendimento do egrégio Tribunal de Justiça
do Rio Grande do Sul sobre o poder vinculado da Administração Pública:
APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO
POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. RENOVAÇÃO DE CARTEIRA
NACIONAL DE HABILITAÇÃO. REBAIXAMENTO DA CATEGORIA E PARA
B. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. ATO ADMINISTRATIVO
VINCULADO. LEGALIDADE. CONDUTA LÍCITA DO AGENTE PÚBLICO. 1.
RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. O sistema jurídico brasileiro
adota a responsabilidade patrimonial objetiva do Estado e das prestadoras
de serviço público sob a forma da Teoria do Risco Administrativo. Tal
assertiva encontra respaldo legal no art. 37, § 6º, da CF. 2. AUSÊNCIA DE
ATO ILÍCITO. 2.1 Em primeiro lugar, ao que se verifica dos documentos
acostados aos autos, não resta comprovado que o réu agira de forma culposa
ou que teria sido influenciado pelo diagnóstico feito quando do deferimento
do benefício previdenciário por invalidez para alterar a categoria da CNH do
autor. Pelo contrário, segundo os documentos das fls. 38-39, o autor fora
encaminhado pelo médico, ora réu, à Junta Médica do DETRAN em
27/07/2001 (com amparo na Resolução nº. 80/98 do CONTRAN) e essa Junta
Médica, mediante exame em 28/08/2001, concluiu que o autor não estaria
26
mais apto a dirigir automóveis correspondentes à categoria E, mas apenas,
aqueles referentes à categoria B, a teor do disposto no art. 143 do Código de
Trânsito Brasileiro. 2.2 Ora, nesse contexto, o que se verifica é que, dentro
dos preceitos legais que regem a matéria, ex vi dos artigos 147, § 2º e 159, §
11, ambos do Código de Trânsito Brasileiro, a Administração Pública
procedeu à aferição da capacidade do autor para dirigir veículos em que a
unidade tratora se enquadre nas Categorias B, C ou D e cuja unidade
acoplada, reboque, semi-reboque [sic] ou articulada, tenha seis mil
quilogramas ou mais de peso bruto total, ou cuja lotação exceda a oito
lugares, ou, ainda, seja enquadrado na categoria trailer. Em outras palavras,
a expedição da Carteira Nacional de Habilitação, ainda que essa seja um
direito conferido aos cidadãos, sujeita-se ao cumprimento dos requisitos pelo
administrado constituindo-se na modalidade de ato administrativo vinculado.
De forma que, se for desatendido algum dos requisitos, a própria eficácia do
ato fica comprometida, impondo a sua anulação pela Administração, ou pelo
Poder Judiciário (mediante provocação). 2.3 Por conseguinte, o órgão público
agiu dentro dos estritos limites da legalidade, seguindo orientação constante
do art. 147, § 2º, do CTB, dispositivo que prevê a realização de exame de
aptidão física e mental de cinco em cinco anos para a renovação da licença
para dirigir, não havendo, pois, qualquer ilegalidade no ato praticado
(rebaixamento da categoria E para B). APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação
Cível Nº 70027224617, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS,
Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 25/03/2009). Disponível em:
www.tjrs.jus.br. Acesso em: 18/05/2012.
Di Pietro (2010, p. 212) conclui: “Nessa esteira, o poder da Administração é
vinculado, visto que a lei não confere escolha ao administrador, mas sim estabelece
através da lei, a forma que a administração deve agir”.
No entanto, Alexandrino e Vicente mencionados por Teixeira (2012, p. 47-48)
defendem outro ponto de vista:
A expressão poder vinculado não é a mais apropriada, visto que quando se
realiza um ato vinculado ou se observa os elementos vinculados de um ato
discricionário, não se está exercendo uma prerrogativa, a administração está
cumprindo um dever.
Assegura o professor Carvalho Filho (2009, p. 49) que a atuação vinculada
reflete uma imposição ao administrador, obrigando-o a conduzir-se rigorosamente em
conformidade com parâmetros legais. Em suma é possível dizer que o Poder de
27
Polícia é por sua natureza vinculado, não deixando margem para que o administrador
atue como lhe convier, mas que certas normas detêm uma dose de discricionariedade,
por meio da qual o agente público tem a liberdade de agir, desde que o faça escorado
nos institutos da conveniência e da oportunidade.
2.3.7 Discricionariedade do Poder de Polícia
Deve-se estudar com muita cautela a discricionariedade aplicada ao Poder de
Polícia, pois, em uma análise superficial, pode-se acreditar que ela é nata à função do
agente público, o que é uma inverdade. Afirma Meirelles (2004, p. 116-117) que “a
discricionariedade é a liberdade de atuação administrativa, no âmbito em que a lei lhe
atribua essa faculdade”.
Com intuito de evitar essa interpretação errônea, o professor Carvalho Filho
(2009, p. 47) esclarece:
A lei não é capaz de traçar rigidamente todas as condutas de um agente
administrativo. Ainda que procure definir alguns elementos que lhe restringem
a atuação, o certo é que em várias situações a própria lei lhes oferece
possibilidade de valoração de conduta. Nesses casos, pode o agente avaliar
a conveniência e a oportunidade dos atos que vai praticar na qualidade de
administrador dos interesses coletivos. [destaque do autor]
Contribui Medauar citada por Teixeira (2012, p. 48): “o poder discricionário,
caracterizado essencialmente como escolha de uma entre várias soluções, é
conferido por normas legais e deve atender a parâmetros no seu exercício”.
Assim, ensina Gasparini (2009) que a discricionariedade ou atribuição
discricionária, como preferem alguns, pode ser determinada através da lei que admite
certa liberdade à Administração Pública para decidir sobre cada caso concreto.
É importante destacar a posição do Tribunal de Justiça de Santa Catarina,
citado por Teixeira (2012, p. 48-49):
DIREITO ADMINISTRATIVO - SISTEMA VIÁRIO URBANO – LIMITAÇÃO AO
TRÂNSITO DE VEÍCULOS PESADOS - PREJUÍZO A EMPRESA QUE
EXPLORA POSTO DE REVENDA DE COMBUSTÍVEL – DECISÃO
JUDICIAL QUE IMPÕE A SUSPENSÃO DAS OBRAS - AGRAVO DE
INSTRUMENTO – RECURSO PROVIDO 01. "Em favor dos atos
28
administrativos milita presunção de legitimidade (Celso Antônio Bandeira de
Mello, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Hely Lopes Meirelles); supõe-se que 'as
decisões da administração são editadas com o pressuposto de que estão
conformes às normas legais e de que seu conteúdo é verdadeiro' (Odete
Medauar)" (ACMS n. 2008.038594-0, Des. Newton Trisotto). 02. "O ato
administrativo discricionário submete-se ao controle judicial, 'pois só a Justiça
poderá dizer da legalidade da invocada discricionariedade e dos limites de
opção do agente administrativo. O que o Judiciário não pode é, no ato
discricionário, substituir o discricionarismo do administrador pelo do juiz. Mas
pode sempre proclamar as nulidades e coibir os abusos da Administração'
(Hely Lopes Meirelles)" (ACMS n. 2006.039019-6, Des. Newton Trisotto).
(Agravo de Instrumento n. 2011.005138-6, Primeira Câmara de Direito
Público, Juiz Prolator: Jeferson Osvaldo Vieira Julgado em: 08/09/2011).
Disponível em: www.tjsc.jus.br. Acesso: 18/05/2012.
Carvalho Filho (2009, p. 48) chama a atenção para um ponto crucial nesse
estudo, que é o uso ilimitado da discricionariedade, conduta esta que não encontra
nenhum amparo legal:
Ocorre que algumas vezes o agente, a pretexto de agir discricionariamente,
se conduz fora dos limites da lei ou em direta ofensa a esta. Aqui comete
arbitrariedade, conduta ilegítima e suscetível de controle de legalidade.
Neste ponto se situa a linha diferencial entre ambas, não há
discricionariedade contra legem. [destaque do autor]
No mesmo sentido, Di Pietro (2010, p. 212) dispõe: “[...] a discricionariedade
implica liberdade de atuação nos limites traçados pela lei; se a Administração
ultrapassa esses limites, a sua decisão passa a ser arbitrária, ou seja, contrária à lei”.
Meirelles (2004, p. 103) ratifica que “é esse poder que empresta a autoridade
ao agente público quando recebe da lei competência decisória e força para impor suas
decisões aos administrados”.
E continua Meirelles (2004, p. 134) dizendo que “[...] o ato de polícia é, em
princípio, discricionário, mas passará a ser vinculado se a norma legal que o rege
estabelecer o modo e forma de sua realização”.
29
Desse modo, “o certo, então, é dizer que tal atribuição [poder de polícia] se
efetiva por atos administrativos expedidos através do exercício de uma competência
às vezes vinculada, às vezes discricionária”, conclui (GASPARINI, 2009, p. 131).
Por fim, é possível dizer que há apenas um liame dividindo o uso lícito da
discricionariedade da omissão ou uso arbitrário do poder por parte do agente público.
Em regra, o Poder de Polícia é vinculado e para a sua legítima aplicação é necessário
o cumprimento das elementares que a própria norma trouxer. Quando a lei facultar ao
agente a tomada de determinada decisão, esta deve ser decidida com base na
conveniência e oportunidade, jamais de acordo com a vontade pessoal do servidor.
2.3.8 Sanção do Poder de Polícia
A sanção nada mais é do que a consequência do uso do Poder de Polícia. Ela
acarreta uma certa punição ao administrado pelo não cumprimento de determinada
norma. Chega-se até a sanção por meio da fiscalização das condutas do cidadão.
“Sanção administrativa é o ato punitivo que o ordenamento jurídico prevê como
resultado de uma infração administrativa, suscetível de ser aplicado por órgãos da
Administração”, ensina Oliveira citado por Carvalho Filho (2009, p. 88).
O professor Carvalho Filho (2009, p. 88) ensina que “as sanções espelham a
atividade repressiva decorrente do poder de polícia. Estão elas difundidas nas
diversas leis que disciplinam atividades sujeitas a esse poder”. E Justen, citado por
Teixeira (2012, p. 26), resume que a “a sanção administrativa pode ser considerada
como manifestação do poder de polícia”.
Temos abaixo alguns exemplos de sanções administrativas, aplicadas ao
cidadão pelo Estado por meio de agentes devidamente credenciados, no uso do seu
Poder de Polícia Administrativa:
As sanções do poder de polícia, como elemento de coação e intimidação,
principiam, geralmente, com a multa e se escalonam em penalidades mais
graves como a interdição de atividade, o fechamento de estabelecimento, a
demolição de construção, o embargo administrativo de obra, a destruição de
objetos, a inutilização de gêneros, a proibição de fabricação ou comércio em
determinadas zonas e tudo o mais que houver de ser impedido em defesa da
moral, da saúde, e da segurança pública, bem como da segurança nacional,
30
desde que estabelecido em lei ou regulamento. (MEIRELLES, 2004, p. 137-
138) [grifo meu]
O descumprimento de obrigações legais por parte do administrado gera a ele
uma sanção administrativa, como assevera Medauar (2009, p. 349):
As medidas resultantes do poder de polícia exigem observância por parte dos
sujeitos a que impõe restrições em seus direitos: tais medidas podem implicar
obrigações de fazer ou de se abster. O descumprimento de tais prescrições
enseja, para o agente, a possibilidade de impor sanções.
Cabe ressaltar que, “[...] se o ato sancionatório de polícia não tiver propiciado
ao infrator a oportunidade de rechaçar a acusação e de produzir as provas
necessárias às suas alegações, estará contaminado de vício de legalidade, devendo
ser corrigido na via administrativa ou judicial”. (CARVALHO FILHO, 2009, p. 89)
Especialmente no que se refere à multa de Trânsito, Carvalho Filho (2009)
menciona uma decisão do Superior Tribunal de Justiça, que afirmou ser
indispensável ao devido processo administrativo a notificação da autuação e
da aplicação da sanção decorrentes da infração cometida pelo condutor do
veículo, proporcionando a este o direito ao contraditório e,
consequentemente, à ampla defesa. No entanto, salienta-se que, se o
motorista for pego em flagrante no cometimento da infração, torna-se
desnecessária a notificação da autuação, podendo ele promover sua defesa
desde o momento do flagrante. (ANDRADE, 2013, p. 34).
À primeira vista pode-se pensar que a multa de trânsito fere os direitos à ampla
defesa e ao contraditório porque, ao ser flagrado pelo Agente de Trânsito, o condutor
é autuado sem nem fazer sua defesa. Porém, o Agente de Trânsito confecciona o
Auto de Infração de Trânsito (AIT), que se transforma posteriormente em Notificação
da Autuação (NA) e Notificação da Penalidade (NP) em um segundo momento.
A partir da confecção do AIT o condutor ou proprietário do veículo passam a ter
o direito à ampla defesa e ao contraditório, podendo exercê-los junto à autoridade de
trânsito com circunscrição sobre a via onde foi autuado. Ressalta-se que o infrator terá
o prazo necessário ao exercício de suas faculdades recursais, só não podendo
exercê-lo junto ao agente autuador, pois este está vinculado à lavratura do AIT ao se
deparar com uma infração de trânsito.
31
2.4 A Legislação de Trânsito no Brasil
Após definir o Poder de Polícia da Administração Pública e apresentar as suas
principais características, agora se discorrerá especificamente sobre o Poder de
Polícia Administrativa de Trânsito.
Porém, antes de prosseguir, para que se possa analisar com profundidade o
uso do Poder de Polícia de Trânsito, é importante fazer uma breve síntese sobre a
legislação de trânsito no Brasil.
O artigo 1º do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) define:
Art. 1º [...]
§ 1º Considera-se trânsito a utilização das vias por pessoas, veículos e
animais, isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação,
parada, estacionamento e operação de carga ou descarga.
§ 2º O trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos
órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes
cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas
destinadas a assegurar esse direito. (BRASIL, 1997)
O atual Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é considerado uma das normas
mais completas e restritivas do mundo, principalmente no que se refere à embriaguez
ao volante. No entanto, ainda assim o Brasil ocupa há anos a vergonhosa quinta
colocação entre os países com maior número de pessoas mortas em acidentes
veiculares.
Antes de pormenorizar o estudo da legislação de trânsito vigente, é conveniente
fazer uma síntese da evolução dessa norma no Brasil. Os primeiros veículos
automotores de que se tem conhecimento chegaram na Bahia no ano de 1871 e eram
movidos à vapor. Somente em 1891 chegou o primeiro carro à combustão e, assim,
iniciou-se a formação da frota automotiva brasileira, que vem crescendo
significativamente.
Quanto à legislação, o primeiro registro encontrado de uma lei de trânsito no
Brasil é datado de 1910, cujo objetivo da norma era exigir dos motoristas a redução
32
da velocidade para evitar a ocorrência de acidentes, principalmente envolvendo os
inúmeros veículos ainda tracionados por animais.
No ano de 1927, já com muitos automóveis e ônibus em circulação, a União
criou o primeiro imposto veicular, que era um tipo de fundo para a manutenção das
estradas. Todos os veículos automotores tinham a obrigação de contribuir para esse
fundo. Desde então passou-se a cobrar o que hoje conhecemos por Imposto sobre a
Propriedade de Veículo Automotor (IPVA), com a diferença de que atualmente a
arrecadação é feitas pelos Estados e pelo Distrito Federal.
Em 1928 o Brasil adotou uma legislação de trânsito baseada em normas
internacionais, com previsão de emplacamento dos veículos e multas para os que
desobedecem às normas de circulação. Porém, somente no ano de 1941 surgiu o
primeiro Código Nacional de Trânsito (CNT), que transferiu aos Estados a
responsabilidade para com o trânsito.
O primeiro CNT foi retificado em 1966, quando passou a possuir 131 artigos,
criou o Registro Nacional de Veículos Automotores (RENAVAM) e instituiu a Junta
Administrativa de Recursos de Infração (JARI) devido ao grande número de
contestações de multas. No ano de 1968 o CNT foi novamente retificado e trouxe em
seu bojo 264 artigos e 8 anexos. As principais alterações foram a regulamentação da
concessão de linhas de transporte coletivo e a exigência da colocação de taxímetros
nos automóveis de aluguel.
No período de 1993 a 1997 foi criado e discutido o projeto do que seria o atual
CTB. Embates técnicos e políticos retardaram a aprovação da nova norma, que foi
publicada em 23 de setembro de 1997 e trouxe consideráveis inovações, como a
transferência da competência sobre o trânsito nas cidades aos respectivos municípios,
por exemplo, exigindo deles o cumprimento de certos requisitos, que serão objeto de
estudo oportunamente.
Como mencionado, o atual CTB é considerado uma lei exemplar a nível
mundial, mas especialistas têm defendido a edição de um novo código que venha a
incluir as normas infra legais complementares e regulamentadoras – como resoluções,
deliberações e portarias – publicadas principalmente pelo Conselho Nacional de
Trânsito (CONTRAN). Ressalta-se que o CONTRAN já publicou mais de 570
33
resoluções regulamentando a legislação, motivo pelo qual o CTB tem sido alvo de
muitas críticas.
2.4.1 O Sistema Nacional de Trânsito
O CTB inovou a legislação de trânsito de tal modo que o Brasil passou a ser
considerado modelo nesse tema. Ao criar um sistema complexo, mas com a divisão
de responsabilidades entre os diversos órgãos e autoridades, o código conceitua o
Sistema Nacional de Trânsito (SNT) e define seus objetivos básicos:
Art. 5º O Sistema Nacional de Trânsito é o conjunto de órgãos e entidades da
União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que tem por
finalidade o exercício das atividades de planejamento, administração,
normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação,
habilitação e reciclagem de condutores, educação, engenharia, operação do
sistema viário, policiamento, fiscalização, julgamento de infrações e de
recursos e aplicação de penalidades. [destaque meu]
Art. 6º São objetivos básicos do Sistema Nacional de Trânsito:
I - estabelecer diretrizes da Política Nacional de Trânsito, com vistas à
segurança, à fluidez, ao conforto, à defesa ambiental e à educação para o
trânsito, e fiscalizar seu cumprimento;
II - fixar, mediante normas e procedimentos, a padronização de critérios
técnicos, financeiros e administrativos para a execução das atividades de
trânsito;
III - estabelecer a sistemática de fluxos permanentes de informações entre os
seus diversos órgãos e entidades, a fim de facilitar o processo decisório e a
integração do Sistema. (BRASIL, 1997)
Percebe-se que o CTB não excluiu nenhum ente federado da responsabilidade
pelo trânsito, ao contrário do revogado CNT, cujos municípios não integravam o SNT,
ou seja, não participavam do sistema, o que sobrecarregava sobremaneira os Estados
membros. A atual composição do SNT está expressa no artigo 7º do CTB:
Art. 7º Compõem o Sistema Nacional de Trânsito os seguintes órgãos e
entidades:
I - o Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, coordenador do Sistema e
órgão máximo normativo e consultivo; [grifo meu]
34
II - os Conselhos Estaduais de Trânsito - CETRAN e o Conselho de Trânsito
do Distrito Federal - CONTRANDIFE, órgãos normativos, consultivos e
coordenadores;
III - os órgãos e entidades executivos de trânsito da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios;
IV - os órgãos e entidades executivos rodoviários da União, dos Estados, do
Distrito Federal e dos Municípios;
V - a Polícia Rodoviária Federal;
VI - as Polícias Militares dos Estados e do Distrito Federal; e
VII - as Juntas Administrativas de Recursos de Infrações – JARI. (BRASIL,
1997)
Esses componentes do SNT são considerados Autoridades de Trânsito nas
suas respectivas circunscrições, conforme dispõe o Anexo I (Conceitos e Definições)
do CTB: “AUTORIDADE DE TRÂNSITO - dirigente máximo de órgão ou entidade
executivo integrante do Sistema Nacional de Trânsito ou pessoa por ele
expressamente credenciada”. (BRASIL, 1997).
2.4.2 Competência das Autoridades de Trânsito
Sobre as competências em matéria de trânsito, esclarece Favreto (2000, p.
155): “No exercício de sua competência privativa, a União conferiu atribuições
executivas e competências legislativas complementares sobre política de educação,
segurança e fiscalização de trânsito aos demais entes federados [...]”.
Quanto às competências gerais das autoridades, o CTB prevê o seguinte:
Art. 21. Compete aos órgãos e entidades executivos rodoviários da União,
dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, no âmbito de sua
circunscrição:
I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de
suas atribuições; [...]
VI - executar a fiscalização de trânsito, autuar, aplicar as penalidades de
advertência, por escrito, e ainda as multas e medidas administrativas
cabíveis, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar; [...]
35
Art. 256. A autoridade de trânsito, na esfera das competências estabelecidas
neste Código e dentro de sua circunscrição, deverá aplicar, às infrações nele
previstas, as seguintes penalidades:
I - advertência por escrito;
II - multa;
III - suspensão do direito de dirigir;
IV - apreensão do veículo;
V - cassação da Carteira Nacional de Habilitação;
VI - cassação da Permissão para Dirigir;
VII - frequência obrigatória em curso de reciclagem. (BRASIL, 1997)
Por meio dos artigos acima pode-se observar que as autoridades de trânsito
são várias e ocupam todos os níveis da Administração Pública, quais sejam: União,
Estados, Distrito Federal e Municípios; cada qual com responsabilidade sobre sua
circunscrição, sua área de atuação.
O alcance desse objetivo maior - segurança, fluidez, conforto e defesa da vida
pela educação no trânsito - exige uma atuação permanente e sistemática dos
órgãos e entidades que compõem o Sistema Nacional de Trânsito, visto que
este novo ordenamento jurídico distribuiu as regras de competência
entre os três entes federados, exigindo, assim, interpretação e aplicação
integrada para se obter melhor efetividade. (FAVRETO, 2000, p. 155)
[destaque meu]
A própria norma de trânsito trouxe expressa a responsabilidade de cada
componente do SNT. A seguir serão abordadas as principais competências das
autoridades de trânsito de acordo com sua circunscrição e os entes federados a que
pertencem.
A nível federal, dentre outras, temos como autoridade de trânsito a Polícia
Rodoviária Federal (PRF), à qual o CTB impõe as seguintes competências:
Art. 20. Compete à Polícia Rodoviária Federal, no âmbito das rodovias e
estradas federais:
36
I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de
suas atribuições;
II - realizar o patrulhamento ostensivo, executando operações relacionadas
com a segurança pública, com o objetivo de preservar a ordem, incolumidade
das pessoas, o patrimônio da União e o de terceiros;
III - aplicar e arrecadar as multas impostas por infrações de trânsito, as
medidas administrativas decorrentes e os valores provenientes de estada e
remoção de veículos, objetos, animais e escolta de veículos de cargas
superdimensionadas ou perigosas; [...] (BRASIL, 1997)
Pede-se vênia para abrir parênteses a fim de tratar da atual situação da Polícia
Rodoviária Federal (PRF). Em que pese ela ser uma autoridade integrante do SNT, a
PRF tem delegado às polícias militares estaduais, por meio de convênio com os
respectivos Estados, a competência para o patrulhamento e a fiscalização de trânsito
em diversas rodovias federais. Acredita-se que esta delegação se faz necessária
porque a PRF não dispõe de agentes suficientes para cumprir sua missão nos
milhares de quilômetros de rodovias federais existentes no país.
Prescinde dados estatísticos sobre esse assunto por não trazer reflexos diretos
ao resultado desse estudo, mas pode-se dizer que a PRF só não delega aos Estados
as principais rodovias do país, ou seja, aquelas que compõem grandes eixos de
ligação no território nacional e as fronteiriças.
Na esfera estadual, há diversos órgãos e entidades de trânsito, dentre eles, as
Polícias Militares, que podem atuar no trânsito mediante convênio com a autoridade
que detém a circunscrição sobre a via. Dispõe o CTB que:
Art. 22. Compete aos órgãos ou entidades executivos de trânsito dos Estados
e do Distrito Federal, no âmbito de sua circunscrição:
I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito das
respectivas atribuições; [...]
IV - estabelecer, em conjunto com as Polícias Militares, as diretrizes para o
policiamento ostensivo de trânsito;
V - executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas
administrativas cabíveis pelas infrações previstas neste Código, excetuadas
37
aquelas relacionadas nos incisos VI e VIII do art. 24, no exercício regular do
Poder de Polícia de Trânsito;
VI - aplicar as penalidades por infrações previstas neste Código, com exceção
daquelas relacionadas nos incisos VII e VIII do art. 24, notificando os
infratores e arrecadando as multas que aplicar; [...]
Art. 23. Compete às Polícias Militares dos Estados e do Distrito Federal: [...]
III - executar a fiscalização de trânsito, quando e conforme convênio
firmado, como agente do órgão ou entidade executivos de trânsito ou
executivos rodoviários, concomitantemente com os demais agentes
credenciados; (BRASIL, 1997) [destaque meu]
A norma em destaque não exige que o convênio de cooperação deve ser
firmado entre órgãos pertencentes aos mesmo ente federado, o que permite às
polícias militares dos Estados e do Distrito Federal assumirem o papel de Agentes de
Trânsito da PRF nas rodovias federais que lhe forem delegadas.
No âmbito municipal, as prefeituras podem criar seus órgãos de gerenciamento
e controle, mas para isto devem municipalizar o trânsito na área de sua circunscrição,
ou seja, é necessário que a administração municipal se integre ao SNT e cumpra
determinados requisitos, conforme prevê o CTB:
Art. 24. Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos
Municípios, no âmbito de sua circunscrição:
I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de
suas atribuições;
II - planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de
pedestres e de animais, e promover o desenvolvimento da circulação e da
segurança de ciclistas; [...]
V - estabelecer, em conjunto com os órgãos de polícia ostensiva de trânsito,
as diretrizes para o policiamento ostensivo de trânsito;
VI - executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas
administrativas cabíveis, por infrações de circulação, estacionamento e
parada previstas neste Código, no exercício regular do Poder de Polícia
de Trânsito; [destaque meu]
38
VII - aplicar as penalidades de advertência por escrito e multa, por infrações
de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, notificando
os infratores e arrecadando as multas que aplicar; [...] [destaque meu]
X - implantar, manter e operar sistema de estacionamento rotativo pago nas
vias; [...]
XVIII - conceder autorização para conduzir veículos de propulsão humana e
de tração animal; [...]
§ 2º Para exercer as competências estabelecidas neste artigo, os
Municípios deverão integrar-se ao Sistema Nacional de Trânsito,
conforme previsto no art. 333 deste Código. (BRASIL, 1997) [destaque meu]
Em suma, para que a prefeitura assuma o controle do trânsito no âmbito do
município, podendo autuar e receber o valor total das multas que aplicar, é necessário
que ela se integre ao SNT. Para conseguir isto, o poder municipal deve criar uma
secretaria ou departamento de trânsito com agentes devidamente treinados, requisitos
estes que dificultam ou até mesmo impedem a maioria dos municípios brasileiros de
efetivarem a municipalização do seu trânsito. Não o fazendo, a responsabilidade
continua com o Estado e o município recebe parte do valor das autuações aplicadas.
Nestes últimos tópicos buscou-se apresentar uma síntese da evolução da
legislação e o funcionamento do trânsito brasileiro, definindo as autoridades
integrantes do SNT e suas respectivas competências.
2.5 Poder de Polícia Administrativa de Trânsito
A legislação de trânsito brasileira é deveras complexa e carece de profundo
estudo para o seu completo entendimento. Contudo, acredita-se que o exposto até
agora é suficiente para que se passe a discutir o objeto principal deste trabalho, qual
seja: a aplicação do Poder de Polícia Administrativa de Trânsito.
“[...] O poder de polícia de trânsito tem por objetivo disciplinar, controlar e
fiscalizar o trânsito dos veículos em geral, coibindo a ocorrência de infrações de
trânsito, ora de forma preventiva ora de forma repressiva”, diz Teixeira (2012, p. 32).
Como já foi amplamente exposto, o Poder de Polícia faculta ao agente público
restringir de certa forma a aplicação dos direitos individuais do cidadão, sempre em
39
prol da coletividade ou do interesse público. Diante de tamanha responsabilidade ao
lidar com direitos constitucionalmente petrificados, não é conveniente que o
administrador público delegue o Poder de Polícia de Trânsito a qualquer pessoa, sob
pena haver abuso ou omissão na aplicação da norma. Assim, faz-se necessário que
a própria lei traga em seu bojo os legitimados a auferirem tal poder.
Conforme disposto no parágrafo 2º do artigo 280 do CTB, para que haja
legalidade na autuação de trânsito, a fiscalização deve ser exercida pela própria
autoridade ou por um agente devidamente autorizado pela autoridade com
circunscrição sobre a via: “Art. 280. [...] § 2º A infração deverá ser comprovada por
declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito [...]”. (BRASIL,
1997). [destaque meu]
O parágrafo 4º do mesmo artigo traz o rol dos legitimados à função de agente
da autoridade de trânsito:
“Art. 280. [...] § 4º O agente da autoridade de trânsito competente para lavrar
o auto de infração poderá ser servidor civil, estatutário ou celetista ou,
ainda, policial militar designado pela autoridade de trânsito com jurisdição
sobre a via no âmbito de sua competência.” (BRASIL, 1997) [destaque meu]
Buscando um aprofundamento na análise do dispositivo acima, Silva (2004)
apresenta a seguinte explicação:
O Código de Trânsito Brasileiro, por outro lado, estabelece em seu artigo 280,
§ 4º, que o Agente da Autoridade de Trânsito, para que possa efetivamente
exercer uma função de natureza fiscalizadora no tocante às atividades
inseridas na área operacional do trânsito, deverá ser designado pela
autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via no âmbito de sua
competência e, assim sendo, independe da condição de ser o mesmo Agente
um servidor civil, estatutário ou celetista ou policial militar.
Teixeira (2012, p. 36), citando Krigger, completa: “O agente [de trânsito]
competente, portanto, é aquele que além de ter a capacidade civil, possui ainda, a
atinente competência imposta por lei, tendo assim competência para o referido cargo
a que esteja designado”.
40
Observa-se que o CTB não estipulou o tipo de vínculo que o servidor deve ter
com a Administração Pública para que ele seja detentor do Poder de Polícia de
Trânsito. A preocupação do legislador foi no sentido de que o servidor seja formal e
legalmente investido como Agente da Autoridade de Trânsito antes de exercer o seu
papel como fiscal encarregado de aplicação da lei de trânsito.
Contribuindo com essa afirmação, Teixeira (2012, p. 22) mencionando Carlin,
conclui: “Assim sendo, o exercício do poder de polícia deve ter amparo legal, do qual
derivam seus limites, sobressaindo o direito ou interesse público em detrimento do
individual”.
2.5.1 Limites à Discricionariedade do Agente de Trânsito
Em que pese o Poder de Polícia possuir uma certa discricionariedade, como
exposto em tópico anterior, ele também está vinculado às normas legais que o
autorizam. Assim, a atribuição do Poder de Polícia de Trânsito está demarcada por
dois limites:
[...] o primeiro se encontra no pleno desempenho da atribuição, isto é, no
amplo interesse de impor limitações ao exercício da liberdade e ao uso, gozo
e disposição da propriedade; o segundo reside na observância dos direitos
assegurados aos administrados pelo ordenamento positivo. É na conciliação
da necessidade de limitar ou restringir o desfrute da liberdade individual e da
propriedade particular com os direitos fundamentais, reconhecidos a favor
dos administrados, que se encontram os limites dessa atribuição.
(GASPARINI, 2009, p. 132)
Segundo Di Pietro (2010, p. 122): “como todo ato da Administração Pública, o
Poder de Polícia não poderia ser diferente, ainda que seja discricionário, se confronta
com restrições estabelecidas pelo ordenamento jurídico”.
Os limites do poder de polícia administrativa são demarcados pelo interesse
social em conciliação com os direitos fundamentais do indivíduo assegurados
na Constituição da República (art. 5º). Do absolutismo individual evoluímos
para o relativismo social. Os Estados Democráticos, como o nosso, inspiram-
se nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana. Daí o
equilíbrio a ser procurado entre a fruição dos direitos de cada um e os
interesses da coletividade, em favor do bem comum. (MEIRELLES, 2004, p.
133) [destaque do autor]
41
Para Gasparini (2009, p. 132): “Assim, mesmo que a pretexto do exercício do
poder de polícia, não se podem aniquilar os [...] direitos. Qualquer abuso é passível
de controle judicial”.
Ficou claramente expresso nesse estudo que o Poder de Polícia no qual o
agente público está investido não tem o condão de extinguir direito algum do cidadão,
mas tão somente restringir-lhe o uso na medida estritamente proporcional ao exagero
praticado pelo administrado.
Porém, há autores que afirmam que nem sempre o interesse público prevalece
sobre o privado, como ensina Viegas (2012) ao defender que “[...] seria totalmente
incompatível o interesse público sempre prevalecer sobre o interesse privado, uma
vez que há direitos individuais expressamente assegurados pela nossa Carta Magna
e o particular deve lutar pelos seus direitos”.
O professor Carvalho Filho (2009, p. 87) extrai a aplicação do Princípio da
Proporcionalidade nos atos públicos praticados com o uso do Poder de Polícia:
O Princípio da proporcionalidade deriva, de certo modo, do poder de coerção
de que dispõe a Administração ao praticar atos de polícia. Realmente, não se
pode conceber que a coerção seja utilizada indevidamente pelos agentes
administrativos, o que ocorreria, por exemplo, se usada onde não houvesse
necessidade.
Do mesmo modo, ressalva Mello citado por Teixeira (2012, p. 26):
[...] no caso da utilização de meios coativos, que, bem por isso, interferem
energicamente com a liberdade individual, é preciso que a Administração se
comporte com extrema cautela, nunca se servindo de meios enérgicos que
os necessários à obtenção do resultado pretendido pela lei, sob pena de vício
jurídico que acarretará responsabilidade da Administração. Importa que haja
proporcionalidade entre a medida adotada e a finalidade legal a ser atingida.
[destaque do autor]
Ainda sobre o possível abuso por parte do agente público, explica Di Pietro
(2010, p. 122) que “[...] o poder de polícia não deve ir além do necessário para a
satisfação do interesse público que visa proteger; a sua finalidade não é destruir os
direitos individuais, mas, ao contrário, assegurar o seu exercício”.
42
Teixeira (2012) ensina que são conferidas prerrogativas à Administração
Pública com o intuito exclusivo de atender aos interesses coletivos.
Se a conduta administrativa é desproporcional, a conclusão inevitável é a de
que um ou alguns indivíduos estão sendo prejudicados por excesso de poder,
revelando-se ausente o verdadeiro interesse coletivo a ser perseguido e
configurando-se, sem dúvida, ilegalidade que merece correção. (CARVALHO
FILHO, 2009, p. 87)
Destaca-se que, apesar do Poder de Polícia ser nato da Administração Pública,
os abusos ocasionalmente praticados por servidores podem ser discutidos junto ao
Poder Judiciário, sendo esta uma faculdade constitucional garantida ao cidadão.
Cretella, citado por Carvalho Filho (2009, p. 82), corrobora com esta afirmativa
quando diz que “[...] a faculdade repressiva não é, entretanto, ilimitada, estando
sujeita a limites jurídicos: direitos do cidadão, prerrogativas individuais e
liberdades públicas asseguradas na Constituição e nas leis.” [destaque do autor]
Alexandrino e Paulo, mencionados por Teixeira (2012, p. 49) contribuem:
A doutrina e a jurisprudência atuais enfatizam a necessidade de existirem
instrumentos de controle do poder discricionário da administração, que
permitam o adequado delineamento de seus legítimos limites, evitando o
indevido uso da discricionariedade administrativa, como manto protetor de
atos que, embora praticados sob o fundamento da discricionariedade,
revistam insidiosa arbitrariedade. A ideia central é possibilitar um controle
judicial mais efetivo dos atos discricionários praticados pela administração
pública.
Desse modo, “o poder administrativo concedido a autoridade pública tem limites
certos e forma legal de utilização. Não é carta branca para arbítrios, perseguições ou
favoritismos governamentais”, completa Teixeira (2012, p. 49) ao aludir Granjeiro.
Corroborando com o entendimento acima, Medauar citada por Teixeira (2012,
p. 49-50), disse que “a discricionariedade constitui uma espécie de liberdade, porém
não uma liberdade absoluta, e sim sujeita a vínculo de natureza peculiar”. E continua
explicando o porquê da discricionariedade conferida à Administração Pública:
43
Uma das explicações centra-se no seguinte: o Poder Executivo tem a função
de direção política e administrativa, aí incluído o poder regulamentar; tais
funções não poderiam ser desempenhadas corretamente se tudo fosse
predeterminado, de modo absoluto, pela lei; o Estado contemporâneo, muito
complexo, com amplas funções, não pode atuar sem flexibilidade; torna-se
fundamental deixar margem de maleabilidade à Administração em época de
rápidas mudanças; grandes metrópoles, convivência de massa, problemas
sociais, grandes tragédias exigem, por vezes, rapidez de atuação e certa
margem de escolha; a discricionariedade atende, portanto, a necessidade
institucional.
A Administração Pública possui certa discricionariedade quanto ao exercício do
poder de polícia, no entanto seus limites são expressos em lei e seu abuso é
considerado ilegal e torna o ato inválido, afirma Teixeira (2012).
A respeito desse atributo, Di Pietro (2010, p. 119) ensina:
Quanto à discricionariedade, embora esteja presente na maior parte das
medidas de polícia, nem sempre isso ocorre. Às vezes, a lei deixa certa
margem de liberdade de apreciação quanto a determinados elementos, como
o motivo ou o objeto, mesmo porque ao legislador não é dado prever todas
as hipóteses possíveis a exigir atuação de polícia. Assim, em grande parte
dos casos concretos, a Administração terá que decidir qual o melhor
momento de agir, qual o meio de ação mais adequado, qual a sanção cabível
diante das previstas da norma legal.
No uso do Poder de Polícia de Trânsito, o agente tem a discricionariedade de
agir em determinadas ações, como na escolha do veículo a ser abordado e fiscalizado,
mas torna-se ato vinculado a lavratura de um AIT se ocasionalmente for detectada
alguma infração às normas de circulação e conduta. Ilustrando isto, temos:
A discricionariedade, como já vimos, traduz-se na livre escolha, pela
Administração, da oportunidade e conveniência de exercer o poder de polícia,
bem como de aplicar as sanções e empregar os meios conducentes a atingir
o fim colimado, que é a proteção de algum interesse público. Neste particular,
e desde que o ato de polícia administrativa se contenha nos limites legais e a
autoridade se mantenha na faixa de opção que lhe é atribuída, a
discricionariedade é legítima. (MEIRELLES, 2004, p. 134)
44
E continua Meirelles (2004, p. 139) dizendo que “sacrificar um direito ou uma
liberdade do indivíduo sem vantagem para a coletividade invalida o fundamento social
do ato de polícia, pela desproporcionalidade da medida”.
Assim, Viegas (2012) contribui afirmando que o princípio da supremacia do
interesse público deve ter uma aplicação limitada, bem como deve ser pautado no
princípio da razoabilidade e proporcionalidade, incumbindo ao administrador ponderar
os interesses em jogo, uma vez que o particular deve ser reconhecido como um ser
social possuindo legítimas prerrogativas individuais.
No mesmo sentido, conclui Teixeira (2012, p. 48) citando Carlin:
Existe discricionariedade quando a lei deixa à Administração a possibilidade
de, no caso concreto, escolher entre duas ou mais alternativas, todas válidas
perante o Direito. E essa escolha se faz segundo critérios de oportunidade,
conveniência, justiça, equidade, razoabilidade, interesse público, sintetizados
no que se convencionou chamar de mérito do ato administrativo.
Observa-se que o Poder de Polícia de Trânsito, apesar de possuir certa
discricionariedade, está longe de oferecer total liberdade ao agente público que o
detém. Especificamente ao Agente de Trânsito, é vedado aplicar a lei ao seu bel
prazer, tomando as decisões de acordo com sua análise pessoal.
Na aplicação das normas de trânsito, assim como nos demais atos
administrativos, a discricionariedade do Agente está vinculada aos institutos da
conveniência e oportunidade, excluindo-se ações incentivadas por sentimento
pessoal ou sentimental.
O CTB divide as sanções de trânsito entre penalidades e medidas
administrativas. Destas, a primeira é ato vinculado à função do Agente de Trânsito,
ele é obrigado a pratica-la quando detectar determinada infração à legislação. Para
as medidas administrativas é facultado ao Agente de Trânsito aplica-las, tomando sua
decisão de acordo com a conveniência e oportunidade, como já exposto.
Portanto, não há que se falar em discricionariedade no que se refere às
penalidades, como a confecção de autuação, por exemplo, pois apenas as medidas
45
administrativas dão uma certa liberdade de atuação ao Agente, mas, ainda assim,
vinculando-o a determinadas circunstâncias.
Para a análise das citadas elementares conveniência e oportunidade, o artigo
269 do CTB, que trata das medidas administrativas, traz expresso em seu Parágrafo
1º: A ordem, o consentimento, a fiscalização, as medidas administrativas e coercitivas
adotadas pelas autoridades de trânsito e seus agentes terão por objetivo prioritário a
proteção à vida e à incolumidade física da pessoa”. (BRASIL, 1997).
Dessa forma, não haverá licitude na conduta do Agente que, com a escusa de
usar o conhecido “bom senso”, deixar de autuar ou adotar outra medida que não a
prevista na legislação de trânsito. Como dito, exceção a esta regra refere-se à
aplicação das medidas administrativas, que serão adotadas de acordo com a proteção
à vida e à incolumidade física da pessoa.
Em que pese a maioria dos doutrinadores aqui citados demonstrarem
preocupação com um possível abuso por parte do agente público no uso do seu Poder
de Polícia, há de se verificar também a passividade do servidor diante de uma infração
à lei de trânsito. É importante observar que, assim como o excesso do Agente é
passível de controle externo e até mesmo uma punição disciplinar, também sua
omissão pode leva-lo às mesmas sanções ou a outras até mais graves.
Não raras vezes pode-se observar um cidadão cometendo uma infração de
trânsito com seu veículo, sendo ele abordado pelo Agente da Autoridade de Trânsito
com circunscrição sobre o local. Ao invés de confeccionar o devido auto de infração,
o Agente se limita a orientar o condutor sobre sua conduta ilícita. Destaca-se que esta
atitude do Agente se faz mais ilícita do que a do condutor do veículo, pois ele como
encarregado de aplicação da lei não a aplicou, ignorou-a sem justificativa plausível.
Assim, pode-se afirmar que o intuito deste estudo foi demonstrar que a
discricionariedade na ação do Agente de Trânsito, investido com o Poder de Polícia
Administrativa, está vinculada a certos requisitos exigidos pela própria norma. Diante
de uma infração de trânsito, não é facultado ao Agente lavrar a autuação; por força da
norma ele é obrigado a fazê-la. Sua discricionariedade encontra-se tão somente na
aplicação das medidas administrativas previstas para a infração, como a retenção e a
remoção do veículo e outras.
46
3 CONCLUSÃO
Lavando-se em conta o que foi observado no desenrolar desta pesquisa,
conclui-se que o Estado exerce o seu poder soberano sobre os seus cidadãos
administrados por meio do seu Poder de Polícia Administrativa. Este poder é
imprescindível para se manter a prevalência do interesse público e da coletividade
sobre o interesse individual do administrado.
Observou-se ainda que o Poder de Polícia da Administração Pública, apesar
de ser dotado de uma certa discricionariedade, é um poder-dever porque o Estado
está vinculado a aplica-lo de acordo com a própria norma. Além disso, é lícito ao
agente público apenas limitar o uso e o gozo dos direitos dos particulares em prol da
maioria ou da própria administração, mas jamais poderá vir a extinguir tais direitos.
No que se refere ao Poder de Polícia de Trânsito percebeu-se que o Sistema
Nacional de Trânsito congrega diversas autoridades de trânsito e que estas estão
distribuídas nos âmbitos federal, estadual e municipal. Cada autoridade é responsável
pela organização, sinalização e fiscalização de trânsito na área de sua competência.
Demonstrou-se que o Agente de Trânsito pode ser servidor civil, celetista ou
estatutário, ou até mesmo policial militar, desde que devidamente conveniado com o
órgão de trânsito com circunscrição sobre o local de atuação. A nomeação de qualquer
cidadão como Agente de Trânsito deve ser dotada da devida formalidade, para que
haja transparência e legalidade na delegação do Poder de Polícia de Trânsito.
Além disso, restou minuciosamente comprovado que o Agente de Trânsito
possui limites legais para sua atuação, não podendo agir de acordo com a sua
preferência. A discricionariedade presente no Poder de Polícia está vinculada ao
cumprimento de certos requisitos legais, tais como a conveniência e a oportunidade,
sem as quais qualquer ato público se torna ilícito e passível de nulidade.
Finalmente, conclui-se que a aplicação do popular “bom senso” na fiscalização
de trânsito configura ato ilícito por parte do Agente quando este detecta uma infração
à lei de trânsito, mas opta por não fazer a devida autuação. Ao agente é deferida uma
certa discricionariedade somente na aplicação das medidas administrativas, que
podem ser dispensadas com a observância dos requisitos legais.
47
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48
PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS. Pró-Reitoria de
Graduação. Sistema Integrado de Bibliotecas. Orientações para elaboração de
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trabalhos acadêmicos, conforme a Associação Brasileira de Normas Técnicas
(ABNT), a American Psychological Association (APA) e o Comitê Internacional de
Editores de Revistas Médicas (VANCOUVER). Belo Horizonte, 2015. Disponível em:
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Poder de Polícia e limites da discricionariedade do agente de trânsito

  • 1. PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS NÚCLEO DE EDUCAÇÃO À DISTÂNCIA Pós-Graduação Lato Sensu em Direito Público HELDER PAULO DE ANDRADE PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA DE TRÂNSITO: Limites à Discricionariedade do Agente Belo Horizonte 2016
  • 2. HELDER PAULO DE ANDRADE PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA DE TRÂNSITO: Limites à Discricionariedade do Agente Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Direito Público da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Especialista em Direito Público. Orientador: Prof. Me. Jair Eduardo Santana Belo Horizonte 2016
  • 3. HELDER PAULO DE ANDRADE PODER DE POLÍCIA ADMINISTRATIVA DE TRÂNSITO: Limites à Discricionariedade do Agente Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Programa de Pós-Graduação em Direito Público da Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais, como requisito parcial à obtenção do título de Especialista em Direito Público. _________________________________________________ Prof. Me. Jair Eduardo Santana – PUC Minas (Orientador) _________________________________________________ Prof. Dr. Diogo Luna Moureira – PUC Minas (Banca Examinadora) Belo Horizonte, 25 de abril de 2016.
  • 4. À Glória do Grande Arquiteto do Universo, que tem me permitido viver com justiça e perfeição.
  • 5. AGRADECIMENTOS A finalização deste trabalho e a obtenção do título de Especialista em Direito Público só se concretiza graças à colaboração de muitos, aos quais sou muito grato. Dentre inúmeros, destaco: Deus, pela centelha divina que me ilumina; os meus pais – Maria do Carmo e José Paulo – pelo incondicional apoio; a Polícia Militar de Minas Gerais, fonte do meu trabalho e renda; e a Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais – na pessoa do meu Orientador, Professor Jair Santana – por ofertar esse curso na modalidade à distância, facilitando sobremaneira o aprendizado. Por fim, agradeço de forma especial a minha namorada – Rosane Aparecida Miranda – pela amizade, compreensão e, principalmente, pela constante ajuda na superação dos meus desafios nessa incessante busca pelo conhecimento.
  • 6. Tudo aquilo que o homem ignora, não existe para ele. Por isso o universo de cada um, se resume no tamanho de seu saber. (Albert Einstein, 1879-1955)
  • 7. RESUMO Este estudo teve por objetivo conceituar o Poder de Polícia delegado pela Administração Pública aos servidores que executam a função de fiscalizadores de trânsito e os requisitos para que estes se tornem Agentes da Autoridade de Trânsito. Por meio de revisão literária no direito positivo, bem como em doutrinas e em jurisprudências, procurou-se identificar e definir o poder discricionário do Agente de Trânsito durante sua atuação investido no Poder de Polícia Administrativa de Trânsito. Além disso, este estudo buscou analisar essa discricionariedade, conhecida popularmente como bom senso, com intuito de definir seus limites legais. O aprofundamento do estudo desta matéria foi importante porque não há uma padronização de condutas no que se refere à discricionariedade da atuação do agente público no trânsito. Enquanto alguns agem com demasiada restrição, aplicando com exacerbado rigor as normas, outros são deliberadamente complacentes e tolerantes para com os infratores da lei de trânsito. Essas atuações discrepantes e convergentes trazem uma certa insegurança jurídica ao cidadão administrado, pois enquanto um infrator é punido com o rigor da lei, outro, que ocasionalmente cometera o mesmo delito, sai isento de qualquer punição. Observou-se que a discricionariedade enrustida no Poder de Polícia Administrativa deve ser aplicada de acordo com os requisitos exigidos pela norma, além da conveniência e oportunidade. Concluiu-se que o agente público não tem a liberdade de decidir, por suas meras convicções, sobre fazer ou não uma autuação de trânsito, pois trata-se de um ato vinculado à sua função. Pôde-se perceber que a discricionariedade existente em seu Poder de Polícia de Trânsito restringe-se à aplicação das medidas administrativas, mas não quanto à autuação. Palavras-chave: Poder de polícia administrativa de trânsito. Poder discricionário do agente de trânsito. Limites à discricionariedade do agente de trânsito.
  • 8. ABSTRACT This study aimed to conceptualize the delegate Police Power by the Public Administration to servers running the traffic supervisory function and the requirements for them to become agents of the Transit Authority. Through literature review in positive law and in doctrine and jurisprudence, we tried to identify and define the discretion of the Traffic Agent during its operations invested in the Power of Administrative Police Traffic. In addition, this study investigates this discretion, popularly known as common sense, in order to define their legal limits. The study of deepening this matter was important because there is no standardization of procedures in relation to the discretion of the performance of the public official in traffic. While some act with too much restriction, applying with rigor exacerbated the rules, others are deliberately complacent and tolerant of violators of traffic law. These disparate and convergent actions bring legal uncertainty given to citizens, because while an offender is punished with the rigor of the law, one that occasionally committed the same offense, comes out free of any punishment. It was observed that the closeted discretion in Administrative Police Power must be applied in accordance with the requirements of the standard, plus the convenience and opportunity. It was concluded that the public official does not have the freedom to decide, by their mere beliefs, about doing or not a traffic assessment, because it is an act linked to its function. It could be perceived that the existing discretion in its Traffic Police Power is limited to the application of administrative measures, but not as to the assessment. Keywords: Power of administrative police traffic. Discretion traffic agent. Limits the discretion of the traffic agent.
  • 9. LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS AIT – Auto de Infração de Trânsito CNT – Código Nacional de Trânsito CONTRAN – Conselho Nacional de Trânsito CR – Constituição da República Federativa do Brasil CTB – Código de Trânsito Brasileiro IPVA – Imposto sobre a Propriedade de Veículo Automotor JARI – Junta Administrativa de Recursos de Infrações NA – Notificação da Autuação NP – Notificação da Penalidade PRF – Polícia Rodoviária Federal PUC Minas – Pontifícia Universidade Católica de Minas Gerais RENAVAM – Registro Nacional de Veículos Automotores SNT – Sistema Nacional de Trânsito TJ – Tribunal de Justiça
  • 10. SUMÁRIO 1 INTRODUÇÃO .......................................................................................................10 2 DESENVOLVIMENTO ...........................................................................................11 2.1 A Administração Pública...............................................................................11 2.2 Poderes da Administração Pública ..............................................................11 2.3 Poder de Polícia da Administração Pública ................................................14 2.3.1 Definição de Poder de Polícia....................................................................16 2.3.2 Objeto do Poder de Polícia.........................................................................18 2.3.3 Finalidade do Poder de Polícia ..................................................................19 2.3.4 Fundamento do Poder de Polícia ..............................................................20 2.3.5 Características do Poder de Polícia ..........................................................21 2.3.6 Vinculação do Poder de Polícia.................................................................24 2.3.7 Discricionariedade do Poder de Polícia....................................................27 2.3.8 Sanção do Poder de Polícia .......................................................................29 2.4 A Legislação de Trânsito no Brasil ..............................................................31 2.4.1 O Sistema Nacional de Trânsito ................................................................33 2.4.2 Competência das Autoridades de Trânsito ..............................................34 2.5 Poder de Polícia Administrativa de Trânsito ...............................................38 2.5.1 Limites à Discricionariedade do Agente de Trânsito...............................40 3 CONCLUSÃO ........................................................................................................46 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS......................................................................47
  • 11. 10 1 INTRODUÇÃO O trânsito é um tema de grande relevância não só pelo alarmante número de acidentes automobilísticos que ocorrem todos os dias, mas principalmente por estar diretamente ligado ao nosso direito de locomoção. Atualmente tem-se discutido incessantemente o tema mobilidade urbana com intuito de melhorar as condições de vida dos cidadãos que vivem nos grandes centros urbanos, cujas ruas não comportam tantos veículos, o que ocasiona gigantescas filas em determinados horários. Com base nisso, este trabalho visa primeiramente trazer à tona a intervenção da Administração Pública no trânsito por meio do conceito e aplicação do Poder de Polícia Administrativa de trânsito, alcançando a sua delegação aos servidores públicos que atuam nesta atividade. Em seguida buscar-se-á definir o poder discricionário dos agentes e se há limites à essa discricionariedade durante o controle e a fiscalização de trânsito. O aprofundamento nesse estudo é necessário diante da ausência de uma padronização de condutas por parte dos agentes públicos que atuam no trânsito, pois, enquanto alguns agem com demasiada restrição, aplicando com exacerbado rigor as normas, outros são deliberadamente complacentes e tolerantes para com os infratores. Essas atuações discrepantes e convergentes trazem uma certa insegurança jurídica ao cidadão administrado, pois enquanto um infrator é punido com o rigor da lei de trânsito, outro, que ocasionalmente cometera o mesmo delito, sai isento de qualquer sanção por parte do agente fiscalizador. Assim, este estudo tem o escopo de conceituar o Poder de Polícia Administrativa de Trânsito, definir e delimitar a discricionariedade de atuação do Agente de Trânsito durante a aplicação do instituto conhecido popularmente como bom senso. Faz-se necessário verificar se esse bom senso pode ser aplicado de acordo com a vontade do servidor ou se há regras que disciplinam o seu uso.
  • 12. 11 2 DESENVOLVIMENTO O Estado dispõe de meios legais de coordenação e controle para agir junto aos administrados. Esses meios legais são poderes conferidos à Administração Pública pelo ordenamento jurídico, como bem afirma Medauar (2009). Não é desconhecido o fato de que o Estado deve atuar à sombra do princípio da supremacia do interesse público. Significa dizer que o interesse particular há de curvar-se diante do interesse coletivo. É fácil imaginar que, não fora assim, se implantaria o caos na sociedade (CARVALHO FILHO, 2009, p. 71). Esses poderes conferidos à Administração Pública visam a restrição dos direitos do indivíduo em prol da coletividade ou do interesse público. Antes de citar esses poderes, faz-se necessário conceituar a Administração Pública. 2.1 A Administração Pública O termo Administração Pública pode ser definido, segundo Gasparini (2009) como um complexo de atividades concretas e imediatas desempenhadas pelo Estado sob os termos e condições da lei, visando o atendimento das necessidades coletivas dos administrados. Teixeira (2012) conceitua a Administração Pública como o conjunto de entidades, órgãos e agentes que executam a função administrativa do Estado, bem como a atividade administrativa propriamente dita. Em suma a Administração Pública pode ser entendida como o conjunto de órgãos do Estado que visam o controle das atividades estatais e a fiscalização das ações dos cidadãos, resguardados os seus direitos e garantias individuais e coletivos. 2.2 Poderes da Administração Pública Definida a Administração Pública, pode-se afirmar que ela possui certos poderes que facilitam a obtenção de seus objetivos. É necessário que a administração mantenha sua supremacia sobre os administrados visando a preponderância do interesse público e da coletividade.
  • 13. 12 Coadunando com essa ideia, Di Pietro (2010, p. 211), disse que “[...] a administração pública dispõe de poderes que lhe asseguram posição de supremacia sobre o particular e sem os quais ela não conseguiria atingir seus fins”. Meirelles (2004) ensina que, para haver um bom atendimento aos administrados, faz-se necessário que a Administração Pública seja dotada de poderes proporcionais aos seus encargos. Medauar (2009, p. 109) afirma que “para que a Administração possa realizar o conjunto das atividades que lhe cabem, no cumprimento de seu papel na vida coletiva, o ordenamento lhe confere poderes”. Ainda que o foco deste estudo seja somente um dos poderes da Administração Pública, que é o Poder de Polícia de Trânsito, será apresentada uma breve definição dos outros poderes para um melhor entendimento. Assim, de acordo com o Direito Administrativo os poderes podem ser divididos em: Poder Disciplinar: é o meio que a administração tem de controlar, fiscalizar e sancionar, se necessário for, os seus servidores. Esse poder é definido por Meirelles (2004, p. 122) como: Poder disciplinar é a faculdade de punir internamente as infrações funcionais dos servidores e demais pessoas sujeitas à disciplina dos órgãos e serviços da Administração. É uma supremacia especial que o Estado exerce sobre todos aqueles que se vinculam à Administração por relações de qualquer natureza, subordinando-se às normas de funcionamento do serviço ou do estabelecimento que passam a integrar definitiva ou transitoriamente. Poder Hierárquico: define a organização dos órgãos que compõem a administração com base na hierarquização das competências. Ele é conceituado por Gasparini (2009, p. 52) como: A estrutura da Administração Pública, compreendida como a instituição dos órgãos encarregados da execução de certas e determinadas atribuições, faz- se com a observância do princípio da hierarquia, que é a relação de subordinação existente entre os órgãos públicos com competência administrativa e, por conseguinte, entre seus titulares, decorrente do exercício da atribuição hierárquica, chamada por alguns de poder hierárquico. [destaque do autor]
  • 14. 13 Poder Regulamentar: permite ao administrador editar normas complementares às leis vigentes com intuito de facilitar ou até mesmo viabilizar a aplicação delas. É ensinado por Di Pietro (2010, p. 90) como: [...] uma das formas pelas quais se expressa a função normativa do Poder Executivo. Pode ser definido como o que cabe ao Chefe do Poder Executivo da União, dos Estados e dos Municípios, de editar normas complementares à lei, para a sua fiel execução. Poder Vinculado: restringe sobremaneira a atuação do agente público ao disciplinar e moldar a sua atuação. Meirelles (2004, p. 115) ensina que nesse poder: [...] o agente público fica inteiramente preso ao enunciado da lei, em todas as suas especificações. Nessa categoria de atos administrativos a liberdade de ação do administrador é mínima, pois terá que se ater à enumeração minuciosa do Direito Positivo para realizá-lo eficazmente. Deixando de atender a qualquer dado expresso na lei, o ato é nulo, por desvinculado de seu tipo-padrão. Poder Discricionário: permite ao agente público atuar com certa liberdade, possibilitando-lhe agir de acordo com a conveniência e a oportunidade. Está muito definido por Carlin, citado por Teixeira (2012, p. 15), quando afirma: Numa prerrogativa de valoração, a lei não é capaz de regular todas as condutas de um agente administrativo. Por isso, ela lhe confere a prerrogativa de avaliar a conveniência e a oportunidade dos atos administrativos que ele vai praticar como administrador do interesse público. Poder de Polícia: possibilita ao administrador restringir certos direitos do cidadão em prol da coletividade ou do interesse público. Bacellar (2001, p. 11) ensina: Em suma, as prerrogativas da Administração traduzem-se em poderes especiais, os quais possibilitam a sua atuação, impondo limites aos interesses do particular (poder de polícia). Como resultado, temos como regular a possibilidade de um policial de trânsito aplicar uma multa, de o Poder Público Municipal sancionar empresas poluidoras do meio-ambiente, desapropriar bens para a reforma agrária, entre outras.
  • 15. 14 O Poder de Polícia é um dos principais poderes da Administração Pública, tanto que será o foco deste trabalho de agora em diante e será feito um estudo pormenorizado a seu respeito. 2.3 Poder de Polícia da Administração Pública Pode-se perceber que a Administração Pública é refém de seus poderes para exercer suas atividades. Dentre os diversos citados, o Poder de Polícia ganha destaque porque visa fiscalizar, e ocasionalmente sancionar, o administrado, restringindo o gozo de seus direitos e exigindo o cumprimento de seus deveres legais. A origem histórica do Poder de Polícia foi muito bem apresentada por Andrade (2013, p. 15-16), como se pode observar a seguir: Para entendermos o termo poder de polícia, faz-se necessário o estudo de sua evolução histórica, a começar pelo desmembramento das palavras que o compõem. No que se refere às definições afetas ao tema deste estudo, o Dicionário Online de Português [Internet] assim explica: Poder: origina-se do latim potere. Significa direito de agir, de decidir, de mandar; autoridade, governo de um país; mandato, procuração. É sinônimo de autoridade, domínio, mando. Polícia: origina-se do latim politia, procedente do grego politeia, que originalmente se referia a organização política, sistema de governo. Atualmente pode ser definida como o conjunto de regras impostas aos membros de uma coletividade com o objetivo de garantir a ordem, a tranquilidade e a segurança públicas. Seu sinônimo mais adequado é fiscalização. [destaque do autor] Há séculos que o termo polícia vem sendo vinculado às atuações da Administração Pública. “No século XVIII, o termo polícia designava o conjunto das atividades estatais, e denotava o conceito mais amplo de administração estatal”, completa Carlin citado por Teixeira (2012, p. 17). Entretanto, a dimensão com que se utilizava a expressão polícia passou a ser rejeitada a partir no mesmo século XVIII, como assegura Teixeira (2012, p. 17) citando Faria: “Esse entendimento amplo sobre o conceito de polícia foi mais tarde refutado pelo movimento cultural que culminou com a Revolução Francesa de 1789”.
  • 16. 15 A partir de então houve uma certa restrição ao emprego do termo polícia, que passou a ser vinculado à segurança propriamente dita. Comunga com essa afirmação Carlin, citado por Teixeira (2012, p. 17), acrescentando que, com a chegada da Revolução Francesa: [...] o conceito de polícia passou a se restringir, valorizando os direitos individuais e as concepções de Estado de Direito. Polícia passou, então, a designar parte das atividades de Administração, destinada a manter a ordem. Seu caráter fundamental é a vigilância. No entanto, os administrados não estavam satisfeitos porque eram obrigados a cumprir rígidas leis, enquanto os administradores não se submetiam a elas. Posteriormente, com o Estado de Direito, afirma Di Pietro (2010, p. 115) que: [...] inaugura-se nova fase em que já não se aceita a ideia de existirem leis a que o próprio príncipe não se submeta. Um dos princípios básicos do Estado de Direito é precisamente o da legalidade, em consonância com o qual o próprio Estado se submete às leis por ele mesmo postas. Até então não havia distinção entre a polícia que praticava a segurança e a polícia que tinha como objetivo a fiscalização do cumprimento das normas administrativas. “Surgiram, então, na França, a polícia administrativa e a polícia repressiva ou auxiliar, em contraponto com a judiciária, que preparava e impunha as ordens emanadas dos juízes”, como bem ensina Teixeira (2012, p. 17) citando Carlin. É categórico Di Pietro (2010, p. 116) ao dizer que “antes já de iniciar o século XX, os autores começam a falar em uma polícia geral, relativa à segurança pública, e em polícias especiais, que atuam nos mais variados setores da atividade dos particulares”. Assim, começou-se a diferenciar os tipos de polícia, cuja distinção ficou mais evidente no início do século XX, mais precisamente “em 1915 [quando] Ruy Barbosa, num parecer, utiliza a expressão poder de polícia. Aurelino Leal publica em 1918 o livro Polícia e poder de polícia. A partir daí firma-se no direito pátrio o uso da locução”, conclui Medauar (2009, p. 342). É importante diferenciar o Poder de Polícia Administrativa do Poder da Polícia de segurança pública. O primeiro se trata do poder fiscalizatório aplicado pela
  • 17. 16 Administração Pública, objeto de nosso estudo; o segundo é o poder que as forças policiais detêm para a garantia da ordem e da segurança públicas. Ressalta-se que geralmente os policiais, detentores do Poder da Polícia, é que garantem o uso do Poder de Polícia dos agentes públicos, sendo que a polícia pode atuar utilizando esses dois poderes simultaneamente. Exemplo: em uma blitz policial, ao fiscalizar os documentos do condutor e do veículo, o policial utiliza o seu Poder de Polícia Administrativa de Trânsito; ao vistoriar o automóvel e os ocupantes em busca de algo ilícito, o policial exerce o seu Poder da Polícia, originário de sua função. 2.3.1 Definição de Poder de Polícia O autoritarismo foi lentamente perdendo espaço e o poder público passou a intervir de forma mais moderada na vida do cidadão. Entretanto, fazia-se necessário um controle estatal para que não houvesse excesso do administrado ao exercer seus direitos, podendo vir a prejudicar a coletividade. Pois, “quando o Poder Público interfere na órbita do interesse privado para salvaguardar o interesse público, restringindo direitos individuais, atua no exercício do poder de polícia”, ensina Carvalho Filho (2009, p. 71). Cunha Júnior (2008) afirma que o poder de polícia tem origem na segunda metade do século XVIII, quando os cidadãos conquistaram seus primeiros direitos individuais, afastando assim, parte da opressão imposta pelo Estado. A Revolução Industrial teve grande colaboração na conquista desses primeiros direitos. Um conceito simples, porém, completo, de Poder de Polícia da Administração Pública foi emitido pelo professor Carvalho Filho (2009, p. 73): [...] entendemos que se possa conceituar o poder de polícia como a prerrogativa de direito público que, calcada na lei, autoriza a Administração Pública a restringir o uso e o gozo da liberdade e da propriedade em favor do interesse da coletividade. [destaque do autor] Atualmente, a Constituição da República (1988) traz expressos, principalmente no seu artigo 5º, os principais direitos e garantias individuais e coletivos do cidadão. Mas, apesar de estarem petrificados em nossa CR, os direitos e garantias não são absolutos, podendo o poder público restringir o seu uso de acordo o interesse maior.
  • 18. 17 Destaca o professor Cunha Júnior (2008) que ao Estado é autorizado apenas restringir o exercício dos direitos individuais, mas jamais poderá extinguir ou anular qualquer desses direitos. E ainda assim, entende-se que essa restrição só é lícita quando aplicada com vistas ao bem da coletividade ou da própria administração. Igualmente lembra Gasparini (2009, p. 126) que: “O exercício desses direitos [...] não é ilimitado. Ao contrário, deve ser compatível com o bem-estar social ou com o próprio interesse do Poder Público, não podendo, assim, constituir obstáculo à realização dos objetivos do Estado ou da sociedade”. Há de se destacar que, em decorrência desse poder do Estado de intervir nas ações do administrado, os direitos e garantias do cidadão deixam de ser absolutos e tornam-se relativos, como explicado abaixo: Com base nisto, pode-se dizer que os direitos e garantias individuais supracitados não são absolutos, mas sim relativos; pois, se o seu exercício individual estiver colidindo com o ordenamento jurídico em vigor, o Estado poderá intervir. Mas essa intervenção estatal não é discricionária, ela está vinculada aos atos individuais nocivos aos demais membros da sociedade. (ANDRADE, 2013, p. 18) “O poder de polícia é uma faculdade de que dispõe o Estado de condicionar e restringir os bens, as atividades e os direitos individuais, visando ajustá-los aos interesses da coletividade”, afirma Meirelles citado por Cunha Júnior (2008, p. 80). Em que pese o autor ter usado o termo “faculdade” neste texto, pode-se entender que a ação do Estado está vinculada à necessidade de intervenção na vida do administrado. No que se refere ao alcance dessa interferência da Administração Pública na vida do cidadão, os doutrinadores são unânimes em afirmar que: “As limitações, os condicionamentos, as restrições incidem sobre a liberdade e a propriedade, não sobre os respectivos direitos” (GASPARINI, 2009, p. 127); “O poder de polícia não incide sobre o direito, mas sim sobre o seu exercício. Não limita o direito de liberdade ou o direito de propriedade, mas a liberdade ou a propriedade” (CUNHA JÚNIOR, 2008, p. 81). [destaque do autor] No direito positivo pátrio o poder de polícia está conceituado no artigo 78 do Código Tributário Nacional (CTN), in verbis:
  • 19. 18 Art. 78. Considera-se poder de polícia atividade da administração pública que, limitando ou disciplinando direito, interesse ou liberdade, regula a prática de ato ou abstenção de fato, em razão de interesse público concernente à segurança, à higiene, à ordem, aos costumes, à disciplina da produção e do mercado, ao exercício de atividades econômicas dependentes de concessão ou autorização do Poder Público, à tranquilidade pública ou ao respeito à propriedade e aos direitos individuais ou coletivos. [destaque meu] Parágrafo único. Considera-se regular o exercício do poder de polícia quando desempenhado pelo órgão competente nos limites da lei aplicável, com observância do processo legal e, tratando-se de atividade que a lei tenha como discricionária, sem abuso ou desvio de poder. [destaque meu] Por meio deste conceito trazido pelo CTN, Andrade (2013, p. 19) conclui: [...] o Estado só pode intervir na individualidade do cidadão quando houver interesse coletivo. E, para se efetivar esta intervenção, torna-se imprescindível a competência legal do órgão detentor do poder de polícia e que este seja exercido nos limites da lei. Assim, considerando o princípio da intervenção mínima, pode-se encerrar afirmando que o Poder de Polícia da Administração Pública é imprescindível para que o Estado consiga obter os resultados do qual se espera. Contudo, esse poder não pode ser aplicado de maneira arbitrária e nem tampouco de acordo com a vontade pessoal do agente público, faz-se necessário um anseio coletivo ou o descumprimento de norma legal por parte do coagido. 2.3.2 Objeto do Poder de Polícia O objeto do Poder de Polícia pode ser entendido como toda ação ou omissão praticadas pelo administrado, que carece de um determinado controle por parte da administração pública para que não venha a ferir os direitos de terceiros. Igualmente Teixeira (2012, p. 20) entende como objeto do poder de polícia: “todo direito, bem ou atividade individual que possa prejudicar a sociedade, havendo assim a necessidade de controle pela Administração Pública”. Em outras palavras ensina Meirelles (2004, p. 131): O objeto do poder de polícia administrativa é todo o bem, direito ou atividade individual que possa afetar a coletividade ou pôr em risco a segurança
  • 20. 19 nacional, exigindo, por isso mesmo, regulamentação, controle e contenção do Poder Público. [destaque do autor] E ainda no mesmo sentido, percebe-se que o objeto do Poder de Polícia obrigatoriamente tem que ser lícito, moral e possível: O objeto há de ser lícito, isto é, o resultado pretendido dever ser aceito pelo ordenamento, porque pautado na lei; moral – conforme a [sic] princípios éticos e todas as regras de conduta extraídas da disciplina geral da Administração; possível – referente a algo realizável de fato e de direito. (MEDAUAR, 2009, p. 140) [destaque do autor] “O objeto é [...] a liberdade e a propriedade dos administrados, sem alcançar os respectivos direitos. Aquela, no que respeita ao seu exercício; está no que se relaciona com o uso, gozo e disposição”, é a tese de Gasparini (2009, p. 129). 2.3.3 Finalidade do Poder de Polícia A finalidade do Poder de Polícia Administrativa está diretamente ligada à normalidade do uso e gozo dos direitos pelos cidadãos. Havendo eventual excesso que poderia trazer transtorno à administração ou ao terceiro administrado, faz-se necessária a intervenção estatal, que se efetiva por meio desse poder. Meirelles (2004, p. 132) explica com minúcias a finalidade do poder de polícia: A finalidade do poder de polícia [...] é a proteção ao interesse público no seu sentido mais amplo. Nesse interesse superior da comunidade entram não só os valores materiais como, também, o patrimônio moral e espiritual do povo, expresso na tradição, nas instituições e nas aspirações nacionais da maioria que sustenta o regime político adotado e consagrado na Constituição e na ordem jurídica vigente. O Professor Gasparini (2009, p. 129) complementa afirmando que o interesse particular jamais pode se sobrepor ao interesse coletivo ou público: O uso, gozo e disposição da propriedade e o exercício da liberdade não podem impedir a realização do interesse público nem o pleno alcance do bem-estar social. Destina-se a polícia administrativa a prevenir o surgimento (quando ainda não aconteceu) de atividades particulares nocivas aos interesses sociais ou públicos ou a obstar (paralisar, impedir) seu desenvolvimento. Estes os seus fins.
  • 21. 20 O poder de polícia tem por finalidade “[...] propiciar a convivência social mais harmoniosa possível, para evitar ou atenuar conflitos no exercício dos direitos e atividades dos indivíduos entre si e ante o interesse de toda a população”, leciona Medauar (2009, p. 346). Esta é a adoção da teoria da intervenção mínima, um dos princípios basilares da relação administração – administrado. Entretanto, havendo conflito entre o interesse individual e o coletivo, não há dúvidas de que o Estado deverá intervir visando satisfazer o interesse da maioria. Esta é a tese sustentada por Viegas (2012): Vale trazer à baila a existência do princípio da supremacia do interesse público, o qual informa todo o Direito Administrativo direcionando as condutas dos agentes. Ocorre que, no âmbito das relações sociais, vão surgir conflitos entre o interesse público e o interesse privado, de forma que, ocorrendo esse conflito, há de prevalecer o interesse público, isto é, aquele que atende um maior número de pessoas. Concluindo, Teixeira (2012) resume a finalidade do poder de polícia como sendo o intuito da Administração Pública de resguardar o interesse público, ou seja, da coletividade em detrimento do particular. Cabe salientar que, se a intervenção estatal trouxer algum prejuízo ao particular, como perda patrimonial definitiva, por exemplo, ele deverá ser ressarcido dos valores correspondentes. Isto porque, como foi dito, o Estado não pode extinguir o direito do cidadão, mas tão somente limitar o seu direito de uso. 2.3.4 Fundamento do Poder de Polícia O Poder de Polícia se fundamenta na manutenção da soberania dos interesses da coletividade em relação ao indivíduo. Gasparini (2009, p. 127) afirma que o Poder de Polícia tem fundamento na supremacia da Administração Pública em relação aos interesses individuais: O fundamento da atribuição de polícia administrativa está centrado num vínculo geral, existente entre a Administração Pública e os administrados, que autoriza o condicionamento do uso, gozo e disposição da propriedade e do exercício da liberdade em benefício do interesse público ou social. Alguns autores chamam-no de supremacia geral da Administração Pública em relação aos administrados. [destaque do autor]
  • 22. 21 É do mesmo entendimento Mello (2009, p. 826), que ensina: O poder, pois, que a Administração exerce ao desempenhar seus encargos de polícia administrativa repousa nesta, assim chamada, ‘supremacia geral’, que, no fundo, não é senão a própria supremacia das leis em geral, concretizadas através de atos da Administração. [destaque do autor] Há ainda o professor Meirelles (2004, p. 130-131), afirmando que: [...] seu fundamento está na supremacia geral que o Estado exerce em seu território sobre todas as pessoas, bens e atividades, supremacia que se revela nos mandamentos constitucionais e nas normas de ordem pública, que a cada passo opõem condicionamentos e restrições aos direitos individuais em favor da coletividade, incumbindo ao Poder Público o seu policiamento administrativo. 2.3.5 Características do Poder de Polícia O Poder de Polícia Administrativa possui certas características que viabilizam a sua aplicação de modo efetivo. Teixeira (2012, p. 22) ensina que “o poder de polícia administrativo tem atributos próprios e específicos ao exercício e à sua validade, tais como a discricionariedade, a auto-executoriedade [sic], a coercibilidade e a tipicidade”. Diante disso, necessário se faz definir, ainda que sucintamente, estas características do Poder de Polícia. Destaca-se dentre elas a discricionariedade, que ganhará tópico especial mais adiante neste estudo. Passe-se, então, a definir os demais atributos do Poder de Polícia. A autoexecutoriedade pode-se conceituar como sendo a desnecessidade de qualquer autorização formal para que a Administração Pública exerça seus trabalhos e tome suas decisões. Corroborando com este entendimento, Teixeira (2012, p. 24), cintando Carlin, ensina que a autoexecutoriedade: [...] o poder que a Administração tem de executar suas decisões sem consentimento prévio, lançando mão de meios próprios para executar o ato, considerando-se a proporcionalidade, o que significa a exigência de uma relação de limites entre o direito individual e o prejuízo a ser evitado. Também Maffini, citado por Teixeira (2012, p. 24), explica assim: “[...] o poder de polícia é concretizável independentemente de qualquer participação (autorização,
  • 23. 22 permissão, deferimento etc.) do Poder Judiciário ou de qualquer outro órgão estatal que não seja a própria Administração Pública". Igualmente, outro professor comunga com a ideia de que o Estado prescinde de autorização para exigir do seu cidadão a moldagem de sua conduta de acordo com as normas legais editadas pelo primeiro: A Administração Pública pode promover, por seus próprios meios, humanos e materiais, a submissão do administrado às determinações editadas, para vê-lo conformado à legislação a que deve obediência, sem necessidade de recorrer a qualquer outro poder. (GASPARINI, 2009, p. 134) E conclui Meirelles (2004, p. 135) com outras palavras: “Destarte, para garantir a proteção dos administrados, a Administração pode efetuar diretamente os atos de seu poder de polícia sem necessitar da autorização de outro poder”. Quanto à coercibilidade, está ligada de certa forma ao uso da força estatal sobre o administrado até que sua conduta se enquadre no que disciplina as normas vigentes. Explica Mello (2009, p. 836) que se trata da “utilização de meios coativos por parte da Administração Pública, conforme o indicado, é uma necessidade imposta em nome da defesa dos interesses públicos”. Meirelles (2004, p. 136) vai mais além ao afirmar: A coercibilidade, isto é, a imposição coativa das medidas adotadas pela Administração, constitui também atributo do poder de polícia. Realmente, todo ato de polícia é imperativo (obrigatório para seu destinatário), admitindo até o emprego da força pública para seu cumprimento, quando resistido pelo administrado. A Administração Pública pode utilizar a força para com seus administrados, mas que essa força deve ser estritamente proporcional à resistência encontrada, sob pena de se cometer um abuso por parte da autoridade. Assim leciona Maffini citado por Teixeira (2012, p. 25): Além disso, se os policiados opuserem indevida resistência à atuação de polícia administrativa, poderá a Administração Pública valer-se de força pública, para a efetivação das medidas cabíveis, desde que sejam tais mecanismos de força pública legalmente previstos e proporcionais à
  • 24. 23 resistência que buscam ultrapassar. Não se admite, por certo, qualquer manifestação de violência gratuita, mesmo que em nome do interesse público inerente ao poder de polícia. Por fim, o atributo da coercibilidade do poder de polícia é indispensável para a Administração Pública, já que esta pode e deve atuar com autoridade protegendo o interesse público em detrimento do particular, conclui Teixeira (2012). No que se refere à tipicidade, toda ação da Administração Pública deve estar amparada na norma legal, pois não basta a ela fazer o que a lei não proíbe, é necessário que sua conduta seja legalmente autorizada. Ensina Di Pietro (2010, p. 201) que “é o atributo pelo qual o ato administrativo deve corresponder a figuras definidas previamente pela lei como aptas a produzir determinados resultados”. “Moraes elucida que se trata de atributo [...] absolutamente necessário em um Estado de Direito, uma vez que se refuta a possibilidade de a Administração Pública praticar atos administrativos inominados, em desrespeito ao princípio da legalidade, e, consequentemente, obrigar os administrados a cumpri-los, em função dos atributos da imperatividade e executoriedade”. (TEIXEIRA, 2012, p. 25) Esta característica do Poder de Polícia traz segurança jurídica aos administrados, uma vez que é vedado à administração executar qualquer ato sem que haja expressa previsão legal. Detalhadamente, Teixeira (2012, p. 25) afirma que: Alexandrino e Paulo mencionam que Di Pietro aponta duas consequências decorrentes de atributo: a) representa uma garantia para o administrado, pois impede que a Administração pratique ato unilateral e coercitivo, sem prévia previsão; b) afasta a possibilidade de ser praticado ato totalmente discricionário, pois a lei, ao prever o ato, já define os limites em que a discricionariedade poderá ser exercida. E Mazza, aludido por Teixeira (2012, p. 25), conclui: “Trata-se, portanto, de uma derivação do princípio da legalidade, impedindo a Administração Pública de praticar atos atípicos ou inominados”. Qualquer ato público praticado sem uma previsão legal anterior é nulo, resguardado o direito do cidadão atingido por ele de buscar junto ao poder público uma reparação pelos danos eventualmente sofridos.
  • 25. 24 2.3.6 Vinculação do Poder de Polícia O Poder de Polícia apresenta-se como um poder-dever, pois a quase totalidade de sua aplicação está vinculada à obediência às normas que o permeiam. Pode-se dizer que há uma parcela mínima de discricionariedade na atuação do agente, conforme será exposto em tópico posterior. Ensina Teixeira (2012, p. 46) que “O Poder vinculado é aquele exercido pelo agente público impondo-lhe o dever de praticar o ato, o qual tem previsão legal”; e completa citando Medauar: “Há poder vinculado, também denominado competência vinculada, quando a autoridade, ante determinada circunstância, é obrigada a tomar decisão determinada, pois sua conduta é ditada previamente pela norma jurídica”. A omissão no atendimento de qualquer requisito legal na aplicação do Poder de Polícia torna o ato jurídico nulo. É isto que explica Meirelles (2004, p. 115): Nessa categoria de atos administrativos a liberdade de ação do administrador é mínima, pois terá que ater à enumeração minuciosa do Direito Positivo para realizá-los eficazmente. Deixando de atender a qualquer dado expresso na lei, o ato é nulo, por desvinculado de seu tipo-padrão. Apesar de alguns doutrinadores usarem a palavra “faculdade” para conceituar o poder de polícia, destaca Cunha Júnior (2008) que ele não é uma faculdade da administração pública, mas sim um dever, um poder-dever, que o Estado não pode renunciar ou transigir. Gasparini (2009) chama a atenção ao enfatizar que esses poderes administrativos são deveres-poderes e vinculam a atuação do agente público proporcionalmente às normas previstas no ordenamento jurídico, repudiando qualquer tipo de excesso da parte do Estado. De acordo ainda com Teixeira (2012, p. 23), fazendo alusão a Maffini, “[...] a concretização do poder de polícia será vinculada ou discricionária dependendo tão- somente [sic] da regra legal de atribuição de competência”. Nesse caso, a autora se refere às normas legais que abrem uma certa brecha para a que o agente atue com mais liberdade, dispondo de uma certa discricionariedade.
  • 26. 25 Tem-se também que há normas originalmente vinculadas e outras discricionárias, como se percebe nos exemplos a seguir. Porém, até mesmo as leis ditas discricionárias contêm vinculação em seu bojo: A atividade de polícia ora é discricionária, a exemplo do que ocorre quando a Administração Pública outorga a alguém autorização para portar arma de fogo, ora é vinculada, nos moldes do que aconteceu quando a Administração Pública licencia uma construção (alvará ou licença de construção). (GASPARINI, 2009, p. 131) E continua o professor aprofundando sua lição sobre poder vinculado e poder discricionário: A lei prescreve em princípio, se, quando e como deve a Administração Pública agir ou decidir. A vontade da lei só estará satisfeita com esse comportamento, já que não permite à Administração Pública qualquer outro. Esses atos decorrem do exercício de uma atribuição vinculada ou, como prefere boa parte dos autores, do desempenho do poder vinculado, em cuja prática a Administração Pública não tem qualquer margem de liberdade. (GASPARINI, 2009, p. 96) [destaque do autor] Teixeira (2012, p. 47) destaca o entendimento do egrégio Tribunal de Justiça do Rio Grande do Sul sobre o poder vinculado da Administração Pública: APELAÇÃO CÍVEL. RESPONSABILIDADE CIVIL. AÇÃO DE INDENIZAÇÃO POR DANOS MATERIAIS E MORAIS. RENOVAÇÃO DE CARTEIRA NACIONAL DE HABILITAÇÃO. REBAIXAMENTO DA CATEGORIA E PARA B. NÃO PREENCHIMENTO DOS REQUISITOS. ATO ADMINISTRATIVO VINCULADO. LEGALIDADE. CONDUTA LÍCITA DO AGENTE PÚBLICO. 1. RESPONSABILIDADE OBJETIVA DO ESTADO. O sistema jurídico brasileiro adota a responsabilidade patrimonial objetiva do Estado e das prestadoras de serviço público sob a forma da Teoria do Risco Administrativo. Tal assertiva encontra respaldo legal no art. 37, § 6º, da CF. 2. AUSÊNCIA DE ATO ILÍCITO. 2.1 Em primeiro lugar, ao que se verifica dos documentos acostados aos autos, não resta comprovado que o réu agira de forma culposa ou que teria sido influenciado pelo diagnóstico feito quando do deferimento do benefício previdenciário por invalidez para alterar a categoria da CNH do autor. Pelo contrário, segundo os documentos das fls. 38-39, o autor fora encaminhado pelo médico, ora réu, à Junta Médica do DETRAN em 27/07/2001 (com amparo na Resolução nº. 80/98 do CONTRAN) e essa Junta Médica, mediante exame em 28/08/2001, concluiu que o autor não estaria
  • 27. 26 mais apto a dirigir automóveis correspondentes à categoria E, mas apenas, aqueles referentes à categoria B, a teor do disposto no art. 143 do Código de Trânsito Brasileiro. 2.2 Ora, nesse contexto, o que se verifica é que, dentro dos preceitos legais que regem a matéria, ex vi dos artigos 147, § 2º e 159, § 11, ambos do Código de Trânsito Brasileiro, a Administração Pública procedeu à aferição da capacidade do autor para dirigir veículos em que a unidade tratora se enquadre nas Categorias B, C ou D e cuja unidade acoplada, reboque, semi-reboque [sic] ou articulada, tenha seis mil quilogramas ou mais de peso bruto total, ou cuja lotação exceda a oito lugares, ou, ainda, seja enquadrado na categoria trailer. Em outras palavras, a expedição da Carteira Nacional de Habilitação, ainda que essa seja um direito conferido aos cidadãos, sujeita-se ao cumprimento dos requisitos pelo administrado constituindo-se na modalidade de ato administrativo vinculado. De forma que, se for desatendido algum dos requisitos, a própria eficácia do ato fica comprometida, impondo a sua anulação pela Administração, ou pelo Poder Judiciário (mediante provocação). 2.3 Por conseguinte, o órgão público agiu dentro dos estritos limites da legalidade, seguindo orientação constante do art. 147, § 2º, do CTB, dispositivo que prevê a realização de exame de aptidão física e mental de cinco em cinco anos para a renovação da licença para dirigir, não havendo, pois, qualquer ilegalidade no ato praticado (rebaixamento da categoria E para B). APELAÇÃO DESPROVIDA. (Apelação Cível Nº 70027224617, Nona Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Odone Sanguiné, Julgado em 25/03/2009). Disponível em: www.tjrs.jus.br. Acesso em: 18/05/2012. Di Pietro (2010, p. 212) conclui: “Nessa esteira, o poder da Administração é vinculado, visto que a lei não confere escolha ao administrador, mas sim estabelece através da lei, a forma que a administração deve agir”. No entanto, Alexandrino e Vicente mencionados por Teixeira (2012, p. 47-48) defendem outro ponto de vista: A expressão poder vinculado não é a mais apropriada, visto que quando se realiza um ato vinculado ou se observa os elementos vinculados de um ato discricionário, não se está exercendo uma prerrogativa, a administração está cumprindo um dever. Assegura o professor Carvalho Filho (2009, p. 49) que a atuação vinculada reflete uma imposição ao administrador, obrigando-o a conduzir-se rigorosamente em conformidade com parâmetros legais. Em suma é possível dizer que o Poder de
  • 28. 27 Polícia é por sua natureza vinculado, não deixando margem para que o administrador atue como lhe convier, mas que certas normas detêm uma dose de discricionariedade, por meio da qual o agente público tem a liberdade de agir, desde que o faça escorado nos institutos da conveniência e da oportunidade. 2.3.7 Discricionariedade do Poder de Polícia Deve-se estudar com muita cautela a discricionariedade aplicada ao Poder de Polícia, pois, em uma análise superficial, pode-se acreditar que ela é nata à função do agente público, o que é uma inverdade. Afirma Meirelles (2004, p. 116-117) que “a discricionariedade é a liberdade de atuação administrativa, no âmbito em que a lei lhe atribua essa faculdade”. Com intuito de evitar essa interpretação errônea, o professor Carvalho Filho (2009, p. 47) esclarece: A lei não é capaz de traçar rigidamente todas as condutas de um agente administrativo. Ainda que procure definir alguns elementos que lhe restringem a atuação, o certo é que em várias situações a própria lei lhes oferece possibilidade de valoração de conduta. Nesses casos, pode o agente avaliar a conveniência e a oportunidade dos atos que vai praticar na qualidade de administrador dos interesses coletivos. [destaque do autor] Contribui Medauar citada por Teixeira (2012, p. 48): “o poder discricionário, caracterizado essencialmente como escolha de uma entre várias soluções, é conferido por normas legais e deve atender a parâmetros no seu exercício”. Assim, ensina Gasparini (2009) que a discricionariedade ou atribuição discricionária, como preferem alguns, pode ser determinada através da lei que admite certa liberdade à Administração Pública para decidir sobre cada caso concreto. É importante destacar a posição do Tribunal de Justiça de Santa Catarina, citado por Teixeira (2012, p. 48-49): DIREITO ADMINISTRATIVO - SISTEMA VIÁRIO URBANO – LIMITAÇÃO AO TRÂNSITO DE VEÍCULOS PESADOS - PREJUÍZO A EMPRESA QUE EXPLORA POSTO DE REVENDA DE COMBUSTÍVEL – DECISÃO JUDICIAL QUE IMPÕE A SUSPENSÃO DAS OBRAS - AGRAVO DE INSTRUMENTO – RECURSO PROVIDO 01. "Em favor dos atos
  • 29. 28 administrativos milita presunção de legitimidade (Celso Antônio Bandeira de Mello, Maria Sylvia Zanella Di Pietro, Hely Lopes Meirelles); supõe-se que 'as decisões da administração são editadas com o pressuposto de que estão conformes às normas legais e de que seu conteúdo é verdadeiro' (Odete Medauar)" (ACMS n. 2008.038594-0, Des. Newton Trisotto). 02. "O ato administrativo discricionário submete-se ao controle judicial, 'pois só a Justiça poderá dizer da legalidade da invocada discricionariedade e dos limites de opção do agente administrativo. O que o Judiciário não pode é, no ato discricionário, substituir o discricionarismo do administrador pelo do juiz. Mas pode sempre proclamar as nulidades e coibir os abusos da Administração' (Hely Lopes Meirelles)" (ACMS n. 2006.039019-6, Des. Newton Trisotto). (Agravo de Instrumento n. 2011.005138-6, Primeira Câmara de Direito Público, Juiz Prolator: Jeferson Osvaldo Vieira Julgado em: 08/09/2011). Disponível em: www.tjsc.jus.br. Acesso: 18/05/2012. Carvalho Filho (2009, p. 48) chama a atenção para um ponto crucial nesse estudo, que é o uso ilimitado da discricionariedade, conduta esta que não encontra nenhum amparo legal: Ocorre que algumas vezes o agente, a pretexto de agir discricionariamente, se conduz fora dos limites da lei ou em direta ofensa a esta. Aqui comete arbitrariedade, conduta ilegítima e suscetível de controle de legalidade. Neste ponto se situa a linha diferencial entre ambas, não há discricionariedade contra legem. [destaque do autor] No mesmo sentido, Di Pietro (2010, p. 212) dispõe: “[...] a discricionariedade implica liberdade de atuação nos limites traçados pela lei; se a Administração ultrapassa esses limites, a sua decisão passa a ser arbitrária, ou seja, contrária à lei”. Meirelles (2004, p. 103) ratifica que “é esse poder que empresta a autoridade ao agente público quando recebe da lei competência decisória e força para impor suas decisões aos administrados”. E continua Meirelles (2004, p. 134) dizendo que “[...] o ato de polícia é, em princípio, discricionário, mas passará a ser vinculado se a norma legal que o rege estabelecer o modo e forma de sua realização”.
  • 30. 29 Desse modo, “o certo, então, é dizer que tal atribuição [poder de polícia] se efetiva por atos administrativos expedidos através do exercício de uma competência às vezes vinculada, às vezes discricionária”, conclui (GASPARINI, 2009, p. 131). Por fim, é possível dizer que há apenas um liame dividindo o uso lícito da discricionariedade da omissão ou uso arbitrário do poder por parte do agente público. Em regra, o Poder de Polícia é vinculado e para a sua legítima aplicação é necessário o cumprimento das elementares que a própria norma trouxer. Quando a lei facultar ao agente a tomada de determinada decisão, esta deve ser decidida com base na conveniência e oportunidade, jamais de acordo com a vontade pessoal do servidor. 2.3.8 Sanção do Poder de Polícia A sanção nada mais é do que a consequência do uso do Poder de Polícia. Ela acarreta uma certa punição ao administrado pelo não cumprimento de determinada norma. Chega-se até a sanção por meio da fiscalização das condutas do cidadão. “Sanção administrativa é o ato punitivo que o ordenamento jurídico prevê como resultado de uma infração administrativa, suscetível de ser aplicado por órgãos da Administração”, ensina Oliveira citado por Carvalho Filho (2009, p. 88). O professor Carvalho Filho (2009, p. 88) ensina que “as sanções espelham a atividade repressiva decorrente do poder de polícia. Estão elas difundidas nas diversas leis que disciplinam atividades sujeitas a esse poder”. E Justen, citado por Teixeira (2012, p. 26), resume que a “a sanção administrativa pode ser considerada como manifestação do poder de polícia”. Temos abaixo alguns exemplos de sanções administrativas, aplicadas ao cidadão pelo Estado por meio de agentes devidamente credenciados, no uso do seu Poder de Polícia Administrativa: As sanções do poder de polícia, como elemento de coação e intimidação, principiam, geralmente, com a multa e se escalonam em penalidades mais graves como a interdição de atividade, o fechamento de estabelecimento, a demolição de construção, o embargo administrativo de obra, a destruição de objetos, a inutilização de gêneros, a proibição de fabricação ou comércio em determinadas zonas e tudo o mais que houver de ser impedido em defesa da moral, da saúde, e da segurança pública, bem como da segurança nacional,
  • 31. 30 desde que estabelecido em lei ou regulamento. (MEIRELLES, 2004, p. 137- 138) [grifo meu] O descumprimento de obrigações legais por parte do administrado gera a ele uma sanção administrativa, como assevera Medauar (2009, p. 349): As medidas resultantes do poder de polícia exigem observância por parte dos sujeitos a que impõe restrições em seus direitos: tais medidas podem implicar obrigações de fazer ou de se abster. O descumprimento de tais prescrições enseja, para o agente, a possibilidade de impor sanções. Cabe ressaltar que, “[...] se o ato sancionatório de polícia não tiver propiciado ao infrator a oportunidade de rechaçar a acusação e de produzir as provas necessárias às suas alegações, estará contaminado de vício de legalidade, devendo ser corrigido na via administrativa ou judicial”. (CARVALHO FILHO, 2009, p. 89) Especialmente no que se refere à multa de Trânsito, Carvalho Filho (2009) menciona uma decisão do Superior Tribunal de Justiça, que afirmou ser indispensável ao devido processo administrativo a notificação da autuação e da aplicação da sanção decorrentes da infração cometida pelo condutor do veículo, proporcionando a este o direito ao contraditório e, consequentemente, à ampla defesa. No entanto, salienta-se que, se o motorista for pego em flagrante no cometimento da infração, torna-se desnecessária a notificação da autuação, podendo ele promover sua defesa desde o momento do flagrante. (ANDRADE, 2013, p. 34). À primeira vista pode-se pensar que a multa de trânsito fere os direitos à ampla defesa e ao contraditório porque, ao ser flagrado pelo Agente de Trânsito, o condutor é autuado sem nem fazer sua defesa. Porém, o Agente de Trânsito confecciona o Auto de Infração de Trânsito (AIT), que se transforma posteriormente em Notificação da Autuação (NA) e Notificação da Penalidade (NP) em um segundo momento. A partir da confecção do AIT o condutor ou proprietário do veículo passam a ter o direito à ampla defesa e ao contraditório, podendo exercê-los junto à autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via onde foi autuado. Ressalta-se que o infrator terá o prazo necessário ao exercício de suas faculdades recursais, só não podendo exercê-lo junto ao agente autuador, pois este está vinculado à lavratura do AIT ao se deparar com uma infração de trânsito.
  • 32. 31 2.4 A Legislação de Trânsito no Brasil Após definir o Poder de Polícia da Administração Pública e apresentar as suas principais características, agora se discorrerá especificamente sobre o Poder de Polícia Administrativa de Trânsito. Porém, antes de prosseguir, para que se possa analisar com profundidade o uso do Poder de Polícia de Trânsito, é importante fazer uma breve síntese sobre a legislação de trânsito no Brasil. O artigo 1º do Código de Trânsito Brasileiro (CTB) define: Art. 1º [...] § 1º Considera-se trânsito a utilização das vias por pessoas, veículos e animais, isolados ou em grupos, conduzidos ou não, para fins de circulação, parada, estacionamento e operação de carga ou descarga. § 2º O trânsito, em condições seguras, é um direito de todos e dever dos órgãos e entidades componentes do Sistema Nacional de Trânsito, a estes cabendo, no âmbito das respectivas competências, adotar as medidas destinadas a assegurar esse direito. (BRASIL, 1997) O atual Código de Trânsito Brasileiro (CTB) é considerado uma das normas mais completas e restritivas do mundo, principalmente no que se refere à embriaguez ao volante. No entanto, ainda assim o Brasil ocupa há anos a vergonhosa quinta colocação entre os países com maior número de pessoas mortas em acidentes veiculares. Antes de pormenorizar o estudo da legislação de trânsito vigente, é conveniente fazer uma síntese da evolução dessa norma no Brasil. Os primeiros veículos automotores de que se tem conhecimento chegaram na Bahia no ano de 1871 e eram movidos à vapor. Somente em 1891 chegou o primeiro carro à combustão e, assim, iniciou-se a formação da frota automotiva brasileira, que vem crescendo significativamente. Quanto à legislação, o primeiro registro encontrado de uma lei de trânsito no Brasil é datado de 1910, cujo objetivo da norma era exigir dos motoristas a redução
  • 33. 32 da velocidade para evitar a ocorrência de acidentes, principalmente envolvendo os inúmeros veículos ainda tracionados por animais. No ano de 1927, já com muitos automóveis e ônibus em circulação, a União criou o primeiro imposto veicular, que era um tipo de fundo para a manutenção das estradas. Todos os veículos automotores tinham a obrigação de contribuir para esse fundo. Desde então passou-se a cobrar o que hoje conhecemos por Imposto sobre a Propriedade de Veículo Automotor (IPVA), com a diferença de que atualmente a arrecadação é feitas pelos Estados e pelo Distrito Federal. Em 1928 o Brasil adotou uma legislação de trânsito baseada em normas internacionais, com previsão de emplacamento dos veículos e multas para os que desobedecem às normas de circulação. Porém, somente no ano de 1941 surgiu o primeiro Código Nacional de Trânsito (CNT), que transferiu aos Estados a responsabilidade para com o trânsito. O primeiro CNT foi retificado em 1966, quando passou a possuir 131 artigos, criou o Registro Nacional de Veículos Automotores (RENAVAM) e instituiu a Junta Administrativa de Recursos de Infração (JARI) devido ao grande número de contestações de multas. No ano de 1968 o CNT foi novamente retificado e trouxe em seu bojo 264 artigos e 8 anexos. As principais alterações foram a regulamentação da concessão de linhas de transporte coletivo e a exigência da colocação de taxímetros nos automóveis de aluguel. No período de 1993 a 1997 foi criado e discutido o projeto do que seria o atual CTB. Embates técnicos e políticos retardaram a aprovação da nova norma, que foi publicada em 23 de setembro de 1997 e trouxe consideráveis inovações, como a transferência da competência sobre o trânsito nas cidades aos respectivos municípios, por exemplo, exigindo deles o cumprimento de certos requisitos, que serão objeto de estudo oportunamente. Como mencionado, o atual CTB é considerado uma lei exemplar a nível mundial, mas especialistas têm defendido a edição de um novo código que venha a incluir as normas infra legais complementares e regulamentadoras – como resoluções, deliberações e portarias – publicadas principalmente pelo Conselho Nacional de Trânsito (CONTRAN). Ressalta-se que o CONTRAN já publicou mais de 570
  • 34. 33 resoluções regulamentando a legislação, motivo pelo qual o CTB tem sido alvo de muitas críticas. 2.4.1 O Sistema Nacional de Trânsito O CTB inovou a legislação de trânsito de tal modo que o Brasil passou a ser considerado modelo nesse tema. Ao criar um sistema complexo, mas com a divisão de responsabilidades entre os diversos órgãos e autoridades, o código conceitua o Sistema Nacional de Trânsito (SNT) e define seus objetivos básicos: Art. 5º O Sistema Nacional de Trânsito é o conjunto de órgãos e entidades da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios que tem por finalidade o exercício das atividades de planejamento, administração, normatização, pesquisa, registro e licenciamento de veículos, formação, habilitação e reciclagem de condutores, educação, engenharia, operação do sistema viário, policiamento, fiscalização, julgamento de infrações e de recursos e aplicação de penalidades. [destaque meu] Art. 6º São objetivos básicos do Sistema Nacional de Trânsito: I - estabelecer diretrizes da Política Nacional de Trânsito, com vistas à segurança, à fluidez, ao conforto, à defesa ambiental e à educação para o trânsito, e fiscalizar seu cumprimento; II - fixar, mediante normas e procedimentos, a padronização de critérios técnicos, financeiros e administrativos para a execução das atividades de trânsito; III - estabelecer a sistemática de fluxos permanentes de informações entre os seus diversos órgãos e entidades, a fim de facilitar o processo decisório e a integração do Sistema. (BRASIL, 1997) Percebe-se que o CTB não excluiu nenhum ente federado da responsabilidade pelo trânsito, ao contrário do revogado CNT, cujos municípios não integravam o SNT, ou seja, não participavam do sistema, o que sobrecarregava sobremaneira os Estados membros. A atual composição do SNT está expressa no artigo 7º do CTB: Art. 7º Compõem o Sistema Nacional de Trânsito os seguintes órgãos e entidades: I - o Conselho Nacional de Trânsito - CONTRAN, coordenador do Sistema e órgão máximo normativo e consultivo; [grifo meu]
  • 35. 34 II - os Conselhos Estaduais de Trânsito - CETRAN e o Conselho de Trânsito do Distrito Federal - CONTRANDIFE, órgãos normativos, consultivos e coordenadores; III - os órgãos e entidades executivos de trânsito da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; IV - os órgãos e entidades executivos rodoviários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios; V - a Polícia Rodoviária Federal; VI - as Polícias Militares dos Estados e do Distrito Federal; e VII - as Juntas Administrativas de Recursos de Infrações – JARI. (BRASIL, 1997) Esses componentes do SNT são considerados Autoridades de Trânsito nas suas respectivas circunscrições, conforme dispõe o Anexo I (Conceitos e Definições) do CTB: “AUTORIDADE DE TRÂNSITO - dirigente máximo de órgão ou entidade executivo integrante do Sistema Nacional de Trânsito ou pessoa por ele expressamente credenciada”. (BRASIL, 1997). 2.4.2 Competência das Autoridades de Trânsito Sobre as competências em matéria de trânsito, esclarece Favreto (2000, p. 155): “No exercício de sua competência privativa, a União conferiu atribuições executivas e competências legislativas complementares sobre política de educação, segurança e fiscalização de trânsito aos demais entes federados [...]”. Quanto às competências gerais das autoridades, o CTB prevê o seguinte: Art. 21. Compete aos órgãos e entidades executivos rodoviários da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição: I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de suas atribuições; [...] VI - executar a fiscalização de trânsito, autuar, aplicar as penalidades de advertência, por escrito, e ainda as multas e medidas administrativas cabíveis, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar; [...]
  • 36. 35 Art. 256. A autoridade de trânsito, na esfera das competências estabelecidas neste Código e dentro de sua circunscrição, deverá aplicar, às infrações nele previstas, as seguintes penalidades: I - advertência por escrito; II - multa; III - suspensão do direito de dirigir; IV - apreensão do veículo; V - cassação da Carteira Nacional de Habilitação; VI - cassação da Permissão para Dirigir; VII - frequência obrigatória em curso de reciclagem. (BRASIL, 1997) Por meio dos artigos acima pode-se observar que as autoridades de trânsito são várias e ocupam todos os níveis da Administração Pública, quais sejam: União, Estados, Distrito Federal e Municípios; cada qual com responsabilidade sobre sua circunscrição, sua área de atuação. O alcance desse objetivo maior - segurança, fluidez, conforto e defesa da vida pela educação no trânsito - exige uma atuação permanente e sistemática dos órgãos e entidades que compõem o Sistema Nacional de Trânsito, visto que este novo ordenamento jurídico distribuiu as regras de competência entre os três entes federados, exigindo, assim, interpretação e aplicação integrada para se obter melhor efetividade. (FAVRETO, 2000, p. 155) [destaque meu] A própria norma de trânsito trouxe expressa a responsabilidade de cada componente do SNT. A seguir serão abordadas as principais competências das autoridades de trânsito de acordo com sua circunscrição e os entes federados a que pertencem. A nível federal, dentre outras, temos como autoridade de trânsito a Polícia Rodoviária Federal (PRF), à qual o CTB impõe as seguintes competências: Art. 20. Compete à Polícia Rodoviária Federal, no âmbito das rodovias e estradas federais:
  • 37. 36 I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de suas atribuições; II - realizar o patrulhamento ostensivo, executando operações relacionadas com a segurança pública, com o objetivo de preservar a ordem, incolumidade das pessoas, o patrimônio da União e o de terceiros; III - aplicar e arrecadar as multas impostas por infrações de trânsito, as medidas administrativas decorrentes e os valores provenientes de estada e remoção de veículos, objetos, animais e escolta de veículos de cargas superdimensionadas ou perigosas; [...] (BRASIL, 1997) Pede-se vênia para abrir parênteses a fim de tratar da atual situação da Polícia Rodoviária Federal (PRF). Em que pese ela ser uma autoridade integrante do SNT, a PRF tem delegado às polícias militares estaduais, por meio de convênio com os respectivos Estados, a competência para o patrulhamento e a fiscalização de trânsito em diversas rodovias federais. Acredita-se que esta delegação se faz necessária porque a PRF não dispõe de agentes suficientes para cumprir sua missão nos milhares de quilômetros de rodovias federais existentes no país. Prescinde dados estatísticos sobre esse assunto por não trazer reflexos diretos ao resultado desse estudo, mas pode-se dizer que a PRF só não delega aos Estados as principais rodovias do país, ou seja, aquelas que compõem grandes eixos de ligação no território nacional e as fronteiriças. Na esfera estadual, há diversos órgãos e entidades de trânsito, dentre eles, as Polícias Militares, que podem atuar no trânsito mediante convênio com a autoridade que detém a circunscrição sobre a via. Dispõe o CTB que: Art. 22. Compete aos órgãos ou entidades executivos de trânsito dos Estados e do Distrito Federal, no âmbito de sua circunscrição: I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito das respectivas atribuições; [...] IV - estabelecer, em conjunto com as Polícias Militares, as diretrizes para o policiamento ostensivo de trânsito; V - executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis pelas infrações previstas neste Código, excetuadas
  • 38. 37 aquelas relacionadas nos incisos VI e VIII do art. 24, no exercício regular do Poder de Polícia de Trânsito; VI - aplicar as penalidades por infrações previstas neste Código, com exceção daquelas relacionadas nos incisos VII e VIII do art. 24, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar; [...] Art. 23. Compete às Polícias Militares dos Estados e do Distrito Federal: [...] III - executar a fiscalização de trânsito, quando e conforme convênio firmado, como agente do órgão ou entidade executivos de trânsito ou executivos rodoviários, concomitantemente com os demais agentes credenciados; (BRASIL, 1997) [destaque meu] A norma em destaque não exige que o convênio de cooperação deve ser firmado entre órgãos pertencentes aos mesmo ente federado, o que permite às polícias militares dos Estados e do Distrito Federal assumirem o papel de Agentes de Trânsito da PRF nas rodovias federais que lhe forem delegadas. No âmbito municipal, as prefeituras podem criar seus órgãos de gerenciamento e controle, mas para isto devem municipalizar o trânsito na área de sua circunscrição, ou seja, é necessário que a administração municipal se integre ao SNT e cumpra determinados requisitos, conforme prevê o CTB: Art. 24. Compete aos órgãos e entidades executivos de trânsito dos Municípios, no âmbito de sua circunscrição: I - cumprir e fazer cumprir a legislação e as normas de trânsito, no âmbito de suas atribuições; II - planejar, projetar, regulamentar e operar o trânsito de veículos, de pedestres e de animais, e promover o desenvolvimento da circulação e da segurança de ciclistas; [...] V - estabelecer, em conjunto com os órgãos de polícia ostensiva de trânsito, as diretrizes para o policiamento ostensivo de trânsito; VI - executar a fiscalização de trânsito, autuar e aplicar as medidas administrativas cabíveis, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, no exercício regular do Poder de Polícia de Trânsito; [destaque meu]
  • 39. 38 VII - aplicar as penalidades de advertência por escrito e multa, por infrações de circulação, estacionamento e parada previstas neste Código, notificando os infratores e arrecadando as multas que aplicar; [...] [destaque meu] X - implantar, manter e operar sistema de estacionamento rotativo pago nas vias; [...] XVIII - conceder autorização para conduzir veículos de propulsão humana e de tração animal; [...] § 2º Para exercer as competências estabelecidas neste artigo, os Municípios deverão integrar-se ao Sistema Nacional de Trânsito, conforme previsto no art. 333 deste Código. (BRASIL, 1997) [destaque meu] Em suma, para que a prefeitura assuma o controle do trânsito no âmbito do município, podendo autuar e receber o valor total das multas que aplicar, é necessário que ela se integre ao SNT. Para conseguir isto, o poder municipal deve criar uma secretaria ou departamento de trânsito com agentes devidamente treinados, requisitos estes que dificultam ou até mesmo impedem a maioria dos municípios brasileiros de efetivarem a municipalização do seu trânsito. Não o fazendo, a responsabilidade continua com o Estado e o município recebe parte do valor das autuações aplicadas. Nestes últimos tópicos buscou-se apresentar uma síntese da evolução da legislação e o funcionamento do trânsito brasileiro, definindo as autoridades integrantes do SNT e suas respectivas competências. 2.5 Poder de Polícia Administrativa de Trânsito A legislação de trânsito brasileira é deveras complexa e carece de profundo estudo para o seu completo entendimento. Contudo, acredita-se que o exposto até agora é suficiente para que se passe a discutir o objeto principal deste trabalho, qual seja: a aplicação do Poder de Polícia Administrativa de Trânsito. “[...] O poder de polícia de trânsito tem por objetivo disciplinar, controlar e fiscalizar o trânsito dos veículos em geral, coibindo a ocorrência de infrações de trânsito, ora de forma preventiva ora de forma repressiva”, diz Teixeira (2012, p. 32). Como já foi amplamente exposto, o Poder de Polícia faculta ao agente público restringir de certa forma a aplicação dos direitos individuais do cidadão, sempre em
  • 40. 39 prol da coletividade ou do interesse público. Diante de tamanha responsabilidade ao lidar com direitos constitucionalmente petrificados, não é conveniente que o administrador público delegue o Poder de Polícia de Trânsito a qualquer pessoa, sob pena haver abuso ou omissão na aplicação da norma. Assim, faz-se necessário que a própria lei traga em seu bojo os legitimados a auferirem tal poder. Conforme disposto no parágrafo 2º do artigo 280 do CTB, para que haja legalidade na autuação de trânsito, a fiscalização deve ser exercida pela própria autoridade ou por um agente devidamente autorizado pela autoridade com circunscrição sobre a via: “Art. 280. [...] § 2º A infração deverá ser comprovada por declaração da autoridade ou do agente da autoridade de trânsito [...]”. (BRASIL, 1997). [destaque meu] O parágrafo 4º do mesmo artigo traz o rol dos legitimados à função de agente da autoridade de trânsito: “Art. 280. [...] § 4º O agente da autoridade de trânsito competente para lavrar o auto de infração poderá ser servidor civil, estatutário ou celetista ou, ainda, policial militar designado pela autoridade de trânsito com jurisdição sobre a via no âmbito de sua competência.” (BRASIL, 1997) [destaque meu] Buscando um aprofundamento na análise do dispositivo acima, Silva (2004) apresenta a seguinte explicação: O Código de Trânsito Brasileiro, por outro lado, estabelece em seu artigo 280, § 4º, que o Agente da Autoridade de Trânsito, para que possa efetivamente exercer uma função de natureza fiscalizadora no tocante às atividades inseridas na área operacional do trânsito, deverá ser designado pela autoridade de trânsito com circunscrição sobre a via no âmbito de sua competência e, assim sendo, independe da condição de ser o mesmo Agente um servidor civil, estatutário ou celetista ou policial militar. Teixeira (2012, p. 36), citando Krigger, completa: “O agente [de trânsito] competente, portanto, é aquele que além de ter a capacidade civil, possui ainda, a atinente competência imposta por lei, tendo assim competência para o referido cargo a que esteja designado”.
  • 41. 40 Observa-se que o CTB não estipulou o tipo de vínculo que o servidor deve ter com a Administração Pública para que ele seja detentor do Poder de Polícia de Trânsito. A preocupação do legislador foi no sentido de que o servidor seja formal e legalmente investido como Agente da Autoridade de Trânsito antes de exercer o seu papel como fiscal encarregado de aplicação da lei de trânsito. Contribuindo com essa afirmação, Teixeira (2012, p. 22) mencionando Carlin, conclui: “Assim sendo, o exercício do poder de polícia deve ter amparo legal, do qual derivam seus limites, sobressaindo o direito ou interesse público em detrimento do individual”. 2.5.1 Limites à Discricionariedade do Agente de Trânsito Em que pese o Poder de Polícia possuir uma certa discricionariedade, como exposto em tópico anterior, ele também está vinculado às normas legais que o autorizam. Assim, a atribuição do Poder de Polícia de Trânsito está demarcada por dois limites: [...] o primeiro se encontra no pleno desempenho da atribuição, isto é, no amplo interesse de impor limitações ao exercício da liberdade e ao uso, gozo e disposição da propriedade; o segundo reside na observância dos direitos assegurados aos administrados pelo ordenamento positivo. É na conciliação da necessidade de limitar ou restringir o desfrute da liberdade individual e da propriedade particular com os direitos fundamentais, reconhecidos a favor dos administrados, que se encontram os limites dessa atribuição. (GASPARINI, 2009, p. 132) Segundo Di Pietro (2010, p. 122): “como todo ato da Administração Pública, o Poder de Polícia não poderia ser diferente, ainda que seja discricionário, se confronta com restrições estabelecidas pelo ordenamento jurídico”. Os limites do poder de polícia administrativa são demarcados pelo interesse social em conciliação com os direitos fundamentais do indivíduo assegurados na Constituição da República (art. 5º). Do absolutismo individual evoluímos para o relativismo social. Os Estados Democráticos, como o nosso, inspiram- se nos princípios de liberdade e nos ideais de solidariedade humana. Daí o equilíbrio a ser procurado entre a fruição dos direitos de cada um e os interesses da coletividade, em favor do bem comum. (MEIRELLES, 2004, p. 133) [destaque do autor]
  • 42. 41 Para Gasparini (2009, p. 132): “Assim, mesmo que a pretexto do exercício do poder de polícia, não se podem aniquilar os [...] direitos. Qualquer abuso é passível de controle judicial”. Ficou claramente expresso nesse estudo que o Poder de Polícia no qual o agente público está investido não tem o condão de extinguir direito algum do cidadão, mas tão somente restringir-lhe o uso na medida estritamente proporcional ao exagero praticado pelo administrado. Porém, há autores que afirmam que nem sempre o interesse público prevalece sobre o privado, como ensina Viegas (2012) ao defender que “[...] seria totalmente incompatível o interesse público sempre prevalecer sobre o interesse privado, uma vez que há direitos individuais expressamente assegurados pela nossa Carta Magna e o particular deve lutar pelos seus direitos”. O professor Carvalho Filho (2009, p. 87) extrai a aplicação do Princípio da Proporcionalidade nos atos públicos praticados com o uso do Poder de Polícia: O Princípio da proporcionalidade deriva, de certo modo, do poder de coerção de que dispõe a Administração ao praticar atos de polícia. Realmente, não se pode conceber que a coerção seja utilizada indevidamente pelos agentes administrativos, o que ocorreria, por exemplo, se usada onde não houvesse necessidade. Do mesmo modo, ressalva Mello citado por Teixeira (2012, p. 26): [...] no caso da utilização de meios coativos, que, bem por isso, interferem energicamente com a liberdade individual, é preciso que a Administração se comporte com extrema cautela, nunca se servindo de meios enérgicos que os necessários à obtenção do resultado pretendido pela lei, sob pena de vício jurídico que acarretará responsabilidade da Administração. Importa que haja proporcionalidade entre a medida adotada e a finalidade legal a ser atingida. [destaque do autor] Ainda sobre o possível abuso por parte do agente público, explica Di Pietro (2010, p. 122) que “[...] o poder de polícia não deve ir além do necessário para a satisfação do interesse público que visa proteger; a sua finalidade não é destruir os direitos individuais, mas, ao contrário, assegurar o seu exercício”.
  • 43. 42 Teixeira (2012) ensina que são conferidas prerrogativas à Administração Pública com o intuito exclusivo de atender aos interesses coletivos. Se a conduta administrativa é desproporcional, a conclusão inevitável é a de que um ou alguns indivíduos estão sendo prejudicados por excesso de poder, revelando-se ausente o verdadeiro interesse coletivo a ser perseguido e configurando-se, sem dúvida, ilegalidade que merece correção. (CARVALHO FILHO, 2009, p. 87) Destaca-se que, apesar do Poder de Polícia ser nato da Administração Pública, os abusos ocasionalmente praticados por servidores podem ser discutidos junto ao Poder Judiciário, sendo esta uma faculdade constitucional garantida ao cidadão. Cretella, citado por Carvalho Filho (2009, p. 82), corrobora com esta afirmativa quando diz que “[...] a faculdade repressiva não é, entretanto, ilimitada, estando sujeita a limites jurídicos: direitos do cidadão, prerrogativas individuais e liberdades públicas asseguradas na Constituição e nas leis.” [destaque do autor] Alexandrino e Paulo, mencionados por Teixeira (2012, p. 49) contribuem: A doutrina e a jurisprudência atuais enfatizam a necessidade de existirem instrumentos de controle do poder discricionário da administração, que permitam o adequado delineamento de seus legítimos limites, evitando o indevido uso da discricionariedade administrativa, como manto protetor de atos que, embora praticados sob o fundamento da discricionariedade, revistam insidiosa arbitrariedade. A ideia central é possibilitar um controle judicial mais efetivo dos atos discricionários praticados pela administração pública. Desse modo, “o poder administrativo concedido a autoridade pública tem limites certos e forma legal de utilização. Não é carta branca para arbítrios, perseguições ou favoritismos governamentais”, completa Teixeira (2012, p. 49) ao aludir Granjeiro. Corroborando com o entendimento acima, Medauar citada por Teixeira (2012, p. 49-50), disse que “a discricionariedade constitui uma espécie de liberdade, porém não uma liberdade absoluta, e sim sujeita a vínculo de natureza peculiar”. E continua explicando o porquê da discricionariedade conferida à Administração Pública:
  • 44. 43 Uma das explicações centra-se no seguinte: o Poder Executivo tem a função de direção política e administrativa, aí incluído o poder regulamentar; tais funções não poderiam ser desempenhadas corretamente se tudo fosse predeterminado, de modo absoluto, pela lei; o Estado contemporâneo, muito complexo, com amplas funções, não pode atuar sem flexibilidade; torna-se fundamental deixar margem de maleabilidade à Administração em época de rápidas mudanças; grandes metrópoles, convivência de massa, problemas sociais, grandes tragédias exigem, por vezes, rapidez de atuação e certa margem de escolha; a discricionariedade atende, portanto, a necessidade institucional. A Administração Pública possui certa discricionariedade quanto ao exercício do poder de polícia, no entanto seus limites são expressos em lei e seu abuso é considerado ilegal e torna o ato inválido, afirma Teixeira (2012). A respeito desse atributo, Di Pietro (2010, p. 119) ensina: Quanto à discricionariedade, embora esteja presente na maior parte das medidas de polícia, nem sempre isso ocorre. Às vezes, a lei deixa certa margem de liberdade de apreciação quanto a determinados elementos, como o motivo ou o objeto, mesmo porque ao legislador não é dado prever todas as hipóteses possíveis a exigir atuação de polícia. Assim, em grande parte dos casos concretos, a Administração terá que decidir qual o melhor momento de agir, qual o meio de ação mais adequado, qual a sanção cabível diante das previstas da norma legal. No uso do Poder de Polícia de Trânsito, o agente tem a discricionariedade de agir em determinadas ações, como na escolha do veículo a ser abordado e fiscalizado, mas torna-se ato vinculado a lavratura de um AIT se ocasionalmente for detectada alguma infração às normas de circulação e conduta. Ilustrando isto, temos: A discricionariedade, como já vimos, traduz-se na livre escolha, pela Administração, da oportunidade e conveniência de exercer o poder de polícia, bem como de aplicar as sanções e empregar os meios conducentes a atingir o fim colimado, que é a proteção de algum interesse público. Neste particular, e desde que o ato de polícia administrativa se contenha nos limites legais e a autoridade se mantenha na faixa de opção que lhe é atribuída, a discricionariedade é legítima. (MEIRELLES, 2004, p. 134)
  • 45. 44 E continua Meirelles (2004, p. 139) dizendo que “sacrificar um direito ou uma liberdade do indivíduo sem vantagem para a coletividade invalida o fundamento social do ato de polícia, pela desproporcionalidade da medida”. Assim, Viegas (2012) contribui afirmando que o princípio da supremacia do interesse público deve ter uma aplicação limitada, bem como deve ser pautado no princípio da razoabilidade e proporcionalidade, incumbindo ao administrador ponderar os interesses em jogo, uma vez que o particular deve ser reconhecido como um ser social possuindo legítimas prerrogativas individuais. No mesmo sentido, conclui Teixeira (2012, p. 48) citando Carlin: Existe discricionariedade quando a lei deixa à Administração a possibilidade de, no caso concreto, escolher entre duas ou mais alternativas, todas válidas perante o Direito. E essa escolha se faz segundo critérios de oportunidade, conveniência, justiça, equidade, razoabilidade, interesse público, sintetizados no que se convencionou chamar de mérito do ato administrativo. Observa-se que o Poder de Polícia de Trânsito, apesar de possuir certa discricionariedade, está longe de oferecer total liberdade ao agente público que o detém. Especificamente ao Agente de Trânsito, é vedado aplicar a lei ao seu bel prazer, tomando as decisões de acordo com sua análise pessoal. Na aplicação das normas de trânsito, assim como nos demais atos administrativos, a discricionariedade do Agente está vinculada aos institutos da conveniência e oportunidade, excluindo-se ações incentivadas por sentimento pessoal ou sentimental. O CTB divide as sanções de trânsito entre penalidades e medidas administrativas. Destas, a primeira é ato vinculado à função do Agente de Trânsito, ele é obrigado a pratica-la quando detectar determinada infração à legislação. Para as medidas administrativas é facultado ao Agente de Trânsito aplica-las, tomando sua decisão de acordo com a conveniência e oportunidade, como já exposto. Portanto, não há que se falar em discricionariedade no que se refere às penalidades, como a confecção de autuação, por exemplo, pois apenas as medidas
  • 46. 45 administrativas dão uma certa liberdade de atuação ao Agente, mas, ainda assim, vinculando-o a determinadas circunstâncias. Para a análise das citadas elementares conveniência e oportunidade, o artigo 269 do CTB, que trata das medidas administrativas, traz expresso em seu Parágrafo 1º: A ordem, o consentimento, a fiscalização, as medidas administrativas e coercitivas adotadas pelas autoridades de trânsito e seus agentes terão por objetivo prioritário a proteção à vida e à incolumidade física da pessoa”. (BRASIL, 1997). Dessa forma, não haverá licitude na conduta do Agente que, com a escusa de usar o conhecido “bom senso”, deixar de autuar ou adotar outra medida que não a prevista na legislação de trânsito. Como dito, exceção a esta regra refere-se à aplicação das medidas administrativas, que serão adotadas de acordo com a proteção à vida e à incolumidade física da pessoa. Em que pese a maioria dos doutrinadores aqui citados demonstrarem preocupação com um possível abuso por parte do agente público no uso do seu Poder de Polícia, há de se verificar também a passividade do servidor diante de uma infração à lei de trânsito. É importante observar que, assim como o excesso do Agente é passível de controle externo e até mesmo uma punição disciplinar, também sua omissão pode leva-lo às mesmas sanções ou a outras até mais graves. Não raras vezes pode-se observar um cidadão cometendo uma infração de trânsito com seu veículo, sendo ele abordado pelo Agente da Autoridade de Trânsito com circunscrição sobre o local. Ao invés de confeccionar o devido auto de infração, o Agente se limita a orientar o condutor sobre sua conduta ilícita. Destaca-se que esta atitude do Agente se faz mais ilícita do que a do condutor do veículo, pois ele como encarregado de aplicação da lei não a aplicou, ignorou-a sem justificativa plausível. Assim, pode-se afirmar que o intuito deste estudo foi demonstrar que a discricionariedade na ação do Agente de Trânsito, investido com o Poder de Polícia Administrativa, está vinculada a certos requisitos exigidos pela própria norma. Diante de uma infração de trânsito, não é facultado ao Agente lavrar a autuação; por força da norma ele é obrigado a fazê-la. Sua discricionariedade encontra-se tão somente na aplicação das medidas administrativas previstas para a infração, como a retenção e a remoção do veículo e outras.
  • 47. 46 3 CONCLUSÃO Lavando-se em conta o que foi observado no desenrolar desta pesquisa, conclui-se que o Estado exerce o seu poder soberano sobre os seus cidadãos administrados por meio do seu Poder de Polícia Administrativa. Este poder é imprescindível para se manter a prevalência do interesse público e da coletividade sobre o interesse individual do administrado. Observou-se ainda que o Poder de Polícia da Administração Pública, apesar de ser dotado de uma certa discricionariedade, é um poder-dever porque o Estado está vinculado a aplica-lo de acordo com a própria norma. Além disso, é lícito ao agente público apenas limitar o uso e o gozo dos direitos dos particulares em prol da maioria ou da própria administração, mas jamais poderá vir a extinguir tais direitos. No que se refere ao Poder de Polícia de Trânsito percebeu-se que o Sistema Nacional de Trânsito congrega diversas autoridades de trânsito e que estas estão distribuídas nos âmbitos federal, estadual e municipal. Cada autoridade é responsável pela organização, sinalização e fiscalização de trânsito na área de sua competência. Demonstrou-se que o Agente de Trânsito pode ser servidor civil, celetista ou estatutário, ou até mesmo policial militar, desde que devidamente conveniado com o órgão de trânsito com circunscrição sobre o local de atuação. A nomeação de qualquer cidadão como Agente de Trânsito deve ser dotada da devida formalidade, para que haja transparência e legalidade na delegação do Poder de Polícia de Trânsito. Além disso, restou minuciosamente comprovado que o Agente de Trânsito possui limites legais para sua atuação, não podendo agir de acordo com a sua preferência. A discricionariedade presente no Poder de Polícia está vinculada ao cumprimento de certos requisitos legais, tais como a conveniência e a oportunidade, sem as quais qualquer ato público se torna ilícito e passível de nulidade. Finalmente, conclui-se que a aplicação do popular “bom senso” na fiscalização de trânsito configura ato ilícito por parte do Agente quando este detecta uma infração à lei de trânsito, mas opta por não fazer a devida autuação. Ao agente é deferida uma certa discricionariedade somente na aplicação das medidas administrativas, que podem ser dispensadas com a observância dos requisitos legais.
  • 48. 47 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ANDRADE, Helder Paulo de. Poder de Polícia de Trânsito: Legitimidade e Delegação. 2013. 71 f. Monografia (Graduação) – Centro Universitário de Lavras – Unilavras, Bacharelado em Direito, Lavras, 2013. BACELLAR FILHO, Romeu Felipe. Responsabilidade civil extracontratual das pessoas jurídicas de direito privado prestadoras de serviço público. Datadez: Interesse Público, [S.l], n. 06, mar. / abr. 2001. BRASIL. Constituição da República Federativa do Brasil. Diário Oficial da União, Brasília, 05 out. 1988. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/ constituicao/constituicao.htm>. Acesso em: 12 nov. 2015. ______. Lei n. 5.172, de 25 de outubro de 1966. Institui o Código Tributário Nacional. Diário Oficial da União, Brasília, 27 out. 1966, retificado 31 out. 1966. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L5172Compilado.htm>. Acesso em: 12 nov. 2015. ______. Lei n. 9.503, de 23 de setembro de 1997. Institui o Código de Trânsito Brasileiro. Diário Oficial da União, Brasília, 25 set. 1997. Disponível em: <http://www.planalto.gov.br/ccivil_03/leis/L9503.htm>. Acesso em: 17 dez. 2015. CARVALHO FILHO, José dos Santos. Manual de Direito Administrativo. 21. ed. rev., amp. e atual. Rio de Janeiro: Lumen Juris, 2009. CUNHA JÚNIOR, Dirley da. Curso de Direito Administrativo. 7. ed. rev. e atual. Bahia: Jus Podivm, 2008. DI PIETRO, Maria Sylvia Zanella. Direito Administrativo. 23. ed. São Paulo: Atlas, 2010. FAVRETO, Rogério. A municipalização do trânsito e o serviço de inspeção veicular. Datadez: Interesse Público, [S.l.], jul. / ago. 2000. GASPARINI, Diogenes. Direito Administrativo. 14. ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2009. HENRIQUES, Antônio; MEDEIROS, João Bosco. Monografia no Curso de Direito. 3. ed. São Paulo: Atlas, 2003. MEDAUAR, Odete. Direito Administrativo Moderno. 13. ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2009. MEIRELLES, Hely Lopes. Direito Administrativo Brasileiro. 29. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2004. MELLO, Celso Antônio Bandeira de. Curso de Direito Administrativo. 26. ed. São Paulo: Malheiros Editores, 2009.
  • 49. 48 PONTIFÍCIA UNIVERSIDADE CATÓLICA DE MINAS GERAIS. Pró-Reitoria de Graduação. Sistema Integrado de Bibliotecas. Orientações para elaboração de trabalhos científicos: projeto de pesquisa, teses, dissertações, monografias e trabalhos acadêmicos, conforme a Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), a American Psychological Association (APA) e o Comitê Internacional de Editores de Revistas Médicas (VANCOUVER). Belo Horizonte, 2015. Disponível em: <www.pucminas.br/biblioteca>. Acesso em: 20 nov. 2015. TEIXEIRA, Paula do Canto. O Poder de Polícia de Trânsito: o uso do “bom senso” pelo agente público. 2012. 89 f. Monografia (Graduação em Direito) – Universidade do Extremo Sul Catarinense, Criciúma. Disponível em: <http://repositorio.unesc.net/ bitstream/handle/1/1200/Paula%20do%20Canto%20Teixeira.pdf?sequence=1>. Acesso em: 19 set. 2015. VIEGAS, Cláudia Mara de Almeida Rabelo. O princípio da supremacia do interesse público: uma visão crítica da sua devida conformação e aplicação. Juris Síntese, [S.l.], n. 93, jan. / fev. 2012.