SOCIAL REVOLUTIONS, THEIR TRIGGERS FACTORS AND CURRENT BRAZIL
Desafios da administração estratégica e competitividade em empresas no século XXI
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OS DESAFIOS DA ADMINISTRAÇÃO ESTRATÉGICA DE EMPRESAS NO
SÉCULO XXI
Fernando Alcoforado*
O contexto atual das organizações estimula algumas reflexões sobre os desafios da
Administração de Empresas no futuro. Os desafios a serem enfrentados pelas empresas no
futuro podem ser resumidos em três pontos principais: 1) o caos e complexidade da
economia mundial; 2) a competitividade no momento atual; e, 3) a competição pelo futuro.
O desafio do caos e da complexidade da economia mundial
O grande desafio enfrentado pelos dirigentes empresariais na era contemporânea é
representado pela necessidade de planejar o desenvolvimento de seus sistemas produtivos
em um ambiente de elevada complexidade e de mudanças muitas vezes caóticas. Os
modelos de gestão convencionais consideram a administração uma atividade de “feedback”
negativo, isto é, estabelece uma estratégia e conduz a empresa na direção desejada com a
correção dos desvios entre o plano traçado e os resultados alcançados.
Numa época em que tudo muda rapidamente, pode-se afirmar que os princípios que regem
esses modelos estão ultrapassados quando aplicados em um ambiente externo como o atual
caracterizado pela instabilidade. Além disso, as decisões tomadas por seus dirigentes em
um determinado momento pode não levar ao resultado desejado porquanto será afetado
inexoravelmente por mutações que venham a ocorrer interna e externamente à organização
ao longo do tempo.
Para ser eficaz, o processo de planejamento precisa levar em conta, necessariamente, a
instabilidade, a incerteza, com suas turbulências e seus riscos. No ambiente econômico
contemporâneo, já se tornou lugar-comum falar em turbulência e instabilidade dos
mercados como o ocorrido em 2008 com a crise do sistema capitalista mundial que afetou
todos os países e empresas. Uma das grandes dificuldades do processo de planejamento é o
de minimizar as incertezas quando se sabe que a mudança é a única regra estável no atual
momento e que o passado serve cada vez menos como base para projetar o futuro.
As visões clássicas a respeito da desordem foram todas depreciativas, pois a ciência esteve
sempre orientada para a descoberta de certezas. Todo conhecimento reduzia-se à ordem, e
toda aleatoriedade seria apenas aparência, fruto de nossa ignorância, a ser necessariamente
superada em algum momento futuro. O desenvolvimento da Teoria do Caos a partir da
década de 1970 contribuiu para a formulação de um modelo muito diferente do que
prevalecia até então que era basicamente determinista e linear. No modelo baseado na
Teoria do Caos, o mundo é mais complexo e fundamentalmente não determinista e não
linear. A Teoria do Caos se impôs a partir do avanço no entendimento dos processos
lineares e não lineares e especialmente, com a ajuda dos computadores.
Comumente o emprego do termo "caos" está sempre associado à desordem. Caos, em
ciência, não é desordem, "é uma ordem mascarada de aleatoriedade", segundo Lorenz. O
advento da Teoria do Caos veio legitimar a desordem e o acaso no campo científico.
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Doravante, pode-se continuar conceituando alguns fenômenos como estritamente
deterministas, mas reconhece-se que tais fenômenos são exceção no domínio dos eventos
naturais. Ficou logo claro para alguns pensadores das ciências sociais que a teoria do caos e
da complexidade lançaria muita luz sobre as organizações humanas como companhias,
mercados, economias e ecologia. As coisas são mais do que a soma de suas partes;
equilíbrio é morte; causas são efeitos e efeitos são causas; desordem e paradoxo estão em
toda parte.
O que a ciência contemporânea vem demonstrando, por meio da Teoria do Caos e da
Complexidade, é que tanto o equilíbrio quanto as relações de causa e efeito são antes
exceção do que regra. Este entendimento nos permite compreender melhor as dinâmicas
organizacionais nestes contextos de forte turbulência, bem como divisar novas
possibilidades para que as empresas tornem-se capazes não apenas de "dialogar" com esta
turbulência, mas de tirar partido dela para poder evoluir.
O que a Teoria do Caos está fazendo, em essência, é demonstrar que tudo no Universo é
composto tanto por ordem como por desordem, cabendo à ciência aceitar que a incerteza
não tem como ser dirimida. O objetivo último do conhecimento não deve mais ser o de
desvendar todos os segredos do mundo, mas sim o de propor-se a dialogar com este mundo
e suas incertezas.
No modelo baseado na Teoria do Caos, as organizações passam a ser vistas como sistemas
sujeitos a oscilações que poderiam ser amortecidas, ou seja, que os sistemas seriam capazes
de retornar ao equilíbrio. O modelo considerado é agora o de um sistema autorregulado,
onde os desvios são identificados por sinalizações de feedback e então compensados,
corrigidos, atenuados ou neutralizados, sempre por meio de mudanças incrementais.
Chegou-se a tal modelo acreditando-se que oscilações que se amplificassem com o tempo
conduziriam o sistema ao colapso, e que apenas os sistemas capazes de manterem-se
estáveis sobreviveriam no tempo.
Prigogine defende a tese de que pequenas perturbações aleatórias podem ser rapidamente
amplificadas, levando o sistema a uma ainda maior instabilidade, até um limite denominado
"ponto de bifurcação", a partir do qual é rompida a estrutura do sistema (uma "quebra de
simetria"). Após o ponto de bifurcação, o comportamento do sistema torna-se errático por
algum tempo, mas tende a estabilizar-se em um novo equilíbrio - só que qualitativamente
distinto do original. O sistema agora apresenta novos modos de organização,
estruturalmente mais complexos. Ele evoluiu.
O mais notável neste processo é, segundo Prigogine, o fato de ser impossível prever o
caminho evolutivo que o sistema irá tomar a partir do ponto de bifurcação. Durante a fase
de instabilidade, o sistema "experimenta" inúmeras variantes de "futuros possíveis", antes
de "decidir-se" por seu novo patamar estável de complexidade. Todo o processo é, em
suma, um processo de auto-organização, que resguarda o sistema de ingressar no caminho
da entropia, isto é, da inexorável decadência (PRIGOGINE, Ilya, STENGERS, Isabelle. O
Fim das Certezas - Tempo, Caos e as Leis da Natureza. São Paulo: UNESP, 1996 e
PRIGOGINE, Ilya, STENGERS, Isabelle. Entre o Tempo e a Eternidade. São Paulo:
Companhia das Letras, trad. brasileira 1992, 1988).
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Para fazer frente às incertezas do futuro, as empresas devem utilizar a técnica de Cenários
adotando como premissa que o futuro é múltiplo, muitos futuros são possíveis e o caminho
que conduz aos muitos futuros não é forçosamente único (GODET, Michel. Manual de
Prospectiva Estratégica. Lisboa: Dom Quixote, 1993). O propósito essencial de cenários é
apresentar aos executivos uma imagem significativa de futuros prováveis, em horizontes de
tempo diversos. A partir dos cenários os executivos podem projetar o inter-relacionamento
de sua organização com o ambiente daqui há alguns anos. Eles podem, também, projetar
formas de alterar esse relacionamento, visando assegurar um posicionamento mais
favorável da empresa no futuro.
Cabe observar que Cenário representa uma descrição sobre um futuro e de seu caminho
correspondente. O Cenário é um conjunto formado pela descrição de uma situação futura e
do caminho dos acontecimentos que permitem passar da situação origem à situação futura.
Os Cenários têm por finalidade preparar a organização para as crescentes incertezas do
futuro, apoiar a tomada de decisão para formulação dos grandes objetivos e estratégias
institucionais, identificar oportunidades e riscos originados de mudanças no ambiente
externo e estabelecer referencial para a elaboração do plano estratégico da organização.
É importante que se faça uma distinção clara entre cenários e previsões. Frequentemente
previsões não passam de simples extrapolações de tendências. Cenários por sua vez, são
sistemas complexos, que buscam revelar sinais precoces de alterações do futuro. Mas, o que
constitui um "bom" cenário?
1. Bons cenários afetam o julgamento dos executivos sobre como o futuro deve ser. Muitas
vezes cenários são desenhados para serem profecias auto-realizáveis (positivas ou
negativas). Por isso, a arte de preparar e interpretar um cenário é apenas o primeiro passo
para alterar o futuro.
2. Bons cenários reconhecem que ainda que passado e presente sejam importantes no
estabelecimento de direções para o futuro, o objetivo de executivos é transformar as
tendências, o que requer visões de um futuro radicalmente diferente. Em outras palavras,
eles levam em conta a dinâmica do futuro e o poder de ação humana para moldá-lo.
3. Bons cenários permitem a tradução de declarações sobre o futuro em insights sobre
riscos/probabilidades para o tomador de decisões. Cenários de qualidade guiam os
executivos em "cálculos" mentais sobre o que pode acontecer e as inter-relações entre os
fatos e suas decisões.
4. Bons cenários testam todos os elementos de um sistema mais amplo e suas interações
com o ambiente. Por isso, eles levam em conta, de forma abrangente e equilibrada, aspectos
econômicos, tecnológicos, sociais, políticos, psicológicos, culturais, espirituais, etc.
5. Bons cenários oferecem descrições tão vívidas do futuro que os executivos podem
colocar-se na situação de compreender esse futuro de uma maneira que não seria possível
apenas por meio de números e gráficos.
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6. Bons cenários dão "pistas" que podem ser verificadas anos antes da ocorrência dos
eventos que elas sinalizam. Essa é uma diferença fundamental entre cenários de qualidade e
meras especulações futurísticas sem fundamento.
7. Bons cenários são resultado de reflexões de pessoas com referenciais intelectuais,
culturais e sociais diversos. A diversidade de opiniões assegura a riqueza dos futuros
idealizados e dá margem aos executivos para optar pelo futuro que eles desejam construir.
O desafio da competição no momento atual
O desafio da competitividade nos planos nacional e mundial exige que as empresas se
constituam em rede. Estudos recentes sugerem que uma das formas mais efetivas de
atuação das empresas ocorre por meio da cooperação em redes, pois as estratégias isoladas
dificilmente conduzem à obtenção de informações e de recursos financeiros que permitam a
exploração de novos mercados, principalmente em se tratando de pequenas e médias
empresas. Esses estudos também mostram que o sucesso da organização em redes depende
do desenvolvimento de uma relação de confiança entre os parceiros, um grande desafio que
se apresenta àquelas organizações não acostumadas a este tipo de procedimento.
A convergência entre as exigências organizacionais e a transformação tecnológica
estabeleceu a integração em redes como a forma dominante de concorrência nos setores
mais avançados da economia, com tendência a se estender a todos os tipos de organizações.
O Japão foi quem inaugurou após a Segunda Guerra Mundial de forma bem sucedida este
modelo de integração em redes. Nesse novo contexto as barreiras à entrada elevaram-se, e
ampliou-se o processo de exclusão. A cooperação e os sistemas de rede oferecem a
possibilidade de dividir custos e riscos, bem como de manter-se em dia com a informação
constantemente renovada. Mas as redes também atuam como "porteiros". Dentro delas,
novas oportunidades são criadas permanentemente. Fora das redes, a sobrevivência fica
cada vez mais difícil para as empresas.
O advento das novas tecnologias da informação possibilitou o surgimento de uma nova
forma organizacional como característica da economia informacional e global, "a empresa
em rede". O desempenho de uma determinada rede dependerá de dois de seus atributos
fundamentais: a "conectividade", que é capacidade estrutural de facilitar a comunicação
sem ruídos entre seus componentes; e a "coerência", na medida em que há interesses
compartilhados entre os objetivos da rede e de seus componentes. As organizações capazes
de gerar conhecimentos e processar informações com eficiência; adaptar-se à geometria
variável da economia global; ser flexível o suficiente para transformar seus meios
rapidamente sob o impacto da rápida transformação cultural, tecnológica e institucional; e
inovar, já que a inovação torna-se a principal arma competitiva, conseguem se sustentar
nesse furacão que envolve as organizações.
O argumento de que a empresa de grande porte é a melhor maneira de reduzir incertezas e
minimizar custos transacionais, absorvendo transações na empresa, simplesmente não se
aplica quando confrontada com as informações empíricas do processo espetacular de
desenvolvimento capitalista, baseado em redes externas à empresa. Também se atribui o
desenvolvimento da grande empresa com várias unidades na era contemporânea, ao
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crescente tamanho do mercado e à disponibilidade da tecnologia de comunicações que
possibilitam o controle desse amplo mercado pela grande empresa, obtendo com isso,
economias de escala e escopo e absorvendo-as na empresa. Entretanto, análises empíricas
sobre a estrutura e prática das grandes empresas globais parecem mostrar que esses dois
pontos de vista estão ultrapassados e devem ser substituídos pelo surgimento das redes
nacionais e internacionais de empresas e de subunidades empresariais, como a forma
organizacional básica da economia informacional / global.
Os efeitos organizacionais são exatamente os opostos daqueles esperados pela teoria
econômica tradicional. Embora o tamanho do mercado devesse induzir a formação de
empresa vertical com várias unidades, a globalização da concorrência dissolve a grande
empresa em uma teia de redes multidirecionais, que se tornam a verdadeira unidade
operacional. Isto significa dizer que o aumento dos custos de transação devido ao acréscimo
de complexidade tecnológica não resulta na internalização das transações na empresa, mas
na externalização das transações e em "custos compartilhados" por toda a rede, aumentando
as incertezas, mas também possibilitando sua difusão.
A maioria das atividades econômicas está organizada em cinco tipos de redes:
Redes de fornecedores: incluem subcontratação, acordos entre um cliente (a empresa
foco) e seus fornecedores de insumos intermediários;
Redes de produtores: acordos de coprodução, que possibilitam a produtores
concorrentes juntarem suas capacidades de produção e recursos financeiros/ humanos
com a finalidade de ampliar seus portfólios de produtos, bem como sua cobertura
geográfica;
Redes de clientes: que são os encadeamentos à frente, entre a indústria e redes de
distribuidores e canais de comercialização;
Coalizões padrão: coordenadas por potenciais definidores de padrões globais com o
objetivo explícito de prender tantas empresas quanto possível a seu padrão de interface;
e
Redes de cooperação tecnológica: que facilitam a aquisição de tecnologia para
projetos, capacitam o desenvolvimento conjunto dos processos e da produção e
permitem acesso compartilhado a conhecimentos científicos genéricos e de P&D.
As empresas multinacionais são as detentoras do poder oriundo da riqueza e tecnologia na
economia global, visto que a maior parte das redes é estruturada em torno delas. Mas, ao
mesmo tempo, são internamente diferenciadas em redes descentralizadas e externamente
dependentes de sua participação em uma estrutura complexa e em transformação de redes
interligadas. Além disso, cada componente dessas redes internas e externas está inserido em
ambientes culturais/ institucionais específicos (nações, regiões, locais) que afetam a rede
em vários níveis. Em geral, as redes são assimétricas, mas cada um de seus elementos não
consegue sobreviver sozinho ou impor suas regras.
No entanto, as culturas e as instituições continuam a dar forma aos requisitos
organizacionais da economia, em uma interação entre a lógica produtiva, a base tecnológica
em transformação e as características do ambiente social. A arquitetura e composição das
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redes de empresas em formação em todo o mundo são influenciadas pelas características
das sociedades em que essas redes estão inseridas. Por exemplo, o conteúdo e as estratégias
das empresas eletrônicas na Europa dependem muito das políticas da União Europeia no
tocante à redução de dependência tecnológica do Japão e dos Estados Unidos, mas a aliança
da Siemens com a IBM e a Toshiba em microeletrônica é forçada por imperativos
tecnológicos.
A empresa em rede fica cada vez mais internacional e sua gestão resultará da interação
administrativa entre a estratégia global da rede e os interesses nacional e regionalmente
enraizados de seus componentes. As diversas correntes dos estudos organizacionais
contemporâneos têm que se dar conta da complexidade dos ambientes internos e externos
onde gravitam as organizações, e procurar sinergias e interrrelações entre algumas
abordagens, especialmente entre as do poder e das instituições, não desconsiderando
aspectos importantes das outras abordagens, como as novas tecnologias da informação e
comunicação, a eficiência e a própria pressão competitiva nos diversos ambientes
organizacionais.
Há um código cultural comum nos diversos mecanismos da empresa em rede. É composto
de muitas culturas, valores e projetos que passam pelas mentes e informam as estratégias
dos vários participantes das redes, mudando no mesmo ritmo que os membros da rede e
seguindo a transformação organizacional e cultural das unidades da rede. É de fato uma
cultura, mas uma cultura no efêmero, uma cultura de cada decisão estratégica, uma colcha
de retalhos de experiências e interesses, em vez de uma carta de direitos e obrigações. É
uma cultura virtual multifacetada, como nas experiências visuais criadas por computadores
no espaço cibernético ao reorganizar a realidade. O espírito Da era da informação é a
cultura da destruição criativa, acelerada pela velocidade dos circuitos optoeletrônicos que
processam seus sinais.
O desafio da competição pelo futuro
Hamel e Prahalad argumentavam que, em vez de pensar na empresa como um conjunto de
unidades de negócios, os gerentes deveriam começar a encará-la como um conjunto de
competências essenciais, ou seja, habilidades e tecnologias que permitem a uma empresa
oferecer benefícios aos clientes (Hamel, Gary e Prahalad, C. K. Competindo Pelo Futuro.
Rio: Editora Campus, 2005). Hamel e Prahalad observam que muitas vezes o que impede
as empresas de imaginar o futuro e descobrir um novo espaço competitivo não é não
conhecer o futuro, mas sim o fato de que os gerentes tendem a ver o futuro através das
lentes dos mercados aos quais servem atualmente.
Hamel e Prahalad sugerem que, para ver o futuro, os gerentes devem deixar de pensar nos
produtos e serviços existentes e começar a pensar em suas funcionalidades subjacentes. Em
vez de perguntar: Qual é nosso produto ou serviço?, os gerentes devem perguntar: Que
benefícios os produtos ou serviços existentes oferecem aos clientes?
Hamel e Prahalad inventaram um novo termo: arquitetura estratégica. A arquitetura
estratégica é basicamente um plano de alto nível da utilização de novas funcionalidades, da
aquisição de novas competências ou da migração das competências existentes e
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reconfiguração da interface com os clientes, escrevem eles. É equivalente a uma planta de
arquitetura, suficientemente detalhada para mostrar as estruturas básicas, mas não a ponto
de mostrar a localização exata de todas as tomadas elétricas. No entanto, a arquitetura
estratégica - ou plano, se você tiver que usar o termo – é suficientemente detalhada para
oferecer orientação sobre o que sua empresa deveria estar fazendo nesse momento para se
preparar para o futuro.
Uma arquitetura estratégica mostra à organização que competências ela deve começar a
desenvolver exatamente agora. Que novos grupos de clientes devem começar a entender
exatamente agora, quais novos canais deve explorar neste momento, quais novas
prioridades de desenvolvimento deve buscar neste momento para interceptar o futuro. A
arquitetura estratégica é um amplo plano de abordagem à oportunidade. A questão
abordada por uma arquitetura estratégica não é o que fazer para maximizar a receita da
empresa ou entrar em um mercado existente de produtos, mas sim o que deve fazer hoje,
em termos de aquisição de competências, como preparação para captar uma fatia
significativa das receitas futuras em uma arena de oportunidades emergentes.
A transformação organizacional precisa ser impelida por um ponto de vista sobre o futuro
da indústria. Como a empresa quer que este ramo de atividade seja moldado nos próximos
cinco ou dez anos? O que precisa fazer para que ele evolua da maneira mais vantajosa para
a empresa? Que capacidades e técnicas a empresa precisa começar a desenvolver agora, se
quiser ocupar o ponto de destaque no futuro? Como a empresa deve se organizar para
oportunidades que podem não estar totalmente dentro do seu campo de ação atual? Como a
maioria das empresas não começa com uma visão compartilhada do futuro, a primeira
missão dos diretores é desenvolver um processo para reunir a sabedoria coletiva dentro da
organização. A preocupação com o futuro, uma noção de onde estão as oportunidades, e
uma compreensão da mudança organizacional não são domínio de qualquer grupo
específico; pessoas de todos os níveis da empresa podem ajudar a definir o futuro.
Para criar o futuro é preciso uma antevisão do mundo dos negócios. Por que falar em
antevisão, e não em visão? A visão conota um sonho ou uma aparição. A antevisão nos
negócios se baseia em visões profundas, em tendências tecnológicas, demográficas,
políticas e em estilo de vida, que podem ser canalizadas para reescrever as regras do ramo
de atividade e criar novos espaços competitivos. Embora a compreensão das implicações
em potencial dessas tendências exija criatividade e imaginação, qualquer “visão” que não
se apoie sobre uma base sólida provavelmente será quimérica. Outros desafios dizem
respeito ao estabelecimento de relações de confiança entre os stakeholders (proprietários da
empresa, acionistas, empregados, fornecedores, clientes, sindicatos patronais e de
trabalhadores, comunidades e governos, entre outros), bem como ao atendimento das
demandas sobre o comportamento ético e a responsabilidade corporativa.
O movimento de expansão das fusões e aquisições internacionais tem mudado as
configurações de propriedade no mundo inteiro. Essa questão vem se tornando cada vez
mais importante quando se considera o movimento de mudança na propriedade das
empresas com a abertura econômica em nível mundial. No início do capitalismo, essa
questão não se apresentava relevante, pois quem administrava a empresa era o dono. Com a
expansão e o aumento do tamanho das empresas, houve necessidade de delegar decisões e
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responsabilidades a profissionais de gerência. Segundo alguns autores, a necessidade de
delegar decisões gerou o que na literatura se denomina “problema de agência”, que se
refere às relações de confiança entre os investidores e seus representantes.
A teoria diz que certas características humanas, como tendência ao egoísmo e ao
oportunismo, motivam decisões que beneficiam os gerentes, mas não os acionistas,
afetando as relações de confiança entre esses agentes. Tal problema se torna mais grave em
situações nas quais a delegação de responsabilidade é prioritária em virtude da grande
dispersão de acionistas. Na Inglaterra e nos Estados Unidos existe uma tendência a colocar
um enorme poder nas mãos do executivo principal.
Os escândalos recentes, envolvendo empresas como Enron e WorldCom nos Estados
Unidos, trouxeram à tona várias questões importantes relativas ao governo e à gestão das
empresas. Uma delas se refere à passividade, à falta de informação e de profissionalização
dos conselhos de administração. Outra se refere ao comportamento oportunista, ineficiente
e corrupto dos executivos principais de certas empresas, levando a enormes prejuízos para
os acionistas minoritários. Uma terceira se refere à relação deficiente dos acionistas e da
gerência com outros stakeholders, como os empregados e os clientes.
A necessidade de controlar a corrupção e de impor limites aos altos salários dos executivos
tem dado origem a uma das principais contradições do capitalismo contemporâneo. Como o
problema de agência agrega os interesses dos acionistas em torno da geração de valor, isso
reforça o consenso de que o problema da decência e da ética só poderá ser resolvido por
meio de algumas medidas-chave, como a maior vigilância sobre o executivo principal e o
uso de procedimentos operacionais e contábeis que garantam a geração de valor.
No entanto, reconhece-se se que a adoção de critérios éticos pode ser muito mais facilmente
obtida por meio da cooperação e da participação de outros stakeholders nas decisões
empresariais. Assim, paradoxalmente, a ênfase na geração de valor – que atribui o poder de
vigilância da gerência predominantemente aos investidores e proprietários – pode fracassar
em suas intenções, pois negligencia a contribuição dos stakeholders. Além disso, a
orientação excessiva da gerência para com a geração de valor tem frequentemente levado as
empresas a adotar medidas que ferem as determinações dos acordos implícitos com os
empregados.
Como a empresa tem de gerar valor para seus acionistas e, ao mesmo tempo, pagar altos
salários aos executivos, cabe a outros stakeholders pagar esses custos. Pode-se começar
pelos clientes. A máxima de que “o cliente é o rei” tem servido para justificar práticas que,
na verdade, servem para criar barreiras entre estes e a empresa. A terceirização por meio de
call centers é uma delas. Dificilmente se consegue entrar em contato com a área
operacional da empresa por meio deles. Na maioria dos casos, seus funcionários não estão
aptos a resolver os problemas do cliente porque não conhecem a empresa e o contexto em
que o problema aparece.
Mais recentemente, os call centers vêm se constituindo em unidades de lucro para as
empresas por meio de contratos com companhias telefônicas. Frequentemente, são os
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clientes quem pagam o custo dos call centers, pois quanto mais tempo permanecem na fila
de espera, mais a empresa ganha no custo da chamada.
Outra prática que tem sido abusiva é a do downsizing, e nesse caso os que pagam os custos
são os empregados. A sede dos executivos por poder e compensação financeira tem
reforçado essa prática, e até hoje não se sabe o suficiente de que maneira o downsizing e
sua irmã gêmea, a terceirização, contribuem para a melhoria do desempenho
organizacional. Em geral, os movimentos de downsizing seguem uma mudança na
propriedade das empresas, pois nessa ocasião torna-se mais fácil ignorar as regras dos
acordos implícitos com os empregados. Estudos recentes têm mostrado que o downsizing
constitui a principal forma de agregar valor para os shareholders e expropriar os
empregados. Os que ficam têm de assumir as atribuições dos que vão embora, além de
outras novas. Os que perdem o emprego raramente conseguem posições equivalentes em
outras empresas.
Assim, o mais premente desafio que se impõe à empresa do século XXI é o da
responsabilidade corporativa, pois é aí que se muda a orientação de curto prazo para uma
perspectiva de longo prazo. Gradualmente, vem-se formando um consenso de que a
sobrevivência da empresa no longo prazo depende da construção de uma relação mais
equilibrada com seus vários stakeholders. Talvez o envolvimento mais efetivo destes nas
decisões que lhes afetam venha a ser o meio eficaz de controlar os excessos da ênfase na
geração de valor, o que certamente poderá contribuir para a construção de um ambiente de
maior confiança nas organizações.
*Fernando Alcoforado, 73, engenheiro e doutor em Planejamento Territorial e Desenvolvimento Regional
pela Universidade de Barcelona, professor universitário e consultor nas áreas de planejamento estratégico,
planejamento empresarial, planejamento regional e planejamento de sistemas energéticos, é autor dos livros
Globalização (Editora Nobel, São Paulo, 1997), De Collor a FHC- O Brasil e a Nova (Des)ordem Mundial
(Editora Nobel, São Paulo, 1998), Um Projeto para o Brasil (Editora Nobel, São Paulo, 2000), Os
condicionantes do desenvolvimento do Estado da Bahia (Tese de doutorado. Universidade de Barcelona,
http://www.tesisenred.net/handle/10803/1944, 2003), Globalização e Desenvolvimento (Editora Nobel, São
Paulo, 2006), Bahia- Desenvolvimento do Século XVI ao Século XX e Objetivos Estratégicos na Era
Contemporânea (EGBA, Salvador, 2008), The Necessary Conditions of the Economic and Social
Development- The Case of the State of Bahia (VDM Verlag Dr. Müller Aktiengesellschaft & Co. KG,
Saarbrücken, Germany, 2010), Aquecimento Global e Catástrofe Planetária (P&A Gráfica e Editora,
Salvador, 2010), Amazônia Sustentável- Para o progresso do Brasil e combate ao aquecimento global
(Viena- Editora e Gráfica, Santa Cruz do Rio Pardo, São Paulo, 2011) e Os Fatores Condicionantes do
Desenvolvimento Econômico e Social (Editora CRV, Curitiba, 2012), entre outros.