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FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS
                 DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA

Disciplina: Teoria das Ciências Humanas I     Professor: Vladimir Safatle

Nome: Fábio Augusto dos Santos de Deus         Nº USP: 6476065
Período Noturno.

Dissertação – Da necessidade do Estado



             As discussões sobre a figura do Estado ideal remontam à Platão
que discorreu sobre o assunto na sua famosa obra A República. Porém,
somente a partir do século XVI, no interior do movimento Iluminista, é que se
começou a questionar e discutir sobre as origens e a necessidade do Estado,
necessidade essa que ainda é muito questionada pelo movimento anarquista, e
vista como apenas um estágio para o movimento socialista. Isso demonstra
que ainda hoje esta reflexão é pertinente. O presente trabalho pretende mostrar
dois pontos de vista sobre a necessidade do Estado, tendo como um deles o
pensamento de Hegel, e outro a crítica de Pierre Clastres a esta necessidade.
             Segundo Hegel o Estado deve ser uma espécie regulador da
dinâmica econômica da sociedade no intuito de permitir condições sociais para
a realização do conceito de liberdade. Para entender melhor este conceito de
Estado é necessário esclarecer como Hegel compreende as relações
econômicas e sociais. Para ele as relações humanas são mediadas pelo
Espírito através da Eticidade. Hegel coloca o Espírito universal como “(...)
intuição e imagem na arte, sentimento e representação na religião,
pensamento puro e livre na filosofia.” (1997, p. 307, §341). Grosso modo o
Espírito seria como “uma forma de vida auto-consciente”, criada a partir da
reflexão sobre as normas da vida em sociedade e os processos de formação
da cultura. Podemos entender a Eticidade como a estrutura que permite a vida
em sociedade, o conjunto de normas sociais que permeiam as dinâmicas de
interação social. Esta estrutura deverá focar o direito de cada indivíduo como
ser livre e autônomo. Para a realização do conceito de liberdade na esfera da
Eticidade, Hegel coloca como necessários três núcleos de interações sociais
que possuem uma dinâmica interna de passagem de um para o outro, a
família, a sociedade civil e o Estado.
Como primeiro núcleo, a família esta unida em torno dos laços de
sangue e do sentimento de amor entre seus indivíduos. É dentro deste núcleo
que se desenvolve a educação para a eticidade, transformando os indivíduos
em membros da sociedade civil e cidadãos do Estado. A sociedade civil, e sua
multiplicidade de personalidades e interesses, desagrega os indivíduos da
família, que agora estão em torno das corporações e as estruturas das
relações econômicas. Este núcleo permite que a individualidade se afirme
como sistema particular de interesse. As dinâmicas dessas relações
econômicas levam cada vez mais ao acumulo de riquezas e o empobrecimento
de uma porção significativa da população. Este empobrecimento é um limitador
das liberdades individuais. Para evitar o colapso da sociedade será necessária
a instituição do Estado como regulador dos interesses gerais, e para balancear
a divisão da riqueza produzida pela sociedade civil, permitindo assim o
desenvolvimento do conceito de liberdade. É como forma de universalização
das suas vontades, como uma espécie de dever libertador, que o indivíduo
deverá exerce o papel de cidadão no Estado, pois é a única forma de garantir a
liberdade universal. “No cumprimento do dever com a forma de prestação de
serviço para o estado, [o indivíduo] assegura também a sua conservação e
subsistência. Segundo o que tem de abstrato, o interesse geral estabeleceria
apenas que os atos e serviços que solicita fossem cumpridos como deveres”
(1997, p. 228, §261). A função do Estado, portanto, seria garantir as liberdades
individuais no interior da sociedade.
             A filosofia de Hegel está fortemente centrada na idéia de uma
Razão histórica que evolui no tempo, que é o Espírito em vias de se conhecer.
Para ele a história é “(...) o desenvolvimento necessário dos momentos da
razão, da consciência de si e da liberdade do espírito, a interpretação e a
realização do espírito universal.” (1997, p. 307, §342). Sendo universal, não é
possível que qualquer sociedade humana fique fora desta história, se existem
tais sociedades é porque elas ainda não evoluíram. Para Hegel, a propriedade
privada seria um estágio importante na idéia de liberdade, por isso dentro das
sociedades comunitárias, como as primitivas, não é possível se chegar ao
conceito de liberdade. O aparecimento do Estado seria um estágio posterior ao
surgimento da propriedade privada. Portanto, o Estado seria o destino de todas
as sociedades.




                                                                               2
Mas este não é um pensamento unânime. Podemos ter como
exemplo as idéias de Pierre Clastres a partir das suas pesquisas sobre as
sociedades primitivas, que ele coloca como sociedades contra o Estado.
             Como pensador da segunda metade do século XX, Clastres não
poderia deixar de observar as contribuições dos pensadores socialistas sobre o
conceito de Estado como déspota e representante da classe dominante. Mas,
diferente das idéias marxistas, de que a infra-estrutura econômica altera a
superestrutura política, Clastres pensa que não há qualquer relação entre as
duas.
             Para Clastres as sociedades com Estado são constituídas pela
força, a força de sujeitar seus indivíduos a um poder político. Esta idéia de
Estado é pensada a partir da passagem das sociedades primitivas,
essencialmente igualitárias, às ditas sociedades civilizadas, com divisão de
classes entre dominantes e dominadas. Esta passagem não se dá pelas
condições econômicas das sociedades, mas sim pela coerção política. Nas
sociedades primitivas o homem produz somente aquilo que vai consumir, sem
excedentes, a sua produção está de acordo com o seu trabalho, mesmo que
seja para a troca, a produção não deixa de ser sua. Para Clastres a situação
muda quando o homem deixa de produzir para si e passa a produzir para os
outros, “sem troca e sem reciprocidade.” A regra de troca passa a ser
substituída pelo terror da dívida. A Economia então deixa de ser uma economia
para satisfação de suas necessidades e passa a ser uma economia política.
Clastres coloca como exemplo a diferença entre os índios amazônicos e os
Incas: “O primeiro produz, em suma, para viver, enquanto o segundo trabalha,
de mais a mais, para fazer com que outros vivam – os que não trabalham, os
senhores que lhe dizem: cumpre que tu pagues o que nos deves; impõe-se
que tu eternamente saldes a dívida que conosco contraíste.” (2003, p. 215).
Mas, antes do campo econômico, a verdadeira passagem entre a sociedade
primitiva e as sociedades com Estado se dá no campo político. Uma vez que
esse determinará todos os outros campos. “A principal divisão da sociedade,
aquela que serve de base a todas as outras, inclusive sem dúvida a divisão do
trabalho, é a nova disposição vertical entre a base e o cume, é o grande corte
político entre detentores da força, seja ela guerreira ou religiosa, e sujeitados a
essa força.” (2003, p. 216).




                                                                                  3
Clastres demonstra que a alteração do poder político tem uma
importância considerável na mudança de sociedades primitivas à sociedades
civilizadas. Esta importância pode ser demonstrada pelos exemplos das
diferentes sociedades americanas:
                                    “Grupos         de      caçadores-pescadores-
                                    coletores, nômades ou não, apresentam
                                    as mesmas propriedades sociopolíticas
                                    que    os       seus    vizinhos         agricultores
                                    sedentários: “infra-estruturas” diferentes,
                                    “superestrutura” idêntica. Inversamente,
                                    as    sociedades         meso-americanas           –
                                    sociedades imperiais, sociedades com
                                    Estado      –    eram      tributárias     de   uma
                                    agricultura     que,    mais      intensiva      que
                                    alhures, não ficava muito longe, do ponto
                                    de    vista     de   seu     nível   técnico,     da
                                    agricultura das tribos “selvagens” da
                                    Floresta         Tropical:       “infra-estrutura”
                                    idêntica, “superestruturas” diferentes, uma
                                    vez que, num dos casos, se trata de
                                    sociedades sem Estado, e, no outro, de
                                    Estados acabados.” (2003, p. 219).
             Portanto, é a ruptura política que modifica as sociedades de
primitivas para as ditas civilizadas. É com a ruptura política, a alteração do
poder político que faz com quem uma sociedade seja dividida entre senhores e
súditos. Mas o que provoca está ruptura? É sobre esta reflexão que Clastres irá
demonstrar que a necessidade do Estado é apenas um aspecto etnocêntrico
por parte da civilização moderna.
             Segundo Clastres, o pensamento das sociedades modernas é de
que as sociedades primitivas são privadas de algo. A ausência do Estado é
visto como algo negativo, seriam sociedades incompletas, o que faz com que
elas não sejam sociedades de fato. Este pensamento seria conseqüência de
nosso modo de vida, da própria história do mundo moderno, pois nossa vida,
nossa história, está de tal forma ligada ao estado que fica difícil imaginar a
ausência dele. As sociedades primitivas para nós estariam à margem da




                                                                                        4
história, pois esta teria um sentido único, e “(...) toda sociedade está
condenada a inscrever-se nessa história e a percorrer as suas etapas que, a
partir da selvageria, conduzem à civilização.” (Clastres, 2003, p. 208). Este
pensamento sobre o aspecto de ausência avança também sobre a economia,
elas seriam vistas então como sociedades “sem mercado”. Isso ocorreria por
que as técnicas utilizadas por elas para se obter alimentos não estão em
condições para produzir excedentes, sendo assim uma economia de
subsistência, e esta economia não evolui, pois os homens estão o tempo todo
ocupados em conseguir o mínimo necessário para sobreviver. Clastres
demonstra a falsidade desta lógica, uma vez que essas sociedades possuem
uma capacidade técnica adaptada e de acordo com suas necessidades, “Os
índios, efetivamente, só dedicavam pouco tempo àquilo a que damos o nome
de trabalho. E apesar disso não morriam de fome. As crônicas da época são
unânimes em descrever a bela aparência dos adultos, a boa saúde das
numerosas crianças, a abundância e variedade dos recursos alimentares.”
(2003, p. 211). E assim o aspecto etnocêntrico deste pensamento é revelado,
pois sempre pensamos essas sociedades sobre o ponto de vista da falta tendo
como referência o que temos no nosso mundo, o Estado, a história, o mercado.
O que Clastres tenta demonstrar é que, para um bom entendimento de suas
estruturas, essas sociedades não devem ser vista sob este aspecto negativo.
“Inacabamento, incompletude, falta: não é absolutamente desse lado que se
revela a natureza das sociedades primitivas. Ela impõe-se bem mais como
positividade, como domínio do meio ambiente natural e do projeto social, como
vontade livre de não deixar escapar para fora de seu ser nada que possa
alterá-lo, corrompê-lo e dissolvê-lo.” (2003, p. 216).         Para Clastres as
sociedades primitivas, longe de serem miseráveis, incompletas e inferiores,
seriam sociedades onde o homem seria verdadeiramente livre, não estaria
alienado da produção do seu trabalho, e não estria sujeito a dominação de
ninguém. Longe de serem sociedades a margem da história, elas teriam em
sua própria estrutura de funcionamento aspectos que de certa forma evitariam
sua “evolução na história”, evitando o surgimento do Estado.
             Em seu texto Clastres não procura demonstrar quais seriam os
motivos para o aparecimento do Estado, mas sim, quais seriam as condições
do seu não aparecimento. As sociedades primitivas possuem um “chefe” da
tribo, mas, diferente do conceito de chefe que temos, este não tem o poder de




                                                                              5
mando, não tem autoridade efetiva. O “chefe” da tribo seria um apaziguador
das divergências, dos conflitos que poderiam ocorrer nessas sociedades. Mas
não um apaziguador pela força, mas sim pelo prestígio que tem junto aos
membros da tribo. Sua autoridade estaria limitada à sua eloqüência de
convencer os indivíduos em conflito da necessidade de manter a paz, e jamais
é permitida a autoridade política, “O chefe está a serviço da sociedade, é a
sociedade em si mesma - verdadeiro lugar do poder - que exerce como tal sua
autoridade sobre o chefe. É por isso que é impossível para o chefe alterar essa
relação em seu proveito, colocar a sociedade a seu próprio serviço, exercer
sobre a tribo o que denominamos poder: a sociedade nunca tolerará que seu
chefe se transforme em déspota.” (2003, p. 224). É esta estrutura que sustenta
as sociedades primitivas como sociedades sem estado, pois o surgimento
deste provocaria a extinção deste “projeto social”. O surgimento do Estado,
portanto implicaria a perda da liberdade.
             Vimos então que Hegel sustenta a necessidade do Estado como
estagio final para assegurar a liberdade dos indivíduos. O Estado seria
conseqüência do processo de evolução do Espírito universal na história e “(...)
a história é, de acordo com o conceito da sua liberdade, o desenvolvimento
necessário dos momentos da razão, da consciência de si e da liberdade do
espírito, a interpretação e a realização do espírito universal.” (1997, p. 307,
§342). Qualquer sociedade que ainda estiver fora deste processo histórico, em
algo momento necessariamente terá que se adequar a ele. Clastres, no
entanto, diz que não há necessidade do surgimento do Estado nas sociedades
humanas, tendo algumas delas inclusive “dispositivos” para evitar o surgimento
deste. Defende ainda que o Estado seria um fator da perda da liberdade da
maioria de seus indivíduos, que não mais trabalhariam apenas para si, mas sim
estariam sujeitos à um senhor. A diferença entre os dois pensadores parece se
dar partir da definição de liberdade de cada um deles. Para Hegel não é
possível o indivíduo ser livre dentro de uma sociedade primitiva, a liberdade
viria em estágios e nos graus de evolução da liberdade a propriedade privada
aparece como princípio, pois “É a minha vontade pessoal, e portanto como
individual, que se torna objetiva para mim na propriedade.” (1997, p. 47, § 46),
sendo que esse estágio, de propriedade, se desenvolve no interior da
sociedade até chegarmos a concepção de Estado para garantir as liberdades
individuais. Enquanto que para Clastres o individuo livre é aquele que faz uso




                                                                               6
da sua força de trabalho, sem ser explorado, sem estar sujeito à qualquer
entidade superior. Parece que para Hegel, o destino da sociedade humana
seria estar sujeita ao Estado moderno. O capitalismo seria o sistema
econômico hegemônico, e a única alternativa seria ajustar este Estado para ser
um regulador das mazelas sociais. Mas para Clastres, esse destino aparece
apenas como um equivoco. As sociedades humanas não teriam que estar
necessariamente sujeitadas a um Estado. E este apareceria apenas por um
caso fortuito. A submissão à um senhor seria uma contingência das sociedades
humanas. Uma vez que a liberdade é buscada por todos, e a natureza do
homem é ser livre,
                                    “O bom senso questiona: por que razão
                                    os homens dessas sociedades [primitivas]
                                    quereriam trabalhar e produzir mais,
                                    quando três ou quatro horas diárias de
                                    atividade são suficientes para garantir as
                                    necessidades do grupo? De que lhes
                                    serviria isso? Qual seria a utilidade dos
                                    excedentes assim acumulados?          Qual
                                    seria o destino desses excedentes? É
                                    sempre    pela   força   que   os   homens
                                    trabalham além das suas necessidades.”
                                    (Clastres, 2003, p. 213).




                                                                             7
Referências Bibliográficas


HEGEL, G. W. Friedrich. Princípios da Filosofia do Direito. Tradução de
Orlando Vitorino. S. Paulo, Martins Fontes, 1997.


HEGEL, G. W. Friedrich. Introdução à Historia da Filosofia. In “Coleção os
Pensadores”, tradução de Antonio Pinto de Carvalho. São Paulo: Abril Cultural,
1980.


CLASTRES, Pierre. A Sociedade contra o Estado – pesquisas de antropologia
política. Tradução de Theo Santiago: S. Paulo, Cocac & Naify, 2003.




                                                                             8

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A necessidade do Estado segundo Hegel e Clastres

  • 1. FACULDADE DE FILOSOFIA, LETRAS E CIÊNCIAS HUMANAS DEPARTAMENTO DE FILOSOFIA Disciplina: Teoria das Ciências Humanas I Professor: Vladimir Safatle Nome: Fábio Augusto dos Santos de Deus Nº USP: 6476065 Período Noturno. Dissertação – Da necessidade do Estado As discussões sobre a figura do Estado ideal remontam à Platão que discorreu sobre o assunto na sua famosa obra A República. Porém, somente a partir do século XVI, no interior do movimento Iluminista, é que se começou a questionar e discutir sobre as origens e a necessidade do Estado, necessidade essa que ainda é muito questionada pelo movimento anarquista, e vista como apenas um estágio para o movimento socialista. Isso demonstra que ainda hoje esta reflexão é pertinente. O presente trabalho pretende mostrar dois pontos de vista sobre a necessidade do Estado, tendo como um deles o pensamento de Hegel, e outro a crítica de Pierre Clastres a esta necessidade. Segundo Hegel o Estado deve ser uma espécie regulador da dinâmica econômica da sociedade no intuito de permitir condições sociais para a realização do conceito de liberdade. Para entender melhor este conceito de Estado é necessário esclarecer como Hegel compreende as relações econômicas e sociais. Para ele as relações humanas são mediadas pelo Espírito através da Eticidade. Hegel coloca o Espírito universal como “(...) intuição e imagem na arte, sentimento e representação na religião, pensamento puro e livre na filosofia.” (1997, p. 307, §341). Grosso modo o Espírito seria como “uma forma de vida auto-consciente”, criada a partir da reflexão sobre as normas da vida em sociedade e os processos de formação da cultura. Podemos entender a Eticidade como a estrutura que permite a vida em sociedade, o conjunto de normas sociais que permeiam as dinâmicas de interação social. Esta estrutura deverá focar o direito de cada indivíduo como ser livre e autônomo. Para a realização do conceito de liberdade na esfera da Eticidade, Hegel coloca como necessários três núcleos de interações sociais que possuem uma dinâmica interna de passagem de um para o outro, a família, a sociedade civil e o Estado.
  • 2. Como primeiro núcleo, a família esta unida em torno dos laços de sangue e do sentimento de amor entre seus indivíduos. É dentro deste núcleo que se desenvolve a educação para a eticidade, transformando os indivíduos em membros da sociedade civil e cidadãos do Estado. A sociedade civil, e sua multiplicidade de personalidades e interesses, desagrega os indivíduos da família, que agora estão em torno das corporações e as estruturas das relações econômicas. Este núcleo permite que a individualidade se afirme como sistema particular de interesse. As dinâmicas dessas relações econômicas levam cada vez mais ao acumulo de riquezas e o empobrecimento de uma porção significativa da população. Este empobrecimento é um limitador das liberdades individuais. Para evitar o colapso da sociedade será necessária a instituição do Estado como regulador dos interesses gerais, e para balancear a divisão da riqueza produzida pela sociedade civil, permitindo assim o desenvolvimento do conceito de liberdade. É como forma de universalização das suas vontades, como uma espécie de dever libertador, que o indivíduo deverá exerce o papel de cidadão no Estado, pois é a única forma de garantir a liberdade universal. “No cumprimento do dever com a forma de prestação de serviço para o estado, [o indivíduo] assegura também a sua conservação e subsistência. Segundo o que tem de abstrato, o interesse geral estabeleceria apenas que os atos e serviços que solicita fossem cumpridos como deveres” (1997, p. 228, §261). A função do Estado, portanto, seria garantir as liberdades individuais no interior da sociedade. A filosofia de Hegel está fortemente centrada na idéia de uma Razão histórica que evolui no tempo, que é o Espírito em vias de se conhecer. Para ele a história é “(...) o desenvolvimento necessário dos momentos da razão, da consciência de si e da liberdade do espírito, a interpretação e a realização do espírito universal.” (1997, p. 307, §342). Sendo universal, não é possível que qualquer sociedade humana fique fora desta história, se existem tais sociedades é porque elas ainda não evoluíram. Para Hegel, a propriedade privada seria um estágio importante na idéia de liberdade, por isso dentro das sociedades comunitárias, como as primitivas, não é possível se chegar ao conceito de liberdade. O aparecimento do Estado seria um estágio posterior ao surgimento da propriedade privada. Portanto, o Estado seria o destino de todas as sociedades. 2
  • 3. Mas este não é um pensamento unânime. Podemos ter como exemplo as idéias de Pierre Clastres a partir das suas pesquisas sobre as sociedades primitivas, que ele coloca como sociedades contra o Estado. Como pensador da segunda metade do século XX, Clastres não poderia deixar de observar as contribuições dos pensadores socialistas sobre o conceito de Estado como déspota e representante da classe dominante. Mas, diferente das idéias marxistas, de que a infra-estrutura econômica altera a superestrutura política, Clastres pensa que não há qualquer relação entre as duas. Para Clastres as sociedades com Estado são constituídas pela força, a força de sujeitar seus indivíduos a um poder político. Esta idéia de Estado é pensada a partir da passagem das sociedades primitivas, essencialmente igualitárias, às ditas sociedades civilizadas, com divisão de classes entre dominantes e dominadas. Esta passagem não se dá pelas condições econômicas das sociedades, mas sim pela coerção política. Nas sociedades primitivas o homem produz somente aquilo que vai consumir, sem excedentes, a sua produção está de acordo com o seu trabalho, mesmo que seja para a troca, a produção não deixa de ser sua. Para Clastres a situação muda quando o homem deixa de produzir para si e passa a produzir para os outros, “sem troca e sem reciprocidade.” A regra de troca passa a ser substituída pelo terror da dívida. A Economia então deixa de ser uma economia para satisfação de suas necessidades e passa a ser uma economia política. Clastres coloca como exemplo a diferença entre os índios amazônicos e os Incas: “O primeiro produz, em suma, para viver, enquanto o segundo trabalha, de mais a mais, para fazer com que outros vivam – os que não trabalham, os senhores que lhe dizem: cumpre que tu pagues o que nos deves; impõe-se que tu eternamente saldes a dívida que conosco contraíste.” (2003, p. 215). Mas, antes do campo econômico, a verdadeira passagem entre a sociedade primitiva e as sociedades com Estado se dá no campo político. Uma vez que esse determinará todos os outros campos. “A principal divisão da sociedade, aquela que serve de base a todas as outras, inclusive sem dúvida a divisão do trabalho, é a nova disposição vertical entre a base e o cume, é o grande corte político entre detentores da força, seja ela guerreira ou religiosa, e sujeitados a essa força.” (2003, p. 216). 3
  • 4. Clastres demonstra que a alteração do poder político tem uma importância considerável na mudança de sociedades primitivas à sociedades civilizadas. Esta importância pode ser demonstrada pelos exemplos das diferentes sociedades americanas: “Grupos de caçadores-pescadores- coletores, nômades ou não, apresentam as mesmas propriedades sociopolíticas que os seus vizinhos agricultores sedentários: “infra-estruturas” diferentes, “superestrutura” idêntica. Inversamente, as sociedades meso-americanas – sociedades imperiais, sociedades com Estado – eram tributárias de uma agricultura que, mais intensiva que alhures, não ficava muito longe, do ponto de vista de seu nível técnico, da agricultura das tribos “selvagens” da Floresta Tropical: “infra-estrutura” idêntica, “superestruturas” diferentes, uma vez que, num dos casos, se trata de sociedades sem Estado, e, no outro, de Estados acabados.” (2003, p. 219). Portanto, é a ruptura política que modifica as sociedades de primitivas para as ditas civilizadas. É com a ruptura política, a alteração do poder político que faz com quem uma sociedade seja dividida entre senhores e súditos. Mas o que provoca está ruptura? É sobre esta reflexão que Clastres irá demonstrar que a necessidade do Estado é apenas um aspecto etnocêntrico por parte da civilização moderna. Segundo Clastres, o pensamento das sociedades modernas é de que as sociedades primitivas são privadas de algo. A ausência do Estado é visto como algo negativo, seriam sociedades incompletas, o que faz com que elas não sejam sociedades de fato. Este pensamento seria conseqüência de nosso modo de vida, da própria história do mundo moderno, pois nossa vida, nossa história, está de tal forma ligada ao estado que fica difícil imaginar a ausência dele. As sociedades primitivas para nós estariam à margem da 4
  • 5. história, pois esta teria um sentido único, e “(...) toda sociedade está condenada a inscrever-se nessa história e a percorrer as suas etapas que, a partir da selvageria, conduzem à civilização.” (Clastres, 2003, p. 208). Este pensamento sobre o aspecto de ausência avança também sobre a economia, elas seriam vistas então como sociedades “sem mercado”. Isso ocorreria por que as técnicas utilizadas por elas para se obter alimentos não estão em condições para produzir excedentes, sendo assim uma economia de subsistência, e esta economia não evolui, pois os homens estão o tempo todo ocupados em conseguir o mínimo necessário para sobreviver. Clastres demonstra a falsidade desta lógica, uma vez que essas sociedades possuem uma capacidade técnica adaptada e de acordo com suas necessidades, “Os índios, efetivamente, só dedicavam pouco tempo àquilo a que damos o nome de trabalho. E apesar disso não morriam de fome. As crônicas da época são unânimes em descrever a bela aparência dos adultos, a boa saúde das numerosas crianças, a abundância e variedade dos recursos alimentares.” (2003, p. 211). E assim o aspecto etnocêntrico deste pensamento é revelado, pois sempre pensamos essas sociedades sobre o ponto de vista da falta tendo como referência o que temos no nosso mundo, o Estado, a história, o mercado. O que Clastres tenta demonstrar é que, para um bom entendimento de suas estruturas, essas sociedades não devem ser vista sob este aspecto negativo. “Inacabamento, incompletude, falta: não é absolutamente desse lado que se revela a natureza das sociedades primitivas. Ela impõe-se bem mais como positividade, como domínio do meio ambiente natural e do projeto social, como vontade livre de não deixar escapar para fora de seu ser nada que possa alterá-lo, corrompê-lo e dissolvê-lo.” (2003, p. 216). Para Clastres as sociedades primitivas, longe de serem miseráveis, incompletas e inferiores, seriam sociedades onde o homem seria verdadeiramente livre, não estaria alienado da produção do seu trabalho, e não estria sujeito a dominação de ninguém. Longe de serem sociedades a margem da história, elas teriam em sua própria estrutura de funcionamento aspectos que de certa forma evitariam sua “evolução na história”, evitando o surgimento do Estado. Em seu texto Clastres não procura demonstrar quais seriam os motivos para o aparecimento do Estado, mas sim, quais seriam as condições do seu não aparecimento. As sociedades primitivas possuem um “chefe” da tribo, mas, diferente do conceito de chefe que temos, este não tem o poder de 5
  • 6. mando, não tem autoridade efetiva. O “chefe” da tribo seria um apaziguador das divergências, dos conflitos que poderiam ocorrer nessas sociedades. Mas não um apaziguador pela força, mas sim pelo prestígio que tem junto aos membros da tribo. Sua autoridade estaria limitada à sua eloqüência de convencer os indivíduos em conflito da necessidade de manter a paz, e jamais é permitida a autoridade política, “O chefe está a serviço da sociedade, é a sociedade em si mesma - verdadeiro lugar do poder - que exerce como tal sua autoridade sobre o chefe. É por isso que é impossível para o chefe alterar essa relação em seu proveito, colocar a sociedade a seu próprio serviço, exercer sobre a tribo o que denominamos poder: a sociedade nunca tolerará que seu chefe se transforme em déspota.” (2003, p. 224). É esta estrutura que sustenta as sociedades primitivas como sociedades sem estado, pois o surgimento deste provocaria a extinção deste “projeto social”. O surgimento do Estado, portanto implicaria a perda da liberdade. Vimos então que Hegel sustenta a necessidade do Estado como estagio final para assegurar a liberdade dos indivíduos. O Estado seria conseqüência do processo de evolução do Espírito universal na história e “(...) a história é, de acordo com o conceito da sua liberdade, o desenvolvimento necessário dos momentos da razão, da consciência de si e da liberdade do espírito, a interpretação e a realização do espírito universal.” (1997, p. 307, §342). Qualquer sociedade que ainda estiver fora deste processo histórico, em algo momento necessariamente terá que se adequar a ele. Clastres, no entanto, diz que não há necessidade do surgimento do Estado nas sociedades humanas, tendo algumas delas inclusive “dispositivos” para evitar o surgimento deste. Defende ainda que o Estado seria um fator da perda da liberdade da maioria de seus indivíduos, que não mais trabalhariam apenas para si, mas sim estariam sujeitos à um senhor. A diferença entre os dois pensadores parece se dar partir da definição de liberdade de cada um deles. Para Hegel não é possível o indivíduo ser livre dentro de uma sociedade primitiva, a liberdade viria em estágios e nos graus de evolução da liberdade a propriedade privada aparece como princípio, pois “É a minha vontade pessoal, e portanto como individual, que se torna objetiva para mim na propriedade.” (1997, p. 47, § 46), sendo que esse estágio, de propriedade, se desenvolve no interior da sociedade até chegarmos a concepção de Estado para garantir as liberdades individuais. Enquanto que para Clastres o individuo livre é aquele que faz uso 6
  • 7. da sua força de trabalho, sem ser explorado, sem estar sujeito à qualquer entidade superior. Parece que para Hegel, o destino da sociedade humana seria estar sujeita ao Estado moderno. O capitalismo seria o sistema econômico hegemônico, e a única alternativa seria ajustar este Estado para ser um regulador das mazelas sociais. Mas para Clastres, esse destino aparece apenas como um equivoco. As sociedades humanas não teriam que estar necessariamente sujeitadas a um Estado. E este apareceria apenas por um caso fortuito. A submissão à um senhor seria uma contingência das sociedades humanas. Uma vez que a liberdade é buscada por todos, e a natureza do homem é ser livre, “O bom senso questiona: por que razão os homens dessas sociedades [primitivas] quereriam trabalhar e produzir mais, quando três ou quatro horas diárias de atividade são suficientes para garantir as necessidades do grupo? De que lhes serviria isso? Qual seria a utilidade dos excedentes assim acumulados? Qual seria o destino desses excedentes? É sempre pela força que os homens trabalham além das suas necessidades.” (Clastres, 2003, p. 213). 7
  • 8. Referências Bibliográficas HEGEL, G. W. Friedrich. Princípios da Filosofia do Direito. Tradução de Orlando Vitorino. S. Paulo, Martins Fontes, 1997. HEGEL, G. W. Friedrich. Introdução à Historia da Filosofia. In “Coleção os Pensadores”, tradução de Antonio Pinto de Carvalho. São Paulo: Abril Cultural, 1980. CLASTRES, Pierre. A Sociedade contra o Estado – pesquisas de antropologia política. Tradução de Theo Santiago: S. Paulo, Cocac & Naify, 2003. 8