1) O texto discute a importância do pensamento de Montesquieu sobre o poder e como ele influenciou o Iluminismo.
2) Locke também é mencionado como um pensador influente, especialmente seus Tratados sobre o Governo Civil, que defenderam o direito do povo de derrubar governantes despóticos.
3) O Iluminismo surgiu na França do século 18 e questionou a autoridade da Igreja e do absolutismo, defendendo a liberdade de pensamento, felicidade individual e direitos do povo.
1. “É uma verdade eterna: qualquer pessoa que tenha o poder, tende a abusar dele. Para
que não haja abuso, é preciso organizar as coisas de maneira que o poder seja contido
pelo poder”
Montesquieu - O Espírito das Leis.
Tais mudanças ressaltariam com maior ímpeto
O
fim do reinado de Luís XIV, em 1715,
na área do pensamento filosófico e político, transbor-
deixou a França numa situação muito
dando com evidência no Iluminismo – movimento filo-
difícil. O jovem rei Luís XV,
sófico que marcou o século XVIII como o Século das
estranhamente, preferia viver à sombra das regências,
Luzes.
desfrutando em Versalhes as diversões palacianas que
esgotavam os cofres do Estado. Enquanto isso, a aris-
tocracia se aproveitava da inoperância do rei manten-
do privilégios e abomináveis direitos que lembravam a
época feudal. Só em 1748, o relutante Luís XV assu-
miu o trono depois da morte de Fleury, o último re-
gente. Com 32 anos de idade o rei não poderia, mais
uma vez, recusar o governo sob pena de provocar
uma crise de graves proporções.
“O homem aprende
todos os dias, avança, obser-
va, parece-lhe que as trevas
recuam: é o século das Olhando para trás, lembramos que o Os salões da
aristocracia
luzes” Renascimento Cultural abriu as portas do conhecimen-
esclarecida
to, ao colocar em xeque a visão teocêntrica da Igreja
reuniam os
Católica. O humanismo renascentista encorajou a for- intelectuais da
mulação de novas teorias que derrubaram os antigos época: no salão
preconceitos medievais. Na mesma época, a Reforma da madame
Mas, como era fácil de prever, o novo rei dei- Geoffrin, estão
Protestante provocou uma fissura insuperável na auto-
xou que os aristocratas se encarregassem das tarefas retratados
ridade da Igreja Católica, expondo-a ao vexame de con- Diderot, Turgot
reais apenas interferindo nos casos mais sérios. Acre-
viver com novas religiões, que bem ou mal, propicia- e D’Alembert,
ditando estar num mar de rosas, faltou a Luís XV a em destaque,
vam um clima mais adequado ao desenvolvimento da
percepção que a França já não era a mesma de outros no fundo à
ciência e do pensamento crítico.
tempos. A liberdade concedida aos pensadores e esquerda, o
intelectuais, bem como o ambiente de investigação busto de
Voltaire
científica, especulação filosófica e crítica acabaram
frutificando.
2. REVOLUÇÃO CIENTÍFICA Em 1687, o mundo científico foi sacudido pe-
las incríveis descobertas do gênio inglês Isaac Newton.
No século XVII surgiram novas teorias científi- O cientista provou que os planetas descreviam sua ór-
cas, começando com Galileu, em 1609. Montando um bita no universo motivada pela força exercida de um
telescópio pôde observar a superfície da Lua checan- corpo sobre outro. A compreensão do universo como
do detalhes imperceptíveis a olho nu. Em seguida, ob- um espaço infinito sujeito a constantes transformações
servou o planeta Júpiter constatando a existência de revolucionou a ciência, permitindo a explicação dinâ-
vários anéis girando ao seu redor. mica e coerente dos fenômenos da natureza. A Lei da
Pensou então: se os
anéis giravam em torno de
Júpiter, o mesmo deveria
ocorrer com a Lua em rela-
O Iluminismo
ção a Terra e, conseqüente-
mente de todos em relação ao
Sol. Essa teoria derrubou o
postulado da Terra como as-
tro fixo e os outros astros
imóveis à sua volta. A Igreja
Católica em resposta às teo-
rias de Galileu, resolveu levá-
lo a julgamento mostrando
que a Inquisição condenava as
descobertas do cientista.
“Em 25 de
setembro de 1632, sete
meses depois da
publicação do Diálogo, Galileu foi intimado a se Gravitação Universal uniu as diversas partes do mun-
“Vista de um
mercado apresentar em Roma para ser julgado como herege do físico, explicando em termos matemáticos por que
público”de a Terra e os planetas se movem.
perante o delegado geral do Santo Ofício. Tentou
Hendrick Newton quebrou de vez as barreiras que impe-
Sleenuvick, visão por todos os meios evitar o julgamento, mas só diam a explicação cientifica das coisas do universo.
idealista de uma conseguiu adiá-lo. Em fevereiro do ano seguinte
sociedade em
Perto de morrer, diria - “Não sei que impressão o mun-
chegou a Roma, onde teve de esperar três meses. do terá de mim, mas para mim mesmo parece que fui
paz.
Finalmente, entre 12 de abril e 21 de junho, foi apenas um menino que brincava à beira-mar, diver-
repetidamente interrogado pelo Santo Ofício, mas, tindo-me de vez em quando com o achado de um sei-
ao que parece, não foi torturado. xo mais liso ou uma concha mais bonita do que o
Em 22 de junho levaram-no para o salão normal, enquanto o oceano imenso da verdade jazia
do convento dominicano da Santa Maria e lá totalmente inexplorado diante de mim”. 2
pronunciaram a sentença diante da Congregação Outro expoente da época foi o filósofo e cien-
do Santo Ofício. O Diálogo ficou proibido de tista francês René Descartes, autor do livro Discurso
circular, e seu autor, veementemente suspeito de sobre o Método. Nessa obra, alegava que a providên-
heresia, foi encarcerado. Após ouvir a sentença, cia Divina legou aos homens o livre-arbítrio e o dom
Galileu viu-se compelido a se ajoelhar e retratar- da razão para que pudessem escolher o caminho da
se.” realização. Afirmava que a prática do livre-arbítrio to-
mava o homem semelhante a Deus, aproximando-o da
plenitude.
O Tempo da História
SÉCULO DAS LUZES
1637 1690
DESCARTES JOHN LOCKE 1748 1762
“DISCURSO 1689 “TRATADOS MONTESQUIEU ROUSSEAU
1751-1772
SOBRE O SOBRE O
MÉTODO” REVOLUÇÃO GOVERNO “O ESPÍRITO “O CONTRATO
DAS LEIS” PUBLICAÇÃO SOCIAL”
GLORIOSA CIVIL”
DA “ENCICLOPÉDIA”
NA INGLATERRA
3. Descartes formulou a espinha dorsal do O Iluminismo tem, nos seus fundamentos, vári-
questionamento político dos iluministas. A partir de os pontos em comum: busca da felicidade, respeito às
1650, o pensamento cartesiano, espalhou-se por toda liberdades individuais, abolição dos privilégios de nas-
a Europa traduzido em várias línguas. cimento, liberdade econômica e a crítica aos valores da
“Os pensamentos que lhe ocuparam a aten- Igreja Católica. No aspecto social embora não tenha
ção centralizaram-se na questão do que é que o ho- nascido no seio da burguesia, o Iluminismo se adequa-
mem conhece, e de como o conhece. Haverá, refletiu va perfeitamente aos interesses burgueses. O ideário
Descartes, alguma coisa de que o homem possa abso- iluminista deu à burguesia o suporte ideológico para a
lutamente estar certo? Se duvidasse sistematicamen- derrubada da ordem absolutista e a construção do capi-
te de tudo, haveria uma única coisa que resistisse a talismo moderno.
toda a dúvida? Meditando sobre essas questões, Des- A obra iluminista mais abrangente foi a Enciclo-
cartes viu-se forçado a concluir que todas as fontes pédia das Letras e das Artes. Essa ampla coleção de 35
O Iluminismo
convencionais do conhecimento do homem eram dis- volumes demorou quase duas décadas para ser conclu-
cutíveis. Os escritos de antigos autores, tradicional ída, contando com a participação de vários intelectuais
reservatório de sabedoria, obviamente se contradi- e pensadores. A Enciclopédia foi organizada por Diderot
zem entre si a cada passo. e D’Alembert: o primeiro, político por essência; o se-
A evidência dos sentidos era igualmente ilu- gundo, filósofo por natureza. Lida por dezenas de pes-
sória — provaram-no os sonhos, as ilusões de ótica, soas, que se encantavam com a linguagem fácil e aces-
as alucinações. Mesmo a razão estava longe de ser sível, teve a publicação proibida por ordem do rei Luís
infalível, como o sabia qualquer pessoa que tivesse XV, seguida do confisco de muitos exemplares.
cometido um erro de aritmética. Tendo duvidado de
tudo, achou-se Descartes diante de uma única coisa
A pintura de
que não podia duvidar: sua própria existência. Con- Dumesnil
quanto eu quisesse considerar tudo falso — escreve mostra a rainha
ele na passagem mais célebre da filosofia moderna Cristina e
— era absolutamente necessário que eu, que assim membros da
sua corte,
pensava, fosse alguma coisa. Penso, logo existo ”. 3 ouvindo
Descartes dar
uma aula de
Filosofia.
“Os filósofos se erigiram
como preceptores do gênero
humano. Liberdade de pensar,
eis seu brado, e este brado se
propagou de uma extremidade
a outra do mundo”.
O SÉCULO DAS LUZES
No século XVIII a França era um país afunda-
do em problemas. A monarquia levou o país à miséria,
enfrentando sucessivas guerras inúteis que esgotaram
os cofres do Estado. Curiosamente, foi em plena corte
de Luís XIV que os filósofos encontraram o clima ide-
al para aprofundar as novas teorias. O monarca queria
marcar seu nome na história como protetor da arte e
da cultura. Permitiu assim o início da renovação do
pensamento, que encontraria sua expressão máxima
na época de Luís XV. No reinado do filho do rei-sol, a
Paris iluminista se tornou o centro de uma notável pro-
dução intelectual, valorizada no início pela própria cor- “Penso, logo existo”
te, que ouvia extasiada as pregações de Montesquieu
e outros filósofos.
Rene Descartes
4. Os Pensadores
O direito e o dever de o povo der-
rubar os governantes despóticos tornou
O Iluminismo
Locke o autor preferido dos rebeldes. Sua
Tratados sobre o Governo Civil teoria foi a “Bíblia” dos revolucionários
que enfrentaram a opressão colonial in-
John Locke glesa e lutaram pela independência dos
EUA. O livro Tratados sobre o Governo
Civil inspirou Tomas Jefferson na
elaboração da Declaração de Independên-
cia dos Estados Unidos. O documento
norte-americano, elaborado em 4 de julho de 1776,
A
pesar da França ter sido o berço inte sacramentava o direito do povo lutar contra a opres-
lectual do Iluminismo, foi o inglês John são. Na França, o livro foi o manual do Século das
Locke o autor mais lido da primeira Luzes, discutido e debatido por vários intelectuais que
metade do século XVIII. Seu livro, Tratados sobre o não se contentavam com os postulados políticos de
Governo Civil foi escrito na Inglaterra, em 1689, logo Maquiavel e outros autores da época do absolutismo.
após a Revolução Gloriosa. Nessa obra, o autor afirma
que o direito de governar é delegado por quem é go-
vernado. Em outras palavras, o governo existe porque
foi aceito pelo povo para exercer essa função. “ Com uma das mãos, os
filósofos tentaram abalar o
trono; com a outra, quiseram
derrubar os altares. Sua finali-
dade era modificar nas
consciências as instituições
civis e religiosas e , por assim
dizer, a revolução se
processou”. 1
Na opinião de Brian Mage - História da Filoso-
fia - Locke tem sido descrito como a primeira mente
moderna. Isso porque reuniu e fundiu numa visão úni-
“Em nenhum A prioridade do governo deve ser a felicidade e ca algumas das preocupações fundamentais do pen-
outro lugar as o bem-estar da população. Em caso de transgressão da samento pós-medieval. Parte de sua mensagem básica
confusões e
ilusões da normalidade institucional defendia o dever do povo poderia ser expressa assim: “Não siga irrefletidamente
linguagem são derrubar o déspota, substituindo-o por um governo as autoridades, sejam elas intelectuais, políticas ou
mais aparentes do constitucional. Afirmava que diante do peso insupor- religiosas. Tampouco as tradições ou convenções so-
que no mundo da tável da opressão, não há direito divino que sustente o ciais. Pense por simesmo. Examine os fatos e tente
política, como
retratado nesse governo. Para Locke, não faz sentido a paz e a ordem basear sua opinião e seu comportamento nas coisas
quadro de Egbert quando os lobos se impõe aos cordeiros. Cabe então como de fato são”.
van Heemskerk - A ao povo julgar o governo dos soberanos e rebelar-se,
Eleição na sala da caso necessário, revogando o contrato político.
Guilda”
5. O Espírito das Leis
Montesquieu
A
primeira obra de impacto do renomado intelectual francês foi Cartas Persas. Nesse livro
de conteúdo atípico, o autor escreve em forma de ficção, descrevendo a perplexidade de
dois viajantes orientais que percorrem a Europa na época de apogeu das monarquias
absolutas. No relato aos amigos do Oriente, os viajantes demonstram a decepção diante de um mundo
supostamente mais coerente do que as terras do Oriente.
Em seguida publicaria O Espírito das Leis, contrariando as
O Iluminismo
teorias absolutistas. Afirmava que “as leis não são fruto da von-
tade pessoal de quem governa, mas da realidade social e históri-
ca de cada povo”. Apesar de não se posicionar por uma forma de
governo em especial, demonstrava enorme simpatia pela monar-
quia inglesa, implantada na Revolução Gloriosa de 1689 lhe
influenciando na elaboração da teoria do equilíbrio dos poderes.
Com efeito, o grande legado de Montesquieu para as gerações
futuras, foi a teoria dos três poderes — Executivo, Legislativo e
Judiciário, onde cada um exerce a vigilância e fiscalização em
relação aos outros, como forma de coibir eventuais abusos de
autoridade.
“O objetivo do governo é o bem estar dos homens. E o que
é melhor para eles? Ficar o povo exposto sempre à vontade ili-
mitada da tirania, ou os governantes terem algumas vezes de
sofrer oposição quando exorbitem o uso do poder e o empre-
guem para a destruição e não para a preservação das proprie-
dades do povo? Mas se há uma persuasão universal baseada em
prova manifesta de que estão em marcha certos desígnios contra
a liberdade, e o curso geral e tendência dos acontecimentos só
podem levantar fortes suspeitas das más intenções dos
O pintor barroco
governantes, quem terá de ser acusado? Quem poderá impedi-lo se os que podiam evitá-lo se deixam francês Jean-
ficar sob suspeita? Há de se reprovar o povo se tem o senso das criaturas racionais, podendo julgar os Honoré
fatos somente pela maneira como os constata e os sente?” 6 Fragnard
exprime
poderosamente
uma das mais
esmagadoras
paixões do
homem - o
desejo
“O primeiro que cercou um
O Contrato Social terreno, advertindo: ‘Este é meu’, e
encontrando gente muito simples
Rousseau que acreditou, foi o verdadeiro fun-
dador da sociedade civil. Que cri-
mes, guerras, assassinatos, miséri-
as e horrores teria poupado ao gê-
O
autor foi considerado o mais radical e nero humano aquele que tivesse gritado a seus seme-
polêmico dos autores iluministas. No lhantes: ‘Não escutem este impostor; vocês estarão
livro Discurso sobre a Origem da De- perdidos se esquecerem que os frutos são de todos,
sigualdade entre os Homens, derrubava a visão tradi- que a terra não é de ninguém’... Desde o instante em
cional, da pobreza naturalmente predeterminada pela que um homem teve necessidade da ajuda de outro,
herança social. Para Rousseau, a miséria decorria da desde que ele percebeu ser conveniente para um só ter
própria história dos homens, das formas de poder e da provisões para dois, a igualdade desapareceu, a pro-
conduta dos governantes, do poder despótico e a sua priedade se introduziu, o trabalho tornou-se necessá-
aceitação passiva. Nesse aspecto, ousava mais do que rio e as vastas florestas se transformaram em campos
os outros iluministas, combatendo a desigualdade so- risonhos que passaram a ser regados com o suor dos
cial. homens e nos quais vimos então a miséria e a escravi-
dão germinarem e crescerem com a colheita”. 7
6. “O
Homem
nasceu livre e
por toda
parte está em
O Iluminismo
grilhões”
Rousseau
Rousseau foi o apóstolo dos humildes. Na Re- Na obra “ O Contrato Social” defendia a reno-
volução Francesa, sua obra inspirou os jacobinos e as vação periódica do governo através de eleições, com
facções mais ousadas dos “enragés”. Contudo, ao cri- base no sufrágio universal. Considerava que a verda-
ticar a desigualdade, não propunha explicitamente a des- deira soberania é a que emanava do povo, e a vontade
truição da propriedade como um todo e sim a grande individual nunca deve superar o interesse geral da
propriedade remanescente da época feudal. Defendia a nação. O Estado resultante do Contrato Social tem
divisão dessas terras entre pequenos e médios plenos poderes para governar em benefício da maioria.
proprietários, prenunciando as reformas na agricultura “Cada um de nós coloca em comum sua pessoa e toda
que seriam realizadas nos países capitalistas. Seus sua potência sob a suprema direção da vontade geral;
conceitos exerceram grande impacto nos meios e recebemos em corpo cada membro como parte
intelectuais que, via de regra, consideravam Rousseau indivisível do todo.”
um louco destoante do seu tempo. Foi marginalizado e “Se a ordem social é para Rousseau um direi-
perseguido pela monarquia francesa e atacado pelos to sagrado que serve de base para todos os direitos,
próprios iluministas inclusive o da propriedade, ela não se origina, po-
“Nasceu livre esse homem, que entretanto, está rém, na natureza: esta não designou ninguém para
a ferros por toda a parte. Renunciar à sua liberdade, dar ordens aos outros, nenhum homem detém uma au-
não o poderia fazer sem renunciar, ao mesmo tempo, à toridade natural sobre seu semelhante; e, por outro
sua qualidade de homem, aos direitos da humanidade lado, a força não produz direito algum o que é um
e até aos próprios deveres; isso seria incompatível com direito que perece quando a força cessa? Se impõe a
sua própria natureza. Portanto, a autoridade política obediência pela força, não se tem necessidade de obe-
Londres, só pode assentar legitimamente numa convenção ini- decer por dever. O homem nasce livre; para Rousseau,
em 1753
cial. Trata-se do ato pelo qual um povo é povo. Eis o isso é axiomático. 8
verdadeiro fundamento da sociedade política”. Para os filósofos do iluminismo a natureza era
quase a mesma coisa que a razão. Isto porque, para
eles, a razão era uma dádiva da natureza ao homem
em oposição, por exemplo, à igreja ou aos corrompidos
métodos civilizatórios. Enfatizava-se que os povos
naturais eram freqüentemente mais sadios e mais felizes
do que os europeus, exatamente porque não possuíam
uma civilização. A palavra de ordem “de volta à
natureza” é de Jean-Jacques Rousseau. Ele dizia que a
natureza era boa e que o homem, portanto era natural-
mente bom. Todo o mal estava na sociedade civilizada,
que afasta o homem da sua natureza. 1
7. A Riqueza das Nações
Adam Smith
Nesse período, a agricultura francesa ainda su-
O
mais importante pensador econômico
perava a produção de manufaturas. Os fisiocratas e
foi o inglês Adam Smith. No livro, “A
Adam Smith tiveram em comum, a idéia do livre-co-
Riqueza das Nações” defendia insis-
O Iluminismo
mércio, apelidada pelos franceses de “laissez-faire,
tentemente o ideal liberal, condenando com veemên-
laissez-passez”. Mas, ao contrário do autor inglês,
cia as práticas mercantilistas. Para ele, a tutela do Esta-
Quesnay e Turgot enfatizavam a agricultura como gran-
do na economia, emperra o desenvolvimento e dificulta
de fonte de riqueza de um país.
a expansão do comércio. Achava que o mercado se
“Os fisiocratas partiam do pressuposto que a
ajustaria pelas leis de oferta e procura, impossibilitan-
terra era a única fonte de riqueza, daí a primazia da
do a escassez e excesso de produtos. Estudando a
agricultura sobre o comércio, atividade estéril, que se
realidade inglesa concluiu que a reserva de mão-de-
resumia na troca de mercadorias. Faziam analogia ente
obra era inesgotável o que impedia a escassez da oferta
o funcionamento do corpo humano e o organismo eco-
de trabalho.
nômico, ambos regidos por leis naturais: assim como
o coração era o orgão mais importante
do corpo humano, a agricultura o era na
vida econômica. Negavam, pois, o direito
do Estado de intervir e regulamentar a
vida econômica, pois, estaria atentando
contra as leis naturais. Nesse sentido cri-
ticavam as regulamentações
mercantilistas do Estado absoluto e pre-
gavam que o Estado deveria apenas limi-
tar-se a incentivar o progresso técnico e A elite
econômico, eliminando os obstáculos ao retratada em
quadro de
livre jogo da economia.” 10 Gainsborough
O DESPOTISMO
ESCLARECIDO
A concepção econômica de Adam Smith foi in-
fluenciada pelo contexto da nascente industrialização As teorias iluministas influenciaram, no final do
inglesa. Em contato com as fábricas, o autor espantou- século XVIII, o desenvolvimento de uma versão mais
se com o desenvolvimento e o ritmo de produção da amena das monarquias absolutistas, conhecidas como
indústria fabril. Desenvolveu então a teoria que a ri- Despotismo Esclarecido. Essas monarquias se desta-
queza de uma nação estava no trabalho e no desen- caram pela aplicação de reformas liberais, alterando (um
volvimento da produção. Segundo o autor, o trabalho pouco) o perfil de poder ilimitado exercido pelos reis.
especializado é mais produtivo, pois cada empregado Frederico II da Prússia, Catarina II da Rússia, Maria
desenvolve uma função especifica, podendo dedicar- Teresa e seu filho Joseph II, na Áustria, José I e Pombal
se a especialização e a melhoria da qualidade. O livro em Portugal, investiram em novas atitudes políticas e
“A Riqueza das Nações” é uma das mais importantes econômicas, tomando como base algumas idéias
obras de economia de todos os tempos. Apesar de iluministas.
Adam Smith revelar certa ingenuidade no ajuste auto- A condição de fraqueza dessas monarquias in-
mático da economia, as concepções de liberdade de centivou a adoção de reformas, visando a ascensão rá-
comércio se tornaram paradigma do capitalismo até os pida dessas nações que não conseguiam competir com
dias atuais. França, Inglaterra e Holanda. Na Áustria a moderniza-
ção atingiu principalmente a administração, estabele-
OS FISIOCRATAS cendo um sistema de governo bastante eficiente. No
plano externo, como não conseguiam anexar os esta-
O Fisiocratismo concebia a agricultura como dos alemães, os austríacos voltaram-se para os estados
principal fonte de riqueza de um país. Também não era do leste, realizando conquistas na região da Boêmia e
à toa, pois os autores fisiocratas viveram na França Hungria.
em fins do século XVIII.
8. A Prússia, enfatizou mais o aspecto militar, com Constata-se então que o Despotismo Esclare-
a pretensão de ampliar o seu poder. O ataque prussiano cido, se apoiou no ideal iluminista, mas não conseguiu
a Silésia estendeu o seu território, provocando um au- erguer nações que eram bastante dependentes das na-
mento de 50% na sua população, incluindo a nova re- ções desenvolvidas. No aspecto político, as mudanças
gião anexada. Além do mais, os novos domínios tinham foram restritas ao incentivo à cultura e a proteção aos
uma excelente manufatura têxtil, que foi obviamente, perseguidos. Nesse sentido, pode ser visto como
explorada pelos prussianos. A obsessão por organizar marketing de boa imagem sem alterar as questões mais
um exército poderoso fez a monarquia prussiana profundas.
diminuir o máximo possível, as despesas da corte, ca- A aplicação de medidas modernizantes sempre
nalizando os recursos para o sustento do efetivo mili- foi um bom negócio ao longo da história, daí a inten-
tar de 200.000 soldados. Em relação à cultura, Frederico ção de alterar a aparência sem modificar nada da es-
o Grande, foi muito esperto ao aceitar exilados franceses sência. Reformar a estética não significava mudança
em sua corte. A tolerância política demonstrada pelo em todos níveis. O rei da Prússia acabou com os direi-
O Iluminismo
monarca era um marketing positivo que o tornava sim- tos feudais, mas não teve coragem de impor o decreto
pático aos investidores e comerciantes burgueses. aos nobres. O José II da Áustria era tido como protetor
A Rússia alcançou destaque no reinado de da arte, até que a Revolução Francesa sacudisse o
Catarina a Grande, (1762-1796). Nesse período gran- mundo, levando o rei a censurar espetáculos musicais
de número de artistas e pensadores perseguidos encon- e exibições teatrais que lembrassem os temas revoluci-
traram na tolerância russa, o abrigo seguro para fugir onários.
da opressão em seus países. A corte ficou abarrotada
de intelectuais, que prestavam inúmeros favores à rai-
nha, incluindo o polêmico Rousseau que foi recebido 2
In. Blitzer, Charles. Op cit. Pág. 106.
como herói. 3
In. Blitzer, Charles. A Era dos Reis. Coleção Time-
Life. Pág. 119.
5
In. Gaarder Jostein. O Mundo de Sofia. Cia das
Letras. Pág. 338.
7
In. Rousseau. Discursos sobre a origem da desi-
gualdade. Apud. Chevallier, Jean-Jacques. História
do Pensamento Político. Editora Zahar. Pág. 149.
8
In. Chevallier, Jean-Jacques. História do Pensa-
mento Político. Editora Zahar. Pág. 46.
9
In. Gaarder Jostein. O Mundo de Sofia. Op. Cit.
Pág. 339.
10
In. Aquino, Jacques, Denise e Oscar. História das
Sociedades. Das sociedades modernas às socieda-
des atuais. Editora Ao Livro Técnico. Pág. 123.
11
In. Perry, Marwin. Op. Cit. Pág. 415.
A rainha Catarina procurou (sem muito suces-
so) aproveitar-se da dependência dos ingleses, em re-
A Holanda na
lação às reservas de ferro do território russo. Com o
época do
Iluminismo. tempo foi obrigada a dobrar-se à superioridade inglesa,
Quadro de aceitando liberar as fronteiras para a entrada de merca-
John Sleen - A dorias fornecidas pela Inglaterra.
Companhia
Em Portugal, no período do Marques de Pom-
Musical
bal, também se fez de tudo para desenvolver a indústria.
As medidas se estenderam ao Brasil com a liberação da
produção de manufaturas. Sobre o tema, confira o ca-
pítulo de Inconfidência Mineira.