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PROGRAMA DE ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DA MULHER – PAISM: 
entre as diretrizes nacionais e a realidade em Imperatriz 
Conceição de Maria Amorim 
INTRODUÇÃO 
A construção de políticas públicas dirigidas à saúde da mulher no 
Brasil é parte das profundas mudanças societárias das últimas décadas, 
através das lutas do movimento feminista, aliadas às profissionais da saúde do 
movimento sanitarista, comprometidas com a filosofia de saúde enquanto 
direito e preocupadas em garantir à mulher assistência integral, enfatizando a 
preocupação com seu corpo de forma integral, “e não apenas como órgãos 
isolados, a serem tratados por diferentes especialistas" (OSIS, apud; 
NAGAHAMA, SANTIAGO 2005, p.106). 
Este debate tem início em 1983, cujo desdobramento resultou na 
implantação do Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM). A 
partir de então, o Programa passa a ser gradativamente implantado, em 
diversos Estados do Brasil. 
O PAISM demarca um novo campo de visão e ação da saúde da 
mulher, ao romper com o modelo maternoinfantil retrógrado e conservador, que 
via a mulher como uma mera reprodutora. Embora não tendo sido implantado 
dentro da filosofia original, foi um marco na luta das mulheres por saúde, direito 
reprodutivo, cidadania e pelo seu reconhecimento enquanto sujeito de direito, 
significando uma conquista importante para a sociedade brasileira. 
Ao eleger esse tema de estudo, tem-se a pretensão de compreender 
em que contexto se deram as ações de saúde da mulher, em Imperatriz. Tal 
escolha também foi motivada por conversas com as funcionárias, durante 
período de estágio no Programa da Saúde da Mulher do Município de 
Imperatriz, e percebe-se que a equipe de saúde do PAISM não conhece as 
diretrizes nacionais, não foram capacitadas na perspectiva das relações de 
gênero ou violência doméstica e familiar contra a mulher. Essa constatação 
despertou a curiosidade de avaliar se o Programa de Atenção Integral à Saúde 
da Mulher responde aos princípios norteadores da integralidade na assistência 
à saúde da mulher, em Imperatriz. 
1
Esse estudo foi construído a partir de pesquisa de campo orientada 
por abordagem quantiqualitativa, através de coleta de dados. Utilizaram-se 
técnicas de entrevistas, observação direta e pesquisa documental. Os 
instrumentos utilizados, questionários abertos, roteiros de entrevistas 
estruturadas, pesquisas documentais realizadas em fichas de atendimento das 
usuárias, encaminhamentos ao Serviço Social, Relatório de Atividades de 2005 
a 2007 e atas do Conselho da Mulher permitiram compreender a dimensão 
desse Programa, neste município. 
Os dados foram coletados de forma sistematizada, utilizando-se 
elementos quantitativos e qualitativos com vistas a responder aos objetivos 
específicos propostos. Para a análise dos dados da pesquisa, empregou-se o 
método dialético, tendo em vista que este se refere à arte do diálogo e da 
discussão. Trata-se de um método de inquirição da realidade pelo estudo e sua 
ação recíproca. 
Para a dialética, não há nada definitivo, de absoluto, de sagrado. 
Apresenta a lógica de todas as coisas e em todas as coisas e, para ela, nada 
existe além do processo contínuo do devir transitório. 
A dialética é ciência que mostra como as contradições podem ser 
concretamente idênticas, como passam uma na outra, mostrando 
também porque a razão não deve tomar essas contradições como 
coisas mortas, petrificadas, mas como coisas vivas, móveis, lutando 
uma contra a outra em e através de sua luta. (LEFEBVRE, 1979, p. 192 
Disponível em: www.wikipeia.pt.com. ). 
Ao construir os dados dessa pesquisa de forma cuidadosa, buscando 
não somente a visão das mulheres usuárias, mas também dos profissionais de 
saúde, teve-se a consciência de que as respostas têm várias faces, várias 
visões, inúmeras verdades, causas e conseqüências. Assim se move o pensar 
dialético. As verdades aqui construídas são frutos dessas reflexões e das 
experiências que não são movidas pela neutralidade, uma vez que os 
pesquisadores que fazem ciência, usando o método dialético, não se furtam de 
expressar suas visões e suas paixões, fruto de análise e estudos em que se 
constituem em muitas situações protagonistas. (FERREIRA, 2007). 
2
SAÚDE DA MULHER: LUTAS E CONQUISTAS 
A política pública de atenção à saúde da mulher está vinculada à luta 
dos movimentos feministas, que culminou com a formulação de uma Política 
Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher. Segundo Costa (1997), a 
integralidade pensada na formulação do PAISM, no início dos anos 80, tinha 
por inspiração tanto os valores que norteavam o movimento sanitário quanto 
aqueles advindos da reflexão feminista. Dessa forma, incluía tanto a idéia de 
integração das distintas modalidades e níveis de assistência, quanto a 
perspectiva da integralidade dos sujeitos sociais. Como resultado, suas 
diretrizes propunham a assistência à saúde nas diferentes etapas da vida das 
mulheres, tendo a integralidade como principal estratégia de reorganização dos 
serviços de saúde. Por outro lado, a compreensão de que a organização das 
práticas de saúde apóia-se em valores que produzem e reproduzem as 
desigualdades de gênero, as propostas originais do PAISM pretendiam influir 
na construção de novos valores com vistas à emancipação das mulheres. No 
plano das relações entre usuárias e serviços de saúde, o PAISM privilegiou a 
sensibilização de profissionais na busca de melhoria da qualidade da atenção e 
humanização das práticas assistenciais. 
Esta desconstrução partia da premissa de não permitir o controle da 
sexualidade e da reprodução como simples instrumento para assegurar o 
controle populacional e reproduzir a força de trabalho nos modos subalternos 
em que as relações sociais são estabelecidas no sistema capitalista. Desta 
forma, o pensamento do Movimento Feminista se reafirma no Espaço 
Acadêmico na perspectiva de combater a visão de uma sexualidade 
socialmente útil e politicamente conservadora, que questionava a prática do 
saber médico acima de todos os saberes, que se fortalece no método das 
especializações. 
A SAÚDE DA MULHER E AS RELAÇÕES DE GENÊRO 
Quando se fala de gênero, fala-se de relações sociais e, segundo 
dizia o filósofo francês Michel Foucault, falar de relações sociais é falar de 
relações de poder, poder que se exerce nos espaços privado e público. 
Para Eleonora Menicucci de Oliveira, (2008): 
3
O uso da categoria de gênero como relacional de poder nos estudos 
na área da saúde integral da mulher, direitos reprodutivos e direitos 
sexuais problematiza as práticas e os exercícios das sexualidades ao 
(des)naturalizar e (des)banalizar as relações entre os sexos e 
intrassexos. Essa problematização ilumina as expressões das 
necessidades de saúde, articulando-as às necessidades que estão 
ancoradas nas esferas da subjetividade e mentalidades, como o 
preconceito e a discriminação. 
A experiência com as pesquisas na área da saúde integral da mulher 
tem sido valiosa para tornar visível a que nível se dão as relações de gênero, 
em nossa sociedade, e o quanto sofrem, em maior intensidade, as mulheres 
negras, indígenas, lésbicas, portadoras do vírus HIV, que precisam do 
atendimento médico na rede pública ou privada. Estas têm sua saúde tratada 
com um maior grau de desrespeito e desumanização, independente do 
atendimento ser feito por um profissional homem ou mulher. 
Como gênero é relacional, segundo Saffiotti (1992, p.36), quer 
enquanto categoria analítica, quer enquanto processo social, “o conceito deve 
ser capaz de captar a trama das relações sociais”, os graus de risco a que está 
exposto o conjunto da população. É necessário, também, serem observados os 
padrões distintos de sofrimento, adoecimento e morte a que estão expostos, 
distintamente, homens e mulheres. 
DIRETRIZES DO PAISM 
O Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM) teve 
sua formulação no início da década de 80. Tinha como principal perspectiva a 
superação da afirmação maternoinfantil nas ações de saúde da mulher. 
É por meio de políticas públicas que o Estado adquire legitimidade 
para agir sobre um grupo de indivíduos ou sobre um dado segmento da 
sociedade, na tentativa de praticar ações interventivas que interfiram 
positivamente nas condições de vida desses indivíduos ou segmentos sociais. 
Conforme Mary Ferreira, (1999, p. 35), em sua obra “Mulher Gênero 
e Políticas Públicas” preconiza que: 
A formulação de políticas públicas pode ser vista como um processo 
que se constrói a partir de um diálogo entre o Estado, através de seus 
diversos poderes – executivo, legislativo, judiciário – e os grupos de 
interesse e de pressão representados por partidos políticos, sindicatos, 
grupos autônomos, organizações não governamentais, cidadãos e 
cidadãs. 
4
O PAISM funcionou como Programa de Atenção à Saúde da Mulher, 
desde sua implantação, até 2004, quando, em 28 de maio de 2004, o ministro 
da Saúde, Humberto Costa, lançou a - Política Nacional de Atenção Integral à 
Saúde da Mulher – PNAISM - Princípios e Diretrizes, construída a partir da 
proposição do SUS, respeitando as características da nova política de saúde. 
(MS 2008). 
Esses parâmetros de saúde integral, dentro de uma concepção de 
garantia de direitos, remetem-nos a compreender alguns de seus marcos na 
constituição de tais diretrizes para execução de uma Política Nacional, 
Estadual e Municipal de Atenção Integral à Saúde da Mulher. 
O Sistema Único de Saúde deve estar orientado e capacitado para a 
atenção integral à saúde da mulher, numa perspectiva que contemple a 
promoção da saúde, as necessidades de saúde da população 
feminina, o controle de patologias mais prevalentes nesse grupo e a 
garantia do direito à saúde. (BRASIL, 2004). 
Executar ações no controle de patologias mais prevalecentes entre 
as mulheres, respeitando e reconhecendo suas subjetividades, grupos étnicos, 
nível e grau de vulnerabilidade social entre outros elementos e fenômenos, 
ainda é um grande desafio. 
A Política de Atenção à Saúde da Mulher deverá atingir as mulheres 
em todos os ciclos de vida, resguardadas as especificidades das 
diferentes faixas etárias e dos distintos grupos populacionais (mulheres 
negras, indígenas, residentes em áreas urbanas e rurais, residentes 
em locais de difícil acesso, em situação de risco, presidiárias, de 
orientação homossexual, com deficiência, dentre outras). (BRASIL, 
2004). 
O planejamento e a avaliação como prática sistemática nos diversos 
níveis dos serviços de saúde propiciam aos gestores a definição de estratégias 
de intervenção, mais próxima da realidade epidemiológica da saúde da mulher. 
As políticas de saúde da mulher deverão ser compreendidas em sua 
dimensão mais ampla, objetivando a criação e ampliação das 
condições necessárias ao exercício dos direitos da mulher, seja no 
âmbito do SUS, seja na atuação em parceria do setor Saúde com 
outros setores governamentais, com destaque para a segurança, a 
justiça, trabalho, previdência social e educação. (BRASIL, 2004). 
A integralidade do Programa pressupõe ações construídas a partir 
da concepção de intersetorialidade, comunhão de saberes e fazeres coletivos, 
5
que perpassem o espaço físico do atendimento, em que se veja a usuária 
como um todo e se garanta uma atuação permanente na prevenção e 
promoção da saúde, considerando as especificidades e as relações de gênero 
na sociedade patriarcal, capitalista comprometida com as políticas do 
neoliberalismo. 
O SUS deverá garantir o acesso das mulheres a todos os níveis de 
atenção à saúde, no contexto da descentralização, hierarquização e 
integração das ações e serviços. Sendo responsabilidade dos três 
níveis gestores, de acordo com as competências de cada um, garantir 
as condições para a execução da Política de Atenção à Saúde da 
Mulher. (BRASIL, 2004). 
A prática da Atenção Básica permeada pela integralidade traz para o 
campo da assistência à saúde da mulher a perspectiva de transformação das 
práticas de assistência à saúde até então perpetradas no Brasil. Significa ter 
acesso a uma saúde que considera toda a situação vivida pelo coletivo, onde 
vive aquela usuária; significa a atuação dentro do Programa de equipes 
multiprofissionais que planejam e avaliam, conjuntamente. 
Compreende-se que a participação da sociedade civil na im-plementação 
das ações de saúde da mulher, no âmbito federal, 
estadual e municipal requer – cabendo, portanto, às instâncias 
gestoras – melhorar e qualificar os mecanismos de repasse de 
informações sobre as políticas de saúde da mulher e sobre os 
instrumentos de gestão e regulação do SUS. (BRASIL, 2004). 
O controle social é um grande desafio dos gestores municipal, 
estadual e federal. Uma gestão transparente que inclua a população, 
profissionais da saúde, gestores e prestadores, em Conselho de Saúde, em 
comissões de planejamento, execução e avaliação, em comitês qualificados, 
autônomos e representativos. É uma luta política permanente. Mesmo que 
estes instrumentos estejam previstos nas normas técnicas e legislação do 
Sistema Único de Saúde, continuam sendo um grande desafio para o conjunto 
da sociedade e dos governos. 
IMPLANTAÇÃO DO PAISM EM IMPERATRIZ 
O primeiro contato que os trabalhadores da Saúde de Imperatriz 
tiveram com o Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher, segundo o 
médico ginecologista Pedro Mário, foi no começo da década de 90. Este 
6
profissional foi convidado para uma capacitação, em São Luís, no entanto, as 
ações não se concretizaram. No Maranhão, o Programa foi implantado pela 
Secretaria de Desenvolvimento Social que continuava vinculando a saúde 
materna à infantil. Segundo Pedro Mário, na capacitação, o Programa foi 
apresentado como PAISMC- Programa de Atenção à Saúde da Mulher e da 
Criança. Em 2001, o poder público municipal decidiu pela implantação e o 
convidou para implantar e coordenar o PAISM. 
O PAISM foi implantado, em Imperatriz, no dia 08 de março 2001. 
Segundo a Secretária Municipal de Saúde, à época, a implantação se deu por 
reivindicação do Movimento de Mulheres de Imperatriz. 
Maria da Conceição Medeiros Formiga, uma das lideranças do 
Movimento de Mulheres, lembra que foi entregue ao Prefeito eleito, para o 
mandato de 2000 a 2004, uma pauta ampla de reivindicação, entre elas a 
implantação do PAISM. Sobre este asunto ela ressaltou que: 
Esta era uma reivindicação antiga do Movimento de Mulheres e 
Feministas de Imperatriz, até porque o Programa estava sendo 
implantado em outros estados e municípios do país desde 1984. 
Mesmo sendo uma das reivindicações prioritárias para o movimento 
e pautadas em todas as reuniões entre o Poder Público e a 
Sociedade Civil só foi atendida no ano de 2001. (FORMIGA, 2008) 
O médico ginecologista Pedro Mario afirmou ter montado toda a 
estrutura do Programa à luz de sua experiência pessoal. 
Para (M.J), militante feminista do Centro de Direitos Humanos Padre 
Josimo, a “implantação do PAISM se deu num embate político pela 
participação do Movimento de Mulheres nas deliberações sobre como, onde e 
quem deveria estar à frente do Programa”. 
ESTRUTURA ATUAL DE FUNCIONAMENTO 
O Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher funciona no 
Centro de Saúde Três Poderes, Rua Itamar Guará, S/N, Jardim Três Poderes. 
O atendimento ao público se dá de segunda a sexta-feira, das 7hs às 12hs, 
Segundo informação da Coordenação do Programa e os Relatórios 
de Atividades de 2005 a 2007, as usuárias são encaminhadas pelo Programa 
de Saúde da Família para as consultas ginecológicas. Após tais consultas, 
podem ser encaminhadas para procedimentos no próprio Programa, tais como: 
Exame Citopatológico (PCCU), Histopatológico, Colposcopia, Biópsia, Cirurgia 
7
de Alta Freqüência - CAF, Consultas Ginecológicas, Consultas Mastológicas, 
Atendimento ao Climatério, Atendimento Equipe Multiprofissional, Inserção do 
DIU, Cirurgias Ginecológicas, Conização, e Palestras Educativas. As usuárias 
que necessitam de outros tipos de exames são encaminhadas para a rede 
credenciada. 
Foram realizadas entrevistas com 09 funcionárias. Perguntadas se a 
equipe recebeu capacitação sobre questão de relações de gênero, 06 
afirmaram, categoricamente, não ter havido capacitação na perspectiva das 
relações de gênero para a equipe, e 03 funcionárias responderam textualmente: 
“Sim – recentemente tivemos uma palestra sobre coleta 
citopatológica de colo de útero” (Funcionária 1) 
Freqüentemente estamos nos capacitando desde o ACS, Agente 
Comunitário de Saúde, enfermeiras das equipes do PSF, médicos, 
auxiliar de enfermagem, sempre se capacitando nas várias situações 
que atendemos a saúde da mulher, desde a questão do 
Planejamento...Pré Natal...(Coordenadora) 
Percebe-se, nas afirmações, o desconhecimento do termo “relações 
de gênero” pelas profissionais que afirmaram terem recebido a capacitação, 
que se concretiza quando enfocam as temáticas dos cursos. 
Sobre a capacitação de atendimento à mulher vítima de violência, 
segundo o médico ginecologista Pedro Mário, na época da implantação do 
Programa: 
Não houve nenhum pensamento nem meu. Não sei se houve por 
alguém de assistência, até porque, aí, entra uma culpa minha. Na 
qualidade de médico, a gente, vê de imediato, a questão do estupro, 
aí vê a violência doméstica como uma questão de agressão que 
deveria ser assistida pela Policia...Mas essa tem uma assistência 
melhor em termos de assistência médica, porque sendo uma 
agressão física, ela encontra o hospital municipal que atende 
urgência e emergência, numa boa lá... (Pedro Mário) 
As demais profissionais entrevistadas confirmam que a equipe não 
recebeu qualquer capacitação sobre o atendimento às mulheres vítimas de 
violência. Segundo uma das profissionais, esta é “uma questão de suma 
importância a ser debatida e avaliada pela equipe como um todo”. 
A relação da violência contra a mulher e a sua saúde tem se 
tornado, cada vez, mais evidente, embora a maioria das mulheres não relate 
que viveu ou vive em situação de violência doméstica. Por isso, é importante 
que os profissionais de saúde sejam treinados para identificar, atender e tratar 
8
as pacientes que se apresentam com sintomas que podem estar relacionados 
a abuso e agressão. 
As funcionárias foram questionadas se conheciam as Diretrizes e 
Princípios do PAISM e a maioria afirmou não conhecê-las. Também foram 
questionadas se a equipe se reúne para avaliar, planejar e trocar informações 
sobre perfil socioeconômico, psicológico ou sobre as incidências de doenças 
das usuárias. Todas responderam que não. 
As falas da maioria das profissionais entrevistadas sobre as 
dificuldades na implementação das ações no PAISM apontam para as 
questões ligadas à infraestrutura do espaço, à qualidade do atendimento, 
reconhecendo, principalmente, a falta de informação entre funcionárias e 
usuárias. Apenas uma manifestou a preocupação com a falta de avaliação e 
planejamento. 
Quanto às usuárias, 70% disseram que foram bem atendidas, 24% 
disseram que não foram bem atendidas e 6% não responderam. As principais 
queixas das usuárias quanto ao atendimento são o longo tempo de espera e o 
curto tempo dedicado a elas na consulta, filas, falta de condições adequadas 
do espaço, falta de informações sobre o funcionamento, erros em dados ou 
registros, falta de comunicação sobre assuntos de seu interesse. 
Quando as perguntas passaram a questionar acerca do 
atendimento, percebemos uma grande resistência a cada resposta. A 
preocupação de não se exporem, de não se prejudicarem, além do elemento 
“medo” de prejudicar alguém é explicito. Há a compreensão de que, por se 
tratar de um atendimento público, é natural que as consultas sejam rápidas, 
que os exames não sejam marcados ou que os prazos estabelecidos não 
sejam cumpridos. 
A relação da usuária com o SUS se dá com base em uma regra 
incisiva, em nível de sua consciência prática, embora rejeitada, muitas vezes, 
no aspecto discursivo. É a de que os serviços de saúde pública são tidos 
como uma espécie de favor à população mais pobre do país, bem longe de ser 
um exercício de direito de cidadania. 
As usuárias sentem isso, concretamente, na maneira de serem 
tratadas, especialmente quando necessitam de informações básicas. 
Geralmente, recebem respostas evasivas ou não recebem respostas, gerando 
9
uma percepção de um expressivo descaso para com elas, nas diversas 
interfaces com os serviços de saúde. 
Desse modo, a maioria das entrevistas expressou um sentimento 
em que predomina a imagem na qual não são vistas como cidadãs, no entanto, 
depois de todas as queixas relatadas, elas preferem que a pesquisadora 
marque sim - que foram bem atendidas - porque “não vai adiantar nada mesmo 
dizer que não foi”. 
O nível de escolaridade da maioria das entrevistadas, ou seja, 43% 
entre analfabetas e com, no máximo, o ensino fundamental completo, contribuí 
para o baixo senso crítico, até mesmo pela dificuldade que a usuária tem de se 
apropriar das políticas públicas como um dever do Estado e direito do cidadão. 
Indagadas às usuárias se conheciam os serviços do PAISM, 68% 
disseram não conhecê-los e 32% disseram conhecer os serviços prestados 
pelo Programa. Estes dados não só confirmam o desconhecimento das 
usuárias sobre o funcionamento, mas como também reafirmam a constatação 
feita, acima, por algumas funcionárias, que admitem a falta de diálogo e 
conhecimento entre as equipes, desde a atenção básica, nos PSF’s, até os 
serviços de especialidades e referência. 
Algumas usuárias relatam que têm dificuldades para conseguir 
informações das atividades desenvolvidas, no Posto de Saúde. 
As usuárias vêm para o Programa encaminhadas pelos PSFs, sem 
nenhum prontuário, sem nenhuma informação sobre sua vida epidemiológica, e 
são tratadas apenas no aspecto ginecológico, sem que se garanta a contra 
referência. Ela é cadastrada em uma ficha do atendimento ginecológico, e, na 
primeira consulta, são pesadas, medem a pressão e fazem a consulta. Das 
mulheres entrevistadas, 68% fizeram consulta ginecológica, 13% fizeram o 
papanicolau, 7% procuraram o programa para a colocação do DIU, 3%, em 
busca de laqueadura e 3%, outros. Questionadas sobre o tempo da consulta, 
50% responderam ter durado 5 minutos, 25% 10 minutos, 22% 15 minutos e 
3% não souberam dizer. Portanto, a média de tempo, segundo as usuárias, fica 
em torno de 8,54 minutos. 
Das mulheres atendidas em consulta ginecológica, 93% disseram 
que o médico não fez exames locais, mas todas receberam solicitação de 
exames. 
10
Esta é uma situação generalizada no atendimento médico. Além de 
pesquisar o tempo gasto na consulta entre as usuárias, observamos, durante 5 
dias, o fluxograma de atendimento. Contabilizamos 54 atendimentos com um 
tempo de duração de, no máximo, 3 a 4 minutos e 12 atendimentos, no período 
máximo, de 5 minutos. Considerando as mulheres que estão vindo para a 
primeira consulta, percebe-se uma grande frustração quando as mesmas 
saem do consultório sem serem “examinadas” e com vários pedidos de exames 
para carimbar. 
Como se assiste, integralmente, uma mulher com uma consulta 
ginecológica que dura, no máximo, 5 minutos? Qual o tempo que é reservado 
à escuta dessa paciente sobre suas queixas acerca do sofrimento vivido por 
sua pressão arterial, sua dor na coluna? Qual o tempo que se reserva para que 
este médico se inteire sobre as condições de saúde, além do seu útero ou 
mama? Qual a carga de trabalho doméstico dessa usuária? Como ela vive sua 
sexualidade? Ela decide sobre seu corpo? Toma decisão com respeito a sua 
vida pessoal e quanto aos aspectos reprodutivos? Ela sofre violência física, 
psicológica, moral, material ou sexual? Ela sofre discriminação por causa de 
sua cor, idade, orientação sexual? Conhece sobre seus direitos à saúde e à 
cidadania? 
Quanto ao tempo gasto para marcar os exames no Programa, 77% 
demoraram até 30 dias, 15% mais de 30 dias e 8% mais de 60 dias. Outro 
grande problema é a demora na entrega dos resultados dos exames, como no 
caso do Papanicolau, A coleta é feita no Programa e em alguns Postos de 
Saúde, e os exames são feitos em laboratórios credenciados, além da demora 
na entrega do resultado, que, geralmente, não acontece na data marcada, 
criando uma expectativa muito grande e, dependendo do caso, as usuárias se 
sujeitam a pagar o exame particular para não perder prazos. 
No que se refere ao atendimento médico, 43% consideram a 
consulta boa, 36 % consideram a consulta regular, 8%, ruim e 8% não 
quiseram responder. 
As usuárias do PAISM expressam, contraditoriamente, sua 
satisfação com uma consulta que, na maioria das vezes, aconteceu num tempo 
insuficiente para elas esclarecerem dúvidas, receberem informações mais 
11
detalhadas sobre sua saúde, o que constitui um elemento a ser refletido, 
considerando o nível de escolaridade o que influência sua capacidade crítica. 
Perguntadas sobre os principais avanços no PAISM, as profissionais 
entrevistadas consideraram a reforma física do espaço e a ampliação do 
quadro de funcionários. 
Quando perguntadas se avaliam que o Programa, em Imperatriz, 
consegue efetivar o que está determinado pelas diretrizes nacionais, todas as 
funcionárias responderam que não. 
Nas 224 fichas analisadas, constatamos que, no período de 06 anos, 
não foi registrado o atendimento de nenhuma criança de 0 a 12 anos. Apesar 
de o Programa manter, em seu quadro de funcionários, uma ginecologista só 
para esse público, apenas 4% de adolescentes entre 13 e 18 anos, 21% de 
19 a 30, 35% de 31 a 40 anos, 25% de 41 a 50 anos e 15% mais de 50 
anos passaram por essa profissional. 
Portanto, 56% das usuárias são mulheres em faixa etária de fertilidade. 
Um dado muito importante é que destas, 73% são laqueadas, apenas 17% 
usam métodos reversíveis de contracepção. Entre as 224 usuárias, 52% são 
casadas, 23% solteiras, 3% viúvas e 22% não foi registrado o estado civil da 
usuária. 
As usuárias do PAISM tiveram registradas a seguinte escolaridade: 9% 
de analfabetas, 15% de alfabetizadas, 19% com ensino fundamental, 20% com 
ensino médio, 2% com ensino superior e 35% das fichas não registravam a 
informação. O nível de escolaridade está relacionado a importantes fatores 
sobre a saúde da mulher. Este é um dado de elevada relevância que se 
apresenta para o desenvolvimento humano, no sentido de que o conhecimento 
despertado pela escolaridade atenua as desigualdades em diversas esferas da 
vida. 
Estudo recente apresentado pela 3ª Pesquisa Nacional de 
Demografia em Saúde (PNDS), apresentada em Brasília, dia 03 de julho de 
2008, mostra que 10% das mulheres brasileiras - cerca de 10 milhões de 
pessoas - têm dificuldades de cuidar de si e de seus filhos e até mesmo ter 
acesso às políticas públicas de saúde porque não têm escolaridade básica. 
A pesquisa mostra que, apesar da redução na mortalidade infantil no 
país, 20% dos filhos nascidos vivos de mulheres sem estudo morrem antes de 
12
completar um ano. Na faixa superior de escolaridade, com 12 anos ou mais de 
estudo, a mortalidade dos bebês é praticamente zero. 
Segundo esses estudos , até mesmo o direito de escolher ter esses 
filhos é mais difícil para as mulheres com menor escolaridade, basta ver as 
diferenças nas taxas de fecundidade. Enquanto aquelas com mais estudo têm, 
em média, um filho - inferior até mesmo à taxa de reposição da população, que 
é de dois filhos - mulheres que nunca freqüentaram a escola têm, em média, 
4,2 filhos. Ainda uma parte não desprezível dos filhos dessas mulheres (16,6%) 
sofre de desnutrição crônica, um problema que não mata, mas afeta o 
desenvolvimento da criança, sua capacidade de aprender e de reagir a 
doenças. 
Verifica-se, também, que quanto mais aumentam a escolaridade e a 
renda, menor é o grau de utilização intensiva do SUS, confirmando que o 
acesso para as camadas mais pobres é essencial e estratégico. 
Considerando a importância da identificação da cor da mulher, que 
está diretamente ligada à etnia, à raça, ao preconceito, à desigualdade, e à 
história epidemiológica, podemos observar que esta é uma discussão que 
passa longe do Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher de 
Imperatriz, considerando que 35% das fichas de atendimento, mesmo com o 
local destinado a identificar a cor da paciente, este não é preenchido. 
Uma variante que se encontra em debates técnicos, científicos e 
políticos, em nossa sociedade, há poucos anos, tem identificado perfis 
epidemiológicos entre mulheres negras e brancas bem diversificados, com 
doenças consideradas prevalecentes entre negras e brancas. O quesito que 
identifica a cor da usuária encontra-se assim distribuído: 4% de negras, 11% de 
brancas 50% pardas, portanto 65 % das usuárias foram classificadas por cor, 
sendo que a cor parda aparece como a cor da metade da população usuária do 
PAISM, em Imperatriz. 
Considerando que os dados referentes à categoria "pardos" têm sido 
mais próximos aos evidenciados pela população negra, é importante que a 
gestão do PAISM tenha um recorte étnico/racial, com intervenções que 
perpassem a universalidade, com políticas equitativas de natureza pluri e 
interdisciplinar, pois, segundo Oliveira (2003, p. 25), “Em todos os grupos 
13
populacionais raciais ou étnicos, há doenças que são prevalentes ou que evolui 
de forma diferenciada nesses grupos”. 
Entre algumas doenças consideradas prevalecentes em negras e 
negros, está a anemia falciforme, que também é uma doença genética comum, 
no mundo; a hipertensão arterial; a diabetes tipo II. Os miomas uterinos que, 
segundo a literatura médica norteamericana, têm sua prevalência em mulheres 
negras, sendo cinco vezes maior que nas brancas, estes dados se confirmaram 
através de pesquisa também realizada, no Brasil, em 1995, pelo CEBRAP – 
Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. (OLIVEIRA, 2003) 
Desenvolver ações de saúde da mulher sem levar em conta estes 
dados da realidade, e ter, como público alvo, usuárias incluídas neste perfil 
epidemiológico, remete-nos a refletir sobre que universalidades estão 
praticando, que equidades estão almejando e, principalmente, que 
integralidades de fato estão implementando. 
Quanto à ocupação das usuárias, os dados revelam que 2% são 
trabalhadoras domésticas, 3% professoras, 4% lavradoras, 40% do lar e 51% 
outras. 
Quando observamos, de maneira conjunta, os dados referentes à 
ocupação e à escolaridade da usuária, observamos uma negativa relação 
direta entre eles: ocupação subalterna acompanha a baixa escolaridade. Fora 
da escola, instituição responsável pela qualificação da força de trabalho, pela 
integração do indivíduo ao sistema produtivo, a mulher, com baixa 
escolaridade, tem um handcap que a impede de ocupar até mesmo as 
posições subalternas e secundárias destinadas às mulheres pela sociedade 
patriarcal. 
As ocupações exercidas pela maioria das mulheres apresentam 
algumas características comuns. De um modo geral, são ocupações com 
características ditas "femininas": servir, alimentar, limpar, cuidar em caso de 
doença, educar e são trabalhos com baixa remuneração. 
Considerando outra variável da pesquisa, o estado civil dessas 
usuárias, 52% são casadas. Tradicionalmente, as mulheres que casam e 
constituem famílias, ainda jovens, param de estudar, por vários motivos, entre 
eles a imposição do marido. 
14
É possível que as mulheres que não trabalham fora disponham de 
mais tempo livre para usar os serviços de saúde, já que não estão submetidas 
a uma dupla jornada de trabalho. 
Considerando a realidade das mulheres que trabalham, estas estão 
submissas a um mercado com horários rígidos, que coincidem com o horário 
de funcionamento do PAISM, no município. Este público tem acessado pouco o 
PAISM. 
Sobre questões socioeconômicas: das usuárias, 34% têm renda de 
01 a 02 salários mínimos, 43% de 02 a 03 salários mínimos, 15% mais de 3 
salários mínimos e 8% não sabem estimar a renda familiar. 
O Programa está localizado em uma área residencial de classe 
média alta, nos Três Poderes. O acesso ao Programa se dá pela Av. Bernardo 
Sayão, por onde passam alguns dos ônibus urbanos, dificultando o acesso da 
maioria da população usuária. Moradores da Região da Grande Santa Rita, 
por exemplo, se tiverem que vir de ônibus, precisam andar 08 quadras a pé 
para chegar ao Centro de Saúde. 
É real a desarticulação administrativa entre os Programas, PAISM 
-DST/AIDS - PSF (Programa Saúde da Família), e entre os próprios 
profissionais envolvidos nos respectivos Programas, o que tem contribuído 
para a dispersão das ações e a não otimização dos recursos destinados à 
saúde da mulher, como implantação de serviços, capacitação das equipes e 
distribuição dos preservativos e métodos contraceptivos de forma integrada. 
Algumas falas dos entrevistados, entre eles gestores e ex-gestores, 
revelam a dificuldade de realizar a interdisciplinaridade dentro do Programa 
e/ou entre o conjunto dos Programas de Saúde: 
“Nós tínhamos uma equipe multiprofissional, mas não tínhamos uma 
interação, até porque não era uma situação fácil. A gente não tinha os 
recursos humanos muito próximos... e principalmente médicos para 
você chamar para reunião fica muito difícil...“um dos elementos é a 
dificuldade de reunir o pessoal das equipes que é outro grande 
problema que depende de decisão política, porque ai nós temos a 
cobrança da produtividade...(P.M) 
“ainda precisamos ver com outro enfoque, precisamos sensibilizar 
mais, mobilizar mais, trazer a sociedade civil pra ajudar, trazer a 
comunidade como um todo...eu acredito que vai ser determinante um 
controle social para que possa estr junto ao Gestor em nível de 
município e em nível de estado para que se possa realmente fazer 
15
com que a equipe se reúna, faça planejamento, pra que haja 
sugestões da comunidade que estão na ponta...(Secretária)”. 
“Para os indicadores, PCCU, CISCOLO, a gente tem feito reunião. A 
gente se reúne para avaliar cumprimento de meta de indicadores que 
estão pactuados há mais tempo...há reuniões, sim, sobre os 
indicadores...(Secretária)”. 
“Nós temos uma equipe multidisciplinar, trabalhamos com atendimento 
das mulheres e, mensalmente, são avaliados os dados, quantas 
mulheres são atendidas, no que elas são atendidas, trabalhamos com o 
planejamento dessas atividades”. (Coordenadora) 
Os gestores constatam e pontuam, com clareza, a dificuldade de 
realizar as reuniões para avaliar e planejar as ações, reafirmando, em suas 
falas, que até acontecem reuniões mensais com alguns membros da equipe 
para levantamento e registros de dados de produtividade. 
Constata-se que a discussão do atendimento à mulher vítima de 
violência foi retomada pela atual Coordenação, que conseguiu realizar uma 
reunião com alguns técnicos da Secretaria de Saúde e iniciaram um debate 
para definir um fluxograma de atendimento às mulheres vítimas de violência. 
Porém, a iniciativa se mantém embrionária, dada as dificuldades de 
elaboração, compreensão do que fazer, como fazer, quem fazer. O 
desconhecimento por parte dos membros da equipe que se envolveram, na 
discussão, sobre a temática, juntamente com a ausência da compreensão das 
relações de gênero, dificultam a articulação dessas ações. 
Alguns dos dados do Relatório de Atividades de 2005 a 2007 são, 
comprovadamente, irreais. Estes, quando divulgados, comprometem a real 
cobertura da saúde da mulher, no município e região, pois eles, de fato, não 
existiram. Comprometem, também, as informações da cobertura nacional na 
medida em que estes são informados ao Departamento de Informática do SUS 
- DATASUS, órgão da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde, que tem a 
responsabilidade de coletar, processar e disseminar informações sobre saúde. 
A inexistência da avaliação e planejamento culmina com as 
dificuldades do exercício da prática da interdisciplinar que se concretiza diante 
de tais fatos que impossibilitam ações combinadas e de superação de 
demandas diárias. 
Assim sendo, é palpável o confronto entre as duas políticas 
presentes no PAISM de Imperatriz. Dentro do espaço da ordem capitalista, a 
16
política de bem-estar social exige garantias de direitos sociais; a política liberal, 
perpetrar restrições e, por conseguinte, nega tais direitos, promovendo 
ambiguidade e contradições que adquirem dimensões éticas. 
CONSIDERAÇÕES FINAIS 
No decorrer deste estudo, verificou-se que as políticas públicas 
resultam de uma permanente luta de classes e que, apesar de se conseguirem 
avanços e conquistas sociais, nem sempre se garante, na prática, a eficácia do 
seu conteúdo teórico. 
Durante as etapas que o nortearam, é visível que a luta pela 
implantação do PAISM faz parte do mesmo esforço da implantação do SUS, e 
este se fortaleceu e tomou impulso com as últimas Conferências Nacionais de 
Saúde, mas, sensivelmente, recua na prática dos gestores responsáveis pela 
sua concretização, através de rupturas com os princípios do SUS, levando-se a 
crer que, apesar das declarações oficiais a favor de sua implantação, há 
manobras políticas com o propósito de inviabilizá-lo. 
A implantação do PAISM aparenta ter sido bastante diferenciada em 
todo o país, refletindo os distintos graus de compreensão e compromisso 
político dos governantes com a questão da mulher e a disparidade nas 
estratégias adotadas na organização do sistema de saúde. 
A partir de 2004, o PAISM foi transformado em Política de Atenção 
Integral à Saúde das Mulheres, transformação esta que tem o papel 
determinante de provocar mudanças não apenas na qualidade de atenção à 
saúde da mulher, mas também o de provocar mudanças culturais no eixo de 
como se compreende o que é saúde e sexualidade, e de como, no processo de 
construção da autonomia, são centrais as determinantes de gênero, raça/etnia 
e classes sociais. 
Observamos que, a partir de uma proposta norteada por diretrizes e 
princípios, não se conseguiu, em oito anos, efetivar a integralidade e equidade 
dentro do Programa, nem mesmo fazer estas diretrizes conhecidas pelos 
profissionais de saúde que nele atuam, muito menos, as usuárias. 
As investigações constatam, claramente, a falta de correspondência 
entre os direitos assegurados nos discursos oficiais e a realidade concreta a 
17
que se referem. Observa-se, na realidade dos serviços públicos, que a garantia 
do direito à saúde está muito distante do que se tem no papel. 
Falta trabalhar a interdisciplinaridade, estimulando a discussão 
coletiva acerca das ações desenvolvidas e por toda a equipe; 
Falta capacitação da prática interdisciplinar. 
Falta capacitação da equipe na perspectiva de gênero; 
Falta conhecimento e preparação da equipe para o atendimento à 
mulher vítima de violência doméstica e sexual; 
Falta articulação entre os outros Programas da Saúde, inclusive o 
PSF; 
O atendimento médico está voltado, unicamente, para “doença” da 
usuária; 
É imprescindível que o Programa implante o acolhimento, invertendo 
a lógica de organização e funcionamento do serviço de saúde, norteado em 
experiência exitosa, como o caso de Betim – MG, pautado nos seguintes 
princípios: 
1) Atender a todas as pessoas que procuram os serviços de saúde, 
garantindo a acessibilidade universal. Assim, o serviço de saúde 
assume sua função precípua, a de acolher, escutar e dar uma resposta 
positiva capaz de resolver os problemas de saúde da população. 
2) Reorganizar o processo de trabalho, a fim de que este desloque seu 
eixo central do médico para uma equipe multiprofissional que se 
encarregue da escuta do usuário, comprometendo-se a resolver seu 
problema de saúde. 
3) Habilitar a relação trabalhador-usuário, que deve dar-se por 
parâmetros humanitários, de solidariedade e cidadania. 
4) Habilitar toda a equipe na perspectiva de gênero; garantido a 
sensibilização da equipe para determinadas fragilidades e 
vulnerabilidades das usuárias do Programa; 
18
5) Habilitar a equipe para o atendimento à mulher vítima de violência 
doméstica e sexual; 
6) Articular dentro da equipe ações permanentes de educação e saúde; 
7) Que se repense a importância e necessidade da avaliação 
sistemática das ações desenvolvidas pelo Programa, respeitando-se as 
instâncias de representação das mulheres, na luta por saúde pública de 
qualidade. 
8) Por fim, que as instâncias de gestão no Município compreendam 
a importância política de transformar o PAISM – Programa de Atenção Integral 
à Saúde da Mulher na PMAISM - Política Municipal de Atenção Integral a 
Saúde da Mulher. 
Sugerimos, portanto, melhoria gerencial dos serviços e a qualificação 
permanente dos profissionais de saúde, a fim de que possam prestar uma 
assistência integral e humana, evitando a excessiva utilização de tecnologias 
médicas, utilizando recursos de “escuta” de “acolhimento”, contribuindo, 
efetivamente, para a transformação do atual modelo de assistência. 
Nesse contexto, espera-se que os resultados deste estudo possam 
estimular reflexões que favoreçam mudanças urgentes na adequação das 
ações, ao modelo de atenção proposto pelo PAISM, no que se refere ao acesso 
e acolhimento das mulheres, enfatizando-se a proposta de humanização, 
integralidade e equidade. 
19
REFERÊNCIAS 
BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à saúde. Departamento 
de Ações Programáticas Estratégicas. Política nacional de Atenção integral 
á Saúde da Mulher: Princípios e diretrizes. Brasília, DF: Ministério da saúde, 
2004. 
COSTA, Ana Maria. (Cord.) Políticas de Saúde, Equidade e Gênero: 
Atualizando a Agenda, Águas de Lindóia, SP, 1997. 
FERREIRA, Maria Mery, (org.) Mulher Gênero e Políticas Públicas. São Luis: 
Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre a Mulher e Gênero; Grupo de Mulheres 
da Ilha, 1999. 
______. As Caetanas vão a Luta: Feminismo e Políticas Públicas no 
Maranhão. São Luis: EDUFMA, 2007 
LEFEBVRE, 1979, p. 192 . Dialética. Disponível em: www.wikipeia.pt.com. 
Acesso em: 24 Set.2008. 
NAGAHAMA, Elizabeth Eriko Ishida; SANTIAGO, Silvia Maria. A 
institucionalização médica do parto no Brasil. Ciênc. saúde coletiva , Rio de 
Janeiro, v. 10, n. 3, p. 651-657, Set. 2005 . Disponível em: 
<http://www.scielo.br/scielo.php Acesso em: 12 Nov. 2008 
OLIVEIRA, Eleonora Menicucci de. Gênero, Corpo e Conhecimento. Saúde 
soc. São Paulo, v.17, n.2, 2008. disponível em : http// www. Scielo.br/scielo. 
Acesso em : 2. Set. 2008. 
OLIVEIRA, Fátima. A Presença da Mulher no Controle Social das Políticas 
de Saúde, Anais de capacitação de multiplicadoras em controle social das 
políticas de saúde/ Rede Feminista de Saúde – Belo Horizonte; Mazza , 2003 
SAFFIOTI, H.I.B. Rearticulando Gênero e Classe Social. In: Costa A.O. 
bruschini, C. (orgs). Uma questão de gênero. São Paulo; Rio de Janeiro: Rosa 
dos Tempos, 1992. 
20

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PROGRAMA DE ATENÇÃO INTEGRAL A SAÚDE DA MULHER – PAISM: entre as diretrizes nacionais e a realidade em Imperatriz

  • 1. PROGRAMA DE ATENÇÃO INTEGRAL À SAÚDE DA MULHER – PAISM: entre as diretrizes nacionais e a realidade em Imperatriz Conceição de Maria Amorim INTRODUÇÃO A construção de políticas públicas dirigidas à saúde da mulher no Brasil é parte das profundas mudanças societárias das últimas décadas, através das lutas do movimento feminista, aliadas às profissionais da saúde do movimento sanitarista, comprometidas com a filosofia de saúde enquanto direito e preocupadas em garantir à mulher assistência integral, enfatizando a preocupação com seu corpo de forma integral, “e não apenas como órgãos isolados, a serem tratados por diferentes especialistas" (OSIS, apud; NAGAHAMA, SANTIAGO 2005, p.106). Este debate tem início em 1983, cujo desdobramento resultou na implantação do Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher (PAISM). A partir de então, o Programa passa a ser gradativamente implantado, em diversos Estados do Brasil. O PAISM demarca um novo campo de visão e ação da saúde da mulher, ao romper com o modelo maternoinfantil retrógrado e conservador, que via a mulher como uma mera reprodutora. Embora não tendo sido implantado dentro da filosofia original, foi um marco na luta das mulheres por saúde, direito reprodutivo, cidadania e pelo seu reconhecimento enquanto sujeito de direito, significando uma conquista importante para a sociedade brasileira. Ao eleger esse tema de estudo, tem-se a pretensão de compreender em que contexto se deram as ações de saúde da mulher, em Imperatriz. Tal escolha também foi motivada por conversas com as funcionárias, durante período de estágio no Programa da Saúde da Mulher do Município de Imperatriz, e percebe-se que a equipe de saúde do PAISM não conhece as diretrizes nacionais, não foram capacitadas na perspectiva das relações de gênero ou violência doméstica e familiar contra a mulher. Essa constatação despertou a curiosidade de avaliar se o Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher responde aos princípios norteadores da integralidade na assistência à saúde da mulher, em Imperatriz. 1
  • 2. Esse estudo foi construído a partir de pesquisa de campo orientada por abordagem quantiqualitativa, através de coleta de dados. Utilizaram-se técnicas de entrevistas, observação direta e pesquisa documental. Os instrumentos utilizados, questionários abertos, roteiros de entrevistas estruturadas, pesquisas documentais realizadas em fichas de atendimento das usuárias, encaminhamentos ao Serviço Social, Relatório de Atividades de 2005 a 2007 e atas do Conselho da Mulher permitiram compreender a dimensão desse Programa, neste município. Os dados foram coletados de forma sistematizada, utilizando-se elementos quantitativos e qualitativos com vistas a responder aos objetivos específicos propostos. Para a análise dos dados da pesquisa, empregou-se o método dialético, tendo em vista que este se refere à arte do diálogo e da discussão. Trata-se de um método de inquirição da realidade pelo estudo e sua ação recíproca. Para a dialética, não há nada definitivo, de absoluto, de sagrado. Apresenta a lógica de todas as coisas e em todas as coisas e, para ela, nada existe além do processo contínuo do devir transitório. A dialética é ciência que mostra como as contradições podem ser concretamente idênticas, como passam uma na outra, mostrando também porque a razão não deve tomar essas contradições como coisas mortas, petrificadas, mas como coisas vivas, móveis, lutando uma contra a outra em e através de sua luta. (LEFEBVRE, 1979, p. 192 Disponível em: www.wikipeia.pt.com. ). Ao construir os dados dessa pesquisa de forma cuidadosa, buscando não somente a visão das mulheres usuárias, mas também dos profissionais de saúde, teve-se a consciência de que as respostas têm várias faces, várias visões, inúmeras verdades, causas e conseqüências. Assim se move o pensar dialético. As verdades aqui construídas são frutos dessas reflexões e das experiências que não são movidas pela neutralidade, uma vez que os pesquisadores que fazem ciência, usando o método dialético, não se furtam de expressar suas visões e suas paixões, fruto de análise e estudos em que se constituem em muitas situações protagonistas. (FERREIRA, 2007). 2
  • 3. SAÚDE DA MULHER: LUTAS E CONQUISTAS A política pública de atenção à saúde da mulher está vinculada à luta dos movimentos feministas, que culminou com a formulação de uma Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher. Segundo Costa (1997), a integralidade pensada na formulação do PAISM, no início dos anos 80, tinha por inspiração tanto os valores que norteavam o movimento sanitário quanto aqueles advindos da reflexão feminista. Dessa forma, incluía tanto a idéia de integração das distintas modalidades e níveis de assistência, quanto a perspectiva da integralidade dos sujeitos sociais. Como resultado, suas diretrizes propunham a assistência à saúde nas diferentes etapas da vida das mulheres, tendo a integralidade como principal estratégia de reorganização dos serviços de saúde. Por outro lado, a compreensão de que a organização das práticas de saúde apóia-se em valores que produzem e reproduzem as desigualdades de gênero, as propostas originais do PAISM pretendiam influir na construção de novos valores com vistas à emancipação das mulheres. No plano das relações entre usuárias e serviços de saúde, o PAISM privilegiou a sensibilização de profissionais na busca de melhoria da qualidade da atenção e humanização das práticas assistenciais. Esta desconstrução partia da premissa de não permitir o controle da sexualidade e da reprodução como simples instrumento para assegurar o controle populacional e reproduzir a força de trabalho nos modos subalternos em que as relações sociais são estabelecidas no sistema capitalista. Desta forma, o pensamento do Movimento Feminista se reafirma no Espaço Acadêmico na perspectiva de combater a visão de uma sexualidade socialmente útil e politicamente conservadora, que questionava a prática do saber médico acima de todos os saberes, que se fortalece no método das especializações. A SAÚDE DA MULHER E AS RELAÇÕES DE GENÊRO Quando se fala de gênero, fala-se de relações sociais e, segundo dizia o filósofo francês Michel Foucault, falar de relações sociais é falar de relações de poder, poder que se exerce nos espaços privado e público. Para Eleonora Menicucci de Oliveira, (2008): 3
  • 4. O uso da categoria de gênero como relacional de poder nos estudos na área da saúde integral da mulher, direitos reprodutivos e direitos sexuais problematiza as práticas e os exercícios das sexualidades ao (des)naturalizar e (des)banalizar as relações entre os sexos e intrassexos. Essa problematização ilumina as expressões das necessidades de saúde, articulando-as às necessidades que estão ancoradas nas esferas da subjetividade e mentalidades, como o preconceito e a discriminação. A experiência com as pesquisas na área da saúde integral da mulher tem sido valiosa para tornar visível a que nível se dão as relações de gênero, em nossa sociedade, e o quanto sofrem, em maior intensidade, as mulheres negras, indígenas, lésbicas, portadoras do vírus HIV, que precisam do atendimento médico na rede pública ou privada. Estas têm sua saúde tratada com um maior grau de desrespeito e desumanização, independente do atendimento ser feito por um profissional homem ou mulher. Como gênero é relacional, segundo Saffiotti (1992, p.36), quer enquanto categoria analítica, quer enquanto processo social, “o conceito deve ser capaz de captar a trama das relações sociais”, os graus de risco a que está exposto o conjunto da população. É necessário, também, serem observados os padrões distintos de sofrimento, adoecimento e morte a que estão expostos, distintamente, homens e mulheres. DIRETRIZES DO PAISM O Programa de Assistência Integral à Saúde da Mulher (PAISM) teve sua formulação no início da década de 80. Tinha como principal perspectiva a superação da afirmação maternoinfantil nas ações de saúde da mulher. É por meio de políticas públicas que o Estado adquire legitimidade para agir sobre um grupo de indivíduos ou sobre um dado segmento da sociedade, na tentativa de praticar ações interventivas que interfiram positivamente nas condições de vida desses indivíduos ou segmentos sociais. Conforme Mary Ferreira, (1999, p. 35), em sua obra “Mulher Gênero e Políticas Públicas” preconiza que: A formulação de políticas públicas pode ser vista como um processo que se constrói a partir de um diálogo entre o Estado, através de seus diversos poderes – executivo, legislativo, judiciário – e os grupos de interesse e de pressão representados por partidos políticos, sindicatos, grupos autônomos, organizações não governamentais, cidadãos e cidadãs. 4
  • 5. O PAISM funcionou como Programa de Atenção à Saúde da Mulher, desde sua implantação, até 2004, quando, em 28 de maio de 2004, o ministro da Saúde, Humberto Costa, lançou a - Política Nacional de Atenção Integral à Saúde da Mulher – PNAISM - Princípios e Diretrizes, construída a partir da proposição do SUS, respeitando as características da nova política de saúde. (MS 2008). Esses parâmetros de saúde integral, dentro de uma concepção de garantia de direitos, remetem-nos a compreender alguns de seus marcos na constituição de tais diretrizes para execução de uma Política Nacional, Estadual e Municipal de Atenção Integral à Saúde da Mulher. O Sistema Único de Saúde deve estar orientado e capacitado para a atenção integral à saúde da mulher, numa perspectiva que contemple a promoção da saúde, as necessidades de saúde da população feminina, o controle de patologias mais prevalentes nesse grupo e a garantia do direito à saúde. (BRASIL, 2004). Executar ações no controle de patologias mais prevalecentes entre as mulheres, respeitando e reconhecendo suas subjetividades, grupos étnicos, nível e grau de vulnerabilidade social entre outros elementos e fenômenos, ainda é um grande desafio. A Política de Atenção à Saúde da Mulher deverá atingir as mulheres em todos os ciclos de vida, resguardadas as especificidades das diferentes faixas etárias e dos distintos grupos populacionais (mulheres negras, indígenas, residentes em áreas urbanas e rurais, residentes em locais de difícil acesso, em situação de risco, presidiárias, de orientação homossexual, com deficiência, dentre outras). (BRASIL, 2004). O planejamento e a avaliação como prática sistemática nos diversos níveis dos serviços de saúde propiciam aos gestores a definição de estratégias de intervenção, mais próxima da realidade epidemiológica da saúde da mulher. As políticas de saúde da mulher deverão ser compreendidas em sua dimensão mais ampla, objetivando a criação e ampliação das condições necessárias ao exercício dos direitos da mulher, seja no âmbito do SUS, seja na atuação em parceria do setor Saúde com outros setores governamentais, com destaque para a segurança, a justiça, trabalho, previdência social e educação. (BRASIL, 2004). A integralidade do Programa pressupõe ações construídas a partir da concepção de intersetorialidade, comunhão de saberes e fazeres coletivos, 5
  • 6. que perpassem o espaço físico do atendimento, em que se veja a usuária como um todo e se garanta uma atuação permanente na prevenção e promoção da saúde, considerando as especificidades e as relações de gênero na sociedade patriarcal, capitalista comprometida com as políticas do neoliberalismo. O SUS deverá garantir o acesso das mulheres a todos os níveis de atenção à saúde, no contexto da descentralização, hierarquização e integração das ações e serviços. Sendo responsabilidade dos três níveis gestores, de acordo com as competências de cada um, garantir as condições para a execução da Política de Atenção à Saúde da Mulher. (BRASIL, 2004). A prática da Atenção Básica permeada pela integralidade traz para o campo da assistência à saúde da mulher a perspectiva de transformação das práticas de assistência à saúde até então perpetradas no Brasil. Significa ter acesso a uma saúde que considera toda a situação vivida pelo coletivo, onde vive aquela usuária; significa a atuação dentro do Programa de equipes multiprofissionais que planejam e avaliam, conjuntamente. Compreende-se que a participação da sociedade civil na im-plementação das ações de saúde da mulher, no âmbito federal, estadual e municipal requer – cabendo, portanto, às instâncias gestoras – melhorar e qualificar os mecanismos de repasse de informações sobre as políticas de saúde da mulher e sobre os instrumentos de gestão e regulação do SUS. (BRASIL, 2004). O controle social é um grande desafio dos gestores municipal, estadual e federal. Uma gestão transparente que inclua a população, profissionais da saúde, gestores e prestadores, em Conselho de Saúde, em comissões de planejamento, execução e avaliação, em comitês qualificados, autônomos e representativos. É uma luta política permanente. Mesmo que estes instrumentos estejam previstos nas normas técnicas e legislação do Sistema Único de Saúde, continuam sendo um grande desafio para o conjunto da sociedade e dos governos. IMPLANTAÇÃO DO PAISM EM IMPERATRIZ O primeiro contato que os trabalhadores da Saúde de Imperatriz tiveram com o Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher, segundo o médico ginecologista Pedro Mário, foi no começo da década de 90. Este 6
  • 7. profissional foi convidado para uma capacitação, em São Luís, no entanto, as ações não se concretizaram. No Maranhão, o Programa foi implantado pela Secretaria de Desenvolvimento Social que continuava vinculando a saúde materna à infantil. Segundo Pedro Mário, na capacitação, o Programa foi apresentado como PAISMC- Programa de Atenção à Saúde da Mulher e da Criança. Em 2001, o poder público municipal decidiu pela implantação e o convidou para implantar e coordenar o PAISM. O PAISM foi implantado, em Imperatriz, no dia 08 de março 2001. Segundo a Secretária Municipal de Saúde, à época, a implantação se deu por reivindicação do Movimento de Mulheres de Imperatriz. Maria da Conceição Medeiros Formiga, uma das lideranças do Movimento de Mulheres, lembra que foi entregue ao Prefeito eleito, para o mandato de 2000 a 2004, uma pauta ampla de reivindicação, entre elas a implantação do PAISM. Sobre este asunto ela ressaltou que: Esta era uma reivindicação antiga do Movimento de Mulheres e Feministas de Imperatriz, até porque o Programa estava sendo implantado em outros estados e municípios do país desde 1984. Mesmo sendo uma das reivindicações prioritárias para o movimento e pautadas em todas as reuniões entre o Poder Público e a Sociedade Civil só foi atendida no ano de 2001. (FORMIGA, 2008) O médico ginecologista Pedro Mario afirmou ter montado toda a estrutura do Programa à luz de sua experiência pessoal. Para (M.J), militante feminista do Centro de Direitos Humanos Padre Josimo, a “implantação do PAISM se deu num embate político pela participação do Movimento de Mulheres nas deliberações sobre como, onde e quem deveria estar à frente do Programa”. ESTRUTURA ATUAL DE FUNCIONAMENTO O Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher funciona no Centro de Saúde Três Poderes, Rua Itamar Guará, S/N, Jardim Três Poderes. O atendimento ao público se dá de segunda a sexta-feira, das 7hs às 12hs, Segundo informação da Coordenação do Programa e os Relatórios de Atividades de 2005 a 2007, as usuárias são encaminhadas pelo Programa de Saúde da Família para as consultas ginecológicas. Após tais consultas, podem ser encaminhadas para procedimentos no próprio Programa, tais como: Exame Citopatológico (PCCU), Histopatológico, Colposcopia, Biópsia, Cirurgia 7
  • 8. de Alta Freqüência - CAF, Consultas Ginecológicas, Consultas Mastológicas, Atendimento ao Climatério, Atendimento Equipe Multiprofissional, Inserção do DIU, Cirurgias Ginecológicas, Conização, e Palestras Educativas. As usuárias que necessitam de outros tipos de exames são encaminhadas para a rede credenciada. Foram realizadas entrevistas com 09 funcionárias. Perguntadas se a equipe recebeu capacitação sobre questão de relações de gênero, 06 afirmaram, categoricamente, não ter havido capacitação na perspectiva das relações de gênero para a equipe, e 03 funcionárias responderam textualmente: “Sim – recentemente tivemos uma palestra sobre coleta citopatológica de colo de útero” (Funcionária 1) Freqüentemente estamos nos capacitando desde o ACS, Agente Comunitário de Saúde, enfermeiras das equipes do PSF, médicos, auxiliar de enfermagem, sempre se capacitando nas várias situações que atendemos a saúde da mulher, desde a questão do Planejamento...Pré Natal...(Coordenadora) Percebe-se, nas afirmações, o desconhecimento do termo “relações de gênero” pelas profissionais que afirmaram terem recebido a capacitação, que se concretiza quando enfocam as temáticas dos cursos. Sobre a capacitação de atendimento à mulher vítima de violência, segundo o médico ginecologista Pedro Mário, na época da implantação do Programa: Não houve nenhum pensamento nem meu. Não sei se houve por alguém de assistência, até porque, aí, entra uma culpa minha. Na qualidade de médico, a gente, vê de imediato, a questão do estupro, aí vê a violência doméstica como uma questão de agressão que deveria ser assistida pela Policia...Mas essa tem uma assistência melhor em termos de assistência médica, porque sendo uma agressão física, ela encontra o hospital municipal que atende urgência e emergência, numa boa lá... (Pedro Mário) As demais profissionais entrevistadas confirmam que a equipe não recebeu qualquer capacitação sobre o atendimento às mulheres vítimas de violência. Segundo uma das profissionais, esta é “uma questão de suma importância a ser debatida e avaliada pela equipe como um todo”. A relação da violência contra a mulher e a sua saúde tem se tornado, cada vez, mais evidente, embora a maioria das mulheres não relate que viveu ou vive em situação de violência doméstica. Por isso, é importante que os profissionais de saúde sejam treinados para identificar, atender e tratar 8
  • 9. as pacientes que se apresentam com sintomas que podem estar relacionados a abuso e agressão. As funcionárias foram questionadas se conheciam as Diretrizes e Princípios do PAISM e a maioria afirmou não conhecê-las. Também foram questionadas se a equipe se reúne para avaliar, planejar e trocar informações sobre perfil socioeconômico, psicológico ou sobre as incidências de doenças das usuárias. Todas responderam que não. As falas da maioria das profissionais entrevistadas sobre as dificuldades na implementação das ações no PAISM apontam para as questões ligadas à infraestrutura do espaço, à qualidade do atendimento, reconhecendo, principalmente, a falta de informação entre funcionárias e usuárias. Apenas uma manifestou a preocupação com a falta de avaliação e planejamento. Quanto às usuárias, 70% disseram que foram bem atendidas, 24% disseram que não foram bem atendidas e 6% não responderam. As principais queixas das usuárias quanto ao atendimento são o longo tempo de espera e o curto tempo dedicado a elas na consulta, filas, falta de condições adequadas do espaço, falta de informações sobre o funcionamento, erros em dados ou registros, falta de comunicação sobre assuntos de seu interesse. Quando as perguntas passaram a questionar acerca do atendimento, percebemos uma grande resistência a cada resposta. A preocupação de não se exporem, de não se prejudicarem, além do elemento “medo” de prejudicar alguém é explicito. Há a compreensão de que, por se tratar de um atendimento público, é natural que as consultas sejam rápidas, que os exames não sejam marcados ou que os prazos estabelecidos não sejam cumpridos. A relação da usuária com o SUS se dá com base em uma regra incisiva, em nível de sua consciência prática, embora rejeitada, muitas vezes, no aspecto discursivo. É a de que os serviços de saúde pública são tidos como uma espécie de favor à população mais pobre do país, bem longe de ser um exercício de direito de cidadania. As usuárias sentem isso, concretamente, na maneira de serem tratadas, especialmente quando necessitam de informações básicas. Geralmente, recebem respostas evasivas ou não recebem respostas, gerando 9
  • 10. uma percepção de um expressivo descaso para com elas, nas diversas interfaces com os serviços de saúde. Desse modo, a maioria das entrevistas expressou um sentimento em que predomina a imagem na qual não são vistas como cidadãs, no entanto, depois de todas as queixas relatadas, elas preferem que a pesquisadora marque sim - que foram bem atendidas - porque “não vai adiantar nada mesmo dizer que não foi”. O nível de escolaridade da maioria das entrevistadas, ou seja, 43% entre analfabetas e com, no máximo, o ensino fundamental completo, contribuí para o baixo senso crítico, até mesmo pela dificuldade que a usuária tem de se apropriar das políticas públicas como um dever do Estado e direito do cidadão. Indagadas às usuárias se conheciam os serviços do PAISM, 68% disseram não conhecê-los e 32% disseram conhecer os serviços prestados pelo Programa. Estes dados não só confirmam o desconhecimento das usuárias sobre o funcionamento, mas como também reafirmam a constatação feita, acima, por algumas funcionárias, que admitem a falta de diálogo e conhecimento entre as equipes, desde a atenção básica, nos PSF’s, até os serviços de especialidades e referência. Algumas usuárias relatam que têm dificuldades para conseguir informações das atividades desenvolvidas, no Posto de Saúde. As usuárias vêm para o Programa encaminhadas pelos PSFs, sem nenhum prontuário, sem nenhuma informação sobre sua vida epidemiológica, e são tratadas apenas no aspecto ginecológico, sem que se garanta a contra referência. Ela é cadastrada em uma ficha do atendimento ginecológico, e, na primeira consulta, são pesadas, medem a pressão e fazem a consulta. Das mulheres entrevistadas, 68% fizeram consulta ginecológica, 13% fizeram o papanicolau, 7% procuraram o programa para a colocação do DIU, 3%, em busca de laqueadura e 3%, outros. Questionadas sobre o tempo da consulta, 50% responderam ter durado 5 minutos, 25% 10 minutos, 22% 15 minutos e 3% não souberam dizer. Portanto, a média de tempo, segundo as usuárias, fica em torno de 8,54 minutos. Das mulheres atendidas em consulta ginecológica, 93% disseram que o médico não fez exames locais, mas todas receberam solicitação de exames. 10
  • 11. Esta é uma situação generalizada no atendimento médico. Além de pesquisar o tempo gasto na consulta entre as usuárias, observamos, durante 5 dias, o fluxograma de atendimento. Contabilizamos 54 atendimentos com um tempo de duração de, no máximo, 3 a 4 minutos e 12 atendimentos, no período máximo, de 5 minutos. Considerando as mulheres que estão vindo para a primeira consulta, percebe-se uma grande frustração quando as mesmas saem do consultório sem serem “examinadas” e com vários pedidos de exames para carimbar. Como se assiste, integralmente, uma mulher com uma consulta ginecológica que dura, no máximo, 5 minutos? Qual o tempo que é reservado à escuta dessa paciente sobre suas queixas acerca do sofrimento vivido por sua pressão arterial, sua dor na coluna? Qual o tempo que se reserva para que este médico se inteire sobre as condições de saúde, além do seu útero ou mama? Qual a carga de trabalho doméstico dessa usuária? Como ela vive sua sexualidade? Ela decide sobre seu corpo? Toma decisão com respeito a sua vida pessoal e quanto aos aspectos reprodutivos? Ela sofre violência física, psicológica, moral, material ou sexual? Ela sofre discriminação por causa de sua cor, idade, orientação sexual? Conhece sobre seus direitos à saúde e à cidadania? Quanto ao tempo gasto para marcar os exames no Programa, 77% demoraram até 30 dias, 15% mais de 30 dias e 8% mais de 60 dias. Outro grande problema é a demora na entrega dos resultados dos exames, como no caso do Papanicolau, A coleta é feita no Programa e em alguns Postos de Saúde, e os exames são feitos em laboratórios credenciados, além da demora na entrega do resultado, que, geralmente, não acontece na data marcada, criando uma expectativa muito grande e, dependendo do caso, as usuárias se sujeitam a pagar o exame particular para não perder prazos. No que se refere ao atendimento médico, 43% consideram a consulta boa, 36 % consideram a consulta regular, 8%, ruim e 8% não quiseram responder. As usuárias do PAISM expressam, contraditoriamente, sua satisfação com uma consulta que, na maioria das vezes, aconteceu num tempo insuficiente para elas esclarecerem dúvidas, receberem informações mais 11
  • 12. detalhadas sobre sua saúde, o que constitui um elemento a ser refletido, considerando o nível de escolaridade o que influência sua capacidade crítica. Perguntadas sobre os principais avanços no PAISM, as profissionais entrevistadas consideraram a reforma física do espaço e a ampliação do quadro de funcionários. Quando perguntadas se avaliam que o Programa, em Imperatriz, consegue efetivar o que está determinado pelas diretrizes nacionais, todas as funcionárias responderam que não. Nas 224 fichas analisadas, constatamos que, no período de 06 anos, não foi registrado o atendimento de nenhuma criança de 0 a 12 anos. Apesar de o Programa manter, em seu quadro de funcionários, uma ginecologista só para esse público, apenas 4% de adolescentes entre 13 e 18 anos, 21% de 19 a 30, 35% de 31 a 40 anos, 25% de 41 a 50 anos e 15% mais de 50 anos passaram por essa profissional. Portanto, 56% das usuárias são mulheres em faixa etária de fertilidade. Um dado muito importante é que destas, 73% são laqueadas, apenas 17% usam métodos reversíveis de contracepção. Entre as 224 usuárias, 52% são casadas, 23% solteiras, 3% viúvas e 22% não foi registrado o estado civil da usuária. As usuárias do PAISM tiveram registradas a seguinte escolaridade: 9% de analfabetas, 15% de alfabetizadas, 19% com ensino fundamental, 20% com ensino médio, 2% com ensino superior e 35% das fichas não registravam a informação. O nível de escolaridade está relacionado a importantes fatores sobre a saúde da mulher. Este é um dado de elevada relevância que se apresenta para o desenvolvimento humano, no sentido de que o conhecimento despertado pela escolaridade atenua as desigualdades em diversas esferas da vida. Estudo recente apresentado pela 3ª Pesquisa Nacional de Demografia em Saúde (PNDS), apresentada em Brasília, dia 03 de julho de 2008, mostra que 10% das mulheres brasileiras - cerca de 10 milhões de pessoas - têm dificuldades de cuidar de si e de seus filhos e até mesmo ter acesso às políticas públicas de saúde porque não têm escolaridade básica. A pesquisa mostra que, apesar da redução na mortalidade infantil no país, 20% dos filhos nascidos vivos de mulheres sem estudo morrem antes de 12
  • 13. completar um ano. Na faixa superior de escolaridade, com 12 anos ou mais de estudo, a mortalidade dos bebês é praticamente zero. Segundo esses estudos , até mesmo o direito de escolher ter esses filhos é mais difícil para as mulheres com menor escolaridade, basta ver as diferenças nas taxas de fecundidade. Enquanto aquelas com mais estudo têm, em média, um filho - inferior até mesmo à taxa de reposição da população, que é de dois filhos - mulheres que nunca freqüentaram a escola têm, em média, 4,2 filhos. Ainda uma parte não desprezível dos filhos dessas mulheres (16,6%) sofre de desnutrição crônica, um problema que não mata, mas afeta o desenvolvimento da criança, sua capacidade de aprender e de reagir a doenças. Verifica-se, também, que quanto mais aumentam a escolaridade e a renda, menor é o grau de utilização intensiva do SUS, confirmando que o acesso para as camadas mais pobres é essencial e estratégico. Considerando a importância da identificação da cor da mulher, que está diretamente ligada à etnia, à raça, ao preconceito, à desigualdade, e à história epidemiológica, podemos observar que esta é uma discussão que passa longe do Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher de Imperatriz, considerando que 35% das fichas de atendimento, mesmo com o local destinado a identificar a cor da paciente, este não é preenchido. Uma variante que se encontra em debates técnicos, científicos e políticos, em nossa sociedade, há poucos anos, tem identificado perfis epidemiológicos entre mulheres negras e brancas bem diversificados, com doenças consideradas prevalecentes entre negras e brancas. O quesito que identifica a cor da usuária encontra-se assim distribuído: 4% de negras, 11% de brancas 50% pardas, portanto 65 % das usuárias foram classificadas por cor, sendo que a cor parda aparece como a cor da metade da população usuária do PAISM, em Imperatriz. Considerando que os dados referentes à categoria "pardos" têm sido mais próximos aos evidenciados pela população negra, é importante que a gestão do PAISM tenha um recorte étnico/racial, com intervenções que perpassem a universalidade, com políticas equitativas de natureza pluri e interdisciplinar, pois, segundo Oliveira (2003, p. 25), “Em todos os grupos 13
  • 14. populacionais raciais ou étnicos, há doenças que são prevalentes ou que evolui de forma diferenciada nesses grupos”. Entre algumas doenças consideradas prevalecentes em negras e negros, está a anemia falciforme, que também é uma doença genética comum, no mundo; a hipertensão arterial; a diabetes tipo II. Os miomas uterinos que, segundo a literatura médica norteamericana, têm sua prevalência em mulheres negras, sendo cinco vezes maior que nas brancas, estes dados se confirmaram através de pesquisa também realizada, no Brasil, em 1995, pelo CEBRAP – Centro Brasileiro de Análise e Planejamento. (OLIVEIRA, 2003) Desenvolver ações de saúde da mulher sem levar em conta estes dados da realidade, e ter, como público alvo, usuárias incluídas neste perfil epidemiológico, remete-nos a refletir sobre que universalidades estão praticando, que equidades estão almejando e, principalmente, que integralidades de fato estão implementando. Quanto à ocupação das usuárias, os dados revelam que 2% são trabalhadoras domésticas, 3% professoras, 4% lavradoras, 40% do lar e 51% outras. Quando observamos, de maneira conjunta, os dados referentes à ocupação e à escolaridade da usuária, observamos uma negativa relação direta entre eles: ocupação subalterna acompanha a baixa escolaridade. Fora da escola, instituição responsável pela qualificação da força de trabalho, pela integração do indivíduo ao sistema produtivo, a mulher, com baixa escolaridade, tem um handcap que a impede de ocupar até mesmo as posições subalternas e secundárias destinadas às mulheres pela sociedade patriarcal. As ocupações exercidas pela maioria das mulheres apresentam algumas características comuns. De um modo geral, são ocupações com características ditas "femininas": servir, alimentar, limpar, cuidar em caso de doença, educar e são trabalhos com baixa remuneração. Considerando outra variável da pesquisa, o estado civil dessas usuárias, 52% são casadas. Tradicionalmente, as mulheres que casam e constituem famílias, ainda jovens, param de estudar, por vários motivos, entre eles a imposição do marido. 14
  • 15. É possível que as mulheres que não trabalham fora disponham de mais tempo livre para usar os serviços de saúde, já que não estão submetidas a uma dupla jornada de trabalho. Considerando a realidade das mulheres que trabalham, estas estão submissas a um mercado com horários rígidos, que coincidem com o horário de funcionamento do PAISM, no município. Este público tem acessado pouco o PAISM. Sobre questões socioeconômicas: das usuárias, 34% têm renda de 01 a 02 salários mínimos, 43% de 02 a 03 salários mínimos, 15% mais de 3 salários mínimos e 8% não sabem estimar a renda familiar. O Programa está localizado em uma área residencial de classe média alta, nos Três Poderes. O acesso ao Programa se dá pela Av. Bernardo Sayão, por onde passam alguns dos ônibus urbanos, dificultando o acesso da maioria da população usuária. Moradores da Região da Grande Santa Rita, por exemplo, se tiverem que vir de ônibus, precisam andar 08 quadras a pé para chegar ao Centro de Saúde. É real a desarticulação administrativa entre os Programas, PAISM -DST/AIDS - PSF (Programa Saúde da Família), e entre os próprios profissionais envolvidos nos respectivos Programas, o que tem contribuído para a dispersão das ações e a não otimização dos recursos destinados à saúde da mulher, como implantação de serviços, capacitação das equipes e distribuição dos preservativos e métodos contraceptivos de forma integrada. Algumas falas dos entrevistados, entre eles gestores e ex-gestores, revelam a dificuldade de realizar a interdisciplinaridade dentro do Programa e/ou entre o conjunto dos Programas de Saúde: “Nós tínhamos uma equipe multiprofissional, mas não tínhamos uma interação, até porque não era uma situação fácil. A gente não tinha os recursos humanos muito próximos... e principalmente médicos para você chamar para reunião fica muito difícil...“um dos elementos é a dificuldade de reunir o pessoal das equipes que é outro grande problema que depende de decisão política, porque ai nós temos a cobrança da produtividade...(P.M) “ainda precisamos ver com outro enfoque, precisamos sensibilizar mais, mobilizar mais, trazer a sociedade civil pra ajudar, trazer a comunidade como um todo...eu acredito que vai ser determinante um controle social para que possa estr junto ao Gestor em nível de município e em nível de estado para que se possa realmente fazer 15
  • 16. com que a equipe se reúna, faça planejamento, pra que haja sugestões da comunidade que estão na ponta...(Secretária)”. “Para os indicadores, PCCU, CISCOLO, a gente tem feito reunião. A gente se reúne para avaliar cumprimento de meta de indicadores que estão pactuados há mais tempo...há reuniões, sim, sobre os indicadores...(Secretária)”. “Nós temos uma equipe multidisciplinar, trabalhamos com atendimento das mulheres e, mensalmente, são avaliados os dados, quantas mulheres são atendidas, no que elas são atendidas, trabalhamos com o planejamento dessas atividades”. (Coordenadora) Os gestores constatam e pontuam, com clareza, a dificuldade de realizar as reuniões para avaliar e planejar as ações, reafirmando, em suas falas, que até acontecem reuniões mensais com alguns membros da equipe para levantamento e registros de dados de produtividade. Constata-se que a discussão do atendimento à mulher vítima de violência foi retomada pela atual Coordenação, que conseguiu realizar uma reunião com alguns técnicos da Secretaria de Saúde e iniciaram um debate para definir um fluxograma de atendimento às mulheres vítimas de violência. Porém, a iniciativa se mantém embrionária, dada as dificuldades de elaboração, compreensão do que fazer, como fazer, quem fazer. O desconhecimento por parte dos membros da equipe que se envolveram, na discussão, sobre a temática, juntamente com a ausência da compreensão das relações de gênero, dificultam a articulação dessas ações. Alguns dos dados do Relatório de Atividades de 2005 a 2007 são, comprovadamente, irreais. Estes, quando divulgados, comprometem a real cobertura da saúde da mulher, no município e região, pois eles, de fato, não existiram. Comprometem, também, as informações da cobertura nacional na medida em que estes são informados ao Departamento de Informática do SUS - DATASUS, órgão da Secretaria Executiva do Ministério da Saúde, que tem a responsabilidade de coletar, processar e disseminar informações sobre saúde. A inexistência da avaliação e planejamento culmina com as dificuldades do exercício da prática da interdisciplinar que se concretiza diante de tais fatos que impossibilitam ações combinadas e de superação de demandas diárias. Assim sendo, é palpável o confronto entre as duas políticas presentes no PAISM de Imperatriz. Dentro do espaço da ordem capitalista, a 16
  • 17. política de bem-estar social exige garantias de direitos sociais; a política liberal, perpetrar restrições e, por conseguinte, nega tais direitos, promovendo ambiguidade e contradições que adquirem dimensões éticas. CONSIDERAÇÕES FINAIS No decorrer deste estudo, verificou-se que as políticas públicas resultam de uma permanente luta de classes e que, apesar de se conseguirem avanços e conquistas sociais, nem sempre se garante, na prática, a eficácia do seu conteúdo teórico. Durante as etapas que o nortearam, é visível que a luta pela implantação do PAISM faz parte do mesmo esforço da implantação do SUS, e este se fortaleceu e tomou impulso com as últimas Conferências Nacionais de Saúde, mas, sensivelmente, recua na prática dos gestores responsáveis pela sua concretização, através de rupturas com os princípios do SUS, levando-se a crer que, apesar das declarações oficiais a favor de sua implantação, há manobras políticas com o propósito de inviabilizá-lo. A implantação do PAISM aparenta ter sido bastante diferenciada em todo o país, refletindo os distintos graus de compreensão e compromisso político dos governantes com a questão da mulher e a disparidade nas estratégias adotadas na organização do sistema de saúde. A partir de 2004, o PAISM foi transformado em Política de Atenção Integral à Saúde das Mulheres, transformação esta que tem o papel determinante de provocar mudanças não apenas na qualidade de atenção à saúde da mulher, mas também o de provocar mudanças culturais no eixo de como se compreende o que é saúde e sexualidade, e de como, no processo de construção da autonomia, são centrais as determinantes de gênero, raça/etnia e classes sociais. Observamos que, a partir de uma proposta norteada por diretrizes e princípios, não se conseguiu, em oito anos, efetivar a integralidade e equidade dentro do Programa, nem mesmo fazer estas diretrizes conhecidas pelos profissionais de saúde que nele atuam, muito menos, as usuárias. As investigações constatam, claramente, a falta de correspondência entre os direitos assegurados nos discursos oficiais e a realidade concreta a 17
  • 18. que se referem. Observa-se, na realidade dos serviços públicos, que a garantia do direito à saúde está muito distante do que se tem no papel. Falta trabalhar a interdisciplinaridade, estimulando a discussão coletiva acerca das ações desenvolvidas e por toda a equipe; Falta capacitação da prática interdisciplinar. Falta capacitação da equipe na perspectiva de gênero; Falta conhecimento e preparação da equipe para o atendimento à mulher vítima de violência doméstica e sexual; Falta articulação entre os outros Programas da Saúde, inclusive o PSF; O atendimento médico está voltado, unicamente, para “doença” da usuária; É imprescindível que o Programa implante o acolhimento, invertendo a lógica de organização e funcionamento do serviço de saúde, norteado em experiência exitosa, como o caso de Betim – MG, pautado nos seguintes princípios: 1) Atender a todas as pessoas que procuram os serviços de saúde, garantindo a acessibilidade universal. Assim, o serviço de saúde assume sua função precípua, a de acolher, escutar e dar uma resposta positiva capaz de resolver os problemas de saúde da população. 2) Reorganizar o processo de trabalho, a fim de que este desloque seu eixo central do médico para uma equipe multiprofissional que se encarregue da escuta do usuário, comprometendo-se a resolver seu problema de saúde. 3) Habilitar a relação trabalhador-usuário, que deve dar-se por parâmetros humanitários, de solidariedade e cidadania. 4) Habilitar toda a equipe na perspectiva de gênero; garantido a sensibilização da equipe para determinadas fragilidades e vulnerabilidades das usuárias do Programa; 18
  • 19. 5) Habilitar a equipe para o atendimento à mulher vítima de violência doméstica e sexual; 6) Articular dentro da equipe ações permanentes de educação e saúde; 7) Que se repense a importância e necessidade da avaliação sistemática das ações desenvolvidas pelo Programa, respeitando-se as instâncias de representação das mulheres, na luta por saúde pública de qualidade. 8) Por fim, que as instâncias de gestão no Município compreendam a importância política de transformar o PAISM – Programa de Atenção Integral à Saúde da Mulher na PMAISM - Política Municipal de Atenção Integral a Saúde da Mulher. Sugerimos, portanto, melhoria gerencial dos serviços e a qualificação permanente dos profissionais de saúde, a fim de que possam prestar uma assistência integral e humana, evitando a excessiva utilização de tecnologias médicas, utilizando recursos de “escuta” de “acolhimento”, contribuindo, efetivamente, para a transformação do atual modelo de assistência. Nesse contexto, espera-se que os resultados deste estudo possam estimular reflexões que favoreçam mudanças urgentes na adequação das ações, ao modelo de atenção proposto pelo PAISM, no que se refere ao acesso e acolhimento das mulheres, enfatizando-se a proposta de humanização, integralidade e equidade. 19
  • 20. REFERÊNCIAS BRASIL. Ministério da Saúde. Secretaria de Atenção à saúde. Departamento de Ações Programáticas Estratégicas. Política nacional de Atenção integral á Saúde da Mulher: Princípios e diretrizes. Brasília, DF: Ministério da saúde, 2004. COSTA, Ana Maria. (Cord.) Políticas de Saúde, Equidade e Gênero: Atualizando a Agenda, Águas de Lindóia, SP, 1997. FERREIRA, Maria Mery, (org.) Mulher Gênero e Políticas Públicas. São Luis: Núcleo de Estudos e Pesquisa sobre a Mulher e Gênero; Grupo de Mulheres da Ilha, 1999. ______. As Caetanas vão a Luta: Feminismo e Políticas Públicas no Maranhão. São Luis: EDUFMA, 2007 LEFEBVRE, 1979, p. 192 . Dialética. Disponível em: www.wikipeia.pt.com. Acesso em: 24 Set.2008. NAGAHAMA, Elizabeth Eriko Ishida; SANTIAGO, Silvia Maria. A institucionalização médica do parto no Brasil. Ciênc. saúde coletiva , Rio de Janeiro, v. 10, n. 3, p. 651-657, Set. 2005 . Disponível em: <http://www.scielo.br/scielo.php Acesso em: 12 Nov. 2008 OLIVEIRA, Eleonora Menicucci de. Gênero, Corpo e Conhecimento. Saúde soc. São Paulo, v.17, n.2, 2008. disponível em : http// www. Scielo.br/scielo. Acesso em : 2. Set. 2008. OLIVEIRA, Fátima. A Presença da Mulher no Controle Social das Políticas de Saúde, Anais de capacitação de multiplicadoras em controle social das políticas de saúde/ Rede Feminista de Saúde – Belo Horizonte; Mazza , 2003 SAFFIOTI, H.I.B. Rearticulando Gênero e Classe Social. In: Costa A.O. bruschini, C. (orgs). Uma questão de gênero. São Paulo; Rio de Janeiro: Rosa dos Tempos, 1992. 20