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...sei a prata dos silêncios
e o barulho dos
sentidos...


             Ed g a rd o
              X a v ie r
Outra Pele

      Sinto a luz da tarde
       como outra pele
         e saio de mim

         O gosto é acre
   no tempo das promessas
    e o ar anil quando arde
          no teu corpo
       de seda e jasmim

Não leio palavras nos teus olhos
 mas sei a prata dos silêncios
   e o barulho dos sentidos

      Sei que pelo amor
         até as pedras
       adoçam os gumes
      e se moldam à mão
     que lhes trava o voo
           Pelo amor
     sangram as escarpas
       seixos e papoilas

    Há vermelho nos trigais
Limite

            Salga-me a boca
       na maresia dos teus lábios
                túmidos
     e despe-me de roupa e de pele
             ainda que fuja
             ainda que gele

O amor não se esgota na lisura das sedes
 e antes se amarra de raiva no sangue
             das tuas redes
          Doces são os dedos
        quando me esventram
        na pressa de beber-me
Duelo

   À carne expectante
  anuncio o meu corpo
 em trovoada de sentidos
        Há dores
          cheiros
         gemidos
  na tua terra queimada

 Na promessa de redenção
   crestam-se os lábios
        E as chagas

       É tempo amor
Sangra-me a sede mais feroz
   e mistura a tua noite
      ao meu veneno
As lágrimas como fonte
               rio aberto
             pranto sereno
  submersos padrões de dor sangrada
         nos mistérios do peito
         na incerteza das mãos
na inclemência com que nos fustigamos
          de palavras e uivos
   Somos a fusão de corpos exângues
         na avidez de um fogo
               já extinto
É tempo de papoilas nos trigais
 e nas matas livres do sopé da serra
frágeis tons de rubro em verde solto
               na terra
       ou na boca das mulheres
           que o amor ferra
A música vem de ti
promessa ainda demorada
    na luz do tempo
    no pó da estrada

     A música vem
   e chegam também
     a urze e o azul
    que te precedem

És a flor na aurora branda
   ou pedra que geme
    na tua boca calada
É em ti que moro
         e vivo
que visito os horizontes
         águas
         serras
        montes
que trazes no teu olhar
     Se tu és fogo
         tempo
          e luz
     Eu sou o mar
Os sentimentos são urgentes
     Os sentidos, não
As emoções são sempre fortes
 Quando seguro a tua Mão
Corre-me no sangue
      a tua voz ardente
         som de terra
          queimada
     a golpes de tempo
     Corre-me no corpo
       a força do lume
            aceso
na seda breve dos teus dedos
        descuidados
Conta-me o que vês
  do alto do teu prado
Diz-me do sol e do vento
 dentro do teu sobrado
 Mostra-me como é fácil
     ser-se espuma
 na melodia das ondas
Conta-me como é bom ser
    mulher e sereia
Por coração uma pedra
     e no corpo este vazio
        Crescem a sede
         e as mágoas
     no parado deste frio

        Se vens acordo
           e esqueço
que o coração de pedra não sente
         Volto a ser rio
Poemas de Edgardo Xavier
  Mem Martins - Portugal

    Música: Vogel music

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Formatado por Vilma Nunes
   vibrasilva@gmail.com
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Poemas Do Edgardo Xavier 2009

  • 1.
  • 2. ...sei a prata dos silêncios e o barulho dos sentidos... Ed g a rd o X a v ie r
  • 3.
  • 4. Outra Pele Sinto a luz da tarde como outra pele e saio de mim O gosto é acre no tempo das promessas e o ar anil quando arde no teu corpo de seda e jasmim Não leio palavras nos teus olhos mas sei a prata dos silêncios e o barulho dos sentidos Sei que pelo amor até as pedras adoçam os gumes e se moldam à mão que lhes trava o voo Pelo amor sangram as escarpas seixos e papoilas Há vermelho nos trigais
  • 5.
  • 6. Limite Salga-me a boca na maresia dos teus lábios túmidos e despe-me de roupa e de pele ainda que fuja ainda que gele O amor não se esgota na lisura das sedes e antes se amarra de raiva no sangue das tuas redes Doces são os dedos quando me esventram na pressa de beber-me
  • 7.
  • 8. Duelo À carne expectante anuncio o meu corpo em trovoada de sentidos Há dores cheiros gemidos na tua terra queimada Na promessa de redenção crestam-se os lábios E as chagas É tempo amor Sangra-me a sede mais feroz e mistura a tua noite ao meu veneno
  • 9.
  • 10. As lágrimas como fonte rio aberto pranto sereno submersos padrões de dor sangrada nos mistérios do peito na incerteza das mãos na inclemência com que nos fustigamos de palavras e uivos Somos a fusão de corpos exângues na avidez de um fogo já extinto
  • 11.
  • 12. É tempo de papoilas nos trigais e nas matas livres do sopé da serra frágeis tons de rubro em verde solto na terra ou na boca das mulheres que o amor ferra
  • 13.
  • 14. A música vem de ti promessa ainda demorada na luz do tempo no pó da estrada A música vem e chegam também a urze e o azul que te precedem És a flor na aurora branda ou pedra que geme na tua boca calada
  • 15.
  • 16. É em ti que moro e vivo que visito os horizontes águas serras montes que trazes no teu olhar Se tu és fogo tempo e luz Eu sou o mar
  • 17.
  • 18. Os sentimentos são urgentes Os sentidos, não As emoções são sempre fortes Quando seguro a tua Mão
  • 19.
  • 20. Corre-me no sangue a tua voz ardente som de terra queimada a golpes de tempo Corre-me no corpo a força do lume aceso na seda breve dos teus dedos descuidados
  • 21.
  • 22. Conta-me o que vês do alto do teu prado Diz-me do sol e do vento dentro do teu sobrado Mostra-me como é fácil ser-se espuma na melodia das ondas Conta-me como é bom ser mulher e sereia
  • 23.
  • 24. Por coração uma pedra e no corpo este vazio Crescem a sede e as mágoas no parado deste frio Se vens acordo e esqueço que o coração de pedra não sente Volto a ser rio
  • 25.
  • 26. Poemas de Edgardo Xavier Mem Martins - Portugal Música: Vogel music Imagens da Internet Formatado por Vilma Nunes vibrasilva@gmail.com Primavera - São Paulo - Brasil