1. CURSO DE PREPARAÇÃO À CRISMA
Trata-se de um curso para ser ministrado a adultos
e jovens a partir dos 15 anos, e que prepara tanto
para a Primeira Eucaristia quanto para a Crisma, a
serem ministradas em uma só celebração.
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2. LIÇÃO 1 - DEUS EXISTE!
LIÇÃO 1
Deus existe!
OBJETIVO:
Levar o catequizando a entender que a existência de Deus pode ser
demonstrada pela razão, a professar que é impossível que haja mais de um
Deus, e a defender tais proposições fundamentadamente.
MEIOS:
• Introduzir ao tema, explicando que a fé e a razão não se excluem, antes
são duas asas da mesma verdade.
• Mencionar as verdades que são explícitas por si só, sem necessidade de
uma revelação, v.g., que respiramos, que o ar é invisível, que nos
movemos, que todo movimento tem por trás um motor etc.
• A partir dessa última afirmação, fornecer as provas da existência de Deus
em Santo Tomás de Aquino.
• Explicar que a crença em Deus não pertence apenas ao terreno da fé. Não
é necessário fé para acreditar na existência de um Criador.
• Dar a noção de religião natural e religião revelada, conceituá-las e
estabelecer diferenças.
AULA EM SI:
1) “A razão humana, pelas suas próprias forças, sem auxílio do sobrenatural,
pode chegar à demonstração da existência de Deus e a deduzir muitas das suas
perfeições.” (ARCE, Pablo; SADA, Ricardo. “Curso de Teologia Dogmática”. Lisboa:
Rei dos Livros Editor; p. 19) Podemos, então, pela inteligência, abstraída a fé,
conhecer a Deus, ainda que não entendê-Lo, eis que Ele é infinito. A Igreja mesmo
já definiu no Concílio Ecumênico Vaticano I: “A mesma Santa Madre Igreja sustenta
e ensina que Deus, princípio e fim de todas as coisas, pode ser conhecido com
certeza pela luz natural da razão humana a partir das coisas criadas.” (Constituição
Dogmática Dei Filius, 2)
2) Todavia a simples ação da inteligência, sem uma vontade firme de querer
conhecê-Lo, é insuficiente. Deve o investigador, pois, estar investido de sinceridade
e virtudes morais mínimas que não o impeçam de buscar Deus de todo o seu
coração.
3) Cinco provas da existência de Deus em Santo Tomás: a) pela existência do
movimento; b) pela causalidade eficiente; c) pela contingência dos seres; d) pelos
diversos graus de perfeição; e) pela ordem do Universo.
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3. 4) Tudo o que se move necessita ser movido por um motor. Ora, um móvel é
movido por um motor que, por sua vez, pelo fato de ser móvel, é movido por motor
anterior, movido também por um outro motor, numa sucessão no tempo e no
espaço. Assim, é preciso admitir que os móveis vão se sucedendo, movidos por
motores anteriores, os quais, pela lógica, deverão ser movidos por um motor que,
diferentemente dos outros, move mas não é movido. A esse primeiro motor
chamamos Deus.
5) Não há efeito sem causa. Tudo o que começa a existir possui uma causa. O
mundo começou a existir; logo, exige uma causa de si. A essa causa chamamos
Deus.
6) Ser contingente é aquele que, por si, não tem necessidade de existir. Pode tanto
existir como não existir. Ser necessário, entretanto, é aquele que tem de existir,
pois repousa nele mesmo a razão de sua existência. Todos os seres no mundo são
contingentes, pois tendem a desaparecer, e mesmo se não o fazem não lhes é
necessária a existência, por si mesmo. Se existem seres contingentes, exige-se a
existência de um ser necessário. A esse ser necessário chamamos Deus.
7) Existem diversos graus de perfeição no mundo, de modo que uns são superiores
a outros. Tal cadeia não pode ser infinita, e exige a presença um ser que disponha
tais graus da forma como estão dispostos, e que, por si, seja perfeito. A esse ser
perfeito chamamos Deus.
8) No mundo há uma ordem admirável, tanto nos seres grandes como nos
pequenos, de modo que tal ordenação exige uma inteligência ordenadora. A essa
inteligência ordenadora chamamos Deus.
9) Pela razão, vemos, prova-se a existência de Deus. Mesmo sendo transcendente,
Deus não é completamente estranho à inteligência humana, que pode conhecê-Lo.
Resta perceber como Deus só pode ser um, e não vários, como pretendiam os
politeístas. Extrai-se das provas da existência de Deus que Ele é perfeito. Ora,
perfeito é o estado de quem possui a perfeição, qual seja a impossibilidade de haver
qualquer coisa contrária a essa perfeição, por mínima que for. Assim, se Deus é
perfeito, não Lhe falta nada à perfeição. Entendamos, então, a perfeição divina
como uma reta infinita. Se existisse mais de um Deus, haveria tantas retas infinitas
quantos deuses houvesse. Tais retas seriam diferentes, pois, ainda que tivessem
atributos comuns, um deles não seria compartilhado: a posição no espaço, pois
ocupariam lugares diversos – do contrário não seriam várias retas, senão uma, eis
que dois corpos não ocupam o mesmo lugar no espaço. Desse modo, faltaria a uma
das retas a qualidade da outra. Vimos, entretanto, que nada que é inerente à
perfeição pode faltar ao ser perfeito, de modo que, em faltando algo disso a uma
das retas, não poderíamos afirmá-la perfeita. De tal forma que é impossível,
pela própria perfeição divina, haver outro Deus que não o único. A unicidade
de Deus é racionalmente explicável. A multiplicidade de Deus, por sua vez, é
contrária à inteligência humana.
10) Conhecemos a Deus por meio da razão, vimos. Porém, ao lado deste,
também O conhecemos através da revelação. Diferencia-se a razão da
revelação por aquela ser uma luz natural dada por Deus ao nosso
entendimento para que conhecêssemos as coisas, enquanto a segunda é a
manifestação feita por Deus acerca de verdades de ordem religiosa. Diz-se
3
4. religião natural do conjunto de verdades religiosas que o homem pode conhecer
simplesmente pela luz da razão, ao passo que denomina-se religião revelada o
grupo das verdades manifestadas por Deus por meio da Revelação. Se para
conhecermos a Deus basta a religião natural – a ciência de Deus pela razão –, para
a nossa salvação temos de aceitar a religião revelada – a ciência de Deus pela fé.
“O justo viverá pela fé.” (Rm 1,17)
11) “Quis a sua sabedoria e bondade revelar-Se a Si próprio ao gênero humano, e
revelar os eternos decretos de sua vontade por outro caminho, e este
sobrenatural.” (Concílio Ecumênico Vaticano I. Constituição Dogmática Dei Filius, 2)
Tal Revelação é o assunto da Lição 2.
EXERCÍCIOS PARA CASA:
1) Explicar, com tuas palavras, pelo menos duas das provas da existência de Deus
em Santo Tomás. Poderás consultar a Suma Teológica, de sua autoria (S. Th., I, q.
2, a. 3).
2) Procurar, na internet, o texto completo da Constituição Dogmática Dei Filius e
fazer um comentário, de quinze linhas, sobre ela.
3) Estabelecer provas de que, com poucas exceções, todos os povos do mundo
tinham um conceito de Deus.
4) Ler Rm 1,21 e explicar em breves linhas.
ATIVIDADES PRÁTICAS:
1) Rezar pelos homens que dizem não crer em Deus, um Pai Nosso, uma Ave Maria
e a seguinte oração, da liturgia de Sexta-feira Santa: “Oremos pelos que não
reconhecem a Deus, para que, buscando lealmente o que é reto, possam chegar ao
Deus verdadeiro. Deus eterno e todo-poderoso, vós criastes todos os seres
humanos e pusestes em seu coração o desejo de procurar-vos para que, tendo-vos
encontrado, só em vós achassem repouso. Concedei que, entre as dificuldades do
mundo, discernindo os sinais da vossa bondade e vendo o testemunho das boas
obras daqueles que crêem em vós, tenham a alegria de proclamar que sois o único
Deus verdadeiro e Pai de todos os seres humanos. Por Cristo, nosso Senhor.”
(Missal Romano; Sexta-feira da Paixão; Oração Universal, Pelos que não crêem em
Deus) Repeti-la todos os dias durante a semana.
2) Comentar com os pais ou com amigos que não são colegas de catequese, sobre
as provas da existência de Deus em Santo Tomás e sobre a possibilidade de
conhecermos Deus pela razão, sem o auxílio da luz sobrenatural.
LIÇÃO 2 - DEUS SE REVELA
LIÇÃO 2
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5. Deus Se revela
OBJETIVO:
Levar o catequizando a entender que Deus, conhecido pela razão natural,
oferece entretanto uma via mais perfeita para Seu conhecimento, a
Revelação, e a crer no conteúdo revelado.
MEIOS:
• Concatenar o exposto na Lição 1 com o tema desta.
• Dar a noção de Revelação, explicando seu conceito, e distinguindo-a das
revelações privadas.
• Fornecer o conteúdo da Revelação, enfatizar sua necessidade, e
demonstrar onde está aquela contida: Sagrada Escritura e Tradição
Apostólica.
• Mostrar as divisões dos livros bíblicos, e traçar breves comentários sobre
eles.
• Provar a falsidade da “Sola Scriptura”, demonstrando a existência da
Tradição.
• Definir o que seja o Magistério da Igreja.
• Dar a definição de dogma, reafirmar a imutabilidade do depósito da
Fé, e explicar em que sentido pode haver um certo desenvolvimento
doutrinário, que, por sua vez, não se confunde com uma perniciosa
evolução doutrinária.
AULA EM SI:
1) Revelação é uma manifestação extraordinária de Deus, Nosso Senhor, aos
homens, de algumas verdades religiosas fundamentais, obrigando-os a nelas
acreditar. Tal extraordinariedade a difere do conhecimento ordinário pela via da
razão. “Pela revelação divina quis Deus manifestar-Se e comunicar-Se a Si mesmo
e os decretos de Sua vontade acerca da salvação dos homens, ‘a saber, para fazer
participar os bens divinos, que superam inteiramente a capacidade da mente
humana’. Este sacrossanto Concílio professa que ‘Deus, princípio e fim de todas as
coisas, pode ser conhecido com certeza pela luz natural da razão humana a partir
das coisas criadas’ (cf. Rom 1,20); mas ensina que se deve atribur à Sua revelação
o fato de ‘mesmo na presente situação do gênero humano se poderem conhecer por
todos e de modo acessível e com sólida certeza e sem mistura de nenhum erro
aquelas coisas que em matéria divina não são de per si inacessíveis à razão
humana.’” (Concílio Ecumênico Vaticano II. Constituição Dogmática Dei Verbum, 6)
2) As verdades ou são acessíveis pela via da razão ou pela via da revelação. Ainda
que algumas delas só nos sejam conhecidas pela Revelação, não se opõem,
contudo, à razão, sendo chamadas, mesmo que não racionais, pelo menos
razoáveis.
3) A Revelação é necessária para que conheçamos melhor a Deus. “Visto que nos
elevou à ordem sobrenatural, era indispensável que nos manifestasse essa ordem.”
(Santo Tomás de Aquino. S. Th., I, q. 1, a. 1)
5
6. 4) Na Revelação, Deus manifestou Suas verdades, inclusive aquelas que, embora
não possamos compreender, não se configuram como contrários à razão
humana; as chamamos mistérios. A verdade revelada é chamada dogma, em
um sentido amplo. Já em sentido estrito, dogma é uma verdade revelada por
Deus e proposta como tal pela Igreja, com a obrigação de a ela aderir pela
fé. O dogma, como verdade revelada por Deus, está contido em uma das fontes
que contém a Revelação. E como verdade proposta por Deus, deve ser feita pela
autoridade competente assim designada por Deus. Não podemos confundir a
Revelação com as revelações privadas que Deus, todavia, manifesta, se quer, a
alguns de Seus filhos, das quais são exemplos as aparições da Virgem, os sonhos e
profecias etc. Aquela tem caráter público e obriga sob obediência, enquanto as
revelações privadas são de cunho interno, e não são impostas aos fiéis sob dever.
5) A Revelação foi confiada a homens por Deus escolhidos, Noé, Abraão, Moisés,
patriarcas e profetas, e, nos últimos tempos, foi manifestada em plenitude por
Cristo, Filho de Deus. “Muitas vezes e de diversos modos outrora falou Deus aos
nossos pais pelos profetas. Ultimamente nos falou por seu Filho...” (Hb 1,1-2) A
Revelação em Cristo é perfeita e a consumação de todos os anteriores decretos de
Deus, como ensina São João da Cruz, em sua obra magistral: “... pois o que antes
falava por partes aos profetas, agora nos revelou inteiramente, dando-nos o Tudo
que é seu Filho. Se atualmente, portanto, alguém quisesse interrogar a Deus,
pedindo-lhe alguma visão ou revelação, não só cairia numa insensatez, mas
agravaria muito a Deus em não pôr os olhos totalmente em Cristo sem querer outra
coisa ou novidade alguma.” (A subida do monte Carmelo, II, 2, 22)
6) “‘Cristo Senhor, em que se consuma toda a revelação do Sumo Deus, ordenou
aos Apóstolos que o Evangelho, prometido antes pelos profetas, completado por ele
e por sua própria boca promulgado, fosse por eles pregado a todos os homens
como fonte de toda a verdade salvífica e de toda a disciplina de costumes,
comunicando-lhes dons divinos.’ A transmissão do Evangelho, segundo a ordem do
Senhor, fez-se de duas maneiras: oralmente ‘pelos apóstolos, que na pregação oral,
por exemplos e instituições, transmitiram aquelas coisas que ou receberam das
palavras, da convivência e das obras de Cristo ou aprenderam das sugestões do
Espírito Santo’; por escrito ‘como também por aqueles apóstolos e varões
apostólicos que, sob a inspiração do mesmo Espírito Santo, puseram por escrito a
mensagem da salvação.’” (Catecismo da Igreja Católica, 75-76) A parte das
verdades reveladas que foi escrita chama-se Sagrada Escritura ou,
popularmente, Bíblia. A parte das verdades reveladas que não foi escrita,
senão transmitida oralmente, chama-se Tradição Apostólica, ou simplesmente
Tradição, e não se confunde com as tradições humanas. Tanto a Bíblia quanto a
Tradição são a Palavra de Deus, o ensino de Deus, e o conjunto das verdades
nelas contido denomina-se “depositum fidei”, o depósito da fé.
7) A Bíblia é inspirada por Deus, e isso quer dizer que “a) Deus induziu os
autores a escreverem os livros santos; b) sugeriu-lhes o que deviam dizer; c)
preservou-os de erro. Não consiste, por, em que a Igreja tenha aprovado com a
sua autoridade livros escritos por engenho humano; consiste, sim, nas três
condições acima indicadas.” (ARCE, Pablo; SADA, Ricardo. “Curso de Teologia
Dogmática”. Lisboa: Rei dos Livros Editor; p. 42)
8) A Bíblia divide-se em Antigo Testamento, que compreende os livros escritos
antes de Jesus Cristo, e em Novo Testamento, compreendendo aqueles compostos
6
7. depois de Sua vinda. A palavra “testamento” tem o significado de aliança, concerto,
pacto.
9) “Dá-se o nome de Tradição à doutrina revelada por Deus que não está
contida na Escritura, tendo-se conservado por diveros meios. Por isso se diz que
a Tradição é ‘complemento’ da Sagrada Escritura; assim, por ex., nem tudo o que
Nosso Senhor Jesus Cristo fez ou disse foi escrito, e no entanto foi transmitido
infalivelmente, graças à assistência do Espírito Santo. A Tradição chegou até nós
por meio da pregação, da própria vida da Igreja, dos escritos dos Padres da
Igreja, da Liturgia e de outras formas...” (ARCE, Pablo; SADA, Ricardo. op cit.; p.
48)
10) A Tradição tem suas fontes principalmente nos Símbolos da Fé, na
Liturgia e na vida da Igreja, e nos escritos dos Padres e Doutores da Igreja.
11) Os Símbolos são compilações, fórmulas, resumos das principais verdades
da Fé, sendo os mais importantes o “Credo Apostólico”, o “Credo Niceno-
constantinopolitano”, e “Credo de Santo Atanásio”. Este último será muito
importante na Lição 4. A Liturgia e a vida da Igreja também contém a Tradição, por
exemplo, nos ritos, nas ações sagradas (as exéquias para os defuntos é uma
confissão implícita da crença no Purgatório, v.g.) Os livros dos grandes escritores da
Igreja também nos conservam as verdades da Tradição. Nesse sentido, Padres da
Igreja são escritores que reúnem quatro condições: antigüidade – anteriores
todos ao século VII –, ortodoxia – i.e., pureza de fé, retidão na doutrina –,
santidade e declaração pela Igreja – para ser “Padre da Igreja” é necessário
que a Igreja tenha declarado o escritor com tal título. Exemplos: Santo Agostinho,
Santo Atanásio, São Basílio Magno, São Cipriano de Cartago, São Gregório de Nissa,
São Policarpo de Esmirna, Santo Inácio de Antioquia, São Clemente Romano, São
Cesário de Arles, São Cirilo de Alexandria, São Cirilo de Jerusalém, Santo Irineu de
Lião, Santo Ildefonso de Toledo, Santo Isidoro de Sevilha etc. Doutores da Igreja,
por sua vez, são escritores que não necessitam do requisito da antigüidade, mas,
em compensação, além da ortodoxia, santidade e declaração pela Igreja, reúnem o
da ciência eminente. Dessa maneira, alguns Padres da Igreja são também
declarados Doutores: Santo Agostinho, São João Crisóstomo, Santo Atanásio, São
Basílio Magno, São Gregório Nazianzeno, Santo Isidoro de Sevilha, Santo Ambrósio,
São Jerônimo, São Gregório Magno. Outros Doutores, entretanto, por lhes faltar o
requisito da antigüidade, não são considerados também Padres: São Bernardo,
Santo Anselmo, São Boaventura, São Francisco de Sales, São João da Cruz, Santo
Afonso Maria de Ligório, Santa Catarina de Sena, Santa Teresa de Ávila, Santa
Teresinha do Menino Jesus, e, entre outros, muito especialmente, o grande
teólogo da Igreja, Santo Tomás de Aquino. Temos entretanto que nem tudo o
que escreveram os Padres e Doutores representa a voz da Tradição, que só pode
ser julgada pela Igreja. Somente aquilo que, das fontes, for julgado legítimo e
com o valor dado pela Igreja, é realmente parte da Tradição.
12) Para interpretar o conteúdo do depositum fidei, e manifestar se determinada
doutrina pertence ou não àquele, i.e., para verificar se alguma questão
levantada é ou não acolhida pela Revelação e com ela compatível, Deus
estabeleceu o Magistério da Igreja. É o Magistério da Igreja que sanciona a
infalibilidade de uma verdade contida nas fontes da Revelação. Assim, a Igreja julga
das expressões de suas fontes para saber se estão com consonância com a
Tradição, e também, em relação à Escritura, estabelece seu cânone – i.e., os
7
8. livros que estão presentes na Bíblia e os que não fazem parte dela –, determina o
sentido de alguma passagem bíblica, e vela pela integridade do texto sagrado. A
Igreja nos dá o significado das palavras presentes na Tradição e na Bíblia.
13) A Revelação cessou com a morte do último Apóstolo, São João. “Todavia,
embora a Revelação esteja terminada, não está explicitada por completo;
caberá à fé cristã captar gradualmente todo o seu alcance ao longo dos séculos.”
(Catecismo da Igreja Católica, 66) Uma coisa é revelar uma verdade, outra
explicitá-la. A verdade que tinha de ser revelada já o foi completamente. Resta-
nos vê-la explicitada, o que não se dá senão gradualmente, face a limitação
humana. Assim, quando uma verdade já revelada é plenamente explicitada temos
uma definição dogmática. “Consequentemente, quando a Igreja define
solenemente um novo dogma, não estabelece uma nova verdade, não contida na
Escritura e na Tradição; mas, pelo contrário, declara que essa verdade está contida
na Escritura e na Tradição, e que portanto devemos admiti-la.” (ARCE, Pablo;
SADA, Ricardo. op. cit; p. 54) Nisso, vemos que não existe evolução doutrinária,
pois a Revelação, já cessada, não pode mudar. Deus não muda! Há, isso sim, um
sadio desenvolvimento dogmático, à medida em que a Igreja vai
compreendendo o conteúdo da Revelação que ainda não foi explicitado.
Ressalte-se, entretanto, que, uma vez explicitada determinada doutrina pelo
Magistério, tal verdade deve ser admitida como parte do depositum fidei,
porque proposta como tal. São exemplos dessa compreensão: a) sempre se
acreditou que Cristo estava realmente presente, em Corpo e Sangue, no
sacramento da Eucaristia; só não se sabia como se dava a mudança do pão e do
vinho no Corpo e no Sangue de Nosso Senhor; pela atenta análise da Igreja aos
escritos dos Padres, principalmente de São João Crisóstomo, e também dos ritos
litúrgicos que davam destaque a tal ação, pôde ela constatar que o momento da
mudança era o da pronúncia das palavras da consagração; posteriormente, para
melhor explicar que tipo de mudança havia, usou a Igreja o termo
transubstanciação, que significa que havia a conversão das substâncias de pão e
vinho nas de Corpo e Sangue, mantendo-se, todavia, os acidentes – cheiro, sabor,
aparência, textura etc; b) na Bíblia podemos constatar o emprego da expressão
“Pai, Filho, e Espírito Santo”; os primeiros cristãos sempre creram que os três eram
Deus, mas mantiveram-se, pela origem judaico-monoteísta do cristianismo, em
apego a unicidade de Deus; assim, foi preciso explicar como há o Pai, o Filho, e o
Espírito Santo se só existe um Deus; dessa forma, Tertuliano explicou que há, em
Deus, três Pessoas, mas uma só Natureza, ou Substância, e os Concílios de Nicéia e
Constantinopla puderam explicitar melhor a crença na Trindade, como veremos na
Lição 4; c) a doutrina da infalibilidade do Papa estava implicitamente contida na
promessa de Cristo a Pedro (cf. Mt 16,18), e também nas Suas afirmações acerca
do ministério de Pedro (cf. Lc 22,32; Jo 21,15-17); também a Tradição abarcava tal
verdade em suas fontes, como podemos comprovar da obediência que os demais
Bispos prestavam ao Bispo de Roma, o Papa, sucessor de São Pedro, da presença
do legado papal nos Concílios Ecumênicos, da força de uma decisão do Romano
Pontífice, das orações que se faziam, juntamente com a prece pelo Bispo local, pelo
Papa; do analisar desses e de outros fatores, concluiu a Igreja, no Concílio Vaticano
I, que o Papa era infalível quando se manifestasse acerca da fé e da moral,
definindo o dogma de uma maneira clara, precisa e explícita.
14) A definição dogmática não anula nem substitui a Revelação, nem
acrescenta dado novo a ela. Antes a guarda, a protege de doutrinas
errôneas, julgando das proposições que se apresentam se alguma pertence ou não
8
9. ao depósito da fé, declarando, em caso positivo, um dogma, explicitando
determinado ponto não muito claro, numa visível demonstração do sadio
desenvolvimento doutrinário – e não evolução, pois esta supõe mudança de
essência, o que não ocorre. Outrossim, sempre que o Magistério da Igreja se
pronuncia proclamando um dogma, conta com a proteção do Espírito Santo,
que garante não haver erro na declaração do Papa, em consonância com o
prometido por Cristo: “as portas do inferno não prevalecerão contra ela.” (Mt
16,18)
LEITURA:
São Jerônimo, Doutor da Escritura
Nascido em 340, São Jerônimo recebeu sua instrução na cidade de Roma. De
excelente cultura, adquirida por sua sólida formação em companhia dos grandes
gênios de seu tempo, e por suas inúmeras viagens, conheceu a Palavra de Deus e
fez-se batizar aos vinte e cinco anos.
De temperamento impetuoso, dado aos calorosos debates, era conhecido por sua
disciplina austera, pela qual impunha-se rigorosos jejuns e vigílias. Homem de
oração e profunda sensibilidade espiritual, aliada ao caráter leal, franco e, por
vezes, excessivamente duro, recebeu o sacerdócio, tornando-se padre com a idade
de trinta e oito anos. Aproveitando sua erudição a serviço de Deus, dedicou-se, ao
lado do trabalho pastoral, a escrever suas obras, geralmente de caráter exegético,
i.e., interpretativo dos dados da Revelação.
São Jerônimo é considerado Doutor da Igreja, o que demonstra sua reconhecida
ciência, e também, por sua antigüidade, um dos grandes Padres Latinos.
Soube passar adiante, como poucos, o conteúdo da Tradição, sendo seus escritos
fontes seguras do dado revelado e nela conservado. Outrossim, por indicação do
Papa São Dâmaso I, de quem foi secretário pessoal, consagrou-se à tarefa de
compilar as muitas versões latinas da Escritura, traduzindo suas passagens
novamente, do grego, hebraico e aramaico, línguas bíblicas originais. Sua obra, a
Vulgata, foi a Bíblia tornada de referência, séculos mais tarde, pelo Concílio de
Trento.
O santo não apenas foi um erudito bíblico. Mais do que traduzir a Bíblia para o latim
e comentar, em uma gama vastíssima de livros, trechos da Sagrada Escritura, foi
um amante pessoal da Palavra de Deus. Leu a Bíblia, é verdade. Escreveu
comentários sobre ela, também o é. Traduziu-a primorosamente dos originais para
a língua vulgar da época, o latim. Todavia, sua grande ação não foi a leitura, nem o
comentário, tampouco a tradução do texto sagrado, senão o amor a ele devotado.
Entendia que o conhecimento da Bíblia era o conhecimento do próprio Deus que
nela se revela. É sua a célebre frase: “Ignorar as Escrituras é ignorar Cristo.”
(Commentariorum in Isaiam Libri XVIII, prol.; PL 24:17B)
São Jerônimo, representante da Tradição e profundo conhecedor da Escritura, é
uma prova viva de que as duas maneiras de Deus revelar-Se não se excluem, antes
são complementares, e uma exige a outra. Por outro lado, sua fidelidade ao Papa
ensina-nos que fora do Magistério da Igreja é impossível uma legítima interpretação
da Revelação divina.
9
10. Tendo vivido os últimos anos de sua vida em Belém, na Judéia, cidade onde nasceu
Jesus, morreu em 420, tendo convivido com muitos santos e com ele trocado farta
correspondência. É declarado o patrono dos biblistas.
EXERCÍCIOS PARA AULA:
1) Explicar a frase seguinte: “Ninguém pode compreender a Sagrada Escritura se
não tiver alguém que o preceda e lhe mostre o caminho.” (São Jerônimo)
2) Indicar as relações existentes entre a Sagrada Escritura e a Tradição Apostólica.
3) Um dogma é uma doutrina acrescentada ao depósito da fé pelo Papa, pois Deus
lhe revelou tal verdade. Essa frase é verdadeira ou não? Desenvolver o tema.
EXERCÍCIOS PARA CASA:
1) Qual o dogma que mais recentemente foi definido pela Igreja?
2) Pesquisar, no dicionário, o significado etimológico de “revelação”, “tradição” e
“dogma”.
3) Ler e copiar no teu caderno os parágrafos 68-73, 96-100, 134-141, do Catecismo
da Igreja Católica.
4) Resumir o disposto nos parágrafos 101-133, do Catecismo da Igreja Católica.
5) Procurar, na internet, escritos de alguns Padres da Igreja, imprimi-los e trazê-los
na próxima aula.
6) Escrever uma pequena biografia de Santo Tomás de Aquino, citando suas
principais obras e informando sua contribuição para com a Igreja.
7) Dissertar sobre o contido nas seguintes passagens da Escritura: Js 1,8; Sl
118(119),9-16; Rm 15,4; II Tm, 3,14-17.
ATIVIDADES PRÁTICAS:
1) Rezar, todos os dias da semana, o “Vinde, Espírito Santo” (“Vinde, Espírito
Santo, enchei os corações dos vossos fiéis e acendei neles o fogo do vosso amor.
Enviai o vosso Espírito e tudo será criado: – e renovareis a face da terra. Oremos:
Deus, que instruístes os corações dos vossos fiéis com a luz do Espírito Santo, fazei
que apreciemos retamente todas as coisas segundo o mesmo Espírito, e gozemos
sempre da sua consolação. Por Cristo, Senhor nosso. Amém.”), pedindo a Deus as
graças de conhecê-Lo pela Revelação, acreditar na seu conteúdo, e explicá-lo a
todos que precisarem.
2) Ir em uma igreja e conversar com Jesus presente no sacrário, agradecendo-Lhe
pelo dom da Sagrada Escritura, e ler, na ocasião, o texto de II Tm, 3,14-17.
Autor: Rafael Vitola Brodbeck
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