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INSPER INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA
Renato Carlos Pereira Cotrim
Turma MBEW 05
Estudo sobre a valorização de empresas que praticam o
capitalismo consciente no Brasil
São Paulo – 2016
INSPER INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA
Renato Carlos Pereira Cotrim
Turma MBEW 05
Estudo sobre a valorização de empresas que praticam o
capitalismo consciente no Brasil
O aluno cumpriu todos os
requisitos necessários para a
elaboração do Projeto Aplicado,
estando, portanto, APROVADO.
São Paulo, 24 de Março de 2016
Silvio Abrahão Laban Neto
São Paulo – 2016
“Do you want to make a profit or make a difference?”
Resumo
O objetivo primordial do gestor é maximizar o valor para os acionistas. O mercado, na
pessoa de investidores privados, funciona de forma racional, antecipando e incorporando ao
preço das empresas todas as informações públicas tão logo estas se tornam disponíveis. As
empresas são avaliadas por sua capacidade de gerar fluxo livre de caixa futuro, que são
trazidos a valor presente por uma taxa de desconto.
Empresas que buscam expandir o valor econômico e social gerado como parte inerente
de suas atividades devem ter maior valorização de mercado, pois têm modelo de geração de
fluxo livre de caixa mais sustentável no futuro, logo diminuem as incertezas quanto a geração
de caixa na perpetuidade.
1. Introdução
A pergunta que abre este trabalho, “você quer fazer lucro ou diferença?”, pode ser
encontrada em muitos panfletos que buscam voluntários para trabalhos sociais, normalmente
distribuídos por organizações não governamentais do terceiro setor.
O conceito assumido é que ambos são mutuamente excludentes: uma empresa que tem
lucro, o tem, necessariamente, às custas da sociedade, seja através da exploração de
alternativas de trabalho com baixa remuneração, ou em outras regiões geográficas menos
favorecidas; seja através do custo ambiental de dejetos poluentes, as chamadas externalidades
negativas, ou também da exploração de fornecedores e parceiros, que devem receber o
mínimo possível pelos insumos que fornecem A ideia que prevalece é que, para alguém
ganhar e ter mais, é preciso que alguém perca e ganhe menos, conhecido como “zero sum
game”, ou seja, o total é sempre o mesmo, o que muda é a distribuição.
Não deveria, porém, ser assim. Fazer a coisa certa deveria ser também fazer a coisa
mais lucrativa. Se a empresa pode ser avaliada pelo valor presente de seus fluxos de caixa
futuros, e se uma empresa consegue maximizar a criação de valor econômico e social, ao
mesmo tempo em que torna seu fluxo livre de caixa mais sustentável no longo prazo, esta
empresa deveria obter maior valorização.
O objetivo principal do gestor, de maximização de valor para o acionista, deveria ser
convergente com o objetivo de geração de valor social, desde que este valor social seja gerado
a partir das atividades principais da empresa, e não como uma atividade acessória para
redistribuição de valor já gerado, e desde que a geração deste valor social também possibilite
uma maior eficiência que, de outra forma, não seria possível.
O objetivo deste trabalho é demonstrar que é possível, e desejável, perseguir metas de
maximização de valor econômico ao mesmo tempo em que se perseguem metas de geração de
valor social, que estes objetivos são conciliáveis e não conflitantes, e que o capitalismo está
evoluindo para uma nova fase na qual o mercado recompensará as empresas que busquem
modelos socialmente sustentáveis no longo prazo, e o fará não porque isso é socialmente
responsável, mas porque estas empresas se provarão mais rentáveis do que as empresas que
buscam apenas maximizar resultados de curto prazo.
2. Uma Breve História do Capitalismo
O comércio entre povos, ou capitalismo mercantil, floresceu no mundo antigo na baixa
idade média. O comércio era uma das poucas formas de acumulação de capital e de
movimentação entre camadas sociais.
Historicamente, com a queda do império romano ocidental e início da idade média, o
feudalismo foi o sistema sócio-político predominante (séculos IV e V). Neste, um senhor
feudal, oferecia terras (glebas) para cultivar e habitar, e proteção aos camponeses, que lhes
pagavam pesados tributos.
A partir do século XI, com as cruzadas e retomada do comércio com o oriente próximo
(Palestina), a população urbana aumenta, os alimentos ficam mais caros e os camponeses
acumulam capital para comprar suas terras e enfraquecem o sistema feudal, que dá lugar ao
capitalismo.
Tecnicamente, o capitalismo é um sistema econômico no qual os meios de produção e
comércio são de iniciativa privada, que os operam de forma a gerar lucro. Suas bases são a
propriedade privada, a acumulação de capital, o trabalho assalariado e, em alguma instâncias,
um mercado em competição perfeita, no qual as partes negociam e determinam a que preços
bens e serviços serão comercializados.
Ironicamente, o termo capitalismo foi popularizado por Karl Max, no século XIX,
porém seus princípios já haviam sido delineados pelo economista escocês Adam Smith, em
seu livro “An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations”, publicado em
1776. Nesta época o termo utilizado era “liberalismo”, ou uma economia livre de mercado.
Com o advento da revolução industrial, que permitiu que bens fossem produzidos em
larga escala e custos reduzidos, o capitalismo ganhou força. O capitalismo pressupõe quatro
princípios básicos:
 o capital de negócios é de propriedade privada
 a economia é controlada por vendedores e compradores
 as pessoas tem liberdade de gastar seu dinheiro no que desejarem
 a intervenção e supervisão do governo deve ser a menor possível
No final do século XIX e princípio do século XX, os empregadores se aproveitaram da
falta de regulamentação para obrigar os trabalhadores a longas jornadas, falta de segurança no
trabalho e abuso do trabalho infantil. O que levou a criação de leis regulamentando estes
temas.
3. Trabalhando para Wall Street
O capitalismo tem sido o sistema econômico mais efetivo em promover melhores
condições de vida para a sociedade, além de mola propulsora da inovação e veículo de
mobilidade social. No sistema anterior, o feudalismo, se você nascia pobre, você morria
pobre, no capitalismo qualquer indivíduo tem a possibilidade de produzir e vender bens e
serviços que, dado a demanda, pode levar a acumulação de riquezas e mobilidade social.
Os conceitos fundamentais nesta promoção de melhoria social são:
 o capital, na forma de seus acionistas, contrata meios de produção,
como insumos, equipamentos e trabalho, para produzir bens e serviços e vende-los ao
mercado para obtenção de lucro,
 os negócios contribuem para a sociedade através da obtenção de lucro,
que gera os empregos, salários, compras, investimentos e impostos, conforme
expressado por Milton Friedman,
 os gestores tomarão decisões no sentido de maximizar a criação de
lucro e valor para os acionistas e assim perpetuar este ciclo virtuoso,
Estes conceitos têm passado por modificações nas últimas décadas, que nos levam a
questionar se esta equação de geração de valor para a sociedade ainda é válida.
a. Companhias Globais
De acordo com o livro “O Mundo É Plano: uma Breve História do Século XXI”
publicado por Thomas Friedman em abril de 2005, o mundo é plano,. Uma metáfora para um
mundo onde o comercio se dá a nível global, onde todos os competidores têm acesso às
mesmas oportunidades. As empresas, os países e os indivíduos devem se preparar para
competir em um mundo onde as fronteiras históricas e geográficas estão se tornando cada vez
mais irrelevantes.
As empresas, sem uma identidade com uma comunidade ou local específico, perdem
também a percepção de responsabilidade com a sociedade. Produtos, serviços e dinheiro
fluem livremente sem reconhecer fronteiras. Os benefícios do lucro como fomentador de
empregos, salários, compras, investimentos e impostos, também fluem livremente para locais
de menor custo, sem ligações com nenhuma sociedade específica.
b. Diversificação do Risco
A lógica do mercado de capitais afirma que o capital, que arca com a maior parte do
risco do empreendimento, deve receber o retorno residual deste. Este sempre foi o alicerce do
mercado livre e capitalismo competitivo.
No passado um capitalista investia uma boa parte de seu patrimônio em uma fábrica,
que contratava trabalhadores e pagava seus salários. Quem arcava com a maioria dos riscos
neste empreendimento e, por consequência, tinha eticamente o direito aos retornos residuais,
era o capitalista, que também tinha a melhor informação sobre o negócio e o poder de
assegurar a efetiva implementação de decisões operacionais.
Com a diversificação dos investidores em um número sem fim de acionistas, o risco
destes investimentos diversificados reduziu consideravelmente. Muitos investidores sequer
sabem em que companhias seus fundos de pensão estão investidos. Por outro lado os
trabalhadores de um empreendimento ainda detém um considerável risco em uma empresa,
seus investimentos são em forma de conhecimento do negócio, construção de relacionamentos
e reputação, investimentos estes que não são facilmente diversificáveis.
Partindo da premissa que os que detêm a maior parte do risco serão também os mais
motivados para assegurar que uma empresa permaneça competitiva, empresas nas quais as
decisões estratégicas são tomadas por conselhos com representantes laboristas deveriam ser
também as empresas com uma melhor vantagem competitiva de médio e longo prazo.
Os gestores das empresas, no entanto, tomam suas decisões operacionais para
contentar o mercado de capitais que, com a diversificação e minimização do risco buscam
resultados imediatos e não a perpetuação do círculo virtuoso de geração de valor. As decisões
estratégicas, quando direcionadas pelas demandas de curto prazo do mercado de capitais, não
otimizam a competitividade de longo prazo.
c. Foco no Curto Prazo (ou Expectativas Trimestrais)
O capitalismo moderno por ser dividido em duas grandes eras, a primeira se inicia em
1932, com a publicação, por Adolf A. Berle e Gardiner C. Means, do tratado intitulado “The
Modern Corporation and Private Property” que advogava que a gestão e a propriedade de uma
empresa deveriam ser separadas.
Berle e Means, porém, já anteviam o conflito de agencia entre proprietários e gestores.
No sexto capítulo do primeiro livro, intitulado “A divergência de interesse entre propriedade e
controle”, eles alertavam que a justificativa para a premissa de que os que estivessem no
controle da corporação moderna irão operá-la no melhor interesse de seus proprietários
dependia do grau no qual os interesses próprios dos gestores se alinhassem com os dos
proprietários.
Eles mencionam ainda que, se assumirmos que o desejo de lucro pessoal é a força
mestre que motiva o controle, devemos também concluir que os interesses do controle serão
diferentes, e, às vezes, radicalmente opostos aos da propriedade, e que proprietários não serão
atendidos por um grupo de controle que busque lucro.
A segunda grande era do capitalismo também se inicia com a publicação de um
trabalho acadêmico. “Theory of the Firm: Managerial Behavior, Agency Cost and Ownership
Structure”, por Michael C. Jensen e William H. Meckling, publicado em 1976 no “Journal of
Financial Economics”.
Jensen e Meckling, entre vários outros tópicos, afirmam que a premissa que deve
dirigir uma corporação é que o propósito de todas corporações deveria ser maximizar o valor
para o acionista.
Este trabalho argumentava que a gestão profissional estava trabalhando em seu próprio
interesse, e não dos acionistas. Isto era ruim não somente para os acionistas como também
para a economia, os gestores estavam utilizando recursos corporativos e da sociedade para seu
próprio benefício.
Em resposta a este problema surgiu a figura do conselho corporativo, cujo trabalho é
alinhar os interesses da alta gerencia com os dos acionistas através da compensação baseada
em opções de ações.
No entanto o mantra de maximização do valor para o acionista tem uma lógica falha
em si mesmo, aumentar o valor para o acionista, na maioria das vezes, não garante benefício
para este mesmo acionista. Vamos examinar um pouco mais detalhadamente como o valor
para o acionista é criado.
O acionista tem direito ao valor excedente sobre o patrimônio e ganhos da empresa
depois que outras partes como empregados, fundos de pensão, fornecedores, impostos e
credores são pagos. Logo o valor de suas ações é o valor presente de todos os fluxos de caixa
futuros após estes pagamentos. Como é impossível saber com exatidão os fluxos de caixa
futuros o valor da ação se baseia em uma estimativa, uma expectativa.
Portanto as implicações para os gestores são claras, a única forma de uma corporação
servir ao seu propósito e maximizar o valor para o acionista é aumentar as expectativas sobre
o desempenho futuro desta corporação. Infelizmente os gestores não podem fazer isso
indefinidamente, como diz Warren Buffett, “as árvores não crescem até o céu”.
Inevitavelmente, os acionistas e analistas vão aumentar suas expectativas futuras a um
ponto que os gestores não conseguirão atingir. Qualquer gestor que entenda que a criação e
destruição de valor são cíclicas, e não estão sob seu controle, irá investir em estratégias de
curto prazo, na esperança de sair antes da queda inevitável, e frequentemente criticar seu
sucessor.
Como os CEOs não podem vencer o jogo no longo prazo, eles transformam este jogo
em algo que possam vencer no curto prazo. De fato, as companhias negociadas no mercado
acionário vivem atualmente uma pressão sem precedentes para exceder as expectativas
trimestrais dos analistas.
Um notório exemplo desta manipulação é a General Eletric. Jack Welch é famoso por
ter transformado a GE, que quando ele assumiu em 1981 tinha uma capitalização de mercado
de US$ 13 bilhões, na maior empresa do mundo com US$ 484 bilhões de capitalização de
mercado quando ele se aposentou, em 2001.
Porém este crescimento foi, em grande parte alimentada pela unidade GE Capital, que
inicialmente tinha uma participação insignificante nos lucros da GE, e que era responsável por
metade dos lucros da GE no final da década de 90. Em 2009 a GE teve que assumir perdas
significativas relacionadas com a GE Capital e viu seu valor de mercado cair para US$ 75
bilhões.
Concluindo, a valorização de mercado de US$ 471 bilhões, atribuída a gestão de Jack
Welch, beneficiou somente os que venderam na alta. Seu benefício para os acionistas no
médio e longo prazo é questionável.
A questão é, se a capitalização de mercado das empresas está no valor presente da
expectativa de geração de fluxo livre de caixa futuro, por que esta expectativa é traduzida por
estimativas de geração de caixa no curto prazo, os relatórios trimestrais?
O fato é que o encurtamento no horizonte de tempo dos investidores também estreita o
pensamento sobre os investimentos apropriados. Os investimentos, que normalmente seriam
avaliados pelo valor presente líquido dos fluxos futuros, passam a ser avaliado somente por
seus resultados imediatos, o futuro próximo, a perpetuidade passa a ser logo ali.
4. Filantropia
A filantropia foi a primeira tentativa do capitalismo de devolver para a sociedade uma
parte das riquezas acumuladas. A filantropia se diferencia da caridade no sentido de que esta
última tenta amenizar as dores de problemas sociais, enquanto a primeira tenta resolver este
problema na sua causa, ou como comumente mencionado, a diferença entre dar um peixe a
uma pessoa com fome, e ensina-lo a pescar o peixe.
Há diversos exemplos de caridade e filantropia na história da humanidade, e nem
sempre é fácil classificá-los. Na história moderna, podemos citar Henry Dunant, homem de
negócios suíço que, em 1863, usou sua fortuna pessoal para criar a “Geneva Society for
Public Welfare” que mais tarde se tornou o Comitê Internacional da Cruz-Vermelha, e lhe
valeu o primeiro Premio Nobel da Paz, concedido em 1901.
No final do século 19 e principio do século 20, a filantropia se tornou uma atividade
de moda entre os mais favorecidos na Inglaterra e América industrializadas. Andrew
Carnegie, por exemplo, escreveu sobre a responsabilidade das grandes fortunas e a
importância da justiça social em “Gospel of Wealth” (1889). O senhor Carnegie fundeou
bibliotecas públicas, escolas e universidades nos países de fala inglesa. Outros filantropos
famosos do princípio do século 20 foram John D. Rockefeller and Henry Ford, que
direcionaram seus esforços e atenção para as causas dos problemas sociais.
Mais recentemente, diversas celebridades do mundo do entretenimento, fortunas
pessoais do mundo financeiro, como Warren Buffett, ou da indústria de tecnologia, como Bill
e Melinda Gates, tem liderado ações de filantropia. Novas tecnologias também alteraram a
forma como doações são feitas, muitas iniciativas baseadas em “crowdfunding” utilizam a
Internet para levantar fundos.
Duas críticas podem ser feitas à filantropia como ferramenta sustentável de resolução
de problemas sociais é que trata-se de iniciativa individual de caráter pessoal, e não
corporativo, e que redistribui o valor já produzido pelo capitalismo.
Por melhor intencionados que os filantropos sejam, e por melhor que sejam os
resultados de seus trabalhos para resolver as mazelas sociais, ainda serão insuficientes frente
ao desafio. Como é inerente a natureza humana a acumulação de bens, esforços para
endereçar as enfermidades sociais somente serão sustentáveis se forem parte deste esforço de
acumulação de bens.
5. Responsabilidade Social Corporativa
“The social responsibility of business is to increase profits”
Friedman, Milton
The New York Times Magazine
(1970, September 13)
Responsabilidade Social Corporativa (CSR, em inglês), é um termo que se
popularizou na década de 60, e segue sendo usado indistintamente por muitos com diferentes
significados.
Para alguns, CSR, às vezes também chamado de consciência corporativa, cidadania
corporativa ou práticas responsáveis de negócio, é uma regulação auto imposta por algumas
empresas, no sentido de monitorar e assegurar aderência dos negócios com as práticas legais,
padrões éticos e normas internacionais.
Para outros, CSR vai além da prática de “compliance”, e inclui o engajamento ativo
em ações que ampliem o bem estar social, além das exigências legais e responsabilidades da
corporação.
A ideia é encorajar ações corporativas que gerem um impacto positivo no ambiente e
“stakeholders”, que inclui os consumidores, os funcionários, investidores, a comunidade e
outros, como o governo. Aqueles que são a favor da Responsabilidade Social Corporativa
afirmam que as corporações que se engajam em ações de CSR, aumentam seus lucros,
enquanto os críticos respondem que a CSR desvia a corporação de seu verdadeiro objetivo,
que é aumentar os lucros, vide Milton Friedman.
Um estudo, conduzido por Abagail McWilliams e Donald Siegel, intitulado
“Corporate social responsibility and financial performance: correlation or misspecification?”,
e publicado em 06 de abril de 2000 no Strategic Management Journal, comparou estudos
econométricos da relação entre resultados sociais e financeiros, e concluiu que não há impacto
de CSR nos resultados financeiros das corporações. Embora hajam outros estudos que,
contraditoriamente, relatam impactos positivos, negativos e neutros.
Conforme crítica de Peter Fleming e Marc T. Jones, em seu livro “The End of
Corporate Social Responsibility: Crisis and Critique”, a maioria das atividades relacionadas à
Responsabilidade Social Corporativa tem como objetivo ganhar a legitimidade de
consumidores e funcionários para maximizar seus lucros. Neste contexto, qualquer atividade
de CSR é somente uma forma de a empresa implementar sua agenda de exploração e
colonização.
Este livro, que na verdade é mais uma monografia do que um livro-texto, vai além
afirmando que os danos que as empresas causam são sistemáticos enquanto as iniciativas de
CSR são, em geral, as com maior visibilidade pública e de pequena escala, que são
irrelevantes para endereçar os danos sistemáticos causados. CSR busca reconciliar os
objetivos corporativos com o bem social o que, segundo Fleming e Jones, é
fundamentalmente impossível.
Por outro lado, governos e organizações não governamentais (NGO em inglês), tem
uma perspectiva mais ideológica e absolutista, na qual os benefícios sociais devem ser
perseguidos a qualquer preço.
A figura abaixo traz três abordagens diferentes de CSR em escala crescente de valor, e
também seus objetivos, impactos e benefícios.
"CSR framework - value1" by Touro - Own work. Licensed under Public Domain via Wikimedia Commons -
https://commons.wikimedia.org/wiki/File:CSR_framework_-_value1.jpg#/media/File:CSR_framework_-_value1.jpg
Uma primeira abordagem é a da filantropia corporativa, ou seja, doações monetárias e
assistenciais para NGOs e comunidades. Estas doações podem abranger diversas áreas tais
como educação, saúde, artes, meio-ambiente, entre outras, incluindo o patrocínio de eventos
comerciais. Algumas críticas válidas para esta abordagem é o caráter distributivo do valor
gerado, mínimo impacto na corporação, benefícios não sustentáveis e de curto prazo.
Uma segunda abordagem é incorporar a estratégia de CSR nas
operações da corporação. Um exemplo desta abordagem é o movimento social
Fair Trade (http://www.fairtrade.net/) que procura assegurar melhores
negociações para trabalhadores e fazendeiros na compra de produtos agrícolas,
como café e chá. Esta é uma abordagem tipicamente de “compliance”, que diminui os riscos
e impactos da operação corporativa enquanto promove relações mais sustentáveis com
organizações externas.
Finalmente, temos a abordagem de responsabilidade social corporativa como base de
criação de valor de um modelo de negócios sustentável, com impacto estratégico e
operacional fundamental na corporação, com promoção de inovação e competitividade,
sustentabilidade do modelo de negócios e desenvolvimento do capital humano, que é crítico
para promover o crescimento nos países em desenvolvimento. A criação de valor
compartilhado (CSR em inglês) será o assunto da próxima sessão deste trabalho.
6. Criando Valor Compartilhado (CSV em inglês)
O conceito de Criando Valor Compartilhado, ou “Creating Shared Value” (CSV) em
inglês, foi introduzido pela primeira vez em uma publicação, de Dezembro de 2006, da
Harvard Business Review intitulada “Strategy and Society: The Link Between Competitive
Advantage and Corporate Social Responsibility”, de autoria de Michael E. Porter e Mark R.
Kramer.
A ideia central deste conceito é que a competitividade de uma empresa e a saúde da
comunidade que a rodeia são mutualmente dependente, que o conceito de criação de valor,
que emergiu na última década, está ultrapassado, pois otimiza a performance financeira de
curto prazo, ignorando fatores críticos que são fundamentais para seu crescimento e geração
de valor de forma sustentável, entre os quais o bem-estar de seus clientes, manutenção dos
recursos naturais que são insumos críticos para sua atividade, a viabilidade econômica de
fornecedores chave, e a sustentação econômica nas comunidades onde produzem e vendem.
Do ponto de vista de CSV, a Responsabilidade Social Corporativa (CSR) coloca os
problemas sociais na periferia dos negócios, e não no núcleo do modelo de negócios adotado.
Quando colocado no centro do modelo de negócio adotado, a criação de valor econômico
também cria valor para a sociedade, endereçando suas necessidades e desafios.
Há diversos exemplos de empresas brasileiras e estrangeiras que adotaram a criação de
valor para a sociedade como parte de suas atividades, melhorando também sua
competitividade e sustentabilidade.
A Nestlé criou um programa global, chamado de Nescafé Plan, cujo objetivo é
fomentar o desenvolvimento de produtos locais de café, e educar os produtores para aumento
de produtividade com sustentabilidade. Para isso ela criou o Código Comum para a
Comunidade Cafeeira (4C), incentiva os produtores a fazerem parte desta iniciativa e compra
sua produção. O 4C discrimina práticas inaceitáveis (trabalho infantil e escravo, tráfico de
pessoas, utilização de agrotóxicos, corte de floresta primária, etc.), dimensão social (liberdade
de associação de trabalhadores, liberdade de negociação, discriminação, direito à infância e à
educação, condições de trabalho, etc.), dimensão ambiental (conservação da biodiversidade,
conservação do solo, uso responsável da água, descarte de resíduos, conservação de energia,
etc.), dimensão econômica (informação e acesso ao mercado, qualidade, comércio e
rastreabilidade).
Este tipo de iniciativa, associado aos treinamentos periódicos que a Nestlé fornece
sobre melhores práticas, aumentam a produtividade da propriedade rural, a qualidade da
matéria prima e garantem a origem dos insumos comprados. Em última instancia o benefício é
compartilhado pelo produtor rural, pela Nestlé, pelo governo, pela sociedade que tem seu
meio-ambiente preservado e pelo país.
Há três maneiras de criar valor compartilhado, a primeira é reconceber produtos e
mercados. As iniciativas de microfinanciamento, por exemplo, se encaixam nesta categoria.
São mercados que não existiriam se o modelo de negócios não incorporasse em si mesmo o
endereçamento das necessidades de financiamento de populações mais pobres. Um bom
exemplo nesta categoria é a Vodafone, que desenvolveu um serviço de mobile-banking no
Quênia, chamado de M-PESA, que conseguiu 10 milhões de clientes em três anos de
existência, e manuseia fundos que contabilizam 11% do produto interno bruto do país.
Atualmente o serviço está lançado em dez países.
Uma segunda forma de criar valor
compartilhado é redefinir a produtividade na
cadeia de valor. Segundo Porter e Kramer, há
diversas maneiras de criação de valor
compartilhado quando reexaminamos a cadeia
de valor:
 Uso de energia e logística - uso mais
eficiente de energia através de melhores
tecnologias, reciclagem, cogeração, e uso de fornecedores locais,
 Uso de Recursos Naturais - uso mais eficiente de água, insumos e embalagem através de
melhores tecnologias,
 Compras - melhoria de produtividade e qualidade de fornecedores (vide Nestlé
Nespresso),
 Distribuição - redução de embalagens, utilização de pequenos distribuidores de
comunidades rurais,
 Produtividade do Funcionário - programas corporativos para deixar de fumar
 Localidade – fornecedores e produção próximos ao mercado de consumo.
Finalmente podemos criar valor compartilhado pelo desenvolvimento dos
agrupamentos (“cluster”) ao redor do negócio da empresa. Um agrupamento inclui
fornecedores, infraestrutura, negócios relacionados, provedores de serviços, associações de
comércio, organizações de normatização e programas acadêmicos. As deficiências nos
elementos do agrupamento aumentam o custo interno da empresa, por exemplo, estradas ruins
aumentam o custo de logística. As empresas podem criar valor compartilhado ajudando a
desenvolver o agrupamento ao seu redor, por exemplo, desenvolvendo fornecedores mais
capacitados e qualificados, como no caso da Nestlé exemplificado acima.
7. Capitalismo Consciente
O movimento do Capitalismo Consciente emergiu da teoria de Responsabilidade
Social Corporativa (em inglês CSR). Muitos acreditam que a pioneira deste movimento foi
Anita Roddick, que em 1976 fundou a “The Body Shop” com um modelo de negócios
inovador, que levava em conta os impactos ao meio ambiente, testes de cosméticos em
animais e direitos humanos. Porém John Mackey, que em 1978 fundou o supermercado
“Whole Foods Market” e coautor do livro “Conscious Capitalism”, tem sido um de seus
defensores mais vocais.
O Capitalismo Consciente advoga que modelos de negócios que levam em conta todos
os “stakeholders”, os investidores, a comunidade, os funcionários, os fornecedores e os
clientes, são os que conseguem gerar maior valor sustentável para seus investidores, no médio
e longo prazo.
O Capitalismo Consciente se apoia em quatro pilares:
a) Propósito Maior nos Negócios
Assim como significado e propósito nos separa de outros animais, eles também
separam os negócios, um propósito maior nos motiva, nos torna resilientes e nos norteia na
rota correta, um negócio com um propósito inspira e engaja seus “stakeholders”, um propósito
inspirador desperta a admiração e até o amor de clientes e funcionário, um propósito
inspirador, quando vivenciado no dia a dia do negócio, une os “stakeholders”.
Os economistas frequentemente nos ensinam que o propósito dos negócios é
maximizar o lucro para seus investidores, o racional é que os investidores são os donos do
negócio, e tem o direito legal de contratar e despedir seus gestores, através de seu conselho.
Porém, quem cria e/ou descobre realmente o propósito do negócio é o empreendedor, não os
investidores, economistas, advogados ou o governo.
O empreendedor define a estratégia e negocia os termos de troca com os outros
“stakeholder”, inclusive investidores. Baseado nos termos de troca, estes investidores podem
decidir voluntariamente fazer o investimento ou não, conforme o fundamento ético dos
negócios e do capitalismo.
Dos muitos motivos pelos quais os empreendedores criam negócios, certamente uma
minoria deles o faz para maximizar o lucro. Claro que ganhar dinheiro é uma parte importante
do negócio, mas na maioria das vezes não é o propósito principal pelo qual o negócio foi
criado.
Da mesma forma que os negócios evoluem, seus propósitos também o fazem,
principalmente pela interação de seus “stakeholders”. Os valores centrais do negócio, via de
regra, são simples no princípio e assumem significância mais profunda na medida em que o
negócio se torna mais maduro, e seus “stakeholders” independentes interagem.
Negócios que não tem lucro não podem sobreviver por muito tempo em um mercado
competitivo, o lucro é essencial para a sobrevivência do negócio, porém maximiza-lo não é o
único propósito deste.
John Mackey defende que, embora possa parecer contra intuitivo, a melhor forma de
maximizar o lucro no longo-prazo é não fazê-lo o principal objetivo da empresa. Em uma
analogia com a busca da felicidade, a melhor forma de encontrá-la não é focar suas energias
na busca de seus interesses diretos, tornando-se narcisista e obcecado em satisfazer de seu
ego, mas através de um senso de propósito, trabalho com significado, grandes amigos, boa
saúde, aprendizado e crescimento, relações afetuosas, e ajudando na realização dos outros.
Quando os modelos de negócios estão centrados apenas na maximização do lucro
imediato, eles negligenciam ou abusam de outros elementos e o sistema interdependente
criará, eventualmente, uma retroalimentação negativa, que irá prejudicar os interesses de
longo prazo dos investidores e acionistas.
A objeção mais frequente aos argumentos acima é que milhares de negócios são
altamente lucrativos e não são geridos de forma a maximizar o valor para todos os
“stakeholders”, mas sim os interesses de seus investidores. Porém, segundo Mackey, estes
negócios competem somente com negócios similares, que também são geridos e estão
organizados de forma a maximizar o lucro.
A questão é como estes negócios focados na maximização do lucro comparam com
negócios que seguem o Capitalismo Consciente. Um estudo de 2007 da Wharton School por
Rajendra Sisodia, David Wolfe e Jagdish Sheth, publicado depois em forma de livro,
comparou os resultados de longo prazo 30 empresas negociadas publicamente, e geridas para
otimizar o valor para todos os “stakeholders”, com o índice S&P 500.
Como o gráfico acima indica, as companhias geridas para criar valor para todos os
seus “stakeholders” tem um retorno do valor de ação extraordinariamente grande, tanto no
curto quanto no longo prazo. John Mackey acredita que este modelo de negócio superior, será
o modelo de negócios dominante no século 21.
b) Orientação ao Stakeholder
Diferente do que observavam as primeiras teorias econômicas elaboradas na época da
revolução industrial, os negócios são uma rede intrínseca e interconectada de relações.
Negócios conscientes focam neste ecossistema no qual estão inseridos e criam e otimizam
valor para todos os “stakeholders”.
Como ressalta John Mackey, negligenciar ou abusar de um ou mais constituintes desse
ecossistema no qual está inserido o negócio, eventualmente criará um feedback negativo, que
prejudicará os interesses de longo prazo dos acionistas.
Por outro lado, “stakeholders” fortes e engajados levam a um negócio saudável,
sustentável e resiliente. O próprio Mackey conta que, pouco tempo após abrir as portas, o
“Whole Foods Market” enfrentou uma grande enchente na qual perdeu todas as mercadorias.
Sem o auxílio de seus fornecedores, que aceitaram vender sem receber no curto prazo, e de
clientes que literalmente ajudaram a limpar e arrumar a loja, a empresa provavelmente teria
falido.
Orientação ao “stakeholders” é reconhecer que funcionários, clientes, fornecedores,
fundadores, comunidades de suporte, e um ecossistema de sustentação de vida simplesmente
não há negócio.
Os negócios que levam em consideração todos os constituintes criam uma relação de
confiança e colaboração de longo-prazo.
c) Liderança Consciente
Como observou Robert K. Greenleaf, em seu ensaio de 1970 “The Servant As
Leader”, bons líderes tem que se tornar antes bons servidores.
Líderes conscientes reconhecem que seu papel é servir ao propósito do negócio, apoiar
as pessoas e criar valor para todos os “stakeholders”. Eles focam no “nós” e não no “eu”,
lideres conscientes inspiram e provocam transformações nos que estão a sua volta,
despertando melhor de todos.
Líderes conscientes lideram, por exemplo, nos inspiram a explorar novas áreas, e
tornar realidade nosso potencial.
Antes de mais nada, eles entendem o papel intrínseco da cultura na organização e
pessoalmente cultivam uma cultura de cuidado e crença nos outros.
d) Cultura Consciente
Como diz uma frase atribuída a Peter Drucker, “cultura come estratégia no café da
manhã”. A cultura é a personificação dos valores, princípios e práticas sob a malha social de
um negócio, que permeia suas ações e conecta seus “stakeholder” e estes ao propósito do
negócio, pessoas e processos da organização.
Uma cultura consciente estimula amor e cuidado, e cria confiança entre seus membros,
e destes com seus “stakeholders”, uma cultura consciente é uma força energizante e de união.
Os valores centrais de um negócio são os princípios guia que este utiliza para realizar
seu propósito. Os propósitos do negócio devem estar refletidos nos seus valores centrais, e
estes devem levar em conta todos os constituintes do ecossistema na forma de lucro e
crescimento para os acionistas e investidores, produtos e serviços da melhor qualidade para os
clientes, ambiente de excelência e transparente para os funcionários, relações justas e de
confiança com fornecedores e cuidado com a comunidade e o meio-ambiente para a
sociedade.
8. “Firms of Endearment”
O conceito de “Firms of Endearment”, como descrito no livro de Raj Sisodia, David
Wolfe e Jag Sheth, se aplica a companhias que, pela prática de um capitalismo consciente e
relações de ganho mútuo baseadas em credibilidade com todos os “stakeholders”,
desenvolvem uma ligação emocional com estes “stakeholders”, sejam eles clientes,
fornecedores, parceiros, funcionários, a comunidade na qual operam ou a sociedade.
Essa ligação emocional vai além da lealdade de comportamento, que faz com que
consumidores comprem repetidamente de empresas com as quais não possuem nenhuma
ligação emocional, ela é a fundação para uma lealdade de atitude que é a que mais importa na
sustentação da sobrevivência e sucesso de longo prazo de uma companhia, especialmente em
um mercado em rápida transformação como vemos atualmente.
É essa ligação emocional que permite que as “Firms of Endearment” tenham um
resultado melhor em marketing mesmo com orçamentos menores que a média da indústria, ou
que fazem com que as municipalidades tentem atrai-las a abrir filiais em suas comunidades
com incentivos de isenção de impostos.
Até o final da década de 80, e início da década de 90, não havia um ambiente propício
para que os consumidores desenvolvessem laços emocionais com as empresas. Os autores
dividem as eras culturais dos Estados Unidos em três: a era do empoderamento (“age of
empowerment”), a era do conhecimento (“age of knowledge”) e, finalmente, a era da
transcendência (“age of transcendence”).
A era do empoderamento começa na assinatura da declaração de independência, e
publicação do livro de Adam Smith, “An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of
Nations”, em 1776. Respaldados pela liberdade da nação e dos mercados, e por uma
legislação que protegia o empreendedorismo e a propriedade intelectual, os norte-americanos
utilizaram o capitalismo para melhorar seu padrão de vida. Nesta mesma época, a Europa
aristocrática vivia sua era do iluminismo (“age of enlightenment”). A era do empoderamento
termina por volta de 1880 com o início da era do conhecimento.
A era do conhecimento é marcada por grandes invenções tais como o telefone
(Graham Bell), o fonógrafo, a lâmpada incandescente e o sistema central elétrico (Thomas
Edison). Esta era viu os Estados Unidos passarem de uma sociedade agraria para uma
sociedade industrial, criando a sociedade de consumo moderna com o aumento da expectativa
de vida e grandes feitos científicos.
Embora não haja uma data específica para o início da era da transcendência, os autores
adotaram o ano de 1989 para tanto, pois foi o ano em que, pela primeira vez na história, a
maior parte da população dos Estados Unidos passou a ter mais de 40 anos. Esta população
mais madura aumenta a propensão a uma sociedade mais gentil e afetuosa, conforme escreveu
Peggy Noonan, ou uma sociedade que se move de perspectivas mais racionais, associadas ao
lado esquerdas do cérebro, para perspectivas mais emocionais e intuitivas, associadas ao lado
direito do cérebro, conforme vê o autor de “A Whole New Mind”, Daniel Pink.
É comum que pessoas que já passaram pelos anos de construção de carreira e sustento
da família em crescimento se pergunte o que farão com o resto de suas vidas, buscando um
propósito maior do que simplesmente acumular riquezas. Esta busca de propósito está
mudando as expectativas que as pessoas têm das empresas das quais consomem bens e
serviços, mudando a essência do capitalismo.
1989 foi também o ano que Tim Berners-Lee, engenheiro de software britânico,
inventou a interface gráfica para a Internet, o a World Wide Web como a conhecemos. A web
alterou de forma dramática a forma como interagimos, democratizando a informação e
forçando as companhias a operarem com muito mais transparência.
As “Firms of Endearment” tem em comum um conjunto de valores, políticas e
atributos operacionais que as distinguem. Os autores citam, por exemplo, as seguintes
características:
 propósito de existência que vai além da acumulação de dinheiro
 alinham, através de modelos de negócios diferenciados, os interesses dos
vários “stakeholders”
 compensação relativamente modesta para CEOs e altos executivos
 política de portas abertas
 compensação e benefícios para funcionários acima da média de mercado
 mais treinamento para funcionários
 menor rotatividade de colaboradores
 funcionários com poder para tomar medidas não convencionais e satisfazer os
clientes
 esforço consciente para contratar pessoas apaixonadas pela empresa e seus
produtos
 espaço de trabalho humanizado para clientes e funcionários
 desenvolvem uma conexão emocional genuína com seus clientes, o que os
autores chamam de “share of customer´s hearts”
 orçamento de marketing substancialmente menor do que a média de seus
concorrentes
 consideram a cultura corporativa como seu maior patrimônio e fonte primária
de vantagem competitiva
 cultura resistente a pressões momentâneas porém capazes de adaptação rápida
quando necessário
O que podemos observar, pelo quadro abaixo, é que as empresas que conseguem
estabelecer este laço emocional com todos os “stakeholders” tem um desempenho financeiro
significativamente superior a seus concorrentes.
A eficiência operacional, que por muito tempo foi suficiente para garantir lucros
significativos e a perpetuidade das empresas, passou a ser necessária, porém não suficiente.
Em um período de 15 anos, de 1998 a 2013, as companhias classificadas como “Firms
of Endearment”, listadas no apêndice A, tiveram uma performance 14 vezes melhor do que a
média das 500 maiores companhias do índice “Standard & Poors”, e seis vezes maiores do
que as companhias classificadas como “Good to Great”.
Em períodos menores do que 15 anos, a diferença, embora menos pronunciada, segue
sendo significativa como podemos notar.
O próximo passo é examinar o desempenho de empresas brasileiras que praticam o
capitalismo consciente em um esforço para estabelecer um laço emocional com seus
“stakeholders”.
Como não temos ainda nenhum estudo classificando as empresas Brasileiras como
“Firmas Mais Queridas” (“Firms of Endearment”), e precisaríamos de um estudo detalhado de
cada empresa candidata para assegurar esta classificação, tomamos como proxy as empresas
listadas como sustentáveis no índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa).
Está claro em nosso estudo que somente uma pequena parte das empresas com
políticas e práticas sustentáveis podem realmente ser classificadas como praticantes do
capitalismo consciente e “Firms of Endearment”, porém podemos afirmar que todas as “Firms
of Endearment” têm estas políticas de sustentabilidade como qualidade necessária, porém não
suficiente.
Para esta comparação tomamos um período de cinco anos, de Janeiro de 2011 à
Janeiro de 2016, e as ações listadas no Índice de Sustentabilidade de Empresarial (vide
apêndice B).
Examinando os índices ISE e iBovespa, e a razão entre ambos, no período de cinco
anos, chegamos a conclusão que as empresas que buscam praticas sustentáveis tiveram uma
performance 60% melhor do que as ações que compõe o iBovespa no período, se tomarmos
um período mais curto esta diferença se torna menos significativa, sendo provavelmente o
contrário também válido.
9. Conclusão final
Como podemos verificar, assim como o mercado Americano, o Brasileiro também
precifica adequadamente a perpetuidade e sucesso das empresas que praticam um capitalismo
consciente e tentam estabelecer uma ligação emocional com todos os “stakeholders”.
O melhor desempenho destas empresas se deve a expectativa de perenidade do
negócio e melhor desempenho no longo prazo. A eficiência operacional destas empresas
incorpora as melhores práticas de gestão aos benefícios procedentes do seu modelo de
interação com funcionários, a comunidade, fornecedores, governo e investidores. Esses
benefícios, como vimos, incluem um menor orçamento de marketing, menor rotatividade de
funcionários, benefícios fiscais, melhor treinamento entre outros.
Talvez seja inclusive o momento de reexaminar as cinco forças de Porter e acrescentar
outras forças, tais como funcionários, sociedade e acionistas às forças existentes (rivalidade
no mercado, fornecedores, clientes, novos entrantes e produtos substitutos) que permitem uma
empresa ter ganhos acima da média de mercado.
A questão que fica é; se há um benefício, historicamente comprovado pela
performance de mercado, em seguir práticas do capitalismo consciente e um modelo onde
todas as partes podem colher o benefício de sua atividade, por que esta prática não é adotada
por todas as empresas?
Pelas expectativas racionais seria natural assumir que a prática de um capitalismo
consciente seria rapidamente incorporada a todas as empresas do mercado, o que, como
sabemos, não ocorreu, pelo menos não ocorreu ainda.
Em uma abordagem otimista, podemos assumir que, dado o envelhecimento da
população do mercado consumidor e uma nova geração mais consciente das externalidades
negativas do capitalismo convencional, a pratica do capitalismo consciente se estenderá a
todas as empresas do mercado ou, de outra forma, se estenderá a todas as empresas que
sobreviverão.
Em uma abordagem mais pessimista, a pressão por resultados de curto prazo, que
chamamos acima de expectativas trimestrais, deve permitir que seja mais rentável para
algumas empresas perseguir resultados de curto prazo, e não incorporar os interesses de todos
os “stakeholders” na gestão do negócio.
De minha parte prefiro a abordagem otimista, que o capitalismo continuará sendo a
melhor ferramenta para melhoria da vida das pessoas e mola propulsora de enriquecimento de
inovadores e empreendedores, porém passará por uma evolução, uma nova fase onde este
enriquecimento não será à custa da sociedade como um todo, onde fazer lucro e a diferença
seja não somente compatíveis como dependentes entre si.
10. Apêndice A – “Firms of Endearment”
Abaixo a lista de companhias selecionadas como “Firms of Endearment” por Raj
Sisodia, David Wolfe e Jag Sheth:
 Companhias públicas Norte-Americanas
3M Adobe Systems Amazon.com
Autodesk Boston Beer Company CarMax
Chipotle Chubb Cognizant
Colgate-Palmolive Costco FedEx
Google Harley-Davidson IBM
J.M. Smucker Marriott International MasterCard Worldwide
Nordstrom Pamera Qualcomm
Walt Disney Whole Foods Market
 Companhias privadas Norte-Americanas
Barry-Wehmiller Bom Appetit Management Co. Clif Bar
Driscoll´s GSD&M Idea City Honest Tea
IDEO Interstate Batteries Jordan´s Furniture
L.L. Bean Method Millennium Oncology
New Balance Patagonia prAna
REI SAS Institute SC Johnson
Stonyfield Yogurt TDIndustries The Container Store
The Motley Fool Timberland TOMS
Trader Joe´s Union Square Hospitality Group USAA
Wegmans WL Gore
 Companhias não Norte-Americanas
BMW (Alemanha) Cipla (India) FabIndia (India)
FEMSA (México) Gemalto (França) Honda (Japão)
IKEA (Suécia) Inditex (Espanha) Mahindra & Mahindra (India)
Marico (India) Novo Nordisk (Dinamarca) POSCO (Correia do Sul)
TCS (India) Toyota (Japão) Unilever (Reino Unido)
11. Apêndice B – Índice de Sustentabilidade de Empresarial
Abaixo a lista das trinta e quatro companhias que compõe atualmente o Índice de
Sustentabilidade Empresarial:
Banco do Brasil Bradesco BRF
Braskem B2W Digital CCR SA
CESP Cielo CEMIG
CPFL Energia COPEL Duratex
Ecorodovias Eletrobrás Eletropaulo
Embraer Energias BR Even
Fibria Fleury Itaú Unibanco
Klabin S/A Lojas Americanas Light S/A
Lojas Renner Natura Oi
Santander Sul America Tractebel
AES Tiete TIM Participações Telefonica Brasil
WEG
12. Bibliografia
"Creating Shared Value", by Michael E. Porter and Mark R. Kramer, Harvard Business
Review, January-February 2011 issue
“The Myth of Shareholders Capitalism”, by Loizos Heracleous and Luh Luh Lan, Harvard
Business Review, April 2010 issue
“The Age of Customer Capitalism”, by Roger L. Martin, Harvard Business Review,
January-February 2010 issue
“Time to Rethink Capitalism?”, Michael Yaziji, Harvard Business Review, November
2008
Wikipedia (https://pt.wikipedia.org), Capitalismo, Feudalismo e Cruzadas, Filantropia,
Corporate Social Responsibility
“O Mundo É Plano: uma Breve História do Século XXI”, Thomas Friedman, Abril 2005
“The Modern Corporation and Private Property”, Adolf Berle e Gardiner Means, 1932
“The End of Corporate Social Responsibility: Crisis and Critique”, Peter Fleming e Marc
T. Jones, December 2012
“Strategy and Society: The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social
Responsibility”, Michael E. Porter e Mark R. Kramer, Harvard Business Review,
Dezembro 2006
Conscious Capitalism with John Mackey Co-founder and Co-CEO of Whole Foods
Market, https://www.youtube.com/watch?v=ZLcIziUvw5Q
Conscious Capitalism – Creating a New Paradigm for Business, by John Mackey
“Companies that Practice “Conscious Capitalism” Perform 10x Better”, by Tony
Schwartz, Harvard Business Review, April 2013 issue
“Firms of Endearment – How World-Class Companies Profit from Passion and Purpose”,
Raj Sisodia, David Malfe e Jag Sheth, 2a. edição
13. Trabalhos Citados
“Not All Profits Are Equal”, William F. Achtmeyer Center for Global Leadership, Chris
Trimble
“The Single Bottom Line”, Daniel Altman and Jonathan Berman, Stern School of
Business, New York University
“The end of capitalism has begun”, Paul Mason, The Guardian
(http://www.theguardian.com/books/2015/jul/17/postcapitalism-end-of-capitalism-
begun?CMP=share_btn_fb)
“How Good We Can Be by Will Hutton review – not socialism, just better capitalism”,
Peter Wilby, The Guardian (http://www.theguardian.com/books/2015/feb/19/how-good-
we-can-be-review-will-hutton-stakeholder-capitalism)
“The social responsibility of business is to increase profits”, Friedman, Milton - The New
York Times Magazine (1970, September 13)
“Corporate social responsibility and financial performance: correlation or
misspecification?”, Abagail McWilliams e Donald Siegel, Strategic Management Journal,
06 de Abril de 2000
“Creating Shared Value: The One-Trick Pony Approach – a comment on Michael Porter
and Mark Kramer”, Beschorner, Thomas (2013), Business Ethics Journal Review 17, no.
1, 106-112, p. 109 (http://businessethicsjournalreview.com/2013/09/08/beschorner-on-
porter-kramer-on-creating-shared-value)
Código Comum para a Comunidade Cafeeira (4C),
http://www.criandovalorcompartilhado.com.br/docs/default-source/default-document-
library/4c_code-of-conduct_illustratedguide_pt.pdf?sfvrsn=2
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  • 1. INSPER INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA Renato Carlos Pereira Cotrim Turma MBEW 05 Estudo sobre a valorização de empresas que praticam o capitalismo consciente no Brasil São Paulo – 2016
  • 2. INSPER INSTITUTO DE ENSINO E PESQUISA Renato Carlos Pereira Cotrim Turma MBEW 05 Estudo sobre a valorização de empresas que praticam o capitalismo consciente no Brasil O aluno cumpriu todos os requisitos necessários para a elaboração do Projeto Aplicado, estando, portanto, APROVADO. São Paulo, 24 de Março de 2016 Silvio Abrahão Laban Neto São Paulo – 2016
  • 3. “Do you want to make a profit or make a difference?” Resumo O objetivo primordial do gestor é maximizar o valor para os acionistas. O mercado, na pessoa de investidores privados, funciona de forma racional, antecipando e incorporando ao preço das empresas todas as informações públicas tão logo estas se tornam disponíveis. As empresas são avaliadas por sua capacidade de gerar fluxo livre de caixa futuro, que são trazidos a valor presente por uma taxa de desconto. Empresas que buscam expandir o valor econômico e social gerado como parte inerente de suas atividades devem ter maior valorização de mercado, pois têm modelo de geração de fluxo livre de caixa mais sustentável no futuro, logo diminuem as incertezas quanto a geração de caixa na perpetuidade. 1. Introdução A pergunta que abre este trabalho, “você quer fazer lucro ou diferença?”, pode ser encontrada em muitos panfletos que buscam voluntários para trabalhos sociais, normalmente distribuídos por organizações não governamentais do terceiro setor. O conceito assumido é que ambos são mutuamente excludentes: uma empresa que tem lucro, o tem, necessariamente, às custas da sociedade, seja através da exploração de alternativas de trabalho com baixa remuneração, ou em outras regiões geográficas menos favorecidas; seja através do custo ambiental de dejetos poluentes, as chamadas externalidades negativas, ou também da exploração de fornecedores e parceiros, que devem receber o mínimo possível pelos insumos que fornecem A ideia que prevalece é que, para alguém ganhar e ter mais, é preciso que alguém perca e ganhe menos, conhecido como “zero sum game”, ou seja, o total é sempre o mesmo, o que muda é a distribuição. Não deveria, porém, ser assim. Fazer a coisa certa deveria ser também fazer a coisa mais lucrativa. Se a empresa pode ser avaliada pelo valor presente de seus fluxos de caixa futuros, e se uma empresa consegue maximizar a criação de valor econômico e social, ao mesmo tempo em que torna seu fluxo livre de caixa mais sustentável no longo prazo, esta empresa deveria obter maior valorização. O objetivo principal do gestor, de maximização de valor para o acionista, deveria ser convergente com o objetivo de geração de valor social, desde que este valor social seja gerado
  • 4. a partir das atividades principais da empresa, e não como uma atividade acessória para redistribuição de valor já gerado, e desde que a geração deste valor social também possibilite uma maior eficiência que, de outra forma, não seria possível. O objetivo deste trabalho é demonstrar que é possível, e desejável, perseguir metas de maximização de valor econômico ao mesmo tempo em que se perseguem metas de geração de valor social, que estes objetivos são conciliáveis e não conflitantes, e que o capitalismo está evoluindo para uma nova fase na qual o mercado recompensará as empresas que busquem modelos socialmente sustentáveis no longo prazo, e o fará não porque isso é socialmente responsável, mas porque estas empresas se provarão mais rentáveis do que as empresas que buscam apenas maximizar resultados de curto prazo. 2. Uma Breve História do Capitalismo O comércio entre povos, ou capitalismo mercantil, floresceu no mundo antigo na baixa idade média. O comércio era uma das poucas formas de acumulação de capital e de movimentação entre camadas sociais. Historicamente, com a queda do império romano ocidental e início da idade média, o feudalismo foi o sistema sócio-político predominante (séculos IV e V). Neste, um senhor feudal, oferecia terras (glebas) para cultivar e habitar, e proteção aos camponeses, que lhes pagavam pesados tributos. A partir do século XI, com as cruzadas e retomada do comércio com o oriente próximo (Palestina), a população urbana aumenta, os alimentos ficam mais caros e os camponeses acumulam capital para comprar suas terras e enfraquecem o sistema feudal, que dá lugar ao capitalismo. Tecnicamente, o capitalismo é um sistema econômico no qual os meios de produção e comércio são de iniciativa privada, que os operam de forma a gerar lucro. Suas bases são a propriedade privada, a acumulação de capital, o trabalho assalariado e, em alguma instâncias, um mercado em competição perfeita, no qual as partes negociam e determinam a que preços bens e serviços serão comercializados. Ironicamente, o termo capitalismo foi popularizado por Karl Max, no século XIX, porém seus princípios já haviam sido delineados pelo economista escocês Adam Smith, em seu livro “An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations”, publicado em 1776. Nesta época o termo utilizado era “liberalismo”, ou uma economia livre de mercado.
  • 5. Com o advento da revolução industrial, que permitiu que bens fossem produzidos em larga escala e custos reduzidos, o capitalismo ganhou força. O capitalismo pressupõe quatro princípios básicos:  o capital de negócios é de propriedade privada  a economia é controlada por vendedores e compradores  as pessoas tem liberdade de gastar seu dinheiro no que desejarem  a intervenção e supervisão do governo deve ser a menor possível No final do século XIX e princípio do século XX, os empregadores se aproveitaram da falta de regulamentação para obrigar os trabalhadores a longas jornadas, falta de segurança no trabalho e abuso do trabalho infantil. O que levou a criação de leis regulamentando estes temas. 3. Trabalhando para Wall Street O capitalismo tem sido o sistema econômico mais efetivo em promover melhores condições de vida para a sociedade, além de mola propulsora da inovação e veículo de mobilidade social. No sistema anterior, o feudalismo, se você nascia pobre, você morria pobre, no capitalismo qualquer indivíduo tem a possibilidade de produzir e vender bens e serviços que, dado a demanda, pode levar a acumulação de riquezas e mobilidade social. Os conceitos fundamentais nesta promoção de melhoria social são:  o capital, na forma de seus acionistas, contrata meios de produção, como insumos, equipamentos e trabalho, para produzir bens e serviços e vende-los ao mercado para obtenção de lucro,  os negócios contribuem para a sociedade através da obtenção de lucro, que gera os empregos, salários, compras, investimentos e impostos, conforme expressado por Milton Friedman,  os gestores tomarão decisões no sentido de maximizar a criação de lucro e valor para os acionistas e assim perpetuar este ciclo virtuoso, Estes conceitos têm passado por modificações nas últimas décadas, que nos levam a questionar se esta equação de geração de valor para a sociedade ainda é válida. a. Companhias Globais De acordo com o livro “O Mundo É Plano: uma Breve História do Século XXI” publicado por Thomas Friedman em abril de 2005, o mundo é plano,. Uma metáfora para um
  • 6. mundo onde o comercio se dá a nível global, onde todos os competidores têm acesso às mesmas oportunidades. As empresas, os países e os indivíduos devem se preparar para competir em um mundo onde as fronteiras históricas e geográficas estão se tornando cada vez mais irrelevantes. As empresas, sem uma identidade com uma comunidade ou local específico, perdem também a percepção de responsabilidade com a sociedade. Produtos, serviços e dinheiro fluem livremente sem reconhecer fronteiras. Os benefícios do lucro como fomentador de empregos, salários, compras, investimentos e impostos, também fluem livremente para locais de menor custo, sem ligações com nenhuma sociedade específica. b. Diversificação do Risco A lógica do mercado de capitais afirma que o capital, que arca com a maior parte do risco do empreendimento, deve receber o retorno residual deste. Este sempre foi o alicerce do mercado livre e capitalismo competitivo. No passado um capitalista investia uma boa parte de seu patrimônio em uma fábrica, que contratava trabalhadores e pagava seus salários. Quem arcava com a maioria dos riscos neste empreendimento e, por consequência, tinha eticamente o direito aos retornos residuais, era o capitalista, que também tinha a melhor informação sobre o negócio e o poder de assegurar a efetiva implementação de decisões operacionais. Com a diversificação dos investidores em um número sem fim de acionistas, o risco destes investimentos diversificados reduziu consideravelmente. Muitos investidores sequer sabem em que companhias seus fundos de pensão estão investidos. Por outro lado os trabalhadores de um empreendimento ainda detém um considerável risco em uma empresa, seus investimentos são em forma de conhecimento do negócio, construção de relacionamentos e reputação, investimentos estes que não são facilmente diversificáveis. Partindo da premissa que os que detêm a maior parte do risco serão também os mais motivados para assegurar que uma empresa permaneça competitiva, empresas nas quais as decisões estratégicas são tomadas por conselhos com representantes laboristas deveriam ser também as empresas com uma melhor vantagem competitiva de médio e longo prazo. Os gestores das empresas, no entanto, tomam suas decisões operacionais para contentar o mercado de capitais que, com a diversificação e minimização do risco buscam resultados imediatos e não a perpetuação do círculo virtuoso de geração de valor. As decisões
  • 7. estratégicas, quando direcionadas pelas demandas de curto prazo do mercado de capitais, não otimizam a competitividade de longo prazo. c. Foco no Curto Prazo (ou Expectativas Trimestrais) O capitalismo moderno por ser dividido em duas grandes eras, a primeira se inicia em 1932, com a publicação, por Adolf A. Berle e Gardiner C. Means, do tratado intitulado “The Modern Corporation and Private Property” que advogava que a gestão e a propriedade de uma empresa deveriam ser separadas. Berle e Means, porém, já anteviam o conflito de agencia entre proprietários e gestores. No sexto capítulo do primeiro livro, intitulado “A divergência de interesse entre propriedade e controle”, eles alertavam que a justificativa para a premissa de que os que estivessem no controle da corporação moderna irão operá-la no melhor interesse de seus proprietários dependia do grau no qual os interesses próprios dos gestores se alinhassem com os dos proprietários. Eles mencionam ainda que, se assumirmos que o desejo de lucro pessoal é a força mestre que motiva o controle, devemos também concluir que os interesses do controle serão diferentes, e, às vezes, radicalmente opostos aos da propriedade, e que proprietários não serão atendidos por um grupo de controle que busque lucro. A segunda grande era do capitalismo também se inicia com a publicação de um trabalho acadêmico. “Theory of the Firm: Managerial Behavior, Agency Cost and Ownership Structure”, por Michael C. Jensen e William H. Meckling, publicado em 1976 no “Journal of Financial Economics”. Jensen e Meckling, entre vários outros tópicos, afirmam que a premissa que deve dirigir uma corporação é que o propósito de todas corporações deveria ser maximizar o valor para o acionista. Este trabalho argumentava que a gestão profissional estava trabalhando em seu próprio interesse, e não dos acionistas. Isto era ruim não somente para os acionistas como também para a economia, os gestores estavam utilizando recursos corporativos e da sociedade para seu próprio benefício. Em resposta a este problema surgiu a figura do conselho corporativo, cujo trabalho é alinhar os interesses da alta gerencia com os dos acionistas através da compensação baseada em opções de ações.
  • 8. No entanto o mantra de maximização do valor para o acionista tem uma lógica falha em si mesmo, aumentar o valor para o acionista, na maioria das vezes, não garante benefício para este mesmo acionista. Vamos examinar um pouco mais detalhadamente como o valor para o acionista é criado. O acionista tem direito ao valor excedente sobre o patrimônio e ganhos da empresa depois que outras partes como empregados, fundos de pensão, fornecedores, impostos e credores são pagos. Logo o valor de suas ações é o valor presente de todos os fluxos de caixa futuros após estes pagamentos. Como é impossível saber com exatidão os fluxos de caixa futuros o valor da ação se baseia em uma estimativa, uma expectativa. Portanto as implicações para os gestores são claras, a única forma de uma corporação servir ao seu propósito e maximizar o valor para o acionista é aumentar as expectativas sobre o desempenho futuro desta corporação. Infelizmente os gestores não podem fazer isso indefinidamente, como diz Warren Buffett, “as árvores não crescem até o céu”. Inevitavelmente, os acionistas e analistas vão aumentar suas expectativas futuras a um ponto que os gestores não conseguirão atingir. Qualquer gestor que entenda que a criação e destruição de valor são cíclicas, e não estão sob seu controle, irá investir em estratégias de curto prazo, na esperança de sair antes da queda inevitável, e frequentemente criticar seu sucessor. Como os CEOs não podem vencer o jogo no longo prazo, eles transformam este jogo em algo que possam vencer no curto prazo. De fato, as companhias negociadas no mercado acionário vivem atualmente uma pressão sem precedentes para exceder as expectativas trimestrais dos analistas. Um notório exemplo desta manipulação é a General Eletric. Jack Welch é famoso por ter transformado a GE, que quando ele assumiu em 1981 tinha uma capitalização de mercado de US$ 13 bilhões, na maior empresa do mundo com US$ 484 bilhões de capitalização de mercado quando ele se aposentou, em 2001. Porém este crescimento foi, em grande parte alimentada pela unidade GE Capital, que inicialmente tinha uma participação insignificante nos lucros da GE, e que era responsável por metade dos lucros da GE no final da década de 90. Em 2009 a GE teve que assumir perdas significativas relacionadas com a GE Capital e viu seu valor de mercado cair para US$ 75 bilhões.
  • 9. Concluindo, a valorização de mercado de US$ 471 bilhões, atribuída a gestão de Jack Welch, beneficiou somente os que venderam na alta. Seu benefício para os acionistas no médio e longo prazo é questionável. A questão é, se a capitalização de mercado das empresas está no valor presente da expectativa de geração de fluxo livre de caixa futuro, por que esta expectativa é traduzida por estimativas de geração de caixa no curto prazo, os relatórios trimestrais? O fato é que o encurtamento no horizonte de tempo dos investidores também estreita o pensamento sobre os investimentos apropriados. Os investimentos, que normalmente seriam avaliados pelo valor presente líquido dos fluxos futuros, passam a ser avaliado somente por seus resultados imediatos, o futuro próximo, a perpetuidade passa a ser logo ali. 4. Filantropia A filantropia foi a primeira tentativa do capitalismo de devolver para a sociedade uma parte das riquezas acumuladas. A filantropia se diferencia da caridade no sentido de que esta última tenta amenizar as dores de problemas sociais, enquanto a primeira tenta resolver este problema na sua causa, ou como comumente mencionado, a diferença entre dar um peixe a uma pessoa com fome, e ensina-lo a pescar o peixe. Há diversos exemplos de caridade e filantropia na história da humanidade, e nem sempre é fácil classificá-los. Na história moderna, podemos citar Henry Dunant, homem de negócios suíço que, em 1863, usou sua fortuna pessoal para criar a “Geneva Society for Public Welfare” que mais tarde se tornou o Comitê Internacional da Cruz-Vermelha, e lhe valeu o primeiro Premio Nobel da Paz, concedido em 1901. No final do século 19 e principio do século 20, a filantropia se tornou uma atividade de moda entre os mais favorecidos na Inglaterra e América industrializadas. Andrew Carnegie, por exemplo, escreveu sobre a responsabilidade das grandes fortunas e a importância da justiça social em “Gospel of Wealth” (1889). O senhor Carnegie fundeou bibliotecas públicas, escolas e universidades nos países de fala inglesa. Outros filantropos famosos do princípio do século 20 foram John D. Rockefeller and Henry Ford, que direcionaram seus esforços e atenção para as causas dos problemas sociais. Mais recentemente, diversas celebridades do mundo do entretenimento, fortunas pessoais do mundo financeiro, como Warren Buffett, ou da indústria de tecnologia, como Bill e Melinda Gates, tem liderado ações de filantropia. Novas tecnologias também alteraram a
  • 10. forma como doações são feitas, muitas iniciativas baseadas em “crowdfunding” utilizam a Internet para levantar fundos. Duas críticas podem ser feitas à filantropia como ferramenta sustentável de resolução de problemas sociais é que trata-se de iniciativa individual de caráter pessoal, e não corporativo, e que redistribui o valor já produzido pelo capitalismo. Por melhor intencionados que os filantropos sejam, e por melhor que sejam os resultados de seus trabalhos para resolver as mazelas sociais, ainda serão insuficientes frente ao desafio. Como é inerente a natureza humana a acumulação de bens, esforços para endereçar as enfermidades sociais somente serão sustentáveis se forem parte deste esforço de acumulação de bens. 5. Responsabilidade Social Corporativa “The social responsibility of business is to increase profits” Friedman, Milton The New York Times Magazine (1970, September 13) Responsabilidade Social Corporativa (CSR, em inglês), é um termo que se popularizou na década de 60, e segue sendo usado indistintamente por muitos com diferentes significados. Para alguns, CSR, às vezes também chamado de consciência corporativa, cidadania corporativa ou práticas responsáveis de negócio, é uma regulação auto imposta por algumas empresas, no sentido de monitorar e assegurar aderência dos negócios com as práticas legais, padrões éticos e normas internacionais. Para outros, CSR vai além da prática de “compliance”, e inclui o engajamento ativo em ações que ampliem o bem estar social, além das exigências legais e responsabilidades da corporação. A ideia é encorajar ações corporativas que gerem um impacto positivo no ambiente e “stakeholders”, que inclui os consumidores, os funcionários, investidores, a comunidade e outros, como o governo. Aqueles que são a favor da Responsabilidade Social Corporativa afirmam que as corporações que se engajam em ações de CSR, aumentam seus lucros, enquanto os críticos respondem que a CSR desvia a corporação de seu verdadeiro objetivo, que é aumentar os lucros, vide Milton Friedman.
  • 11. Um estudo, conduzido por Abagail McWilliams e Donald Siegel, intitulado “Corporate social responsibility and financial performance: correlation or misspecification?”, e publicado em 06 de abril de 2000 no Strategic Management Journal, comparou estudos econométricos da relação entre resultados sociais e financeiros, e concluiu que não há impacto de CSR nos resultados financeiros das corporações. Embora hajam outros estudos que, contraditoriamente, relatam impactos positivos, negativos e neutros. Conforme crítica de Peter Fleming e Marc T. Jones, em seu livro “The End of Corporate Social Responsibility: Crisis and Critique”, a maioria das atividades relacionadas à Responsabilidade Social Corporativa tem como objetivo ganhar a legitimidade de consumidores e funcionários para maximizar seus lucros. Neste contexto, qualquer atividade de CSR é somente uma forma de a empresa implementar sua agenda de exploração e colonização. Este livro, que na verdade é mais uma monografia do que um livro-texto, vai além afirmando que os danos que as empresas causam são sistemáticos enquanto as iniciativas de CSR são, em geral, as com maior visibilidade pública e de pequena escala, que são irrelevantes para endereçar os danos sistemáticos causados. CSR busca reconciliar os objetivos corporativos com o bem social o que, segundo Fleming e Jones, é fundamentalmente impossível. Por outro lado, governos e organizações não governamentais (NGO em inglês), tem uma perspectiva mais ideológica e absolutista, na qual os benefícios sociais devem ser perseguidos a qualquer preço. A figura abaixo traz três abordagens diferentes de CSR em escala crescente de valor, e também seus objetivos, impactos e benefícios.
  • 12. "CSR framework - value1" by Touro - Own work. Licensed under Public Domain via Wikimedia Commons - https://commons.wikimedia.org/wiki/File:CSR_framework_-_value1.jpg#/media/File:CSR_framework_-_value1.jpg Uma primeira abordagem é a da filantropia corporativa, ou seja, doações monetárias e assistenciais para NGOs e comunidades. Estas doações podem abranger diversas áreas tais como educação, saúde, artes, meio-ambiente, entre outras, incluindo o patrocínio de eventos comerciais. Algumas críticas válidas para esta abordagem é o caráter distributivo do valor gerado, mínimo impacto na corporação, benefícios não sustentáveis e de curto prazo. Uma segunda abordagem é incorporar a estratégia de CSR nas operações da corporação. Um exemplo desta abordagem é o movimento social Fair Trade (http://www.fairtrade.net/) que procura assegurar melhores negociações para trabalhadores e fazendeiros na compra de produtos agrícolas, como café e chá. Esta é uma abordagem tipicamente de “compliance”, que diminui os riscos e impactos da operação corporativa enquanto promove relações mais sustentáveis com organizações externas. Finalmente, temos a abordagem de responsabilidade social corporativa como base de criação de valor de um modelo de negócios sustentável, com impacto estratégico e operacional fundamental na corporação, com promoção de inovação e competitividade, sustentabilidade do modelo de negócios e desenvolvimento do capital humano, que é crítico
  • 13. para promover o crescimento nos países em desenvolvimento. A criação de valor compartilhado (CSR em inglês) será o assunto da próxima sessão deste trabalho. 6. Criando Valor Compartilhado (CSV em inglês) O conceito de Criando Valor Compartilhado, ou “Creating Shared Value” (CSV) em inglês, foi introduzido pela primeira vez em uma publicação, de Dezembro de 2006, da Harvard Business Review intitulada “Strategy and Society: The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility”, de autoria de Michael E. Porter e Mark R. Kramer. A ideia central deste conceito é que a competitividade de uma empresa e a saúde da comunidade que a rodeia são mutualmente dependente, que o conceito de criação de valor, que emergiu na última década, está ultrapassado, pois otimiza a performance financeira de curto prazo, ignorando fatores críticos que são fundamentais para seu crescimento e geração de valor de forma sustentável, entre os quais o bem-estar de seus clientes, manutenção dos recursos naturais que são insumos críticos para sua atividade, a viabilidade econômica de fornecedores chave, e a sustentação econômica nas comunidades onde produzem e vendem. Do ponto de vista de CSV, a Responsabilidade Social Corporativa (CSR) coloca os problemas sociais na periferia dos negócios, e não no núcleo do modelo de negócios adotado. Quando colocado no centro do modelo de negócio adotado, a criação de valor econômico também cria valor para a sociedade, endereçando suas necessidades e desafios. Há diversos exemplos de empresas brasileiras e estrangeiras que adotaram a criação de valor para a sociedade como parte de suas atividades, melhorando também sua competitividade e sustentabilidade. A Nestlé criou um programa global, chamado de Nescafé Plan, cujo objetivo é fomentar o desenvolvimento de produtos locais de café, e educar os produtores para aumento de produtividade com sustentabilidade. Para isso ela criou o Código Comum para a Comunidade Cafeeira (4C), incentiva os produtores a fazerem parte desta iniciativa e compra sua produção. O 4C discrimina práticas inaceitáveis (trabalho infantil e escravo, tráfico de pessoas, utilização de agrotóxicos, corte de floresta primária, etc.), dimensão social (liberdade de associação de trabalhadores, liberdade de negociação, discriminação, direito à infância e à educação, condições de trabalho, etc.), dimensão ambiental (conservação da biodiversidade, conservação do solo, uso responsável da água, descarte de resíduos, conservação de energia,
  • 14. etc.), dimensão econômica (informação e acesso ao mercado, qualidade, comércio e rastreabilidade). Este tipo de iniciativa, associado aos treinamentos periódicos que a Nestlé fornece sobre melhores práticas, aumentam a produtividade da propriedade rural, a qualidade da matéria prima e garantem a origem dos insumos comprados. Em última instancia o benefício é compartilhado pelo produtor rural, pela Nestlé, pelo governo, pela sociedade que tem seu meio-ambiente preservado e pelo país. Há três maneiras de criar valor compartilhado, a primeira é reconceber produtos e mercados. As iniciativas de microfinanciamento, por exemplo, se encaixam nesta categoria. São mercados que não existiriam se o modelo de negócios não incorporasse em si mesmo o endereçamento das necessidades de financiamento de populações mais pobres. Um bom exemplo nesta categoria é a Vodafone, que desenvolveu um serviço de mobile-banking no Quênia, chamado de M-PESA, que conseguiu 10 milhões de clientes em três anos de existência, e manuseia fundos que contabilizam 11% do produto interno bruto do país. Atualmente o serviço está lançado em dez países. Uma segunda forma de criar valor compartilhado é redefinir a produtividade na cadeia de valor. Segundo Porter e Kramer, há diversas maneiras de criação de valor compartilhado quando reexaminamos a cadeia de valor:  Uso de energia e logística - uso mais eficiente de energia através de melhores
  • 15. tecnologias, reciclagem, cogeração, e uso de fornecedores locais,  Uso de Recursos Naturais - uso mais eficiente de água, insumos e embalagem através de melhores tecnologias,  Compras - melhoria de produtividade e qualidade de fornecedores (vide Nestlé Nespresso),  Distribuição - redução de embalagens, utilização de pequenos distribuidores de comunidades rurais,  Produtividade do Funcionário - programas corporativos para deixar de fumar  Localidade – fornecedores e produção próximos ao mercado de consumo. Finalmente podemos criar valor compartilhado pelo desenvolvimento dos agrupamentos (“cluster”) ao redor do negócio da empresa. Um agrupamento inclui fornecedores, infraestrutura, negócios relacionados, provedores de serviços, associações de comércio, organizações de normatização e programas acadêmicos. As deficiências nos elementos do agrupamento aumentam o custo interno da empresa, por exemplo, estradas ruins aumentam o custo de logística. As empresas podem criar valor compartilhado ajudando a desenvolver o agrupamento ao seu redor, por exemplo, desenvolvendo fornecedores mais capacitados e qualificados, como no caso da Nestlé exemplificado acima. 7. Capitalismo Consciente O movimento do Capitalismo Consciente emergiu da teoria de Responsabilidade Social Corporativa (em inglês CSR). Muitos acreditam que a pioneira deste movimento foi Anita Roddick, que em 1976 fundou a “The Body Shop” com um modelo de negócios inovador, que levava em conta os impactos ao meio ambiente, testes de cosméticos em animais e direitos humanos. Porém John Mackey, que em 1978 fundou o supermercado “Whole Foods Market” e coautor do livro “Conscious Capitalism”, tem sido um de seus defensores mais vocais. O Capitalismo Consciente advoga que modelos de negócios que levam em conta todos os “stakeholders”, os investidores, a comunidade, os funcionários, os fornecedores e os clientes, são os que conseguem gerar maior valor sustentável para seus investidores, no médio e longo prazo. O Capitalismo Consciente se apoia em quatro pilares: a) Propósito Maior nos Negócios
  • 16. Assim como significado e propósito nos separa de outros animais, eles também separam os negócios, um propósito maior nos motiva, nos torna resilientes e nos norteia na rota correta, um negócio com um propósito inspira e engaja seus “stakeholders”, um propósito inspirador desperta a admiração e até o amor de clientes e funcionário, um propósito inspirador, quando vivenciado no dia a dia do negócio, une os “stakeholders”. Os economistas frequentemente nos ensinam que o propósito dos negócios é maximizar o lucro para seus investidores, o racional é que os investidores são os donos do negócio, e tem o direito legal de contratar e despedir seus gestores, através de seu conselho. Porém, quem cria e/ou descobre realmente o propósito do negócio é o empreendedor, não os investidores, economistas, advogados ou o governo. O empreendedor define a estratégia e negocia os termos de troca com os outros “stakeholder”, inclusive investidores. Baseado nos termos de troca, estes investidores podem decidir voluntariamente fazer o investimento ou não, conforme o fundamento ético dos negócios e do capitalismo. Dos muitos motivos pelos quais os empreendedores criam negócios, certamente uma minoria deles o faz para maximizar o lucro. Claro que ganhar dinheiro é uma parte importante do negócio, mas na maioria das vezes não é o propósito principal pelo qual o negócio foi criado. Da mesma forma que os negócios evoluem, seus propósitos também o fazem, principalmente pela interação de seus “stakeholders”. Os valores centrais do negócio, via de regra, são simples no princípio e assumem significância mais profunda na medida em que o negócio se torna mais maduro, e seus “stakeholders” independentes interagem. Negócios que não tem lucro não podem sobreviver por muito tempo em um mercado competitivo, o lucro é essencial para a sobrevivência do negócio, porém maximiza-lo não é o único propósito deste. John Mackey defende que, embora possa parecer contra intuitivo, a melhor forma de maximizar o lucro no longo-prazo é não fazê-lo o principal objetivo da empresa. Em uma analogia com a busca da felicidade, a melhor forma de encontrá-la não é focar suas energias na busca de seus interesses diretos, tornando-se narcisista e obcecado em satisfazer de seu ego, mas através de um senso de propósito, trabalho com significado, grandes amigos, boa saúde, aprendizado e crescimento, relações afetuosas, e ajudando na realização dos outros. Quando os modelos de negócios estão centrados apenas na maximização do lucro imediato, eles negligenciam ou abusam de outros elementos e o sistema interdependente
  • 17. criará, eventualmente, uma retroalimentação negativa, que irá prejudicar os interesses de longo prazo dos investidores e acionistas. A objeção mais frequente aos argumentos acima é que milhares de negócios são altamente lucrativos e não são geridos de forma a maximizar o valor para todos os “stakeholders”, mas sim os interesses de seus investidores. Porém, segundo Mackey, estes negócios competem somente com negócios similares, que também são geridos e estão organizados de forma a maximizar o lucro. A questão é como estes negócios focados na maximização do lucro comparam com negócios que seguem o Capitalismo Consciente. Um estudo de 2007 da Wharton School por Rajendra Sisodia, David Wolfe e Jagdish Sheth, publicado depois em forma de livro, comparou os resultados de longo prazo 30 empresas negociadas publicamente, e geridas para otimizar o valor para todos os “stakeholders”, com o índice S&P 500. Como o gráfico acima indica, as companhias geridas para criar valor para todos os seus “stakeholders” tem um retorno do valor de ação extraordinariamente grande, tanto no curto quanto no longo prazo. John Mackey acredita que este modelo de negócio superior, será o modelo de negócios dominante no século 21. b) Orientação ao Stakeholder Diferente do que observavam as primeiras teorias econômicas elaboradas na época da revolução industrial, os negócios são uma rede intrínseca e interconectada de relações. Negócios conscientes focam neste ecossistema no qual estão inseridos e criam e otimizam valor para todos os “stakeholders”. Como ressalta John Mackey, negligenciar ou abusar de um ou mais constituintes desse ecossistema no qual está inserido o negócio, eventualmente criará um feedback negativo, que prejudicará os interesses de longo prazo dos acionistas.
  • 18. Por outro lado, “stakeholders” fortes e engajados levam a um negócio saudável, sustentável e resiliente. O próprio Mackey conta que, pouco tempo após abrir as portas, o “Whole Foods Market” enfrentou uma grande enchente na qual perdeu todas as mercadorias. Sem o auxílio de seus fornecedores, que aceitaram vender sem receber no curto prazo, e de clientes que literalmente ajudaram a limpar e arrumar a loja, a empresa provavelmente teria falido. Orientação ao “stakeholders” é reconhecer que funcionários, clientes, fornecedores, fundadores, comunidades de suporte, e um ecossistema de sustentação de vida simplesmente não há negócio. Os negócios que levam em consideração todos os constituintes criam uma relação de confiança e colaboração de longo-prazo. c) Liderança Consciente Como observou Robert K. Greenleaf, em seu ensaio de 1970 “The Servant As Leader”, bons líderes tem que se tornar antes bons servidores. Líderes conscientes reconhecem que seu papel é servir ao propósito do negócio, apoiar as pessoas e criar valor para todos os “stakeholders”. Eles focam no “nós” e não no “eu”, lideres conscientes inspiram e provocam transformações nos que estão a sua volta, despertando melhor de todos. Líderes conscientes lideram, por exemplo, nos inspiram a explorar novas áreas, e tornar realidade nosso potencial. Antes de mais nada, eles entendem o papel intrínseco da cultura na organização e pessoalmente cultivam uma cultura de cuidado e crença nos outros. d) Cultura Consciente Como diz uma frase atribuída a Peter Drucker, “cultura come estratégia no café da manhã”. A cultura é a personificação dos valores, princípios e práticas sob a malha social de um negócio, que permeia suas ações e conecta seus “stakeholder” e estes ao propósito do negócio, pessoas e processos da organização. Uma cultura consciente estimula amor e cuidado, e cria confiança entre seus membros, e destes com seus “stakeholders”, uma cultura consciente é uma força energizante e de união. Os valores centrais de um negócio são os princípios guia que este utiliza para realizar seu propósito. Os propósitos do negócio devem estar refletidos nos seus valores centrais, e
  • 19. estes devem levar em conta todos os constituintes do ecossistema na forma de lucro e crescimento para os acionistas e investidores, produtos e serviços da melhor qualidade para os clientes, ambiente de excelência e transparente para os funcionários, relações justas e de confiança com fornecedores e cuidado com a comunidade e o meio-ambiente para a sociedade. 8. “Firms of Endearment” O conceito de “Firms of Endearment”, como descrito no livro de Raj Sisodia, David Wolfe e Jag Sheth, se aplica a companhias que, pela prática de um capitalismo consciente e relações de ganho mútuo baseadas em credibilidade com todos os “stakeholders”, desenvolvem uma ligação emocional com estes “stakeholders”, sejam eles clientes, fornecedores, parceiros, funcionários, a comunidade na qual operam ou a sociedade. Essa ligação emocional vai além da lealdade de comportamento, que faz com que consumidores comprem repetidamente de empresas com as quais não possuem nenhuma ligação emocional, ela é a fundação para uma lealdade de atitude que é a que mais importa na sustentação da sobrevivência e sucesso de longo prazo de uma companhia, especialmente em um mercado em rápida transformação como vemos atualmente. É essa ligação emocional que permite que as “Firms of Endearment” tenham um resultado melhor em marketing mesmo com orçamentos menores que a média da indústria, ou que fazem com que as municipalidades tentem atrai-las a abrir filiais em suas comunidades com incentivos de isenção de impostos. Até o final da década de 80, e início da década de 90, não havia um ambiente propício para que os consumidores desenvolvessem laços emocionais com as empresas. Os autores dividem as eras culturais dos Estados Unidos em três: a era do empoderamento (“age of empowerment”), a era do conhecimento (“age of knowledge”) e, finalmente, a era da transcendência (“age of transcendence”). A era do empoderamento começa na assinatura da declaração de independência, e publicação do livro de Adam Smith, “An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations”, em 1776. Respaldados pela liberdade da nação e dos mercados, e por uma legislação que protegia o empreendedorismo e a propriedade intelectual, os norte-americanos utilizaram o capitalismo para melhorar seu padrão de vida. Nesta mesma época, a Europa aristocrática vivia sua era do iluminismo (“age of enlightenment”). A era do empoderamento termina por volta de 1880 com o início da era do conhecimento.
  • 20. A era do conhecimento é marcada por grandes invenções tais como o telefone (Graham Bell), o fonógrafo, a lâmpada incandescente e o sistema central elétrico (Thomas Edison). Esta era viu os Estados Unidos passarem de uma sociedade agraria para uma sociedade industrial, criando a sociedade de consumo moderna com o aumento da expectativa de vida e grandes feitos científicos. Embora não haja uma data específica para o início da era da transcendência, os autores adotaram o ano de 1989 para tanto, pois foi o ano em que, pela primeira vez na história, a maior parte da população dos Estados Unidos passou a ter mais de 40 anos. Esta população mais madura aumenta a propensão a uma sociedade mais gentil e afetuosa, conforme escreveu Peggy Noonan, ou uma sociedade que se move de perspectivas mais racionais, associadas ao lado esquerdas do cérebro, para perspectivas mais emocionais e intuitivas, associadas ao lado direito do cérebro, conforme vê o autor de “A Whole New Mind”, Daniel Pink. É comum que pessoas que já passaram pelos anos de construção de carreira e sustento da família em crescimento se pergunte o que farão com o resto de suas vidas, buscando um propósito maior do que simplesmente acumular riquezas. Esta busca de propósito está mudando as expectativas que as pessoas têm das empresas das quais consomem bens e serviços, mudando a essência do capitalismo. 1989 foi também o ano que Tim Berners-Lee, engenheiro de software britânico, inventou a interface gráfica para a Internet, o a World Wide Web como a conhecemos. A web alterou de forma dramática a forma como interagimos, democratizando a informação e forçando as companhias a operarem com muito mais transparência. As “Firms of Endearment” tem em comum um conjunto de valores, políticas e atributos operacionais que as distinguem. Os autores citam, por exemplo, as seguintes características:  propósito de existência que vai além da acumulação de dinheiro  alinham, através de modelos de negócios diferenciados, os interesses dos vários “stakeholders”  compensação relativamente modesta para CEOs e altos executivos  política de portas abertas  compensação e benefícios para funcionários acima da média de mercado  mais treinamento para funcionários  menor rotatividade de colaboradores
  • 21.  funcionários com poder para tomar medidas não convencionais e satisfazer os clientes  esforço consciente para contratar pessoas apaixonadas pela empresa e seus produtos  espaço de trabalho humanizado para clientes e funcionários  desenvolvem uma conexão emocional genuína com seus clientes, o que os autores chamam de “share of customer´s hearts”  orçamento de marketing substancialmente menor do que a média de seus concorrentes  consideram a cultura corporativa como seu maior patrimônio e fonte primária de vantagem competitiva  cultura resistente a pressões momentâneas porém capazes de adaptação rápida quando necessário O que podemos observar, pelo quadro abaixo, é que as empresas que conseguem estabelecer este laço emocional com todos os “stakeholders” tem um desempenho financeiro significativamente superior a seus concorrentes. A eficiência operacional, que por muito tempo foi suficiente para garantir lucros significativos e a perpetuidade das empresas, passou a ser necessária, porém não suficiente. Em um período de 15 anos, de 1998 a 2013, as companhias classificadas como “Firms of Endearment”, listadas no apêndice A, tiveram uma performance 14 vezes melhor do que a média das 500 maiores companhias do índice “Standard & Poors”, e seis vezes maiores do que as companhias classificadas como “Good to Great”. Em períodos menores do que 15 anos, a diferença, embora menos pronunciada, segue sendo significativa como podemos notar.
  • 22. O próximo passo é examinar o desempenho de empresas brasileiras que praticam o capitalismo consciente em um esforço para estabelecer um laço emocional com seus “stakeholders”. Como não temos ainda nenhum estudo classificando as empresas Brasileiras como “Firmas Mais Queridas” (“Firms of Endearment”), e precisaríamos de um estudo detalhado de cada empresa candidata para assegurar esta classificação, tomamos como proxy as empresas listadas como sustentáveis no índice da Bolsa de Valores de São Paulo (Bovespa). Está claro em nosso estudo que somente uma pequena parte das empresas com políticas e práticas sustentáveis podem realmente ser classificadas como praticantes do capitalismo consciente e “Firms of Endearment”, porém podemos afirmar que todas as “Firms of Endearment” têm estas políticas de sustentabilidade como qualidade necessária, porém não suficiente. Para esta comparação tomamos um período de cinco anos, de Janeiro de 2011 à Janeiro de 2016, e as ações listadas no Índice de Sustentabilidade de Empresarial (vide apêndice B).
  • 23. Examinando os índices ISE e iBovespa, e a razão entre ambos, no período de cinco anos, chegamos a conclusão que as empresas que buscam praticas sustentáveis tiveram uma performance 60% melhor do que as ações que compõe o iBovespa no período, se tomarmos um período mais curto esta diferença se torna menos significativa, sendo provavelmente o contrário também válido. 9. Conclusão final Como podemos verificar, assim como o mercado Americano, o Brasileiro também precifica adequadamente a perpetuidade e sucesso das empresas que praticam um capitalismo consciente e tentam estabelecer uma ligação emocional com todos os “stakeholders”. O melhor desempenho destas empresas se deve a expectativa de perenidade do negócio e melhor desempenho no longo prazo. A eficiência operacional destas empresas incorpora as melhores práticas de gestão aos benefícios procedentes do seu modelo de interação com funcionários, a comunidade, fornecedores, governo e investidores. Esses benefícios, como vimos, incluem um menor orçamento de marketing, menor rotatividade de funcionários, benefícios fiscais, melhor treinamento entre outros. Talvez seja inclusive o momento de reexaminar as cinco forças de Porter e acrescentar outras forças, tais como funcionários, sociedade e acionistas às forças existentes (rivalidade no mercado, fornecedores, clientes, novos entrantes e produtos substitutos) que permitem uma empresa ter ganhos acima da média de mercado. A questão que fica é; se há um benefício, historicamente comprovado pela performance de mercado, em seguir práticas do capitalismo consciente e um modelo onde
  • 24. todas as partes podem colher o benefício de sua atividade, por que esta prática não é adotada por todas as empresas? Pelas expectativas racionais seria natural assumir que a prática de um capitalismo consciente seria rapidamente incorporada a todas as empresas do mercado, o que, como sabemos, não ocorreu, pelo menos não ocorreu ainda. Em uma abordagem otimista, podemos assumir que, dado o envelhecimento da população do mercado consumidor e uma nova geração mais consciente das externalidades negativas do capitalismo convencional, a pratica do capitalismo consciente se estenderá a todas as empresas do mercado ou, de outra forma, se estenderá a todas as empresas que sobreviverão. Em uma abordagem mais pessimista, a pressão por resultados de curto prazo, que chamamos acima de expectativas trimestrais, deve permitir que seja mais rentável para algumas empresas perseguir resultados de curto prazo, e não incorporar os interesses de todos os “stakeholders” na gestão do negócio. De minha parte prefiro a abordagem otimista, que o capitalismo continuará sendo a melhor ferramenta para melhoria da vida das pessoas e mola propulsora de enriquecimento de inovadores e empreendedores, porém passará por uma evolução, uma nova fase onde este enriquecimento não será à custa da sociedade como um todo, onde fazer lucro e a diferença seja não somente compatíveis como dependentes entre si.
  • 25. 10. Apêndice A – “Firms of Endearment” Abaixo a lista de companhias selecionadas como “Firms of Endearment” por Raj Sisodia, David Wolfe e Jag Sheth:  Companhias públicas Norte-Americanas 3M Adobe Systems Amazon.com Autodesk Boston Beer Company CarMax Chipotle Chubb Cognizant Colgate-Palmolive Costco FedEx Google Harley-Davidson IBM J.M. Smucker Marriott International MasterCard Worldwide Nordstrom Pamera Qualcomm Walt Disney Whole Foods Market  Companhias privadas Norte-Americanas Barry-Wehmiller Bom Appetit Management Co. Clif Bar Driscoll´s GSD&M Idea City Honest Tea IDEO Interstate Batteries Jordan´s Furniture L.L. Bean Method Millennium Oncology New Balance Patagonia prAna REI SAS Institute SC Johnson Stonyfield Yogurt TDIndustries The Container Store The Motley Fool Timberland TOMS Trader Joe´s Union Square Hospitality Group USAA Wegmans WL Gore  Companhias não Norte-Americanas BMW (Alemanha) Cipla (India) FabIndia (India) FEMSA (México) Gemalto (França) Honda (Japão) IKEA (Suécia) Inditex (Espanha) Mahindra & Mahindra (India) Marico (India) Novo Nordisk (Dinamarca) POSCO (Correia do Sul) TCS (India) Toyota (Japão) Unilever (Reino Unido)
  • 26. 11. Apêndice B – Índice de Sustentabilidade de Empresarial Abaixo a lista das trinta e quatro companhias que compõe atualmente o Índice de Sustentabilidade Empresarial: Banco do Brasil Bradesco BRF Braskem B2W Digital CCR SA CESP Cielo CEMIG CPFL Energia COPEL Duratex Ecorodovias Eletrobrás Eletropaulo Embraer Energias BR Even Fibria Fleury Itaú Unibanco Klabin S/A Lojas Americanas Light S/A Lojas Renner Natura Oi Santander Sul America Tractebel AES Tiete TIM Participações Telefonica Brasil WEG
  • 27. 12. Bibliografia "Creating Shared Value", by Michael E. Porter and Mark R. Kramer, Harvard Business Review, January-February 2011 issue “The Myth of Shareholders Capitalism”, by Loizos Heracleous and Luh Luh Lan, Harvard Business Review, April 2010 issue “The Age of Customer Capitalism”, by Roger L. Martin, Harvard Business Review, January-February 2010 issue “Time to Rethink Capitalism?”, Michael Yaziji, Harvard Business Review, November 2008 Wikipedia (https://pt.wikipedia.org), Capitalismo, Feudalismo e Cruzadas, Filantropia, Corporate Social Responsibility “O Mundo É Plano: uma Breve História do Século XXI”, Thomas Friedman, Abril 2005 “The Modern Corporation and Private Property”, Adolf Berle e Gardiner Means, 1932 “The End of Corporate Social Responsibility: Crisis and Critique”, Peter Fleming e Marc T. Jones, December 2012 “Strategy and Society: The Link Between Competitive Advantage and Corporate Social Responsibility”, Michael E. Porter e Mark R. Kramer, Harvard Business Review, Dezembro 2006 Conscious Capitalism with John Mackey Co-founder and Co-CEO of Whole Foods Market, https://www.youtube.com/watch?v=ZLcIziUvw5Q Conscious Capitalism – Creating a New Paradigm for Business, by John Mackey “Companies that Practice “Conscious Capitalism” Perform 10x Better”, by Tony Schwartz, Harvard Business Review, April 2013 issue “Firms of Endearment – How World-Class Companies Profit from Passion and Purpose”, Raj Sisodia, David Malfe e Jag Sheth, 2a. edição
  • 28. 13. Trabalhos Citados “Not All Profits Are Equal”, William F. Achtmeyer Center for Global Leadership, Chris Trimble “The Single Bottom Line”, Daniel Altman and Jonathan Berman, Stern School of Business, New York University “The end of capitalism has begun”, Paul Mason, The Guardian (http://www.theguardian.com/books/2015/jul/17/postcapitalism-end-of-capitalism- begun?CMP=share_btn_fb) “How Good We Can Be by Will Hutton review – not socialism, just better capitalism”, Peter Wilby, The Guardian (http://www.theguardian.com/books/2015/feb/19/how-good- we-can-be-review-will-hutton-stakeholder-capitalism) “The social responsibility of business is to increase profits”, Friedman, Milton - The New York Times Magazine (1970, September 13) “Corporate social responsibility and financial performance: correlation or misspecification?”, Abagail McWilliams e Donald Siegel, Strategic Management Journal, 06 de Abril de 2000 “Creating Shared Value: The One-Trick Pony Approach – a comment on Michael Porter and Mark Kramer”, Beschorner, Thomas (2013), Business Ethics Journal Review 17, no. 1, 106-112, p. 109 (http://businessethicsjournalreview.com/2013/09/08/beschorner-on- porter-kramer-on-creating-shared-value) Código Comum para a Comunidade Cafeeira (4C), http://www.criandovalorcompartilhado.com.br/docs/default-source/default-document- library/4c_code-of-conduct_illustratedguide_pt.pdf?sfvrsn=2 “An Inquiry into the Nature and Causes of the Wealth of Nations”, Adam Smith “A Whole New Mind”, Daniel Pink