Entrevista com Yeda Crusius sobre gestão das finanças públicas
1. ENTREVISTA COM YEDA CRUSIUS
Polibio – Nossa convidada de hoje é a ex-governadora Yeda Crusius. Ela, além de governadora do RS, foi
Ministra do Planejamento, foi Deputada Federal, foi Diretora da Faculdade de Ciências Econômicas da
UFRGS, ingressou pelo jornalismo também sendo comentarista da RBS e está, agora, passando por um
período sabático até as eleições do ano que vem. Nós convidados a ex-governadora Yeda Crusius na dupla
qualidade de professora de Ciências Econômicas, de ex-ministra do Planejamento e ex-governadora. Ela é
uma daquelas pessoas que têm muito a fornecer do assunto que vamos tratar hoje que é gestão das finanças
públicas. Quando nós apenas teorizamos sobre isso conversando com a professora tem um sentido, quando
nós conversamos com a pessoa que além de dominar teoricamente o assunto ainda teve que botar a mão na
massa, botou a mão na massa e executou aquilo que entende. Então, temos ai um assunto que pode ser
desenvolvido de uma forma muito mais compreensiva para todos, é o que nós vamos tentar fazer aqui. A
área de gestão de finanças públicas é muito árida, mas vamos tentar ficar nesse campo que tem tudo a ver
com a nossa vida, como vocês vão ver. Finanças públicas não é um bicho de sete cabeças como vocês vão
perceber agora também, durante essa nossa conversa. Vocês nem imaginam o significado dessa expressão
“gestão de finanças públicas” na nossa vida e no dia a dia. Nós vamos começar com um assunto do dia aqui
no RS. Aqui estamos assistindo, nesse momento, um episódio insólito que é um verdadeiro assalto sobre os
cofres públicos através desse garfeamento de 4,2 bilhões de reais em cima dos depósitos judiciais, para que
esse dinheiro saia daí, vá para o Caixa Único e lá seja esterilizado de acordo com a vontade do governador.
Nós vamos conversar com a governadora exatamente nesse ponto. Depois até explicando, na medida do
possível o que são os depósitos judiciais e o que é Caixa Único para que cada pessoa que está nos ouvindo
possa entender um pouco melhor. Vamos começar por esses 4,2 bilhões de dinheiro que foi sacado dos
depósitos judiciais do Estado e que foram colocados no Caixa Único, onde serão esterilizados. Essa
instituição depósitos judiciais, isso é constituído de que, como começou essa história aqui no RS e no
Brasil?
Yeda – E é por isso que essa matéria parece tão longe da população. Quando a gente fala em precatório, por
exemplo, todo mundo entende. Precatório é um direito que eu tenho como cidadão. O cidadão vai lá, faz
ajuizamento e ganha ação contra o governo, seja precatório de pensão, precatório de indenização. Enfim, o
governo me deve alguma coisa. Não tem como pagar e a gente faz um precatório. Se a gente fala em
precatório, a sociedade mais ou menos entende. O pensionista, viúva, a pessoa que está recebendo uma
indenização. Quando se fala em depósito judicial, ai fica longe da população, porque na verdade é um
contencioso que não encontrou solução na justiça ainda entre alguém que está dizendo para o governo que
não deve aquele imposto que o governo diz que deve. Mas para ele entrar com essa ação, normalmente
chama empresa, ele tem que depositar judicialmente uma parte, para não ser apenas um jogo de empurra. Eu
digo que não devo, você, governo, diz que eu devo e ninguém deposita nada em conta nenhuma. Não, eu
digo que eu quero discutir na justiça que não é certo você me cobrar esse imposto e eu deposito um pedaço
disso no Cartório Público, enquanto a ação não se completa. A soma dos depósitos judiciais, que é uma
maneira do cidadão que está reivindicando não pagar aquele imposto – ao contrário de precatório em que o
cidadão está querendo receber – é um volume inacreditável. Diariamente você tem milhares de casos em que
você quer discutir na justiça que você não deve aquilo que o governo está dizendo que você deve. O
depósito judicial é só isso: é uma conta na qual se busca exercer o direito de discutir que eu não tenho esse
imposto para pagar.
Polibio – A rigor, não é um dinheiro nem da justiça e nem do governo, é do cidadão que está ali colocando
em juízo.
Yeda – Se ele ganhar volta para ele. Se ele não ganhar, o governo já tem um pedaço do que ele deve. É uma
coisa muito inteligente em termos de fazer a justiça andar. Assim como precatório, que ninguém deposita
coisa nenhuma, você apenas tem uma coisa na justiça dizendo assim “eu te tirei essa terra, essa casa, para
2. construir uma estrada, coisas assim e te devo tanto. Devo, não nego, mas nãos ei quando vou pagar”.
Inclusive foi uma das mudanças que a gente fez em relação a precatórios, foi querer que uma parcela do
orçamento do Estado já fosse dedicada para que a justiça andasse e a gente eliminasse aqueles milhares,
milhares e milhares de casos de precatórios, como existe milhares de casos de reivindicações de “devo ou
não devo o imposto que o governo está me cobrando”. Este é um volume inacreditável. Quando nós
assumimos o governo, os depósitos judiciais estavam a zero. Ou seja, fizeram uma lei permitindo que o
governo sacasse, porque faltava dinheiro para pagar o cotidiano, 75% dos depósitos judiciais que demorava
para a justiça resolver aquelas questões. Depois parece que aumentou e agora, não apenas aumentou como o
governo atual raspou o cofre. Então, aquilo que não é do governo, passou a ser sacado para o cofre do
governo.
Polibio – Sem que o governo tenha a obrigação legal de devolver esse dinheiro pra lá?
Yeda – Alguém tem que levantar essa questão, porque esse dinheiro que está lá é de alguém. Não é possível
que o governo simplesmente saque 4 bilhões e 200 do volume de depósitos judiciais, coloque numa outra
conta que tem que ser transparente – no nosso tempo ela foi, nós começamos tendo que usar o Caixa Único
que é o dinheiro do Porto de Rio Grande, da CEEE, do imposto, vai tudo para um caixa só e a primeira coisa
que eu tenho que pagar é a folha de pagamento do servidor público. Eu pago com aquele Caixa Único, no
começo eu tive que usar com o propósito de não usar mais.
Polibio – Que ai Yeda nós já estamos em outro departamento. Do depósito judicial foi para o Caixa Único, e
o Caixa Único é isso que você está dizendo, é um balaio...
Yeda – balaio que o governo faz o que quer se não lhe cobrarem. É claro, eu sou uma economista, eu tinha
ideia de que a gente poderia consertar as contas do governo do Estado não para a receita ser igual à despesa,
não é esse o objetivo. O objetivo é que estava piorando a vida do gaúcho. Os indicadores sociais mostraram
que a educação estava piorando, a segurança estava piorando, estava tudo piorando. Se você não tem
autonomia para fazer a tua política de segurança pública, a tua política de saúde, sua política de educação, os
indicadores vão te mostrar, como estão mostrando agora, que estão piorando. Nosso objetivo era voltar a
melhorar a vida dos cidadãos e das cidadãs com dinheiro do governo no Estado, sem ir para Brasília.
Primeiro a gente usou um pouquinho do Caixa Único, mas decidimos não usar depósito judicial. A nossa
base é um pouco diferente dessa financista, que eles acham que a minha cara é cara de economista
financista, não, na verdade é o seguinte: existe a lei? Eu quero cumprir a lei! Eu quero fazer com que o RS
seja de novo o líder em fazer andar o Estado Democrático de Direito. Então, é de direito? Tem a lei? É de
depósito judicial? Precatório? Eu quero fazer com que o RS respeite as leis. Ao respeitar as leis, eu tenho
que ter um caixa para cumprir essas leis e foi, na verdade, o resultado foi ótimo porque a gente parou de usar
o Caixa Único logo, passou a usar recursos próprios. Aposentamos o pires, não tinha mais pires indo para
Brasília e voltando vazia, a gente de joelhos. E o depósito judicial dava segurança que se a justiça andasse
com mais celeridade, não faltaria dinheiro para pagar aquilo que deveria ser pago.
Polibio – Por que não deve usar o dinheiro do depósito judicial? Por que não deve usar o dinheiro do caixa
Único? Por que não deve andar de pires na mão? Ou, pelo menos, você não pode sacar do depósito judicial,
do Caixa Único e pegar pires na mão, além do que você não pode devolver. Por que isso tudo não deve ser
feito? Tem alguma coisa a ver com o futuro do Déficit Zero que aconteceu no seu governo?
Yeda – Também essa palavra de déficit parece muito longe das pessoas, mas as pessoas sabem que quando
elas gastam mais do que elas recebem, elas têm que pagar de alguma maneira. Se elas teimarem em gastar
mais do que recebem, fazer déficit – a palavra déficit é isso, hoje eu gastei mais do que arrecadei – ela vai
ter que tomar emprestado de alguém e isso vai fazer a dívida da pessoa e essa dívida é um contrato que ela
vai ter que pagar.
3. Polibio – A dívida em si não é má, desde que você tenha capacidade de pagá-la.
Yeda – Todo mundo tem que ter. Aliás, na sociedade americana, as pessoas respeitadas são aquelas que têm
dívidas.
Polibio – Mas que têm capacidade de pagamento.
Yeda – Não, e não vão além. Se forem além não vão ter como fazer a dívida, existem critérios. Eu, quando
busquei ser representante do RS no Parlamento no Congresso Nacional como Deputada Federal, eu quis
ajudar a fazer leis que mudassem a realidade de dizer “eu vou fazer essa dívida, não vou pagar mesmo”,
aquela ideia de o Brasil não ser sério, aquela ideia de ninguém acreditar em ninguém, “deixa eu passar na
tua frente primeiro”, aquela não seriedade com que se levava a relação de cidadania entre as pessoas. Umas
gastam, outras investem, uma empresta, outra toma emprestado. Um governo que, durante 40 anos, ficou
gastando mais do que recebia todos os anos – portanto registrava o déficit – cobria de alguma maneira.
Como cobria? Tinha muitas maneiras. A inflação é uma maneira de o governo cobrir, porque ele recebe o
imposto com inflação e ele paga, mais tarde, sem inflação, seus gastos não são indexados na inflação; mas
ele também pode tirar dos depósitos judiciais um pouquinho; tira do Caixa Único um pouquinho; toma
dinheiro emprestado nos bancos; ou, se você tem projetos públicos de monta, você tem que ter a confiança
do Banco Mundial, a confiança do Banco Interamericano, a confiança de uma Comissão Internacional que
vai te emprestar dinheiro que você sabe que terá a capacidade de pagar. Então, se você começa a sacar, você
está fazendo uma dívida para outro pagar. Do seu governo passa. Tome o que você puder, gaste o que não é
seu e o próximo que vem que conserte. Foi nossa obrigação fazer isso porque nós quisemos. Primeira coisa é
parar o déficit. Primeira regra, no primeiro dia 2 de janeiro de 2007, quando nós tomamos posse “só se gasta
o que se arrecada”.
Polibio – Esse é o princípio do equilíbrio.
Yeda – Esse é o princípio do equilíbrio diário. Se eu tenho hoje que gastar mais do que eu arrecadei hoje, eu
tenho de onde tirar. Daqui 30 dias, por exemplo, entram os impostos, te adianta um pouquinho isso. Isso é
uma regra nossa no dia a dia, você faz caderneta no armazém da esquina, o banco te dá um cartão de crédito,
enfim, você tem um jeito de ir fazendo suas finanças diárias. Ao final do teu ano, você não pode registrar um
déficit, no ano seguinte outro déficit, no ano seguinte outro déficit, porque alguém teve que te emprestar. O
depósito judicial é uma forma de tomar emprestado. Pela primeira vez na história se sacou do depósito
judicial e não se disse que vai devolver. Isso nunca aconteceu.
Polibio – E nem se disse onde vai ser aplicado isso.
Leandro – Acho que o nosso espectador tem que entender também qual é o conceito do Caixa Único. O que
seria o Caixa Único?
Yeda – É uma lei que foi criada para que todos os recursos que um governo receba das estatais, das
fundações, dos impostos, das taxas, vai tudo para uma conta bancária. E esta conta bancária – é
completamente diferente de sacar de depósito judicial – aquele dinheiro é do governo, ai ele vai gerenciando
isso dia a dia, um dia tem mais, outro menos, ele vai gerenciando. Saca um pouquinho, nem sabe se é da
CEEE, se é do Porto de Rio Grande. De repente, quando começa a fazer do Caixa Único, mais o depósito
judicial, a sua forma de pagar todos os dias, você ficou devendo à CEEE para ela investir, você ficou
devendo ao Porto de Rio Grande para ele investir, ficou devendo para a Fepam para ela fazer proteção
ambiental. Então, o saque ao Caixa Único deveria ser uma coisa só para o cotidiano, pontual, mas passou a
ser uma fonte de recursos para o governo estadual pagar, inclusive, a folha. O Caixa Único é uma conta
bancária, que algum dia você vai ter que devolver, se ele quiser que a CEEE invista, se o Porto de Rio
Grande invista, a Fepam invista e que você pegue os impostos para pagar a folha de pagamento e não fique
4. dando aumentos e benefícios sem saber de onde vai sacar, se não do Caixa Único, e agora um Caixa Único
“inovador”, porque ele é negativo, é um retrocesso. É colocar 4 bi e 200 no caixa Único dos depósitos
judiciais. O chamado Caixa Único é o teu gerenciamento, ponto final, mas você fica devendo se você não
repuser tudo que era dali. Eu, por exemplo, o Irga passou a ser superarbitrário. Teve uma política de arroz no
nosso governo desde irrigação e tudo. Além de deixar de tirar recursos dessas entidades, passei a pagar a
folha de pagamento com impostos. Na verdade, nós fizemos um planejamento muito claro, gestando os
investimentos dessas empresas. De repente você começou a ver o governo do Estado investir, mas não é
porque pediu dinheiro emprestado, é porque não se tirou mais do Irga, não se tirou mais do Porto, não se
tirou mais da CEEE. Esse saneamento das finanças é de todo necessário se você quiser usar o dinheiro
público para suas finalidades e não para parar no meio. Então, na sua pergunta Polibio e na sua Leandro, o
Caixa Único é simplesmente uma conta bancária, mas ele não pode ser fonte de financiamento permanente,
porque isso elimina a capacidade do Estado de investir com seus recursos próprios, que é o recurso de todas
essas entidades.
Polibio – Vamos passar para uma coisa mais amena. Eu sei que o assunto é difícil, mas a gente está tentando
trazer isso para o chão.
Yeda – Antes de você chegar ao intervalo, eu queria te dizer que a vida das pessoas está piorando, esse é um
assunto que as pessoas devem tentar entender.
Leandro – Inclusive hoje, aqui na frente do prédio, houve um assalto, a gente está sem polícia por exemplo.
Yeda – Eles estão ganhando hora extra para ficar no quartel.
Stormer – O importante é justamente a gente conversar em como isso implica na vida da gente. Sabemos
que existe um atraso na repercussão desse saneamento financeiro e da destruição da indústria financeira. Se
o governo na bola, vão aparecer os problemas só daqui a um ano, uns 9 meses, talvez até mais. Como esse
atraso aparece na vida da gente? Quais as dificuldades que tendem a aparecer daqui para frente e como a
gente pode tentar recuperar isso?
Polibio – Por que é importante, governadora, fazer boa gestão pública? Esses dias mesmo eu estava vendo
um governante do RS, não era o Governador Tarso Genro, acho que era o Secretário da Fazenda, que dizia
assim “aqueles 4 bilhões e 200 milhões está lá parado mesmo, não tem utilidade nenhuma, vamos gastar”,
como se não tivesse obrigação de devolver aquilo. Foi bem assim que eu ouvi e fiquei perplexo. O
Secretário da Fazenda dizer uma barbaridade dessas, mas ele disse isso. Então, para a pessoa comum, para
quem está nos vendo, porque é importante gerir bem as finanças públicas? Seria a mesma coisa que gerir
bem as suas próprias contas dentro de casa? Ou não?
Yeda – Mais do que isso, para que o ambiente dentro da sua casa, ele te permita fazer outras coisas para não
se preocupar se você vai ter o pão. É você conviver, é você educar, é você ter outras funções de convivência
dentro de casa que não a da sobrevivência. Então, por que a gestão das finanças públicas é fundamental?
Vamos começar assim: você tem gastos de um lado e tem receitas de outro, você tem que buscar receitas
sem prejudicar, sem fazer o custo RS ser exagerado sobre o comércio, sobre os serviços, sobre a indústria.
Mas, ao mesmo tempo, onde você gasta? Para que existe o governo? Para dar bolsa. Para que existe o
governo? Para dar cargo de confiança para seus apaniguados. Ou o seu governo é para fazer segurança
pública, o seu governo é para fazer saúde, o seu governo é para fazer infraestrutura. Então, para que você é
governo? Para se perpetuar no poder? Sim, parece que essa é a fase atual. A fase atual é de que maneira eu
gasto o que eu tenho e ir além do que eu tenho – pegando os depósitos judiciais, pegando caixa único – para
ficar distribuindo entre os meus apaniguados, entre os meus amigos, aqueles que depois vão votar em mim
outra vez. O que foi a gestão das contas públicas? Foi dar qualidade às despesas para gerar segurança,
educação e saúde. E buscar a receita, nós fizemos o Simples Gaúcho que foi um incentivo à pequena e
5. média empresa, nós pagamos os nossos fornecedores. A primeira coisa que nós fizemos foi cortar 30% dos
cargos de confiança, que era uma atividade meio. Incentivar os funcionários públicos com menos cargos de
confiança a se orgulharem de fazer o que queriam fazer. A primeira coisa que o governo atual fez foi voltar
aos cargos de confiança e triplicar o seu valor. Então, pronto, você fica devendo para o governante. Ele
botou um dinheirinho no seu bolso. Agora, quando você vai ver o índice de segurança pública, índice de
latrocínio, índice de roubo de automóvel, quando você vai ver o nível de educação baixou, as coisas de
saúde estão sob xeque, a infraestrutura é o Custo RS mais alto entre 8 Estados do Brasil. Se você faz gestão
das suas finanças, para fazer as políticas de finalidade. O que eu quero, aqui, afirmar é que todos os anos se
faz uma pesquisa de avaliação dos cidadãos e cidadãs sobre 18 ou 20 políticas públicas. Eu quero dizer que
no último ano todas tiveram um imenso retorno em termos de melhoria na percepção do usuário do serviço
público estadual. Então, se esse era o objetivo, nós conseguíamos e é por isso que eu dormia tranquila.
Porque tinha um projeto de fazer gestão de finanças públicas para gerar infraestrutura, segurança, saúde,
educação. Quando você não tem essa disciplina, eu fui ser deputada para fazer a Lei de Responsabilidade
Fiscal, que é uma disciplina que te impede de ir para o buraco. Não te deixa ir além. Nós cumpríamos a Lei
de Responsabilidade Fiscal, quando nós deixamos o governo...
Polibio – Está faltando um pouco de responsabilidade estadual, fiscal e estadual.
Yeda – Não, mas nós cumpríamos, tanto é que nós conseguimos de novo ter acesso a empréstimos
internacionais. Eles estavam vedados a nós porque não tínhamos disciplina. Agora não sei o que vão fazer,
mas me parece que não vai dar boa coisa com o que está sendo feito ai. Por que o cidadão não percebe isso?
Stormer - Por que o cidadão não percebe isso? Essa é a pergunta que eu queria do bloco anterior.
Yeda – Ele percebe que está melhorando a segurança. Ele quer um dinheirinho no bolso. Isso, para a grande
massa das pessoas, ele sabe o que ele vai fazer com aquele dinheirinho, se ele tiver, a vida dele pode
melhorar, mas a vida do coletivo piora. O coletivo são esses indicadores que eu estou dizendo das políticas
públicas.
Polibio – Vamos dar uma olhada nas perguntas que temos.
Leandro – O Guilherme lá de SC coloca “governadora, o que você acha sobre as privatizações? Onde o
governo estadual teria uma possibilidade de atuar – por exemplo, bancos, portos. Aqui em SC temos o
exemplo do Badessi e portos privados como o porto Navi. Abraços”.
Stormer – Deixa eu pegar esse gancho e pegar, por exemplo, privatização de presídios. Eu me lembro que
estava praticamente alinhada a ideia, tinha-se conseguido, inclusive, presídios que iam resolver em grande
parte a situação do presídio Central que, na minha opinião, é algo absolutamente desumano. Estava tudo
alinhado para se resolver isso e de uma forma rápida e séria, com empresas privadas entrando e se desfez.
Leandro – Só uma última pergunta, para aproveitar, que é uma coisa muito interessante para o nosso
público que vive na atmosfera de bolsa, um comentário sobre o que aconteceu com o Banrisul, por exemplo,
que é um case de sucesso mundial e não foi necessariamente uma privatização.
Yeda – Aliás, eu apanhei muito porque não privatizei o Banrisul. Tinha gente interessada em comprar.
Poderosos interessados, que queriam que eu privatizasse o Banrisul.
Polibio – O presidente do Banco do Brasil ofereceu, ele queria comprar.
Yeda – Na primeira visita à Brasília, em janeiro ou fevereiro de 2007, sentamos lá na mesa e ele, enquanto
mostrava uns vídeos do Banco do Brasil, de repente ele acordou e “governadora, eu quero o seguinte:
comprar o Banrisul”. O meu pessoal todo, vocês vão ver a cena, botou a cabeça para frente, todos me
6. olharam. Como? Vender o Banrisul? Tem gente querendo comprar? Eu disse, “presidente, ele não está à
venda, porque, na verdade, ele é a alforria do RS”. Ele não entendeu.
Polibio – Agora, se tivesse vendido, o PT não seria contra né?
Yeda – Seria sim.
Polibio – O presidente do banco do Brasil é do PT também.
Yeda – Quando se deu isso ai, nós já sabíamos que nós iríamos tentar ampliar o capital próprio do Banrisul.
Só tinha o Banrisul de Banco Estadual, lá pelas decisões do passado, não interessa. Como eu sabia que não
iam me tratar muito bem em Brasília, uma governadora do PSDB, não iam me tratar muito bem, queria
garrotear para a gente poder ajoelhar e ter que rezar.
Polibio – Mas isso não é muito republicano.
Yeda – E eles lá são da República Democrática de Direito? Ah! Eu queria ampliar o capital do Banrisul para
o Banrisul ficar com a parte dele e o dono do Banrisul – que é o governo do estado – ganhar um caixa extra
que me fizesse aposentar o pires. Foi ai que eu aposentei o pires. Foi porque entraram 1 bilhão de reais para
os cofres do banco, para os cofres do governo do estado e eu, com a Assembleia, decidimos o que a gente
iria colocar: num fundo de Previdência, que era para mudar a Previdência – e ela mudou e vai mudar – e de
outra parte saber o que o governo do estado precisava investir e que não ia conseguir. Primeiro lugar porque
não podia tomar emprestado, estava fora do mercado e em segundo lugar porque o governo não ia me dar.
Ele não deu nem 10 milhões para acabar aqui com a nossa entrada de Porto Alegre, com a Baltazar. O Lula
veio aqui e disse “Yeda, eu vou te dar o que você precisa”, mas não deu um pila. Agora, eu fiz. Adiantei um
dinheiro aqui, outro ali, acabei a Baltazar. Assim como eu fiz a estrada que, entrando no Pórtico do RS, você
tem uma nova espinha dorsal, que é a RS-471, que te evita de vir pela única ponte que tem sobre o Guaíba
que era para poder voltar ao Porto de Rio Grande. Hoje você não precisa, com dinheiro do governo do
estado. Só para responder o Guilherme: a privatização é uma coisa necessária para determinados setores.
Para outros, eu não abdico da política de segurança pública. Então, foi uma parceria Público Privada,
construía lá em Canoas num lugar vago, que era um dos índices de homicídios mai alto do Brasil, no bairro
de Guajuviras, se não fosse o mais alto do Brasil pela população, a iniciativa privada construiria e
administraria o cotidiano, mas eu estaria lá dentro. Ministério Público, Defensoria, tal e tal. Então, não é
entregar a segurança, não, é você seguir uma política de segurança pública com administração privada.
Então, muito nós fizemos em termos de parcerias Público Provadas. Em 4 anos não deu para completar. É
uma pena, mas nós não temos a segunda ponte do Guaíba, nós não temos sistema prisional medieval. A não
aceitação das parcerias Público Privadas foi uma questão ideológica pelo Partido dos Trabalhadores aqui,
que impediu que a gente pudesse dar o grande salto em estradas, em sistema prisional e vários outros setores
onde a gente deixou pronto para fazer.
Polibio – Vamos saber se a governadora recomenda ou não comprar ações do Banrisul.
Yeda – Hoje em dia, ou a pessoa aplica escolhendo qual é a empresa que vai aplicar, ou ela aplica num
fundo que vai mostrando que tem bons resultados. Um fundo com mais risco, com menos risco e o Banrisul
está dentro das carteiras dos fundos. Claro que no meu tempo, eu diria e ninguém acreditaria “compra logo,
porque vai ser um fenômeno” e foi um fenômeno.
Polibio – Agora você recomendaria, com base nos estudos?
Stormer – O papel tem um preço alto.
7. Leandro – Eu acho que a pergunta é a seguinte, a gente tem hoje uma influência muito grande do governo,
não só através das suas próprias estatais gigantescas, como a Petrobrás que tem um peso gigantesco na
Bolsa, mas através da regulamentação que está indo atrás de todos os setores e está sufocando a economia,
nós temos ai uma bolsa brasileira que nos últimos 12 meses está em último lugar no mundo, em
rentabilidade. Acho que esse case do Banrisul pode ser um exemplo. Como um ente público, como um
governo poderia realmente atrair investimentos e fazer com que as empresas possam produzir e gerar um
resultado e não serem sufocadas pela regulamentação? Qual é o ponto ótimo? A gente sabe que um mundo
totalmente sem regulamentação é muito complexo também, mas por outro lado, já deveria estar na lata de
lixo da história a ideia de um governo que centraliza todas as decisões, especialmente as decisões
econômicas. Qual, na sua visão, é o ponto ótimo?
Polibio – Eu tenho dois amigos que são do PT, que me disseram o seguinte: “olha, a governadora conseguiu
fazer aquele IPO no Banrisul, de mais de 1 bilhão, porque teve sorte.
Stormer – Tu tens dois amigos do PT?
Polibio – Dois.
Stormer – Eu sempre digo assim: para mim, existe somente dois tipos de petista: o ingênuo ou o conivente.
O cara tem que escolher, ou ele é ingênuo, ou é conivente.
Polibio – Um dos meus amigos é ingênuo o outro é conivente.
Yeda – Eles cunham determinadas frases que passam a ser repetidas. Por exemplo, “ah, ela é uma técnica,
não é uma política”. Ora, se eu não tivesse feito política, eu não teria, de jeito nenhum, conseguido os
resultados, porque tudo o que um governo faz, ele tem que estar consultando o judiciário, consultando o
legislativo e consultando a população. Isso é fazer política. Assim como a frase “ela teve sorte”. Ora,
ninguém tem sorte se não inicia um processo em que sabe qual é a possibilidade dele gerar o resultado. Foi o
último IPO até a crise de 2008. Sorte que ele diz é que depois o mundo perturbou o governo federal do PT
que queria crescer 300% ao ano e não conseguiu. Então, não há sorte nesse jogo. A gente precisa que não
cortem para responder tua pergunta, que não cortem o processo pela metade por um fato do acaso.
Aconteceu, de repente quebrou a Argentina e foi aquele vendaval no Brasil. Quebrou a Rússia, foi aquele
vendaval no Brasil. Mesmo assim o real continuou, com todas as crises mundiais, ano após ano, o real
continua sendo feito porque ele estava baseado em regras, estava baseado em reformas, em leis aprovadas
pelo Congresso Nacional e que foram multiplicadas pelos estados e municípios. Primeira coisa: o
investimento vem se existe confiança de que o contrato em que eu estou trabalhando e que demora – para
fazer um contrato demora, você tem que conversar estabelecer as regras e tachas e tudo mais, que ele vai ser
cumprido. O governo do estado chama investimento como nós chamamos o plástico verde, nós ganhamos na
disputa investimentos, porque passaram a confiar. Eu tinha chancela, por exemplo, não apenas do IPO do
Banrisul, com quem eu não me metia, ele tinha que ter uma gestão própria, mas a partir do aval do Banco
Mundial para a gente reestruturar a dívida acumulada que foi sendo feita...
Polibio – Até ali nunca tinha sido feito.
Yeda – Não tinha, os bancos tinham se afastado, os bancos de fomento, de desenvolvimento do sistema
mundial tinham se afastado porque a gente não conseguia cumprir os contratos – no tempo do Rigotto – ou
não queria cumprir os contratos – no tempo do Olívio. Um não queria e o outro não conseguia.
Polibio – Eu me lembro de uma ocasião que tive no Banco Mundial inclusive e, conversando com os
técnicos do Banco Mundial lá, eu acompanhava o governador da época e eles debochavam da gente. Diziam
assim “vocês são lá do RS, da C3E”, em vez de CEEE que são 3 “e”, eles chamam de C3E e davam risada,
8. porque “vocês não cumprem o que combinam, estão sempre chorando, estão sempre de pires na mão, vocês
perderam a autoconfiança no RS, nem venham para cá porque não vão levar nada”.
Yeda – Mas em 4 anos mudou Polibio, como a gente conseguiu fazer isso? A gente foi trabalhando
contratos e de repente eles viram que eram para ser cumpridos, que tinha todas as condições para cumprir.
Condições legais dentro da Assembleia, condições legais que a gente conseguiu o aval do Senado. Quando o
Banco Mundial nos deu 1 bilhão e 100 milhões de dólares que nunca chegaram ao RS porque é contábil, que
era para transformar um dívida de 7 anos e meio de uma taxa de juros fabulosa, impossível de pagar, numa
dívida de 30 anos com uma taxa de juros mínima. Nós trocamos papéis, 1 bilhão e 100 milhões de dólares e
pronto, não se fala mais nessa dívida que estava sufocando o RS. Nós reestruturamos a dívida, com o aval do
Banco Mundial, que foi um aval que nunca havia sido dado no mundo um empréstimo desta natureza e deste
volume. Nós fizemos uma conexão para eles nos dizerem que a unanimidade do Bord do Banco Mundial
havia concordado e haviam nos felicitado, porque o contrato era: instala-se a transparência, não se deixa
déficit. Ou seja, o contrato que nós fizemos, nós já estávamos cumprindo, era só uma questão de ter
continuidade. Nós criamos um ambiente tal que investimentos muito altos vieram para nós e muita gente
quis fazer conosco a parceria Público Privada. Nós pagaríamos o sistema de 5 presídios, com o Distrito
Industrial dando emprego, com educação, com tudo mais. Então, você chama se você criar um ambiente de
confiança. Por que a bolsa está sendo uma das últimas? Por várias questões, as estatais estão sendo usadas,
você está piorando a situação produtiva e financeira das estatais, você não fala a verdade, diz que vai fazer e
não faz, você maquia números.
Stormer – Contratos rasgados.
Leandro – No setor elétrico, a intervenção.
Yeda – A intervenção no setor elétrico, todos os portos é uma “estatização”. Então, são coisas que estão
sendo prometidas para não serem cumpridas e é isso que tem trazido o investimento no Brasil para trás, é
por isso que dá o pibinho. Você não tem a confiança de ir, como o Stormer disse, quando disseram que ia a
Ford para Guaíba, começou a haver registro de microempresa de área em um volume extraordinário. Isso é
uma regra keynesiana, o Keyne sempre dizia: “quando o empresário decide que vai investir só a decisão dele
já motiva a economia a ir para frente”. Quando a gente cria a condição de que vai cumprir, não está vindo
muito investimento com base na confiança de que será cumprido alguma coisa.
Leandro – O Simon tem uma pergunta interessante: “gostaria de conhecer a opinião da governadora com
relação à dicotomia do governante hoje diante da obrigação da gestão correta da coisa pública, frente à
necessidade cada vez maior de dependência, de confrontar políticas artísticas do marketing – eventualmente
da mentira – como não enganar o povo com coragem de anunciar eventuais más notícias e sobreviver
politicamente?”.
Yeda – Quando eles dizem assim “ah, ela teve sorte”, não! A gente tinha um projeto baseado em Estado
Democrático de Direito, conhecimento na economia e firmeza na tomada de decisões. Tanto é que depois
alguém cunhou coragem para fazer, a gente fez, a gente fez aquilo que programou. Abotoadinho tudo isso,
não existe sorte. Não seriam feitas as coisas que foram feitas se elas não tivessem sido preparadas,
programadas, e daí por diante. Nós nunca dissemos, então deu um problema na segurança pública “ah, nós
vamos construir 5 presídios”, tem 2 anos e meio e não construíram coisa nenhuma. “Nós vamos fazer isso,
nós vamos fazer aquilo” e acalma um pouquinho a consciência das pessoas e a mídia vem e repete. Isso é
marketing. Então, como você contrapõe, como o governante que quer governar corretamente contrapõe isso?
Por exemplo, você vai no cafezinho, você toma ônibus, toma lotação, você vai encontrar lá dentro um monte
de gente que vive de cargo de confiança. Ou a própria pessoa, algum familiar, esses não falam mal do
governo. Você passa a não saber mais o que está acontecendo se as tuas despesas foram baseadas um
9. pouquinho na compra das consciências. Um pouquinho no dinheirinho no bolso de cada um, que daqui a
pouco acaba. Entre você fazer o marketing do que você vai fazer e você fazer, você tem um custo político
muito alto, porque nós decidimos fazer e as pessoas não perceberam o que estava sendo feito porque a gente
não prometia que ia fazer. Só para dar uma ideia – caiu a ponte em Agudo, com aquela pavorosa, morreu
gente, em 2010, janeiro e nós dissemos “vamos fazer uma ponte em 10 meses”, todo mundo “ah, ah, ah, não
acredito porque a última ponte foi feita em 10 anos”. Ai, nós entregamos a ponte em 10 meses e ai “ah,
aham, uma ponte em 10 meses” como se fosse fácil. Então, eu não tive sorte em fazer a ponte, nós criamos
as condições de fazê-la e demos de novo trânsito à região central do RS para todos os lados. Quando um
empresário vê isso, ele bota o RS no radar, “se eu tiver que investir, quem sabe não seja bom investir no
RS”. Cumpre-se prazo, cumpre-se o valor, os ambientes de contrato estão prontos para irmos e investir. Ai
diziam “mas ela não faz marketing”, não gente, a gente faz, nós fazemos o marketing também, só que não
interessa o marketing que estão fazendo de vender ilusão.
Polibio – Eu quero aproveitar um pouco a experiência que teve a governadora Yeda Crusius, que passou
uma parte das últimas duas semanas na Europa, voltou de lá na sexta-feira. Claro que entre as viagens que
fez pela Itália, deve ter acompanhado também os noticiários e jornais da Europa e percebido, ou não, o nível
de gravidade das questões relacionadas com a economia deste país, que estão sendo abaladas sobretudo
sobre a má gestão de suas finanças públicas. Isso tudo tem um reflexo extraordinário aqui no Brasil e pode
ter um reflexo muito maior ainda. Estamos enfrentando problemas na economia brasileira com um pibinho
este ano, novamente, ano passado cresceu 0,9 e esse ano está crescendo 1,05 no primeiro trimestre,
comparado ao trimestre do ano passado. Se esse PIB chegar a 3% esse ano será muita coisa. A inflação não
desembestou, mas está bem além do centro da meta. Por outro lado temos esse cenário externo que não é um
cenário muito favorável. Não sei o que a governadora sobre o que viu na Europa nestes últimos 15 dias, se
deu para acompanhar o noticiário também, sobre o que está acontecendo ali.
Yeda – A viagem que eu fiz foi uma viagem de rua. Ou seja, 9h da manhã eu estava na rua, 9h da noite,
exausta, estava de volta. Conversando com as pessoas você sabe como está repercutindo, o que está
acontecendo. Olha, eu peguei a morte do Andreotti, eu peguei a decisão de montarem o governo Berlusconi,
da direito do tipo Berlusconi com a esquerda do tipo do presidente napolitano. Na hora em que eles estavam
fazendo o julgamento de seus 17 ministros da Itália, nós temos 39. 17 já dá uma despesa grande, imagine 39.
E ai o rapaz lá na frente deu um tiro e acertou o ... Na verdade, as estatísticas contínuas do mercado
financeiro, é a maior recessão em prolongada da Europa.
Polibio – Recessão = crescimento abaixo de 0. Alta taxa de desemprego.
Yeda – Muito, principalmente entre jovens, imigrantes, alguns já voltando, muitos brasileiros já voltando. O
que está acontecendo na Europa? Deflagrou a crise em 2008 e ai se instalou uma recessão com desemprego
na Europa. Mas até 2008, os investimentos na Europa, em infraestrutura, investimento em saúde, benefícios
sociais, eles eram muito altos. O nível de qualidade de vida na Europa é excepcional. Ninguém quer perder o
Euro. Ninguém quer perder a União Europeia. Você tem segurança, infraestrutura, tem tudo andando direito
ali. O que foi feito é que foi sacado, naquele período de 2008, contra o futuro e o futuro não aconteceu. Ou
seja, a Europa não continuou crescendo porque os EUA não continuaram crescendo, porque a China está
dando um suave pouso – está crescendo enormemente, mas está em suave pouso. O que acontece na Europa
é que não há saída para ela, sozinha, a não ser com uma nova descoberta tecnológica, não existe, você já está
na área da tecnologia da informação. Não há saída para a Europa enquanto não houver uma saída que será
trabalhada no mundo inteiro. A queda da Europa não é tão grande quanto a queda da rabeira brasileira. A
rabeira do Bric, da América Latina, que é o nível de educação... O que nós perdemos com isso? Nós estamos
em 2013, a crise foi em 2008. O que nós perdemos de lá até aqui? Nós estamos teimando em usar o
orçamento público federal não para gerar resultados e sim para perpetuar o governo. É o caso específico dos
gastos de custeio. Os investimentos não se completam, não há confiança, os custos são enormes. Enquanto
10. isso você está gastando criando todo tipo de bolsa que faz com que a correria que nós vimos no banco, ou
nos bancos, durante esta semana, essas pessoas não querem perder aquele dinheirinho, porque quem está
trabalhando e passando fome não foi correndo para o banco. O acompanhamento que eu fiz: primeiro – não
querem perder os ganhos que o euro e a União Europeia trouxe, em respeito mútuo...
Polibio – Mas vão perder.
Yeda – Não. O que não estão conseguindo é emprego. Não estão conseguindo crescer, mas eles não querem
vir para trás, perder benefícios sociais, a infraestrutura está lá. Mesmo assim ainda existem modificações em
aeroportos e tudo mais. A dinâmica mundial sofreu muito com a crise de 2008, que o Brasil nem tá porque a
indústria automobilística estourou aqui, enquanto a crise começou com os papeis e a indústria
automobilística lá, o Obama em plena campanha eleitoral bancou, tirou dinheiro do Tesouro para a indústria
automobilística não refrear e virar uma recessão muito forte. Eu nota que, tanto no ano passado quando eu
fui para a Espanha, fazer o mesmo tipo de acompanhamento das eleições espanholas, e cheguei lá no dia 17
de maio, entrei pela Porta do Sol em Madri, eu olhei e disse “o MST veio para cá?”. Estavam todos
acampados na Porta do Sol. O que aconteceu aqui? O movimento M16, que era o M de 16 de maio. São
jovens e outros tipos de grupos dizendo que a política tem que mudar. Ai você vai para a Itália e o
Berlusconi continua mandando e ele tem o império das televisões que modelam a forma de pensar, mas ali
tem tradição oral. Você vai para o cafezinho, vai para o restaurante, vai para o transporte coletivo, estão
falando em política, mas muito menos do que nós. Eles estão falando em como melhorar, como sobreviver,
muito menos fazer política como nós porque não vivem nesse sistema de bolsas. O que eu nota dessa minha
experiência é que eles resolveram não fazer eleição, juntaram a esquerda com a direita e montaram um
gabinete de 17 ministros, nos quais não estão acreditando muito. A primeira negra que tomou posse na Itália
tomou posse agora, na política dos Direitos Humanos. As discussões que se faz pela televisão são discussões
muito proveitosas. Então, a política continua meio separada da questão econômica. E quem realmente banca
a questão econômica é quem não deixou a indústria vir para trás que é a Alemanha.
Leandro – Eu teria uma questão que acho bem importante para o nosso espectador, qual seria a perspectiva
de futuro para o Brasil, tanto no contexto econômico, quanto no político? Eu vejo dessa forma: nós
passamos por uma fase onde foram feitas várias reformas, desde a época do Itamar. Depois nós tivemos a
gestão Lula que surfou uma onda bem interessante do ponto de vista global, talvez o melhor cenário
econômico dos últimos 100 anos, com a casa arrumada, digamos assim. Só que a partir disso nós não
tivemos nenhuma mudança verdadeira, nenhuma reforma profunda que aumente a eficiência do país, não
tivemos nada muito profundo e a gente está pagando um preço por isso. E agora nós temos uma situação de
um certo centralismo político e econômico, com uma inflação em alta, com a bolsa já patinando, onde a
gente precisa de uma nova perspectiva. Por outro lado temos um governo com alta popularidade e não se vê
no futuro, pelo menos, uma perspectiva de mudança. Então, qual seria a expectativa econômica e política em
relação a esse cenário atual, para o futuro? A grande pergunta que o investidor faz é: a inflação vai seguir
em alta? Nós vamos ter uma política de controle da inflação ou não? Nós vamos ter o livre mercado, ou o
mercado sendo melhor tratado ou não? Aparentemente, a Dilma está tratando mal o mercado.
Stormer – Acho que tem mais uma pergunta que o espectador deve querer saber: eles agora cunharam esse
termo de capitalismo de Estado, coisa linda, eles decidiram chamar socialismo de capitalismo de Estado,
mas tudo bem; esse capitalismo de Estado em que o governo está cada vez mais presente em todas as
empresas, literalmente interferindo na gestão dessas empresas, isso vai continuar acontecendo ou se
expandindo e até que ponto isso é benéfico ou ruim para nossa economia.
Yeda – Eu tenho saudade dos tempos em que a gente trabalhava com os alunos os cenários. Cenário é o que
você está dizendo: você tem um palco de ação, você tem um limite, tem todo um mobiliário e você tem
atores. Com esses atores, não tem valor a coisa do controle da inflação. Não é bem visto, as metas não é um
11. sistema bem visto. Meta de câmbio, meta de inflação, meta de juro, vai se levando. E ao ir levando você,
logo, logo, vê o custo e o custo é pibinho com a inflação. O resultado de não ter disciplina, de você não
respeitar o cenário que diga “olha, eu quero crescer direito, com melhoria da qualidade de vida das pessoas
no coletivo”, o resultado é esse que está ai. Você vai ter o crescimento da inflação, que é o crescimento da
desconfiança e você não vai ter investimento suficiente para gerar crescimento continuável e sustentável.
Nós estamos vivendo hoje o resultado do cenário da mudança de governo Lula para a Dilma. A Dilma desde
o começo, assim, “um pouquinho de inflação não tem importância e é só distribuir dinheiro que o país
cresce”. Está provado que não. Nós acabamos de provar outra vez que não. Dentro da sua pergunta sobre os
cenários futuros, com esses atores e esse palco, é só agravamento. Só que você ainda tem cofre para pegar.
A mesma coisa está acontecendo com o governo do Estado, ele tem um finito cofre para gastar. Se a tua
meta é a eleição do ano que vem para governo do estado, você tem como distribuir fartamente recursos ai
que não são do governo e que em algum dia terá que se pagar.
Polibio – Além de ter que pagar, não vai ter mais de onde sacar também porque isso é finito, você acabou de
dizer.
Yeda- Gente, é finito, mas tem muitos bilhões. Quais são os cenários para o futuro? Se são esses os atores, o
palco, se é esse o roteiro, se é essa peça que se está representando, é só continuidade do que está ai. A queda
da confiança não é contraposta pela bolsa empresário, porque existe uma bolsa empresário muito alta sendo
distribuída Brasil a fora.
Leandro – Repasses do Tesouro para o BNDES que escolhe os amigos do rei.
Yeda – Então, apenas, o quanto tempo você vai conseguir segurar isso até a eleição? Eu acho que a riqueza
é suficiente para isso... por exemplo, eu fui fazer o caminho do Maquiavel, não por ser uma Maquiavel, mas
o que foi aquele período aonde se transformou o Império a degola no que a gente conhece hoje de República
e Democracia. Tem até uma frase do Dante e outra do Maquiavel que eu quero citar, porque vai ser um Best
seller este livro do Dan Brown “Inferno”, que é o inferno do Dante. Ele cunhou uma frase do Dante que diz
assim “ninguém é mais merecedor do inferno do que aqueles que se calam diante de uma crise moral”. Essa
é a frase que o Dan Brown tirou do Dante. Então, você precisa de oposição. E você precisa de uma oposição
que seja entendida por uma parte dos empresários que não querem viver de bolsa, por uma parte da
população que não quer viver de bolsa. Para isso existe a preparação para as eleições, é a mudança do
cenário. A mudança do cenário é uma mudança mais completa, você tem um outro roteiro, outra peça que
você quer apresentar e vai pedir o apoio. Na verdade, o cenário como ele está, não tem como mudar. Só tem
como mudar se todas as forças livres se puserem de maneira a serem majoritárias na eleição de 2014.
Polibio – É até um pouco desanimador, mas é a verdade.