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ENTREVISTA COM GUSTAVO GRISA
Polibio – Este é o programa Cenários, nós vamos ouvir esta semana o economista e diretor da Agência
Futuro, Gustavo Grisa. Nós vamos conversar sobre cidades, as grandes e pequenas cidades. Elas são
protagonistas das mudanças que estão acontecendo no mundo, inclusive aqui no Brasil e aqui no RS. Nós
vamos conversar sobre isso, quais são os impasses, as alternativas, o que está acontecendo com as nossas
cidades. Claro que nós vamos dar mais ênfase à questão da Região Metropolitana de Porto Alegre, mas o
Gustavo Grisa tem trabalhado em outras cidades também como Canoas, São Leopoldo. Passa o tempo todo
viajando para todo país, enfim, tem uma experiência muito rica que pode nos transmitir. Começamos pela
Região metropolitana de Porto Alegre. Vamos situar primeiro o nosso espectador sobre o que é uma região
metropolitana e no que consiste a nossa.
Grisa – Hoje, o movimento mundial do ano nas cidades lideram as mudanças de desenvolvimento.
Praticamente todas as novas soluções em termos de desenvolvimento, de estratégias, elas acontecem a partir
de cidades e de regiões. Por exemplo, na questão toda de reestruturação financeira, de estratégia de mudança
de posicionamento. Você tem hoje cidades e regiões que em 10 ou 20 anos mudam totalmente de posição
dentro do mundo, em imagem dentro do mundo. Por exemplo na Colômbia, Bogotá e Medellim que há 20
anos eram considerados lugares caóticos, mais perigosos do mundo, hoje são exemplos de soluções e estão
atraindo investimento. Na Espanha tem dois casos clássicos, Barcelona e BilBau que são cidades que, no
período industrial, tiveram dificuldades profundas. As grandes cidades industriais da Inglaterra, New Castel,
a própria cidade de Liverpol também tiveram esses processos. No Brasil nós estamos ainda engatinhando.
Polibio – Curitiba não fez isso?
Grisa – Curitiba fez, mas Curitiba se atém principalmente na questão dos transportes que é bem resolvido,
mas é claro que a cidade também surfou um pouco nessa onde da uma cidade um pouco mais planejada, um
pouco mais sustentável. E qual é o resultado? Qual o ganho disso? É o ganho econômico. Cidade que tem
qualidade urbana atrai investimentos. Ela cresce, economicamente, muito mais do que as outras.
Polibio – No Brasil alguma cidade fez isso, fez o seu dever de casa?
Grisa – Algumas. Por exemplo, no interior de São Paulo, temos a cidade de Sorocaba, que é um caso muito
completo. Cidade que nos últimos 15, 20 anos tivemos mudanças importantes. Vitória, no ES, também tem
um trabalho contínuo de planejamento. Tem cidades menores, como Jaraguá do Sul em SC. Jaraguá tem um
movimento muito interessante, feito a partir de grandes empresas instaladas ali, elas resolveram auxiliar o
poder público a se planejar.
Polibio – Para fazer o dever de casa, quais seriam os pontos?
Grisa – O dever de casa é, principalmente, colocar as lideranças empresariais e a gestão pública no rumo
daquilo que realmente é importante para resolver os entraves de competitividade da cidade.
Polibio – E o que é realmente importante?
Grisa – Logística, qualidade urbana, regiões. Por exemplo, você não pode ter regiões degradadas. As
regiões centrais são emblemáticas...
Polibio – mas isso em todo o mundo, em todas as cidades, o centro não é degradado? Todos os lugares que
conheço, quase sem exceção, é degradada a zona central mesmo!
Grisa – Não necessariamente. Se você for olhar, quase todas as cidades...
Polibio – Hannover, na Alemanha é. Londres, Nova York é.
Grisa – Mas já tem alguns polos de regeneração. Quando a gente fala num nível de degradação, não dá para
comparar ao nível de degradação das nossas grandes cidades. São Paulo, por exemplo, faz um movimento
que é surreal. Na década de 50 e 60, se instalou a partir de um centro velho, que era o centro de São Paulo.
Na década de 70 e 80, ela vai para a Paulista. Nos anos 2000, ela foi para a região da Perrini, JK. Ela vai
deixando para trás e construindo uma nova centralidade a cada 20 ou 30 anos. Esse é um processo brutal.
Voltando para a nossa região metropolitana, hoje os governos nacionais não fazem mais aquela diferença no
planejamento, no desenvolvimento, no mundo se dá esse mapa dos investimentos, posicionamentos, ele se
dá a partir de regiões e cidades. Regiões metropolitanas polo. Hoje, a região metropolitana de Porto Alegre é
uma das 100 principais regiões metropolitanas no mundo. Isso não é tão pouca coisa.
Polibio – O que é isso, é 4 milhões de habitantes?
Grisa – 4 milhões de habitantes. É 82ª maior região metropolitana do mundo. Em população, a região
metropolitana de Porto Alegre, é a 4ª do Brasil. Nós viemos depois de São Paulo, Rio e Belo Horizonte. Nós
ainda somos economicamente mais fortes do que a região metropolitana de Belo Horizonte.
Polibio – Economicamente está em 3° então.
Grisa – Em 3°, naquela história, balançando. Como Barcelona e Bilbau se tornaram, viraram o jogo?
Polibio – Barcelona é uma cidade maios ou menos do tamanho de Porto Alegre, 1 milhão e 300 mil
habitantes, por ai.
Grisa – 1 milhão e 300, mas a região metropolitana é cerca de 2 milhões e meio, 3 milhões.
Polibio – Metade da nossa população. O que eles souberam ver? Que há uma lógica metropolitana. Ou seja,
o cidadão, naqueles 40 ou 50 Kms de arco da região metropolitana, tem que circular livremente. Você pode
morar em Canoas, almoçar em São Leopoldo e jantar em Porto Alegre. Isso é uma coisa que tem que ser
feita com naturalidade.
Leandro – Esse é um aspecto que realmente me chama a atenção, se for comparar o Brasil com outros
países. Recentemente eu estive na Suíça e é impressionante a mobilidade. Você pode morar, tranquilamente,
a 200 Kms do teu trabalho que em uma hora você vai entrar num trem – vai chegar na estação de trem
facilmente, porque tem o transporte de cada cidade, urbano, que é bonde ou ônibus, que é extremamente
eficiente – você desce na estação central e tu entra num trem. Não tem, sabe aquele movimento sem catraca,
é sem catraca, só que não é de graça.
Polibio – Sem catraca e não precisa apresentar o tiquet em lugar nenhum.
Leandro – Não, só que dentro do trem vai ter alguém que vai conferir. Mas é impressionante a capacidade
de ir do ponto A para o ponto B com rapidez, segurança e a um custo relativamente baixo, se formos levar
em consideração o nível de receita que as pessoas de lá tem.
Polibio – As cidades são muito pequenas também.
Leandro – Mas tem grandes centros como Zurik, que são muito grandes e funcionam da mesma forma. Por
que isso não funciona, mesmo em Nova York que é uma cidade grande, mas é mais de carro, mas mesmo
nas cidades americanas é fácil se movimentar. Tem sistemas de metrô, tem sistema de ônibus. Por que no
Brasil isso não acontece? Por que o nosso transporte é tão ruim?
Grisa – Obviamente que os casos que a gente tem de sucesso são em países desenvolvidos, com outro nível
de renda. Até, em termos de comparação com outros países da América Latina, a gente vê outras regiões da
América Latina, regiões de renda média, Leste da Europa, África do Sul, México, Colômbia, com soluções
melhores dos que as nossas. Chile nem se fala. Quando você fala numa região dessas, o que está inserido no
sistema competitivo mundial, vamos dizer que é a região metropolitana de Porto Alegre, região
metropolitana de Curitiba, região metropolitana de Recife, essas que estão inseridas num padrão mundial de
competição. Você tem que ter um hab, um hab de ligação. Para começar, o seu hab aéreo tem que ser
extremamente eficiente. Quando a gente fala de hab aéreo, a gente fala apenas de passageiros e de transporte
de cargas.
Polibio – Mas esse nosso campo de aviação de Porto Alegre não serve?
Grisa – Nós temos um problema de crescimento de hab de carga. É necessário isso porque a porta de
entrada, e a partir dali, cada uma das cidades da região passa a exercer uma função.
Leandro – Ainda mais no Brasil que o transporte ferroviário quase não existe.
Grisa – Exato. Então, tem que ter uma certa eficiência. Eu tenho que, em 30 ou 40 min, ter capacidade de ir
até qualquer lugar desses e me comunicar. Tem uma discussão, por exemplo, a desindustrialização de Porto
Alegre. Porto Alegre é a cereja do bolo. Porto Alegre, na região metropolitana, é onde estão os serviços mais
qualificados, os hotéis mais qualificados. O importante é que outras cidades funcionem como polos
produtivos. Só que isso tem que funcionar num encaixe estratégico que faça sentido, e não como a situação
hoje que quando eu vou para São Leopoldo e eu demoro 1:30 min, na 116. Às vezes, eu vou a Canoas e
demoro 40 min. Coisas básicas. Essa visão de como a nossa região metropolitana funciona e é essa
comparação que os grandes investidores fazem.
Polibio – Pelo que estou notando, toda a nossa conversa gira em torno da mobilidade urbana, ou seja,
transporte. Esse é o vetor de todos os problemas subsequentes. Vamos analisar a questão dos nós que
impedem que as cidades consigam se expandir tal como nós desejaríamos. Bom transporte, bom sistema de
saúde, bons níveis de educação. Por enquanto estamos falando do estrangulamento do transporte. O Leandro
estava lembrando da dificuldade que nós temos para nos movimentar na saída de Porto Alegre. Domingo eu
viajei para Gramado e o pessoal que foi comigo disse “vamos sair ao meio-dia em ponto de Porto Alegre
porque os motoristas estão almoçando, se não sairmos até 13:30 nós vamos ter problemas”, não saímos.
Saímos perto das 15h. Uma viagem que dá para fazer tranquilamente, de Gramado a Porto Alegre, 103 KM,
dá pra fazer em uma hora, eu levei 3 horas.
Leandro – Na última vez que fui a Gramado, foram 4 horas.
Polibio – Você falou em 1:30 min para São Leopoldo, aqui dentro de Porto Alegre, se o sujeito sair na hora
errada de casa, não vai chegar em 1:30 min no seu trabalho. Eu acho que esse é o principal motivo que
estrangula uma cidade, uma região metropolitana.
Grisa – O grande problema é da viabilização do investimento público, do investimento público como um
todo. A parte de mobilidade e de infraestrutura, vamos dizer assim que é a mais aparente. È a que está mais
na superfície, e que nós notamos com mais facilidade. Está por trás disso a falta da solução, porque o estado
brasileiro tem uma dificuldade de investimento, ele tem um custeio lá em cima e um investimento e uma
demora em agir muito forte. No caso aqui do Sul, nós temos 3 décadas de defasagem em investimentos
nessa área. Tudo isso tem um custo econômico. O custo disso são as viagens que você deixa de fazer, o
tempo que você gasta em cima do carro em vez de ficar produzindo mais. Nós estamos finalizando um
estudo que indica uma perda apenas de produtividade da região metropolitana de Porto Alegre, pelos
gargalos de mobilidade, de falta de encaixe estratégico, em torno de 4 a 5 bilhões por ano, isso é 5% do PIB
do RS. Só na região metropolitana.
Polibio – São 32 municípios a região metropolitana?
Grisa – Isso, são 32 municípios, mas aqui a gente está falando do entorno mais próximo. Se nós somarmos o
eixo que vem da Serra. O eixo produtivo que vem de Caxias do Sul, que está interligado nesse sistema, nós
vemos todo um sistema de produção que tem um problema de escoamento, e que ai entra 34% da economia
do RS. A gente está vendo isso no problema de ajuste de competitividade do estado. Não tem dinheiro,
vamos viabilizar, vamos fazer parceria público/privada. Há um problema de 30 ou 40 anos.
Polibio – Porque se o governo não quer conter os seus gastos para poder ter dinheiro para investir, tudo
bem, continue gastando como quiser, mas deixe outros entrarem então.
Grisa – Há condições de isso ser feito.
Leandro – Mas ai a gente vê as manifestações, esse é um problema que eu vejo: o problema de
entendimento das pessoas de como funciona o sistema. As manifestações de rua meses atrás, “ah, eu quero
transporte de graça” ou “quero mais barato”. O que acontece, uma das cidades que teve esse movimento
iniciado foi São Paulo, agora foi apresentado um aumento de IPTU de 30%. Ou seja, reflexo direto, e
contando com a ineficiência do estado em como vai prover este serviço. Nosso governador extinguiu o
pedágio, ou vai colocar uma empresa pública de pedágio. Ou seja, na minha cabeça isso não entra, porque se
lá atrás o estado concedeu as rodovias para o poder privado...
Polibio - Concedeu para que ele pudesse investir, melhorar estradas, botar ambulância...
Leandro – Ele não tem nem recurso e nem capacidade administrativa, tem uma baixa eficiência, então agora
a gente vai tirar esse pedágio e vai, além de pagar os impostos, vamos também pagar um pedágio para uma
empresa pública que é altamente ineficiente. Como nós vamos conseguir fugir disso?
Grisa – E acho que por trás disso tem uma mentalidade da população que é a mentalidade existencialista.
Nós temos que começar a romper com isso, o Brasil como um país moderno, um país que está partindo do
estágio industrial para o pós-industrial, uma das coisas que não fazem mais sentido é essa mentalidade
existencialista. Até porque, não é só questão de finanças públicas que é um assunto que nós temos apenas
que tangenciar, o saco tem fundo e já chegou no fundo. Aquela ideia: “eu quero mais educação, mais saúde”,
não! Hoje a discussão não está mais na quantidade e sim na qualidade, com direcionamento. É
impressionante, quando eu passei a trabalhar com gestão pública, a dificuldade que você tem na gestão
pública de dar direcionamento a seu gasto, a seu investimento. 95 ou 98% acabam sendo no dia a dia, vai a
roldão. Ai que está o pulo, quando na gestão de uma cidade, na gestão de um estado, você consegue dar
minimamente um direcionamento estratégico para certas ações, você sabe o que vai fazer , o que vai
priorizar, você dá um salto em relação aos outros.
Leandro – Tem uma pergunta, Luis coloca o seguinte: “vocês já perguntaram para o Grisa se não é
complicado demais destacar uma cidade e um país com o poder centralizado como o Brasil, onde não se
pode estabelecer políticas próprias em municípios, como nos EUA?”
Grisa – A nossa legislação dificulta muito a política de desenvolvimento a partir de cidades e regiões. A
nossa estrutura faz com que o estado e o município estejam sempre reféns da União para conseguir os seus
recursos. Tem uma coisa importante, esse movimento de regionalização já existe nos EUA há muito tempo,
dentro do próprio modelo federativo americano que é um modelo federativo verdadeiro. Com a União
Européia, você passou a ter esse destaque, esse protagonismo das regiões, que também, a partir da década de
80 e 90, começaram a mudar a realidade. Quais são as nossas modernizações institucionais? Depois de 2010,
fez-se os estatuto das cidades. Com o que, teoricamente a partir daí, as cidades brasileiras poderiam passar a
ser protagonistas, poderiam passar a ter uma visão estratégica sobre si mesmo e buscar, juntamente com as
pessoas que ali moram, as lideranças, sociedade civil, a fazer os seus caminhos. Isso foi no ano 2000, final
do governo Fernando Henrique. Em 2003, o governo Lula criou o Ministério das Cidades que teoricamente
deveria ser o Ministério que ia fomentar esse processo de desenvolvimento estratégico das cidades
brasileiras. Acabo se tornando um Ministério de Infraestrutura urbana, que é outra coisa. Acabou não
cumprindo a sua função. Então, os avanços institucionais brasileiros, foram apenas esses. As nossas
instituições ainda são bastante tímidas para esse tipo de coisa. Vamos falar, por exemplo, do problema dos
fundos, o RS ou uma região metropolitana, uma região que recebe um grande investimento, hoje, no Brasil,
nós temos a dificuldade de formação de fundos. Como as regiões e as cidades se desenvolvem? Você cria
fundos específicos para passar a investir em desenvolvimento com recurso carimbado. Isso, no Brasil, ainda
não se desenvolveu. Eu acho que isso se deve mais à falta de entendimento e vontade política dos nossos
gestores do que pelas dificuldades impostas pela nossa estrutura legal. É uma questão de mentalidade, nós
ainda não acordamos para esta questão.
Polibio – Ou seja, a centralização federal inibe, mas ela não impede. Vamos ver alguns prefeitos que estão
fazendo acontecer, apesar de tudo. Há vários lugares do mundo que tiveram êxito com isso, não tem porque
não ter aqui no Brasil. Depois eu quero que você explique o que é a cidade 1.0, 2.0, 3.0. Então, o prefeito, o
vereador, as lideranças da sociedade, do município elas têm margem de ação. Podem fazer, pelo menos, um
planejamento estratégico que isso não depende da centralização da União, basta contratar uma consultoria,
por exemplo.
Grisa – Na verdade, o grande problema, e a gente fala principalmente de cidades médias para grandes onde
você tem já um acúmulo de capital social um pouco maior, você tem plena condição de passar a ter uma
estratégia de cidade. Nós, na nossa empresa, precisamos ter estratégias. Na nossa vida precisamos ter
estratégias. E eu digo para vocês que 90% dos municípios brasileiros, municípios de 200, 300, 400 mil
habitantes, o cara entra no primeiro dia e não tem uma estratégia. Ele não sabe por onde vai.
Polibio – Pode ter uma ideia, mas estratégia...
Grisa – Exato. É o posicionamento da cidade. O que nós vamos ser? O que nós queremos ser e para onde eu
vou conduzir esta cidade? Com base nisso, não se fez os instrumentos de planejamentos tradicionais.
Polibio – Mas o prefeito já entra ali como bombeiro. Ele tem que apagar um incêndio que o prefeito anterior
deixou. O que é a maioria dos casos. Ai já perdeu um ano com isso.
Grisa – Já perdeu um ano, mas você não pode ficar refém disso.
Polibio – Ele tem que ser bombeiro, mas tem que ser o que, paralelamente?
Grisa – Tem que ser bombeiro, mas tem que mostrar que tem uma visão para aquela competitividade.
Polibio – Ai precisa de dois prefeitos, um bombeiro e um administrador.
Grisa – Ao mesmo tempo. Nós estamos tendo uma melhoria muito grande no perfil dos gestores. Apesar de
ainda estarmos muito aquém. Se você pensar, hoje, uma cidade média tem 5 mil funcionários. É Canoas, São
Leopoldo, Caxias. Isso é uma grande empresa para ser gerida. Ai você se pergunta: qual é o nível e a
capacidade de gestão que o prefeito e sua equipe têm para gerir o equivalente a uma grande empresa? Se ele
não tem um norte na ação, efetivamente onde ele quer intervir na cidade, vai ficar perdido, vai ficar refém do
tempo, porque hoje uma administração, 4 anos de gestão, tanto no estado quanto no município, é um
campeonato de pontos corridos. Não existe mais aquela coisa da chegada faltando 1 ano e meio para o final,
ele começa a fazer obras e encaminha a reeleição ao sucessor. Não. Hoje isso tem que ser feito a partir do
primeiro dia. A questão do 1.0, 2.0 e 3.0: as cidades 1.0 são aquelas cidades – e isso tudo passa pela
mentalidade do gestor e a consciência que ele tem que ter da necessidade de profissionalização, isso eu digo
que é premente até em capitais, o voluntarismo, o improviso, hoje, não tem mais vez – a cidade 1.0 é aquela
que o prefeito e sua administração tem uma visão tradicional. Eu cuido de limpar a cidade, de pavimentação,
de limpar o cemitério do município e deu.
Polibio – Por que 1.0? Quem criou essa classificação?
Grisa – Essa é uma classificação que eu analisei num estudo que foi publicado, estudo internacional, que a
gente apresentou num congresso, dois ou três anos atrás. A 1.0 é essa. A 2.0 é o feijão com arroz onde ele
ainda não incorporou as grandes funções de saúde e educação. A Constituição de 88 transformou os
municípios em grandes operadores de saúde e educação.
Polibio – Era uma função que não tinha?
Grisa – Era uma função que era mais dividida com a União e com os estados. Hoje, a grande função de
gestão sobre a saúde e educação é no município.
Polibio – Mais do que o governo federal e estadual?
Grisa – Mais do que o governo federal e estadual. Você passa a ser gestor de uma equipe de educação que,
às vezes, tem mil pessoas. De uma equipe de saúde que tem 600, 700 pessoas. Isso tem uma complexidade
grande.
Polibio – Aquele hospital de São Leopoldo, o Centenário, quantos funcionários tem?
Grisa – Em torno de 800 funcionários. São Leopoldo tem 5600 funcionários. Canoas tem 5200. Caxias deve
ter em torno de 5000. São Leopoldo é um caso de administração às avessas.
Polibio – É um caso de uma cidade que precisaria de um prefeito 2.0 e teve 1.0.
Grisa – Precisaria de um prefeito 3.0. Vocês sabem que uma vez o Tancredo Neves fez uma discussão com
o Paulo Maluf, eles estavam conversando e no meio da discussão foram trocando livros, e o Tancredo
chegou e deu para o Paulo Maluf. Ele perguntou o que era aquilo e Tancredo “é o Código Penal, é o que eu
preciso para conversar com o Senhor”. Então, quer dizer, há outras questões que passam da questão da
administração.
Polibio – Aqui no RS tem um debate famoso, do tempo da Ditadura Militar ainda. Quando foram disputar
uma cadeira ao Senado, o Brossard que naquele na se elegeu, pela primeira vez Senador, e o Nestor Iost que
era presidente do Banco do Brasil, que era um homem da ditadura militar. Eles foram para um debate na
televisão e o Brossard colocou um livro em cima de uma mesinha do lado e, a todo momento que falava com
o Nestor ele apontava para o livrinho. Até que uma hora o Nestor não aguentou mais e perguntou “por que
você está mostrando esse livro?” “porque você deveria ler isso aqui”. Mostrou para ele e era a Constituição
federal. Então, tem que cumprir a lei, não adianta nada.
Grisa – O 2.0 é esse que faz o básico, cumpre a lei de responsabilidade fiscal e passa a incorporar estas
grandes funções. Hoje, no mundo, e principalmente no Brasil, você está demandando a gestão 3.0, que faz
isso, mas ainda se preocupa com a questão do desenvolvimento, porque desenvolvimento sustentável e
dinheiro no bolso das pessoas que moram ali também é importante, é a qualidade de vida, e com estratégia.
Você passa a ter um foco estratégico.
Polibio – Tem algum prefeito 3.0 no Brasil?
Grisa – Tem, temos alguns. Temos em torno de 1%, eu diria. Dos 5660 municípios, nós temos hoje em
torno de 50 a 60 municípios no Brasil com um tipo de entendimento de gestão 3.0.
Polibio – Aqui no RS tem alguém?
Grisa – Tem. O Jairo Jorge em Canoas. Ele tem levado essa noção estratégica de cidade...
Polibio – Olha PT, heim...estou surpreso.
Grisa – É, mas esta questão independe da questão partidária. Há gestores extremamente avançados em todos
os partidos e gestores retrógados em todos os partidos. E em região também. Isso é outra coisa que atuando
nacionalmente a gente aprende.
Polibio – Você está dizendo que tem partido é muito mais avançado e o prefeito é atrasado?
Grisa – Às vezes, sim. Você não tem unidade na questão partidária. Outra coisa é a questão regional.
Polibio – Mas o que o Jairo Jorge fez? Vamos pegar o exemplo dele.
Grisa – Jairo Jorge fez, por exemplo, a estratégia da cidade de Canoas. Canoas tem uma estratégia de cidade
de 2011 a 2021. Em que se fez uma discussão, com mais de 600 pessoas da sociedade, em processo
extremamente aberto.
Polibio – Com que objetivo?
Grisa – Com o objetivo “qual a cidade que nós vamos ser em 10 anos?”. Com ações objetivas e bem
desenhadas.
Polibio – Nesse caso específico de Canoas, o que eles querem ser?
Grisa – Eles querem ser uma cidade mais atrativa, estão trabalhando para isso. Tanto que Canoas está se
tornando um multipolo de serviços metropolitano. Você vê claramente que a cidade fez um rumo e ela está
seguindo neste caminho. È um projeto que eles têm 43 iniciativas de 104 ações.
Polibio – Você enxerga isso em Porto Alegre ou não?
Grisa – Não. Porto Alegre é uma questão problemática à parte. Acho até que não é uma questão isolada de
um ou outro governo, mas a gente sente a necessidade de Porto Alegre...
Polibio – É uma questão para economistas ou psiquiatras Porto Alegre?
Grisa – Acho que as duas coisas juntas. Acho que ainda é mais economista e gestores, essa questão
psiquiatra a gente tem que passar por cima.
Leandro- Na minha visão, na minha tese, é um problema de incentivo. Se nós temos uma empresa como um
hospital de 800 funcionários, o que vai acontecer se eu for o gestor deste hospital e esse hospital, por
exemplo, gastar mais do que arrecada, oferecer um serviço ruim, eventualmente um paciente morrer, o que
vai acontecer comigo? Eu vou me dar mal. O que acontece com um político quando, na esfera onde ele
trabalha, seja na prefeitura, no estado ou mesmo no país, se as coisas vão mal? Na pior das hipóteses ele não
vai se reeleger. A lógica no incentivo, na responsabilidade das coisas, a gente vê o estado sendo gastador,
nós inventamos um orçamento 15% maior do que a despesa. Isso eu não consigo fazer numa empresa. Se eu
gastar 15% a mais do que eu receber, eu quebro. Se pegarmos desde o governo Fernando Henrique, 8 anos
atrás, o tamanho do estado na economia, a cada ano, só cresce, e a lógica do estado não é uma lógica da
iniciativa privada no sentido de responsabilidade direta, de eficiência. Como a gente poderia, numa escala de
prefeitura - porque eu acho até que é mais fácil do que na escala federal, porque eu não estou ligado à
Brasília, estou ligado na minha cidade - como poderíamos ter uma percepção e uma cobrança mais forte em
relação aos resultados?
Grisa – Eu já acho que isso está mudando bastante em função das redes sociais. Hoje há um controle social
sobre os governos, vamos dizer que nem sempre correto, nem sempre imparcial, nem sempre qualificado,
mas existe um controle social maior ao que existia há 10 ou 15 anos. Por outro lado também há uma
legislação em cima da responsabilidade.
Polibio – As redes sociais permitem que qualquer pessoa possa expor publicamente a sua demanda.
Grisa – O grande pulo do gato é o seguinte: as lideranças púbicas nãos e deram conta que ser um bom
gestor e ser um gestor transformador faz uma grande diferença e eleitoramente é muito bom. Não é pela
pressão que isso virá e sim pela motivação.
Leandro – Não teve um deputado que quando foi para a Comissão de Ética da Câmara, ai um repórter
perguntou uma coisa e ele “estou me lixando para o povo, não estou nem ai” e foi reeleito.
Polibio – Deputado Sérgio Moraes, PTB, de Santa Cruz do Sul.
Leandro – Aqui do RS ainda.
Polibio – É ex-prefeito de Santa Cruz do Sul.
Leandro – É com isso que a gente tem que acabar.
Polibio – E ele disso o seguinte: “estou me lixando para o povo e tem outra, esse povo para o qual estou me
lixando vai me eleger de novo”.
Leandro – E elegeu!
Grisa – Isso só tem uma solução, a única solução é o voto.
Polibio – Mas ai o sujeito vai lá e vota de novo no cara.
Leandro – Talvez ele nem teve acesso a essa informação, ou não quis ter acesso, achou que não era
importante. Esse é o nosso drama aqui no Brasil.
Polibio – Ele até deu uma declaração depois – fazendo justiça para o Sérgio – eu fui repórter e eu sei como é
isso, ele disse “olha, o repórter me irritou e eu acabei dizendo isso, mas não era o que eu queria dizer”...
Grisa – Vocês sabem uma coisa sutil que fez melhorar muito já os governos? A necessidade de se registrar
problema de governo no TRE, isso nos municípios e nos estados está fazendo uma diferença grande. Essas
mudanças são lentas. O Brasil é um país de mudança lenta, faz parte da nossa cultura. Nós fomos um dos
últimos países a abolir a escravatura no mundo, nós fomos o último país da América Latina a ter estabilidade
econômica, nós somos lentos no nosso próprio desenrolar.
Polibio – Vamos voltar a falar um pouquinho sobre Porto Alegre. Capital dos gaúchos, 1 milhão e 300 mil
habitantes, centro de uma região metropolitana que expande muito. Hoje é uma cidade estritamente de
serviços, se desindustrializou completamente. Em Porto Alegre ainda, os seus gestores nunca se
perguntaram “o que nós queremos ser”. O que Porto Alegre pretende ser. Aliás, nem região metropolitana e
nem o RS e nem o Brasil também.
Grisa – A questão nacional, no Brasil existe uma inércia pelo seu tamanho natural que, no caso, a falta de
direcionamento acaba não sendo tão grave. Porém, o RS e mais ainda a região de Porto Alegre, essa falta de
direcionamento já está nos custando muito caro. Lembro que há 4 ou 5 anos, quando a gente começou a
mostrar a situação de decadência relativa do RS e de Porto Alegre, existia uma resistência muito grande de
alguns setores. Hoje já há uma unanimidade em torno disso. Nós temos é que evoluir dessa unanimidade
para a construção das soluções, para virar o jogo. Nós vemos que a cidade de Porto Alegre tem uma
dinâmica de transformação muito lenta, isso, em parte, pela falta de entendimento do que ela é e do que ela
tem que ser.
Polibio – Qual é nossa identidade do ponto de vista econômico...
Grisa – Exatamente. Por exemplo, a cidade tem que colocar, nas suas características de produtividade para
se refletir como centro de serviços, não apenas no âmbito regional e estadual, mas para ser...
Polibio – Ou seja, uma vocação de Porto Alegre é serviço mesmo?
Grisa – É serviço, mas serviço qualificado. Se você tem recursos humanos e serviços qualificados, e ainda
tem, se tem essas condições, você tem que transformar isso em condição e não continuar sendo um centro
exportador. Na atual geração, de profissionais que estão entrando, eu direi que 50% já é evasão para o centro
do país, porque não tem mercado.
Polibio – O pessoal mais qualificado usa ponte aérea, não é?
Grisa – Usa ponte aérea e muita gente teimosa. Dizem que a gente vivem em ponte aérea, passa o fim de
semana em Porto Alegre e acaba trabalhando lá.
Polibio – Eu conheço vários profissionais que fazem ponte aérea. De ir na segunda e voltar na sexta,
trabalha a semana toda lá. Pessoas altamente qualificadas.
Grisa – Pela teimosia porque a gente gosta de lá, mas tem que transformar aqui. Tem um viés de Porto
Alegre que não é bom. Se nós olharmos 5, 10, 11 anos, aqueles problemas que persistem, aquelas coisas que
não são devidamente encaradas.
Leandro – Acho que um dos problemas que não se dá a devida atenção é exatamente a questão da violência.
Se fala de São Paulo, mas em São Paulo temos hoje o pior crime que é o homicídio, é uma taxa de 12
homicídios para 100 mil habitantes, aqui em Porto Alegre estamos em 55 já.
Grisa – Mas a segurança é um pouco resultante das outras coisas que desandam. Nós temos que entender
que somos a capital do estado mais meridional do Brasil, nós estamos do lado de um Mercosul que não está
essas maravilhas. Para que você possa se posicionar competitivamente, minimamente numa escala nacional
e mundial você tem que ser mais eficiente do que os outros. Tem que criar um sistema de produção de
conhecimento que seja mais eficiente. A isso a gente ainda não deu a devida atenção, continuamos em Porto
Alegre se enganando. Se enganando, sendo paliativo em cima das coisas. Um exemplo é o nosso aeromóvel
que leva do aeroporto até o Trensurb, que é muito bonito. Ai eu pergunto: qual é o executivo que vai chegar
às 11h da noite, vai pegar o aeromóvel, para pegar o trem e desembarcar na praça do mercado Público?
Nessas coisas temos que ter uma visão melhor de realidade.
Polibio – Eu estaria ali na estação, esperando com ele, com uma camisa de força.
Grisa – Pensa o mesmo aeromóvel como um mecanismo de ligações entre esses bairros e o centro, seguindo
o traçado da avenida Ipiranga. Nessas coisas Porto Alegre perdeu a característica de ser ousada, de ser
inovadora. A cidade como um todo, não é apenas na gestão, porque o setor público reflete a cultura dos seus
formadores de opinião.
Leandro – É só andar ali pela antiga Perimetral, mais perto do centro, e ver os trilhos que estão ali de um
aeromóvel de um projeto muito mais antigo.
Polibio - 30 anos já.
Grisa – Exato. Não é apenas os governos, os governos refletem o pensamento da sua formação de opinião.
Acho que isso está mudando. Acho que nós já batemos no fundo do poço e há um certo movimento de
reversão, em Porto Alegre, e RS.
Leandro – Tem uma questão importante, já que nós trabalhamos com um público formado por investidores,
você que tem um conhecimento em gestão pública, principalmente em cidades, qual seria sua dica para um
investidor imobiliária, especialmente, o que ele teria que buscar numa cidade de local interessante, situação
interessante para investir?
Grisa – Um dos grandes problemas brasileiras é exatamente porque não há este planejamento e essa junção
de pensamento positivo dos governos e iniciativa privada, é que você não tem movimentos planejados,
movimentos concatenados. Se você for olhar o investimento imobiliário, ele é todo picadinho. De repente,
numa rua que você tem uma casa, o cara pega e coloca um prédio de 20 andares.
Polibio – Em Porto Alegre eu percebo exatamente isso, essa expansão imobiliária que está acontecendo é
caótica, não obedece regra nenhuma.
Grisa – No Brasil é assim, porque não há uma sinalização privada para “vamos recuperar esta área aqui,
vamos regenerar esta área aqui fazendo um zoneamento correto e equilibrado”. Você cria um movimento em
que você chama os investidores.
Leandro – Um amigo meu foi morar num apartamento novo em Moema, um bairro de São Paulo que teve
um grande crescimento imobiliário e ele demorava uma hora para sair do estacionamento do prédio dele,
porque colocaram um prédio gigante, um do lado do outro, numa ruasinha pequena e não tinha como sair
todo mundo no horário de pico.
Grisa – O conceito de regeneração é que são áreas degradadas que passam a ser áreas regeneradas. Ai é que
está a grande oportunidade dos investidores.
Polibio – Esse é um tema que está aqui na pauta desde o início, a questão da degradação dos centros e a
regeneração. O caso de Porto Alegre é emblemático por causa do projeto Cais Mauá, que é um projeto
exatamente de recuperação do centro da cidade de Porto Alegre. Isso está andando a passos de tartaruga. Ela
é emblemática até para o Brasil. Eu não conheço outro caso no Brasil, como esse aqui. Belém já fez isso e
com sucesso, mas não conheço outro.
Grisa – Rio de Janeira está fazendo o Porto Maravilha agora.
Polibio – Lá está andando?
Grisa – Lá está andando.
Polibio – O Grisa tem feito trabalhos em várias regiões do país, está fazendo um trabalho específico aqui em
Canoas. Nós já falamos sobre o que está fazendo o prefeito Jairo Jorge que, segundo o Grisa, é um bom
exemplo para os demais prefeitos do país; ele conseguiu êxito no que a população quer para daqui dez anos.
Você está fazendo um trabalho também em São Leopoldo, ali é mais difícil, tem que dar uma de bombeiro,
porque teve uma herança maldita. A Agência Futuro tem trabalhado também em regiões.
Grisa – Na questão nacional, como por exemplo o Programa Nacional de Agentes de Desenvolvimento, que
é um programa que nós fazemos com a Confederação dos Municípios, Sebrae Nacional, são 1500 agentes de
desenvolvimento em todo o país.
Polibio – O que é isso, agende de desenvolvimento?
Grisa – É um cara que é preparado, treinado.
Polibio – Pelas prefeituras?
Grisa – Não, não. Pelo Sebrae Nacional e pela Confederação Nacional dos Municípios. Tem uma
metodologia específica e esse cara vai atuar como se fosse um secretário municipal na questão de
desenvolvimento dos municípios. É óbvio que você tem agentes melhores e agentes piores.
Polibio – Mas eles são funcionários dos municípios?
Grisa – São funcionários dos municípios. Você prepara ele para ser um cara com uma visão mais
estratégica.
Polibio – Aqui em Porto Alegre tem?
Grisa – Tem, no RS tem em um bom número de municípios.
Leandro – Mas qual é o trabalho específico da agência futuro, como funciona este trabalho?
Grisa – Nós trabalhamos como consultoria, trabalhamos junto às organizações nacionais, como o Sebrae
Nacional, nós estamos fazendo toda uma nova metodologia de desenvolvimento econômico local,
desenvolvimento econômico de cidades; a Confederação Nacional dos Municípios; há alguns municípios
como Canoas e São Leopoldo.
Leandro – Mas trabalham diretamente para uma prefeitura?
Grisa – Podemos trabalhar também diretamente com uma prefeitura.
Polibio – Já está trabalhando para São Leopoldo, para Canoas.
Grisa – Já trabalhamos para outros municípios do país também. Às vezes contratados por organismos
terceiros, e também por investidores no sentido de analisar a questão do investidor precisando melhorar a
sua cidade.
Polibio – Gustavo, nesse trabalho que você tem realizado, vamos tocar na questão das regiões centrais
degradadas. Nós temos um caso específico em Porto Alegre que é a região do Cais Central, o Cais Mauá. É
uma região degradada nossa, como é a maioria das regiões centrais das grandes cidades. Mas há um projeto
que a prefeitura liberou, o governo do estado também, está na mão de empreendedores e esses
empreendedores não estão caminhando. Por incrível que pareça, a prefeitura abriu tudo, o governo do estado
abriu tudo e o empreendedor privado não dá andamento ao projeto. Está previsto um investimento de meio
bilhão de reais e a coisa não anda.
Grisa – A questão do centro de Porto Alegre, e eu estudei bastante isso em 2010, esse era um projeto que
nós tínhamos com algumas entidades aqui de Porto Alegre, baseados num trabalho que nós já tínhamos feito
no centro do Rio de Janeiro. Nós começamos esse movimento lá no centro do Rio de Janeiro, em 2009 e
2010, quando eu estava no Rio.
Polibio – Esse que é de recuperação de uma parte.
Grisa – O Cais Mauá é uma grande âncora de mudança no centro de Porto Alegre, mas precisa de outras
além disso. A grande questão do centro da cidade é que você precisa pensar que precisa mudar o padrão de
habitação. O padrão do tipo de estabelecimento que ali se coloca. Não é simplesmente fazendo a chamada
revitalização que é pintar uma praça, arruma uma pracinha, não é por ai. Os negócios que lá estão, perdem
milhões. É só você entrar no negócio de hotel, TripAdviser, e você vê isso. Quem frequenta os hotéis do
centro muitas vezes diz “o hotel é muito bom, mas a região é terrível”. Esta visão, para uma visão de uma
nova ocupação econômica de todo o centro. É claro que o Cais Mauá é importante, porque ele faz uma
âncora, ai você precisaria ter, no mínimo, mais uma ou duas âncoras para fazer esse movimento de
direcionamento de investidores para esta área.
Polibio – Mas não tem planejamento de ninguém nisso que você está dizendo.
Grisa – É um estado em que o planejamento é tímido.
Leandro – Quais seriam estas outras âncoras?
Grisa – Você pode criar mais uma ou duas artérias. Outras artérias para fazer esse desenvolvimento.
Polibio – Tipo novos Cais Mauá ali por perto?
Grisa – Não, novos investidores, você faz 5 ou 6 novos investimentos que acontecem ao mesmo tempo.
Leandro – Tipo uma rua de comércio diferenciado.
Grisa – Exato. Por exemplo, em São Paulo se fez na rua Vaiandava, no centro, tradicional. Mas por quê/
Porque não se fez apenas embelezamento e revitalização, se fez um profundo “vamos mudar o tipo de
estabelecimento que tem aqui.
Polibio – Os empreendedores e investidores daqui imaginam, que com o Cai Mauá, funcionando como uma
âncora ali, ela revitaliza aquela zona e espontaneamente...
Grisa – Não é espontâneo. É preciso haver um movimento de organização nisso. Claro que ele vai causar
alguns movimentos de conflito, mas que ele aconteça na rapidez e nos padrões equilibrados. Por exemplo, a
Avenida Cepulveda, que é exatamente aquela linha que liga o antigo prédio do cinema imperial, do centro
de Porto Alegre, até o Cais do Porto, que tem uma entrada bonita ali, que é tombado. Isso ali, por exemplo,
se pensarmos em Copa do Mundo, em corredor, poderia ser um grande corredor, com grandes
empreendedores, uma coisa de visão bonita para a cidade. E o que acontece? Nada! Então, fica a iniciativa
privada esperando o setor público fazer. O setor público esperando a iniciativa privada fazer e ninguém faz
um investimento verdadeiro. Falta uma articulação e a visão de que o investimento para isso é pesado, não é
uma coisa tico-tico.
Polibio – Só no Cais Mauá é 500 bilhões de reais.
Leandro – Quem puxaria esta corda, a prefeitura ou os investidores?
Grisa – Pode ser qualquer um. Mas enquanto este movimento não acontecer de uma maneira articulada, isso
vai demorar anos. Eu não tenho a menor dúvida de que em 20 ou 30 anos, o centro de Porto Alegre e o
Floresta serão regiões novamente valorizadas. Até pela inércia e pela lógica da cidade. Há condiçções de
você criar movimentos articulados para que isso aconteça da maneira certa.
Polibio – Nós só falamos de coisas ruins, mas podemos falar de coisas boas. O próprio projeto do Cais
Mauá é uma coisa boa, embora não tenha essas subâncoras como você diz, mas é um investimento urbano
importantíssimo. Além disso nós temos dois novos, poderosos e moderníssimos estádios, que é a Arena do
grêmio e do Internacional. Aquilo é uma ventosa que puxa o desenvolvimento no entorno deles.
Grisa – E criadouros de regeneração. Duas âncoras de regeneração.
Polibio – Tem a revitalização que a prefeitura está fazendo em vias públicas, estes grandes viadutos que
estão em execução, parece que vai mudar drasticamente.
Grisa – Vai melhorar. O que nós precisamos evoluir é para dar um fechamento estratégico melhor para isso
tudo.
Polibio – Porque a infraestrutura material da cidade, do ponto de vista imobiliário urbano, me parece que
está bem colocada.
Grisa – Está bem projetada, me parece que dentro de alguns anos isso vai melhorar muito. A questão é: o
que nós vamos fazer com isso? Nós temos que pensar como nós vamos atrás desse quepe competitivo.

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Entrevista com gustavo grisa

  • 1. ENTREVISTA COM GUSTAVO GRISA Polibio – Este é o programa Cenários, nós vamos ouvir esta semana o economista e diretor da Agência Futuro, Gustavo Grisa. Nós vamos conversar sobre cidades, as grandes e pequenas cidades. Elas são protagonistas das mudanças que estão acontecendo no mundo, inclusive aqui no Brasil e aqui no RS. Nós vamos conversar sobre isso, quais são os impasses, as alternativas, o que está acontecendo com as nossas cidades. Claro que nós vamos dar mais ênfase à questão da Região Metropolitana de Porto Alegre, mas o Gustavo Grisa tem trabalhado em outras cidades também como Canoas, São Leopoldo. Passa o tempo todo viajando para todo país, enfim, tem uma experiência muito rica que pode nos transmitir. Começamos pela Região metropolitana de Porto Alegre. Vamos situar primeiro o nosso espectador sobre o que é uma região metropolitana e no que consiste a nossa. Grisa – Hoje, o movimento mundial do ano nas cidades lideram as mudanças de desenvolvimento. Praticamente todas as novas soluções em termos de desenvolvimento, de estratégias, elas acontecem a partir de cidades e de regiões. Por exemplo, na questão toda de reestruturação financeira, de estratégia de mudança de posicionamento. Você tem hoje cidades e regiões que em 10 ou 20 anos mudam totalmente de posição dentro do mundo, em imagem dentro do mundo. Por exemplo na Colômbia, Bogotá e Medellim que há 20 anos eram considerados lugares caóticos, mais perigosos do mundo, hoje são exemplos de soluções e estão atraindo investimento. Na Espanha tem dois casos clássicos, Barcelona e BilBau que são cidades que, no período industrial, tiveram dificuldades profundas. As grandes cidades industriais da Inglaterra, New Castel, a própria cidade de Liverpol também tiveram esses processos. No Brasil nós estamos ainda engatinhando. Polibio – Curitiba não fez isso? Grisa – Curitiba fez, mas Curitiba se atém principalmente na questão dos transportes que é bem resolvido, mas é claro que a cidade também surfou um pouco nessa onde da uma cidade um pouco mais planejada, um pouco mais sustentável. E qual é o resultado? Qual o ganho disso? É o ganho econômico. Cidade que tem qualidade urbana atrai investimentos. Ela cresce, economicamente, muito mais do que as outras. Polibio – No Brasil alguma cidade fez isso, fez o seu dever de casa? Grisa – Algumas. Por exemplo, no interior de São Paulo, temos a cidade de Sorocaba, que é um caso muito completo. Cidade que nos últimos 15, 20 anos tivemos mudanças importantes. Vitória, no ES, também tem um trabalho contínuo de planejamento. Tem cidades menores, como Jaraguá do Sul em SC. Jaraguá tem um movimento muito interessante, feito a partir de grandes empresas instaladas ali, elas resolveram auxiliar o poder público a se planejar. Polibio – Para fazer o dever de casa, quais seriam os pontos? Grisa – O dever de casa é, principalmente, colocar as lideranças empresariais e a gestão pública no rumo daquilo que realmente é importante para resolver os entraves de competitividade da cidade. Polibio – E o que é realmente importante? Grisa – Logística, qualidade urbana, regiões. Por exemplo, você não pode ter regiões degradadas. As regiões centrais são emblemáticas... Polibio – mas isso em todo o mundo, em todas as cidades, o centro não é degradado? Todos os lugares que conheço, quase sem exceção, é degradada a zona central mesmo! Grisa – Não necessariamente. Se você for olhar, quase todas as cidades... Polibio – Hannover, na Alemanha é. Londres, Nova York é.
  • 2. Grisa – Mas já tem alguns polos de regeneração. Quando a gente fala num nível de degradação, não dá para comparar ao nível de degradação das nossas grandes cidades. São Paulo, por exemplo, faz um movimento que é surreal. Na década de 50 e 60, se instalou a partir de um centro velho, que era o centro de São Paulo. Na década de 70 e 80, ela vai para a Paulista. Nos anos 2000, ela foi para a região da Perrini, JK. Ela vai deixando para trás e construindo uma nova centralidade a cada 20 ou 30 anos. Esse é um processo brutal. Voltando para a nossa região metropolitana, hoje os governos nacionais não fazem mais aquela diferença no planejamento, no desenvolvimento, no mundo se dá esse mapa dos investimentos, posicionamentos, ele se dá a partir de regiões e cidades. Regiões metropolitanas polo. Hoje, a região metropolitana de Porto Alegre é uma das 100 principais regiões metropolitanas no mundo. Isso não é tão pouca coisa. Polibio – O que é isso, é 4 milhões de habitantes? Grisa – 4 milhões de habitantes. É 82ª maior região metropolitana do mundo. Em população, a região metropolitana de Porto Alegre, é a 4ª do Brasil. Nós viemos depois de São Paulo, Rio e Belo Horizonte. Nós ainda somos economicamente mais fortes do que a região metropolitana de Belo Horizonte. Polibio – Economicamente está em 3° então. Grisa – Em 3°, naquela história, balançando. Como Barcelona e Bilbau se tornaram, viraram o jogo? Polibio – Barcelona é uma cidade maios ou menos do tamanho de Porto Alegre, 1 milhão e 300 mil habitantes, por ai. Grisa – 1 milhão e 300, mas a região metropolitana é cerca de 2 milhões e meio, 3 milhões. Polibio – Metade da nossa população. O que eles souberam ver? Que há uma lógica metropolitana. Ou seja, o cidadão, naqueles 40 ou 50 Kms de arco da região metropolitana, tem que circular livremente. Você pode morar em Canoas, almoçar em São Leopoldo e jantar em Porto Alegre. Isso é uma coisa que tem que ser feita com naturalidade. Leandro – Esse é um aspecto que realmente me chama a atenção, se for comparar o Brasil com outros países. Recentemente eu estive na Suíça e é impressionante a mobilidade. Você pode morar, tranquilamente, a 200 Kms do teu trabalho que em uma hora você vai entrar num trem – vai chegar na estação de trem facilmente, porque tem o transporte de cada cidade, urbano, que é bonde ou ônibus, que é extremamente eficiente – você desce na estação central e tu entra num trem. Não tem, sabe aquele movimento sem catraca, é sem catraca, só que não é de graça. Polibio – Sem catraca e não precisa apresentar o tiquet em lugar nenhum. Leandro – Não, só que dentro do trem vai ter alguém que vai conferir. Mas é impressionante a capacidade de ir do ponto A para o ponto B com rapidez, segurança e a um custo relativamente baixo, se formos levar em consideração o nível de receita que as pessoas de lá tem. Polibio – As cidades são muito pequenas também. Leandro – Mas tem grandes centros como Zurik, que são muito grandes e funcionam da mesma forma. Por que isso não funciona, mesmo em Nova York que é uma cidade grande, mas é mais de carro, mas mesmo nas cidades americanas é fácil se movimentar. Tem sistemas de metrô, tem sistema de ônibus. Por que no Brasil isso não acontece? Por que o nosso transporte é tão ruim? Grisa – Obviamente que os casos que a gente tem de sucesso são em países desenvolvidos, com outro nível de renda. Até, em termos de comparação com outros países da América Latina, a gente vê outras regiões da América Latina, regiões de renda média, Leste da Europa, África do Sul, México, Colômbia, com soluções
  • 3. melhores dos que as nossas. Chile nem se fala. Quando você fala numa região dessas, o que está inserido no sistema competitivo mundial, vamos dizer que é a região metropolitana de Porto Alegre, região metropolitana de Curitiba, região metropolitana de Recife, essas que estão inseridas num padrão mundial de competição. Você tem que ter um hab, um hab de ligação. Para começar, o seu hab aéreo tem que ser extremamente eficiente. Quando a gente fala de hab aéreo, a gente fala apenas de passageiros e de transporte de cargas. Polibio – Mas esse nosso campo de aviação de Porto Alegre não serve? Grisa – Nós temos um problema de crescimento de hab de carga. É necessário isso porque a porta de entrada, e a partir dali, cada uma das cidades da região passa a exercer uma função. Leandro – Ainda mais no Brasil que o transporte ferroviário quase não existe. Grisa – Exato. Então, tem que ter uma certa eficiência. Eu tenho que, em 30 ou 40 min, ter capacidade de ir até qualquer lugar desses e me comunicar. Tem uma discussão, por exemplo, a desindustrialização de Porto Alegre. Porto Alegre é a cereja do bolo. Porto Alegre, na região metropolitana, é onde estão os serviços mais qualificados, os hotéis mais qualificados. O importante é que outras cidades funcionem como polos produtivos. Só que isso tem que funcionar num encaixe estratégico que faça sentido, e não como a situação hoje que quando eu vou para São Leopoldo e eu demoro 1:30 min, na 116. Às vezes, eu vou a Canoas e demoro 40 min. Coisas básicas. Essa visão de como a nossa região metropolitana funciona e é essa comparação que os grandes investidores fazem. Polibio – Pelo que estou notando, toda a nossa conversa gira em torno da mobilidade urbana, ou seja, transporte. Esse é o vetor de todos os problemas subsequentes. Vamos analisar a questão dos nós que impedem que as cidades consigam se expandir tal como nós desejaríamos. Bom transporte, bom sistema de saúde, bons níveis de educação. Por enquanto estamos falando do estrangulamento do transporte. O Leandro estava lembrando da dificuldade que nós temos para nos movimentar na saída de Porto Alegre. Domingo eu viajei para Gramado e o pessoal que foi comigo disse “vamos sair ao meio-dia em ponto de Porto Alegre porque os motoristas estão almoçando, se não sairmos até 13:30 nós vamos ter problemas”, não saímos. Saímos perto das 15h. Uma viagem que dá para fazer tranquilamente, de Gramado a Porto Alegre, 103 KM, dá pra fazer em uma hora, eu levei 3 horas. Leandro – Na última vez que fui a Gramado, foram 4 horas. Polibio – Você falou em 1:30 min para São Leopoldo, aqui dentro de Porto Alegre, se o sujeito sair na hora errada de casa, não vai chegar em 1:30 min no seu trabalho. Eu acho que esse é o principal motivo que estrangula uma cidade, uma região metropolitana. Grisa – O grande problema é da viabilização do investimento público, do investimento público como um todo. A parte de mobilidade e de infraestrutura, vamos dizer assim que é a mais aparente. È a que está mais na superfície, e que nós notamos com mais facilidade. Está por trás disso a falta da solução, porque o estado brasileiro tem uma dificuldade de investimento, ele tem um custeio lá em cima e um investimento e uma demora em agir muito forte. No caso aqui do Sul, nós temos 3 décadas de defasagem em investimentos nessa área. Tudo isso tem um custo econômico. O custo disso são as viagens que você deixa de fazer, o tempo que você gasta em cima do carro em vez de ficar produzindo mais. Nós estamos finalizando um estudo que indica uma perda apenas de produtividade da região metropolitana de Porto Alegre, pelos gargalos de mobilidade, de falta de encaixe estratégico, em torno de 4 a 5 bilhões por ano, isso é 5% do PIB do RS. Só na região metropolitana. Polibio – São 32 municípios a região metropolitana?
  • 4. Grisa – Isso, são 32 municípios, mas aqui a gente está falando do entorno mais próximo. Se nós somarmos o eixo que vem da Serra. O eixo produtivo que vem de Caxias do Sul, que está interligado nesse sistema, nós vemos todo um sistema de produção que tem um problema de escoamento, e que ai entra 34% da economia do RS. A gente está vendo isso no problema de ajuste de competitividade do estado. Não tem dinheiro, vamos viabilizar, vamos fazer parceria público/privada. Há um problema de 30 ou 40 anos. Polibio – Porque se o governo não quer conter os seus gastos para poder ter dinheiro para investir, tudo bem, continue gastando como quiser, mas deixe outros entrarem então. Grisa – Há condições de isso ser feito. Leandro – Mas ai a gente vê as manifestações, esse é um problema que eu vejo: o problema de entendimento das pessoas de como funciona o sistema. As manifestações de rua meses atrás, “ah, eu quero transporte de graça” ou “quero mais barato”. O que acontece, uma das cidades que teve esse movimento iniciado foi São Paulo, agora foi apresentado um aumento de IPTU de 30%. Ou seja, reflexo direto, e contando com a ineficiência do estado em como vai prover este serviço. Nosso governador extinguiu o pedágio, ou vai colocar uma empresa pública de pedágio. Ou seja, na minha cabeça isso não entra, porque se lá atrás o estado concedeu as rodovias para o poder privado... Polibio - Concedeu para que ele pudesse investir, melhorar estradas, botar ambulância... Leandro – Ele não tem nem recurso e nem capacidade administrativa, tem uma baixa eficiência, então agora a gente vai tirar esse pedágio e vai, além de pagar os impostos, vamos também pagar um pedágio para uma empresa pública que é altamente ineficiente. Como nós vamos conseguir fugir disso? Grisa – E acho que por trás disso tem uma mentalidade da população que é a mentalidade existencialista. Nós temos que começar a romper com isso, o Brasil como um país moderno, um país que está partindo do estágio industrial para o pós-industrial, uma das coisas que não fazem mais sentido é essa mentalidade existencialista. Até porque, não é só questão de finanças públicas que é um assunto que nós temos apenas que tangenciar, o saco tem fundo e já chegou no fundo. Aquela ideia: “eu quero mais educação, mais saúde”, não! Hoje a discussão não está mais na quantidade e sim na qualidade, com direcionamento. É impressionante, quando eu passei a trabalhar com gestão pública, a dificuldade que você tem na gestão pública de dar direcionamento a seu gasto, a seu investimento. 95 ou 98% acabam sendo no dia a dia, vai a roldão. Ai que está o pulo, quando na gestão de uma cidade, na gestão de um estado, você consegue dar minimamente um direcionamento estratégico para certas ações, você sabe o que vai fazer , o que vai priorizar, você dá um salto em relação aos outros. Leandro – Tem uma pergunta, Luis coloca o seguinte: “vocês já perguntaram para o Grisa se não é complicado demais destacar uma cidade e um país com o poder centralizado como o Brasil, onde não se pode estabelecer políticas próprias em municípios, como nos EUA?” Grisa – A nossa legislação dificulta muito a política de desenvolvimento a partir de cidades e regiões. A nossa estrutura faz com que o estado e o município estejam sempre reféns da União para conseguir os seus recursos. Tem uma coisa importante, esse movimento de regionalização já existe nos EUA há muito tempo, dentro do próprio modelo federativo americano que é um modelo federativo verdadeiro. Com a União Européia, você passou a ter esse destaque, esse protagonismo das regiões, que também, a partir da década de 80 e 90, começaram a mudar a realidade. Quais são as nossas modernizações institucionais? Depois de 2010, fez-se os estatuto das cidades. Com o que, teoricamente a partir daí, as cidades brasileiras poderiam passar a ser protagonistas, poderiam passar a ter uma visão estratégica sobre si mesmo e buscar, juntamente com as pessoas que ali moram, as lideranças, sociedade civil, a fazer os seus caminhos. Isso foi no ano 2000, final do governo Fernando Henrique. Em 2003, o governo Lula criou o Ministério das Cidades que teoricamente
  • 5. deveria ser o Ministério que ia fomentar esse processo de desenvolvimento estratégico das cidades brasileiras. Acabo se tornando um Ministério de Infraestrutura urbana, que é outra coisa. Acabou não cumprindo a sua função. Então, os avanços institucionais brasileiros, foram apenas esses. As nossas instituições ainda são bastante tímidas para esse tipo de coisa. Vamos falar, por exemplo, do problema dos fundos, o RS ou uma região metropolitana, uma região que recebe um grande investimento, hoje, no Brasil, nós temos a dificuldade de formação de fundos. Como as regiões e as cidades se desenvolvem? Você cria fundos específicos para passar a investir em desenvolvimento com recurso carimbado. Isso, no Brasil, ainda não se desenvolveu. Eu acho que isso se deve mais à falta de entendimento e vontade política dos nossos gestores do que pelas dificuldades impostas pela nossa estrutura legal. É uma questão de mentalidade, nós ainda não acordamos para esta questão. Polibio – Ou seja, a centralização federal inibe, mas ela não impede. Vamos ver alguns prefeitos que estão fazendo acontecer, apesar de tudo. Há vários lugares do mundo que tiveram êxito com isso, não tem porque não ter aqui no Brasil. Depois eu quero que você explique o que é a cidade 1.0, 2.0, 3.0. Então, o prefeito, o vereador, as lideranças da sociedade, do município elas têm margem de ação. Podem fazer, pelo menos, um planejamento estratégico que isso não depende da centralização da União, basta contratar uma consultoria, por exemplo. Grisa – Na verdade, o grande problema, e a gente fala principalmente de cidades médias para grandes onde você tem já um acúmulo de capital social um pouco maior, você tem plena condição de passar a ter uma estratégia de cidade. Nós, na nossa empresa, precisamos ter estratégias. Na nossa vida precisamos ter estratégias. E eu digo para vocês que 90% dos municípios brasileiros, municípios de 200, 300, 400 mil habitantes, o cara entra no primeiro dia e não tem uma estratégia. Ele não sabe por onde vai. Polibio – Pode ter uma ideia, mas estratégia... Grisa – Exato. É o posicionamento da cidade. O que nós vamos ser? O que nós queremos ser e para onde eu vou conduzir esta cidade? Com base nisso, não se fez os instrumentos de planejamentos tradicionais. Polibio – Mas o prefeito já entra ali como bombeiro. Ele tem que apagar um incêndio que o prefeito anterior deixou. O que é a maioria dos casos. Ai já perdeu um ano com isso. Grisa – Já perdeu um ano, mas você não pode ficar refém disso. Polibio – Ele tem que ser bombeiro, mas tem que ser o que, paralelamente? Grisa – Tem que ser bombeiro, mas tem que mostrar que tem uma visão para aquela competitividade. Polibio – Ai precisa de dois prefeitos, um bombeiro e um administrador. Grisa – Ao mesmo tempo. Nós estamos tendo uma melhoria muito grande no perfil dos gestores. Apesar de ainda estarmos muito aquém. Se você pensar, hoje, uma cidade média tem 5 mil funcionários. É Canoas, São Leopoldo, Caxias. Isso é uma grande empresa para ser gerida. Ai você se pergunta: qual é o nível e a capacidade de gestão que o prefeito e sua equipe têm para gerir o equivalente a uma grande empresa? Se ele não tem um norte na ação, efetivamente onde ele quer intervir na cidade, vai ficar perdido, vai ficar refém do tempo, porque hoje uma administração, 4 anos de gestão, tanto no estado quanto no município, é um campeonato de pontos corridos. Não existe mais aquela coisa da chegada faltando 1 ano e meio para o final, ele começa a fazer obras e encaminha a reeleição ao sucessor. Não. Hoje isso tem que ser feito a partir do primeiro dia. A questão do 1.0, 2.0 e 3.0: as cidades 1.0 são aquelas cidades – e isso tudo passa pela mentalidade do gestor e a consciência que ele tem que ter da necessidade de profissionalização, isso eu digo que é premente até em capitais, o voluntarismo, o improviso, hoje, não tem mais vez – a cidade 1.0 é aquela
  • 6. que o prefeito e sua administração tem uma visão tradicional. Eu cuido de limpar a cidade, de pavimentação, de limpar o cemitério do município e deu. Polibio – Por que 1.0? Quem criou essa classificação? Grisa – Essa é uma classificação que eu analisei num estudo que foi publicado, estudo internacional, que a gente apresentou num congresso, dois ou três anos atrás. A 1.0 é essa. A 2.0 é o feijão com arroz onde ele ainda não incorporou as grandes funções de saúde e educação. A Constituição de 88 transformou os municípios em grandes operadores de saúde e educação. Polibio – Era uma função que não tinha? Grisa – Era uma função que era mais dividida com a União e com os estados. Hoje, a grande função de gestão sobre a saúde e educação é no município. Polibio – Mais do que o governo federal e estadual? Grisa – Mais do que o governo federal e estadual. Você passa a ser gestor de uma equipe de educação que, às vezes, tem mil pessoas. De uma equipe de saúde que tem 600, 700 pessoas. Isso tem uma complexidade grande. Polibio – Aquele hospital de São Leopoldo, o Centenário, quantos funcionários tem? Grisa – Em torno de 800 funcionários. São Leopoldo tem 5600 funcionários. Canoas tem 5200. Caxias deve ter em torno de 5000. São Leopoldo é um caso de administração às avessas. Polibio – É um caso de uma cidade que precisaria de um prefeito 2.0 e teve 1.0. Grisa – Precisaria de um prefeito 3.0. Vocês sabem que uma vez o Tancredo Neves fez uma discussão com o Paulo Maluf, eles estavam conversando e no meio da discussão foram trocando livros, e o Tancredo chegou e deu para o Paulo Maluf. Ele perguntou o que era aquilo e Tancredo “é o Código Penal, é o que eu preciso para conversar com o Senhor”. Então, quer dizer, há outras questões que passam da questão da administração. Polibio – Aqui no RS tem um debate famoso, do tempo da Ditadura Militar ainda. Quando foram disputar uma cadeira ao Senado, o Brossard que naquele na se elegeu, pela primeira vez Senador, e o Nestor Iost que era presidente do Banco do Brasil, que era um homem da ditadura militar. Eles foram para um debate na televisão e o Brossard colocou um livro em cima de uma mesinha do lado e, a todo momento que falava com o Nestor ele apontava para o livrinho. Até que uma hora o Nestor não aguentou mais e perguntou “por que você está mostrando esse livro?” “porque você deveria ler isso aqui”. Mostrou para ele e era a Constituição federal. Então, tem que cumprir a lei, não adianta nada. Grisa – O 2.0 é esse que faz o básico, cumpre a lei de responsabilidade fiscal e passa a incorporar estas grandes funções. Hoje, no mundo, e principalmente no Brasil, você está demandando a gestão 3.0, que faz isso, mas ainda se preocupa com a questão do desenvolvimento, porque desenvolvimento sustentável e dinheiro no bolso das pessoas que moram ali também é importante, é a qualidade de vida, e com estratégia. Você passa a ter um foco estratégico. Polibio – Tem algum prefeito 3.0 no Brasil? Grisa – Tem, temos alguns. Temos em torno de 1%, eu diria. Dos 5660 municípios, nós temos hoje em torno de 50 a 60 municípios no Brasil com um tipo de entendimento de gestão 3.0. Polibio – Aqui no RS tem alguém?
  • 7. Grisa – Tem. O Jairo Jorge em Canoas. Ele tem levado essa noção estratégica de cidade... Polibio – Olha PT, heim...estou surpreso. Grisa – É, mas esta questão independe da questão partidária. Há gestores extremamente avançados em todos os partidos e gestores retrógados em todos os partidos. E em região também. Isso é outra coisa que atuando nacionalmente a gente aprende. Polibio – Você está dizendo que tem partido é muito mais avançado e o prefeito é atrasado? Grisa – Às vezes, sim. Você não tem unidade na questão partidária. Outra coisa é a questão regional. Polibio – Mas o que o Jairo Jorge fez? Vamos pegar o exemplo dele. Grisa – Jairo Jorge fez, por exemplo, a estratégia da cidade de Canoas. Canoas tem uma estratégia de cidade de 2011 a 2021. Em que se fez uma discussão, com mais de 600 pessoas da sociedade, em processo extremamente aberto. Polibio – Com que objetivo? Grisa – Com o objetivo “qual a cidade que nós vamos ser em 10 anos?”. Com ações objetivas e bem desenhadas. Polibio – Nesse caso específico de Canoas, o que eles querem ser? Grisa – Eles querem ser uma cidade mais atrativa, estão trabalhando para isso. Tanto que Canoas está se tornando um multipolo de serviços metropolitano. Você vê claramente que a cidade fez um rumo e ela está seguindo neste caminho. È um projeto que eles têm 43 iniciativas de 104 ações. Polibio – Você enxerga isso em Porto Alegre ou não? Grisa – Não. Porto Alegre é uma questão problemática à parte. Acho até que não é uma questão isolada de um ou outro governo, mas a gente sente a necessidade de Porto Alegre... Polibio – É uma questão para economistas ou psiquiatras Porto Alegre? Grisa – Acho que as duas coisas juntas. Acho que ainda é mais economista e gestores, essa questão psiquiatra a gente tem que passar por cima. Leandro- Na minha visão, na minha tese, é um problema de incentivo. Se nós temos uma empresa como um hospital de 800 funcionários, o que vai acontecer se eu for o gestor deste hospital e esse hospital, por exemplo, gastar mais do que arrecada, oferecer um serviço ruim, eventualmente um paciente morrer, o que vai acontecer comigo? Eu vou me dar mal. O que acontece com um político quando, na esfera onde ele trabalha, seja na prefeitura, no estado ou mesmo no país, se as coisas vão mal? Na pior das hipóteses ele não vai se reeleger. A lógica no incentivo, na responsabilidade das coisas, a gente vê o estado sendo gastador, nós inventamos um orçamento 15% maior do que a despesa. Isso eu não consigo fazer numa empresa. Se eu gastar 15% a mais do que eu receber, eu quebro. Se pegarmos desde o governo Fernando Henrique, 8 anos atrás, o tamanho do estado na economia, a cada ano, só cresce, e a lógica do estado não é uma lógica da iniciativa privada no sentido de responsabilidade direta, de eficiência. Como a gente poderia, numa escala de prefeitura - porque eu acho até que é mais fácil do que na escala federal, porque eu não estou ligado à Brasília, estou ligado na minha cidade - como poderíamos ter uma percepção e uma cobrança mais forte em relação aos resultados?
  • 8. Grisa – Eu já acho que isso está mudando bastante em função das redes sociais. Hoje há um controle social sobre os governos, vamos dizer que nem sempre correto, nem sempre imparcial, nem sempre qualificado, mas existe um controle social maior ao que existia há 10 ou 15 anos. Por outro lado também há uma legislação em cima da responsabilidade. Polibio – As redes sociais permitem que qualquer pessoa possa expor publicamente a sua demanda. Grisa – O grande pulo do gato é o seguinte: as lideranças púbicas nãos e deram conta que ser um bom gestor e ser um gestor transformador faz uma grande diferença e eleitoramente é muito bom. Não é pela pressão que isso virá e sim pela motivação. Leandro – Não teve um deputado que quando foi para a Comissão de Ética da Câmara, ai um repórter perguntou uma coisa e ele “estou me lixando para o povo, não estou nem ai” e foi reeleito. Polibio – Deputado Sérgio Moraes, PTB, de Santa Cruz do Sul. Leandro – Aqui do RS ainda. Polibio – É ex-prefeito de Santa Cruz do Sul. Leandro – É com isso que a gente tem que acabar. Polibio – E ele disso o seguinte: “estou me lixando para o povo e tem outra, esse povo para o qual estou me lixando vai me eleger de novo”. Leandro – E elegeu! Grisa – Isso só tem uma solução, a única solução é o voto. Polibio – Mas ai o sujeito vai lá e vota de novo no cara. Leandro – Talvez ele nem teve acesso a essa informação, ou não quis ter acesso, achou que não era importante. Esse é o nosso drama aqui no Brasil. Polibio – Ele até deu uma declaração depois – fazendo justiça para o Sérgio – eu fui repórter e eu sei como é isso, ele disse “olha, o repórter me irritou e eu acabei dizendo isso, mas não era o que eu queria dizer”... Grisa – Vocês sabem uma coisa sutil que fez melhorar muito já os governos? A necessidade de se registrar problema de governo no TRE, isso nos municípios e nos estados está fazendo uma diferença grande. Essas mudanças são lentas. O Brasil é um país de mudança lenta, faz parte da nossa cultura. Nós fomos um dos últimos países a abolir a escravatura no mundo, nós fomos o último país da América Latina a ter estabilidade econômica, nós somos lentos no nosso próprio desenrolar. Polibio – Vamos voltar a falar um pouquinho sobre Porto Alegre. Capital dos gaúchos, 1 milhão e 300 mil habitantes, centro de uma região metropolitana que expande muito. Hoje é uma cidade estritamente de serviços, se desindustrializou completamente. Em Porto Alegre ainda, os seus gestores nunca se perguntaram “o que nós queremos ser”. O que Porto Alegre pretende ser. Aliás, nem região metropolitana e nem o RS e nem o Brasil também. Grisa – A questão nacional, no Brasil existe uma inércia pelo seu tamanho natural que, no caso, a falta de direcionamento acaba não sendo tão grave. Porém, o RS e mais ainda a região de Porto Alegre, essa falta de direcionamento já está nos custando muito caro. Lembro que há 4 ou 5 anos, quando a gente começou a mostrar a situação de decadência relativa do RS e de Porto Alegre, existia uma resistência muito grande de alguns setores. Hoje já há uma unanimidade em torno disso. Nós temos é que evoluir dessa unanimidade
  • 9. para a construção das soluções, para virar o jogo. Nós vemos que a cidade de Porto Alegre tem uma dinâmica de transformação muito lenta, isso, em parte, pela falta de entendimento do que ela é e do que ela tem que ser. Polibio – Qual é nossa identidade do ponto de vista econômico... Grisa – Exatamente. Por exemplo, a cidade tem que colocar, nas suas características de produtividade para se refletir como centro de serviços, não apenas no âmbito regional e estadual, mas para ser... Polibio – Ou seja, uma vocação de Porto Alegre é serviço mesmo? Grisa – É serviço, mas serviço qualificado. Se você tem recursos humanos e serviços qualificados, e ainda tem, se tem essas condições, você tem que transformar isso em condição e não continuar sendo um centro exportador. Na atual geração, de profissionais que estão entrando, eu direi que 50% já é evasão para o centro do país, porque não tem mercado. Polibio – O pessoal mais qualificado usa ponte aérea, não é? Grisa – Usa ponte aérea e muita gente teimosa. Dizem que a gente vivem em ponte aérea, passa o fim de semana em Porto Alegre e acaba trabalhando lá. Polibio – Eu conheço vários profissionais que fazem ponte aérea. De ir na segunda e voltar na sexta, trabalha a semana toda lá. Pessoas altamente qualificadas. Grisa – Pela teimosia porque a gente gosta de lá, mas tem que transformar aqui. Tem um viés de Porto Alegre que não é bom. Se nós olharmos 5, 10, 11 anos, aqueles problemas que persistem, aquelas coisas que não são devidamente encaradas. Leandro – Acho que um dos problemas que não se dá a devida atenção é exatamente a questão da violência. Se fala de São Paulo, mas em São Paulo temos hoje o pior crime que é o homicídio, é uma taxa de 12 homicídios para 100 mil habitantes, aqui em Porto Alegre estamos em 55 já. Grisa – Mas a segurança é um pouco resultante das outras coisas que desandam. Nós temos que entender que somos a capital do estado mais meridional do Brasil, nós estamos do lado de um Mercosul que não está essas maravilhas. Para que você possa se posicionar competitivamente, minimamente numa escala nacional e mundial você tem que ser mais eficiente do que os outros. Tem que criar um sistema de produção de conhecimento que seja mais eficiente. A isso a gente ainda não deu a devida atenção, continuamos em Porto Alegre se enganando. Se enganando, sendo paliativo em cima das coisas. Um exemplo é o nosso aeromóvel que leva do aeroporto até o Trensurb, que é muito bonito. Ai eu pergunto: qual é o executivo que vai chegar às 11h da noite, vai pegar o aeromóvel, para pegar o trem e desembarcar na praça do mercado Público? Nessas coisas temos que ter uma visão melhor de realidade. Polibio – Eu estaria ali na estação, esperando com ele, com uma camisa de força. Grisa – Pensa o mesmo aeromóvel como um mecanismo de ligações entre esses bairros e o centro, seguindo o traçado da avenida Ipiranga. Nessas coisas Porto Alegre perdeu a característica de ser ousada, de ser inovadora. A cidade como um todo, não é apenas na gestão, porque o setor público reflete a cultura dos seus formadores de opinião. Leandro – É só andar ali pela antiga Perimetral, mais perto do centro, e ver os trilhos que estão ali de um aeromóvel de um projeto muito mais antigo. Polibio - 30 anos já.
  • 10. Grisa – Exato. Não é apenas os governos, os governos refletem o pensamento da sua formação de opinião. Acho que isso está mudando. Acho que nós já batemos no fundo do poço e há um certo movimento de reversão, em Porto Alegre, e RS. Leandro – Tem uma questão importante, já que nós trabalhamos com um público formado por investidores, você que tem um conhecimento em gestão pública, principalmente em cidades, qual seria sua dica para um investidor imobiliária, especialmente, o que ele teria que buscar numa cidade de local interessante, situação interessante para investir? Grisa – Um dos grandes problemas brasileiras é exatamente porque não há este planejamento e essa junção de pensamento positivo dos governos e iniciativa privada, é que você não tem movimentos planejados, movimentos concatenados. Se você for olhar o investimento imobiliário, ele é todo picadinho. De repente, numa rua que você tem uma casa, o cara pega e coloca um prédio de 20 andares. Polibio – Em Porto Alegre eu percebo exatamente isso, essa expansão imobiliária que está acontecendo é caótica, não obedece regra nenhuma. Grisa – No Brasil é assim, porque não há uma sinalização privada para “vamos recuperar esta área aqui, vamos regenerar esta área aqui fazendo um zoneamento correto e equilibrado”. Você cria um movimento em que você chama os investidores. Leandro – Um amigo meu foi morar num apartamento novo em Moema, um bairro de São Paulo que teve um grande crescimento imobiliário e ele demorava uma hora para sair do estacionamento do prédio dele, porque colocaram um prédio gigante, um do lado do outro, numa ruasinha pequena e não tinha como sair todo mundo no horário de pico. Grisa – O conceito de regeneração é que são áreas degradadas que passam a ser áreas regeneradas. Ai é que está a grande oportunidade dos investidores. Polibio – Esse é um tema que está aqui na pauta desde o início, a questão da degradação dos centros e a regeneração. O caso de Porto Alegre é emblemático por causa do projeto Cais Mauá, que é um projeto exatamente de recuperação do centro da cidade de Porto Alegre. Isso está andando a passos de tartaruga. Ela é emblemática até para o Brasil. Eu não conheço outro caso no Brasil, como esse aqui. Belém já fez isso e com sucesso, mas não conheço outro. Grisa – Rio de Janeira está fazendo o Porto Maravilha agora. Polibio – Lá está andando? Grisa – Lá está andando. Polibio – O Grisa tem feito trabalhos em várias regiões do país, está fazendo um trabalho específico aqui em Canoas. Nós já falamos sobre o que está fazendo o prefeito Jairo Jorge que, segundo o Grisa, é um bom exemplo para os demais prefeitos do país; ele conseguiu êxito no que a população quer para daqui dez anos. Você está fazendo um trabalho também em São Leopoldo, ali é mais difícil, tem que dar uma de bombeiro, porque teve uma herança maldita. A Agência Futuro tem trabalhado também em regiões. Grisa – Na questão nacional, como por exemplo o Programa Nacional de Agentes de Desenvolvimento, que é um programa que nós fazemos com a Confederação dos Municípios, Sebrae Nacional, são 1500 agentes de desenvolvimento em todo o país. Polibio – O que é isso, agende de desenvolvimento?
  • 11. Grisa – É um cara que é preparado, treinado. Polibio – Pelas prefeituras? Grisa – Não, não. Pelo Sebrae Nacional e pela Confederação Nacional dos Municípios. Tem uma metodologia específica e esse cara vai atuar como se fosse um secretário municipal na questão de desenvolvimento dos municípios. É óbvio que você tem agentes melhores e agentes piores. Polibio – Mas eles são funcionários dos municípios? Grisa – São funcionários dos municípios. Você prepara ele para ser um cara com uma visão mais estratégica. Polibio – Aqui em Porto Alegre tem? Grisa – Tem, no RS tem em um bom número de municípios. Leandro – Mas qual é o trabalho específico da agência futuro, como funciona este trabalho? Grisa – Nós trabalhamos como consultoria, trabalhamos junto às organizações nacionais, como o Sebrae Nacional, nós estamos fazendo toda uma nova metodologia de desenvolvimento econômico local, desenvolvimento econômico de cidades; a Confederação Nacional dos Municípios; há alguns municípios como Canoas e São Leopoldo. Leandro – Mas trabalham diretamente para uma prefeitura? Grisa – Podemos trabalhar também diretamente com uma prefeitura. Polibio – Já está trabalhando para São Leopoldo, para Canoas. Grisa – Já trabalhamos para outros municípios do país também. Às vezes contratados por organismos terceiros, e também por investidores no sentido de analisar a questão do investidor precisando melhorar a sua cidade. Polibio – Gustavo, nesse trabalho que você tem realizado, vamos tocar na questão das regiões centrais degradadas. Nós temos um caso específico em Porto Alegre que é a região do Cais Central, o Cais Mauá. É uma região degradada nossa, como é a maioria das regiões centrais das grandes cidades. Mas há um projeto que a prefeitura liberou, o governo do estado também, está na mão de empreendedores e esses empreendedores não estão caminhando. Por incrível que pareça, a prefeitura abriu tudo, o governo do estado abriu tudo e o empreendedor privado não dá andamento ao projeto. Está previsto um investimento de meio bilhão de reais e a coisa não anda. Grisa – A questão do centro de Porto Alegre, e eu estudei bastante isso em 2010, esse era um projeto que nós tínhamos com algumas entidades aqui de Porto Alegre, baseados num trabalho que nós já tínhamos feito no centro do Rio de Janeiro. Nós começamos esse movimento lá no centro do Rio de Janeiro, em 2009 e 2010, quando eu estava no Rio. Polibio – Esse que é de recuperação de uma parte. Grisa – O Cais Mauá é uma grande âncora de mudança no centro de Porto Alegre, mas precisa de outras além disso. A grande questão do centro da cidade é que você precisa pensar que precisa mudar o padrão de habitação. O padrão do tipo de estabelecimento que ali se coloca. Não é simplesmente fazendo a chamada revitalização que é pintar uma praça, arruma uma pracinha, não é por ai. Os negócios que lá estão, perdem milhões. É só você entrar no negócio de hotel, TripAdviser, e você vê isso. Quem frequenta os hotéis do
  • 12. centro muitas vezes diz “o hotel é muito bom, mas a região é terrível”. Esta visão, para uma visão de uma nova ocupação econômica de todo o centro. É claro que o Cais Mauá é importante, porque ele faz uma âncora, ai você precisaria ter, no mínimo, mais uma ou duas âncoras para fazer esse movimento de direcionamento de investidores para esta área. Polibio – Mas não tem planejamento de ninguém nisso que você está dizendo. Grisa – É um estado em que o planejamento é tímido. Leandro – Quais seriam estas outras âncoras? Grisa – Você pode criar mais uma ou duas artérias. Outras artérias para fazer esse desenvolvimento. Polibio – Tipo novos Cais Mauá ali por perto? Grisa – Não, novos investidores, você faz 5 ou 6 novos investimentos que acontecem ao mesmo tempo. Leandro – Tipo uma rua de comércio diferenciado. Grisa – Exato. Por exemplo, em São Paulo se fez na rua Vaiandava, no centro, tradicional. Mas por quê/ Porque não se fez apenas embelezamento e revitalização, se fez um profundo “vamos mudar o tipo de estabelecimento que tem aqui. Polibio – Os empreendedores e investidores daqui imaginam, que com o Cai Mauá, funcionando como uma âncora ali, ela revitaliza aquela zona e espontaneamente... Grisa – Não é espontâneo. É preciso haver um movimento de organização nisso. Claro que ele vai causar alguns movimentos de conflito, mas que ele aconteça na rapidez e nos padrões equilibrados. Por exemplo, a Avenida Cepulveda, que é exatamente aquela linha que liga o antigo prédio do cinema imperial, do centro de Porto Alegre, até o Cais do Porto, que tem uma entrada bonita ali, que é tombado. Isso ali, por exemplo, se pensarmos em Copa do Mundo, em corredor, poderia ser um grande corredor, com grandes empreendedores, uma coisa de visão bonita para a cidade. E o que acontece? Nada! Então, fica a iniciativa privada esperando o setor público fazer. O setor público esperando a iniciativa privada fazer e ninguém faz um investimento verdadeiro. Falta uma articulação e a visão de que o investimento para isso é pesado, não é uma coisa tico-tico. Polibio – Só no Cais Mauá é 500 bilhões de reais. Leandro – Quem puxaria esta corda, a prefeitura ou os investidores? Grisa – Pode ser qualquer um. Mas enquanto este movimento não acontecer de uma maneira articulada, isso vai demorar anos. Eu não tenho a menor dúvida de que em 20 ou 30 anos, o centro de Porto Alegre e o Floresta serão regiões novamente valorizadas. Até pela inércia e pela lógica da cidade. Há condiçções de você criar movimentos articulados para que isso aconteça da maneira certa. Polibio – Nós só falamos de coisas ruins, mas podemos falar de coisas boas. O próprio projeto do Cais Mauá é uma coisa boa, embora não tenha essas subâncoras como você diz, mas é um investimento urbano importantíssimo. Além disso nós temos dois novos, poderosos e moderníssimos estádios, que é a Arena do grêmio e do Internacional. Aquilo é uma ventosa que puxa o desenvolvimento no entorno deles. Grisa – E criadouros de regeneração. Duas âncoras de regeneração. Polibio – Tem a revitalização que a prefeitura está fazendo em vias públicas, estes grandes viadutos que estão em execução, parece que vai mudar drasticamente.
  • 13. Grisa – Vai melhorar. O que nós precisamos evoluir é para dar um fechamento estratégico melhor para isso tudo. Polibio – Porque a infraestrutura material da cidade, do ponto de vista imobiliário urbano, me parece que está bem colocada. Grisa – Está bem projetada, me parece que dentro de alguns anos isso vai melhorar muito. A questão é: o que nós vamos fazer com isso? Nós temos que pensar como nós vamos atrás desse quepe competitivo.