O documento conta uma fábula sobre um "Pé-de-meia Socialista" criado pelo governo para cuidar da previdência dos cidadãos. Ratazanas administravam o sistema e faziam muitos buracos, deixando pouco dinheiro para os aposentados. No final, o sistema acabou e as pessoas passaram a cuidar de si mesmas novamente.
1. 16-01-2013
De Jacinto Flexa
QUEIJO SUÍÇO NA PREVIDÊNCIA
— Crianças, agora vão todos pra cama, que eu vou contar uma historinha.
— Oba! Uma historinha!
— Tem bruxas, titia?
— Tem um monte delas.
— Tem príncipe encantado?
— Não. Passou muito longe.
— E tem sapo?
— Tantos, que nem dá pra contar.
— E tem velhinha que o lobo come?
— Ora, se ficarem fazendo tantas perguntas, não consigo contar a
historinha.
— Tá bem, tia, então conta.
— Começa assim: Era uma vez, num país longe, muito longe, vivia um
povo que tinha um costume antigo, muito antigo, chamado pé-de-meia.
— O que é pé-de-meia, tia?
— Vou explicar. Quando as pessoas envelhecem, vão perdendo a
2. capacidade de trabalhar; por isso guardam alguma coisa enquanto podem,
para não faltar nada no fim da vida. Isso era o pé-de-meia deles.
— E todo mundo tinha pé-de-meia?
— Às vezes não dava pra guardar muito, mas cada um guardava o que
podia. Nunca faltava, pois os parentes e amigos também ajudavam quando
era necessário. Mas alguns sabidos acharam que as pessoas não sabem
fazer pé-de-meia.
— Os sabidos que acharam isso foram os sapos?
— Não. Foram as raposas e o lobo mau. E resolveram fazer um pé-demeia grandão.
— Assim do tamanho de um caminhão, tia?
— Maior, muito maior. E o nome dele era Injusto e Nocivo Pé-demeiaSocialista.
— Nome feio, titia!
— Feio não era só o nome, não. Todo empregado ficou obrigado a ser
sócio do pé-de-meia, e pagava caro pra isso. O patrão tinha de pagar uma
parte, em vez de pagar mais aos empregados. O governo prometeu dar
outra parte, mas esqueceu. Juntando tudo, podia dar mais um salário pra
cada um no fim de três ou quatro meses. E o trabalhador ia ganhar mais de
quinze salários por ano, em vez de doze.
— Aí o pé-de-meia de cada um ia aumentar muito, não é, tia?
— Claro! E nem precisavam envelhecer para usar o pé-de-meia.
— Mas o pé-de-meia grandão deu certo?
— Acontece que ninguém era dono dele. Quando é assim, aparecem uns...
uns...
— Sapos, titia?
— Não, é melhor ratazanas. Elas foram furando o pé-de-meia. Uma
mordida aqui, um buraco ali, um pedaço pra quem não é sócio, e o pé-demeia grandão ficou com mais buracos do que queijo suíço, era quase tudo
buraco.
3. — Puxa!! E os velhinhos recebiam o que saía dos buracos?
— Para os velhinhos ia só uma partezinha. A maior parte sumia.
— Mas não era tudo dos velhinhos?
— Era, mas outros administravam pra eles, e aí começou a faltar dinheiro.
— Chííí! E como é que resolveram?
— As ratazanas pensaram assim: Se falta dinheiro, tem de entrar mais
dinheiro. Então obrigaram o trabalhador e o patrão a pagar mais
contribuição, imposto, seguro, multa. Se juntassem tudo para aumentar os
salários, cada um ia receber quase vinte salários por ano. Todo mundo ia
viver muito melhor, cada um ia fazer seu próprio pé-de-meia. Mas as
ratazanas continuaram a fazer buracos.
— Se sai mais do que entra, acaba esvaziando, não é, tia?
— Isso mesmo. O queijão foi sumindo... sumindo... sumiu.
— E os velhinhos, coitados, como é que ficaram?
— As ratazanas reduziram os direitos deles. Espremeram daqui, cortaram
dali, enganaram de lá, e sobrou um tantinho de nada. Cada velhinho ficou
com mais buraco do que queijo. Pior, só podia usar o pé-de-meia quando
ficasse muito, muito velhinho.
— Mas ninguém botou uma ratoeira para as ratazanas, titia?
— Não, porque as ratazanas eram muito espertas. E pensaram no último
buraco, que seria assim: os velhinhos só terão direito ao pé-de-meia depois
que morrerem.
— Puxa! Que pé-de-meia mais esquisito!
— Aí uma fada soprou no ouvido deles: O melhor é acabar com isso!
— E acabaram?
— Houve muita choradeira, mas resolveram acabar com o queijão. Aí
todo mundo passou a ganhar mais, e cada um fez de novo seu pé-de-meia.
— E as ratazanas morreram?
4. — Não, crianças. Elas nunca morrem, foram baixar noutra freguesia. E
agora chegou a hora de dormir.
— Mas a senhora disse que tinha bruxas, e eu não vi nenhuma.
— Você deve ter cochilado, está cheio delas por aí. E não se esqueçam:
depois eles viveram felizes para sempre.(www.jacintoflecha.blog.br)
(*) Jacinto Flecha é médico e colaborador da Abim
Fonte: Agência Boa Imprensa – (ABIM)