O recurso interposto pelo Ministério Público de Santa Catarina, o qual visa a suspensão das atividades do estabelecimento “Havanna Bar e Restaurante”, localizado no Município de Navegantes, foi aceito em 2º grau pelo Tribunal de Justiça de Santa Catarina e reverteu o pedido negado anteriormente pela 2ª Vara Cível.
Resolução Forças Armadas - direitos Humanos e 1964.pdf
Suspensão de atividade de bar por poluição sonora acima dos limites legais
1. Agravo de Instrumento n. 2014.000663-4, de Navegantes
Relator: Des. Sérgio Roberto Baasch Luz
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. BAR
E RESTAURANTE. ATIVIDADES DE CASA NOTURNA.
REALIZAÇÃO DE EVENTOS COM MÚSICA AO VIVO E/OU
SOM MECÂNICO. ESTABELECIMENTO QUE EMITE RUÍDOS
SONOROS ACIMA DOS NÍVEIS PREVISTOS EM LEI
MUNICIPAL. POLUIÇÃO SONORA. NECESSIDADE DE
PROMOVER A ADEQUAÇÃO ACÚSTICA DO LOCAL.
PRESENÇA DOS REQUISITOS FUMUS BONI JURIS E
PERICULUM IN MORA. SUSPENSÃO DAS ATIVIDADES.
RECURSO PROVIDO.
"1. Existentes os requisitos autorizadores - fumus boni iuris e
periculum in mora -, impõe-se o deferimento do pedido de liminar
a fim de suspender a atividade poluidora sonora enquanto não for
promovido o devido isolamento acústico do estabelecimento
comercial em questão.
2. Comprovada a emissão de ruídos acima do limite
estabelecido em lei, impõe-se ao infrator a obrigação de fazer
cessar imediatamente as atividades poluentes" (TJSC, Agravo de
Instrumento n. 2008.042215-2, de São José, rel. Des. Luiz Cézar
Medeiros, j. 18.11.2008). (Agravo de Instrumento n.
2012.071693-5, de Brusque, rel. Des. João Henrique Blasi, j.
18.12.2012)
Vistos, relatados e discutidos estes autos de Agravo de Instrumento n.
2014.000663-4, da comarca de Navegantes (2ª Vara Cível), em que é agravante
Ministério Público do Estado de Santa Catarina, e agravado C.B.A.M Bar &
Restaurante Ltda ME:
A Segunda Câmara de Direito Público decidiu, por votação unânime, dar
provimento ao recurso para determinar a suspensão das atividades de casa noturna
da sociedade C.B.A.M. Bar & Restaurante Ltda ME, até que sejam adotadas as
medidas necessárias para evitar/inibir a propagação de poluição sonora, que deverá
ser atestada pelo órgão ambiental competente. Custas na forma da lei.
Participaram do julgamento, realizado no dia 18 de novembro de 2014,
2. os Exmos. Srs. Des. João Henrique Blasi, que o presidiu, e Des. Cid Goulart.
Funcionou como representante do Ministério Público a Dra. Lenir Roslindo Piffer.
Florianópolis, 20 de novembro de 2014.
Sérgio Roberto Baasch Luz
RELATOR
Gabinete Des. Sérgio Roberto Baasch Luz
3. RELATÓRIO
Na Comarca de Navegantes o representante do Ministério Público do
Estado de Santa Catarina ajuizou ação civil pública em face de C.B.A.M. Bar &
Restaurante Ltda ME, cujo nome fantasia é Havanna Bar e Restaurante, objetivando,
em sede de liminar, a suspensão das atividades da sociedade ré, até que esta
promovesse a adequação acústica do estabelecimento comercial para inibir a
propagação de poluição sonora.
A liminar foi deferida. (fls. 58-62)
Houve pedido de reconsideração, o qual foi acolhido pelo juiz de
primeiro grau, nos seguintes termos:
A alegação da requerida merece acolhimento.
As medições apresentadas por meio do laudo de fls. 12/16 demonstram que,
inobstante estar a casa noturna funcionando ou não, o ruído produzido do lado de
fora, seja em frente, ao lado ou aos fundos do estabelecimento, pouco variam,
apresentando-se todos no limite ou pouco acima daquele fixado administrativamente.
Vale dizer, se existe ruído excessivo na localidade em que a requerida se
encontra, isso se deve bem menos às suas atividades do que a outros fatores de
ruído do meio externo.
Portanto, a poluição sonora percebida na localidade não pode ser imputada à
requerida, ao menos de forma isolada, sem que se demonstre, de maneira mais
acurada, todos os responsáveis pelo dano ambiental reclamado à inicial.
Ante o exposto, reconsidero a decisão impugnada, REVOGANDO a liminar de
fls. 21/25. (fls. 79-80)
Irresignado, o representante ministerial interpôs agravo de instrumento
com pedido de efeito suspensivo, postulando a reforma da decisão interlocutória, ao
argumento de que as atividades desenvolvidas pela agravada comprovadamente
causam ruídos que excedem os limites previstos na legislação municipal,
evidenciando-se, portanto, a produção de poluição sonora, de modo que deve ser
decretada a paralisação das suas atividades até que o estabelecimento comercial
receba o necessário tratamento acústico.
O pedido de efeito suspensivo foi indeferido. (fls. 85-86)
Instada a se manifestar, a Procuradoria-Geral de Justiça, em parecer da
lavra do Dr. Paulo Cezar Ramos de Oliveira, opinou pelo provimento do reclamo, para
que se determine a suspensão das atividades da sociedade agravada até que esta
providencie a adequação acústica no local. (fls. 95-99)
É o relatório.
VOTO
Como cediço, "No recurso de agravo de instrumento cabe ao Tribunal de
Justiça verificar o acerto ou não da decisão interlocutória, de acordo com o pedido
formulado pela parte, sendo-lhe defeso examinar alegações e provas não analisadas
em primeiro grau de jurisdição, sob pena de supressão de instância." (Agravo de
Instrumento n. 2006.039452-7, de Balneário Camboriú, rel. Des. Roberto Lucas
Gabinete Des. Sérgio Roberto Baasch Luz
4. Pacheco, j. em 13.09.2007).
Na hipótese, as razões recursais devem se restringir a verificação da
ocorrência dos requisitos autorizadores da antecipação dos efeitos da tutela.
Com efeito, a concessão da tutela antecipada requer, sempre, o
cumprimento dos requisitos legais insculpidos no artigo 273 do Código de Processo
Civil, a saber: a) a prova inequívoca da verossimilhança da alegação; b) o fundado
receio de dano irreparável ou de difícil reparação, ou o evidente abuso de direito de
defesa ou o manifesto propósito protelatório do réu; e, na forma mitigada, c) a
reversibilidade dos fatos ou dos efeitos decorrentes da execução da medida.
Nas palavras do eminente Ministro do Superior Tribunal de Justiça, Luiz
Fux, "O art. 273 do CPC, com a sua nova redação, permite a tutela antecipada toda
vez que a prova inequívoca convença o juízo da verossimilhança da alegação de que
o direito objeto do judicium submete-se a risco de dano irreparável ou de difícil
reparação."
Portanto, o propósito da tutela antecipada é exatamente possibilitar que
se alcance o objetivo final do pleito quando este se apresente verossímil o bastante
para configurar o fumus boni iuris e se encontre ameaçado pela demora do
provimento judicial definitivo, constituindo, desta forma, o periculum in mora.
Adianto, desde logo, que a decisão interlocutória atacada deve ser
reformada, pois que efetivamente preenchidos os requisitos insculpidos no art. 273 do
CPC, tendo em vista que as atividades desenvolvidas pela agravada, segundo
indicam os elementos constantes dos autos, excedem os níveis de ruído previstos na
legislação municipal para a região em que situada, o que está a propagar poluição
sonora, atormentando, consequentemente, a vizinhança do entorno.
A propósito, vale transcrever parte que interessa da Resolução n. 1 de
1990 do Conselho Nacional do Meio Ambiente – CONAMA:
Considerando que os problemas dos níveis excessivos de ruído estão incluídos
entre os sujeitos ao Controle da Poluição de Meio Ambiente;
Considerando que a deterioração da qualidade de vida, causada pela poluição,
está sendo continuamente agravada nos grandes centros urbanos;
Considerando que os critérios e padrões deverão ser abrangentes e de forma a
permitir fácil aplicação em todo o Território Nacional, RESOLVE:
I - A emissão de ruídos, em decorrência de qualquer atividades indus-triais,
comerciais, sociais ou recreativas, inclusive as de propaganda política. obedecerá,
no interesse da saúde, do sossego público, aos padrões, critérios e diretrizes
estabelecidos nesta Resolução.
II - São prejudiciais à saúde e ao sossego público, para os fins do item anterior
aos ruídos com níveis superiores aos considerados aceitáveis pela norma NBR
10.152 - Avaliação do Ruído em Áreas Habitadas visando o conforto da comunidade,
da Associação Brasileira de Normas Técnicas - ABNT.
No Município de Navegantes os limites para a produção de ruídos
encontra previsão na Lei Complementar n. 55/2008 (Plano Diretor).
O estabelecimento comercial da agravada está inserido em Macrozona
Urbana de Consolidação, o que, consoante os termos do art. 228 da Lei
Complementar n. 55/2008, o padrão básico de emissão de som para essa área é de
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5. 50 (cinquenta) decibéis no período diurno e 45 (quarenta e cinco) decibéis no período
noturno.
Da vistoria realizada in loco realizada pela Fundação Municipal do Meio
Ambiente de Navegantes – FUMAN, extrai-se a seguinte conclusão:
11. Relato de campo: Visando atender a apuração de possível poluição
sonora decorrente de atividade comercial e shows realizados no estabelecimento,
estive no local para realizar a mediação do som proveniente do empreendimento.
Foram realizadas medições do ruído ambiente na frente do estabelecimento, por
cinco minutos, e obtida a média de 67,85 dB, logo 68 dB(A);
Também foi realizada a mediação na lateral do empreendimento, o 1º próximo
a residência mais próxima (65 dB as 22h e 69 dB as 00h45min) e outra medição aos
fundos do empreendimento 2º (59 dB as 22h e 62 dB as 00h45min), no beco José
Thiago Costa, todas as medições com intervalo de tempo de cinco minutos.
12. Parecer de vistoria: Através dos dados obtidos na visita de campo,
constatamos que o valor limite é de 63 dB, ou seja, ruído ambiente. Nestes casos em
frente e na lateral do empreendimento os níveis sonoros estão acima do limite, Leq =
68 dB(A) > Lra = 63 dB(A) e Leq = 69 dB(A) > Lra = 63 dB(A). (fl. 50)
Muito embora o ruído ambiente esteja acima do padrão recomendado
pelo Plano Diretor para a região, os níveis sonoros produzidos pelas atividades
comerciais da agravada superam o ruído ambiente, o que agrava e potencializa a
emissão de poluição sonora, prejudicando, por conseguinte, a população vizinha.
Ainda que seja necessária a realização de nova perícia, escorado na
prudência e na cautela, entendo que a suspensão das atividades desenvolvidas pela
sociedade agravada no estabelecimento em questão é medida que se impõe até que
a sociedade empresária ora agravada promova o adequado tratamento acústico
exigido pelos órgãos responsáveis.
A título de reflexão, vale destacar o que disse o eminente Ministro
Herman Benjamin ao relatar REsp. n. 1051306/MG:
"[...] 3. A poluição sonora, mesmo em área urbana, mostra-se tão nefasta aos
seres humanos e ao meio ambiente como outras atividades que atingem a "sadia
qualidade de vida, referida no art. 225, caput, da Constituição Federal. 4. O direito ao
silêncio é uma das manifestações jurídicas mais atuais da pós-modernidade e da
vida em sociedade, inclusive nos grandes centros urbanos. 5. O fato de as cidades,
em todo o mundo, serem associados à ubiqüidade de ruídos de toda a ordem e de
vivermos no país do carnaval e de inumeráveis manifestações musicais não retira de
cada brasileiro o direito de descansar e dormir, duas das expressões do direito ao
silêncio, que encontram justificativa não apenas ética, mas sobretudo fisiológica [...]"
A jurisprudência desta Corte de Justiça, em casos análogos, determina a
suspensão imediata das atividades dos propagadores de poluição sonora,
condicionando sua continuidade à adequação das exigências previstas na lei,
confira-se:
AÇÃO CIVIL PÚBLICA - AMBIENTAL - POLUIÇÃO SONORA - SENTENÇA -
TRÂNSITO EM JULGADO - CUMPRIMENTO - IMPRESCINDIBILIDADE -
INTERDIÇÃO DE ESTABELECIMENTO
Comprovada a emissão de ruídos acima do limite estabelecido em lei,
impõe-se ao infrator a obrigação de fazer cessar imediatamente as atividades
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6. poluentes ou, havendo interesse em sua continuidade, adaptar-se às exigências
legais e administrativas.
A interdição do estabelecimento poderá ser revista pelo Juízo a quo mediante
verificação do cumprimento do decisum e das adequações nele impostas. (Agravo
de Instrumento n. 2011.000156-3, de Sombrio, rel. Des. Luiz Cézar Medeiros, j.
26.4.2011)
Ainda:
AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. POLUIÇÃO SONORA.
NECESSIDADE DE ISOLAMENTO ACÚSTICO. INTERDIÇÃO DE CLUBE SOCIAL.
POSSIBILIDADE. DECISÃO MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.
"1. Existentes os requisitos autorizadores - fumus boni iuris e periculum in mora
-, impõe-se o deferimento do pedido de liminar a fim de suspender a atividade
poluidora sonora enquanto não for promovido o devido isolamento acústico do
estabelecimento comercial em questão.
2. Comprovada a emissão de ruídos acima do limite estabelecido em lei,
impõe-se ao infrator a obrigação de fazer cessar imediatamente as atividades
poluentes" (TJSC, Agravo de Instrumento n. 2008.042215-2, de São José, rel. Des.
Luiz Cézar Medeiros, j. 18.11.2008). (Agravo de Instrumento n. 2012.071693-5, de
Brusque, rel. Des. João Henrique Blasi, j. 18.12.2012)
Entendo que, por ora, isso é suficiente para caracterizar o fumus boni
juris, e assim determinar tão somente a suspensão das atividades de casa noturna
desenvolvidas pela agravada.
Por sua vez, o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação
– periculum in mora – também está configurado, tendo em vista que a continuidade
dos eventos noturnos com realização de shows e/ou música mecânica causa poluição
sonora, tendo em vista as atuais condições do estabelecimento, o que afeta o direito à
sadia qualidade de vida, ao sossego e ao silêncio dos habitantes do entorno.
Pelo exposto, voto no sentido de dar provimento ao recurso para
conceder a liminar, determinando tão somente a suspensão das atividades de casa
noturna da sociedade C.B.A.M. Bar & Restaurante Ltda ME, até que esta promova as
medidas necessárias para evitar/inibir a propagação de poluição sonora, que deverá
ser atestada pelo órgão ambiental competente.
É o voto.
Gabinete Des. Sérgio Roberto Baasch Luz