O texto descreve Samuel, um homem casado que foge de sua vida doméstica todos os domingos indo para um hotel barato. Lá, ele dorme durante a tarde e sonha com ser perseguido. Quando acorda, ele rapidamente volta para casa. O texto sugere que Samuel está insatisfeito com sua vida e busca escapar através desses domingos longe de casa.
2. • O que será que este título quer dizer?
• Sobre o que este texto falará? Qual será o
assunto do mesmo?
• Quando é que fazemos uma PAUSA em
nossa vida? Alguém aqui já deu uma pausa
em sua vida?
Aqui trabalha-se o levantamento de hipóteses, ativação do conhecimento prévio,
antecipação...
?? PAUSA ??
3. Apresentação do texto para o aluno
PAUSA
Às sete horas o despertador tocou. Samuel
saltou da cama, correu para o banheiro. Fez a
barba e lavou-se. Vestiu-se rapidamente e sem
ruído. Estava na cozinha, preparando sanduíches,
quando a mulher apareceu, bocejando:
—Vais sair de novo, Samuel?
Fez que sim com a cabeça. Embora jovem,
tinha a fronte calva; mas as sobrancelhas eram
espessas, a barba, embora recém-feita, deixava
ainda no rosto uma sombra azulada. O conjunto
era uma máscara escura.
—Todos os domingos tu sais cedo – observou
a mulher com azedume na voz.
—Temos muito trabalho no escritório – disse o
marido, secamente.
Ela olhou os sanduíches:
—Por que não vens almoçar?
—Já te disse: muito trabalho. Não há tempo.
Levo um lanche.
A mulher coçava a axila esquerda. Antes que
voltasse a carga, Samuel pegou o chapéu:
—Volto de noite.
As ruas ainda estavam úmidas de cerração.
Samuel tirou o carro da garagem. Guiava
vagarosamente, ao longo do cais, olhando os
guindastes, as barcaças atracadas.
Estacionou o carro numa travessa quieta. Com o
pacote de sanduíches debaixo do braço, caminhou
apressadamente duas quadras. Deteve-se ao chegar a
um hotel pequeno e sujo. Olhou para os lados e entrou
furtivamente. Bateu com as chaves do carro no balcão,
acordando um homenzinho que dormia sentado numa
poltrona rasgada. Era o gerente. Esfregando os olhos,
pôs-se de pé:
—Ah! Seu Isidoro! Chegou mais cedo hoje. Friozinho
bom este, não é? A gente...
—Estou com pressa, seu Raul – atalhou Samuel.
— Está bem, não vou atrapalhar. O de sempre -
Estendeu a chave.
Samuel subiu quatro lanços de uma escada
vacilante. Ao chegar ao último andar, duas mulheres
gordas, de chambre floreado, olharam-no com
curiosidade:
—Aqui, meu bem! – uma gritou, e riu: um cacarejo
curto.
Ofegante, Samuel entrou no quarto e fechou a
porta a chave. Era um aposento pequeno: uma cama de
casal, um guarda-roupa de pinho: a um canto, uma
bacia cheia d’água, sobre um tripé. Samuel correu as
cortinas esfarrapadas, tirou do bolso um despertador de
viagem, deu corda e colocou-o na mesinha de
cabeceira.
4. Puxou a colcha e examinou os lençóis com o
cenho franzido; com um suspiro, tirou o casaco e
os sapatos, afrouxou a gravata. Sentado na cama,
comeu vorazmente quatro sanduíches. Limpou os
dedos no papel de embrulho, deitou-se fechou os
olhos.
Dormir.
Em pouco, dormia. Lá embaixo, a cidade
começava a move-se: os automóveis buzinando,
os jornaleiros gritando, os sons longínquos.
Um raio de sol filtrou-se pela cortina, estampou
um círculo luminoso no chão carcomido.
Samuel dormia; sonhava. Nu, corria por uma
planície imensa, perseguido por um índio montado
o cavalo. No quarto abafado ressoava o galope. No
planalto da testa, nas colinas do ventre, no vale
entre as pernas, corriam. Samuel mexia-se e
resmungava. Às duas e meia da tarde sentiu uma
dor lancinante nas costas. Sentou-se na cama, os
olhos esbugalhados: o índio acabava de trespassá-
lo com a lança. Esvaindo-se em sangue, molhando
de suor, Samuel tombou lentamente; ouviu o apito
soturno de um vapor. Depois, silêncio.
Às sete horas o despertador tocou. Samuel
saltou da cama, correu para a bacia, lavou-se.
Vestiu-se rapidamente e saiu.
Sentado numa poltrona, o gerente lia uma
revista.
— Já vai, seu Isidoro?
—Já – disse Samuel, entregando a chave. Pagou,
conferiu o troco em silêncio.
—Até domingo que vem, seu Isidoro – disse o
gerente.
—Não sei se virei – respondeu Samuel, olhando
pela porta; a noite caia.
—O senhor diz isto, mas volta sempre –
observou o homem, rindo.
Samuel saiu.
Ao longo dos cais, guiava lentamente. Parou
um instante, ficou olhando os guindastes
recortados contra o céu avermelhado. Depois,
seguiu. Para casa.
(in: Alfredo Bosi, org. O conto brasileiro
contemporâneo. São Paulo: Cultrix, 1977. p. 275)
5. Feita a leitura, que se realizará de maneira coletiva, os alunos
trabalharão o vocabulário do texto (com o auxílio do dicionário), a
fim de melhorarem e ampliarem o entendimento do mesmo.
6. Discutindo sobre o texto:
1- Nesse conto, o narrador é observador. Ele narra o que acontece na vida da
personagem Samuel/Isidoro.
a) Quanto tempo transcorre entre o início e o final do conto?
b) Como o narrador informa o leitor sobre o tempo decorrido?
2- O tempo e o espaço são elementos importantes para a construção do sentido das
narrativas. No conto “Pausa”:
a) Onde ocorrem os fatos?
b) Qual deles é mais destacado? Justifique sua resposta.
c) Como se caracteriza esse lugar?
d) Que relação há entre o título, o lugar onde ocorre a maioria dos fatos e o
tempo em que acontece a história?
e) O trajeto que Samuel faz até o hotel, nos traz informações a respeito do
espaço onde acontece a narrativa. Através delas é possível determinar qual o tipo
de cidade que a personagem vive? Ela se parece com a sua?
Aqui será trabalhada a localização e comparações de informações, a generalização e a produção de
inferências.
7. AO VER ESTAS IMAGENS...É POSSÍVEL PERCEBER ALGUMA SEMELHANÇA COM
O TEXTO? OU ELAS SÃO TOTALMENTE DIFERENTES?
8. O que o filme tem em comum com o texto Pausa ?
Como as personagens de ambos os gêneros (conto e filme) fogem da realidade
em que se encontram?
Existe algum ou alguns momentos no filme que assim como no conto sugerem
uma mudança na vida de suas personagens?
A mudança acontece somente no cenário(visual) ou ela ocorre também no
textual (falas/linguagens) ? E esta mudança afeta o seu psicológico, sua
personalidade?
10. Será que esta pausa relatada por Mario Quintana é a
mesma relatada por Moacyr?
“...E sinto que, enquanto eu não puder captar a sua implícita
imagem-poema, a inquietação perdurará...”
A inquietação que toma conta do autor é semelhante a que percebe-se
na vida de Isidoro/Samuel?
11. História de passarinho
Lygia Fagundes Telles
Um ano depois os moradores do bairro ainda se lembravam do homem de cabelo ruivo que enlouqueceu e sumiu de casa.
Ele era um santo, disse a mulher abrindo os braços. E as pessoas em redor não perguntaram nada e nem era preciso,
perguntar o que se todos já sabiam que era um bom homem que de repente abandonou casa, emprego no cartório, o filho
único, tudo. E se mandou Deus sabe para onde.
Só pode ter enlouquecido, sussurrou a mulher, e as pessoas tinham que se aproximar inclinando a cabeça para ouvir melhor.
Mas de uma coisa estou certa, tudo começou com aquele passarinho, começou com o passarinho.
Que o homem ruivo não sabia se era um canário ou um pintassilgo. Ô, Pai! caçoava o filho, que raio de passarinho é esse que
você foi arrumar?!
O homem ruivo introduzia o dedo entre as grades da gaiola e ficava acariciando a cabeça do passarinho que por essa época
era um filhote todo arrepiado, escassa a plumangem de um amarelo-pálido com algumas peninhas de um cinza-claro.
Não sei, filho, deve ter caído de algum ninho, peguei ele na rua, não sei que passarinho é esse.
O menino mascava chicle. Você não sabe nada mesmo, Pai, nem marca de carro, nem marca de cigarro, nem marca de
passarinho, você não sabe nada.
Em verdade, o homem ruivo sabia bem poucas coisas. Mas de uma coisa ele estava certo, é que naquele instante gostaria de
estar em qualquer parte do mundo, mas em qualquer parte mesmo, menos ali. Mais tarde, quando o passarinho cresceu, o
homem ruivo ficou sabendo também o quanto ambos se pareciam, o passarinho e ele.
Ai!, o canto desse passarinho, queixava-se a mulher. Você quer mesmo me atormentar, Velho. O menino esticava os beiços,
tentando fazer rodinhas com a fumaça do cigarro que subia para o teto, Bicho mais chato, Pai, solta ele.
Antes de sair para o trabalho, o homem ruivo costumava ficar algum tempo olhando o passarinho que desatava a cantar, as
asas trêmulas ligeiramente abertas, ora pousando num pé ora noutro e cantando como se não pudesse parar nunca mais. O
homem então enfiava a ponta do dedo entre as grades, era a despedida e o passarinho, emudecido, vinha meio encolhido
oferecer-lhe a cabeça para a carícia. Enquanto o homem se afastava, o passarinho se atirava meio às cegas contra as grades,
fugir, fugir. Algumas vezes, o homem assistiu a essas tentativas que deixavam o passarinho tão cansado, o peito palpitante,
o bico ferido. Eu sei, você quer ir embora, você quer ir embora mas não pode ir, lá fora é diferente e agora é tarde demais.
12. A mulher punha-se então a falar, e falava uns cinqüenta minutos sobre as coisas todas que quisera ter e que o homem ruivo
não lhe dera, não esquecer aquela viagem para Pocinhos do Rio Verde e o trem prateado descendo pela noite até o mar. Esse
mar que, se não fosse o pai (que Deus o tenha!), ela jamais teria conhecido, porque em negra hora se casara com um homem
que não prestava para nada, Não sei mesmo onde estava com a cabeça quando me casei com você, Velho.
Ele continuava com o livro aberto no peito, gostava muito de ler. Quando a mulher baixava o tom de voz, ainda furiosa (mas
sem saber mais a razão de tanta fúria), o homem ruivo fechava o livro e ia conversar com o
passarinho que se punha tão manso que se abrisse a portinhola poderia colhê-lo na palma da mão. Decorridos os cinqüenta
minutos das queixas, e como ele não respondia mesmo, ela se calava, exausta. Puxava-o pela manga,
afetuosa, Vai, Velho, o café está esfriando, nunca pensei que nesta idade avançada eu fosse trabalhar tanto assim. O homem
ia tomar o café. Numa dessas vezes, esqueceu de fechar a portinhola e quando voltou com o pano preto para cobrir a gaiola
(era noite) a gaiola estava vazia. Ele então sentou-se no degrau de pedra da escada e ali ficou pela madrugada, fixo na
escuridão. Quando amanheceu, o gato da vizinha desceu o muro, aproximou-se da escada onde estava o homem ruivo e
ficou ali estirado, a se espreguiçar sonolento de tão feliz. Por entre o pêlo negro do gato desprendeu-se uma pequenina pena
amarelho-acinzentada que o vento delicadamente fez voar. O homem inclinou-se para colher a pena entre o polegar e o
indicador. Mas não disse nada, nem mesmo quando o menino, que presenciara a cena, desatou a rir, Passarinho burro! Fugiu
e acabou aí, na boca do gato?
Calmamente, sem a menor pressa, o homem ruivo guardou a pena no bolso do casaco e levantou-se com uma expressão tão
estranha que o menino parou de rir para ficar olhando. Repetiria depois à Mãe, Mas ele até que parecia contente, Mãe, juro
que o Pai parecia contente, juro!
A mulher então interrompeu o filho num sussurro, Ele ficou louco.
Quando formou-se a roda de vizinhos , o menino voltou a contar isso tudo, mas não achou importante contar aquela coisa
que descobriu de repente: o Pai era um homem alto, nunca tinha reparado antes como ele era alto. Não contou também que
estranhou o andar do Pai, firme e reto, mas por que ele andava agora desse jeito? E repetiu o que todos já sabiam, que
quando o Pai saiu, deixou o portão aberto e não olhou para trás.
In “Cadernos de Literatura Brasileira nº. 5”,
editados pelo Instituto Moreira Salles, 1998
13. Quais as semelhanças existentes entre as
obras de Mário Quintana e Lygia Fagundes
Telles?
Nos dois contos os protagonistas parecem
insatisfeitos com o seu cotidiano, mas
acabam tomando atitudes distintas. Com
qual dessas atitudes, você mais se identifica?
Aqui será trabalhado a percepção de intertextualidade e de outras linguagens,
bem como a comparação existente entre os gêneros e a capacidade de apreciação
réplica do leitor em relação aos gêneros.