2. estratégia
Pesquisa anual da Consultoria accenture, realizada com 436 presidentes
de grandes empresas, revelou que a maior dificuldade que os dirigen-
tes enfrentam está na execução de um plano estratégico, e não na sua
elaboração. apenas 30% dos entrevistados confirmaram ser capazes de
responder rapidamente às demandas do mercado e, assim, estarem à
frente da concorrência. Isso explica a escassez de empresas bem-sucedi-
das nessa empreitada. Mudar a estratégia não é a tarefa mais difícil para
uma empresa – o maior desafio é implementá-la com rapidez.
COMO ESTRATéGIA
luÍs augusto loBÃo MenDes
POR
O sucesso de qualquer estratégia, nos dias de hoje, gias de marketing de acesso total e a criação de
depende muito mais de uma ação rápida do que valor pelas comunidades de consumidores estão
de um planejamento detalhado. No trabalho con- modificando os padrões de concorrência entre as
tínuo com organizações de grande e médio porte, empresas e criando novas oportunidades.
no Brasil e no exterior, orientando-as no processo
Mas, como estabelecer uma ponte entre os resul-
de formulação e implementação estratégica por
tados desejados e o que realmente se alcança? A
períodos de três a cinco anos consecutivos, foi
disciplina na execução de uma estratégia lançada
possível observar a dinâmica deste processo ao
para atingir resultados requer líderes compro-
longo do tempo e participar diretamente dele.
metidos e preparados. Liderar este processo é o
As exigências de um ambiente complexo e em
principal papel dos dirigentes atuais. A busca das
constante mutação, agravado pelo crescimento
respostas para essa questão desafia pressupostos
exponencial dos concorrentes e substitutos, nos
básicos e crenças essenciais baseados na aplica-
impõem novos desafios. Nesse contexto, trata-se
ção de ferramentas e modelos. E mais importante:
como vantagem competitiva a capacidade da orga-
nossas observações se chocam com algumas ver-
nização para estabelecer estratégias emergentes,
dades absolutas que norteiam as práticas geren-
em consonância e em resposta ao novo cenário de
ciais dependentes da capacidade de moldar e
transformações na arena competitiva.
controlar.
O futuro da competição vem sendo moldado por
A execução não é apenas a questão mais impor-
mudanças que alteram profundamente o compor-
tante que as empresas terão de enfrentar; o
tamento de compra dos consumidores e os canais
grande problema é o desconhecimento do tema.
de distribuição conhecidos, fazendo desaparecer as
Nenhuma outra disciplina na área de gestão tem
cadeias de valor tradicionais. O próprio cliente já
tamanha defasagem de conhecimento e bibliogra-
pode fazer seus pedidos e operações pela Internet
fia disponíveis. Tente fazer uma busca no seu site
– e até projetar o produto ou serviço que está com-
preferido de livros, com os termos “estratégia” ou
prando. Assim, encomenda carro pelo computador,
Ilustrações Binho Barreto
“formulação estratégica”. Quantos resultados apa-
compra camisas sociais com monograma e sob
recem? Se for num site nacional, talvez umas 500
medida, e escolhe uma geladeira de duas cores e
publicações, e em um site americano, você fica até
compartimentos internos adequados ao seu tipo
zonzo com os mais de 312 mil títulos disponíveis.
de vida. O comércio eletrônico, as novas estraté-
DOM 77
3. E sobre o termo “execução”, já tentou fazer a mes- E como ninguém pode ser punido por desempenhos
ma pesquisa? Decepcionado? futuros e pela “defasagem estratégica”, o ciclo de
mau desempenho se repete, às vezes por anos a
Um estudo coordenado pelos professores Michael
fio, cercado de boas desculpas, justificativas e
C. Markins e Richard Steele, publicado na Harvard
explicações. O processo atual de análise crítica
Business Review de julho de 2005, revela que as
das organizações não está voltado para a aprendi-
empresas estão longe de obter um bom desem-
zagem e sim para o objetivo de fechar um ciclo.
penho financeiro a partir de suas estratégias.
Esquecendo por completo aquele indesejado ano,
Segundo os autores, o desempenho insatisfatório
com convincentes argumentos por não ter alcança-
pode ser atribuído a uma combinação de fatores,
do os objetivos desejados.
como planos mal formulados, recursos mal aplica-
dos, falhas na comunicação e limitada responsabi- Empresas e colaboradores devem enfrentar juntos
lidade por resultados (ver gráfico 1). os problemas e, para isso, precisam ter uma lingua-
gem comum que seja do entendimento de todos.
O que emerge dos resultados dessa pesquisa é
É aí que a comunicação ganha força estratégica. O
uma seqüência de eventos que ocorrem mais ou
colaborador deve receber a informação, na própria
menos assim: as estratégias são aprovadas, mas
empresa, antes que ela circule fora. Lembrar-se
mal comunicadas, o que torna quase impossível
da comunicação somente nos momentos de crise
sua conversão em iniciativas e planos específicos
não cria diálogo e traz rupturas. Uma comunicação
de alocação de recursos. Os níveis mais operativos
franca, aberta e autêntica aumenta as chances de
da organização não sabem o que fazer, como fazer
sucesso na implantação de estratégias. Pesquisas
e quando fazer. Até porque seu bônus anual está
realizadas pela consultoria internacional watson
atrelado ao desempenho de curto prazo. Logo, os
wyatt, em vários países, indicam que os líderes
resultados previstos nunca se concretizam.
GRáFICO 1 | PARA ONDE VAI O DESEMPENHO
Outros obstáculos 2%
Estratégia desaprovada 2%
Liderança sem empenho 5%
Fraca liderança sênior 7%
Recursos inadequados
ou inexistentes 21%
Consequências ou
prêmios inadequados para
fracasso ou sucesso 8%
Monitoramento inadequado
Precária comunicação
do desempenho 8%
da estratégia 14%
Silos e cultura organizacional
impedem a execução 10%
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4. mais eficientes são os que têm habilidade para Essas empresas precisam, urgentemente, repensar
utilizar os canais formais e informais de comu- seu estilo organizacional. Para que serve um orga-
nicação. Quando bem conduzidos, esses canais nograma? Ele demonstra como a empresa identifi-
colaboram para acelerar a tomada de decisões. ca e cria vantagem em relação aos concorrentes?
Ou quais os seus produtos e serviços? Como a
Diante dos resultados da pesquisa, façamos algu- empresa se posiciona no mercado? Ele revela os
mas reflexões: nossas estratégias são elaboradas processos e atividades críticas da organização?
para serem implementadas? Como efetivamente Mostra quais as principais relações em sua cadeia
ajustamos nossas estratégias às mudanças do de valor? A resposta a todas essas perguntas é um
ambiente? sonoro “não”. A única utilidade do organograma é
demonstrar a relação de poder dentro das organiza-
Em vez de colaborar para a proliferação de fer-
ções. Esta mentalidade produz “silos”, chegando a
ramentas e técnicas normativas, desenvolvemos
criar outras empresas dentro da mesma organiza-
um conjunto de idéias integradas, que possam ser
ção, quase repúblicas independentes. Esse modelo
úteis aos dirigentes, na compreensão das causas
compartimentado transforma departamentos em
básicas do problema.
feudos e reduz o desempenho de toda a empresa.
O grande motivo é que ninguém administra os
DISCUTA PREMISSAS, NÃO PROJEÇÕES ORÇAMEN-
espaços em branco do organograma, ou seja, as
TÁRIAS O plano estratégico não é mais um docu-
conexões entre as áreas e departamentos, onde o
mento elaborado pela alta administração, divulga-
mesmo processo se passa e, de fato, cria valor.
do por meio de cópias confidenciais numeradas e
atualizado anualmente sem o questionamento das
A cultura dos “silos” força os gerentes a resolve-
premissas e pressupostos. Deve ser um processo
rem assuntos que poderiam ser tratados nos níveis
que envolve todos os níveis gerenciais, comuni-
mais baixos da organização, o que leva os subor-
cado de forma ampla e livre, sempre aberto ao
dinados a assumirem menor responsabilidade do
questionamento.
que efetivamente deveriam. Em vez de dividido de
cima para baixo, pense em criar um novo modelo
A utilização dessa abordagem cria uma atmosfera
de baixo para cima, com as iniciativas pessoais
organizacional em que os colaboradores desen-
dando origem a equipes de projetos, que, se bem-
volvem o desejo de participação e envolvimento,
sucedidas, evoluem para departamentos. Afinal, o
criando um sentimento de co-autoria. Quando a
problema já conhecido da desmotivação da linha
equipe entende bem os fundamentos e os motores
de frente que passou por várias tentativas de solu-
do desempenho, não é mais necessário administrar
ção anteriores, todas fracassadas, talvez encontre
os detalhes. O grupo sabe de sua responsabilidade
uma solução. Nada mais trágico no mundo organi-
e do que precisa repassar aos dirigentes, que exi-
zacional do que o fracasso de uma grande empre-
gem um trabalho conjunto.
sa, principalmente quando a maioria do pessoal
CRIAÇÃO DO SENSO DE PROPRIEDADE Na verdade, na linha de frente percebia a ameaça iminente,
muitos executivos de topo estão decidindo sozi- enquanto a alta administração não se conscienti-
nhos, com base em dados abstratos, como também zava do problema ou estava insegura em relação
conduzem as operações. Isso leva os gerentes de a ele. A alta direção está cada vez mais obcecada
linha de frente a se retraírem, e passivamente, a por números, que somente refletem as decisões,
começarem a ter uma atitude de conformidade ações e posicionamentos passados, esquecendo-
e obediência. Outros executivos assumem uma se de sintonizar com as “vozes do mercado”. Os
postura mais subversiva, procurando meios de executivos de níveis mais altos devem cultivar o
vencer dentro do “sistema”, mediante a distorção respeito pelas idéias provenientes das bases.
de números/fatos e a manipulação de informações,
efetivando acordos paralelos. Em ambos os casos, A confiança é o elemento evidente na criação do
o relacionamento entre as pessoas e a organização senso de propriedade. O forte elo de confiança
se torna, cada vez mais, patológico e mutuamente entre gerentes e executivos de alto nível proporcio-
destrutivo. na o contexto para a iniciativa individual, enquanto
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5. que o sentimento de segurança compartilhado A inspiração da iniciativa pessoal exige que as
entre eles garante o trabalho em equipe e maior pessoas estejam imbuídas de um sentimento de
apoio entre áreas. A confiança é reconhecida mais propriedade em relação às suas tarefas. O alinha-
facilmente na transparência e abertura dos pro- mento das iniciativas individuais com a trajetória
cessos gerenciais que proporcionam às pessoas o estratégica geral da organização deve ser balan-
senso de envolvimento e participação. ceado, para não gerar um “caos empreendedor”
– exige que o senso de propriedade seja comple-
MONITORE CONTINUAMENTE OS RESULTADOS mentado com um forte senso de autodisciplina,
Para executar com sucesso qualquer estratégia, a pois desta forma o controle não é algo imposto de
gerência precisa tomar milhares de decisões ope- cima para baixo e sim uma cultura que sustenta o
racionais e colocá-las em ação. Empresas sintoni- processo de execução.
zadas com o ambiente monitoram o desempenho
em tempo real, para ajustar processos e posicio- A alta direção precisa manifestar abertamente
namentos. Ou seja, são pró-ativas no processo e a sua tolerância em assumir riscos e aceitar o
dispensam as cansativas reuniões de “autópsia” fracasso. É num ambiente desse tipo que as
no final do mês. O acompanhamento em tempo pessoas se tornam efetivamente confiantes para
real permite aos executivos localizar e remediar tomar iniciativas, pois se sentem com liberdade e
falhas no plano e em sua execução. segurança para exercer a criatividade. Os erros são
inevitáveis, mas deve ficar claro que a promoção
O monitoramento contínuo do desempenho é de um ambiente tolerante em relação ao “fracasso
particularmente importante em setores altamente bem-intencionado” não se confunde com a acei-
voláteis, onde eventos que fogem do controle de tação de um ambiente livre de risco e permissivo
qualquer pessoa podem tornar o plano irrelevante. com o baixo desempenho.
Além disso, uma avaliação prévia dos resultados
INCENTIVOS E RESULTADOS Em muitas organi-
bem contextualizada, junto com a discussão sobre
as tendências de mercado, melhora e ajusta a qua- zações, o plano estratégico é pouco mais do que
lidade do plano estratégico tornando-o muito mais um acordo negociado, fruto de barganhas quanto
realista e viável. a metas de desempenho e projeções financeiras.
Portanto, o planejamento é em grande parte um
INSPIRANDO A INICIATIVA PESSOAL Neste ponto, processo político, em que os executivos pedem
talvez tenhamos novamente outro conflito com projeções de lucro mais baixas em curto prazo
algumas verdades absolutas. Não devemos incen- (para garantir um bônus anual mais elevado para
tivar o trabalho em equipe? Ao contrário do que se si mesmos) e a alta direção pressiona por melhores
imagina, os modelos racionais estabelecidos estão resultados em longo prazo (para satisfazer o conse-
criando um ambiente em que as pessoas capazes lho e outras partes interessadas).
são esmagadas e constrangidas pelas próprias orga-
nizações, que não foram concebidas para aprovei- Incentivos fortes e apropriados, que encorajem os
tar sua energia e competência. Fragmentados em gerentes a perseguir as oportunidades de mercado,
estruturas organizacionais, reféns de caixinhas no em combinação com uma responsável alocação
organograma, sufocados pelos apoios burocráticos, de recursos internos, podem estimular a busca de
isolados dos recursos vitais e carentes de incen- maior retorno para a organização. Os executivos
tivos e de motivação na busca de oportunidades de linha de frente são os olhos e os ouvidos da
emergentes, ou para o desenvolvimento de novas empresa e, ao mesmo tempo, a voz do cliente.
idéias criativas, os gerentes da linha de frente, Eles sabem o que os clientes querem antes de
em vez de trabalhar para a realização de algo que tudo, mas também têm a missão de transformar
não ocorreria espontaneamente, estão em geral estratégias em ação. O grande problema é que cos-
absorvidos em longas jornadas de trabalho, ape- tumam se transformar em meros implementadores
nas para assegurar o inevitável. As organizações operacionais, atendendo somente as demandas
estão sofrendo da síndrome do subdesempenho dos processos internos, em vez de se concentrarem
satisfatório. nas oportunidades externas.
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6. Empresas fortes na execução dão destaque tam-
bém ao desenvolvimento, mas têm um tremendo
potencial não aproveitado em sua equipe, subesti-
mam os talentos e subutilizam as aptidões do seu
pessoal. O objetivo do líder genuíno é construir um
lugar em que as pessoas desfrutem de liberdade
criativa e desenvolvam o verdadeiro senso de rea-
lização – um ambiente que desperte o melhor de
cada um. Os atuais modelos organizacionais nos
induzem a utilizar no trabalho apenas parte de
nossa capacidade individual. Precisamos aprender
a reconhecer e explorar esta capacidade ociosa
que todos os dias cada pessoa traz para a organi-
zação.
Com a aceleração da dinâmica da competição, o
patrimônio humano das organizações talvez seja a
única forma verdadeiramente sustentável de vanta-
gem competitiva. Acreditamos que as pessoas são
dotadas de uma curiosidade inata e estão imbuí-
das da motivação natural para agir e aprender.
Portanto, devemos aproveitar a engenhosidade de
nossas equipes e recompensar os empreendedo-
res internos para que sejam importantes agentes
de desenvolvimento. Isso pode ser feito com a
introdução de novos produtos e métodos de pro-
dução, além de outras atividades inovadoras que
estimulam a competitividade e o crescimento da
organização.
luís augusto loBão Mendes é professor da Fundação Dom Cabral.
PaRa SE aPROFUnDaR nO TEMa
Ghoshal, Sumantra & Bartlett, Christopher – “Organização Individualizada” – Campus, 2000
– apresenta idéias de um novo modelo organizacional, discutindo a impossibilidade de ter estra-
tégias de 3ª geração com empresas de 2ª geração e gerentes de 1ª geração. Os autores discutem
como criar uma organização orientada a criar valor para o cliente e valorizar as iniciativas – uma
redescoberta da gestão. Imperdível.
Bossidy, Larry & Charan, Ram – “Execução – A disciplina para atingir resultados” – Campus,
2005 - 7ª Edição – lançado inicialmente com o título “O desafio de fazer acontecer”. Não con-
fundam – é a mesma obra. Os autores relatam experiências e dão algumas dicas. Pode parecer
superficial para quem busca respostas ou um modelo para implantação, mas vale a pena pelas
dicas e idéias, além de ser de fácil leitura.
Hrebiniak, G. Lawrence – “Making Strategy work: Leading Effective Execution and Change”
(Hardcover). Uma da melhores e mais claras publicações sobre o tema – ainda longe de discutir
fórmulas mágicas e modelos, apresenta muitos exemplos e casos.
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