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UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO
   ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E
             ARTES

           LUNALVA DE OLIVEIRA MENDES SILVA




   A representação do negro e das relações raciais nos meios de
comunicação: Um estudo comparativo em revistas de segmentos, do
Grupo Abril, no Brasil e suas respectivas versões norte-americanas



                                            Apresentação de Trabalho de
                                            Conclusão de Curso como pré-
                                            requisito parcial para obtenção do
                                            titulo de bacharel em Comunicação
                                            Social – Relações Públicas.

                                            Área de Concentração:
                                            Comunicação e Cultura

                                            Orientador: Prof. Dr. Paulo Nassar
                                            Co-Orientador: Prof. Dr. Dennis de
                                            Oliveira




                           SÃO PAULO
                              2011
Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio
convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte.




                       SILVA, Lunalva de Oliveira Mendes.
  A representação do negro e das relações raciais nos meios de comunicação: Um
   estudo comparativo em revistas de segmentos, do Grupo Abril, e suas versões
                                 norte-americanas.
     Lunalva de Oliveira Mendes Silva; orientador Prof. Dr. Paulo Nassar e co-
             orientador Prof. Dr. Dennis de Oliveira - São Paulo, 2011.
                                        53 f.
        Trabalho de Conclusão de Curso - Universidade de São Paulo, 2011.
Este trabalho é dedicado às duas Marias de Lourdes que me deram à luz...
À primeira por seu amor, seu suporte e por sua incansável bravura na batalha por uma
                            vida mais justa e mais digna.
 À segunda, in memoriam, pela sua determinação, pela sua ternura, pelos puxões de
 orelha, pela sua confiança em mim, e principalmente, pelo inestimável despertar da
busca interior pelo melhor que eu e muitos outros jovens, contemplados pelo programa
          Raça, Desenvolvimento e Desigualdade Social, tem para oferecer.
AGRADECIMENTOS

À Profa. Dra. Luciene Cecília Barbosa, por despertar em mim o estudo da temática
                        racial nos meios de comunicação.

   À Profa. Dra. Maria Immacolata Vassalo de Lopes, por me introduzir a vida
                                   Acadêmica.

  Ao Prof. Dr. Paulo Nassar, por me orientar prestativamente contribuindo para
                           meu crescimento intelectual.

 Ao Prof. Dr. Dennis de Oliveira, por me ensinar e co-orientar com sabedoria e
       paciência, ao longo do processo de pesquisa, contribuindo para meu
                     desenvolvimento científico e intelectual.

 Ao Prof. Dr. Richard Wright, pelo carinho, a completa atenção e disponibilidade
                   durante o período internacional da pesquisa.

    Ao Prof. Dr. Carlos Roberto Azzoni e ao Dr.Charles L.Belsey, assim como
  aos demais responsáveis, pela consolidação e manutenção do Programa Raça,
                     Desenvolvimento e Desigualdade Social.

À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pela concessão
da bolsa e pelo apoio financeiro nos Estados Unidos para a internacionalização
                                 desta pesquisa.

        À Pró-Reitoria de Graduação pelo projeto Ensinar com pesquisa.

 À todos, meus professores e amigos incríveis que de alguma forma, compuseram
  um dos blocos que consolida esta realização pessoal, profissional e acadêmica.
SUMÁRIO


1. INTRODUÇÃO..................................................................... 7
2. REVISÃO DA LITERATURA...............................................9
      2.1 A branquidade normativa e as relações raciais............9
      2.2 A identidade do sujeito e sua participação em
comunidades práticas..................................................................11
      2.3 Ser negro ao longo dos séculos.....................................13
      2.4 Cultura e Mídia.............................................................18
      2.5 Negro nos meios de Comunicação................................19
      2.6 Os meios de comunicação da população negra..............22
3. OBJETIVOS............................................................................25
4. JUSTIFICATIVA....................................................................26
5. PESQUISA..............................................................................28
      5.1 Tema do trabalho............................................................28
      5.2 Contexto do tema............................................................28
      5.3 Problema do tema...........................................................29
      5.4 Problema da pesquisa.....................................................29
      5.5 Universo da pesquisa......................................................29
      5.6 Amostra.......................................]...................................29
      5.7 Hipóteses.........................................................................30
      5.8 Objetivos específicos.......................................................30
6. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.............................30
      6.1 A escolha do objeto.........................................................31
      6.2 Coleta dos Dados no Brasil............................................31
      6.3 Coleta de dados nos Estados Unidos da América...........32
      6.4 Em campo........................................................................33
7. APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS..................................34
Gráfico 4.......................................................................................35
Gráficos 5 .....................................................................................37
Gráficos 6 .....................................................................................38
8. CONCLUSÃO..........................................................................39
BIBLIOGRAFIA......................................................................... 43
ANEXOS..................................................................................... 47
RESUMO:
O objetivo deste trabalho é verificar, no ano de 2010, em que situações, e de qual forma
homens e mulheres negras, celebridades ou não, são apresentados em fotografias,
histórias ou anúncios da linha editorial de revistas de segmento do Grupo Abril,
analisando a conotação dos discursos e a proporção em que a aparição de negros na
mídia faz-se presente. Para isso, foram selecionadas, no Brasil, quatro edições - uma
por trimestre de revistas específicas de informação, feminina e masculina. As quais
foram comparadas com edições norte-americanas dirigidas ao mesmo público :
Respectivamente: Veja, / Time; Nova / Cosmopolitan, e Playboy Brasil / Playboy
E.U.A.
Palavras-chave: discurso midiático, relações raciais, imagem do negro na mídia.


ABSTRACT:
The objective of this study is verify, in 2010, what are the situations and how are the
scenes in which black people, celebrities or not, have being showed in photography,
histories or editorial's advertisement in the Grupo Abril’s targeting magazines.
In addition, this study analyzes the connotation's discurses about black people and the
proportion which they are showed in the media.
Thus, four magazines issues were chosen, one for each trimester, from Brazil and they
were compared with their United States of America’s version, in the targeting public
magazines: information, feminine and masculine. Respectively: Veja / Time; Nova /
Cosmopolitan, e Playboy Brasil / Playboy U.S.A

Keywords: connotation’s discourses, racial relations, black people image in
the media
1. INTRODUÇÃO

       O objetivo deste estudo é analisar como são representadas pessoas negras, comuns ou
célebres, e as relações raciais nos discursos existentes nas revistas segmentadas mais lidas no
Brasil, publicadas pelo Grupo Abril. Além disso, a pesquisa realizará a análise de uma
publicação voltada para o público étnico e irá comparar as edições brasileiras estudadas com
suas versões originais ou similares nos Estados Unidos.
       Uma sondagem que é de grande relevância, por ser realizada numa atmosfera de
marcos políticos recentes no quadro de enfrentamento da desigualdade racial, o que tem
colaborado para o ganho de visibilidade do problema na agenda pública, com a entrada do
tema nos meios de comunicação de massa.
       Nos Estados Unidos da América, há dois anos, a eleição de Barack Obama - o primeiro
presidente afro-americano da maior potência do mundo foi um dos avanços no quadro da luta
dos negros pela igualdade racial na sociedade.
        Segundo Thomas Brunell, professor de ciência política da Universidade do Texas,
“mostra que superamos uma barreira que, há dez anos, parecia intransponível”1. Este
comentário justifica-se ao considerarmos o passado de segregação regulamentada por lei,
cerca de 50 anos atrás com a supressão e opressão dos direitos dos negros nos Estados Unidos
da América privilegiando brancos em detrimento de negros e determinando para cada raça
seus bairros, escolas, cinemas, transporte próprios e locais ou condições de trabalho.
        Seguindo esta mesma perspectiva, o Brasil também teve uma grande conquista nos
avanços que pareciam inconcevíveis há dez anos. Neste caso, a vitória da comunidade negra
ocorreu com aprovação do Estatuto de Igualdade Racial pelo Senado, após uma década em
discussão na Câmera, e a sanção do presidente da república Luiz Inácio Lula da Silva.
       Este cenário representa alguma das conquistas dos movimentos sociais de negros, que
vem atuando para formular e implantar políticas públicas para a equidade social entre brancos
e afrodescendentes, desde a redemocratização do país no final dos anos 80 e início dos anos
90, do século passado.
       Nesse sentido, o estudo irá conferir em que medida a produção dos discursos nos
meios de comunicação de massa, especificamente de revistas segmentadas do Grupo Abril

1
 C.f. BUARQUE, D. In G1 - Eleições nos EUA põem em xeque passado de racismo do
país.
                                                                                             7
(com excessão de uma destinada ao segmento étnico) e suas versões norte-americanas, ocorre
considerando o quadro de avanços socioeconômicos e políticos da população afro-
descendente.
       O estudo teve início com uma pesquisa exploratória das revistas de segmento, do ano
de 2010, que melhor representassem os nichos do mercado étnico, de informação, feminino e
masculino. Em seguida, foram selecionadas quatro edições de revistas - uma por trimestre de
publicações específicas de etnia, informação, juvenil, feminina e masculina. Respectivamente:
Raça / Ebony; Veja / Time; Atrevida / Seventeen; Nova / Cosmopolitan, e Playboy Brasil /
Playboy E.U.A.
       As revistas foram selecionadas em uma ordem trimestral, com uma escolha aleatória
das edições antes da compra e com datas correspondentes as edições estadunidentes
analisadas. O conteúdo das publicações foi separados entre tipos: carta do leitor/comentário,
crônica, declaração, depoimento, entrevista, notícia e quadrinho. As mensagens transmitidas
foram classificadas por opinativa, informativa, interpretativa e distinguidas pelo teor das
conotações: positiva, neutra, negativa e ambivalente, sendo que a última permitia uma leitura
ambígua da conotação que a mensagem estava transmitindo.
       Os dados coletados foram utilizados na produção de gráficos ilustrativos para a
comparação de milímetros quadrados do espaço conferido a negros em relação ao produto
total da revista; gráfico comparativo de revistas do mesmo nicho nas edições brasileiras e
americanas com datas correspondentes; gráfico representativo dos teores mais ocorrentes na
análise da revistas; e apresentação das categorias de estereótipos mais ocorrentes.




                                                                                           8
2. REVISÃO DA LITERATURA

       2.1 A branquidade normativa e as relações raciais


       Desde 1975, os estudos sobre as relações raciais já alertavam que o termo raça pode
não se basear mais em nenhum suporte biológico para a diferenciação de grupos humanos ao
longo das linhas raciais. Pelo contrário, como dizia (Banton e Harwood, 1975), ainda assim, a
distinção racial ocorre revelando-se diariamente como um produto intencional de processos
sociais e históricos criados arbitrariamente para atribuir categorias de pessoas e hierarquizá-
las. Um conceito que representa e simboliza os conflitos sociopolíticos e interesses de
diferentes tipos de corpos humanos, que têm funções econômicas e políticas articuladas de
acordo com relações de dominação e privilégio.
       Os métodos de determinação, definição e classificação de pessoas foram muitos e
sofreram transformações ao longo do tempo. Inicialmente, foi estabelecida a superioridade
européia, baseada na identificação com o cristianismo. Posteriormente, um novo termo de
identificação apareceu – branco, criado através de métodos científicos (Eze, 1997).
       Desta forma, a “branquidade” durante os séculos foi construída como “adequada”,
"normal" ou "neutra" e tem sido utilizada como o principal meio para a consolidação de poder
nas relações raciais, conferindo até os dias atuais a reprodução e sustentação de privilégios aos
considerados brancos – norma da humanidade - e estabelecendo inferioridade e
marginalização aos classificados como diferentes.
       Além disso, a branquidade sustenta as práticas mais sutis de racismo,
institucionalizadas e, ou os atos individuais de discriminação, dando suporte a
comportamentos e atitudes racistas em organizações, na sociedade e na mídia.
       Contudo, nem mesmo após a desmistificação das possíveis diferenças genéticas
utilizadas   para   hierarquizar   os    considerados    não-brancos,    as    práticas   sociais
institucionalizadas de inferiorização e marginalização foram minadas. Além disso, novas
estratégias de desvalorização foram adotadas para discriminação racial e foram adicionadas
proposições econômicas aos critérios utilizados anteriormente para sustentar e reproduzir no
cotidiano as hierarquias de privilégios dos séculos anteriores.
       O que (Wieviorka, 2000) chama de “novo racismo”, quando novas estratégias de
desvalorização, em geral mais sofisticadas, são utilizadas para a discriminação racial.

                                                                                               9
Portanto, enquanto o fato de ser branco ou possuir aparência mais parecida com a (norte)
européia tem garantido a associação com qualidades e valores mais positivos, como a
inteligência, a habilidade, a educação, a beleza, a honradez e a amabilidade. Esta mesma
hiper-valorização   de    traços    europeus,     particularmente      nórdicos     como      formas     de
hierarquização racial, há séculos desvaloriza principalmente indígenas e negros e confere à
negritude uma aproximação com o primitivo.


           A ‘negritude´ tem funcionado como signo de maior proximidade dos afro-descendentes com a
           natureza e, conseqüentemente, da probabilidade de que sejam preguiçosos e indolentes, de que lhes
           faltem capacidades intelectuais de ordem mais elevada, sejam impulsionados pela emoção e o
           sentimento em vez da razão, hipersexualizados, tenham baixo autocontrole, tendam a violência e
           etc.
                                                                                         (Hall 1990, p.67)


       Deste modo, como já observou (Hall, 2003) o referente biológico privilegia
marcadores étnicos para conotar diferenças sociais e culturais, e quando o nível genético é
imediatamente visível (como as diferenças genéticas supostamente escondidas na estrutura
dos genes e “materializadas” em significantes corporais facilmente reconhecíveis), tais como a
cor da pele, características físicas do cabelo, feições do rosto e tipo físico, que são
significantes utilizados para hierarquização social e funcionam, também, como mecanismos
de fechamento discursivo em situações cotidianas. O que explica modelos brancos serem
frequentemente associados à beleza, saúde e bem-estar, sendo os representantes universais da
espécie humana nos diversos meios discursivos.
       Assim, é possível notar que o referente biológico nunca opera isoladamente e nunca
está ausente, tanto no discurso de “raça”, quanto no de “etnia”, o registro biológico funciona
estabelecendo uma articulação discursiva ou uma “cadeia de equivalências” (Laclau e Mouffe,
1984) com as condições sócio-culturais.
       Portanto, percebe-se que o racismo biológico e a discriminação cultural operam como
dois registros de racismo que, na maioria das vezes, estão em jogo simultaneamente. Contudo,
faz-se necessário considerar as variadas possibilidades identitárias do sujeito, que tem sido
articuladas num processo em que membros sociais são enquadrados em diferentes espaços
socioeconômicos e políticos de acordo com características físicas.
       Para isso, partimos da premissa da relação dialógica do indivíduo, no sentido de sua
relação com outro ser fundamentalmente constitutiva do sujeito, que passa a articular sua
                                                                                                         10
“identidade” em relação com aquilo que o falta – seu outro, seu “exterior constitutivo”.
(Lacan, 1977); (Laclau e Mouffe, 1985); (Butler, 1993).
       Haja vista, o postulado séculos atrás por Hegel de que as pessoas percebem e
compreendem a sociedade, primeiramente com base nas perspectivas de seus grupos sociais,
perspectivas que são formadas pela localização dos grupos na cultura como um todo e também
no modo como experienciam a realidade social.
       Em outras palavras, a vida em sociedade envolve relações de poder desiguais e
impossibilita haver uma única perspectiva sobre a vida social. Deste modo, a cultura expressa
o sentido de valores que nascem entre as classes e grupos sociais diferentes, com base em
relações e condições históricas pelas quais eles lidam com suas condições e respondem a elas,
além de, as tradições e práticas vividas através das quais “entendimentos” são expressados.


       2.2 A identidade do sujeito e sua participação em comunidades práticas


           é literalmente a nossa maneira de viver, o processo de comunicação, de fato, é o processo de
           comunhão, o compartilhamento de significados... comuns; a oferta, recepção e comparação de
           novos significados, que levam a tensões, ao crescimento e a mudança.
                                                                                (Hall, 2006, p. 126)


       De acordo com (Laclau, 1996), o ser humano adquire identidade interagindo com os
outros. Ou seja, a vida do sujeito ganha significados, incrustados nos contextos culturais com
o qual este se relaciona. Uma identidade diferencial não existe distinta de um contexto, e no
processo de fazer a distinção afirma-se o contexto simultaneamente.
       Assim, os sistemas de significados operam a partir do sistema de representação social
para produzir as formas nas quais nos utilizamos para apresentar o mundo para nós mesmos e
os outros e no qual nos baseamos para constituir nossas práticas sociais.
       Como a linguagem, por exemplo, a mais poderosa representação de sistemas sociais
que coloca a interação com o outro no mundo social como processo de constituição da
consciência, criando significados e representações que na medida em que apresentam
imagens, idéias e perspectivas, passa a refletir não apenas a realidade, mas também a
construção das realidades em que acreditamos.




                                                                                                    11
O ser humano, portanto, constitui-se na e por meio da alteridade, e todas as atividades e papéis por
           ele desempenhados, nas mais diversas esferas do mundo social, encontram-se impregnados do
           discurso de outrem.
                                                                                       (Fairclough, 1992)

       Deste modo, o signo que é a união da imagem e do significado, torna-se
interdependente e inseparável na construção do sentido, ou seja, na representação mental de
um objeto ou da realidade social em que nos situamos e com o qual se atribui significado a
conceitos e idéias baseado nas condições de formação e construção sócio-cultural que nos
cerceia ao longo de nossas vidas.
       Por isso, o indivíduo depende dos signos para compreender o mundo, a si mesmo, as
pessoas com as quais se relaciona, viver, interagir com o meio em que está inserido e construir
seu universo, utilizando-se do significante e do significado, intimamente unidos, para
constituir os signos, dar sentido as coisas e fazer-se compreender e ser compreendido.
       Portanto, ao considerarmos as visões de mundo em constante interação, visando o
conflito e o engajamento discursivo, podemos entender como os discursos ideológicos dos
sujeitos interferem no processo de reflexão do indivíduo sobre a própria ação nas mais
diversas esferas da vida social e em processo ininterrupto de (re) construção de identidades.
De acordo com Pinheiro,
           à medida que essas identidades entram em conflito, são questionadas e analisadas o diálogo pode
           se tornar um espaço para (re)construção de identidades para todos os participantes envolvidos.
           Sendo assim, a participação nas práticas de diferentes comunidades leva à construção de
           identidades em relação a essas comunidades.
                                                                                          (Pinheiro, 2006)


       Neste contexto, é possível inferir que o pertencimento a uma comunidade influência o
que fazemos, quem somos e a forma como interpretamos aquilo que fazemos.


           Todos nós pertencemos a diversas comunidades de prática: em casa, no trabalho, na escola, na
           Internet, comunidades essas que mudam no curso de nossas vidas. A forma como participamos
           dessas comunidades representa experiências de aprendizagem e, logo, de constituição de
           identidades.
                                                                                       (Fairclouch, 1992)


       Além disso, como acrescenta (Fairclouch, 1992) é o processo de (re) construção de
identidades, por meio das sucessivas formas de participação nas comunidades de prática que
determina nossa trajetória nessas comunidades, fazendo da identidade um processo de vir a

                                                                                                           12
ser, um constante tornar-se. Por relacionar presente, passado e futuro, a noção de identidade
implica a idéia de constante movimento, e não de “destino fixo”.
          Assim, é possível compreender que a identidade é constituída historicamente em uma
negociação do presente, com a incorporação do passado e uma perspectiva de futuro com a
qual lidamos para contribuir nas mudanças das comunidades de práticas com a qual nos
engajamos. Sendo assim, é necessário compreender as mudanças pelas quais as construções
raciais passaram ao longo dos séculos, as quais moldaram práticas perpetuadas até os dias
atuais.


          2.3 Ser negro ao longo dos séculos


          Nos séculos XVI e XVII, durante a expansão ibérica ultramarina, os argumentos do
discurso religioso da Igreja Católica que visavam a restauração da supremacia cristã e difusão
da fé aos gentis foram fortemente utilizados para justificar a superioridade européia sobre os
considerados pagãos e infiéis nos territórios dominados e sustentou por centenas de anos a
escravização de nativos e, principalmente, de negros africanos.
          Os escravizados eram considerados bens imobiliários, mercadorias negociáveis e
tratados como animais, eram responsáveis por todo o trabalho executado, desde a produção e
cultivo das terras, até a realização de serviços domésticos.
          Neste sentido, no século XVIII, quando os Estados Unidos da América conquistou sua
independência e a igualdade de direitos, foi conferida a todos os homens, esta conquista não
foi estendida ao homem negro considerado como propriedade, destituído de humanidade,
escravo.
          Contudo, as lutas dos africanos e afro-descendentes por liberdade e direitos humanos
já havia fecundado e, tanto nas colônias americanas quanto no cenário brasileiro, várias foram
as práticas instituídas para coibir a mobilização de escravos e limitar a liberdade deles,
proibindo-os de expressar sua língua, religiosidade e cultura.
A exemplo, nos Estados Unidos criou-se uma legislação mais rigorosa, reforçaram-se os
controles policiais e foram tomadas medidas com vistas a restringir a liberdade de movimento
dos negros no país e impedir, entre muitas coisas, até mesmo a instrução de afro-descendentes,
mesmo que livres.


                                                                                           13
Qualquer pessoa branca que se reunir com os escravos, [ou] negros livres com o objetivo de
            instruí-los a ler ou escrever, será punido com reclusão na cadeia...... e com multa...
                                                                       (Código Penal Virginia, 1847)


No Brasil, podemos destacar a lei régia de 1741 que declarava:


            [...] todo o grupo com mais de cinco escravos fugidos, ou suspeitos de fuga, será considerado um
            quilombo, arriscando-se, desde logo a ser massacrado.
                                                                                     (Alencastro, 2009)

      Em meados do século XVIII, os negros livres ou não, convertidos à religião imposta por
seus senhores (cristãos na América e católicos no Brasil) eram destituídos da liberdade de
freqüentar as igrejas dos brancos e quando permitidos ouviam nas pregações ensinamentos de
submissão e subserviência às regras que os oprimiam.
      Por isso, a construção de igrejas negras norte-americanas e irmandades brasileiras foi
considerada o germe da representação social criada por negros nos dois países como forma de
resistência, articulação e modificação da situação de repressão vigente.
      No século seguinte, com a saturação do processo de escravidão, devido aos crescentes
enfrentamentos entre senhores e escravos que lutavam por liberdade, as dificuldades políticas
na sustentação do sistema escravista e o declínio econômico das sociedades em que este
sistema era aplicado tornaram inevitável o estouro de conflitos iguais aos que deram início à
Guerra Civil Americana, quando os colonos do sul que enfrentavam as fugas de escravos, as
revoltas organizadas na luta pela liberdade, e o assassinato de rebeldes e senhores, declararam
secessão aos Estados Unidos da América e perderam completamente o controle das constantes
batalhas.
      Diante deste quadro, o exército nortista lançou mão da aceitação do alistamento
voluntário de negros e escravos fugidos das colônias rebeldes às tropas do Norte, combateram
aos senhores rebelados das colônias do sul dos Estados Unidos, venceram e deram suporte à
proclamação do Presidente Abraham Lincoln da abolição da escravatura nos Estados Unidos.
      O cenário de confronto e mudanças na América, tornou a questão da escravidão no
Brasil ainda mais insustentável. No entanto, como a aristocracia sulista estadunidense,
predominantemente       branca     a    “sociedade     de    privilégios”     brasileira    (baseada     na


                                                                                                         14
agroexportação, na posse de latifúndios e na exploração de escravos) não queria perder seus
privilégios e retardou ao máximo a proclamação da libertação da escravatura.
      Enquanto, os Estados Unidos protagonizava o período da Reconstrução com a
implantação de emendas garantidoras dos direitos civis aos afro-americanos, no Brasil
algumas leis foram aplicadas, após diversas tentativas de aplacar o movimento abolicionista
brasileiro.
      Dentre as leis implantadas, é possível citar a Lei do Ventre Livre de 1871 que garantia a
liberdade apenas aos filhos de escravos nascidos a partir daquela data com a condição de que
eles permanecessem cativos até os 21 anos e a Lei do sexagenário de 1885, que libertava os
escravos com mais de 65 anos de idade e eximia o proprietário de responsabilidades para com
os poucos que conseguiam sobreviver àquelas condições de vida por tanto tempo.
      Na sociedade brasileira, mesmo depois que a Lei Áurea foi assinada libertando todos os
escravos, as praticas e comportamentos que distanciavam os negros na hierarquia social e na
divisão do trabalho foram reforçadas.

              Após 1888, a sociedade (...) torna-se um corpo assentado, fechado. Suas camadas superiores
              assumem uma consciência, aguda como nunca antes, de tudo do que pode separar o homem branco
              do preto ou do mestiço. A cor da pele, antes esquecida, torna-se, entre ricos e pobres, uma fronteira
              nítida (...) Nas relações humanas fortalecem-se todas as regras da humildade, da obediência e da
              fidelidade dos séculos de escravidão.
                                                                                              (Mattoso, 2003)


        Deste modo, percebe-se que com o fim da escravidão novas formas de discriminação e
marginalização foram adotadas e projetos de reconstrução da nação passaram a ser traçados.
Neste momento, as reflexões sobre as questões relativas à cor, à raça e a identidade nacional
basearam-se numa nova estratégia que visava a transformação do quadro racial da sociedade
americana e brasileira, as quais tinham ambas em seu bojo teorias baseadas na obra “A
desigualdade das raças” (Gobineau, 1855) que defendia a superioridade da raça branca sobre
as demais, assumindo-a como o modelo apropriado a ser instituído.
        A teoria sustentava que o destino das civilizações é determinado pela composição
racial que os brancos e em particular as sociedades arianas forneciam desde que ficassem
livres dos pretos e amarelos, porque a perca da vitalidade, da criatividade, o mergulho na
corrupção e a imoralidade tornam-se mais prováveis quanto mais o caráter racial de uma
civilização se dilui através da miscigenação.

                                                                                                               15
Nesse sentido, nas colônias americanas do Sul foi aplicada pelos donos de escravos a
regra na qual mesmo uma gota de sangue por menor que seja estabelecia a identidade étnico-
racial da população escrava como negra. Ela era aplicada aos filhos de senhores e servia para
definí-los racialmente na hierarquia social, ampliar o número de escravos e desobrigar os
senhores de maiores responsabilidades.


            One drop of Negro blood — (…) just one drop of black blood makes a man colored. One drop —
            you are a Negro!2
                                                                                    ( Hughes, 1953)


       Além disso, esta regra tão arraigada na concepção americana, mesmo após a Guerra de
Secessão nos Estados Unidos e a libertação dos escravos, sustentava a crença de que cada raça
possui determinada no sangue a aparência física e o comportamento social.
       A partir deste ponto de vista, doutrinas como as de Jim Crow ganharam território e em
1883 no sul dos Estados Unidos, a Suprema Corte derrubou a Lei dos Direitos Civis de 1875,
que havia proibido a segregação racial em locais públicos.
       Assim, foram formadas instalações separadas para afro-americanos e brancos (em
escolas, poltronas de bondes, entradas de edifícios públicos, banheiros, bebedouros, horários
de visitação a museus, prisões e forças armadas. A segregação com base na raça foi apoiada
por lei, com a doutrina de “Separados mas iguais”. Em 1896, a separação foi instituída como
constitucional e validada também para teatros, praias, e instalações desportivas.
       Enquanto isso, na sociedade brasileira tomou corpo a estratégia de estímulo às políticas
de imigração européia (ver anexos) para transformar o cenário do país, no qual negros e
indígenas compunham a maior parte da população da época.
       Nesse contexto, as leis de incentivo aplicadas a imigração, conhecidas como “Lei do
Embranquecimento”, utilizadas para promover a evolução da cor no país, garantiram o
transporte, a acomodação e a contratação de milhões de imigrantes europeus no Brasil.
       Além disso, o novo sistema político não assegurou profícuos ganhos materiais, ou
simbólicos para os ex-escravos, que não tiveram nenhum projeto de reintegração à sociedade.
De acordo com (Andrews, 1991), a população negra foi marginalizada, seja politicamente sem

2
 Uma gota de sangue de negro – (...) uma só gota de sangue de negro é sufuciente para fazer
de um homem um preto. Uma gota!
                                                                                                   16
a implantação do sufrágio, seja economicamente devido às preferências em termos de
emprego em favor dos imigrantes europeus.
       Deste modo, os negros que constituíram a mão-de-obra brasileira, e uma vez livres do
trabalho escravo, eram aproveitados apenas para os serviços esporádicos, normalmente braçais
engrossarando a camada de marginalizados.
       Esse quadro histórico, não só deixou sua marca indelével no passado das sociedades
brasileira e americana, como também, deu suporte a atual sustentação de privilégios que tem
colaborado substancialmente para a lentidão das mudanças sociais alcançadas.
       No século XX, o cenário de conflito racial na sociedade americana encontrava-se
acirrado com a revogação das leis federais do período da Reconstrução que garantiam a
proteção aos direitos dos ex-escravos e a aplicação das leis de Jim Crow formalizando a
segregação racial estendida à confederação em poucas décadas.
       Diante deste quadro, os afro-descendentes mobilizam-se na batalha pelos direitos civis
motivando-os a participarem das associações, agremiações e sociedades destinadas a unir os
afro-americanos e a transformar o quadro de desigualdade.
       Sendo assim, por volta de 1945 paralelo ao fim da Segunda Guerra Mundial, o
Movimento dos direitos Civis ganhou impulso e utilizou as cortes federais para atacar as leis
de segregação na federação e como resultado de batalhas civis e sociais e da resistência de
afro-americanos mobilizada. Em 1954, a Suprema Corte declarou a inconstitucionalidade da
segregação e, ainda com um atraso de dez anos, aprovou a Lei dos Direitos Civis de 64 à qual
anulou as Leis Jim Crow.
       Nas décadas seguintes, foram registrados muitos casos coletivos e individuais de
enfrentamento do cenário de desigualdade social, marginalização, e práticas severas de
preconceito racial ao longo do país, além da reação da comunidade negra aos casos polêmicos
de preconceito com o apoio de poucos simpatizantes brancos à luta, chamados
pejorativamente de niggerlovers.
       Ao mesmo tempo em que no Brasil, os aspectos ligados à cor e a raça foram
articuladamente suprimidos, de acordo com as políticas governamentais vigentes. Assim, a
definição de uma identidade negra foi inibida, e como já afirmava (Nogueira, 1979) a
concepção de branco e não-branco, encontrou variações em função do grau de mestiçagem, de
indivíduo para indivíduo, de classe para classe, de região para região.


                                                                                          17
Desta forma, no Brasil criou-se o preconceito de marca em que as nuanças cromáticas
da pele passaram a contribuir para um futuro mais ou menos promissor nos moldes de um
sistema sócio-econômico competitivo e excludente, no qual a rejeição aos negros podia operar
de acordo com a tonalidade de sua cor, textura de cabelo e quanto mais distante do padrão
branco europeu de aparência, menor o número de oportunidades no sistema educacional e no
mercado de trabalho.
       Portanto, os afro-descendentes passaram a vivenciar a luta contra uma barreira ainda
mais árdua que exige, não só, o enfrentamento do quadro social, para o êxito educacional,
profissional e econômico. Como também, e, sobretudo, a luta contra a barreira racial que
atribui desvantagem e inferioridade de prestígio, capacidade, habilidade, honradez,
inteligência e poder do negro.


             Existem duas barreiras na sociedade brasileira que são muito fortes. Uma é social, é a barreira de
             classes, que o homem “branco” vence quando consegue uma oportunidade de se escolarizar, se
             profissionalizar, de subir socialmente. Já o “negro” tem a barreira social e a barreira racial, ele tem
             duas barreiras a enfrentar e a vencer. Por isso que classe e raça são tão interdependentes. E depois
             do negro conseguir êxito na profissão, ele ainda precisa lutar por sua auto-afirmação como pessoa.
                                                                                            (Fernandes, 2004)


       Nesse contexto, nota-se que a igualdade racial na sociedade brasileira, como já
observou o professor Kabengele Munanga é um mito:

             A democracia racial é um mito. Existe realmente um racismo no Brasil, diferenciado daquele
             praticado na África do Sul durante o regime do apartheid, diferente também do racismo praticado
             nos EUA, principalmente no Sul. Porque nosso racismo (...) é sutil, é velado. Pelo fato de ser sutil
             e velado isso não quer dizer que faça menos vítimas do que aquele que é aberto. Faz vítimas de
             qualquer maneira.
                                                                                             (Munanga, 2009)


       2.4 Cultura e Mídia

       Sendo assim, ao considerermos que o maior capital da mídia é a sua credibilidade, e
que ela se propõe a ser um simulacro do espaço societário, a mudança em valores e pressões
de determinados segmentos sociais tem reflexos direto nos imaginários construídos no espaço
midiático.
       Com base nisso, Hall e outros autores dos Estudos Culturais propõem ao movimento
negro uma estratégia para fortalecer o reconhecimento da população negra, a busca constante
                                                                                                                18
pela singularidade da cultura popular negra. O questionamento: - Quem sou? – De onde
venho?
         Pois, o processo de reconhecimento da identidade em um grupo e da identificação do
individuo são sempre marcados pela diferença e definidos pela inclusão e exclusão, porque
quando eu afirmo o que eu sou, deixo subentendido o que eu não sou, ou seja, a identidade e
diferença existem uma em relação a outra.
Por isso, como afirma Sodré é necessário:
             Contornar esse desdobramento violento do mal-estar individualista, que é o racismo, implica
             engendrar lugares de trânsito (ético-políticos) entre as singularidades. Na prática, isto significa
             levar indivíduos e instituições a assumirem ou incorporarem o princípio da diversidade humana
             como uma anterioridade simbólica (e não como mera conseqüência) para os desenvolvimentos
             jurídicos, políticos e econômicos que possam intervir na espinhosa questão da diferença e da
             desigualdade entre os homens.
                                                                                                (Sodré, 2000)


         Para tanto, é preciso assegurar o enfretamento das armadilhas presentes na
disseminação dos preconceitos, dos mecanismos utilizados na reprodução dos estereótipos de
geração a geração, e evitar que a estigmatização negativa de um grupo em detrimento do outro
se confunda com uma realidade “natural”.
         Nesse sentido, é preciso considerar que o campo da cultura é um espaço de conflitos,
onde diversas possibilidades de interpelações atuam influenciando no nosso modo de perceber
o mundo, na construção do nosso universo simbólico e na nossa percepção sobre nós mesmos,
que é articulada a partir da apropriação da realidade como ponto de partida para a reflexão e
construção do pensamento.
         Nas palavras de (Oliveira, 2009), a cultura desempenha o papel de novo ágora de
representação das tipologias sociais com o esvaziamento do espaço público da sociedade civil
coincidindo com a crise da utopia do sujeito universal iluminista nas novas configurações da
sociedade neoliberal globalizada. O que implica na seleção e reconstrução racial da realidade
de forma hegemônica e co-participante, pelo aparelho midiático, sem a apresentação de um
discurso de constetação sistêmica mesmo que minoritário.

              A mídia funciona, no nível macro, como um gênero discursivo capaz de catalisar expressões
             políticas e institucionais sobre as relações inter-raciais, em geral estruturadas por uma tradição
             intelectual elitista que, de uma maneira ou de outra legitima a desigualdade social pela cor da pele.
                                                                                       (Sodré, 1999, p. 243)


                                                                                                              19
2.5 Negro nos meios de Comunicação


         Como já diz Oliveira, a mídia evoca para si o espaço dos conflitos político-ideológicos
e com isso transforma-se no palco central das representações políticas passando a atrair a
expectativa de apresentação das várias possibilidades interpelativas e assujeitamentos.
         No entanto, o discurso sobre o negro nos meios de comunicação é apontado como
“natural” ocorrendo apenas o destaque de algumas pessoas negras com características
referendadas exclusivamente a determinados espaços, apresentando não só um pequeno
espaço de visibilidade para negros, mas principalmente propostas que trazem estereótipos do
negro e do relacionar-se inter-etnicamente.
         Em outras palavras, a grande mídia tende a abrir espaço para a temática racial, apenas
cobrindo alguns eventos com a participação de negros ou via o lançamento de produtos
segmentados destinados a um pretenso mercado e dificilmente incorpora a problemática
racial, suprimindo o discurso anti-racista (centrado na percepção dos mecanismos socialmente
criados para exclusão da população negra) e apontado para a superação dos mesmos.
Nas palavras de (Oliveira, 2009),


             Outra estratégia na busca da “voz” no ágora midiático reside na construção de modelos de figuras
             olimpianas negras que “representariam” este segmento no ágora. Esta estratégia é cooptada pela
             mídia e, em geral, reforça a idéia de uma guetificação de espaços permitidos aos afrodescendentes
             – o espaço lúdico. Ao lado, disto, estas figuras são apresentadas como “vencedoras”, como pessoas
             que superam suas barreiras e estas qualificações servem tanto para a mídia legitimar-se como um
             simulacro de uma sociedade multi-étnica quanto para atender as expectativas dos grupos
             subalternos para encontrar representações suas no ágora midiatizado.
                                                                                          (Oliveira, 2009)


         Cabe aqui, destacar que, em tratando-se de sociedades multirraciais, tanto no caso
norte-americano, quanto no brasileiro os afro-descendentes correspondem a um número
expressivo, sendo cerca de 13,5% da população estadunidense e 51,1% da população
brasileira – distribuída entre 6,9% pretos e 44,2% pardos3.
         Dentre os quais, de acordo com pesquisa realizada em meados de 2008 pelo
economista Marcelo Neri, do Centro de Políticas Sociais (CPS) da Fundação Getúlio Vargas
(FGV), 53,5% dos negros e 47,3% dos mestiços no Brasil pertencem às classes A, B e C.

3
    C.f. Sinopse do Censo Demográfico 2010. p.225-230.
                                                                                                           20
Ainda segundo Neri, no Brasil negros e mestiços juntos são 48% da classe média,
incluindo o quadro de 15% de afrodescendentes no recorte de 1% das famílias mais ricas do
país – sendo respectivamente 1,8% pretos e 14,2% pardos, além de 52%                de negros
distribuídos nas classes D e E.
       Acrescenta-se a isso, dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domícilio (PNAD
2009) os quais indicam um suave aumento de 2,3 anos no tempo de estudo dos afro-
brasileiros, bem como o crescimento do número de negros que concluem o ensino superior,
quando comparado à década passada.
       Além do mais, conforme o Census Bureau de julho de 2008, nos Estados Unidos os
negros compõem 10% das famílias com renda igual ou acima da casa dos 100.000 dólares,
83% da população afro-americana tem, no mínimo, o ensino médio e 20% da população negra
concluiu o ensino superior (graduação ou pós) no país.
       Neste ponto, é imprescindível observar que embora o paradigma de consumo tenha
alterado o neoliberalismo para uma forma de organização a partir de pequenos “nichos” de
mercado - mobilizando grandes montantes de dinheiro, os meios de comunicação ainda não
operam considerando o mercado já existente da população negra com altos níveis econômicos
e educacionais.
       Ao invés disso, apresenta corriqueiramente imagem do afro-descendente carregada de
estereótipos negativos. O que se revela no fato de a mídia há décadas, freqüentemente, vir
excluindo da arena dos conflitos político-ideológicos midiáticos a problemática racial que
ainda opera acirrando a falta de identificação, baixa auto-estima e, principalmente, reforçando
um quadro social em que negros e brancos no Brasil e nos Estados Unidos sustentam suas
vidas desarticulados pela desigualdade.
Esta desvantagem, entre negros em relação aos brancos, é apontada de forma natural no
quadro brasileiro educacional, econômico e social. Em que a incidência de analfabetismo
entre negros é de 26,7% contra brancos a 5,9% da população brasileira com a diferença em
média de 57,4% entre os rendimentos-hora de negros e brancos na esfera econômica; e no
âmbito social, a construção pela mídia da imagem de negros freqüentemente aludida à
sexualidade, musicalidade, ausência de moralidade ou de bons costumes e precariedade
econômica e educacional. Além disso, há ainda a disseminação da imagem da fé da população
afrodescendente e de suas práticas, como a expressão do mal.


                                                                                            21
Nesse sentido, tem-se como resultado a participação de afro-descendentes com iniciativas
adotadas há séculos para encontrar e produzir alternativas de comunicar o ponto de vista da
população negra e expressar seus pontos de vista.


       2.6 Os meios de comunicação da população negra


       O Jornal da liberdade foi o primeiro jornal publicado por afro-descendentes e teve sua
origem em uma reunião na casa do Sr. Crummell, sob o comando de dois nomes proeminentes
do grupo – Rev. Samuel Cornish e John B.Russwurm, editores-chefes –             a publicação
proclamou: " Agora é nossa vez ... Agora queremos defender nossa própria causa, há muito
tempo que os outros falam de nós e sobre nós”.
       Portanto, o surgimento da imprensa negra nos Estados Unidos, em 1827, ocorreu como
alternativa de expressão dos conflitos político-ideológicos na arena midíatica, consistia na
procura de formas para confrontar questões sociais, políticas e econômicas, comunicando os
pontos de vista e as opiniões da comunidade negra sobre questões gerais da sociedade.
       Isto porque, embora os afro-americanos tivessem em suas igrejas, fraternidades e
associações o meio de expressão coletiva e diálogo social entre os membros da comunidade, o
uso dos habituais canais de comunicação, principalmente os jornais, era negado para os
negros, que constantemente tinham a integridade moral étnica questionada e muitas vezes
eram difamados pela imprensa.
       Durante os últimos 180 anos, desde o surgimento do Jornal da Liberdade, a imprensa
negra norte-americana tem registrado os acontecimentos e comentado sobre eles, sobre a
forma que ocorreram e o impacto que tem causado à população negra, dando voz as batalhas
dos afro-americanos para superação dos efeitos da escravidão e discriminação, buscando
igualdade social e colaborando para a continuidade da defesa da causa.
       Ao longo dos anos, foram muitos os contribuintes da imprensa negra que emprestaram
seus talentos como editores, jornalistas, colunistas e cartunistas incluindo os maiores nomes
da história americana. Dentre eles, estão Frederick Douglass, W.E.B. Dubois, Ida, B. Barnett
Wells, Langston Hughes, Bearden Romare, James Weldon Johnson, McLeod Bethune Maria e
Daisy Bates.



                                                                                          22
Em 1914, sob o clamar de John Sengstacke do “Defensor de Chicago”, foi realizada
uma reunião com os principais editores negros de toda a nação, sobre a qual Sengstacke
afirmou ter sido realizada para sintonizar nossas energias em um objetivo comum para o
jornalismo negro.
       Pelo menos um representante de cada uma das 22 publicações nacionais estava
presente e todos juntos decidiram por formar a Associação Negra Nacional de Editores que,
por volta da década de 50, foi renomeada para Associação Nacional da Imprensa negra e
editores de jornais (RNAP). Ela é formada atualmente por mais de 200 jornais negros nos
Estados Unidos e Ilhas Virgens, com um rendimento anual em torno de 15 milhões de euros.
       Assim, na era da comunicação do novo milênio a RNAP - a imprensa negra
estadunidense continua a atuar de acordo com a missão estabelecida pelos editores fundadores
" Defender sua própria causa".
       Já no Brasil, apesar do lançamento de o Pasquim O Homem de Côr, a primeira
publicação para afro-brasileiros ter ocorrido em setembro de 1814. Os momentos iniciais da
imprensa negra brasileira foram marcados por inúmeros contratempos, dentre eles o próprio
escravismo e seus instrumentos afins.
       Os afro-brasileiros enfrentaram grandes dificuldades para tornar pública sua própria
voz. Além disso, a falta de maquinário próprio foi um problema que afetou a produção de
algumas publicações. Por isso, até mesmo os impressos que nunca tiveram distribuição
nacional são parte do esforço coletivo para controlar os códigos da dominação e subvertê-los.
       Um dos casos vingadouros da produção em meios de comunicação por afro-
descendentes deu-se quando a partir do século XX passou a ser publicado o Alvorada -
periódico de maior longevidade no país produzido com pequenas interrupções de 1907 à 1965
no Rio Grande do Sul, retratando um momento histórico de luta, disseminação de modelos de
comportamento da época e enfretamento das dificuldades sociais encontradas pela população
negra, e de acordo com Domingues:


           Assim como outros jornais da população negra [grifo nosso] o Alvorada enfocava as mais
           diversas mazelas que afetavam os afro-descendentes nas áreas de trabalho, da habitação. Eles
           tornaram-se o espaço privilegiado para pensar e discutir alternativas para os problemas de
           desigualdade na educação, na saúde e no trabalho. Além disso, as páginas desses periódicos
           constituíram veículos de denúncia do regime de "segregação racial" que incidia em várias cidades
           do país, impedindo o negro de ingressar ou freqüentar determinados hotéis, clubes, cinemas,



                                                                                                         23
teatros, restaurantes, orfanatos, estabelecimentos comerciais e religiosos, além de algumas
              escolas, ruas e praças públicas.
                                                                          (Domingues, 2009, p. 106)


          Com o passar do tempo, e principalmente durante o período de ditadura militar no
Brasil a repressão à imprensa e aos movimentos sociais enfraqueceu e desarticulou a cobrança
da cobertura de questões raciais na mídia. Assim, somente durante o processo de
redemocratização no país a militância negra conseguiu um fortalecimento e uma mobilização
na busca por uma forma de resistência mais organizada e unida. O que também provocou o
crescimento da demanda por uma cobertura da grande mídia dos temas relacionados aos
negros.
          Deste modo, na década de 80, a imprensa recém liberta da ditadura ganhou força e
passou a assumir uma postura diferente e a atuar de forma mais denunciativa e o negro passou
a ganhar um modesto espaço na mídia.
          Em meados da década de 90, seguindo o modelo de algumas revistas norte-americanas
lançadas na década de 70, especialmente para o público negro no Brasil, estreou em âmbito
nacional a revista Raça Brasil que no seu lançamento, atingiu uma tiragem de 280 mil
exemplares. O que sucitou o questionamento sobre o quanto os afrodescendentes tem sido
considerados pelos meios de comunicação de massa, que normalmente adaptam-se à realidade
do mercado, segmentando suas ações e criando materiais impressos, radiofônicos e televisivos
para nichos específicos de informação, homens, mulheres, grupos étnicos.
          Assim, faz-se necessário analisar a representação que os afro-descendentes tem ao
considerarmos que a população negra não só forma um nicho que se mobiliza para existir na
representação midiática, como também, intersecciona-se com diversos nichos de grandes
sociedades multirraciais.


3. OBJETIVOS

          A pesquisa tem como objetivo principal verificar em que situações e como homens e
mulheres negras, famosos ou não, são representados em fotografias, anúncios produzidos pela
linha editorial ou histórias de revistas segmentadas de informação, feminina e masculina, do
GRUPO Abril, assim como realizar a análise de uma publicação voltada para o público étnico
e comparar as edições brasileiras estudadas com suas versões originais ou similares

                                                                                                       24
estadunidenses. Pois, constitui também, objetivo do trabalho conferir como é o discurso destas
representações no Brasil e nos Estados Unidos da América.


4. JUSTIFICATIVA

       No cenário político brasileiro, após dez anos em discussão na Câmera, foi aprovado
pelo Senado e sancionado pelo Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva o Estatuto
de Igualdade Racial que representa uma conquista do movimento social de negros que durante
anos cobram a formulação e implantação de políticas públicas para a equidade social entre
brancos e afro-brasileiros desde a redemocratização do país no final dos anos 80 e início dos
anos 90, do século passado.
       O estatuto apresenta em sua proposta políticas de promoção de igualdade de
oportunidades definindo o que é discriminação racial, desigualdade racial e quem pode ser
considerado negro; tornando obrigatório o ensino de história geral da África e da população
negra do Brasil nas escolas de ensino fundamental e médio, públicas e privadas; reiterando a
liberdade do exercício dos cultos religiosos de origem africana; prevendo multa para quem
praticar crime de racismo na internet, e também, a interdição da página da web que exibir
irregularidades; garantindo às comunidades quilombolas direitos de preservar costumes sob a
proteção do Estado; e estabelecendo para o poder público a responsabilidade de criar
ouvidorias permanentes em defesa da igualdade racial para acompanhar a implementação das
medidas; além de certificar-se que o Estado está adotando medidas para coibir a violência
policial contra a população negra.
       Além disso, uma outra vitória para os afro-americanos, considerada um grande avanço
na luta pela igualdade racial na sociedade é o fato da maior potência do mundo ter elegido, há
dois anos, seu primeiro presidente negro Barack Obama. Nas palavras do Professor de Ciência
Política da Universidade do Texas, Thomas Brunell: “mostra que superamos uma barreira
que, há dez anos, parecia intransponível”.
       Principalmente, ao considerarmos o passado recente de segregação regulamentada por
lei, cerca de 50 anos atrás, que estabelecia a supressão e opressão do direito dos negros nos
Estados Unidos da América, privilegiando brancos em detrimento de negros e determinando
para cada raça seus bairros, escolas, cinemas e transporte próprios.



                                                                                           25
Apesar dos avanços, como alertou o professor da Universidade Estadual de Michigan,
Ronald Hall na véspera da eleição presidencial:


           “a vitória de Obama pode dar a impressão de que não há mais preconceito, não há mais racismo, o
           que é errado. Houve uma melhora, é verdade, mas ainda há muitos problemas”. “O racismo ainda
           está vivo. A diferença é que as pessoas não admitem que são racistas, por vergonha, mas elas
           demonstram isso nos seus atos. O racismo continua existindo de forma disfarçada”.
                                                                                 (Hall, Ronald, 2008)

       A exemplo disso, no Brasil, onde políticas públicas para a equidade entre brancos e
negros foram adotadas o racismo cordial foi observado, principalmente, pela significativaa
reação da mídia à agenda do debate político, quando vários colunistas e líderes de aparelhos
midiáticos vieram a público reforçar o discurso da "democracia racial", comprovando o
argumento da linha de estudos culturais que afirma que o sistema de racismo “no Brasil”
[grifo nosso] tenta homogeneizar a diferença e a desigualdade.
       Além disso, muitos foram os ataques às políticas específicas de combate ao racismo,
criticando a luta contra a precariedade das condições socioeconômicas em que os negros tem
sido mantidos, e que dificulta para eles o acesso à educação de qualidade, saúde e boas
condições de trabalho no mercado, entre outras desvantagens produzidas.
       Como (Magnolli, 2009), que em seu livro "Uma gota de sangue" defendeu que não há
distinção de raça, o conceito de raça é uma invenção dos movimentos sociais de negros para
separar a sociedade. Ele criticou, também, questões como a reserva de cotas nas universidades
públicas, ponto que foi retirado da versão final do Estatuto da Igualdade Racial, junto com a
reserva de cotas para negros em partidos políticos e trabalhos em publicidade.
       Diante disso, o estudo do discurso da mídia revela-se de extrema relevância, não só
para os profissionais de comunicação por fornecer material para a compreensão e
questionamento sobre a linha das nomeações com as peculiaridades da realidade social, mas
também, para profissionais da educação por facilitar o acompanhamento das questões raciais
em revistas que constroem estilos de vida junto com a venda da informação.




                                                                                                       26
5. A PESQUISA

       5.1 Tema do Trabalho

       A representação do negro e das relações raciais nos meios de comunicação: Um estudo
comparativo em revistas de segmentos no Brasil e nos Estados Unidos.


       5.2 Contexto do Tema

       O cenário de enfrentamento da desigualdade racial em sociedades multiétnicas tem
sofrido transformações, algumas delas acontecem de forma mais rápida, outras tem ocorrido
de forma gradual, lenta e sofrido resistência.
       Nesse sentido, questões como a reserva de cotas nas universidades públicas, partidos
políticos e trabalhos em publicidade são exemplos de avanços que não passaram imunes ao
discurso da meritocracia e, principalmente, aos argumentos da democracia racial.
       A exemplo, na sociedade brasileira pontos garantidores da equidade de direitos no
espaço educacional, político e profissional foram retirados do Estatuto da Igualdade Racial e
nos Estados Unidos continua visível a desvantagem social, midiática e salarial que homens e
mulheres negras vem vivendo, assim como a manutenção da representações de
afrodescendentes    apresentandos separadamente de brancos, reforçando uma releitura do
dogma de “separados mais iguais”.
       Tendo em vista este cenário, o objetivo do estudo é analisar o discurso da mídia sobre
pessoas negras, comuns ou celebres e as relações raciais existentes nesse discurso das revistas
segmentadas de maior representatividade no Brasil e nos Estados Unidos.


       5.3 Problema do Tema

       A construção da imagem do negro nas revistas segmentadas do Brasil e dos Estados
Unidos.

       5.4 Problema da pesquisa

       Verificar como é apresentada e representada a imagem de pessoas negras em revistas
de segmento Brasil e dos Estados Unidos.


                                                                                            27
5.5 Universo da pesquisa

       Revistas de segmento voltadas para os públicos específicos de informação, feminino e
masculino no Brasil e nos Estados Unidos. Comparando-os com as publicações do público
étnico. Respectivamente, Veja/Time, Nova/Cosmopolitan, Playboy Brasil/Playboy Estados
Unidos e Raça/Ebony;


       5.6 Amostra

       No Brasil e nos Estados Unidos, foram escolhidas quatro edições - uma por trimestre
de revistas específicas de informação, feminina, masculina e étnica.
       As publicações foram selecionadas em uma ordem trimestral, com uma escolha
aleatória das edições antes da compra. Nesse sentido, a amostra correspondeu respectivamente
a:


       Primeiro trimestre de 2010 – a edição de janeiro das revistas mensais e uma das
publicações do mês de janeiro das revistas semanais.
       Segundo trimestre – a publicação escolhida deveria encerrar o segundo trimestre, ou
seja, junho;
       Terceiro trimestre – a edição deveria corresponder também ao fim do trimestre, no
caso edições do mês de setembro.
     Quarto trimestre – neste caso a publicação escolhida deveria ser a primeira do último
mês do trimestre, propiciando um quadro mais geral do perfil de publicações do ano,
dezembro.


     5.7 Hipóteses


Hipótese 1:
       Na mídia, o afrodescendente tem um espaço inferior a sua representação demográfica
nas sociedades brasileira e estadunidense.




                                                                                         28
Hipótese 2:
       A população negra apresentada nas revistas de segmentos sofre estereotipia
comportamental, sócio-cultural e econômica estabelecida ao longo dos séculos na sociedade.


Hipótese 3:
       O discurso sobre as representações do negro nas revistas de segmento omite,
desarticula ou esvazia o conflito racial existente na sociedade.


       5.8 Objetivos específicos

       Verificar em que situações e como homens e mulheres negras, famosos ou não, são
representados em fotografias, anúncios produzidos pela linha editorial ou histórias de revistas
segmentadas de informação, feminina e masculina e etnia.

       Verificar a ocorrência de estereótipos na representação de pessoas negras; identificar a
proporção estatística nas revistas de aparições de pessoas negras; e verificar a proporção
estatística dos discursos positivos, negativos e meramente ilustrativos no conteúdo midiático.




                                                                                             29
6. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICO


        Para realizarmos a pesquisa sobre a representação do negro nos meios de comunicação
de massa, optamos por realizar uma pesquisa exploratória nas revistas de segmento de nichos
de mercado que fornecessem uma abrangente perspectiva da sociedade.
        Deste modo, no Brasil e nos Estados Unidos da América foram selecionadas no ano de
2010 quatro edições - uma por trimestre de revistas específicas de etnia, informação, juvenil,
feminina e masculina,. Respectivamente: Raça / Ebony; Veja / Time; Atrevida / Seventeen;
Nova / Cosmopolitan, e Playboy Brasil / Playboy E.U.A.
        No entanto, para um aprofundamento da pesquisa e uma contemplação mais objetiva
dos resultados o estudo restringiu o foco a produções do Grupo Abril, comparando as com
versões similares, muitas vezes originais, das produções brasileiras, preservando os dados da
análise de revistas do segmento étnico por entender que estas revelavam a discrepancia dos
resultados das representações do negro em diferentes nichos.


        6.1 A escolha do objeto


        A princípio, o estudo visava analisar quatro edições aleatórias de revistas segmentadas
do ano de 2010, com distribuição nacional e com maior representatividade no mercado
brasileiro.
        No entanto, por causa da possibilidade de internacionalização da pesquisa com
extensão aos Estados Unidos, outra grande sociedade multirracial de imensa relevância no
cenário de enfrentamento da desigualdade racial no mundo, o estudo incluiu edições
estadunidenses, correspondentes às revistas analisadas no Brasil e publicadas no mesmo
período selecionado para a pesquisa.


        6.2 Coleta dos Dados no Brasil


        Sob a orientação do Prof. Dennis de Oliveira e sua linha de pesquisa, foram escolhidas
as revistas Atrevida, Playboy e Veja, devido sua singularidade e liderança de share-of-mind na



                                                                                            30
sociedade brasileira4. Já as revistas Nova e Raça Brasil foram selecionadas, também sob os
auspícios do Prof. Dennis, por serem as principais revistas na lista das melhores do Brasil e
representarem muito bem seus nichos de mercado.
          Já a análise de categoria e teor do discurso foi realizada graças as orientações e
instruções do Prof. Paulo Nassar que propiciou um esclarecimento claro e objetivo de gênero
jornalístico e suas implicações na disciplina Produção de Periódicos Institucionais.
          Ainda, o estudo propociou um rico e imenso relatório de dados que pertinentemente
deveriam ser considerados para a reflexão, e até mesmo readequação, da postura na produção
e disseminação de conteúdos das revistas de segmentos específicos.
          Para tanto, foram escolhidas as revistas produzida pelo Grupo Abril para uma pesquisa
mais detalhada e análise de conteúdo mais aprofundada, por considerarmos que a iniciativa de
mudanças do quadro de desigualdade racial deve partir sobretudo de líderes do mercado e
empresas pioneiras e inovadoras como também modelos de tradição, respeito e credibilidade
na sociedade.
          Nesse sentido, foi conferido o contexto histórico destas publicações e na seqüência foi
realizado o clipping dessas revistas. As publicações foram selecionadas em uma ordem
trimestral, com uma escolha aleatória das edições antes da compra. Devido ao fato das edições
num.1 do ano de 2010 das revistas semanais norte-americana terem sido publicadas em
dezembro do ano anterior e corresponderem ao contexto de 2009, foi escolhida para a
pesquisa a edição num.2 do mês de janeiro, para que a data de estudo continuasse condizente a
análise das revistas semanais brasileiras a seleção realizada foi extendida as publicações do
Brasil.


          6.3 Coleta de dados nos Estados Unidos da América


          Inicialmente, foi realizada virtualmente uma pesquisa sobre a missão das revistas, para
garantir que a extensão norte-americana da pesquisa obedecesse aos critérios aplicados à
seleção do material de pesquisa brasileiro.



4
  Anexo relação do IVC – Instituto Verificador de Circulação no Brasil com relação de revistas com maior
circulação em 2010.

                                                                                                           31
As publicações que antes eram selecionadas em ordem aleatória, passaram a ser
escolhidas em uma ordem trimestral, com uma escolha aleatória das edições no trimestre antes
da compra. Nesse sentido, a amostra corresponde a primeira do começo do ano de 2010 –
janeiro; a segunda do final do segundo trimestre – junho; a terceira do final do terceiro
trimestre – setembro e para a quarta revista foi escolhida a edição que iniciava o quarto
trimestre – dezembro.


       6.4 Em campo


       A pesquisa foi iniciada sob a orientação do Prof. Dr. Dennis de Oliveira, quando em
março de 2010, o projeto de estudos foi contemplado por uma bolsa da Pró-reitoria da
Graduação.
       Em algumas reuniões, foi realizada a seleção de revistas de segmentos de extratos
sociais específicos para que o resultado da análise da representação do negro na mídia e o
discurso sobre o negro construído nas revistas refletisse de forma abrangente as tendências
sociais. As revistas selecionadas tiveram sua missão e tiragem conferidos e após a definição
do número de exemplares a ser estudado, a compra no Brasil passou a ser feita diretamente em
bancas de jornais e livrarias pelo Prof. Dennis.
       No entanto, em meados de agosto de 2010, com a internacionalização do projeto de
estudos aprovado pelo programa Raça, Desenvolvimento e Desigualdade do Ccint – FEA USP
em parceria com a CAPES e a FIPSEP, a idéia da pesquisa expandiu-se e o universo da
análise passou a analisar versões estadunidenses, com relevância semelhante às edições já
estudadas no Brasil.
       Deste modo, em agosto, a pesquisa passou a ser realizada nos Estados Unidos da
América e as revistas passaram a ser compradas pela internet. A princípio, por causa da
necessidade de edições anteriores ao mês de chegada ao exterior, segundo pela ausência de
bancas de jornal e a restrição da compra das revistas a livrarias, e, terceiro por causa do
constrangimento que a solicitação de edições específicas da revista Playboy provocavam ao
vendedor e a mim, pesquisadora, devido a questões culturais norte-americanas.




                                                                                         32
Inicialmente, foram compradas as edições anteriores ao mês de setembro de 2010, as
quais necessitaram uma pesquisa minuciosa de termos, siglas e jargões para uma compreensão
mais fluente das expressões.
         As edições restantes foram compradas em livrarias e farmácias norte-americanas,
exceto as correspondentes ao mês de dezembro que, em meados da segunda semana do mês
natalino - mais precisamente dia nove de dezembro, não estavam mais disponíveis para a
venda.
         Por este motivo, as edições de fim de ano foram compradas on-line de assinantes que
não precisavam manter as revistas. Apesar dos contratempos, até o fim de dezembro todas as
edições americanas já haviam sido compradas e mais da metade delas clippadas e mapeadas.
         No entanto, na volta ao Brasil, foi um verdadeiro desafio encontrar edições
correspondentes ao início de 2010, com a busca em sebos, bancas de jornal e bibliotecas. Por
estr motivo, uma das revistas analisadas só foi encontrada em versão on-line, após a busca até
mesmo na própria editora, o que atrasou consideravelmente a mensuração dos resultados.
         Durante a análise, os textos foram separados entre os tipos: carta do leitor/comentário,
crônica, declaração, depoimento, entrevista, notícia e quadrinho. Além disso, suas respectivas
mensagens foram classificadas por opinativa, informativa, interpretativa e distinguidas pelo
teor das conotações: positiva, neutra, negativa e ambivalente, sendo que a última permitia uma
leitura ambígua da conotação que a mensagem estava transmitindo.
         Por fim, foram produzidos gráficos ilustrativos para a comparação de milímetros
quadrados do espaço conferido a negros em relação ao produto total da revista; gráfico
comparativo de revistas do mesmo nicho nas edições brasileiras e americanas referentes à
mesma data; gráfico representativo dos teores mais ocorrentes na análise da revistas; e
apresentação das categorias de estereótipos mais ocorrentes.




                                                                                              33
7. APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS

Primeiramente, os dados foram tabulados em uma planilha geral, em CD anexo, na qual foi
feito um breve resumo do recorte em que houve a aparição de pessoas ou aspectos da cultura
negra, indicado a localização do recorte na revista, classificado o teor em que foi apresentada
a imagem ou citado algo diretamente relacionado a pessoa ou comunidade negra.
       Em seguida, foi apontada a medida em cm! da imagem, menção ou citação e realizada
uma comparação métrica entre as aparições de afrodescendentes e o conteúdo total das
revistas. Estes dados serviram de suporte para demonstrar que, na mídia, no caso revistas de
segmentos para diversos grupos, o negro tem um espaço inferior a sua representação
demográfica tanto na sociedade brasileira, quanto na norte-americana.
       Como revelam os dados extraídos das revistas Veja, Time; Nova, Cosmopolitan; e
Playboy Brasil e Playboy E.U.A e a aparição de afrodescendentes em geral é bem inferior a
10% do seu conteúdo, o que não correspondeu à proporção social de afrodescendentes em
2010, sequer, nos Estados Unidos da América, onde este grupo étnico representa em torno de
12% da população americana com representação na média na mídia de 40% do valor
proporcional ao cenário demográfico da população norte-americana. Salvo duas exceções, a
primeira de uma edição da revista Times de janeiro que teve 22% de seu conteúdo voltado à
aparição de negros, no entanto, grande parte ligada a uma imagem altamente negativa, pois
abordava o atentado terrorista de um estudante nigeriano a um avião em Detroit.
       A segunda exceção foi da revista Ebony que, no mesmo período, garantiu por volta de
55% do conteúdo de suas edições a apresentação de afro-americanos e à temática negra.
       Já no Brasil, a representação do negro no discurso das revistas de segmentos, similares
as analisadas nos Estados Unidos, também não alcançou sequer 10% do conteúdo total das
revistas, o que significa uma exibição de 14% do valor proporcional ao quadro demográfico
de afro-descendentes no Brasil. Ou seja, o conteúdo das revistas de segmentos é 82% inferior
à representação proporcional da população negra no país.
       Neste caso, tem exceção apenas a revista segmentada voltada para o grupo étnico
afrodescendente a Raça Brasil, que destinou cerca de 75% do seu conteúdo à exibição e
valorização dos afrodescendentes, da comunidade e da cultura negra, durante o ano de 2010.




                                                                                            34
Como mostra o gráfico 4 que traz a porcentagem da aparição de negros por revista dos
trimestres de 2010, vê-se a possibilidade de comparação entre o espaço ocupado por negros na
mídia em produções segmentadas para diversos públicos.

Graf.4 porcentagem da aparição de negros por revista dos trimestres do ano de 2010.

                           Aparição de negros por revista dos trimestres do ano de 2010.


       90,00


       80,00


       70,00


       60,00


                                                                                                       Jan
       50,00
                                                                                                       Jun
                                                                                                       Set
       40,00
                                                                                                       Dez


       30,00


       20,00


       10,00


        0,00
                a




                                                                                         l
                        e




                                                             sil




                                                                           .
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                                    a




                                                                                                   t
                                                                                      si
                ej




                                                                         .A
                       m




                                                                                                Je
                                  ov



                                             ita




                                                                                   ra
                                                          ra
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                      Ti




                                                                        U
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                                                                                                 y
                                             ol




                                                                                   B
                                                          B




                                                                                               on
                                                                      E.
                                           op




                                                                                  a
                                                        oy




                                                                                             Eb
                                                                               aç
                                                                      oy
                                          m



                                                     yb




                                                                               R
                                                                   yb
                                        os



                                                      a
                                      C




                                                                 a
                                                   Pl



                                                              Pl




Fonte: SILVA, L. A representação do negro e das relações raciais nos meios de comunicação: Um estudo
comparativo em revistas de segmentos, do Grupo Abril, no Brasil e suas respectivas versões norte-americanas.


        Deste modo, os dados revelam que, no caso americano, apesar de baixa a porcentagem
da aparição de negros nas revistas de segmento para diversos grupos, a proporção de exibição
é próxima do número de afro-americanos, enquanto que a média brasileira de exposição e
representação de afrodescendentes e temáticas da cultura negra chega a ser aproximadamente
cinco vezes menor do que a representação deste grupo étnico-racial, que possui 48% da sua
população distribuidas entre as classes A, B e C no Brasil. Contudo, apesar de representarem

                                                                                                             35
expressivamente os grupos alvo dos segmentos estudados, apenas a revista voltada
especificamente para os afrodescendentes traz uma aparição, não só perto da proporção
demográfica de afro-brasileiros, como também ultrapassa cerca 20% o total de seu conteúdo
para reafirmar a apresentação, exibição, discussão e possibilidades de valorzação dos
afrodescendentes no país. Isto não promove a equidade da exposição do negro na mídia na
mesma proporção de sua representação no Brasil, o que se revela controverso, ao
considerarmos que a sociedade americana até poucas décadas atrás era estritamente
segregacionista, enquanto que o Brasil há séculos hasteia a bandeira da democracia racial,
revelada como um mito a partir da analise da disparidade existente na possibilidade de
aparição de afrodescendentes em meios de comunicação, revistas, que não sejam os
reservados para eles.




                                                                                       36
Graf.5 Média da porcentagem da aparição de negros por revista de acordo com a conotação apresentada
no ano de 2010

                                                     Proporção da aparição de afrodescendentes por segmento

                              Ebony
      Étnica




                               Raça
      Masculina




                       Playboy E.U.A


                         Playboy Bra
      Feminina




                       Cosmopolitan


                              NOVA
      Estilo de vida




                               Time


                                Veja

                                       0                       10                  20                      30                   40                   50                    60
                                                    Estilo de vida                      Feminina                        Masculina                         Étnica
                                       Veja                Time             NOVA            Cosmopolitan    Playboy Bra     Playboy E.U.A Raça               Ebony
   Conotação Positiva                         1,3                    3,30      0,10                0,80          9,30               1,30         56,60             23,00
   Conotação Neutra                           2,5                    1,70      2,00                4,00          2,80               2,80         19,00             27,80
   Conotação Negativa                         1,6                    3,70      0,00                0,20          1,00               0,10         0,80              2,00
   Conotação Ambivalente                      1,9                    1,70      0,30                1,20          1,00               1,00         1,60              1,00

Fonte: SILVA, L. A representação do negro e das relações raciais nos meios de comunicação: Um estudo
comparativo em revistas de segmentos, do Grupo Abril, no Brasil e suas respectivas versões norte-americanas.


                       Outro ponto importante, observado a partir da análise dos dados coletados é que, nas
revistas de segmento a maior parte da construção do discurso que envolve os afrodescendentes
e a temática negra é desarticulada, com a produção de um conteúdo com conotação neutra em
que os pontos para a valorização étnico-racial não são abordados, apesar da tentativa das
revistas de segmento étnico de promover a visibilidade da imagem dos afrodescendentes e da
comunidade negra de forma mais articulada, fomentando a luta contra a desigualdade, a
discussão da questão racial, o debate pela equidade social e a valorização do povo negro,




                                                                                                                                                                                37
Graf.6. Conotação da imagem atribuída as aparições e menções a afrodescendentes nas revista de
segmento do ano de 2010



                Proporção de conotações atribuídas aos afrodescendentes
                                     nas revistas
                                  ambivalente 6%
                   negativa 5%


                                                                          positiva 36%




                neutra 52%


                             ambivalente   negativa   neutra   positiva




       Em outras palavras, a imagem do negro, célebre ou não, quando é apresentada de
forma positiva ou neutra, está na maioria das vezes como mercadoria associada à venda,
promoção ou exibição de marcas, objetos, acessórios ou produtos de beleza.
       Assim, além do argumento sócio-econômico utilizado para manter pequeno o espaço
do negro na sociedade, é possível perceber que a construção do discurso a cerca da imagem
dos afrodescendentes nas revistas de segmentos, que não as étnicas, dificilmente carrega
significados que transcendam a imagem do negro e incitem ao debate, seja sobre a questão
racial, a desigualdade da visibilidade deste grupo étnico ou as dificuldades de acesso a
condições menos marginais, tanto na mídia quanto na sociedade.




                                                                                           38
8. CONCLUSÃO

       A partir do clipping das revistas foi possível confirmar que as lógicas de racismo
existentes no Brasil e nos Estados Unidos persistem e são reforçadas de modos diferentes.
       Na mídia brasileira, a representação de afrodescendentes possui um infímo espaço e
sofre categorizações estereotipadas vísiveis, assim como a contínua exibição e disseminação
da imagem de negros em espaços reservados ou para celébres que alguram espaços
permitidos, para afrodescendentes expostos em contraposições hierárquicas desfavoráveis.
       Enquanto que nos Estados Unidos, além da imagem de afrodescendentes ser exposta
em contraposições hierárquicas, ela foi exibida muitas vezes separadamente da imagem de
pessoas brancas.
       Além disso, foi perceptível    que a articulação da população afrodescendente e o
enfrentamento do preconceito racial são omitidos do discurso existente no conteúdo de
revistas segmentadas destinadas a diversos públicos tanto na sociedade brasileira, quanto
norte-americana.
       No mais, o estudo permitiu constatar no material analisado que as revistas de
segmentos do Grupo Abril, assim como muitos outros meios de comunicação, possuem um
número baixíssimo de aparições de afrodescendentes em suas publicações.
       A análise, também, comprovou que a distinção racial ocorre nítidamente com base no
referente biológico por meio da adoção de práticas discursivas que hierarquizam,
estereotipiam ou excluem os afrodescendentes no conteúdo produzido. O que só reforça a
marginalização e estereotipia sócio-cultural e econômica sofrida pela população negra, por
séculos, na sociedade.
       Além disso, a pesquisa possibilitou observar que a postura revelada na produção de
conteúdo das revistas do Grupo Abril é a de naturalização das questões étnico-raciais,
sustentação da hierarquização das representações dos negros e a estereotipização cultural,
econômica e comportamental de afrodescendentes.
       Pontos, os quais ferem um dos pressupostos básicos do Grupo Abril que declara
“repudiar qualquer tipo de discriminação por credo, raça, sexo, orientação sexual ou
ideológica e condição socieconômica”.
       O que se demonstra irônico, por referir-se na verdade aos princípios da mesma
empresa que emprega na produção de seus materiais uma das mais recentes práticas do

                                                                                            39
racismo. Na qual, a discriminação racial ocorre por meio de representações sociais negativas
dos afrodescendentes sustentadas por inferências que desvalorizam os aspectos culturais,
comportamentais e as condições sócioeconômicas da população negra.
       Neste sentido, é preciso ressaltar que a democracia racial ainda é uma barreira não
transposta na sociedade e retificada por séculos pelos grupos dirigentes dos veículos de
comunicação, principalmente, devido a manutenção de espaços pré-definidos de acesso do
negro à mídia e pela preservação de construções sociais que visam manter privilégios
estabelecidos históricamente.
       Portanto, é imprescindível chamar a atenção para a necessidade da adequação das
práticas discursivas nas revistas de segmento da Abril com os valores e pressupostos adotados
pelo Grupo.
       Para isso, a princípio, as linhas editoriais brasileiras devem reconhecer a existência do
mito da democracia racial e a gritante necessidade de medidas afirmativas para a abertura de
espaço para os afrodescendentes nos meios de comunicação.
       Porque, sem uma iniciativa que promova a presença do negro na mídia será impossível
para as publicações estudadas do Grupo Abril, mesmo com um reposicionamento equitativo,
ao menos acompanhar a tendência de suas homônimas estadunidenses que possuem o número
de aparições de afrodescendentes na mídia próximo ao percentual proporcional da polução
negra nos Estados Unidos.
       Além disso, outro passo importante que deve ser considerado para a equiparação da
representação da população afrodescendente nas revistas de segmento da sociedade brasileira
é a realização de um material do Grupo Abril que complemente o conteúdo dos outros
segmentos com o direcionamento de sua pauta à assuntos que atendam a demanda existente
em uma sociedade multirracial brasileira, majoritariamente afrodescendente.
       Pois, enquanto as linhas editoriais das revistas de diversos segmentos continuarem a
reforçar o mito da democracia racial e não implementarem ações afirmativas e reparativas na
produção de conteúdo e de representações do negro no Brasil, a imagem do afrodescendente
ainda será apresentada de forma insuficiente e superficial, revelando a fragilidade que se
instaura na construção da identidade do negro em sociedades que continuam a reproduzir o
preconceito.



                                                                                             40
Por isso, é necessário que a sociedade brasileira reveja a retirada de pontos como a
reserva de cotas para afrodescendentes em trabalhos de publicidade da versão final do Estatuto
da Igualdade Racial. Tendo em vista, que isto no Brasil só fortalece o quadro de desigualdade
nas representações de negros na mídia.
       Já, no caso dos Estados Unidos onde a elite negra compõe uma camada expressiva e
altamente considerada, é pertinete o aumento da presença de afrodescendentes em espaços que
não sejam só os vinculados diretamente ao consumo, à beleza, espaços categorizados ou em
contraposições hierárquicas.
       Afinal, estas são condições indispensáveis para promover as possibilidades de
articulação e do enfrentamento da discriminação e da luta diária contra o racismo nas duas
sociedades, luta que na mídia demonstra-se mais avançada no cenário norte-americano.




                                                                                           41
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DEURSEN, F. In Escravos: povo marcado. Disponivél em http://historia.abril.com.br/
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p.106

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                                                                                         42
FAIRCLOUGH, N. In PINHEIRO, P. Bakhtin e as Identidades sociais: Uma possível
construção de conceitos. p. 3 Disponível em www.filologia.org.br/.../bakhtin%20e%20as
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______________ In LADEIRA, F. Relação entre classe e cor: Algumas considerações
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                                                                                          43
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MCDANIEL, Intercultural Communication: A reader 12ª ed. Estados Unidos:
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                                                                                         44
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  • 1. UNIVERSIDADE DE SÃO PAULO ESCOLA DE COMUNICAÇÕES E ARTES LUNALVA DE OLIVEIRA MENDES SILVA A representação do negro e das relações raciais nos meios de comunicação: Um estudo comparativo em revistas de segmentos, do Grupo Abril, no Brasil e suas respectivas versões norte-americanas Apresentação de Trabalho de Conclusão de Curso como pré- requisito parcial para obtenção do titulo de bacharel em Comunicação Social – Relações Públicas. Área de Concentração: Comunicação e Cultura Orientador: Prof. Dr. Paulo Nassar Co-Orientador: Prof. Dr. Dennis de Oliveira SÃO PAULO 2011
  • 2. Autorizo a reprodução e divulgação total ou parcial deste trabalho, por qualquer meio convencional ou eletrônico, para fins de estudo e pesquisa, desde que citada a fonte. SILVA, Lunalva de Oliveira Mendes. A representação do negro e das relações raciais nos meios de comunicação: Um estudo comparativo em revistas de segmentos, do Grupo Abril, e suas versões norte-americanas. Lunalva de Oliveira Mendes Silva; orientador Prof. Dr. Paulo Nassar e co- orientador Prof. Dr. Dennis de Oliveira - São Paulo, 2011. 53 f. Trabalho de Conclusão de Curso - Universidade de São Paulo, 2011.
  • 3. Este trabalho é dedicado às duas Marias de Lourdes que me deram à luz... À primeira por seu amor, seu suporte e por sua incansável bravura na batalha por uma vida mais justa e mais digna. À segunda, in memoriam, pela sua determinação, pela sua ternura, pelos puxões de orelha, pela sua confiança em mim, e principalmente, pelo inestimável despertar da busca interior pelo melhor que eu e muitos outros jovens, contemplados pelo programa Raça, Desenvolvimento e Desigualdade Social, tem para oferecer.
  • 4. AGRADECIMENTOS À Profa. Dra. Luciene Cecília Barbosa, por despertar em mim o estudo da temática racial nos meios de comunicação. À Profa. Dra. Maria Immacolata Vassalo de Lopes, por me introduzir a vida Acadêmica. Ao Prof. Dr. Paulo Nassar, por me orientar prestativamente contribuindo para meu crescimento intelectual. Ao Prof. Dr. Dennis de Oliveira, por me ensinar e co-orientar com sabedoria e paciência, ao longo do processo de pesquisa, contribuindo para meu desenvolvimento científico e intelectual. Ao Prof. Dr. Richard Wright, pelo carinho, a completa atenção e disponibilidade durante o período internacional da pesquisa. Ao Prof. Dr. Carlos Roberto Azzoni e ao Dr.Charles L.Belsey, assim como aos demais responsáveis, pela consolidação e manutenção do Programa Raça, Desenvolvimento e Desigualdade Social. À Coordenação de Aperfeiçoamento de Pessoal de Nível Superior, pela concessão da bolsa e pelo apoio financeiro nos Estados Unidos para a internacionalização desta pesquisa. À Pró-Reitoria de Graduação pelo projeto Ensinar com pesquisa. À todos, meus professores e amigos incríveis que de alguma forma, compuseram um dos blocos que consolida esta realização pessoal, profissional e acadêmica.
  • 5. SUMÁRIO 1. INTRODUÇÃO..................................................................... 7 2. REVISÃO DA LITERATURA...............................................9 2.1 A branquidade normativa e as relações raciais............9 2.2 A identidade do sujeito e sua participação em comunidades práticas..................................................................11 2.3 Ser negro ao longo dos séculos.....................................13 2.4 Cultura e Mídia.............................................................18 2.5 Negro nos meios de Comunicação................................19 2.6 Os meios de comunicação da população negra..............22 3. OBJETIVOS............................................................................25 4. JUSTIFICATIVA....................................................................26 5. PESQUISA..............................................................................28 5.1 Tema do trabalho............................................................28 5.2 Contexto do tema............................................................28 5.3 Problema do tema...........................................................29 5.4 Problema da pesquisa.....................................................29 5.5 Universo da pesquisa......................................................29 5.6 Amostra.......................................]...................................29 5.7 Hipóteses.........................................................................30 5.8 Objetivos específicos.......................................................30 6. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICOS.............................30 6.1 A escolha do objeto.........................................................31 6.2 Coleta dos Dados no Brasil............................................31 6.3 Coleta de dados nos Estados Unidos da América...........32 6.4 Em campo........................................................................33 7. APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS..................................34 Gráfico 4.......................................................................................35 Gráficos 5 .....................................................................................37 Gráficos 6 .....................................................................................38 8. CONCLUSÃO..........................................................................39 BIBLIOGRAFIA......................................................................... 43 ANEXOS..................................................................................... 47
  • 6. RESUMO: O objetivo deste trabalho é verificar, no ano de 2010, em que situações, e de qual forma homens e mulheres negras, celebridades ou não, são apresentados em fotografias, histórias ou anúncios da linha editorial de revistas de segmento do Grupo Abril, analisando a conotação dos discursos e a proporção em que a aparição de negros na mídia faz-se presente. Para isso, foram selecionadas, no Brasil, quatro edições - uma por trimestre de revistas específicas de informação, feminina e masculina. As quais foram comparadas com edições norte-americanas dirigidas ao mesmo público : Respectivamente: Veja, / Time; Nova / Cosmopolitan, e Playboy Brasil / Playboy E.U.A. Palavras-chave: discurso midiático, relações raciais, imagem do negro na mídia. ABSTRACT: The objective of this study is verify, in 2010, what are the situations and how are the scenes in which black people, celebrities or not, have being showed in photography, histories or editorial's advertisement in the Grupo Abril’s targeting magazines. In addition, this study analyzes the connotation's discurses about black people and the proportion which they are showed in the media. Thus, four magazines issues were chosen, one for each trimester, from Brazil and they were compared with their United States of America’s version, in the targeting public magazines: information, feminine and masculine. Respectively: Veja / Time; Nova / Cosmopolitan, e Playboy Brasil / Playboy U.S.A Keywords: connotation’s discourses, racial relations, black people image in the media
  • 7. 1. INTRODUÇÃO O objetivo deste estudo é analisar como são representadas pessoas negras, comuns ou célebres, e as relações raciais nos discursos existentes nas revistas segmentadas mais lidas no Brasil, publicadas pelo Grupo Abril. Além disso, a pesquisa realizará a análise de uma publicação voltada para o público étnico e irá comparar as edições brasileiras estudadas com suas versões originais ou similares nos Estados Unidos. Uma sondagem que é de grande relevância, por ser realizada numa atmosfera de marcos políticos recentes no quadro de enfrentamento da desigualdade racial, o que tem colaborado para o ganho de visibilidade do problema na agenda pública, com a entrada do tema nos meios de comunicação de massa. Nos Estados Unidos da América, há dois anos, a eleição de Barack Obama - o primeiro presidente afro-americano da maior potência do mundo foi um dos avanços no quadro da luta dos negros pela igualdade racial na sociedade. Segundo Thomas Brunell, professor de ciência política da Universidade do Texas, “mostra que superamos uma barreira que, há dez anos, parecia intransponível”1. Este comentário justifica-se ao considerarmos o passado de segregação regulamentada por lei, cerca de 50 anos atrás com a supressão e opressão dos direitos dos negros nos Estados Unidos da América privilegiando brancos em detrimento de negros e determinando para cada raça seus bairros, escolas, cinemas, transporte próprios e locais ou condições de trabalho. Seguindo esta mesma perspectiva, o Brasil também teve uma grande conquista nos avanços que pareciam inconcevíveis há dez anos. Neste caso, a vitória da comunidade negra ocorreu com aprovação do Estatuto de Igualdade Racial pelo Senado, após uma década em discussão na Câmera, e a sanção do presidente da república Luiz Inácio Lula da Silva. Este cenário representa alguma das conquistas dos movimentos sociais de negros, que vem atuando para formular e implantar políticas públicas para a equidade social entre brancos e afrodescendentes, desde a redemocratização do país no final dos anos 80 e início dos anos 90, do século passado. Nesse sentido, o estudo irá conferir em que medida a produção dos discursos nos meios de comunicação de massa, especificamente de revistas segmentadas do Grupo Abril 1 C.f. BUARQUE, D. In G1 - Eleições nos EUA põem em xeque passado de racismo do país. 7
  • 8. (com excessão de uma destinada ao segmento étnico) e suas versões norte-americanas, ocorre considerando o quadro de avanços socioeconômicos e políticos da população afro- descendente. O estudo teve início com uma pesquisa exploratória das revistas de segmento, do ano de 2010, que melhor representassem os nichos do mercado étnico, de informação, feminino e masculino. Em seguida, foram selecionadas quatro edições de revistas - uma por trimestre de publicações específicas de etnia, informação, juvenil, feminina e masculina. Respectivamente: Raça / Ebony; Veja / Time; Atrevida / Seventeen; Nova / Cosmopolitan, e Playboy Brasil / Playboy E.U.A. As revistas foram selecionadas em uma ordem trimestral, com uma escolha aleatória das edições antes da compra e com datas correspondentes as edições estadunidentes analisadas. O conteúdo das publicações foi separados entre tipos: carta do leitor/comentário, crônica, declaração, depoimento, entrevista, notícia e quadrinho. As mensagens transmitidas foram classificadas por opinativa, informativa, interpretativa e distinguidas pelo teor das conotações: positiva, neutra, negativa e ambivalente, sendo que a última permitia uma leitura ambígua da conotação que a mensagem estava transmitindo. Os dados coletados foram utilizados na produção de gráficos ilustrativos para a comparação de milímetros quadrados do espaço conferido a negros em relação ao produto total da revista; gráfico comparativo de revistas do mesmo nicho nas edições brasileiras e americanas com datas correspondentes; gráfico representativo dos teores mais ocorrentes na análise da revistas; e apresentação das categorias de estereótipos mais ocorrentes. 8
  • 9. 2. REVISÃO DA LITERATURA 2.1 A branquidade normativa e as relações raciais Desde 1975, os estudos sobre as relações raciais já alertavam que o termo raça pode não se basear mais em nenhum suporte biológico para a diferenciação de grupos humanos ao longo das linhas raciais. Pelo contrário, como dizia (Banton e Harwood, 1975), ainda assim, a distinção racial ocorre revelando-se diariamente como um produto intencional de processos sociais e históricos criados arbitrariamente para atribuir categorias de pessoas e hierarquizá- las. Um conceito que representa e simboliza os conflitos sociopolíticos e interesses de diferentes tipos de corpos humanos, que têm funções econômicas e políticas articuladas de acordo com relações de dominação e privilégio. Os métodos de determinação, definição e classificação de pessoas foram muitos e sofreram transformações ao longo do tempo. Inicialmente, foi estabelecida a superioridade européia, baseada na identificação com o cristianismo. Posteriormente, um novo termo de identificação apareceu – branco, criado através de métodos científicos (Eze, 1997). Desta forma, a “branquidade” durante os séculos foi construída como “adequada”, "normal" ou "neutra" e tem sido utilizada como o principal meio para a consolidação de poder nas relações raciais, conferindo até os dias atuais a reprodução e sustentação de privilégios aos considerados brancos – norma da humanidade - e estabelecendo inferioridade e marginalização aos classificados como diferentes. Além disso, a branquidade sustenta as práticas mais sutis de racismo, institucionalizadas e, ou os atos individuais de discriminação, dando suporte a comportamentos e atitudes racistas em organizações, na sociedade e na mídia. Contudo, nem mesmo após a desmistificação das possíveis diferenças genéticas utilizadas para hierarquizar os considerados não-brancos, as práticas sociais institucionalizadas de inferiorização e marginalização foram minadas. Além disso, novas estratégias de desvalorização foram adotadas para discriminação racial e foram adicionadas proposições econômicas aos critérios utilizados anteriormente para sustentar e reproduzir no cotidiano as hierarquias de privilégios dos séculos anteriores. O que (Wieviorka, 2000) chama de “novo racismo”, quando novas estratégias de desvalorização, em geral mais sofisticadas, são utilizadas para a discriminação racial. 9
  • 10. Portanto, enquanto o fato de ser branco ou possuir aparência mais parecida com a (norte) européia tem garantido a associação com qualidades e valores mais positivos, como a inteligência, a habilidade, a educação, a beleza, a honradez e a amabilidade. Esta mesma hiper-valorização de traços europeus, particularmente nórdicos como formas de hierarquização racial, há séculos desvaloriza principalmente indígenas e negros e confere à negritude uma aproximação com o primitivo. A ‘negritude´ tem funcionado como signo de maior proximidade dos afro-descendentes com a natureza e, conseqüentemente, da probabilidade de que sejam preguiçosos e indolentes, de que lhes faltem capacidades intelectuais de ordem mais elevada, sejam impulsionados pela emoção e o sentimento em vez da razão, hipersexualizados, tenham baixo autocontrole, tendam a violência e etc. (Hall 1990, p.67) Deste modo, como já observou (Hall, 2003) o referente biológico privilegia marcadores étnicos para conotar diferenças sociais e culturais, e quando o nível genético é imediatamente visível (como as diferenças genéticas supostamente escondidas na estrutura dos genes e “materializadas” em significantes corporais facilmente reconhecíveis), tais como a cor da pele, características físicas do cabelo, feições do rosto e tipo físico, que são significantes utilizados para hierarquização social e funcionam, também, como mecanismos de fechamento discursivo em situações cotidianas. O que explica modelos brancos serem frequentemente associados à beleza, saúde e bem-estar, sendo os representantes universais da espécie humana nos diversos meios discursivos. Assim, é possível notar que o referente biológico nunca opera isoladamente e nunca está ausente, tanto no discurso de “raça”, quanto no de “etnia”, o registro biológico funciona estabelecendo uma articulação discursiva ou uma “cadeia de equivalências” (Laclau e Mouffe, 1984) com as condições sócio-culturais. Portanto, percebe-se que o racismo biológico e a discriminação cultural operam como dois registros de racismo que, na maioria das vezes, estão em jogo simultaneamente. Contudo, faz-se necessário considerar as variadas possibilidades identitárias do sujeito, que tem sido articuladas num processo em que membros sociais são enquadrados em diferentes espaços socioeconômicos e políticos de acordo com características físicas. Para isso, partimos da premissa da relação dialógica do indivíduo, no sentido de sua relação com outro ser fundamentalmente constitutiva do sujeito, que passa a articular sua 10
  • 11. “identidade” em relação com aquilo que o falta – seu outro, seu “exterior constitutivo”. (Lacan, 1977); (Laclau e Mouffe, 1985); (Butler, 1993). Haja vista, o postulado séculos atrás por Hegel de que as pessoas percebem e compreendem a sociedade, primeiramente com base nas perspectivas de seus grupos sociais, perspectivas que são formadas pela localização dos grupos na cultura como um todo e também no modo como experienciam a realidade social. Em outras palavras, a vida em sociedade envolve relações de poder desiguais e impossibilita haver uma única perspectiva sobre a vida social. Deste modo, a cultura expressa o sentido de valores que nascem entre as classes e grupos sociais diferentes, com base em relações e condições históricas pelas quais eles lidam com suas condições e respondem a elas, além de, as tradições e práticas vividas através das quais “entendimentos” são expressados. 2.2 A identidade do sujeito e sua participação em comunidades práticas é literalmente a nossa maneira de viver, o processo de comunicação, de fato, é o processo de comunhão, o compartilhamento de significados... comuns; a oferta, recepção e comparação de novos significados, que levam a tensões, ao crescimento e a mudança. (Hall, 2006, p. 126) De acordo com (Laclau, 1996), o ser humano adquire identidade interagindo com os outros. Ou seja, a vida do sujeito ganha significados, incrustados nos contextos culturais com o qual este se relaciona. Uma identidade diferencial não existe distinta de um contexto, e no processo de fazer a distinção afirma-se o contexto simultaneamente. Assim, os sistemas de significados operam a partir do sistema de representação social para produzir as formas nas quais nos utilizamos para apresentar o mundo para nós mesmos e os outros e no qual nos baseamos para constituir nossas práticas sociais. Como a linguagem, por exemplo, a mais poderosa representação de sistemas sociais que coloca a interação com o outro no mundo social como processo de constituição da consciência, criando significados e representações que na medida em que apresentam imagens, idéias e perspectivas, passa a refletir não apenas a realidade, mas também a construção das realidades em que acreditamos. 11
  • 12. O ser humano, portanto, constitui-se na e por meio da alteridade, e todas as atividades e papéis por ele desempenhados, nas mais diversas esferas do mundo social, encontram-se impregnados do discurso de outrem. (Fairclough, 1992) Deste modo, o signo que é a união da imagem e do significado, torna-se interdependente e inseparável na construção do sentido, ou seja, na representação mental de um objeto ou da realidade social em que nos situamos e com o qual se atribui significado a conceitos e idéias baseado nas condições de formação e construção sócio-cultural que nos cerceia ao longo de nossas vidas. Por isso, o indivíduo depende dos signos para compreender o mundo, a si mesmo, as pessoas com as quais se relaciona, viver, interagir com o meio em que está inserido e construir seu universo, utilizando-se do significante e do significado, intimamente unidos, para constituir os signos, dar sentido as coisas e fazer-se compreender e ser compreendido. Portanto, ao considerarmos as visões de mundo em constante interação, visando o conflito e o engajamento discursivo, podemos entender como os discursos ideológicos dos sujeitos interferem no processo de reflexão do indivíduo sobre a própria ação nas mais diversas esferas da vida social e em processo ininterrupto de (re) construção de identidades. De acordo com Pinheiro, à medida que essas identidades entram em conflito, são questionadas e analisadas o diálogo pode se tornar um espaço para (re)construção de identidades para todos os participantes envolvidos. Sendo assim, a participação nas práticas de diferentes comunidades leva à construção de identidades em relação a essas comunidades. (Pinheiro, 2006) Neste contexto, é possível inferir que o pertencimento a uma comunidade influência o que fazemos, quem somos e a forma como interpretamos aquilo que fazemos. Todos nós pertencemos a diversas comunidades de prática: em casa, no trabalho, na escola, na Internet, comunidades essas que mudam no curso de nossas vidas. A forma como participamos dessas comunidades representa experiências de aprendizagem e, logo, de constituição de identidades. (Fairclouch, 1992) Além disso, como acrescenta (Fairclouch, 1992) é o processo de (re) construção de identidades, por meio das sucessivas formas de participação nas comunidades de prática que determina nossa trajetória nessas comunidades, fazendo da identidade um processo de vir a 12
  • 13. ser, um constante tornar-se. Por relacionar presente, passado e futuro, a noção de identidade implica a idéia de constante movimento, e não de “destino fixo”. Assim, é possível compreender que a identidade é constituída historicamente em uma negociação do presente, com a incorporação do passado e uma perspectiva de futuro com a qual lidamos para contribuir nas mudanças das comunidades de práticas com a qual nos engajamos. Sendo assim, é necessário compreender as mudanças pelas quais as construções raciais passaram ao longo dos séculos, as quais moldaram práticas perpetuadas até os dias atuais. 2.3 Ser negro ao longo dos séculos Nos séculos XVI e XVII, durante a expansão ibérica ultramarina, os argumentos do discurso religioso da Igreja Católica que visavam a restauração da supremacia cristã e difusão da fé aos gentis foram fortemente utilizados para justificar a superioridade européia sobre os considerados pagãos e infiéis nos territórios dominados e sustentou por centenas de anos a escravização de nativos e, principalmente, de negros africanos. Os escravizados eram considerados bens imobiliários, mercadorias negociáveis e tratados como animais, eram responsáveis por todo o trabalho executado, desde a produção e cultivo das terras, até a realização de serviços domésticos. Neste sentido, no século XVIII, quando os Estados Unidos da América conquistou sua independência e a igualdade de direitos, foi conferida a todos os homens, esta conquista não foi estendida ao homem negro considerado como propriedade, destituído de humanidade, escravo. Contudo, as lutas dos africanos e afro-descendentes por liberdade e direitos humanos já havia fecundado e, tanto nas colônias americanas quanto no cenário brasileiro, várias foram as práticas instituídas para coibir a mobilização de escravos e limitar a liberdade deles, proibindo-os de expressar sua língua, religiosidade e cultura. A exemplo, nos Estados Unidos criou-se uma legislação mais rigorosa, reforçaram-se os controles policiais e foram tomadas medidas com vistas a restringir a liberdade de movimento dos negros no país e impedir, entre muitas coisas, até mesmo a instrução de afro-descendentes, mesmo que livres. 13
  • 14. Qualquer pessoa branca que se reunir com os escravos, [ou] negros livres com o objetivo de instruí-los a ler ou escrever, será punido com reclusão na cadeia...... e com multa... (Código Penal Virginia, 1847) No Brasil, podemos destacar a lei régia de 1741 que declarava: [...] todo o grupo com mais de cinco escravos fugidos, ou suspeitos de fuga, será considerado um quilombo, arriscando-se, desde logo a ser massacrado. (Alencastro, 2009) Em meados do século XVIII, os negros livres ou não, convertidos à religião imposta por seus senhores (cristãos na América e católicos no Brasil) eram destituídos da liberdade de freqüentar as igrejas dos brancos e quando permitidos ouviam nas pregações ensinamentos de submissão e subserviência às regras que os oprimiam. Por isso, a construção de igrejas negras norte-americanas e irmandades brasileiras foi considerada o germe da representação social criada por negros nos dois países como forma de resistência, articulação e modificação da situação de repressão vigente. No século seguinte, com a saturação do processo de escravidão, devido aos crescentes enfrentamentos entre senhores e escravos que lutavam por liberdade, as dificuldades políticas na sustentação do sistema escravista e o declínio econômico das sociedades em que este sistema era aplicado tornaram inevitável o estouro de conflitos iguais aos que deram início à Guerra Civil Americana, quando os colonos do sul que enfrentavam as fugas de escravos, as revoltas organizadas na luta pela liberdade, e o assassinato de rebeldes e senhores, declararam secessão aos Estados Unidos da América e perderam completamente o controle das constantes batalhas. Diante deste quadro, o exército nortista lançou mão da aceitação do alistamento voluntário de negros e escravos fugidos das colônias rebeldes às tropas do Norte, combateram aos senhores rebelados das colônias do sul dos Estados Unidos, venceram e deram suporte à proclamação do Presidente Abraham Lincoln da abolição da escravatura nos Estados Unidos. O cenário de confronto e mudanças na América, tornou a questão da escravidão no Brasil ainda mais insustentável. No entanto, como a aristocracia sulista estadunidense, predominantemente branca a “sociedade de privilégios” brasileira (baseada na 14
  • 15. agroexportação, na posse de latifúndios e na exploração de escravos) não queria perder seus privilégios e retardou ao máximo a proclamação da libertação da escravatura. Enquanto, os Estados Unidos protagonizava o período da Reconstrução com a implantação de emendas garantidoras dos direitos civis aos afro-americanos, no Brasil algumas leis foram aplicadas, após diversas tentativas de aplacar o movimento abolicionista brasileiro. Dentre as leis implantadas, é possível citar a Lei do Ventre Livre de 1871 que garantia a liberdade apenas aos filhos de escravos nascidos a partir daquela data com a condição de que eles permanecessem cativos até os 21 anos e a Lei do sexagenário de 1885, que libertava os escravos com mais de 65 anos de idade e eximia o proprietário de responsabilidades para com os poucos que conseguiam sobreviver àquelas condições de vida por tanto tempo. Na sociedade brasileira, mesmo depois que a Lei Áurea foi assinada libertando todos os escravos, as praticas e comportamentos que distanciavam os negros na hierarquia social e na divisão do trabalho foram reforçadas. Após 1888, a sociedade (...) torna-se um corpo assentado, fechado. Suas camadas superiores assumem uma consciência, aguda como nunca antes, de tudo do que pode separar o homem branco do preto ou do mestiço. A cor da pele, antes esquecida, torna-se, entre ricos e pobres, uma fronteira nítida (...) Nas relações humanas fortalecem-se todas as regras da humildade, da obediência e da fidelidade dos séculos de escravidão. (Mattoso, 2003) Deste modo, percebe-se que com o fim da escravidão novas formas de discriminação e marginalização foram adotadas e projetos de reconstrução da nação passaram a ser traçados. Neste momento, as reflexões sobre as questões relativas à cor, à raça e a identidade nacional basearam-se numa nova estratégia que visava a transformação do quadro racial da sociedade americana e brasileira, as quais tinham ambas em seu bojo teorias baseadas na obra “A desigualdade das raças” (Gobineau, 1855) que defendia a superioridade da raça branca sobre as demais, assumindo-a como o modelo apropriado a ser instituído. A teoria sustentava que o destino das civilizações é determinado pela composição racial que os brancos e em particular as sociedades arianas forneciam desde que ficassem livres dos pretos e amarelos, porque a perca da vitalidade, da criatividade, o mergulho na corrupção e a imoralidade tornam-se mais prováveis quanto mais o caráter racial de uma civilização se dilui através da miscigenação. 15
  • 16. Nesse sentido, nas colônias americanas do Sul foi aplicada pelos donos de escravos a regra na qual mesmo uma gota de sangue por menor que seja estabelecia a identidade étnico- racial da população escrava como negra. Ela era aplicada aos filhos de senhores e servia para definí-los racialmente na hierarquia social, ampliar o número de escravos e desobrigar os senhores de maiores responsabilidades. One drop of Negro blood — (…) just one drop of black blood makes a man colored. One drop — you are a Negro!2 ( Hughes, 1953) Além disso, esta regra tão arraigada na concepção americana, mesmo após a Guerra de Secessão nos Estados Unidos e a libertação dos escravos, sustentava a crença de que cada raça possui determinada no sangue a aparência física e o comportamento social. A partir deste ponto de vista, doutrinas como as de Jim Crow ganharam território e em 1883 no sul dos Estados Unidos, a Suprema Corte derrubou a Lei dos Direitos Civis de 1875, que havia proibido a segregação racial em locais públicos. Assim, foram formadas instalações separadas para afro-americanos e brancos (em escolas, poltronas de bondes, entradas de edifícios públicos, banheiros, bebedouros, horários de visitação a museus, prisões e forças armadas. A segregação com base na raça foi apoiada por lei, com a doutrina de “Separados mas iguais”. Em 1896, a separação foi instituída como constitucional e validada também para teatros, praias, e instalações desportivas. Enquanto isso, na sociedade brasileira tomou corpo a estratégia de estímulo às políticas de imigração européia (ver anexos) para transformar o cenário do país, no qual negros e indígenas compunham a maior parte da população da época. Nesse contexto, as leis de incentivo aplicadas a imigração, conhecidas como “Lei do Embranquecimento”, utilizadas para promover a evolução da cor no país, garantiram o transporte, a acomodação e a contratação de milhões de imigrantes europeus no Brasil. Além disso, o novo sistema político não assegurou profícuos ganhos materiais, ou simbólicos para os ex-escravos, que não tiveram nenhum projeto de reintegração à sociedade. De acordo com (Andrews, 1991), a população negra foi marginalizada, seja politicamente sem 2 Uma gota de sangue de negro – (...) uma só gota de sangue de negro é sufuciente para fazer de um homem um preto. Uma gota! 16
  • 17. a implantação do sufrágio, seja economicamente devido às preferências em termos de emprego em favor dos imigrantes europeus. Deste modo, os negros que constituíram a mão-de-obra brasileira, e uma vez livres do trabalho escravo, eram aproveitados apenas para os serviços esporádicos, normalmente braçais engrossarando a camada de marginalizados. Esse quadro histórico, não só deixou sua marca indelével no passado das sociedades brasileira e americana, como também, deu suporte a atual sustentação de privilégios que tem colaborado substancialmente para a lentidão das mudanças sociais alcançadas. No século XX, o cenário de conflito racial na sociedade americana encontrava-se acirrado com a revogação das leis federais do período da Reconstrução que garantiam a proteção aos direitos dos ex-escravos e a aplicação das leis de Jim Crow formalizando a segregação racial estendida à confederação em poucas décadas. Diante deste quadro, os afro-descendentes mobilizam-se na batalha pelos direitos civis motivando-os a participarem das associações, agremiações e sociedades destinadas a unir os afro-americanos e a transformar o quadro de desigualdade. Sendo assim, por volta de 1945 paralelo ao fim da Segunda Guerra Mundial, o Movimento dos direitos Civis ganhou impulso e utilizou as cortes federais para atacar as leis de segregação na federação e como resultado de batalhas civis e sociais e da resistência de afro-americanos mobilizada. Em 1954, a Suprema Corte declarou a inconstitucionalidade da segregação e, ainda com um atraso de dez anos, aprovou a Lei dos Direitos Civis de 64 à qual anulou as Leis Jim Crow. Nas décadas seguintes, foram registrados muitos casos coletivos e individuais de enfrentamento do cenário de desigualdade social, marginalização, e práticas severas de preconceito racial ao longo do país, além da reação da comunidade negra aos casos polêmicos de preconceito com o apoio de poucos simpatizantes brancos à luta, chamados pejorativamente de niggerlovers. Ao mesmo tempo em que no Brasil, os aspectos ligados à cor e a raça foram articuladamente suprimidos, de acordo com as políticas governamentais vigentes. Assim, a definição de uma identidade negra foi inibida, e como já afirmava (Nogueira, 1979) a concepção de branco e não-branco, encontrou variações em função do grau de mestiçagem, de indivíduo para indivíduo, de classe para classe, de região para região. 17
  • 18. Desta forma, no Brasil criou-se o preconceito de marca em que as nuanças cromáticas da pele passaram a contribuir para um futuro mais ou menos promissor nos moldes de um sistema sócio-econômico competitivo e excludente, no qual a rejeição aos negros podia operar de acordo com a tonalidade de sua cor, textura de cabelo e quanto mais distante do padrão branco europeu de aparência, menor o número de oportunidades no sistema educacional e no mercado de trabalho. Portanto, os afro-descendentes passaram a vivenciar a luta contra uma barreira ainda mais árdua que exige, não só, o enfrentamento do quadro social, para o êxito educacional, profissional e econômico. Como também, e, sobretudo, a luta contra a barreira racial que atribui desvantagem e inferioridade de prestígio, capacidade, habilidade, honradez, inteligência e poder do negro. Existem duas barreiras na sociedade brasileira que são muito fortes. Uma é social, é a barreira de classes, que o homem “branco” vence quando consegue uma oportunidade de se escolarizar, se profissionalizar, de subir socialmente. Já o “negro” tem a barreira social e a barreira racial, ele tem duas barreiras a enfrentar e a vencer. Por isso que classe e raça são tão interdependentes. E depois do negro conseguir êxito na profissão, ele ainda precisa lutar por sua auto-afirmação como pessoa. (Fernandes, 2004) Nesse contexto, nota-se que a igualdade racial na sociedade brasileira, como já observou o professor Kabengele Munanga é um mito: A democracia racial é um mito. Existe realmente um racismo no Brasil, diferenciado daquele praticado na África do Sul durante o regime do apartheid, diferente também do racismo praticado nos EUA, principalmente no Sul. Porque nosso racismo (...) é sutil, é velado. Pelo fato de ser sutil e velado isso não quer dizer que faça menos vítimas do que aquele que é aberto. Faz vítimas de qualquer maneira. (Munanga, 2009) 2.4 Cultura e Mídia Sendo assim, ao considerermos que o maior capital da mídia é a sua credibilidade, e que ela se propõe a ser um simulacro do espaço societário, a mudança em valores e pressões de determinados segmentos sociais tem reflexos direto nos imaginários construídos no espaço midiático. Com base nisso, Hall e outros autores dos Estudos Culturais propõem ao movimento negro uma estratégia para fortalecer o reconhecimento da população negra, a busca constante 18
  • 19. pela singularidade da cultura popular negra. O questionamento: - Quem sou? – De onde venho? Pois, o processo de reconhecimento da identidade em um grupo e da identificação do individuo são sempre marcados pela diferença e definidos pela inclusão e exclusão, porque quando eu afirmo o que eu sou, deixo subentendido o que eu não sou, ou seja, a identidade e diferença existem uma em relação a outra. Por isso, como afirma Sodré é necessário: Contornar esse desdobramento violento do mal-estar individualista, que é o racismo, implica engendrar lugares de trânsito (ético-políticos) entre as singularidades. Na prática, isto significa levar indivíduos e instituições a assumirem ou incorporarem o princípio da diversidade humana como uma anterioridade simbólica (e não como mera conseqüência) para os desenvolvimentos jurídicos, políticos e econômicos que possam intervir na espinhosa questão da diferença e da desigualdade entre os homens. (Sodré, 2000) Para tanto, é preciso assegurar o enfretamento das armadilhas presentes na disseminação dos preconceitos, dos mecanismos utilizados na reprodução dos estereótipos de geração a geração, e evitar que a estigmatização negativa de um grupo em detrimento do outro se confunda com uma realidade “natural”. Nesse sentido, é preciso considerar que o campo da cultura é um espaço de conflitos, onde diversas possibilidades de interpelações atuam influenciando no nosso modo de perceber o mundo, na construção do nosso universo simbólico e na nossa percepção sobre nós mesmos, que é articulada a partir da apropriação da realidade como ponto de partida para a reflexão e construção do pensamento. Nas palavras de (Oliveira, 2009), a cultura desempenha o papel de novo ágora de representação das tipologias sociais com o esvaziamento do espaço público da sociedade civil coincidindo com a crise da utopia do sujeito universal iluminista nas novas configurações da sociedade neoliberal globalizada. O que implica na seleção e reconstrução racial da realidade de forma hegemônica e co-participante, pelo aparelho midiático, sem a apresentação de um discurso de constetação sistêmica mesmo que minoritário. A mídia funciona, no nível macro, como um gênero discursivo capaz de catalisar expressões políticas e institucionais sobre as relações inter-raciais, em geral estruturadas por uma tradição intelectual elitista que, de uma maneira ou de outra legitima a desigualdade social pela cor da pele. (Sodré, 1999, p. 243) 19
  • 20. 2.5 Negro nos meios de Comunicação Como já diz Oliveira, a mídia evoca para si o espaço dos conflitos político-ideológicos e com isso transforma-se no palco central das representações políticas passando a atrair a expectativa de apresentação das várias possibilidades interpelativas e assujeitamentos. No entanto, o discurso sobre o negro nos meios de comunicação é apontado como “natural” ocorrendo apenas o destaque de algumas pessoas negras com características referendadas exclusivamente a determinados espaços, apresentando não só um pequeno espaço de visibilidade para negros, mas principalmente propostas que trazem estereótipos do negro e do relacionar-se inter-etnicamente. Em outras palavras, a grande mídia tende a abrir espaço para a temática racial, apenas cobrindo alguns eventos com a participação de negros ou via o lançamento de produtos segmentados destinados a um pretenso mercado e dificilmente incorpora a problemática racial, suprimindo o discurso anti-racista (centrado na percepção dos mecanismos socialmente criados para exclusão da população negra) e apontado para a superação dos mesmos. Nas palavras de (Oliveira, 2009), Outra estratégia na busca da “voz” no ágora midiático reside na construção de modelos de figuras olimpianas negras que “representariam” este segmento no ágora. Esta estratégia é cooptada pela mídia e, em geral, reforça a idéia de uma guetificação de espaços permitidos aos afrodescendentes – o espaço lúdico. Ao lado, disto, estas figuras são apresentadas como “vencedoras”, como pessoas que superam suas barreiras e estas qualificações servem tanto para a mídia legitimar-se como um simulacro de uma sociedade multi-étnica quanto para atender as expectativas dos grupos subalternos para encontrar representações suas no ágora midiatizado. (Oliveira, 2009) Cabe aqui, destacar que, em tratando-se de sociedades multirraciais, tanto no caso norte-americano, quanto no brasileiro os afro-descendentes correspondem a um número expressivo, sendo cerca de 13,5% da população estadunidense e 51,1% da população brasileira – distribuída entre 6,9% pretos e 44,2% pardos3. Dentre os quais, de acordo com pesquisa realizada em meados de 2008 pelo economista Marcelo Neri, do Centro de Políticas Sociais (CPS) da Fundação Getúlio Vargas (FGV), 53,5% dos negros e 47,3% dos mestiços no Brasil pertencem às classes A, B e C. 3 C.f. Sinopse do Censo Demográfico 2010. p.225-230. 20
  • 21. Ainda segundo Neri, no Brasil negros e mestiços juntos são 48% da classe média, incluindo o quadro de 15% de afrodescendentes no recorte de 1% das famílias mais ricas do país – sendo respectivamente 1,8% pretos e 14,2% pardos, além de 52% de negros distribuídos nas classes D e E. Acrescenta-se a isso, dados da Pesquisa Nacional de Amostra por Domícilio (PNAD 2009) os quais indicam um suave aumento de 2,3 anos no tempo de estudo dos afro- brasileiros, bem como o crescimento do número de negros que concluem o ensino superior, quando comparado à década passada. Além do mais, conforme o Census Bureau de julho de 2008, nos Estados Unidos os negros compõem 10% das famílias com renda igual ou acima da casa dos 100.000 dólares, 83% da população afro-americana tem, no mínimo, o ensino médio e 20% da população negra concluiu o ensino superior (graduação ou pós) no país. Neste ponto, é imprescindível observar que embora o paradigma de consumo tenha alterado o neoliberalismo para uma forma de organização a partir de pequenos “nichos” de mercado - mobilizando grandes montantes de dinheiro, os meios de comunicação ainda não operam considerando o mercado já existente da população negra com altos níveis econômicos e educacionais. Ao invés disso, apresenta corriqueiramente imagem do afro-descendente carregada de estereótipos negativos. O que se revela no fato de a mídia há décadas, freqüentemente, vir excluindo da arena dos conflitos político-ideológicos midiáticos a problemática racial que ainda opera acirrando a falta de identificação, baixa auto-estima e, principalmente, reforçando um quadro social em que negros e brancos no Brasil e nos Estados Unidos sustentam suas vidas desarticulados pela desigualdade. Esta desvantagem, entre negros em relação aos brancos, é apontada de forma natural no quadro brasileiro educacional, econômico e social. Em que a incidência de analfabetismo entre negros é de 26,7% contra brancos a 5,9% da população brasileira com a diferença em média de 57,4% entre os rendimentos-hora de negros e brancos na esfera econômica; e no âmbito social, a construção pela mídia da imagem de negros freqüentemente aludida à sexualidade, musicalidade, ausência de moralidade ou de bons costumes e precariedade econômica e educacional. Além disso, há ainda a disseminação da imagem da fé da população afrodescendente e de suas práticas, como a expressão do mal. 21
  • 22. Nesse sentido, tem-se como resultado a participação de afro-descendentes com iniciativas adotadas há séculos para encontrar e produzir alternativas de comunicar o ponto de vista da população negra e expressar seus pontos de vista. 2.6 Os meios de comunicação da população negra O Jornal da liberdade foi o primeiro jornal publicado por afro-descendentes e teve sua origem em uma reunião na casa do Sr. Crummell, sob o comando de dois nomes proeminentes do grupo – Rev. Samuel Cornish e John B.Russwurm, editores-chefes – a publicação proclamou: " Agora é nossa vez ... Agora queremos defender nossa própria causa, há muito tempo que os outros falam de nós e sobre nós”. Portanto, o surgimento da imprensa negra nos Estados Unidos, em 1827, ocorreu como alternativa de expressão dos conflitos político-ideológicos na arena midíatica, consistia na procura de formas para confrontar questões sociais, políticas e econômicas, comunicando os pontos de vista e as opiniões da comunidade negra sobre questões gerais da sociedade. Isto porque, embora os afro-americanos tivessem em suas igrejas, fraternidades e associações o meio de expressão coletiva e diálogo social entre os membros da comunidade, o uso dos habituais canais de comunicação, principalmente os jornais, era negado para os negros, que constantemente tinham a integridade moral étnica questionada e muitas vezes eram difamados pela imprensa. Durante os últimos 180 anos, desde o surgimento do Jornal da Liberdade, a imprensa negra norte-americana tem registrado os acontecimentos e comentado sobre eles, sobre a forma que ocorreram e o impacto que tem causado à população negra, dando voz as batalhas dos afro-americanos para superação dos efeitos da escravidão e discriminação, buscando igualdade social e colaborando para a continuidade da defesa da causa. Ao longo dos anos, foram muitos os contribuintes da imprensa negra que emprestaram seus talentos como editores, jornalistas, colunistas e cartunistas incluindo os maiores nomes da história americana. Dentre eles, estão Frederick Douglass, W.E.B. Dubois, Ida, B. Barnett Wells, Langston Hughes, Bearden Romare, James Weldon Johnson, McLeod Bethune Maria e Daisy Bates. 22
  • 23. Em 1914, sob o clamar de John Sengstacke do “Defensor de Chicago”, foi realizada uma reunião com os principais editores negros de toda a nação, sobre a qual Sengstacke afirmou ter sido realizada para sintonizar nossas energias em um objetivo comum para o jornalismo negro. Pelo menos um representante de cada uma das 22 publicações nacionais estava presente e todos juntos decidiram por formar a Associação Negra Nacional de Editores que, por volta da década de 50, foi renomeada para Associação Nacional da Imprensa negra e editores de jornais (RNAP). Ela é formada atualmente por mais de 200 jornais negros nos Estados Unidos e Ilhas Virgens, com um rendimento anual em torno de 15 milhões de euros. Assim, na era da comunicação do novo milênio a RNAP - a imprensa negra estadunidense continua a atuar de acordo com a missão estabelecida pelos editores fundadores " Defender sua própria causa". Já no Brasil, apesar do lançamento de o Pasquim O Homem de Côr, a primeira publicação para afro-brasileiros ter ocorrido em setembro de 1814. Os momentos iniciais da imprensa negra brasileira foram marcados por inúmeros contratempos, dentre eles o próprio escravismo e seus instrumentos afins. Os afro-brasileiros enfrentaram grandes dificuldades para tornar pública sua própria voz. Além disso, a falta de maquinário próprio foi um problema que afetou a produção de algumas publicações. Por isso, até mesmo os impressos que nunca tiveram distribuição nacional são parte do esforço coletivo para controlar os códigos da dominação e subvertê-los. Um dos casos vingadouros da produção em meios de comunicação por afro- descendentes deu-se quando a partir do século XX passou a ser publicado o Alvorada - periódico de maior longevidade no país produzido com pequenas interrupções de 1907 à 1965 no Rio Grande do Sul, retratando um momento histórico de luta, disseminação de modelos de comportamento da época e enfretamento das dificuldades sociais encontradas pela população negra, e de acordo com Domingues: Assim como outros jornais da população negra [grifo nosso] o Alvorada enfocava as mais diversas mazelas que afetavam os afro-descendentes nas áreas de trabalho, da habitação. Eles tornaram-se o espaço privilegiado para pensar e discutir alternativas para os problemas de desigualdade na educação, na saúde e no trabalho. Além disso, as páginas desses periódicos constituíram veículos de denúncia do regime de "segregação racial" que incidia em várias cidades do país, impedindo o negro de ingressar ou freqüentar determinados hotéis, clubes, cinemas, 23
  • 24. teatros, restaurantes, orfanatos, estabelecimentos comerciais e religiosos, além de algumas escolas, ruas e praças públicas. (Domingues, 2009, p. 106) Com o passar do tempo, e principalmente durante o período de ditadura militar no Brasil a repressão à imprensa e aos movimentos sociais enfraqueceu e desarticulou a cobrança da cobertura de questões raciais na mídia. Assim, somente durante o processo de redemocratização no país a militância negra conseguiu um fortalecimento e uma mobilização na busca por uma forma de resistência mais organizada e unida. O que também provocou o crescimento da demanda por uma cobertura da grande mídia dos temas relacionados aos negros. Deste modo, na década de 80, a imprensa recém liberta da ditadura ganhou força e passou a assumir uma postura diferente e a atuar de forma mais denunciativa e o negro passou a ganhar um modesto espaço na mídia. Em meados da década de 90, seguindo o modelo de algumas revistas norte-americanas lançadas na década de 70, especialmente para o público negro no Brasil, estreou em âmbito nacional a revista Raça Brasil que no seu lançamento, atingiu uma tiragem de 280 mil exemplares. O que sucitou o questionamento sobre o quanto os afrodescendentes tem sido considerados pelos meios de comunicação de massa, que normalmente adaptam-se à realidade do mercado, segmentando suas ações e criando materiais impressos, radiofônicos e televisivos para nichos específicos de informação, homens, mulheres, grupos étnicos. Assim, faz-se necessário analisar a representação que os afro-descendentes tem ao considerarmos que a população negra não só forma um nicho que se mobiliza para existir na representação midiática, como também, intersecciona-se com diversos nichos de grandes sociedades multirraciais. 3. OBJETIVOS A pesquisa tem como objetivo principal verificar em que situações e como homens e mulheres negras, famosos ou não, são representados em fotografias, anúncios produzidos pela linha editorial ou histórias de revistas segmentadas de informação, feminina e masculina, do GRUPO Abril, assim como realizar a análise de uma publicação voltada para o público étnico e comparar as edições brasileiras estudadas com suas versões originais ou similares 24
  • 25. estadunidenses. Pois, constitui também, objetivo do trabalho conferir como é o discurso destas representações no Brasil e nos Estados Unidos da América. 4. JUSTIFICATIVA No cenário político brasileiro, após dez anos em discussão na Câmera, foi aprovado pelo Senado e sancionado pelo Presidente da República Luiz Inácio Lula da Silva o Estatuto de Igualdade Racial que representa uma conquista do movimento social de negros que durante anos cobram a formulação e implantação de políticas públicas para a equidade social entre brancos e afro-brasileiros desde a redemocratização do país no final dos anos 80 e início dos anos 90, do século passado. O estatuto apresenta em sua proposta políticas de promoção de igualdade de oportunidades definindo o que é discriminação racial, desigualdade racial e quem pode ser considerado negro; tornando obrigatório o ensino de história geral da África e da população negra do Brasil nas escolas de ensino fundamental e médio, públicas e privadas; reiterando a liberdade do exercício dos cultos religiosos de origem africana; prevendo multa para quem praticar crime de racismo na internet, e também, a interdição da página da web que exibir irregularidades; garantindo às comunidades quilombolas direitos de preservar costumes sob a proteção do Estado; e estabelecendo para o poder público a responsabilidade de criar ouvidorias permanentes em defesa da igualdade racial para acompanhar a implementação das medidas; além de certificar-se que o Estado está adotando medidas para coibir a violência policial contra a população negra. Além disso, uma outra vitória para os afro-americanos, considerada um grande avanço na luta pela igualdade racial na sociedade é o fato da maior potência do mundo ter elegido, há dois anos, seu primeiro presidente negro Barack Obama. Nas palavras do Professor de Ciência Política da Universidade do Texas, Thomas Brunell: “mostra que superamos uma barreira que, há dez anos, parecia intransponível”. Principalmente, ao considerarmos o passado recente de segregação regulamentada por lei, cerca de 50 anos atrás, que estabelecia a supressão e opressão do direito dos negros nos Estados Unidos da América, privilegiando brancos em detrimento de negros e determinando para cada raça seus bairros, escolas, cinemas e transporte próprios. 25
  • 26. Apesar dos avanços, como alertou o professor da Universidade Estadual de Michigan, Ronald Hall na véspera da eleição presidencial: “a vitória de Obama pode dar a impressão de que não há mais preconceito, não há mais racismo, o que é errado. Houve uma melhora, é verdade, mas ainda há muitos problemas”. “O racismo ainda está vivo. A diferença é que as pessoas não admitem que são racistas, por vergonha, mas elas demonstram isso nos seus atos. O racismo continua existindo de forma disfarçada”. (Hall, Ronald, 2008) A exemplo disso, no Brasil, onde políticas públicas para a equidade entre brancos e negros foram adotadas o racismo cordial foi observado, principalmente, pela significativaa reação da mídia à agenda do debate político, quando vários colunistas e líderes de aparelhos midiáticos vieram a público reforçar o discurso da "democracia racial", comprovando o argumento da linha de estudos culturais que afirma que o sistema de racismo “no Brasil” [grifo nosso] tenta homogeneizar a diferença e a desigualdade. Além disso, muitos foram os ataques às políticas específicas de combate ao racismo, criticando a luta contra a precariedade das condições socioeconômicas em que os negros tem sido mantidos, e que dificulta para eles o acesso à educação de qualidade, saúde e boas condições de trabalho no mercado, entre outras desvantagens produzidas. Como (Magnolli, 2009), que em seu livro "Uma gota de sangue" defendeu que não há distinção de raça, o conceito de raça é uma invenção dos movimentos sociais de negros para separar a sociedade. Ele criticou, também, questões como a reserva de cotas nas universidades públicas, ponto que foi retirado da versão final do Estatuto da Igualdade Racial, junto com a reserva de cotas para negros em partidos políticos e trabalhos em publicidade. Diante disso, o estudo do discurso da mídia revela-se de extrema relevância, não só para os profissionais de comunicação por fornecer material para a compreensão e questionamento sobre a linha das nomeações com as peculiaridades da realidade social, mas também, para profissionais da educação por facilitar o acompanhamento das questões raciais em revistas que constroem estilos de vida junto com a venda da informação. 26
  • 27. 5. A PESQUISA 5.1 Tema do Trabalho A representação do negro e das relações raciais nos meios de comunicação: Um estudo comparativo em revistas de segmentos no Brasil e nos Estados Unidos. 5.2 Contexto do Tema O cenário de enfrentamento da desigualdade racial em sociedades multiétnicas tem sofrido transformações, algumas delas acontecem de forma mais rápida, outras tem ocorrido de forma gradual, lenta e sofrido resistência. Nesse sentido, questões como a reserva de cotas nas universidades públicas, partidos políticos e trabalhos em publicidade são exemplos de avanços que não passaram imunes ao discurso da meritocracia e, principalmente, aos argumentos da democracia racial. A exemplo, na sociedade brasileira pontos garantidores da equidade de direitos no espaço educacional, político e profissional foram retirados do Estatuto da Igualdade Racial e nos Estados Unidos continua visível a desvantagem social, midiática e salarial que homens e mulheres negras vem vivendo, assim como a manutenção da representações de afrodescendentes apresentandos separadamente de brancos, reforçando uma releitura do dogma de “separados mais iguais”. Tendo em vista este cenário, o objetivo do estudo é analisar o discurso da mídia sobre pessoas negras, comuns ou celebres e as relações raciais existentes nesse discurso das revistas segmentadas de maior representatividade no Brasil e nos Estados Unidos. 5.3 Problema do Tema A construção da imagem do negro nas revistas segmentadas do Brasil e dos Estados Unidos. 5.4 Problema da pesquisa Verificar como é apresentada e representada a imagem de pessoas negras em revistas de segmento Brasil e dos Estados Unidos. 27
  • 28. 5.5 Universo da pesquisa Revistas de segmento voltadas para os públicos específicos de informação, feminino e masculino no Brasil e nos Estados Unidos. Comparando-os com as publicações do público étnico. Respectivamente, Veja/Time, Nova/Cosmopolitan, Playboy Brasil/Playboy Estados Unidos e Raça/Ebony; 5.6 Amostra No Brasil e nos Estados Unidos, foram escolhidas quatro edições - uma por trimestre de revistas específicas de informação, feminina, masculina e étnica. As publicações foram selecionadas em uma ordem trimestral, com uma escolha aleatória das edições antes da compra. Nesse sentido, a amostra correspondeu respectivamente a: Primeiro trimestre de 2010 – a edição de janeiro das revistas mensais e uma das publicações do mês de janeiro das revistas semanais. Segundo trimestre – a publicação escolhida deveria encerrar o segundo trimestre, ou seja, junho; Terceiro trimestre – a edição deveria corresponder também ao fim do trimestre, no caso edições do mês de setembro. Quarto trimestre – neste caso a publicação escolhida deveria ser a primeira do último mês do trimestre, propiciando um quadro mais geral do perfil de publicações do ano, dezembro. 5.7 Hipóteses Hipótese 1: Na mídia, o afrodescendente tem um espaço inferior a sua representação demográfica nas sociedades brasileira e estadunidense. 28
  • 29. Hipótese 2: A população negra apresentada nas revistas de segmentos sofre estereotipia comportamental, sócio-cultural e econômica estabelecida ao longo dos séculos na sociedade. Hipótese 3: O discurso sobre as representações do negro nas revistas de segmento omite, desarticula ou esvazia o conflito racial existente na sociedade. 5.8 Objetivos específicos Verificar em que situações e como homens e mulheres negras, famosos ou não, são representados em fotografias, anúncios produzidos pela linha editorial ou histórias de revistas segmentadas de informação, feminina e masculina e etnia. Verificar a ocorrência de estereótipos na representação de pessoas negras; identificar a proporção estatística nas revistas de aparições de pessoas negras; e verificar a proporção estatística dos discursos positivos, negativos e meramente ilustrativos no conteúdo midiático. 29
  • 30. 6. PROCEDIMENTOS METODOLÓGICO Para realizarmos a pesquisa sobre a representação do negro nos meios de comunicação de massa, optamos por realizar uma pesquisa exploratória nas revistas de segmento de nichos de mercado que fornecessem uma abrangente perspectiva da sociedade. Deste modo, no Brasil e nos Estados Unidos da América foram selecionadas no ano de 2010 quatro edições - uma por trimestre de revistas específicas de etnia, informação, juvenil, feminina e masculina,. Respectivamente: Raça / Ebony; Veja / Time; Atrevida / Seventeen; Nova / Cosmopolitan, e Playboy Brasil / Playboy E.U.A. No entanto, para um aprofundamento da pesquisa e uma contemplação mais objetiva dos resultados o estudo restringiu o foco a produções do Grupo Abril, comparando as com versões similares, muitas vezes originais, das produções brasileiras, preservando os dados da análise de revistas do segmento étnico por entender que estas revelavam a discrepancia dos resultados das representações do negro em diferentes nichos. 6.1 A escolha do objeto A princípio, o estudo visava analisar quatro edições aleatórias de revistas segmentadas do ano de 2010, com distribuição nacional e com maior representatividade no mercado brasileiro. No entanto, por causa da possibilidade de internacionalização da pesquisa com extensão aos Estados Unidos, outra grande sociedade multirracial de imensa relevância no cenário de enfrentamento da desigualdade racial no mundo, o estudo incluiu edições estadunidenses, correspondentes às revistas analisadas no Brasil e publicadas no mesmo período selecionado para a pesquisa. 6.2 Coleta dos Dados no Brasil Sob a orientação do Prof. Dennis de Oliveira e sua linha de pesquisa, foram escolhidas as revistas Atrevida, Playboy e Veja, devido sua singularidade e liderança de share-of-mind na 30
  • 31. sociedade brasileira4. Já as revistas Nova e Raça Brasil foram selecionadas, também sob os auspícios do Prof. Dennis, por serem as principais revistas na lista das melhores do Brasil e representarem muito bem seus nichos de mercado. Já a análise de categoria e teor do discurso foi realizada graças as orientações e instruções do Prof. Paulo Nassar que propiciou um esclarecimento claro e objetivo de gênero jornalístico e suas implicações na disciplina Produção de Periódicos Institucionais. Ainda, o estudo propociou um rico e imenso relatório de dados que pertinentemente deveriam ser considerados para a reflexão, e até mesmo readequação, da postura na produção e disseminação de conteúdos das revistas de segmentos específicos. Para tanto, foram escolhidas as revistas produzida pelo Grupo Abril para uma pesquisa mais detalhada e análise de conteúdo mais aprofundada, por considerarmos que a iniciativa de mudanças do quadro de desigualdade racial deve partir sobretudo de líderes do mercado e empresas pioneiras e inovadoras como também modelos de tradição, respeito e credibilidade na sociedade. Nesse sentido, foi conferido o contexto histórico destas publicações e na seqüência foi realizado o clipping dessas revistas. As publicações foram selecionadas em uma ordem trimestral, com uma escolha aleatória das edições antes da compra. Devido ao fato das edições num.1 do ano de 2010 das revistas semanais norte-americana terem sido publicadas em dezembro do ano anterior e corresponderem ao contexto de 2009, foi escolhida para a pesquisa a edição num.2 do mês de janeiro, para que a data de estudo continuasse condizente a análise das revistas semanais brasileiras a seleção realizada foi extendida as publicações do Brasil. 6.3 Coleta de dados nos Estados Unidos da América Inicialmente, foi realizada virtualmente uma pesquisa sobre a missão das revistas, para garantir que a extensão norte-americana da pesquisa obedecesse aos critérios aplicados à seleção do material de pesquisa brasileiro. 4 Anexo relação do IVC – Instituto Verificador de Circulação no Brasil com relação de revistas com maior circulação em 2010. 31
  • 32. As publicações que antes eram selecionadas em ordem aleatória, passaram a ser escolhidas em uma ordem trimestral, com uma escolha aleatória das edições no trimestre antes da compra. Nesse sentido, a amostra corresponde a primeira do começo do ano de 2010 – janeiro; a segunda do final do segundo trimestre – junho; a terceira do final do terceiro trimestre – setembro e para a quarta revista foi escolhida a edição que iniciava o quarto trimestre – dezembro. 6.4 Em campo A pesquisa foi iniciada sob a orientação do Prof. Dr. Dennis de Oliveira, quando em março de 2010, o projeto de estudos foi contemplado por uma bolsa da Pró-reitoria da Graduação. Em algumas reuniões, foi realizada a seleção de revistas de segmentos de extratos sociais específicos para que o resultado da análise da representação do negro na mídia e o discurso sobre o negro construído nas revistas refletisse de forma abrangente as tendências sociais. As revistas selecionadas tiveram sua missão e tiragem conferidos e após a definição do número de exemplares a ser estudado, a compra no Brasil passou a ser feita diretamente em bancas de jornais e livrarias pelo Prof. Dennis. No entanto, em meados de agosto de 2010, com a internacionalização do projeto de estudos aprovado pelo programa Raça, Desenvolvimento e Desigualdade do Ccint – FEA USP em parceria com a CAPES e a FIPSEP, a idéia da pesquisa expandiu-se e o universo da análise passou a analisar versões estadunidenses, com relevância semelhante às edições já estudadas no Brasil. Deste modo, em agosto, a pesquisa passou a ser realizada nos Estados Unidos da América e as revistas passaram a ser compradas pela internet. A princípio, por causa da necessidade de edições anteriores ao mês de chegada ao exterior, segundo pela ausência de bancas de jornal e a restrição da compra das revistas a livrarias, e, terceiro por causa do constrangimento que a solicitação de edições específicas da revista Playboy provocavam ao vendedor e a mim, pesquisadora, devido a questões culturais norte-americanas. 32
  • 33. Inicialmente, foram compradas as edições anteriores ao mês de setembro de 2010, as quais necessitaram uma pesquisa minuciosa de termos, siglas e jargões para uma compreensão mais fluente das expressões. As edições restantes foram compradas em livrarias e farmácias norte-americanas, exceto as correspondentes ao mês de dezembro que, em meados da segunda semana do mês natalino - mais precisamente dia nove de dezembro, não estavam mais disponíveis para a venda. Por este motivo, as edições de fim de ano foram compradas on-line de assinantes que não precisavam manter as revistas. Apesar dos contratempos, até o fim de dezembro todas as edições americanas já haviam sido compradas e mais da metade delas clippadas e mapeadas. No entanto, na volta ao Brasil, foi um verdadeiro desafio encontrar edições correspondentes ao início de 2010, com a busca em sebos, bancas de jornal e bibliotecas. Por estr motivo, uma das revistas analisadas só foi encontrada em versão on-line, após a busca até mesmo na própria editora, o que atrasou consideravelmente a mensuração dos resultados. Durante a análise, os textos foram separados entre os tipos: carta do leitor/comentário, crônica, declaração, depoimento, entrevista, notícia e quadrinho. Além disso, suas respectivas mensagens foram classificadas por opinativa, informativa, interpretativa e distinguidas pelo teor das conotações: positiva, neutra, negativa e ambivalente, sendo que a última permitia uma leitura ambígua da conotação que a mensagem estava transmitindo. Por fim, foram produzidos gráficos ilustrativos para a comparação de milímetros quadrados do espaço conferido a negros em relação ao produto total da revista; gráfico comparativo de revistas do mesmo nicho nas edições brasileiras e americanas referentes à mesma data; gráfico representativo dos teores mais ocorrentes na análise da revistas; e apresentação das categorias de estereótipos mais ocorrentes. 33
  • 34. 7. APRESENTAÇÃO DE RESULTADOS Primeiramente, os dados foram tabulados em uma planilha geral, em CD anexo, na qual foi feito um breve resumo do recorte em que houve a aparição de pessoas ou aspectos da cultura negra, indicado a localização do recorte na revista, classificado o teor em que foi apresentada a imagem ou citado algo diretamente relacionado a pessoa ou comunidade negra. Em seguida, foi apontada a medida em cm! da imagem, menção ou citação e realizada uma comparação métrica entre as aparições de afrodescendentes e o conteúdo total das revistas. Estes dados serviram de suporte para demonstrar que, na mídia, no caso revistas de segmentos para diversos grupos, o negro tem um espaço inferior a sua representação demográfica tanto na sociedade brasileira, quanto na norte-americana. Como revelam os dados extraídos das revistas Veja, Time; Nova, Cosmopolitan; e Playboy Brasil e Playboy E.U.A e a aparição de afrodescendentes em geral é bem inferior a 10% do seu conteúdo, o que não correspondeu à proporção social de afrodescendentes em 2010, sequer, nos Estados Unidos da América, onde este grupo étnico representa em torno de 12% da população americana com representação na média na mídia de 40% do valor proporcional ao cenário demográfico da população norte-americana. Salvo duas exceções, a primeira de uma edição da revista Times de janeiro que teve 22% de seu conteúdo voltado à aparição de negros, no entanto, grande parte ligada a uma imagem altamente negativa, pois abordava o atentado terrorista de um estudante nigeriano a um avião em Detroit. A segunda exceção foi da revista Ebony que, no mesmo período, garantiu por volta de 55% do conteúdo de suas edições a apresentação de afro-americanos e à temática negra. Já no Brasil, a representação do negro no discurso das revistas de segmentos, similares as analisadas nos Estados Unidos, também não alcançou sequer 10% do conteúdo total das revistas, o que significa uma exibição de 14% do valor proporcional ao quadro demográfico de afro-descendentes no Brasil. Ou seja, o conteúdo das revistas de segmentos é 82% inferior à representação proporcional da população negra no país. Neste caso, tem exceção apenas a revista segmentada voltada para o grupo étnico afrodescendente a Raça Brasil, que destinou cerca de 75% do seu conteúdo à exibição e valorização dos afrodescendentes, da comunidade e da cultura negra, durante o ano de 2010. 34
  • 35. Como mostra o gráfico 4 que traz a porcentagem da aparição de negros por revista dos trimestres de 2010, vê-se a possibilidade de comparação entre o espaço ocupado por negros na mídia em produções segmentadas para diversos públicos. Graf.4 porcentagem da aparição de negros por revista dos trimestres do ano de 2010. Aparição de negros por revista dos trimestres do ano de 2010. 90,00 80,00 70,00 60,00 Jan 50,00 Jun Set 40,00 Dez 30,00 20,00 10,00 0,00 a l e sil . n a t si ej .A m Je ov ita ra ra V Ti U N y ol B B on E. op a oy Eb aç oy m yb R yb os a C a Pl Pl Fonte: SILVA, L. A representação do negro e das relações raciais nos meios de comunicação: Um estudo comparativo em revistas de segmentos, do Grupo Abril, no Brasil e suas respectivas versões norte-americanas. Deste modo, os dados revelam que, no caso americano, apesar de baixa a porcentagem da aparição de negros nas revistas de segmento para diversos grupos, a proporção de exibição é próxima do número de afro-americanos, enquanto que a média brasileira de exposição e representação de afrodescendentes e temáticas da cultura negra chega a ser aproximadamente cinco vezes menor do que a representação deste grupo étnico-racial, que possui 48% da sua população distribuidas entre as classes A, B e C no Brasil. Contudo, apesar de representarem 35
  • 36. expressivamente os grupos alvo dos segmentos estudados, apenas a revista voltada especificamente para os afrodescendentes traz uma aparição, não só perto da proporção demográfica de afro-brasileiros, como também ultrapassa cerca 20% o total de seu conteúdo para reafirmar a apresentação, exibição, discussão e possibilidades de valorzação dos afrodescendentes no país. Isto não promove a equidade da exposição do negro na mídia na mesma proporção de sua representação no Brasil, o que se revela controverso, ao considerarmos que a sociedade americana até poucas décadas atrás era estritamente segregacionista, enquanto que o Brasil há séculos hasteia a bandeira da democracia racial, revelada como um mito a partir da analise da disparidade existente na possibilidade de aparição de afrodescendentes em meios de comunicação, revistas, que não sejam os reservados para eles. 36
  • 37. Graf.5 Média da porcentagem da aparição de negros por revista de acordo com a conotação apresentada no ano de 2010 Proporção da aparição de afrodescendentes por segmento Ebony Étnica Raça Masculina Playboy E.U.A Playboy Bra Feminina Cosmopolitan NOVA Estilo de vida Time Veja 0 10 20 30 40 50 60 Estilo de vida Feminina Masculina Étnica Veja Time NOVA Cosmopolitan Playboy Bra Playboy E.U.A Raça Ebony Conotação Positiva 1,3 3,30 0,10 0,80 9,30 1,30 56,60 23,00 Conotação Neutra 2,5 1,70 2,00 4,00 2,80 2,80 19,00 27,80 Conotação Negativa 1,6 3,70 0,00 0,20 1,00 0,10 0,80 2,00 Conotação Ambivalente 1,9 1,70 0,30 1,20 1,00 1,00 1,60 1,00 Fonte: SILVA, L. A representação do negro e das relações raciais nos meios de comunicação: Um estudo comparativo em revistas de segmentos, do Grupo Abril, no Brasil e suas respectivas versões norte-americanas. Outro ponto importante, observado a partir da análise dos dados coletados é que, nas revistas de segmento a maior parte da construção do discurso que envolve os afrodescendentes e a temática negra é desarticulada, com a produção de um conteúdo com conotação neutra em que os pontos para a valorização étnico-racial não são abordados, apesar da tentativa das revistas de segmento étnico de promover a visibilidade da imagem dos afrodescendentes e da comunidade negra de forma mais articulada, fomentando a luta contra a desigualdade, a discussão da questão racial, o debate pela equidade social e a valorização do povo negro, 37
  • 38. Graf.6. Conotação da imagem atribuída as aparições e menções a afrodescendentes nas revista de segmento do ano de 2010 Proporção de conotações atribuídas aos afrodescendentes nas revistas ambivalente 6% negativa 5% positiva 36% neutra 52% ambivalente negativa neutra positiva Em outras palavras, a imagem do negro, célebre ou não, quando é apresentada de forma positiva ou neutra, está na maioria das vezes como mercadoria associada à venda, promoção ou exibição de marcas, objetos, acessórios ou produtos de beleza. Assim, além do argumento sócio-econômico utilizado para manter pequeno o espaço do negro na sociedade, é possível perceber que a construção do discurso a cerca da imagem dos afrodescendentes nas revistas de segmentos, que não as étnicas, dificilmente carrega significados que transcendam a imagem do negro e incitem ao debate, seja sobre a questão racial, a desigualdade da visibilidade deste grupo étnico ou as dificuldades de acesso a condições menos marginais, tanto na mídia quanto na sociedade. 38
  • 39. 8. CONCLUSÃO A partir do clipping das revistas foi possível confirmar que as lógicas de racismo existentes no Brasil e nos Estados Unidos persistem e são reforçadas de modos diferentes. Na mídia brasileira, a representação de afrodescendentes possui um infímo espaço e sofre categorizações estereotipadas vísiveis, assim como a contínua exibição e disseminação da imagem de negros em espaços reservados ou para celébres que alguram espaços permitidos, para afrodescendentes expostos em contraposições hierárquicas desfavoráveis. Enquanto que nos Estados Unidos, além da imagem de afrodescendentes ser exposta em contraposições hierárquicas, ela foi exibida muitas vezes separadamente da imagem de pessoas brancas. Além disso, foi perceptível que a articulação da população afrodescendente e o enfrentamento do preconceito racial são omitidos do discurso existente no conteúdo de revistas segmentadas destinadas a diversos públicos tanto na sociedade brasileira, quanto norte-americana. No mais, o estudo permitiu constatar no material analisado que as revistas de segmentos do Grupo Abril, assim como muitos outros meios de comunicação, possuem um número baixíssimo de aparições de afrodescendentes em suas publicações. A análise, também, comprovou que a distinção racial ocorre nítidamente com base no referente biológico por meio da adoção de práticas discursivas que hierarquizam, estereotipiam ou excluem os afrodescendentes no conteúdo produzido. O que só reforça a marginalização e estereotipia sócio-cultural e econômica sofrida pela população negra, por séculos, na sociedade. Além disso, a pesquisa possibilitou observar que a postura revelada na produção de conteúdo das revistas do Grupo Abril é a de naturalização das questões étnico-raciais, sustentação da hierarquização das representações dos negros e a estereotipização cultural, econômica e comportamental de afrodescendentes. Pontos, os quais ferem um dos pressupostos básicos do Grupo Abril que declara “repudiar qualquer tipo de discriminação por credo, raça, sexo, orientação sexual ou ideológica e condição socieconômica”. O que se demonstra irônico, por referir-se na verdade aos princípios da mesma empresa que emprega na produção de seus materiais uma das mais recentes práticas do 39
  • 40. racismo. Na qual, a discriminação racial ocorre por meio de representações sociais negativas dos afrodescendentes sustentadas por inferências que desvalorizam os aspectos culturais, comportamentais e as condições sócioeconômicas da população negra. Neste sentido, é preciso ressaltar que a democracia racial ainda é uma barreira não transposta na sociedade e retificada por séculos pelos grupos dirigentes dos veículos de comunicação, principalmente, devido a manutenção de espaços pré-definidos de acesso do negro à mídia e pela preservação de construções sociais que visam manter privilégios estabelecidos históricamente. Portanto, é imprescindível chamar a atenção para a necessidade da adequação das práticas discursivas nas revistas de segmento da Abril com os valores e pressupostos adotados pelo Grupo. Para isso, a princípio, as linhas editoriais brasileiras devem reconhecer a existência do mito da democracia racial e a gritante necessidade de medidas afirmativas para a abertura de espaço para os afrodescendentes nos meios de comunicação. Porque, sem uma iniciativa que promova a presença do negro na mídia será impossível para as publicações estudadas do Grupo Abril, mesmo com um reposicionamento equitativo, ao menos acompanhar a tendência de suas homônimas estadunidenses que possuem o número de aparições de afrodescendentes na mídia próximo ao percentual proporcional da polução negra nos Estados Unidos. Além disso, outro passo importante que deve ser considerado para a equiparação da representação da população afrodescendente nas revistas de segmento da sociedade brasileira é a realização de um material do Grupo Abril que complemente o conteúdo dos outros segmentos com o direcionamento de sua pauta à assuntos que atendam a demanda existente em uma sociedade multirracial brasileira, majoritariamente afrodescendente. Pois, enquanto as linhas editoriais das revistas de diversos segmentos continuarem a reforçar o mito da democracia racial e não implementarem ações afirmativas e reparativas na produção de conteúdo e de representações do negro no Brasil, a imagem do afrodescendente ainda será apresentada de forma insuficiente e superficial, revelando a fragilidade que se instaura na construção da identidade do negro em sociedades que continuam a reproduzir o preconceito. 40
  • 41. Por isso, é necessário que a sociedade brasileira reveja a retirada de pontos como a reserva de cotas para afrodescendentes em trabalhos de publicidade da versão final do Estatuto da Igualdade Racial. Tendo em vista, que isto no Brasil só fortalece o quadro de desigualdade nas representações de negros na mídia. Já, no caso dos Estados Unidos onde a elite negra compõe uma camada expressiva e altamente considerada, é pertinete o aumento da presença de afrodescendentes em espaços que não sejam só os vinculados diretamente ao consumo, à beleza, espaços categorizados ou em contraposições hierárquicas. Afinal, estas são condições indispensáveis para promover as possibilidades de articulação e do enfrentamento da discriminação e da luta diária contra o racismo nas duas sociedades, luta que na mídia demonstra-se mais avançada no cenário norte-americano. 41
  • 42. BIBLIOGRAFIA ALBUQUERQUE, W.; FRAGA FILHO, W. In Uma história do negro no Brasil. Disponível em http://pt.scribd.com/doc/7108249/Historia-Do-Negro-No-Brasil. Acesso em: 02 dez. de 2010. AMARAL, R.J. In Imprensa Negra. Disponível em http://www.assis.unesp.br/cedap/ cat_imprensa_negra/biografias/raul_joviano_ amaral.html. Acesso em: 04 jan. 2011. ANDREWS, G. In. O protesto político negro em São Paulo (1888-1988). Estudos Afro- asiáticos, Rio de Janeiro, no. 21, 1991, p.27. BAKHTIN, M. In PINHEIRO, Petrilson. Bakhtin e as Identidades sociais: Uma possível construção de conceitos, 2006 p. 3 BARBOSA, L. C. In Identidade e Branquidade: Conflitos no universo infanto-juvenil. Artigo apresentado no XXX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação. Intercom – Sociedade Brasileira de Estudos Interdisciplinares da Comunicação, 2007. p.7 BANTON, M.; HARWOOD, J. In LARRY.A. SAMOVAR; RICHARD E. PORTER; EDWIN R. MCDANIEL, Intercultural Communication: A reader 12ª ed. Estados Unidos: Cenagebrain, 2009. p.315 tradução nossa. BERRY, M. In Black. Resistance, White Law: A History of Constitutional Racism in America. New York: A. Lane, Penguin Press, 1994. BELELI, I. In Racismo discursivo, legislação e proposições para a Televisão pública brasileira, 2005. p.3-4. BUARQUE, D. In Eleições nos EUA põem em xeque passado de racismo do país. Disponível em http://g1.globo.com/Sites/Especiais/Noticias/0,,M UL754162-16107,00- ELEICOES+NOS+EUA+POEM+EM+XEQUE+ PASSADO+DE+RACISMO+ DO+PAIS.html. Acesso em: 30 set. 2009. DEURSEN, F. In Escravos: povo marcado. Disponivél em http://historia.abril.com.br/ cultura/escravos-povo-marcado-491017.shtml. Acesso em: 13 nov. de 2010. DOMINGUES, P. In Movimento Negro Brasileiro: alguns apontamentos históricos. 2009, p.106 EZE, E. C. In Introduction Race and the Enlightenment: A reader Cambridge, MA: Blackwell. 1997. p.1-9. 42
  • 43. FAIRCLOUGH, N. In PINHEIRO, P. Bakhtin e as Identidades sociais: Uma possível construção de conceitos. p. 3 Disponível em www.filologia.org.br/.../bakhtin%20e%20as %20identidades%20sociais.pdf Acesso em: 25 mar. 2010. FERNANDES, F. Depoimento de Florestan Fernandes para O Mestre Brasília: TV Câmara. 2004. ______________ In LADEIRA, F. Relação entre classe e cor: Algumas considerações sobre o negro no Brasil. Disponível em http://www.consciencia.org/relacao-classe-cor-a- ascensao-social-negro-no-brasil Acesso em: 05 dez. 2010. GOBINEAU, A. In FEITOSA, E. Publicação do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Disponível em www.educacional.com.br/upload/blogSite/5052/../Racismo.doc Acesso em: 06 dez. 2009. HALL, S. In Da Diáspora: Identidades e Mediações Culturais. Minas Gerais: UFMG, 2006. p.126 HEGEL, F. In WOOD, J. Communication Theories in action: An Introduction. Cengage Learning, 3ª ed., 2004. p.312 HUGUES, L. In Crenshaw, K. E PELLER, G. Critical Race Theory. New Press, 2001, p. 258. LACAN (1977); LACLAU e MOUFFE (1985); BUTLER (1993) In LARRY.A. SAMOVAR; RICHARD E. PORTER; EDWIN R. MCDANIEL. Intercultural Communication: A reader 12ª ed. Estados Unidos: Cenagebrain, 2009. LACLAU, E; MOUFFE, C. In HALL, Stuart. Da diáspora : Identidades e Mediações Culturais. Belo Horizonte: UFMG/UNESCO, 2003. p.182. _________________________ LACLAU , E. Emancipations. London: Verso, 1996 p.126 MATTOSO, K. In Ser Escravo no Brasil. Brasiliense, 2003. Disponível em http://historia. abril.com.br/cultura/escravos-povo-marcado-491017.shtml Acesso em: 02 dez. 2010. MAGNOLLI, R. In Uma gota de sangue. São Paulo: Editora Contexto 1a. ed., 2009, p.14 MUNANGA, K. In Nosso racismo é um crime perfeito. Entrevista de RAMOS, C. e FARIA, G. Revista Fórum, nº 77, ano 8, 2009. NERI, M. Cadermo de Econômia e Negócios do Estadão de 27 de mar. de 2010. Disponível em http://economia.estadao.com.br/noticias/not_11138.html . Acesso em: 14 nov. de 2010. NOGUEIRA, O. In Preconceito racial de marca e preconceito racial de origem: sugestão de um quadro de referência para a interpretação do material sobre relações raciais no Brasil. Revista de sociologia da USP - Tempo Social v. 19, nº 1 2006, p.07. 43
  • 44. OLIVEIRA, D. In Ambivalências raciais e midiatização da sociedade . Artigo apresentado no XXIX Congresso Brasileiro de Ciências da Comunicação, 2006. p.5. PINHEIRO, P. A. In A narrativa auto-biográfica num programa televisivo religioso: um meio de (re)construção sócio-discursiva de gênero e masculinidades. Revista Entrelinhas, Ano III, n° 2, jul/dez 2006, RS. PRUDENTE, C.L (Org.). In Cinema Negro. São Paulo: Fiuza 1ª ed., 2009. SAUSSURE, F. In Curso de lingüística geral. São Paulo: Cultrix; USP, , 1969.p.16. Tradução de A. Chelini, José P. Paes e I. Blikstein SILVA, P. In Racismo discursivo, legislação e proposições para a Televisão pública brasileira, 2007, p.3-4. SODRÉ, M. In Claros e esuros. Rio de Janeiro: Vozes, 1999. WILSON, C. C. In. Black Press History: Overview of the past 182 years of the Black Press. Disponível em http://www.nnpa.org/index.php?option=com_content&task=view&id =15& Itemid=44 . Acesso em: 13 set. de 2010. WINANT , H. In LARRY.A. SAMOVAR; RICHARD E. PORTER; EDWIN R. MCDANIEL, Intercultural Communication: A reader 12ª ed. Estados Unidos: Cenagebrain, 2009. p.315.Tradução nossa. 44