A experiência amorosa e a reflexão sobre o Amor.pptx
Ridículo e Injustiça Linguística
1. Otrechoabaixoépartedolivro"LeDéfidesLangues-Dugâchisaubonsense"(ODesafiodasLínguas
- da má gestão ao bom senso)*, do psicólogo belga Claude Piron, ex-intérprete da ONU e OMS. Esse
excelente livro da editora L'Harmattan (Paris) foi publicado em português em 2002, numa coedição
daPontesEditorese BEL.
*pág.114.TraduzidoporIsmaelMattosAndradeÁvila.
Na maior parte das reuniões, o recurso da interpretação não dispensa uma boa
parte dos participantes de falar uma língua estrangeira. Essa obrigação acarreta novos
inconvenientes. É o caso em particular daqueles que escolhem exprimir-se na língua
de Shakespeare. A fonética inglesa, nunca se dirá o bastante, impõe graves problemas
àgrandemaioriadospovos.Porexemplo,trêsquartosdapopulaçãomundialnãotêm,
em sua língua, os dois sons [θ] e [ð], correspondentes ao th inglês, que se pronunciam
aplicando-se a língua contra a extremidade dos dentes incisivos. Ora, é o som [θ] que
permite diferenciar thick ("espesso") de sick ("doente") e de tick ("tique" ou
"recolocar alguém em seu lugar"). Com frequência o contexto permite evitar os mal-
entendidos. Mas um outro fator que desempenha um importante papel na
comunicação humana continua presente mesmo se o sentido é compreendido: o
ridículo. Eu nunca esquecerei os risos que havia provocado um delegado de um país
cujo nome eu omitirei e que, buscando com dificuldade exprimir-se num inglês mal
dominado, havia desastradamente feito uma pausa, sem dúvida procurando a palavra
certa, após haver pronunciado: My government sinks..., isto é, não, como ele
acreditava, "meu governo pensa" (thinks), mas "meu governo naufraga" tal qual um
navio que afunda no oceano. Dado que todo mundo considerava o país em questão
como à beira do abismo, essa pronúncia inoportuna desencadeou a hilaridade dos
participantes.
É bom ter bastante humor para poder rir uns dos outros. Mas o que é chocante
nesse tipo de incidente, é seu lado injusto. A vítima, em lugar de ser ajudada, é posta
numa situação inferior precisamente porque ela é vítima. Vítima de quê? Da injustiça
A Importância do Ridículo
por Claude Piron
2. dos sistemas de comunicação atualmente em vigor no mundo. Com efeito, esse risco
de ridículo é por definição poupado aos anglo-saxões e aos outros povos cuja língua
gozadeumestatutooficial.
Outro exemplo: na abertura de um encontro internacional, a Sra. Helle Degn,
uma ministra dinamarquesa, querendo desculpar-se por sua falta de familiaridade
com o assunto para o qual havia recentemente assumido suas funções, disse: "I'm in
the beginning of my period"[8](Eu estou no início de meu período [menstrual]). Ela se
tornouapiadadaquelaassembléia.Porquê?Porquemesmoumapessoacommaisde
10000 horas de estudo e prática da língua, como é o caso dos escandinavos, está
sujeitaàsarmadilhasdoinglês.
Os francófonos têm também eles a ocasião de saborear a inferioridade de seus
parceiros. Um dia, quando eu trabalhava ainda na ONU, todas as delegações de língua
francesa divertiram-se muito ao escutar a crítica de um representante, que repetia a
expressão la politique du Cuba [9] constantemente, e que com isso se desmoralizava
cada vez mais. Se nós tivéssemos o coração mais aberto e um pouco mais de
compreensão humana, nós nos indignaríamos contra um sistema que impõe tais
armadilhas a pessoas que de resto são competentes. Na oportunidade, o francês do
orador eraemtodos os aspectos notável.Eu o situariano nível98emrelação ao índice
100 definido no capítulo III. O artigo diante do nome da ilha foi seu único erro. Ora,
esse é ainda mais perdoável uma vez que se diz la politique du Japon ("a política do
Japão"), du Togo ("do Togo")... Um francófono nunca cometeria esse erro, como os
anglófonos no caso do th. É equitativo esse sistema que não reparte igualmente entre
os povos o risco do ridículo? Num debate político, tornar-se ridículo é apresentar a
posição que se defende sob uma circunstância desvantajosa. Será que é para
conservaressasuperioridadeinicialqueasgrandespotênciasmanobramsemprepara
evitarqueseabraenfimodossiêdacomunicaçãolinguísticanomundo?
[8] Jyllands-Posten, 14 de janeiro de 1994; Sprog og erhverv, 1, 1994.
[9] "A política do Cuba": além de errada a expressão soa chula em francês. (N.T.)
Leia o livro "O Desafio das Línguas":
http://www.slideshare.net/Intraespo/o-desafio-das-lnguas-5798456
www.intraespo.org/brasil
www.falesperanto.com.br
Organização Mundial para o
Desenvolvimento da Economia Esperantista