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Seminário Internacional Desfazendo Gênero
14 a 16 de agosto de 2013, Natal (RN)
Grupo de Trabalho: Corpos Estilhaçados: Discursos, Performances e
Agenciamentos
Corpos asfixiados e dilacerados sob as forças das
hetero(homo)normatividades: Arquivo-morto da homofobia no interior do
Piauí
Paulo Fernando Mafra de Souza Júnior
Universidade Federal de Pernambuco – UFPE
Programa de Pós-graduação em Serviço Social
Natal/RN
Agosto de 2013
Corpos asfixiados e dilacerados sob as forças das
hetero(homo)normatividades1
: Arquivo-morto da homofobia2
no interior
do Piauí
Paulo Fernando Mafra de Souza Júnior3
Resumo:
Problematizando o silêncio e segredo construídos acerca dos assassinatos de
homossexuais, tais como expressões singulares da homofobia no Estado do
Piauí, esta comunicação objetiva analisar as vozes contrárias que dilaceram os
gestos, performances e corpos frente às forças discursivas hetero(e/ou homo)
normativas, partindo do método de análise dos Estudos Gays e Teoria Queer.
Palavras-Chave: Homofobia; Heteronormatividade; Homonormatividade; Corpo;
Interior do Estado do Piauí.
Abstract:
Questioning the silence and secrecy built about the murder of homosexuals,
such as singular expressions of homophobia in the State of Piauí, this
communication aims to analyze the contrary voices that torture gestures,
performances and bodies facing straight discursive forces (and / or homo)
normative , based on the method of analysis of Gay Studies and Queer Theory.
Keywords: Homophobia, Heteronormativity; Homonormativity; Corps; Within of
Piauí State.
Introdução:
Agora não se fala mais, toda palavra guarda uma cilada; e qualquer
gesto é o fim do seu início; agora não se fala nada e tudo é
transparente em cada forma, qualquer palavra é um gesto [...] (não se
fala. não é permitido: mudar de idéia. é proibido); não se permite
1
Heteronormatividade é um termo que especifica a tendência, no sistema ocidental contemporâneo de
sexo-gênero, de ver as relações heterossexuais como norma, e todas as outras formas de
comportamento sexual como desvios ou estranhamento dessa norma (SPARGO, 2006). Entre parêntese,
o termo homo acentua o recrudescimento da normatividade ao modo de homossexualidade ‘assimilada’
que incorporada as formas lógicas da norma heterossexual, tal qual outra versão da política sexual ou
dominação de formas neoliberais (BROW, 2012).
2
Segundo Borrillo (2001, p.13-19) o fenômeno da homofobia – vista, grosso modo, como uma
manifestação arbitrária frente ao outro, compreendido como contrário, inferior e anormal, é apresentada
como uma atitude hostil, de repulsa irracional (homofobia afetiva) em respeito à homossexualidade
(apreendida como algo fora do universo comum dos seres humanos), pode ser comparada como à
xenofobia, ao racismo e ao antisemitismo. Salienta-se que a homofobia deve ser tratada como crime
contra à humanidade, por ser produto da alienação do heterosexismo e construção ideológica (homofobia
cognitiva), emergindo como um objeto de estudo da psicologia social, sociologia e ciências jurídicas.
Nesse sentido a homofobia é um fenômeno bem mais amplo que a violência contra homossexuais, pois
enquanto esta é constituída no contexto histórico e econômico-cultural dado como realidade
contemporânea, aquela pode ser observada desde a formação social, psicológica e jurídica do mundo
ocidental.
3
Professor nos cursos de Direito, Serviço Social e Jornalismo no Instituto de Ensino Superior Raimundo
Sá (IESRSA) e Coordenador da Diversidade e Inclusão na Secretaria Municipal de Educação de
Picos/Piauí (PMP). Graduado em História (FUNESO), Especialista em História das Artes e Religião
(UFRPE), História do Brasil com ênfase na história do Piauí (UFPI), Mestre e Doutorando pelo Programa
de Pós-Graduação em Serviço Social (UFPE). E-mail: pmafrajr@hotmail.com; fone +55(89)99390500.
nunca mais olhares, tensões de cismas, crises e outros tempos; está
vetado qualquer movimento. Torquato Neto 4
Esta comunicação procura problematizar o silêncio e o segredo acerca
das séries de assassinatos de homossexuais que vem ocorrendo no interior do
Piauí. Corpos asfixiados e/ou despedaçados são comumente encontrados em
terrenos baldios, beiras de rios, caminhos ermos, entre destroços ou trancados
em apartamentos. Estes fenômenos, longe de ser vinculados à
homossexualidade ou a indefinida prostituição masculina não são registrados
como expressões da homofobia, não aparecem enquanto tais nas mídias locais
ou nos dados das pesquisas levantadas pelo movimento LGBT. Sobretudo
emergem ruidosamente nos fuxicos das comadres, nas gírias dos tímidos
guetos ou furtivamente disfarçadas nas expressões e gestos daqueles que
coletivamente guarda o segredo de tais mortes em silêncio.
O ponto de partida que me incitou o início de uma pesquisa de mestrado
acerca das situações de violência contra gays no interior do Piauí foi o fato do
mesmo ser anunciado pelas pesquisas do GGB5
como um dos estados
brasileiros de menor índice de violência letal contra gays, lésbicas e travestis,
fato que me chamou atenção porque, segundo minhas observações, nas
pequenas cidades piauienses quase não havia registros de tais violências,
apesar dos assassinatos de homossexuais ocorrerem escandalosamente de
forma brutal e desumana. Uma das reais faces dessa realidade cotidiana
mostrou-se protegida pelos silêncios construídos coletivamente frente às
clandestinas relações e práticas homossexuais, sufocadas pelos subterfúgios
das violências simbólicas, mortalmente demarcadas pelo puritanismo acerca
dos acordos de prostituição entre homens e fortemente dilaceradas sob o
segredo dos mecanismos e dispositivos da hetero e homonormatividade
(SOUZA JUNIOR, 2011).
No contexto das violências, Prado (2008, p. 89) afirma que a história da
cultura e posicionamento políticos dos homossexuais aparece de forma
4
Torquato Neto é um dos poetas mais famoso do Piauí, sendo referência intelectual do movimento
tropicalista. Problematizou os conceitos através das imagens e cinema. Asfixiou-se aos 28 anos dentro do
seu apartamento, deixou um acervo intelectual que estilhaça os sentidos das palavras (BRANCO, 2005).
Ver em: http://www.letraselivros.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=619&Itemid=65
5
http://www.ggb.org.br/Assassinatos%20de%20homossexuais%20no%20Brasil%20relatorio%20geral
%20completo.html
bastante imprecisas, devido sua aparição ocorrer em inúmeras configurações
sociais e em diversos contextos histórico-culturais – estando em todas as
sociedades, assumindo posições sociais de formas distintas, estando em todas
as hierarquias econômico-sociais, em várias ocupações políticas, religiosas,
profissionais e envolvidas em distintas tramas da história sociais – sendo,
portanto, muito difícil de traçar uma história de resistência dos homossexuais
frente às situações de violência. Sobretudo porque “o lugar de subalternidade
dos homossexuais foi construído a partir de um silenciamento, muitas vezes
violento, das vozes contrárias [...] o que contribuiu para sua invisibilidade”.
Portanto é diante da demanda política de desfazer a invisibilidade dos
corpos estilhaçados sob os mecanismos dos discursos, performances e
agenciamentos dos corpos que este trabalho se propõe trazer à tona as vozes
contrárias que exibem as forças da hetero e homonormatividade que ajustam e
reajustam corpos que indefinidamente assume a crise da identidade ora
travesti, ora gay ou ora bissexual e acabam por serem asfixiados e dilacerados
pela camisa de força posta pela sociedade normativamente e monarquia do
sexo (SOUZA JUNIOR, 2011).
Do arquivo-morto: A homofobia no interior do Piauí
A homofobia no interior do Estado do Piauí, tal como objeto de
investigação, surge como uma das expressões da realidade brasileira que
nunca esteve guardada, como se fosse um objeto esperando para ser
descoberto. No entanto, tem esse efeito porque é aqui tratada como um
arquivo-morto por ter sido encerrada sob o selo do segredo e protegida através
da barreira do silêncio coletivo. Assim, o fenômeno do desprezo à
homossexualidade e suplício dado aos corpos dos homossexuais são
reproduzidos sob a concepção de tempo passado que, quando acessado na
sob a égide da atualidade, abre-se para o aparecimento de outras
compreensões acerca de um mundo real, levando-nos ao estranhamento das
nossas noções de verdade frente às relações hetero(homo)normativas na
contemporaneidade.
A ideia de arquivo protegido no interior do Piauí, território concebido
como o lugar do “Berço do Homem Americano” pela comunidade internacional
de arqueólogos no Piauí liderada pela Drª Niede Guidon6
, foi construída a partir
da problemática dos dados enunciados das pesquisas realizadas anualmente
pelo Grupo Gay da Bahia, através do site GGB. Os resultados sinalizam que o
Piauí, entre os anos de 2004 à 2010,é um dos estados brasileiros de menor
índice de violência letal contra LGBT, fato contraditório diante do alarmante
silenciamento e segredo no entorno dos vários assassinatos de sujeitos
envolvidos, majoritariamente, com a prostituição masculina, especialmente na
região do Vale do Rio Guaribas7
e que, comumente, quase nunca aparecem
nas estatísticas das pesquisas realizadas a partir dos dados jornalísticos,
sobretudo por ser um fenômeno que, ao modo piauiense, as notícias aparecem
sem detalhes quando a temática é de conotações (homo)sexuais e, muitas das
vezes as informações que estão na ‘boca do povo’ são suprimida pelas
imprensas locais e sufocadas sob a norma da sociedade abrangente, tal como
pressuposto de evitar o desconforto da família e a ‘boa’ memória do/a morto/a.
Partindo do pressuposto de que hoje em dia o pensamento só é possível
acerca do vazio e silêncio do homem assassinado (ROUANET 1996), o cenário
da homofobia reprodutora dos homicídios, no interior do Piauí, é reconhecido
pelas expressões, majoritárias, de enforcamentos, asfixias e esfacelamentos
de caixas cranianas. Apesar das causas mortis, locais e armas dos crimes
entre outros elementos que constituem a infâmia de tais fenômenos, a
homofobia ao modo piauiense traz à tona a imagem trágica de corpos
silenciados, faces desconfiguradas, bocas destruídas e promove o estranho
desenho das forças normalizadoras dos dispositivos da
hetero(homo)sexualidades. Sobretudo, para o além do maldito retrato da
violência corporal e simbólica, o fenômeno traduz as técnicas de ajustamento
dos sujeitos sexuados, técnicas e práticas de hierarquização das subcategorias
sexuais, assim como os mecanismos de poder e controle sobre os corpos.
E é sob os corpos asfixiados e decapitados pela homofobia no interior do
Piauí que encontramos os mais modernos e sutis mecanismos do puritanismo
6
Ver http://www.egal2013.pe/wp-content/uploads/2013/07/Tra_Antonio-Jos%C3%A9-Castelo.pdf
7
http://www.territoriosdacidadania.gov.br/dotlrn/clubs/territriosrurais/valedoguaribaspi/one-community?
page_num=0
brasileiro, tais como produtos resultantes da formação social e político-cultural
de um dos estados mais católicos do território americano. Noutro sentido, esse
mesmo estado revela uma das mais emblemáticas descontinuidades do
processo histórico de tolerância religiosa e sexual no Brasil. Se a conhecida
cidade de Oeiras, hoje orgulhosamente apelidada como “Capital da Fé” agrega
anualmente o maior número de suicídio8
por enforcamento do estado, estando
à cima da média nacional de suicídios, essa mesma cidade agregou, ainda
enquanto capital do Piauí, um dos primeiros sabá satânicos do Brasil Colônia,
que segundo Mott (2007) revela a mais antiga referência explícita a tolerância
às práticas homossexuais no ano de 1758:
Duas jovens escravas, Josefa Linda, mulata da Vila do Mocha e
Custódia de Abreu, índia gueguê da Gurgueía, confessaram a um
emissário da Inquisição em visita pastoral pela Freguesia de Nossa
Senhora do Livramento de Paranaguá que, sob o pretexto de realizar
o famoso “sabá de feiticeiras e diabos”, praticaram, diversas vezes
“atos de soneto (como) de um homem com uma mulher nas partes
pudendas, na traseira e na boca”9
Mott (2007) salienta que neste tempo elas pediram perdão e nada lhes
aconteceu. Do mesmo modo como vários outros casos em que indivíduos
escreviam e contavam histórias homoeróticas que se esvaiam pelos sertões,
descritas por antigos cronistas que relatavam o ano de 1697, com 129
fazendas de gado onde viviam 398 homens e apenas 40 mulheres. Ele relata
que 40% das fazendas não havia uma mulher e a improvável castidade cristã,
certamente não impedia a masturbação, a zoofilia e o homoerotismo dentro e
fora das choupanas nas quais, comumente, se vivia apenas um vaqueiro
branco, acompanhado de um ou dois escravos negros. Este cenário parece
fértil para o recrudescimento do segredo mediante a força heteronormativa do
moralismo cristão que veio se fortalecendo nos tempos modernos.
8
Os dados revelam que 70% dos casos de suicídios são realizados pelo sexo masculino; 91% por
católicos; 76% através do método de enforcamento. Ultima consulta em 08/2013, disponível em
http://oeiras.pi.gov.br/noticias.php?id=132&exibe=comentarios
9
Mott (2007) faz referência ao trabalho: Um congresso de diabos e feiticeiras no Piauí Colonial. In.
BELLINI, Lígia; SALES SOUZA, Evergton; REIS SAMPAIO, Gabriela (Orgs.). Formas de crer: Ensaios de
história religiosa do mundo luso-afro-brasileiro, século XIV-XXI. Salvador: Corrupio-Edufba, 2006, p.129-
160
Mott (2007) aponta a História da homossexualidade no Piauí como ‘uma
página em branco’, pois a prática do segredo que se tornou robusta e
alimentou o silenciamento da história da homocultura no Piauí, tornou-se um
tema tabu na contemporaneidade. Assim como foram abafadas as vidas e
obras dos poetas Mário Faustino – autor dos mais belos poemas homoeróticos,
segundo João Silvério Trevisan – e Torquato Neto10
, mentor intelectual do
movimento tropicalista, descrito como poeta errante, marginal e experimentador
da contracultura, que deixando composições como “Mamãe, coragem”, “Geléia
Geral”, entre outras dos LPs “Panis et Circense” e “Tropicália”, fatalmente
asfixiado aos 28 anos.
Dos Corpos asfixiados e dilacerados sob as forças das
hetero(homo)normatividades: Discussões teórico-metodógicas11
Não se deve fazer divisão binária entre o que se diz e o que não se
diz; é preciso tentar determinar as diferentes maneiras de não dizer,
como são distribuídos os que podem e os que não podem falar, que
tipo de discurso é autorizado ou que forma de discrição é exigida a
uns e a outros. Não existe um só, mas muitos silêncios e são parte
integrante das estratégias que apóiam e atravessam os discursos
(FOUCAULT, 1998 p.30).
O impulso qualitativo deste estudo foi posto pelos expressivos crimes de
ódio que simultaneamente desfiguraram corpos em várias cidades do interior
do Paiuí nos nove últimos anos (do ano 2004 ao 2013), fenômeno velado pela
problemática do silêncio acerca da homossexualidade reprimida num estado
assustadoramente católico e determinados pelos valores da família tradicional
cristã. Esta realidade demarcou o desenhou e procedimentos metodológicos
que acabou por sofrer a influência do raciocínio construcionista dos estudos
gays e que acabou sendo extremamente instabilizado pela negação do
10
Mott faz referência ao artigo: Torquato Neto era gay? , In ISTOÉ, São Paulo, 11 de maio de 2005.
11
Inicialmente será tratada, na etapa desse trabalho, a construção teórico-metodológica desenvolvida
durante a pesquisa de mestrado intitulada de “O silêncio e o segredo do cabeça de cuia: Um estudo sobre
a situação de violência vivida pelos gays no Vale do Rio Guaribas” e que contribuiu para problematizar a
temática do presente trabalho.
discurso legítimo e normativo oriundo do pós-estruturalismo constituída pela
teoria queer.
Entretanto, foi a demanda da desconstrução do discurso hegemônico
que pôs luminosidade sobre o silêncio da homossexualidade que, enquanto tal,
agrega a heteronormatividade da rede institucional da sociedade
contemporânea, realidade que exigiu deste discussão uma constante
incertezas e negação frente à invenção das identidades sexuais enquanto
categorias essencialistas e naturais.
Segundo Gamson (2006, p.345-6), a história da pesquisa no campo da
sexualidade possui semelhanças com a história dos estudos sobre as mulheres
e estudos étnicos, por se apresentarem como pesquisas que são entrelaçadas
com a política dos movimentos sociais, matizadas com a cautela quanto à
forma pelas quais a “ciência” tem sido empregada contra os marginalizados e
aparecendo confortáveis com as estratégias da pesquisa qualitativa. Nesse
sentido, os sujeitos da pesquisa aparecem delimitados como reprodutores dos
significados políticos e culturais: dando mais espaço às vozes e às
experiências que foram suprimidas no contexto sociocultural; evidenciando a
problemática da maioridade dos sujeitos na pesquisa de campo e visibilidade
das representações sociossexuais; e, apreendendo a voz dos novos sujeitos
nos seus posicionamentos-identitários (RIOS, 2004).
Tais procedimentos teórico-metodológicos se tornam óbvios pelas
marcas da difícil tarefa de reconhecer o sujeito gay ou hetero como sujeitos
unificados por um eu autônomo. Esta situação, que passou a ser
problematizada junto ao desenvolvimento da teoria queer, influenciou vários
trabalhos entorno da temática da sexualidade que, adotando os insights
construcionistas, acrescentaram críticas pós-estruturalistas aos discursos
científicos. Percebi, através desta teoria, que os pesquisadores se distanciaram
do uso pleno da linguagem positivista e da noção do sexo como realidade
reguladora de uma estrutura biológica ou essencial do desejo sexual
constituído por um gênero, uma raça, uma nação ou uma classe. As histórias
contadas trazem à tona o abandono e a decadência das velhas narrativas que
tinham como objeto de estudos os sujeitos como estruturas estáveis. Por outro
lado, propuseram luminosidades sobre os questionamentos pós-modernos da
objetividade e sobre a adoção de um ponto descentralizado dos
posicionamentos-identitários, sempre mutáveis, que enquadra a diferença, o
movimento e a instabilidade dos sujeitos contemporâneos (cf. HALL, 2006;
LYOTARD, 2004; GAMSON 2006 p. 346), aqui observados, frente aos desejos
sociossexuais.
Demarcando as tendências concorrentes com o discurso hegemônico, a
fim de instabilizar o mesmo, o intuito inicial é de romper com o binarismo
homo/hetero e processos de categorização sexual; trazer visibilidade para
constituição histórica e cultural dos dispositivos das sexualidades, tais como
práticas “estilísticas da existência” e políticas sociossexuais do indivíduo e
corpo coletivo. É neste sentido que o sujeito da pesquisa sempre aparece,
ancorado no pós-estruturalismo, como provisório, circunstancial e cindido,
através do qual o procedimento metodológico articule e apreenda o sexo como
sistema de utilidade e regulação da vida social presente nos discursos,
instituições, enunciados científicos, formas arquitetônicas, proposições morais
e filosóficas. Assim, a heterossexualidade só existe por meio da enunciação da
homossexualidade que, aparecendo como o “Outro” inferior, negativo, abjeto,
sem o qual o hegemônico não se constitui e nem tem como descrever a si
próprio (MISKOLCI, 2009 p. 2-3).
No agenciamento dos corpos (des)contruídos pelos discursos
hegemônicos no Estado do Piauí, percebe-se que os casos de assassinatos de
homossexuais, articulados e denunciados a partir dos interesses políticos e
ideológicos da imprensa e grupos de homossexuais organizados, parecem
produzir visibilidades sobre o discurso conservador das instituições
governamentais e não-governamentais. Pois a visibilidade dos casos de
assassinatos de homossexuais se dão no contexto histórico-econômico
fomentado na imprensa local através de relações coloniais e tradicionalistas
frente aos valores morais conservadores do status-quo de uma elite burguesa
em detrimento dos emergentes sujeitos praticantes da homossexualidade e
movimentos sociais de homossexuais organizados. (SOUZA JUNIOR, 2011)
Noutro sentido, os dispositivos da heterossexualidade incitam no
movimento de homossexuais organizados o ativismo político-social das
denúncias, reconhecidas como tal pelos próprios militantes e organização
coletiva dos mesmos. No entanto, parece óbvio que o não reconhecimento
político do movimento LGBT na esfera política das relações de sociabilidade
frente ao conservadorismo das instituições governamentais e da sociedade civil
confirma que a denúncia dos assassinatos de homossexuais expressa o
posicionamento conservador da imprensa brasileira e latino-americana,
diferentemente da imprensa norte-americana (GREEN, 2000).
Se as denúncias de assassinatos na capital do Piauí são estimuladas a
tomarem visibilidade, segundo os dispositivos que fazem falar o ativismo
homossexual, percebe-se que as informações arquivadas no GGB foram,
majoritariamente, viabilizadas pelos grupos organizados da capital Teresina, tal
como efeito dos mesmos dispositivos. Sobretudo, no interior do estado a
demanda do fenômeno da violência contra gays revela-se como mecanismo
que faz calar e intimidam as denúncias dos movimentos e ativismos dos
posicionamentos político-social dos homossexuais12
. Segundo o estudo de Mott
(2007, p.28), a capital do Piauí concentra 91% dos homicídios denunciados,
aparecendo denúncias no interior apenas através da mídia eletrônica e
informações radiofônicas, apreendidas pelos grupos de ativistas da capital. A
denúncia de um dos casos de assassinatos de homossexuais na cidade Picos,
no Vale do Rio Guaribas, arquivada pelo GGB, foi viabilizada pelo grupo
Matizes, ONG sediada na capital.
ANTONIO RODRIGUES DO NASCIMENTO, travesti Toinha, foi
encontrada morta com a cabeça esmagada com uma pedra, no dia
21-1-2007, domingo de madrugada, no bairro Conduru, Picos-PI; São
acusados do crime, E.F.C de 17, já detido, e o outro menor cuja inicial
do primeiro nome é L. de 16 anos, residente na região do bairro do
Junco. Consta que estes jovens decidiram fazer um “programa” com a
travesti, com o objetivo de arrecadar dinheiro necessário para o
pagamento da bebida consumida no Bar da Railha, nas proximidades
12
Foi observado durante noves anos (2004-2013) no Vale do Rio Guaribas e Vale do Canidé que muitos
dos casos de assassinatos de homossexuais não foram vinculados como tais na imprensa local. Mesmo
que muitos sabem quem foram os assassinos, a polícia e a sociedade civil não enquadram tais sujeitos
como homofóbicos, alguns foram detidos e logo depois liberados e outros nunca foram presos como
autores de tais crimes, dados como foragidos.
de onde foi encontrado o corpo. Segundo o delegado Xavier, ao
chegarem ao bairro Conduru, os dois menores desistiram da proposta
inicial e cometeram o homicídio, dando pelo menos três golpes “com
o corpo rígido de concreto”, o que esfacelou a cabeça da travesti.
“Estamos averiguando se haveria possibilidade de apenas um dos
rapazes ter levantado a pedra, devido o seu tamanho”, comentou. Os
dois menores possuem constantes passagens pela polícia picoense
por crime de pequeno porte. O crime chocou a cidade pela violência
empregada. Este é, agora, o nono homicídio em Picos em menos de
dois meses, fato que tem chamado à atenção das autoridades
policiais locais e de Teresina (FONTE: RIACHAONET; JORNAL 95,
FM CIDADE MODELO, GRUPO MATIZES. MOTT, 2007 p.35).
Parece que o “complô do silêncio” e a “lei do segredo‟ faz emergir
incertezas acerca das evidências de quem e porque levantou a pedra para
esfacelar a cabeça de “Toinha”, assim como emerge a incerteza sobre a
constituição do crescente número de casos da violência letal contra
homossexuais no interior dos estados brasileiros – 165 mortes no interior frente
a 95 mortes nas capitais, no ano de 2010. Este fenômeno é descrito como
resultante do robustecimento da homofobia ou aumento da eficiência de
identificação dos assassinatos e realização de denúncias efetivadas pelo
movimento LGBT no interior dos estados. Como se verifica no estado do Piauí,
segundo tabelas completas divulgadas no site do GGB, o número de denúncias
de violência letal aumentou de 2 para 8 casos de assassinatos de
homossexuais, do ano de 2009 para o ano de 2010. Mott (2007, p.22,28)
problematiza as denúncias da violência contra homossexuais no interior do
Piauí a partir do questionamento de como é possível fazer aparecer os
números dos homossexuais assassinados, “se somos nós que sabemos a
incompletude dessas estimativas”.
Assim, foi a partir de pesquisas in lócus, que assumi a demanda durante
o desenvolvimento da pesquisa de mestrado em serviço social de relatar a
história de vida de alguns sobreviventes da violência letal em algumas cidades
do Vale do Rio Guaribas, momento que trouxe à tona uma série de fragmentos
de histórias de vida de sujeitos estigmatizados que nunca havia aparecido nas
mídias ou jornais das redes sociais locais e, no entanto, tiveram a infeliz
visibilidade apenas após as suas mortes, através das notícias policiais e ainda
onde o eixo central da problemática de sua morte foi suprimido, silenciada
devido aos ditames morais do moderno puritanismo burguês e dos bons
costumes do fundamentalismo cristãos da sociedade abrangente.
Segue adiante uma breve mostra de diálogos, valendo-me como
instrumentos dos dados coletados as entrevistas semi-estruturadas com os
pesquisados13
, seguida de diálogos com a literatura consultada e das
observações de campo realizadas acerca dos assassinatos de homossexuais
no Vale do Rio Guaribas-PI. Sinalizo que tais diálogos, inevitavelmente
consciente e/ou inconsciente, são imbricados por percepções apreendidas na
convivência e atravessadas pela subjetividade do autor junto aos discursos e
silêncios produzidos pelas posições-identitárias dos sujeitos ora postos
enquanto heterossexuais/homossexuais em interações com os mecanismos,
práticas políticas, sociais e culturais da sociedade hegemônica da localidade.
Destaco ainda, que os diálogos são “por exemplos” de leituras e interpretações
de uma das formas que o real pode tomar.
Diálogos com os sobreviventes: Dos ajustamentos dos gestos,
performances e controle dos corpos frente as forças da
hetero(homo)normatividade
As temáticas trabalhadas nesta etapa do trabalho serão apresentadas
através de trechos de entrevistas, fragmentadas para facilitar a ilustração dos
agenciamentos dos corpos e forças discursivas demandadas pela norma dos
dispositivos das sexualidades. Os trechos dos depoimentos emergiram acerca
do diálogo sobre a temática da homofobia, tal como uma atitude hostil,
aversão, frente a tudo que está relativo à homossexualidade e/ou
homossexual, constituída como um constructo coletivo e individual, podendo
aparecer de forma externizada ou internalizada, se reproduzindo nas
instituições e micro-relações interpessoais, sociais, culturais, políticas e
13
No número de doze pessoas, os sujeitos pesquisados foram delimitados a partir dos seguintes critérios:
Ter mais de dezoito anos, assumir o posicionamento-identitário dos homossexuais no momento das
entrevistas e ser indicado por outro sujeito pesquisado pelo autor da pesquisa. O primeiro participante da
pesquisa foi uma indicação do movimento LGBT de Picos-PI, segundo a presidente do GGLOS (Grupo
Guaribas de Livre Orientação Sexual). Foi utilizado o método de “bola de neve” para composição dos
sujeitos participantes e a técnica de saturação para delimitação dos mesmos e respostas das entrevistas.
acadêmicas. A homofobia internalizada que provoca o sofrimento interior
também leva o indivíduo a assumir uma inferiorização nas relações socias e
políticas, além de viabilizar o caso da violência contra o próprio corpo até a
efetivação do suicídio (BORRILLO, 2000; CARRARA & RAMOS 2006).
A homofobia aparece através través do preconceito, discriminação, atos,
gestos e palavras baseado no ódio ou não saber acerca do conhecimento
invisibilizado pelo discurso heteronormativo (MOTT 1997, 2007; PRADO, 2008;
MACHADO & PRADO 2011). É constituída por uma noção binária da realidade
homo/hetero, normal/anormal, saudável/doentio, forte/frágil, mantido pela lógica
hegemônica de hierarquias sociossexuais e econômicas construída sobre a
ideia de “minorias sociais” e “maioria social” (GREEN 2000; MARSIAJ 2003;
GAMSON 2006; MISKOLCI 2009).
Os nomes dos sujeitos pesquisados são substituídos por nomes de
tribos indígenas que deixaram traços culturais nas populações locais do interior
do Piauí. A estratégia metodológica é uma provocação de novas reflexões
sobre o neocolonialismo a partir das identidades de gênero e normatividades
das orientações sexuais.
Partindo da noção de controle dos gestos, os espaços escolares e
domésticos aparecem, majoritariamente, como os ambientes determinantes
nos disciplinamentos dos corpos, como podemos identificar através das falas
de:
Tabajara: “Assim no colégio quando eu era mais novo um pouco, eu
sempre fui espontâneo, aí ficavam tirando brincadeira, gayzinho tal...
pra pessoa que não é decidida ainda, machuca muito e eu ficava
isolado dos outros no colégio. Aconteceu já faz algum tempo que eu
presenciei uma discussão... uma do mundo gay e outra hetero, a
pessoa tava com muita agressão verbal... Já em muitas delas, com
muitas pessoas que começaram com provocação baixa... na medida
que eu tentava me defender ele ia aumentando... estava todo mundo
na quadra eu e meus colegas, e veio esse garoto e começou a
provocar... ele começava a me chamar de gay, de várias coisas,
pejorativas... exatamente, como a quadra era pública, ele não
aceitava os gays jogarem bola lá, praticar algum esporte... ele usava
caráter pejorativo para nos agredir... na casa do meu pai não posso
nem dizer que sou, aí é onde eles partem para agressão”
Pimenteiras: “eu acho que foi no colégio, quando eu fazia terceiro
ano... que eu era meio que discriminado... assim.. por meninos... os
homens... não eram muito próximo, sei lá... tiravam muita piadinha...
não dava espaço pra se aproximar... e eu sou do tipo de pessoa que
se eu notar qualquer coisinha já não me aproximo... aí eu acho que
até já peguei um trauma disso.. eu num tenho amizade com hetero
por causa disso, eu tenho medo de tá incomodando... aí eu nem me
aproximo, eu acho isso... no terceiro ano principalmente, eu tinha
16ª[...] Eu acho assim, passivamente... um gay afeminado que saí na
rua fazendo escândalo, eu acho que facilita um hetero tirar uma
piada... e o ativo é o que tem preconceito... o lugar era na escola, não
porque eu me expressasse lá, mas porque quando eu me expressava
na rua, aí as pessoas comentavam na escola.. e é porque eu nem
falo na sala com eles direito... aí eles me viam na rua, aí ficavam
comentando, aí ficavam zuando...”
Tremembés: “a primeira experiência é você ta ali numa sala de aula e
as pessoas saberem que você é gay e você sempre ser motivo de
piadinhas... muitas das vezes agressivamente dos meninos por não
aceitarem como eles dizem... um viado dentro da sala de aula...
então, tudo que você faz, tudo que você diz vai ser alvo de criticas e
ninguém aceita... porque não querem ser liderados por um viado na
sala de aula... a primeira experiência foi na escola, por não ser aceito
muitas vezes... mas também por ser admirado, porque dizem que
gays tem notas altas, gays são bastantes inteligentes...”
Acroá: “Na escola, com os outros alunos... eu sempre usava rosa e
roxo pra ir ao colégio, e um aluno me pegou e jogou minha mochila
roxa dentro do vaso e mandou eu pegar e me bateu dentro do
banheiro... eu chorei muito... procurei autoridade da escola, mais eles
nunca fizeram nada... já com um professor de física... ele é
homofóbico... ele disse pra mim que gay não tinha vez... se eu não
ficasse calado eu não ia fazer prova durante dois meses...”
A homofobia que se vê nos espaços públicos parecem como
construções ou continuidades das instituições escolares. Constrangimento
parece ser uma consequência da expressividade não contida. Segundo Costa
(1992), as escolas internas, os exércitos e as tabernas refletem a
homossexualidade reprimida da infância do adulto de heterossexualidade
compulsória, a realização deste estaria em submeter a sexualidade infantil à lei
do desejo heteronormativo, à qual, enquanto crianças foram submetidas. Tal
situação homofóbica parece alimentar hetero(homo)normatividade submetida
aos corpos a partir de gestos específicos que sinalizam dispositivos que expõe
os sujeitos à situações perigosamente violentas. As expressões da homofobia
silenciosa surgem como algo muito peculiar se confrontada com a bibliografia,
é comum as histórias no interiro do Piauí onde travestis deixaram de se
travestir para serem aceitas na comunidade e ter emprego na região, assim
como gays deixarem de levar a vida de gays para se casarem com o sexo
oposto e adotaram o modelo de vida heterossexual, tal como uma alternativa
de sobrevivência e fuga das situações da violência física e simbólica.
No decorrer da pesquisa de campo, dois gays que foram indicados para
a pesquisa de campo, se casaram segundo a modelo heterossexual e um deles
se converteu às doutrinas da igreja evangélica. A discriminação dada por
funcionários em supermercados, atendentes de lojas, garçons ou
clientes/consumidores se incomodarem com a presença de gays ou travestis
no ambiente, parece surgir como freio para a lógica do consumo e expansão do
mercado “GLS‟14
. Sobretudo, na fala de Tremembés é sinalizado o enunciado
de que “gays tem notas altas, gays são bastante inteligentes”, expressão
emblemática da homonormatividade que desconcerta o discurso hegemônico
do modelo heteronormativo.
Marsiaj (2003) sinaliza para a acentuação da discriminação e da
violência baseadas nas diferenças socioeconômicas entre famílias de classes
populares e médias, nas relações sociais e na dinâmica político-cultural dos
espaços públicos. Os trechos das entrevistas corroboram para caracterização
da homofobia ocorrida nas relações micro-sociais, como apontadas nos
estudos de Carrara & Viana (2006), segundo os registros do DDH no Rio de
Janeiro. Aqui chamamos atenção para a sutileza dos casos de violência dados
em ambiente domésticos, tais como ameaças, agressões, discriminações que
14
GLS: Gays, Lésbicas e Simpatizantes - termo que surgiu dentro da dinâmica do discurso mercadológico
da sexualidade, existente muito antes do termo GLT, GLBT (adotado pelo movimento social). Facchini
2002 apud Machado & Prado. IN: http://lodel.demo.inist.fr/cahierspsychologiepolitique/index.php?
id=300#tocto2n2
acontecem em maior grau do que a violência letal e que no entanto recobre de
silêncio os assassinatos. Os casos vistos nas entrevistas com gays do Vale do
Rio Guaribas as situações de violência contra gays parecem concorrer com as
entrevistas em ambiente público e privado. Segundo as observações realizadas
na região, há uma presença marcante das normas familiares e ordem higienista
ainda remanescentes do século XIX, conservadas pela ordem cristã e vista
comumente nos ambientes citadinos, cunhados sob o perfil da família sagrada
e mortificação do corpo na cruz – desde as residências familiares às escolas,
comércios, prefeituras, câmera dos vereadores, enfim, nos espaços públicos e
privados – apresentam a heteronormatividade cristã como princípio a-histórico,
natural e verdade universal. Na praça central da cidade de Picos, o presépio da
família cristã tem uma exposição permanente, em todos os prédios da
prefeitura e comércio o corpo crucificado é exposto nas portas e paredes
centrais. Este fenômeno parece provocar uma variedade de gestos e discursos
que trazem uma visibilidade silenciosa do assassinatos de homossexuais no
cotidiano, assim como provoca o surgimento de mecanismos singulares de
enfrentamento e denúncias da violência.
Acerca das estratégias do corpo-segredo, aqui entendido como o corpo
que busca velar uma sexualidade estigmatizada, aparece nos gestos e
performances como técnicas de “normalizar‟ o discurso, invisibilizar os trejeitos
“femininos‟ ou evitar aparecer:
Cariri: “Não procuro mexer... Aí a gente passa normal... Como se
nada tivesse acontecido...”
Acaraós: “Tenho uma postura reservada, por causa que não sou
muito de andar chamando atenção, se vestir de mulher e tal... e me
comporto normal, me vestindo como homem.”
Amanajós: “Não é pra todos os gays não... mas eu acho que o que
dificulta é pra aqueles que são afeminados e fazem questão de dizer
-ah sou gay! - eu acho que aqueles discretos não têm lá esses
problemas não... eu acho... as pessoas não olham pra o interior das
pessoas... aqueles que usam roupas de mulher... eu acho que é mais
difícil... Eu tento fazer alguma coisa pra não dá na cara que eu sou...
sei lá... fazendo tudo que dá na telha... assim com a mão...
gesticulando... com a voz afeminada... por exemplo quando você se
sente em casa... aí eu acho que se você fazer isso em todo o lugar dá
na cara... aí fica mais arriscado, comentários... essas coisas.... se for
pra sair eu saio... mas o bom pra sair é quatro ou cinco pessoas [...]
Sair com muitas pessoas gera mais comentários [...]Esses lugares
que sempre tem gente toda hora, num comércio, num lugar onde tem
muitas pessoas que gostam de brincar e soltar piadinha, lugar muito
freqüentado, no trabalho... cem por cento não, mais ou menos... não
pode não... Às vezes eu to andando em algum lugar... aí, eu cruzo as
pernas... quando eu lembro, eu tiro! Tem vez que eu sento e boto a
mão na cintura, quando eu lembro eu solto...”
Acroá: “Eu evito passar onde tem muita gente... muito rapaz e muita
moça, porque sempre joga piadinha na gente, passo pela outra
calçada, às vezes não passo... eu saio do lugar onde tem gente...
assim preconceituosa e às vezes finjo que não escuto [...] Tem gays
afeminados que não trabalham pelo falto de ser afeminado de se
vestir igual a uma mulher... eu deixei de ser afeminado porque
emprego é difícil.”
Tabajara: “Eu não procuro me aproximar das pessoas que já vejo
assim de cara que não são as certas pra conversar e tudo, porque
sempre vem com algum tipo de agressão, eu fico na minha ou
procuro as pessoas do mesmo tipo que eu... um fato que eu observo
é a conversa dele com as outras pessoas, ou então, olho pro jeito
dele, a cara, a aparência da pessoa, muitas coisas indicam o modo
que a pessoa é... se tem cara fechada e o tipo de conversa, se tira
brincadeiras sem graça, ali nem encoste... senão ele começa assim e
vai para umas mais pesadas.”
As falas denunciam a demanda da formação de guetos, da segregação
dos grupos e invisibilidades da diversidade dos sujeitos. Inúmeros sujeitos
pesquisados e observados apresentaram o conflito em desfazer as normas
naturalizadas dos gênero, tal como um conflito de pertencimento ao gênero
masculino ou feminino, tal como lógica heteronormativa. Enquanto sob a lógica
homonormativa, muitas das vozes contrárias revelam os limites de assumir-se
enquanto travestis, sendo forçado a mostram-se como gays ou, caso contrário,
assume-se obrigados a viverem sob o modelo do ‘homem heteronormativo’.
Os trechos acima, inevitavelmente, evocam as reflexões acerca da
política dos gestos e o rompimento do silêncio pela barulhenta desqualificação
daqueles que assumem sua preferência pelo papel inferior. Tal como os gregos
na idade clássica encontravam naqueles sujeitos não viris a razão de
problematizar a virilidade e a juventude dos homens (FOUCAULT, 1984). No
entanto, a idade contemporânea parece exigir dos indivíduos o exercício e
técnica de si que punciona identidades sócio-sexuais provisórias, furtivas o
que, ao mesmo tempo, parece estimular a busca por uma identidade político-
sexual permanente ou favorecer o surgimento de subculturas e fortalecimento
de guetos.
O posicionamento de Cariri em “[...] passa normal... como se nada
tivesse acontecido” sinaliza para o domínio de si no evitar ou enfrentar as
situações de violência contra gays que também sugere a constituição de
situação onde ele não precise exercer uma “tal normalidade‟. No exemplo de
Tabajara em “procuro pessoas do meu tipo que eu” indica a formação de
guetos e subculturas como forma de evitar e enfrentar as situações de riscos. A
maioria dos depoimentos aparece como estratégias silenciosas de suprimir o
confronto dos discursos hegemônicos, ou de visibilidade dos mesmos. Assim
como denotam a separação de corpos e categorização dos gestos dado pela
lógica binária homo/hetero; normal/anormal. Outro detalhe é que a postura e os
gestos afeminados aparecem como sinônimo de produção e rompimento do
silêncio heteronormativo, o que caracteriza a violência contra gay imbricada
pela questão binária da violência de gênero feminino/masculino;
mulher/homem. A idéia de „ex-gays‟ e „ex-travestis‟ parece indicar uma dupla
violência dada por uma homofobia externa e outra interna, ou simplesmente
como estratégia de sobrevivência ou aprimoramento de técnica de si e
silenciamento do corpo político-sexual no âmbito social, o que proporciona a
visibilidade do discurso hegemônico da hetero(homo)normatividade, é nesse
contexto que muitos homossexuais piauienses que se ‘convertem na lei dos
crentes’ (fundamentalismo cristão), comumente revelam o sofrimento da
homofobia sofrida dentro e fora de si.
Nesse sentido, percebe-se o agenciamento do corpo-silêncio, tal como
performances que fragmentam o corpo e dilacera os sentidos a partir da ideia
de ‘virar a face’, ‘tapar os ouvidos’, ‘fechar os olhos’, ‘calar a boca’ ou ‘suicidar-
se’:
Acaraós: “Aquele que tá espancando as pessoas homossexuais,
espancamento, é o de menos, mas não precisa, é só evitar bater
boca e sair do lugar.”
Jaicós: “... aí eu finjo que não tô nem escutando, faço só passar
direto, eu tapo os ouvidos, faço de contas que não to nem vendo...”
Mandaú: “A minha estratégia é uma só, se eu vou para uma rua que
tenha alguma relação de mau... Eu mudo para outra rua... Sempre eu
mudo meu caminho...eu evito festa de meio de rua...na verbal eu
deixo passar...violência verbal é em qualquer lugar em qualquer
tempo... não falo nada e prossigo meu caminho [...] Muitos até se
matam porque não conhece o homossexualismo...já ouvi falar de uma
pessoa que se matou...por não entender direito...”
Timbira: “devido eu ter passado por essas coisas e tudo, hoje eu sou
mais caseiro [...] Hoje eu sou mais na minha, devido às informações,
devido o trabalho, é totalmente diferente...”
Pimenteiras: “Eu dou uma de louca, como diz um amigo meu... eu
finjo que nem to vendo... é como se fosse normal... hoje em dia tudo é
normal [...] eu me saio, sei lá... finjo que não to escutando...”
A asfixia dos sentidos dado pela situação de violência contra gays
parece disciplinar os corpos em favor da discrição e negação do mundo
aparente. Timbira indica que as formas de enfrentamento são demandadas
pelas informações e trabalho, se resguardando numa postura mais caseira, o
que certamente parece limitar o exercício de sua vida sócio-sexual, pelo fato
das restrições de firmar uma parceria sexual no âmbito doméstico. A loucura de
Pimenteiras aponta para um posicionamento queer trabalhada por Gamson
(1996), pois quando tudo parece viabilizar uma normalização, ele prefere
parecer como louca. Sobretudo, o suicídio descrito por Mandaú parece ser das
formas de enfrentamento mais complexo, estudado por Borrillo (2001) como
uma violência provocada pela homofobia internalizada. Já na perspectiva
foucaultiana, esse enfrentamento, apesar de apontar para a anulação de uma
situação de violência, é expressão do poder sobre o próprio corpo, porém o
poder sobre si só, sem positividade em gerar e reproduzir a vida, o poder
destrutivo que não proporciona o desenvolvimento tecnológico de gerir e
reinventar o poder da humanidade de preservar a vida. (DREYFUS, 1995).
Considerações finais
Sinto uma felicidade melancólica em viver no meio dessa confusão de
ruelas, de necessidades e de vozes: quantos prazeres, impaciências,
desejos, quanta sede de vida e que embriaguez vêm à luz aqui a
cada instante! E logo, contudo, o silêncio cairá sobre todos esses
homens barulhentos, vivos e felizes por viver! Atrás de cada se
desenha sua sombra, obscuro companheiro de caminhada! (...) Cada
um deles quer ser o primeiro nesse futuro – e, contudo, a morte, o
silêncio da morte são as únicas certezas que todos têm nesse futuro!
Como é estranho que essa única certeza, essa única comunhão seja
quase imponente em agir sobre os homens e que eles estejam tão
longe de sentir essa fraternidade da morte! Sinto-me feliz em
constatar que os homens se recusam absolutamente a pensar na
ideia da morte e gostaria muito de contribuir para lhes tornar a ideia
da vida ainda cem vezes mais digna de ser pensada. (O Pensamento
da Morte. A Gaia Ciência – Friedrich Nietzsche)
No decorrer da escrita dessa comunicação, mais um corpo de um
homossexual foi encontrado com a cabeça esfacelada num terreno baldio às
margens do centro da cidade de Picos, interior do Estado do Piauí.
Distante da estratégia política das normatividades de reproduzir o medo
contemporâneo nos sujeitos desejosos em viver a tão sonhada liberdade
sexual no próprio corpo, este estudo visou, à guisa conclusiva, sinalizar os
prejuízos dado à humanidade provocado pelo silenciamento dos gestos,
mortificação dos prazeres do corpo e segredos acerca dos dispositivos que
dilaceram o nosso direito de ser e mostrar-se diferente diante do processo de
desfazer os gêneros e modelos tradicionais das orientações sexuais que
reprimem e asfixiam os nossos corpos em caixinhas dentro dos armários ou
prateleiras dos supermercados sexuais da espetacular sociedade do consumo.
Enquanto observador das expressões das violências acerca das normas
e regulações das orientações e corpos sexuais, venho constatando que os
mecanismos lógicos das hetero(homo)normatividades, através da demanda
econômica ou jogo do poder, reproduzem mercados concorrentes na venda de
modelos ideais de sexualidades e/ou consumos de pacotes fechados de estilos
de vida modernos. Sobretudo, é nos bastidores dos grandes espetáculos das
propagandas de margarina da ‘feliz família sagrada’, durante os intervalos das
novelas das oito ou no silêncio que nos tomam entre os episódios de Glee e
Paradas LGBT que percebemos os estímulos que nos incitam às falas, quase
que obrigatórias dos posicionamentos de identidades sexuais “tipo modelo” que
devemos, à qualquer custo, consumir e assumir como nossa ‘liberdade’ de ser
e viver.
Enfim, esta comunicação emergiu do desejo de estilhaçar os discursos
hegemônicos a fim de fazer provocações críticas acerca das lógicas e razões
consumistas, desfazendo os rótulos postos pelos tipos de orientações sexuais.
Acredito que a partir da visibilidade e liberação das vozes contrárias que nos
sufocam e dilaceram nossos corpos sob as obscuras forças
hetero(homo)normativas é que reconheceremos as nossas diversas vontade de
morte e diferentes desejos de vida.
Bibliografia:
BORRILLO. Daniel. Homofobia. - L‟Homophobie. Paris: Presses Universitaires
de France, 2000. - Edicions Bellaterra, La Biblioteca del Ciudadano. 2001.
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Neto e a invenção da tropicália. São Paulo: Annablume, 2005.
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3045. Revista Latino-Americana de Geografia e Gênero, v. 4, n. 1, p. 125-
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FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade 1: A vontade de saber,
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http://lodel.demo.inist.fr/cahierspsychologiepolitique/index.php?id=300
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parcerias e práticas homossexuais entre homens jovens candoblesistas
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Rio de Janeiro: Pazulin; Juíz de Fora: Ed. UFJF, 2006. – Coleção Encontros
Pós-modernos.

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Corpos asfixiados e dilacerados sob as forças das hetero(homo)normatividades: Arquivo-morto da homofobia no interior do Piauí

  • 1. Seminário Internacional Desfazendo Gênero 14 a 16 de agosto de 2013, Natal (RN) Grupo de Trabalho: Corpos Estilhaçados: Discursos, Performances e Agenciamentos Corpos asfixiados e dilacerados sob as forças das hetero(homo)normatividades: Arquivo-morto da homofobia no interior do Piauí Paulo Fernando Mafra de Souza Júnior Universidade Federal de Pernambuco – UFPE Programa de Pós-graduação em Serviço Social Natal/RN Agosto de 2013
  • 2. Corpos asfixiados e dilacerados sob as forças das hetero(homo)normatividades1 : Arquivo-morto da homofobia2 no interior do Piauí Paulo Fernando Mafra de Souza Júnior3 Resumo: Problematizando o silêncio e segredo construídos acerca dos assassinatos de homossexuais, tais como expressões singulares da homofobia no Estado do Piauí, esta comunicação objetiva analisar as vozes contrárias que dilaceram os gestos, performances e corpos frente às forças discursivas hetero(e/ou homo) normativas, partindo do método de análise dos Estudos Gays e Teoria Queer. Palavras-Chave: Homofobia; Heteronormatividade; Homonormatividade; Corpo; Interior do Estado do Piauí. Abstract: Questioning the silence and secrecy built about the murder of homosexuals, such as singular expressions of homophobia in the State of Piauí, this communication aims to analyze the contrary voices that torture gestures, performances and bodies facing straight discursive forces (and / or homo) normative , based on the method of analysis of Gay Studies and Queer Theory. Keywords: Homophobia, Heteronormativity; Homonormativity; Corps; Within of Piauí State. Introdução: Agora não se fala mais, toda palavra guarda uma cilada; e qualquer gesto é o fim do seu início; agora não se fala nada e tudo é transparente em cada forma, qualquer palavra é um gesto [...] (não se fala. não é permitido: mudar de idéia. é proibido); não se permite 1 Heteronormatividade é um termo que especifica a tendência, no sistema ocidental contemporâneo de sexo-gênero, de ver as relações heterossexuais como norma, e todas as outras formas de comportamento sexual como desvios ou estranhamento dessa norma (SPARGO, 2006). Entre parêntese, o termo homo acentua o recrudescimento da normatividade ao modo de homossexualidade ‘assimilada’ que incorporada as formas lógicas da norma heterossexual, tal qual outra versão da política sexual ou dominação de formas neoliberais (BROW, 2012). 2 Segundo Borrillo (2001, p.13-19) o fenômeno da homofobia – vista, grosso modo, como uma manifestação arbitrária frente ao outro, compreendido como contrário, inferior e anormal, é apresentada como uma atitude hostil, de repulsa irracional (homofobia afetiva) em respeito à homossexualidade (apreendida como algo fora do universo comum dos seres humanos), pode ser comparada como à xenofobia, ao racismo e ao antisemitismo. Salienta-se que a homofobia deve ser tratada como crime contra à humanidade, por ser produto da alienação do heterosexismo e construção ideológica (homofobia cognitiva), emergindo como um objeto de estudo da psicologia social, sociologia e ciências jurídicas. Nesse sentido a homofobia é um fenômeno bem mais amplo que a violência contra homossexuais, pois enquanto esta é constituída no contexto histórico e econômico-cultural dado como realidade contemporânea, aquela pode ser observada desde a formação social, psicológica e jurídica do mundo ocidental. 3 Professor nos cursos de Direito, Serviço Social e Jornalismo no Instituto de Ensino Superior Raimundo Sá (IESRSA) e Coordenador da Diversidade e Inclusão na Secretaria Municipal de Educação de Picos/Piauí (PMP). Graduado em História (FUNESO), Especialista em História das Artes e Religião (UFRPE), História do Brasil com ênfase na história do Piauí (UFPI), Mestre e Doutorando pelo Programa de Pós-Graduação em Serviço Social (UFPE). E-mail: pmafrajr@hotmail.com; fone +55(89)99390500.
  • 3. nunca mais olhares, tensões de cismas, crises e outros tempos; está vetado qualquer movimento. Torquato Neto 4 Esta comunicação procura problematizar o silêncio e o segredo acerca das séries de assassinatos de homossexuais que vem ocorrendo no interior do Piauí. Corpos asfixiados e/ou despedaçados são comumente encontrados em terrenos baldios, beiras de rios, caminhos ermos, entre destroços ou trancados em apartamentos. Estes fenômenos, longe de ser vinculados à homossexualidade ou a indefinida prostituição masculina não são registrados como expressões da homofobia, não aparecem enquanto tais nas mídias locais ou nos dados das pesquisas levantadas pelo movimento LGBT. Sobretudo emergem ruidosamente nos fuxicos das comadres, nas gírias dos tímidos guetos ou furtivamente disfarçadas nas expressões e gestos daqueles que coletivamente guarda o segredo de tais mortes em silêncio. O ponto de partida que me incitou o início de uma pesquisa de mestrado acerca das situações de violência contra gays no interior do Piauí foi o fato do mesmo ser anunciado pelas pesquisas do GGB5 como um dos estados brasileiros de menor índice de violência letal contra gays, lésbicas e travestis, fato que me chamou atenção porque, segundo minhas observações, nas pequenas cidades piauienses quase não havia registros de tais violências, apesar dos assassinatos de homossexuais ocorrerem escandalosamente de forma brutal e desumana. Uma das reais faces dessa realidade cotidiana mostrou-se protegida pelos silêncios construídos coletivamente frente às clandestinas relações e práticas homossexuais, sufocadas pelos subterfúgios das violências simbólicas, mortalmente demarcadas pelo puritanismo acerca dos acordos de prostituição entre homens e fortemente dilaceradas sob o segredo dos mecanismos e dispositivos da hetero e homonormatividade (SOUZA JUNIOR, 2011). No contexto das violências, Prado (2008, p. 89) afirma que a história da cultura e posicionamento políticos dos homossexuais aparece de forma 4 Torquato Neto é um dos poetas mais famoso do Piauí, sendo referência intelectual do movimento tropicalista. Problematizou os conceitos através das imagens e cinema. Asfixiou-se aos 28 anos dentro do seu apartamento, deixou um acervo intelectual que estilhaça os sentidos das palavras (BRANCO, 2005). Ver em: http://www.letraselivros.com.br/index.php?option=com_content&task=view&id=619&Itemid=65 5 http://www.ggb.org.br/Assassinatos%20de%20homossexuais%20no%20Brasil%20relatorio%20geral %20completo.html
  • 4. bastante imprecisas, devido sua aparição ocorrer em inúmeras configurações sociais e em diversos contextos histórico-culturais – estando em todas as sociedades, assumindo posições sociais de formas distintas, estando em todas as hierarquias econômico-sociais, em várias ocupações políticas, religiosas, profissionais e envolvidas em distintas tramas da história sociais – sendo, portanto, muito difícil de traçar uma história de resistência dos homossexuais frente às situações de violência. Sobretudo porque “o lugar de subalternidade dos homossexuais foi construído a partir de um silenciamento, muitas vezes violento, das vozes contrárias [...] o que contribuiu para sua invisibilidade”. Portanto é diante da demanda política de desfazer a invisibilidade dos corpos estilhaçados sob os mecanismos dos discursos, performances e agenciamentos dos corpos que este trabalho se propõe trazer à tona as vozes contrárias que exibem as forças da hetero e homonormatividade que ajustam e reajustam corpos que indefinidamente assume a crise da identidade ora travesti, ora gay ou ora bissexual e acabam por serem asfixiados e dilacerados pela camisa de força posta pela sociedade normativamente e monarquia do sexo (SOUZA JUNIOR, 2011). Do arquivo-morto: A homofobia no interior do Piauí A homofobia no interior do Estado do Piauí, tal como objeto de investigação, surge como uma das expressões da realidade brasileira que nunca esteve guardada, como se fosse um objeto esperando para ser descoberto. No entanto, tem esse efeito porque é aqui tratada como um arquivo-morto por ter sido encerrada sob o selo do segredo e protegida através da barreira do silêncio coletivo. Assim, o fenômeno do desprezo à homossexualidade e suplício dado aos corpos dos homossexuais são reproduzidos sob a concepção de tempo passado que, quando acessado na sob a égide da atualidade, abre-se para o aparecimento de outras compreensões acerca de um mundo real, levando-nos ao estranhamento das nossas noções de verdade frente às relações hetero(homo)normativas na contemporaneidade.
  • 5. A ideia de arquivo protegido no interior do Piauí, território concebido como o lugar do “Berço do Homem Americano” pela comunidade internacional de arqueólogos no Piauí liderada pela Drª Niede Guidon6 , foi construída a partir da problemática dos dados enunciados das pesquisas realizadas anualmente pelo Grupo Gay da Bahia, através do site GGB. Os resultados sinalizam que o Piauí, entre os anos de 2004 à 2010,é um dos estados brasileiros de menor índice de violência letal contra LGBT, fato contraditório diante do alarmante silenciamento e segredo no entorno dos vários assassinatos de sujeitos envolvidos, majoritariamente, com a prostituição masculina, especialmente na região do Vale do Rio Guaribas7 e que, comumente, quase nunca aparecem nas estatísticas das pesquisas realizadas a partir dos dados jornalísticos, sobretudo por ser um fenômeno que, ao modo piauiense, as notícias aparecem sem detalhes quando a temática é de conotações (homo)sexuais e, muitas das vezes as informações que estão na ‘boca do povo’ são suprimida pelas imprensas locais e sufocadas sob a norma da sociedade abrangente, tal como pressuposto de evitar o desconforto da família e a ‘boa’ memória do/a morto/a. Partindo do pressuposto de que hoje em dia o pensamento só é possível acerca do vazio e silêncio do homem assassinado (ROUANET 1996), o cenário da homofobia reprodutora dos homicídios, no interior do Piauí, é reconhecido pelas expressões, majoritárias, de enforcamentos, asfixias e esfacelamentos de caixas cranianas. Apesar das causas mortis, locais e armas dos crimes entre outros elementos que constituem a infâmia de tais fenômenos, a homofobia ao modo piauiense traz à tona a imagem trágica de corpos silenciados, faces desconfiguradas, bocas destruídas e promove o estranho desenho das forças normalizadoras dos dispositivos da hetero(homo)sexualidades. Sobretudo, para o além do maldito retrato da violência corporal e simbólica, o fenômeno traduz as técnicas de ajustamento dos sujeitos sexuados, técnicas e práticas de hierarquização das subcategorias sexuais, assim como os mecanismos de poder e controle sobre os corpos. E é sob os corpos asfixiados e decapitados pela homofobia no interior do Piauí que encontramos os mais modernos e sutis mecanismos do puritanismo 6 Ver http://www.egal2013.pe/wp-content/uploads/2013/07/Tra_Antonio-Jos%C3%A9-Castelo.pdf 7 http://www.territoriosdacidadania.gov.br/dotlrn/clubs/territriosrurais/valedoguaribaspi/one-community? page_num=0
  • 6. brasileiro, tais como produtos resultantes da formação social e político-cultural de um dos estados mais católicos do território americano. Noutro sentido, esse mesmo estado revela uma das mais emblemáticas descontinuidades do processo histórico de tolerância religiosa e sexual no Brasil. Se a conhecida cidade de Oeiras, hoje orgulhosamente apelidada como “Capital da Fé” agrega anualmente o maior número de suicídio8 por enforcamento do estado, estando à cima da média nacional de suicídios, essa mesma cidade agregou, ainda enquanto capital do Piauí, um dos primeiros sabá satânicos do Brasil Colônia, que segundo Mott (2007) revela a mais antiga referência explícita a tolerância às práticas homossexuais no ano de 1758: Duas jovens escravas, Josefa Linda, mulata da Vila do Mocha e Custódia de Abreu, índia gueguê da Gurgueía, confessaram a um emissário da Inquisição em visita pastoral pela Freguesia de Nossa Senhora do Livramento de Paranaguá que, sob o pretexto de realizar o famoso “sabá de feiticeiras e diabos”, praticaram, diversas vezes “atos de soneto (como) de um homem com uma mulher nas partes pudendas, na traseira e na boca”9 Mott (2007) salienta que neste tempo elas pediram perdão e nada lhes aconteceu. Do mesmo modo como vários outros casos em que indivíduos escreviam e contavam histórias homoeróticas que se esvaiam pelos sertões, descritas por antigos cronistas que relatavam o ano de 1697, com 129 fazendas de gado onde viviam 398 homens e apenas 40 mulheres. Ele relata que 40% das fazendas não havia uma mulher e a improvável castidade cristã, certamente não impedia a masturbação, a zoofilia e o homoerotismo dentro e fora das choupanas nas quais, comumente, se vivia apenas um vaqueiro branco, acompanhado de um ou dois escravos negros. Este cenário parece fértil para o recrudescimento do segredo mediante a força heteronormativa do moralismo cristão que veio se fortalecendo nos tempos modernos. 8 Os dados revelam que 70% dos casos de suicídios são realizados pelo sexo masculino; 91% por católicos; 76% através do método de enforcamento. Ultima consulta em 08/2013, disponível em http://oeiras.pi.gov.br/noticias.php?id=132&exibe=comentarios 9 Mott (2007) faz referência ao trabalho: Um congresso de diabos e feiticeiras no Piauí Colonial. In. BELLINI, Lígia; SALES SOUZA, Evergton; REIS SAMPAIO, Gabriela (Orgs.). Formas de crer: Ensaios de história religiosa do mundo luso-afro-brasileiro, século XIV-XXI. Salvador: Corrupio-Edufba, 2006, p.129- 160
  • 7. Mott (2007) aponta a História da homossexualidade no Piauí como ‘uma página em branco’, pois a prática do segredo que se tornou robusta e alimentou o silenciamento da história da homocultura no Piauí, tornou-se um tema tabu na contemporaneidade. Assim como foram abafadas as vidas e obras dos poetas Mário Faustino – autor dos mais belos poemas homoeróticos, segundo João Silvério Trevisan – e Torquato Neto10 , mentor intelectual do movimento tropicalista, descrito como poeta errante, marginal e experimentador da contracultura, que deixando composições como “Mamãe, coragem”, “Geléia Geral”, entre outras dos LPs “Panis et Circense” e “Tropicália”, fatalmente asfixiado aos 28 anos. Dos Corpos asfixiados e dilacerados sob as forças das hetero(homo)normatividades: Discussões teórico-metodógicas11 Não se deve fazer divisão binária entre o que se diz e o que não se diz; é preciso tentar determinar as diferentes maneiras de não dizer, como são distribuídos os que podem e os que não podem falar, que tipo de discurso é autorizado ou que forma de discrição é exigida a uns e a outros. Não existe um só, mas muitos silêncios e são parte integrante das estratégias que apóiam e atravessam os discursos (FOUCAULT, 1998 p.30). O impulso qualitativo deste estudo foi posto pelos expressivos crimes de ódio que simultaneamente desfiguraram corpos em várias cidades do interior do Paiuí nos nove últimos anos (do ano 2004 ao 2013), fenômeno velado pela problemática do silêncio acerca da homossexualidade reprimida num estado assustadoramente católico e determinados pelos valores da família tradicional cristã. Esta realidade demarcou o desenhou e procedimentos metodológicos que acabou por sofrer a influência do raciocínio construcionista dos estudos gays e que acabou sendo extremamente instabilizado pela negação do 10 Mott faz referência ao artigo: Torquato Neto era gay? , In ISTOÉ, São Paulo, 11 de maio de 2005. 11 Inicialmente será tratada, na etapa desse trabalho, a construção teórico-metodológica desenvolvida durante a pesquisa de mestrado intitulada de “O silêncio e o segredo do cabeça de cuia: Um estudo sobre a situação de violência vivida pelos gays no Vale do Rio Guaribas” e que contribuiu para problematizar a temática do presente trabalho.
  • 8. discurso legítimo e normativo oriundo do pós-estruturalismo constituída pela teoria queer. Entretanto, foi a demanda da desconstrução do discurso hegemônico que pôs luminosidade sobre o silêncio da homossexualidade que, enquanto tal, agrega a heteronormatividade da rede institucional da sociedade contemporânea, realidade que exigiu deste discussão uma constante incertezas e negação frente à invenção das identidades sexuais enquanto categorias essencialistas e naturais. Segundo Gamson (2006, p.345-6), a história da pesquisa no campo da sexualidade possui semelhanças com a história dos estudos sobre as mulheres e estudos étnicos, por se apresentarem como pesquisas que são entrelaçadas com a política dos movimentos sociais, matizadas com a cautela quanto à forma pelas quais a “ciência” tem sido empregada contra os marginalizados e aparecendo confortáveis com as estratégias da pesquisa qualitativa. Nesse sentido, os sujeitos da pesquisa aparecem delimitados como reprodutores dos significados políticos e culturais: dando mais espaço às vozes e às experiências que foram suprimidas no contexto sociocultural; evidenciando a problemática da maioridade dos sujeitos na pesquisa de campo e visibilidade das representações sociossexuais; e, apreendendo a voz dos novos sujeitos nos seus posicionamentos-identitários (RIOS, 2004). Tais procedimentos teórico-metodológicos se tornam óbvios pelas marcas da difícil tarefa de reconhecer o sujeito gay ou hetero como sujeitos unificados por um eu autônomo. Esta situação, que passou a ser problematizada junto ao desenvolvimento da teoria queer, influenciou vários trabalhos entorno da temática da sexualidade que, adotando os insights construcionistas, acrescentaram críticas pós-estruturalistas aos discursos científicos. Percebi, através desta teoria, que os pesquisadores se distanciaram do uso pleno da linguagem positivista e da noção do sexo como realidade reguladora de uma estrutura biológica ou essencial do desejo sexual constituído por um gênero, uma raça, uma nação ou uma classe. As histórias contadas trazem à tona o abandono e a decadência das velhas narrativas que tinham como objeto de estudos os sujeitos como estruturas estáveis. Por outro
  • 9. lado, propuseram luminosidades sobre os questionamentos pós-modernos da objetividade e sobre a adoção de um ponto descentralizado dos posicionamentos-identitários, sempre mutáveis, que enquadra a diferença, o movimento e a instabilidade dos sujeitos contemporâneos (cf. HALL, 2006; LYOTARD, 2004; GAMSON 2006 p. 346), aqui observados, frente aos desejos sociossexuais. Demarcando as tendências concorrentes com o discurso hegemônico, a fim de instabilizar o mesmo, o intuito inicial é de romper com o binarismo homo/hetero e processos de categorização sexual; trazer visibilidade para constituição histórica e cultural dos dispositivos das sexualidades, tais como práticas “estilísticas da existência” e políticas sociossexuais do indivíduo e corpo coletivo. É neste sentido que o sujeito da pesquisa sempre aparece, ancorado no pós-estruturalismo, como provisório, circunstancial e cindido, através do qual o procedimento metodológico articule e apreenda o sexo como sistema de utilidade e regulação da vida social presente nos discursos, instituições, enunciados científicos, formas arquitetônicas, proposições morais e filosóficas. Assim, a heterossexualidade só existe por meio da enunciação da homossexualidade que, aparecendo como o “Outro” inferior, negativo, abjeto, sem o qual o hegemônico não se constitui e nem tem como descrever a si próprio (MISKOLCI, 2009 p. 2-3). No agenciamento dos corpos (des)contruídos pelos discursos hegemônicos no Estado do Piauí, percebe-se que os casos de assassinatos de homossexuais, articulados e denunciados a partir dos interesses políticos e ideológicos da imprensa e grupos de homossexuais organizados, parecem produzir visibilidades sobre o discurso conservador das instituições governamentais e não-governamentais. Pois a visibilidade dos casos de assassinatos de homossexuais se dão no contexto histórico-econômico fomentado na imprensa local através de relações coloniais e tradicionalistas frente aos valores morais conservadores do status-quo de uma elite burguesa em detrimento dos emergentes sujeitos praticantes da homossexualidade e movimentos sociais de homossexuais organizados. (SOUZA JUNIOR, 2011)
  • 10. Noutro sentido, os dispositivos da heterossexualidade incitam no movimento de homossexuais organizados o ativismo político-social das denúncias, reconhecidas como tal pelos próprios militantes e organização coletiva dos mesmos. No entanto, parece óbvio que o não reconhecimento político do movimento LGBT na esfera política das relações de sociabilidade frente ao conservadorismo das instituições governamentais e da sociedade civil confirma que a denúncia dos assassinatos de homossexuais expressa o posicionamento conservador da imprensa brasileira e latino-americana, diferentemente da imprensa norte-americana (GREEN, 2000). Se as denúncias de assassinatos na capital do Piauí são estimuladas a tomarem visibilidade, segundo os dispositivos que fazem falar o ativismo homossexual, percebe-se que as informações arquivadas no GGB foram, majoritariamente, viabilizadas pelos grupos organizados da capital Teresina, tal como efeito dos mesmos dispositivos. Sobretudo, no interior do estado a demanda do fenômeno da violência contra gays revela-se como mecanismo que faz calar e intimidam as denúncias dos movimentos e ativismos dos posicionamentos político-social dos homossexuais12 . Segundo o estudo de Mott (2007, p.28), a capital do Piauí concentra 91% dos homicídios denunciados, aparecendo denúncias no interior apenas através da mídia eletrônica e informações radiofônicas, apreendidas pelos grupos de ativistas da capital. A denúncia de um dos casos de assassinatos de homossexuais na cidade Picos, no Vale do Rio Guaribas, arquivada pelo GGB, foi viabilizada pelo grupo Matizes, ONG sediada na capital. ANTONIO RODRIGUES DO NASCIMENTO, travesti Toinha, foi encontrada morta com a cabeça esmagada com uma pedra, no dia 21-1-2007, domingo de madrugada, no bairro Conduru, Picos-PI; São acusados do crime, E.F.C de 17, já detido, e o outro menor cuja inicial do primeiro nome é L. de 16 anos, residente na região do bairro do Junco. Consta que estes jovens decidiram fazer um “programa” com a travesti, com o objetivo de arrecadar dinheiro necessário para o pagamento da bebida consumida no Bar da Railha, nas proximidades 12 Foi observado durante noves anos (2004-2013) no Vale do Rio Guaribas e Vale do Canidé que muitos dos casos de assassinatos de homossexuais não foram vinculados como tais na imprensa local. Mesmo que muitos sabem quem foram os assassinos, a polícia e a sociedade civil não enquadram tais sujeitos como homofóbicos, alguns foram detidos e logo depois liberados e outros nunca foram presos como autores de tais crimes, dados como foragidos.
  • 11. de onde foi encontrado o corpo. Segundo o delegado Xavier, ao chegarem ao bairro Conduru, os dois menores desistiram da proposta inicial e cometeram o homicídio, dando pelo menos três golpes “com o corpo rígido de concreto”, o que esfacelou a cabeça da travesti. “Estamos averiguando se haveria possibilidade de apenas um dos rapazes ter levantado a pedra, devido o seu tamanho”, comentou. Os dois menores possuem constantes passagens pela polícia picoense por crime de pequeno porte. O crime chocou a cidade pela violência empregada. Este é, agora, o nono homicídio em Picos em menos de dois meses, fato que tem chamado à atenção das autoridades policiais locais e de Teresina (FONTE: RIACHAONET; JORNAL 95, FM CIDADE MODELO, GRUPO MATIZES. MOTT, 2007 p.35). Parece que o “complô do silêncio” e a “lei do segredo‟ faz emergir incertezas acerca das evidências de quem e porque levantou a pedra para esfacelar a cabeça de “Toinha”, assim como emerge a incerteza sobre a constituição do crescente número de casos da violência letal contra homossexuais no interior dos estados brasileiros – 165 mortes no interior frente a 95 mortes nas capitais, no ano de 2010. Este fenômeno é descrito como resultante do robustecimento da homofobia ou aumento da eficiência de identificação dos assassinatos e realização de denúncias efetivadas pelo movimento LGBT no interior dos estados. Como se verifica no estado do Piauí, segundo tabelas completas divulgadas no site do GGB, o número de denúncias de violência letal aumentou de 2 para 8 casos de assassinatos de homossexuais, do ano de 2009 para o ano de 2010. Mott (2007, p.22,28) problematiza as denúncias da violência contra homossexuais no interior do Piauí a partir do questionamento de como é possível fazer aparecer os números dos homossexuais assassinados, “se somos nós que sabemos a incompletude dessas estimativas”. Assim, foi a partir de pesquisas in lócus, que assumi a demanda durante o desenvolvimento da pesquisa de mestrado em serviço social de relatar a história de vida de alguns sobreviventes da violência letal em algumas cidades do Vale do Rio Guaribas, momento que trouxe à tona uma série de fragmentos de histórias de vida de sujeitos estigmatizados que nunca havia aparecido nas mídias ou jornais das redes sociais locais e, no entanto, tiveram a infeliz visibilidade apenas após as suas mortes, através das notícias policiais e ainda
  • 12. onde o eixo central da problemática de sua morte foi suprimido, silenciada devido aos ditames morais do moderno puritanismo burguês e dos bons costumes do fundamentalismo cristãos da sociedade abrangente. Segue adiante uma breve mostra de diálogos, valendo-me como instrumentos dos dados coletados as entrevistas semi-estruturadas com os pesquisados13 , seguida de diálogos com a literatura consultada e das observações de campo realizadas acerca dos assassinatos de homossexuais no Vale do Rio Guaribas-PI. Sinalizo que tais diálogos, inevitavelmente consciente e/ou inconsciente, são imbricados por percepções apreendidas na convivência e atravessadas pela subjetividade do autor junto aos discursos e silêncios produzidos pelas posições-identitárias dos sujeitos ora postos enquanto heterossexuais/homossexuais em interações com os mecanismos, práticas políticas, sociais e culturais da sociedade hegemônica da localidade. Destaco ainda, que os diálogos são “por exemplos” de leituras e interpretações de uma das formas que o real pode tomar. Diálogos com os sobreviventes: Dos ajustamentos dos gestos, performances e controle dos corpos frente as forças da hetero(homo)normatividade As temáticas trabalhadas nesta etapa do trabalho serão apresentadas através de trechos de entrevistas, fragmentadas para facilitar a ilustração dos agenciamentos dos corpos e forças discursivas demandadas pela norma dos dispositivos das sexualidades. Os trechos dos depoimentos emergiram acerca do diálogo sobre a temática da homofobia, tal como uma atitude hostil, aversão, frente a tudo que está relativo à homossexualidade e/ou homossexual, constituída como um constructo coletivo e individual, podendo aparecer de forma externizada ou internalizada, se reproduzindo nas instituições e micro-relações interpessoais, sociais, culturais, políticas e 13 No número de doze pessoas, os sujeitos pesquisados foram delimitados a partir dos seguintes critérios: Ter mais de dezoito anos, assumir o posicionamento-identitário dos homossexuais no momento das entrevistas e ser indicado por outro sujeito pesquisado pelo autor da pesquisa. O primeiro participante da pesquisa foi uma indicação do movimento LGBT de Picos-PI, segundo a presidente do GGLOS (Grupo Guaribas de Livre Orientação Sexual). Foi utilizado o método de “bola de neve” para composição dos sujeitos participantes e a técnica de saturação para delimitação dos mesmos e respostas das entrevistas.
  • 13. acadêmicas. A homofobia internalizada que provoca o sofrimento interior também leva o indivíduo a assumir uma inferiorização nas relações socias e políticas, além de viabilizar o caso da violência contra o próprio corpo até a efetivação do suicídio (BORRILLO, 2000; CARRARA & RAMOS 2006). A homofobia aparece através través do preconceito, discriminação, atos, gestos e palavras baseado no ódio ou não saber acerca do conhecimento invisibilizado pelo discurso heteronormativo (MOTT 1997, 2007; PRADO, 2008; MACHADO & PRADO 2011). É constituída por uma noção binária da realidade homo/hetero, normal/anormal, saudável/doentio, forte/frágil, mantido pela lógica hegemônica de hierarquias sociossexuais e econômicas construída sobre a ideia de “minorias sociais” e “maioria social” (GREEN 2000; MARSIAJ 2003; GAMSON 2006; MISKOLCI 2009). Os nomes dos sujeitos pesquisados são substituídos por nomes de tribos indígenas que deixaram traços culturais nas populações locais do interior do Piauí. A estratégia metodológica é uma provocação de novas reflexões sobre o neocolonialismo a partir das identidades de gênero e normatividades das orientações sexuais. Partindo da noção de controle dos gestos, os espaços escolares e domésticos aparecem, majoritariamente, como os ambientes determinantes nos disciplinamentos dos corpos, como podemos identificar através das falas de: Tabajara: “Assim no colégio quando eu era mais novo um pouco, eu sempre fui espontâneo, aí ficavam tirando brincadeira, gayzinho tal... pra pessoa que não é decidida ainda, machuca muito e eu ficava isolado dos outros no colégio. Aconteceu já faz algum tempo que eu presenciei uma discussão... uma do mundo gay e outra hetero, a pessoa tava com muita agressão verbal... Já em muitas delas, com muitas pessoas que começaram com provocação baixa... na medida que eu tentava me defender ele ia aumentando... estava todo mundo na quadra eu e meus colegas, e veio esse garoto e começou a provocar... ele começava a me chamar de gay, de várias coisas, pejorativas... exatamente, como a quadra era pública, ele não aceitava os gays jogarem bola lá, praticar algum esporte... ele usava
  • 14. caráter pejorativo para nos agredir... na casa do meu pai não posso nem dizer que sou, aí é onde eles partem para agressão” Pimenteiras: “eu acho que foi no colégio, quando eu fazia terceiro ano... que eu era meio que discriminado... assim.. por meninos... os homens... não eram muito próximo, sei lá... tiravam muita piadinha... não dava espaço pra se aproximar... e eu sou do tipo de pessoa que se eu notar qualquer coisinha já não me aproximo... aí eu acho que até já peguei um trauma disso.. eu num tenho amizade com hetero por causa disso, eu tenho medo de tá incomodando... aí eu nem me aproximo, eu acho isso... no terceiro ano principalmente, eu tinha 16ª[...] Eu acho assim, passivamente... um gay afeminado que saí na rua fazendo escândalo, eu acho que facilita um hetero tirar uma piada... e o ativo é o que tem preconceito... o lugar era na escola, não porque eu me expressasse lá, mas porque quando eu me expressava na rua, aí as pessoas comentavam na escola.. e é porque eu nem falo na sala com eles direito... aí eles me viam na rua, aí ficavam comentando, aí ficavam zuando...” Tremembés: “a primeira experiência é você ta ali numa sala de aula e as pessoas saberem que você é gay e você sempre ser motivo de piadinhas... muitas das vezes agressivamente dos meninos por não aceitarem como eles dizem... um viado dentro da sala de aula... então, tudo que você faz, tudo que você diz vai ser alvo de criticas e ninguém aceita... porque não querem ser liderados por um viado na sala de aula... a primeira experiência foi na escola, por não ser aceito muitas vezes... mas também por ser admirado, porque dizem que gays tem notas altas, gays são bastantes inteligentes...” Acroá: “Na escola, com os outros alunos... eu sempre usava rosa e roxo pra ir ao colégio, e um aluno me pegou e jogou minha mochila roxa dentro do vaso e mandou eu pegar e me bateu dentro do banheiro... eu chorei muito... procurei autoridade da escola, mais eles nunca fizeram nada... já com um professor de física... ele é homofóbico... ele disse pra mim que gay não tinha vez... se eu não ficasse calado eu não ia fazer prova durante dois meses...” A homofobia que se vê nos espaços públicos parecem como construções ou continuidades das instituições escolares. Constrangimento parece ser uma consequência da expressividade não contida. Segundo Costa (1992), as escolas internas, os exércitos e as tabernas refletem a
  • 15. homossexualidade reprimida da infância do adulto de heterossexualidade compulsória, a realização deste estaria em submeter a sexualidade infantil à lei do desejo heteronormativo, à qual, enquanto crianças foram submetidas. Tal situação homofóbica parece alimentar hetero(homo)normatividade submetida aos corpos a partir de gestos específicos que sinalizam dispositivos que expõe os sujeitos à situações perigosamente violentas. As expressões da homofobia silenciosa surgem como algo muito peculiar se confrontada com a bibliografia, é comum as histórias no interiro do Piauí onde travestis deixaram de se travestir para serem aceitas na comunidade e ter emprego na região, assim como gays deixarem de levar a vida de gays para se casarem com o sexo oposto e adotaram o modelo de vida heterossexual, tal como uma alternativa de sobrevivência e fuga das situações da violência física e simbólica. No decorrer da pesquisa de campo, dois gays que foram indicados para a pesquisa de campo, se casaram segundo a modelo heterossexual e um deles se converteu às doutrinas da igreja evangélica. A discriminação dada por funcionários em supermercados, atendentes de lojas, garçons ou clientes/consumidores se incomodarem com a presença de gays ou travestis no ambiente, parece surgir como freio para a lógica do consumo e expansão do mercado “GLS‟14 . Sobretudo, na fala de Tremembés é sinalizado o enunciado de que “gays tem notas altas, gays são bastante inteligentes”, expressão emblemática da homonormatividade que desconcerta o discurso hegemônico do modelo heteronormativo. Marsiaj (2003) sinaliza para a acentuação da discriminação e da violência baseadas nas diferenças socioeconômicas entre famílias de classes populares e médias, nas relações sociais e na dinâmica político-cultural dos espaços públicos. Os trechos das entrevistas corroboram para caracterização da homofobia ocorrida nas relações micro-sociais, como apontadas nos estudos de Carrara & Viana (2006), segundo os registros do DDH no Rio de Janeiro. Aqui chamamos atenção para a sutileza dos casos de violência dados em ambiente domésticos, tais como ameaças, agressões, discriminações que 14 GLS: Gays, Lésbicas e Simpatizantes - termo que surgiu dentro da dinâmica do discurso mercadológico da sexualidade, existente muito antes do termo GLT, GLBT (adotado pelo movimento social). Facchini 2002 apud Machado & Prado. IN: http://lodel.demo.inist.fr/cahierspsychologiepolitique/index.php? id=300#tocto2n2
  • 16. acontecem em maior grau do que a violência letal e que no entanto recobre de silêncio os assassinatos. Os casos vistos nas entrevistas com gays do Vale do Rio Guaribas as situações de violência contra gays parecem concorrer com as entrevistas em ambiente público e privado. Segundo as observações realizadas na região, há uma presença marcante das normas familiares e ordem higienista ainda remanescentes do século XIX, conservadas pela ordem cristã e vista comumente nos ambientes citadinos, cunhados sob o perfil da família sagrada e mortificação do corpo na cruz – desde as residências familiares às escolas, comércios, prefeituras, câmera dos vereadores, enfim, nos espaços públicos e privados – apresentam a heteronormatividade cristã como princípio a-histórico, natural e verdade universal. Na praça central da cidade de Picos, o presépio da família cristã tem uma exposição permanente, em todos os prédios da prefeitura e comércio o corpo crucificado é exposto nas portas e paredes centrais. Este fenômeno parece provocar uma variedade de gestos e discursos que trazem uma visibilidade silenciosa do assassinatos de homossexuais no cotidiano, assim como provoca o surgimento de mecanismos singulares de enfrentamento e denúncias da violência. Acerca das estratégias do corpo-segredo, aqui entendido como o corpo que busca velar uma sexualidade estigmatizada, aparece nos gestos e performances como técnicas de “normalizar‟ o discurso, invisibilizar os trejeitos “femininos‟ ou evitar aparecer: Cariri: “Não procuro mexer... Aí a gente passa normal... Como se nada tivesse acontecido...” Acaraós: “Tenho uma postura reservada, por causa que não sou muito de andar chamando atenção, se vestir de mulher e tal... e me comporto normal, me vestindo como homem.” Amanajós: “Não é pra todos os gays não... mas eu acho que o que dificulta é pra aqueles que são afeminados e fazem questão de dizer -ah sou gay! - eu acho que aqueles discretos não têm lá esses problemas não... eu acho... as pessoas não olham pra o interior das pessoas... aqueles que usam roupas de mulher... eu acho que é mais difícil... Eu tento fazer alguma coisa pra não dá na cara que eu sou... sei lá... fazendo tudo que dá na telha... assim com a mão... gesticulando... com a voz afeminada... por exemplo quando você se
  • 17. sente em casa... aí eu acho que se você fazer isso em todo o lugar dá na cara... aí fica mais arriscado, comentários... essas coisas.... se for pra sair eu saio... mas o bom pra sair é quatro ou cinco pessoas [...] Sair com muitas pessoas gera mais comentários [...]Esses lugares que sempre tem gente toda hora, num comércio, num lugar onde tem muitas pessoas que gostam de brincar e soltar piadinha, lugar muito freqüentado, no trabalho... cem por cento não, mais ou menos... não pode não... Às vezes eu to andando em algum lugar... aí, eu cruzo as pernas... quando eu lembro, eu tiro! Tem vez que eu sento e boto a mão na cintura, quando eu lembro eu solto...” Acroá: “Eu evito passar onde tem muita gente... muito rapaz e muita moça, porque sempre joga piadinha na gente, passo pela outra calçada, às vezes não passo... eu saio do lugar onde tem gente... assim preconceituosa e às vezes finjo que não escuto [...] Tem gays afeminados que não trabalham pelo falto de ser afeminado de se vestir igual a uma mulher... eu deixei de ser afeminado porque emprego é difícil.” Tabajara: “Eu não procuro me aproximar das pessoas que já vejo assim de cara que não são as certas pra conversar e tudo, porque sempre vem com algum tipo de agressão, eu fico na minha ou procuro as pessoas do mesmo tipo que eu... um fato que eu observo é a conversa dele com as outras pessoas, ou então, olho pro jeito dele, a cara, a aparência da pessoa, muitas coisas indicam o modo que a pessoa é... se tem cara fechada e o tipo de conversa, se tira brincadeiras sem graça, ali nem encoste... senão ele começa assim e vai para umas mais pesadas.” As falas denunciam a demanda da formação de guetos, da segregação dos grupos e invisibilidades da diversidade dos sujeitos. Inúmeros sujeitos pesquisados e observados apresentaram o conflito em desfazer as normas naturalizadas dos gênero, tal como um conflito de pertencimento ao gênero masculino ou feminino, tal como lógica heteronormativa. Enquanto sob a lógica homonormativa, muitas das vozes contrárias revelam os limites de assumir-se enquanto travestis, sendo forçado a mostram-se como gays ou, caso contrário, assume-se obrigados a viverem sob o modelo do ‘homem heteronormativo’. Os trechos acima, inevitavelmente, evocam as reflexões acerca da política dos gestos e o rompimento do silêncio pela barulhenta desqualificação
  • 18. daqueles que assumem sua preferência pelo papel inferior. Tal como os gregos na idade clássica encontravam naqueles sujeitos não viris a razão de problematizar a virilidade e a juventude dos homens (FOUCAULT, 1984). No entanto, a idade contemporânea parece exigir dos indivíduos o exercício e técnica de si que punciona identidades sócio-sexuais provisórias, furtivas o que, ao mesmo tempo, parece estimular a busca por uma identidade político- sexual permanente ou favorecer o surgimento de subculturas e fortalecimento de guetos. O posicionamento de Cariri em “[...] passa normal... como se nada tivesse acontecido” sinaliza para o domínio de si no evitar ou enfrentar as situações de violência contra gays que também sugere a constituição de situação onde ele não precise exercer uma “tal normalidade‟. No exemplo de Tabajara em “procuro pessoas do meu tipo que eu” indica a formação de guetos e subculturas como forma de evitar e enfrentar as situações de riscos. A maioria dos depoimentos aparece como estratégias silenciosas de suprimir o confronto dos discursos hegemônicos, ou de visibilidade dos mesmos. Assim como denotam a separação de corpos e categorização dos gestos dado pela lógica binária homo/hetero; normal/anormal. Outro detalhe é que a postura e os gestos afeminados aparecem como sinônimo de produção e rompimento do silêncio heteronormativo, o que caracteriza a violência contra gay imbricada pela questão binária da violência de gênero feminino/masculino; mulher/homem. A idéia de „ex-gays‟ e „ex-travestis‟ parece indicar uma dupla violência dada por uma homofobia externa e outra interna, ou simplesmente como estratégia de sobrevivência ou aprimoramento de técnica de si e silenciamento do corpo político-sexual no âmbito social, o que proporciona a visibilidade do discurso hegemônico da hetero(homo)normatividade, é nesse contexto que muitos homossexuais piauienses que se ‘convertem na lei dos crentes’ (fundamentalismo cristão), comumente revelam o sofrimento da homofobia sofrida dentro e fora de si. Nesse sentido, percebe-se o agenciamento do corpo-silêncio, tal como performances que fragmentam o corpo e dilacera os sentidos a partir da ideia de ‘virar a face’, ‘tapar os ouvidos’, ‘fechar os olhos’, ‘calar a boca’ ou ‘suicidar- se’:
  • 19. Acaraós: “Aquele que tá espancando as pessoas homossexuais, espancamento, é o de menos, mas não precisa, é só evitar bater boca e sair do lugar.” Jaicós: “... aí eu finjo que não tô nem escutando, faço só passar direto, eu tapo os ouvidos, faço de contas que não to nem vendo...” Mandaú: “A minha estratégia é uma só, se eu vou para uma rua que tenha alguma relação de mau... Eu mudo para outra rua... Sempre eu mudo meu caminho...eu evito festa de meio de rua...na verbal eu deixo passar...violência verbal é em qualquer lugar em qualquer tempo... não falo nada e prossigo meu caminho [...] Muitos até se matam porque não conhece o homossexualismo...já ouvi falar de uma pessoa que se matou...por não entender direito...” Timbira: “devido eu ter passado por essas coisas e tudo, hoje eu sou mais caseiro [...] Hoje eu sou mais na minha, devido às informações, devido o trabalho, é totalmente diferente...” Pimenteiras: “Eu dou uma de louca, como diz um amigo meu... eu finjo que nem to vendo... é como se fosse normal... hoje em dia tudo é normal [...] eu me saio, sei lá... finjo que não to escutando...” A asfixia dos sentidos dado pela situação de violência contra gays parece disciplinar os corpos em favor da discrição e negação do mundo aparente. Timbira indica que as formas de enfrentamento são demandadas pelas informações e trabalho, se resguardando numa postura mais caseira, o que certamente parece limitar o exercício de sua vida sócio-sexual, pelo fato das restrições de firmar uma parceria sexual no âmbito doméstico. A loucura de Pimenteiras aponta para um posicionamento queer trabalhada por Gamson (1996), pois quando tudo parece viabilizar uma normalização, ele prefere parecer como louca. Sobretudo, o suicídio descrito por Mandaú parece ser das formas de enfrentamento mais complexo, estudado por Borrillo (2001) como uma violência provocada pela homofobia internalizada. Já na perspectiva foucaultiana, esse enfrentamento, apesar de apontar para a anulação de uma situação de violência, é expressão do poder sobre o próprio corpo, porém o poder sobre si só, sem positividade em gerar e reproduzir a vida, o poder destrutivo que não proporciona o desenvolvimento tecnológico de gerir e reinventar o poder da humanidade de preservar a vida. (DREYFUS, 1995).
  • 20. Considerações finais Sinto uma felicidade melancólica em viver no meio dessa confusão de ruelas, de necessidades e de vozes: quantos prazeres, impaciências, desejos, quanta sede de vida e que embriaguez vêm à luz aqui a cada instante! E logo, contudo, o silêncio cairá sobre todos esses homens barulhentos, vivos e felizes por viver! Atrás de cada se desenha sua sombra, obscuro companheiro de caminhada! (...) Cada um deles quer ser o primeiro nesse futuro – e, contudo, a morte, o silêncio da morte são as únicas certezas que todos têm nesse futuro! Como é estranho que essa única certeza, essa única comunhão seja quase imponente em agir sobre os homens e que eles estejam tão longe de sentir essa fraternidade da morte! Sinto-me feliz em constatar que os homens se recusam absolutamente a pensar na ideia da morte e gostaria muito de contribuir para lhes tornar a ideia da vida ainda cem vezes mais digna de ser pensada. (O Pensamento da Morte. A Gaia Ciência – Friedrich Nietzsche) No decorrer da escrita dessa comunicação, mais um corpo de um homossexual foi encontrado com a cabeça esfacelada num terreno baldio às margens do centro da cidade de Picos, interior do Estado do Piauí. Distante da estratégia política das normatividades de reproduzir o medo contemporâneo nos sujeitos desejosos em viver a tão sonhada liberdade sexual no próprio corpo, este estudo visou, à guisa conclusiva, sinalizar os prejuízos dado à humanidade provocado pelo silenciamento dos gestos, mortificação dos prazeres do corpo e segredos acerca dos dispositivos que dilaceram o nosso direito de ser e mostrar-se diferente diante do processo de desfazer os gêneros e modelos tradicionais das orientações sexuais que reprimem e asfixiam os nossos corpos em caixinhas dentro dos armários ou prateleiras dos supermercados sexuais da espetacular sociedade do consumo. Enquanto observador das expressões das violências acerca das normas e regulações das orientações e corpos sexuais, venho constatando que os mecanismos lógicos das hetero(homo)normatividades, através da demanda econômica ou jogo do poder, reproduzem mercados concorrentes na venda de modelos ideais de sexualidades e/ou consumos de pacotes fechados de estilos
  • 21. de vida modernos. Sobretudo, é nos bastidores dos grandes espetáculos das propagandas de margarina da ‘feliz família sagrada’, durante os intervalos das novelas das oito ou no silêncio que nos tomam entre os episódios de Glee e Paradas LGBT que percebemos os estímulos que nos incitam às falas, quase que obrigatórias dos posicionamentos de identidades sexuais “tipo modelo” que devemos, à qualquer custo, consumir e assumir como nossa ‘liberdade’ de ser e viver. Enfim, esta comunicação emergiu do desejo de estilhaçar os discursos hegemônicos a fim de fazer provocações críticas acerca das lógicas e razões consumistas, desfazendo os rótulos postos pelos tipos de orientações sexuais. Acredito que a partir da visibilidade e liberação das vozes contrárias que nos sufocam e dilaceram nossos corpos sob as obscuras forças hetero(homo)normativas é que reconheceremos as nossas diversas vontade de morte e diferentes desejos de vida. Bibliografia: BORRILLO. Daniel. Homofobia. - L‟Homophobie. Paris: Presses Universitaires de France, 2000. - Edicions Bellaterra, La Biblioteca del Ciudadano. 2001. BRANCO, Edward de Alencar Castelo. Todos os dias de paupéria: Torquato Neto e a invenção da tropicália. São Paulo: Annablume, 2005. BROWN, Gavin. Pensando Além da Homonormatividade: Explorações Performativas de Economias Gays Diversificadas. DOI: 10.5212/Rlagg. v. 4. i1. 3045. Revista Latino-Americana de Geografia e Gênero, v. 4, n. 1, p. 125- 138, 2012. CARRARA, Sérgio & VIANNA, Adriana. A Violência Letal contra Homossexuais no Município do Rio de Janeiro: Características gerais. IN. Homossexualidade, violência & justiça: A violência letal contra homossexuais no Município do Rio de Janeiro, Relatório de Pequisa, IMS/UERJ, mimeo, 2001. CARRARA, Sérgio & RAMOS, Silvia. A Constituição da Problemática da Violência contra Homossexuais: a Articulação entre Ativismo e Academia
  • 22. na Elaboração de Políticas Públicas. PHYSIS: Rev. Saúde Coletiva, Rio de Janeiro, 16 (2):185-205, 2006. COSTA, Jurandir Freire. A inocência e o Vício: estudos sobre o homoerotismo. Rio de Janeiro: Relume-Dumará, 1992. DREYFUS, Hubert. Michel Foucault: Uma trajetória filosófica para além do estruturalismo e da hermenêutica. Tradução Vera Porto Carrero. Rio de Janeiro. Editora Forense Universitária, 1995. FOUCAULT, Michel. História da Sexualidade 1: A vontade de saber, tradução de Maria Thereza Costa Albuquerque e J.A. Guilhon Albuquerque. Rio de Janeiro: Edição Grall, 1998. GAMSON, Joshua. As sexualidades, a teoria queer e a pesquisa qualitativa. IN. DENZIN, Norman K. O Planejamento da Pesquisa Qualitativa: Teorias e Abordagens. Norman K. Denzin, Yvonna S. Lincoln; Tradução Sandra Regina Netz. Porto Alegre: Artmed, 2006. p. 345-362. GREEN, James N. Mais amor e mais tesão: a construção de um movimento brasileiro de gays, lésbicas e travestis. Cadernos Pagu (15) 2000: pp.271-295. HALL, Stuart. Identidade Cultural na Pós-Modernidade. São Paulo: DP&A Editora, 2006. LYOTARD, Jean-François. A Condição Pós-Moderna. Rio de Janeiro: José Olympio, 2004. MACHADO, Frederico V. & PRADO, Marco A. M. Sexualidade e cidadania: sociedade civil e poder público na organização da parada glbt na cidade de belo horizonte (Brasil). Dossier: Perspectivas ibero americanas. número 15. Les cahiers de psychologie politique [En ligne], URL : http://lodel.demo.inist.fr/cahierspsychologiepolitique/index.php?id=300 MARSIAJ, Juan P. Gays ricos e bichas pobres: desenvolvimento, desigualdade socioeconômica e homossexualidade no Brasil. Cadernos AEL. Campinas, Unicamp/IFCH//AEL, vol. 10, nº 18/19, 2003.
  • 23. MOTT, Luiz. Homofobia: a violação dos direitos humanos dos gays, lésbicas e travestis no Brasil. San Francisco, USA: Editora IGLRHC, 1997. ____________. Homofobia no Piauí: 1975 – 2007 – In BARROS JUNIOR, Francisco de O. & LIMA, Solimar O (org.) - Homossexualidades sem fronteiras: Olhares sobre o Piauí – volume 2 - Rio de Janeiro: Booklink; Teresina: Matizes, 2007. MISKOLCI, Richard. A Teoria Queer e a Sociologia: o desafio de uma analítica da normalização. In: Revista Sociologias, Porto Alegre, ano 11, nº 21, jan./jun. 2009, p. 150-182. NIETZSCHE, Friedrich W. A Gaia Ciência. Coleção Grandes Obras do Pensamento Universal, nº 45, tradução de Antônio Carlos Braga. São Paulo: Editora Escala, 2006. PRADO. Marco Aurélio Máximo. Preconceito contra homossexualidades: a hierarquia da invisibilidade. Ed. Cortez, 2008. RIOS, Luiz Felipe. O Feitiço de Exu: Um estudo comparativo sobre parcerias e práticas homossexuais entre homens jovens candoblesistas e/ou integrantes da comunidade entendida do Rio de Janeiro. Tese. Doutorado. Universidade Estadual do Rio de Janeiro. Instituto de Medicina Social. Curso de Pós-graduação em Saúde Coletiva. 2004. ROUANET, S.P. O Homem e o Discurso – Arqueologia de Michel Foucault (com José Guilherme Merquior). Rio de Janeiro: Tempo Brasileiro, 1971. 2.a ed., 1996. SOUZA JUNIOR, P.F.M. O silêncio e o segredo do cabeça de cuia: um estudo sobre a situação de violência vivida pelos gays no Vale do Rio Guaribas. Dissertação (Mestrado) Universidade Federal de Pernambuco. CCSA. Serviço Social. Recife:2011. SPARGO, Tamsim – Foucault e a Teoria Queer. Tradução Vladimir Freire – Rio de Janeiro: Pazulin; Juíz de Fora: Ed. UFJF, 2006. – Coleção Encontros Pós-modernos.