1. Confederación Iberoamericana de Asociaciones Científicas y Académicas de la
Comunicación
Práticas de educação para a mídia na formação básica de jornalistas
Lígia Beatriz Carvalho de Almeida
Universidade Sagrado Coração1
Resumo: Apresenta-se o resultado de experiência que visa à formação de jornalistas cônscios de sua
responsabilidade social e da relação existente entre a elevação do nível educacional da população e a melhoria
das condições de trabalho para a categoria profissional. As atividades são parcialmente norteadas por
referencial teórico metodológico proposto pela UNESCO na publicação Media Education: a kit for teachers,
students, parents and professionals. Promovem-se processos interlocutórios entre comunicadores e educadores
que desenvolvem projetos na escola básica. Tradicionalmente os comunicadores usam a comunicação mediada,
contudo ao se eliminar a mediação, compreendem a natureza humana das audiências e a responsabilidade
social de sua profissão. O referencial teórico utilizado na disciplina Comunicação Educativa, que integra a
grade do curso de jornalismo na Universidade Sagrado Coração, provê o graduando com conhecimentos sobre
jornalismo educacional, jornalismo educativo e educação para a mídia. Reflexão e prática se somam. A
temática desperta interesse nos discentes e parcela deles se aprofunda nas reflexões, desenvolvendo
monografias, projetos de iniciação científica e dissertações de mestrado.
Palavras-chave: jornalismo, educação para a mídia, educomunicação, mídia-educação.
Abstract: This article presents the results of an experience to raise journalism students’ awareness of the social
responsibility of their profession and help them understand the relationship between the increase of population’s
educational level and the improvement of their professional category working conditions. Activities are partly
guided by theoretical and methodological framework proposed by UNESCO’s publication Media Education: a
kit for teachers, students, parents and professionals. Practical activities are developed at basic schools to
promote interlocutory processes between journalism students and educators. Traditionally, journalists use
mediated communication, however the direct contact allow them to understand the human nature of the
audiences. The theoretical framework of the subject Comunicação Educativa, offered at Universidade Sagrado
Coração’s journalism course, provides students with knowledge of educational journalism, instructional
journalism and media education. The experience has been well evaluated; some students deepen their studies on
the subject, developing undergraduate research projects and dissertations.
Palavras-chave: journalism, media education, educommunication.
Introdução
A intenção com este artigo é a de dialogar com educadores interessados na construção
de referencial de qualidade para a formação básica de jornalistas. Para tanto, se compartilha a
experiência desenvolvida na disciplina Comunicação Educativa, expondo o histórico e as
motivações para sua inserção na matriz do curso da Universidade Sagrado Coração (USC),
em 2008. São abordadas as reflexões teóricas que levaram a escolha da metodologia, das
1
Mestre em Comunicação Midiática, docente dos cursos de Comunicação Social da Universidade Sagrado Coração, integrante do grupo de
pesquisa “Estudos de Comunicação, Mídia e Sociedade” – GPECOM/USC/BAURU/SP e doutoranda em educação da UNESP Marília. E-
mail: ligiabeatrizcarvalho@ig.com.br.
2. 2
formas de avaliação e do conteúdo que compreende os jornalismos educacional e educativo e
a educação para a mídia. Expõem-se ainda as dificuldades encontradas no processo, os
resultados obtidos e as impressões dos discentes de jornalismo.
A oferta da disciplina encontra amparo nas Diretrizes Curriculares Nacionais (DCNs)
para a área de Comunicação Social e suas habilitações que estabelecem o perfil do formando
em Jornalismo. Deve-se, contudo considerar que desenvolver o perfil esperado é um desafio
no atual contexto que valoriza a técnica e condena a teoria, alegando que esta desfruta de um
estatuto autônomo não mantendo vínculos com a realidade. Como se não bastasse, a
convivência com os discentes revela jovens destituídos da esperança de realização do ideário
da profissão, alçado por eles a condição de utopia ante as rotinas mercadológicas. Assim, no
momento de planejamento da disciplina nos questionamos: que conteúdos trabalhar? Como
motivar para um assunto – a comunicação educativa - com tão pouco apelo profissional no
Brasil? Como desarmar argumentos, construindo pontes com a realidade?
O perfil do formando em jornalismo
Destaca o Parecer CNE/CES 492/2001 do Ministério da Educação (MEC) que o
formando deve ser capaz de produzir, com objetividade, informações sobre os fatos sociais,
culturais e econômicos contemporâneos de forma a qualificar o senso comum. Ao final do
curso, entre outras aptidões, espera-se que ele saiba posicionar-se ética e politicamente
perante questões como a relação entre poder e comunicação, os constrangimentos a que a
comunicação pode ser submetida, as repercussões sociais advindas do exercício da atividade
jornalística e as necessidades da sociedade contemporânea em relação à comunicação social.
Entre as competências desejadas estão a compreensão dos processos envolvidos na recepção
de mensagens jornalísticas, a análise da realidade, a reflexão crítica sobre as práticas
profissionais e o compromisso com a verdade, com a ética e a cidadania (BRASIL, 2001).
O Código de Ética dos jornalistas brasileiros configura-se outro documento norteador.
Ele afiança a natureza social da profissão e afirma, no artigo sexto, ser dever da profissão a
defesa dos direitos do cidadão e dos princípios constitucionais e legais, preservando a base do
estado democrático de direito e “contribuindo para a promoção das garantias individuais e
coletivas, em especial as das crianças, dos adolescentes, das mulheres, dos idosos, dos negros
e das minorias” (FENAJ, 2011).
A vinculação entre imprensa, cidadania e democracia é delineada nos dois documentos
mencionados, contudo a relação entre informação e cidadania é apresentada de forma mais
evidente pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI) para a qual é
3. 3
responsabilidade do jornalismo fortalecer os laços entre informação e cidadania: “a prática
jornalística dedicada à contextualização das notícias fortalece a cidadania, pois contribui para
que a população possa conhecer e reivindicar seus direitos – o que significa revigorar e
ampliar o capital social” (ANDI, 2006, p. 13).
Conclui-se que do processo de formação deve resultar um sujeito ético, político,
comprometido com a verdade, tecnicamente preparado e capaz de analisar informações e
disseminá-las de forma a qualificar o senso comum e consolidar a democracia. A disciplina
deve então contribuir para o alcance desse perfil.
A disciplina
A USC ofertou pela primeira vez, em 2003, um curso de especialização em
educomunicação. De lá para cá, vem acumulando experiência em formação e atuação na
educação para a mídia envolvendo os alunos de jornalismo e das licenciaturas com atividades
de ensino, pesquisa e extensão. O projeto de extensão Rádio e TV escolares, iniciado em
2006 e mantido até a presente data, já levou atividades há 29 escolas de educação básica e
duas instituições sócio-educativas, tendo envolvido 31 professores e aproximadamente 900
alunos dessas escolas, três docentes da universidade e 68 discentes de graduação. Em 2008,
foi reconhecido como o melhor projeto da área de Comunicação pelo Instituto Cidadania
Brasil, tendo recebido o prêmio Cidadania sem Fronteiras. Sedia também, o laboratório
Midialab, financiado pela Fundação de Amparo à Pesquisa do Estado de São Paulo. Nele,
diversas pesquisas, tanto de iniciação científica quanto de conclusão de curso, têm sido
realizadas. Os resultados podem ser conhecidos na publicação Mídia na Educação, disponível
no endereço eletrônico www.usc.br/midiaeducacao. Os docentes da Universidade, que
coordenam as pesquisas estão, ou estiveram, vinculados a programas de pós-graduação
produzindo teses de doutorado e pós-doutorado e entre os discentes também existem os que
prosseguiram com a temática em programas de pós-graduação lato e stricto sensu com
produção de novas pesquisas.
Em relação ao ensino, a inserção da disciplina Comunicação Educativa no currículo
do curso foi precedida por outras disciplinas, ofertadas em caráter optativo. A Prof. Dra.
Roseane Andrelo, coordenadora do curso de jornalismo à época, explica o contexto que
possibilitou a inclusão da temática no âmbito do curso:
No caso da USC, contribuiu, para isso, a existência de um corpo docente envolvido
com a questão. Como resultado, percebe-se o interesse cada vez maior dos alunos na
participação dos projetos mencionados e na escolha destes temas para desenvolver
4. 4
nas monografias. Da parte da comunidade, é crescente o número de escolas que
procuram a Universidade em busca de formação para os professores. Também
verifica-se, embora isso seja mais difícil, a ampliação do trabalho conjunto de
docentes e estudantes de outros cursos, interessados em mídia-educação. Afinal,
trata-se de uma área interdisciplinar com um vasto campo a ser explorado
(ANDRELO, 2007).
A disciplina tem como objetivos: capacitar os discentes a atuarem nas diversas
interfaces existentes entre a imprensa e a educação, englobando a cobertura da educação, a
exploração do potencial educativo dos meios de comunicação, dos textos e da linguagem
midiática e a educação para a mídia. Entende-se que desta forma os egressos estarão
preparados para colaborar com a esperada qualificação do senso comum da comunidade e ser
copartícipes de processos democráticos. Os conteúdos foram delimitados no jornalismo
educacional, por meio da cobertura da educação e no jornalismo educativo, com a elaboração
de produtos jornalísticos educativos e de projetos mídia-educativos.
Por jornalismo educacional entende-se o jornalismo especializado na cobertura dos
fatos sobre a educação, seja em veículos de grande circulação ou segmentados e “que visa
difundir e incentivar a educação por meio dos veículos de comunicação” (ALMEIDA,
TONELLI e BERTI, 2010, p.60). O educador Gabriel Perissé destaca que o papel dessa
editoria, em um contexto de fragilidade como o da educação brasileira, não deve se ater à
mera exposição de dados quantitativos ou da concepção de política e de sociedade que
determinam esse quadro, mas sim investigar os obstáculos que se interpõem à melhoria da
situação e denunciar o uso da educação para fins intoleráveis, como os eleitoreiros, e ainda
trazer ao conhecimento público a identidade dos atores que os constroem, que com eles são
coniventes ou que atrás deles se escondem (PERISSÉ, 2010).
Marques de Melo localiza as raízes do jornalismo educativo brasileiro no gênero
interpretativo praticado nos Estados Unidos em meados do século XX (MELO, 2009, p.3). O
jornalismo educativo é aquele que tem a intencionalidade de ensinar ou de ser instrutivo,
sendo mais comumente veiculado em publicações segmentadas ou nas emissoras educativas.
É usualmente composto por documentários educativos, biografias, programas que abrangem
conteúdos da educação formal e que disseminam saberes legitimados pela ciência. Há também
programas que visam preparar jovens e adultos para o mundo do trabalho. Marques de Melo
(MELO, 2006), inspirado por Freinet, apresenta mais um foco do jornalismo educativo, cuja
preocupação centra-se na formação de leitores e no combate à marginalização social e cultural
e que, na atualidade, é trabalhado mais especificamente pela educomunicação ou educação
para a mídia. Em seu artigo, Melo defende a familiarização das crianças e jovens com os
5. 5
jornais por meio de sua manipulação nas salas de aula das escolas básicas. Ele recomenda o
envolvimento dos jornalistas com a educação e sugere abordagens metodológicas que podem
ser adotadas por eles em atividades a serem desenvolvidas nas escolas, como comparação das
estruturas narrativas utilizadas por diferentes veículos e análise de opiniões e dos padrões de
referência social utilizados nas notícias. Recomenda, igualmente, a produção de jornais
escolares unindo jornalistas, educadores e alunos das escolas de educação básica. Para ele o
jornal escolar é “instrumento utilíssimo para o exercício da cidadania, ou seja, para o
aprendizado prático da participação social e política” (MELO, 2006, p. 171). Igualmente para
Bucci, “a responsabilidade social do jornalismo passa por assumir o desafio editorial de
expandir e qualificar a base de leitores de notícias, em meios impressos e eletrônicos”
(BUCCI, 2007). Percebe-se, então, que no cerne das profissões de educador e de jornalista
está um mesmo objetivo: contribuir para elevar a qualidade de vida da população brasileira.
Almeida, Tonelli e Berti (2010, p. 62) argumentam que outros interesses se somam e
devem motivar o jornalista para a prática da comunicação educativa. Sendo eles:
[...] ampliar a base de leitores para aumentar a circulação dos produtos jornalísticos
e qualificar o leitor para que esse exija um jornalismo de qualidade e com isso
assegure a realização profissional dos jornalistas, que poderão elaborar textos mais
densos e comprometidos com o ideal democrático.
Em relação ao conteúdo teórico da disciplina Comunicação Educativa, este foi
organizado em três unidades: Imprensa e Educação, Sistema de Comunicação Social e
Educação para a Mídia, apresentados na seqüência, com indicação dos textos bases adotados
para fomentar as discussões em sala de aula, que, diga-se de passagem, têm sido acaloradas.
Na primeira unidade a intenção é relacionar imprensa e educação, categorizando o
jornalismo educacional e o jornalismo educativo. Inicia-se por um diálogo, ancorado na
leitura do texto de Bucci (2008) que coloca em evidência a responsabilidade social do
jornalismo e determina que o objetivo da imprensa ao cobrir políticas públicas deve ser o de
fiscalizar o alcance dos objetivos delimitados por elas, tendo por norte a melhoria da
qualidade de vida dos beneficiados pelas ações realizadas. Na seqüência, desenvolvem-se
atividades de análise da cobertura jornalística da educação em âmbito regional. A atividade
leva o discente à reflexão sobre a qualidade das notícias. As análises são guiadas por critérios
propostos pela Agência de Notícias dos Direitos da Infância (ANDI), encontrados no artigo de
Motta (2008), que sugerem que além de se observar a seleção, a ênfase e a exclusão de
informações nas notícias, três outros pontos devem ser examinados. Em relação à abordagem
6. 6
do tema, verifica-se a contextualização da cobertura, a adequação das fontes de informação, a
menção a causas e conseqüências, políticas públicas e a legislação, o foco dado ao
enquadramento do tema e aos atores envolvidos, a presença de debate sobre as soluções para
possíveis problemas abordados. Quanto à elaboração do produto jornalístico, examina-se o
emprego de critérios de relevância pertinentes, de recursos gráficos auxiliares e a correta
interpretação de dados e informações fornecidas pelas fontes. Considerando-se as fontes, os
envolvidos nos fatos e o público, a atenção volta-se para a presença do contraditório e da
pluralidade de fontes, para a existência de preconceitos e prejulgamentos, bem como a
creditação positiva ou negativa aos atores sociais implicados.
Ainda na primeira unidade, tomando-se por base os textos de Caldas (2008) e de
Vianna e Unbehaum (2004), discute-se a gênese e as características das políticas públicas
sociais e educacionais, por meio da análise da formulação dos principais documentos que
norteiam a educação brasileira: a Constituição, a Lei de Diretrizes e Bases, o Plano Nacional
de Educação e os Parâmetros Curriculares Nacionais. Finaliza-se a unidade refletindo sobre o
papel educativo dos meios de comunicação e o potencial de uso dos recursos da informação e
dos meios de comunicação com propósitos educativos, para tanto colabora a leitura do artigo
de Andrelo e Kerbauy (2009).
Na segunda unidade estuda-se a organização do sistema de comunicação social no
Brasil e seus subsistemas: público, estatal e privado, abordando os modelos de gestão e
sustentação financeira dos veículos, tendo como ponto de partida o texto de Ericsom Scorsim
(2008). Discute-se o direito à comunicação, analisando-se adicionalmente o modelo de gestão
de emissoras educativas e comunitárias e, por fim, a potencialidade e a contribuição das novas
mídias para a democracia. Neste caso, é a entrevista de Francisco Sierra Caballero ao
Observatório do Direito à Comunicação (2007) que serve de elemento para reflexão. Trata-se
também da comunicação escolar, posicionando a escola como um microcosmo social.
A terceira unidade tem como foco a educação para a mídia, cujo histórico é
conhecido pela leitura de Abordagens pedagógicas para o estudo das mídias: da inoculação à
preparação de Siqueira (2009). Os conceitos-chave, as estratégias pedagógicas e as formas de
avaliação, que subsidiam o planejamento das atividades práticas nas escolas de ensino básico
abordados, são adaptados do protótipo de currículo europeu para mídia-educação, formulado
pela UNESCO, denominado Media Education: a kit for teachers, students, parents and
professionals2 (FRAU-MEIGS, 2006). Do kit utilizam-se os conceitos-chave: estruturas
narrativas, representações, audiências, instituições de mídia, linguagens; e as estratégias
2
Tradução livre da autora para o título: Mídia Educação: um kit para professores, alunos, pais e profissionais.
7. 7
pedagógicas: análise de texto e do contexto, estudo de caso, produção de textos, simulação de
rotinas de produção midiática e tradução. Entre as estratégias, a denominação de tradução é a
que causa maior estranhamento, sendo facilmente compreendida pelos acadêmicos assim que
se esclarece que seu foco está na adaptação de um texto de uma mídia para outra, sendo usada
para que as crianças entendam os constrangimentos aos quais a linguagem é submetida em
função das características de cada mídia envolvida. Ainda da publicação da UNESCO, são
analisados exemplos de dinâmicas que podem ser desenvolvidas nas instituições escolares.
Os conceitos-chave, apresentados aqui de forma resumida, estão disponíveis, em
português, na publicação Mídia na Educação (ANDRELO; SIQUEIRA, 2008). O conceito de
estrutura narrativa implica em entender como o teor de uma história – real ou fictícia -
evolui, em função dos objetivos do autor e das expectativas do público. Com representações
se pretende discutir se as representações sociais divulgadas pela mídia são verdadeiras ou
apenas são tidas como verdadeiras por serem predominantes na mídia. Analisar as audiências
permite refletir sobre o poder de persuasão do texto, o poder do receptor e o modo como
audiências diferentes se apropriam de um mesmo conteúdo de modo diferente. Entender as
instituições de mídia é compreender que as notícias produzidas pelos jornais todos os dias são
feitas conforme as normas de um processo institucionalizado aparentemente objetivo, mas
que, no fundo, sustenta pressupostos ideológicos. E, por fim, o estudo das linguagens
midiáticas leva a compreensão de que é a linguagem que produz significado, e não uma
suposta expressão por si só e, consequentemente, até mesmo a notícia não é transparente em
relação à realidade, mas sim uma recriação de um fato, mediada por forças de caráter técnico,
político e simbólico. Uma versão em português das estratégias pedagógicas e das formas de
avaliação propostos no kit é encontrada em Almeida (2008).
Os componentes práticos da disciplina são a análise crítica de notícias e o desenho e
aplicação de projetos educativos. Os alunos, em grupos, podem optar por desenvolver um
produto jornalístico educativo para crianças ou jovens, ou planejar e aplicar atividades de
curta duração de educação para a mídia em escolas de educação formal. Mesmo os que
escolhem a primeira opção devem acompanhar a leitura presencial do texto jornalístico pelo
público alvo para conhecer a reação dos mesmos e avaliar os resultados obtidos.
É praxe ainda, o convite a jornalistas para narrarem suas experiências. São convidados
ex-alunos que desenvolveram iniciação científica, trabalho de conclusão de curso ou
dissertação de mestrado, relacionadas às unidades abordadas na disciplina, bem como
profissionais alocados em veículos de comunicação de grande circulação ou segmentados.
8. 8
Como resultados das experiências nas escolas de educação básica, nos três anos de
oferta da disciplina, diversas atividades foram desenvolvidas como: jornais escolares3,
programas de rádio, fotografia jornalística, simulação de link televisivo ao vivo, reunião de
pauta, análise de publicidade, de filmes, de programas de rádio e TV e de notícias, nas versões
impressa, televisada ou radiofônica. Muitas das atividades combinaram conteúdos midiáticos
com conteúdos escolares e ações visando à inclusão digital.
Considerações finais
Constata-se que em um cenário de aligeiramento da formação acadêmica, favorecido
pelo MEC ao reduzir as cargas horárias mínimas dos cursos de graduação, a formação acaba
tendo um perfil muito mais técnico que humanista, com pouco espaço para a reflexão sobre o
papel social da profissão. Ao cursarem a disciplina, oferecida no quinto semestre do curso, os
discentes não têm segurança para utilizar metodologias específicas para análise da mídia,
conhecimento que contribuirá para a elevação da qualidade de sua própria produção
jornalística. Também não chegaram a sistematizar conhecimentos que permitam que operem
conceitos como educação, política pública, ação afirmativa e compensatória, posse e gestão
dos veículos de comunicação, potencial educativo dos meios. Não são capazes de identificar
plenamente a importância das políticas públicas, nem de estabelecer relação direta entre a
melhoria das condições de trabalho dos jornalistas e a qualificação do leitor. A disciplina
contribui para a aquisição e sedimentação desses conceitos.
Na prática, são poucos os graduandos que se declaram, no início do semestre, atraídos
pelo conteúdo e as propostas de atividade da disciplina, alegam que não têm jeito para lidar
com crianças e adolescentes. Contudo, com o início das discussões eles se mostram bastante
receptivos aos textos e participativos. As informações teóricas vão se encaixando e se somam
às análises das notícias. Estas últimas demonstram que a maior parte das pautas do jornalismo
educacional é oficialista e que a imprensa acaba reproduzindo um discurso que sublima um
suposto sucesso das políticas educativas governamentais, o que leva os acadêmicos a
concluírem que a educação tanto quanto a comunicação é instrumento de poder, controle e
manipulação.
A maior parte dos alunos categoriza os textos de Bucci (2008) e Motta (2008) como
belos, porém utópicos. Porém, ao terem contato com os profissionais convidados para dar
seus depoimentos no decorrer da disciplina, passam a rever a dimensão de utopia que nutriam
durante a revisão do referencial teórico. Nesses momentos, os receios dos acadêmicos
3
O último jornal produzido pode ser conhecido online no link http://bit.ly/kRrWMk.
9. 9
esmaecem, eles têm a oportunidade de esclarecer dúvidas, partindo mais confiantes para a
aplicação das atividades práticas.
Vale ressaltar o desconhecimento dos acadêmicos quanto ao jornalismo educacional.
Para exemplificar, relataremos uma situação. Apesar de no município de Bauru existir uma
editora - um dos poucos campos de estágio e muito cobiçado por eles pelas condições de
trabalho existentes - e do fato de que na maior parte das turmas existem alunos que já
estagiaram ou estagiam no local, eles ignoram completamente um título paradidático
publicado por ela, destinado a professores da escola básica. A editora responsável pela
publicação é usualmente convidada para dar uma palestra durante a disciplina, provocando a
surpresa dos discentes ao revelar o grau de desafio existente e a possibilidade de realização
profissional oferecida aos jornalistas que nela atuam. Ao final de uma dessas exposições, uma
acadêmica espontaneamente relatou o quanto à presença da editora havia colaborado para a
revisão de suas concepções que a levavam a acreditar na impossibilidade de aplicação do
conteúdo estudado na disciplina em suas futuras atividades profissionais.
Os discentes de jornalismo empolgam-se com as atividades de simulação,
desenvolvidas durante as aulas destinadas ao estudo das metodologias para a mídia educação.
A maior parte deles aprecia a fase de planejamento das atividades práticas, mas se mostra
bastante inseguro para enfrentar os jovens nas escolas. Apesar de terem a possibilidade de
desenvolver as atividades no Midialab, laboratório de mídia da Universidade, ao verificarem a
burocracia existente para retirar as crianças ou adolescentes da escola e perceberem a
dificuldade de locomoção que os mesmos têm, em geral, acabam abandonando a hipótese.
Adicionalmente, a realização de atividades digitais, ou de produção de rádio e TV, nos
estabelecimentos escolares é comumente deixada de lado por duas razões: os acadêmicos não
têm segurança quanto ao funcionamento dos equipamentos disponibilizados nas escolas e não
dispõem de muito tempo para o desenvolvimento das atividades. Diversos grupos decidem
produzir jornais digitais, porém nas escolas se deparam com a solicitação dos alunos e
professores de que estes sejam impressos, percebendo o quanto o impresso ainda é valorizado
pela cultura escolar e a força que exerce no imaginário dessas coletividades. Tal fato, de certa
forma os sensibiliza, e seduz, fazendo com que dediquem mais horas do que planejaram
inicialmente à atividade. Outro fato observado é que os alunos de jornalismo acabam
valorizando o desejo da comunidade escolar e se cotizam para imprimir os jornais, já que as
escolas não dispõem de verba para isso.
Nota-se que os acadêmicos entendem os conceitos propostos no kit de mídia da
UNESCO, porém parte deles sente dificuldade em nomear as atividades que formulam de
10. 10
acordo com eles. O que mais os auxilia são os exemplos concedidos e as simulações
realizadas durante as aulas da disciplina.
É comum a surpresa dos futuros jornalistas ao se depararem com o criticismo dos
estudantes da escola básica, o que os leva a entender, na prática, a mudança histórica dos
paradigmas estudados na evolução da mídia-educação.
Por ocasião da exposição final dos projetos desenvolvidos pelos grupos de trabalho,
eles compreendem a importância do ser humano, representada pela figura do indivíduo adulto
na educação de crianças, ao compararem as diferentes reações dos professores e equipes
diretivas das unidades escolares visitadas às propostas de atividades, que passam pela
rejeição, pelo menosprezo, até o apoio integral. São capazes de avaliar a importância
fundamental da escola de educação básica na formação da sociedade, identificando seus
pontos fortes e suas fragilidades.
Situação emblemática da fragilidade do sistema de ensino do estado de São Paulo foi
vivenciada por um grupo de discentes que produzia um jornal escolar com a professora de
língua portuguesa e sua sala composta por 50 alunos do terceiro ano noturno do ensino médio.
A atividade que deveria tomar três semanas, sendo um encontro por semana, acabou se
alongando por seis. A professora efetiva, na terceira semana de desenvolvimento da
atividade, entrou em licença prêmio, o semestre estava se encerrando e inexistia um outro
profissional para substituí-la com a mesma formação. Ao constatar a dedicação e o
envolvimento dos alunos com as atividades de redação de matérias jornalísticas, a direção da
unidade escolar convidou as acadêmicas de jornalismo a estenderem o projeto por mais
tempo, ampliando o conteúdo do jornal.
Planejar as atividades de educação para a mídia leva os acadêmicos a uma revisão e
síntese do conhecimento adquirido ao longo do curso de jornalismo. Eles se questionam sobre
os conteúdos e funções jornalísticas com os quais mais se identificaram. É a partir dessa
decisão que formatam os projetos a serem desenvolvidos. Constata-se que a maior parte deles
sente satisfação em compartilhar com a comunidade o que aprenderam até o momento.
Todos os atores envolvidos nas atividades acabam sendo beneficiados, o que pode ser
exemplificado por uma proposta da disciplina. Nela são estudados os estereótipos presentes
em jornais eletrônicos. Tanto os acadêmicos de jornalismo quanto os alunos da educação
básica acabam aprendendo a usar os recursos avançados disponibilizados pelos mecanismos
de busca de conteúdos digitais. Para os alunos do ensino básico o aprendizado vai além, eles
aprendem não só o uso de representações pela mídia, mas percebem a necessidade de
identificar fontes confiáveis de informação na rede mundial de computadores.
11. 11
Ao final da disciplina, o conhecimento dos alunos de jornalismo sobre a educação está
muito mais apurado permitindo que atuem com mais propriedade no jornalismo educacional.
A convivência com a rotina existente no interior das escolas faz com que revisem suas
representações acerca da educação, do comportamento dos adolescentes e dos ambientes
escolares.
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