O documento discute um caso de improbidade administrativa no qual verba pública foi utilizada para obra diferente da inicialmente informada. Foi celebrado um Termo de Ajustamento de Conduta aplicando multa civil, mas o Conselho Superior do Ministério Público não homologou o arquivamento do caso. O voto em separado argumenta que a composição extrajudicial é possível nesses casos menos graves, visando efetividade e economia de recursos públicos.
TAC em Improbidade - voto favorável - Alexandre Herculano Abreu
1. CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
SEGUNDA TURMA REVISORA
Inquérito Civil n. 06.2011.00002844-9 – PJ de Ponte Serrada
Protocolo CSMP n. 23891
Relator: Conselheiro Alexandre Herculano Abreu
Parafraseando Friedrich Nietzsche,
em sua obra O anticristo: há idéias
que nascem póstumas, só serão
compreendidas depois de amanhã...
Inquérito Civil. Improbidade
Administrativa. Verba utilizada pela
Câmara de Vereadores em obra
distinta da inicialmente informada.
Ofensa aos princípios regentes da
administração pública. Art. 11 da Lei
n. 8.429/92. Termo de Ajustamento
de Conduta celebrado com aplicação
de multa civil. Proposta do relator:
Impossibilidade de celebração de
TAC no âmbito de procedimento
extrajudicial versando sobre prática
de ato de improbidade. Vedação
expressa do §1º do artigo 17 da Lei
n. 8.429/92. Necessidade de
ajuizamento de ação de improbidade
para imposição de sanção.
Precedentes. Não homologação da
promoção de arquivamento com
consequente remessa do feito ao
Procurador-Geral de Justiça para
designação de outro membro para
adoção das medidas reputadas
necessárias. Voto-Vista:
Possibilidade de realização de acordo
na esfera extrajudicial,
convencionando aplicação de multa
civil. Atos de improbidade de menor
monta. Inexistência de vedação legal
à composição extrajudicial, pois em
momento anterior à provocação da
jurisdição. Paralelo com o exercício
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2. CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
de poder investigatório do Ministério
Público, conquistado mediante
atuação combativa, ainda que à
míngua de expressa disposição legal.
Outras situações de direitos difusos
em que possível a plena composição
por meio de ajustamento de conduta.
Penas por improbidade que, só
quando deflagrada a ação
correspondente, podem ser
consideradas de aplicação exclusiva
pelo juiz. Observância da
jurisprudência que em casos
semelhantes conclui tão somente
pela condenação em multa civil.
Máxima efetividade da atuação
ministerial com o mínimo de
dispêndio de recursos públicos.
Atendimento ao interesse público.
Ressalvas à aplicação deste
entendimento aos atos de menor
repercussão e que não possam
render ensejo à aplicação da
hipótese de inelegibilidade prevista
na lei da ficha limpa, bem como
quando não se divise campo fértil
para aplicação das demais
reprimendas previstas na lei de
regência. Conclusão pela
homologação da promoção de
arquivamento pelos seus próprios
fundamentos.
Trata-se de Inquérito Civil proveniente da Promotoria
de Justiça da Comarca de Ponte Serrada, deflagrado em virtude de
notícia de utilização de verba pública em desacordo com a finalidade
prevista no respectivo empenho.
Conforme restou apurado, por omissão do contador e
do presidente da Câmara de Vereadores de Ponte Serrada à época
dos fatos, os valores inicialmente empenhados para reforma do
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3. CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
assoalho da câmara foram utilizados para construção de um palco na
chamada Casa do Chimarrão, localizada no Parque de Exposições
Municipal.
Embora não vislumbrado dolo na conduta dos agentes,
tampouco dano ao erário, pois o serviço foi efetivamente prestado,
ponderou-se acerca de ofensa aos princípios regentes da
administração pública na hipótese, com subsunção dos fatos à
previsão do art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa.
Em decorrência, celebrou-se termo de ajustamento de
conduta com os envolvidos, prevendo o pagamento de multa no valor
de R$ 500,00 (quinhentos reais), para cada um, pela irregularidade
verificada, cominando-se multa de R$ 10.000,00 (dez mil reais) para
o caso de descumprimento (fls. 48/49v).
Após, sobreveio promoção de arquivamento subscrita
pelo Promotor de Justiça, Dr. Eduardo Sens dos Santos, por meio da
qual se deram por exauridos os objetivos do procedimento,
consignando-se a ausência de interesse jurídico a ensejar a adoção
de outras medidas judiciais, porquanto “a multa aplicada atende ao
disposto no art. 12, III da Lei de Improbidade Administrativa, nos
termos exatos do entendimento da jurisprudência catarinense, que
em casos semelhantes vem aplicando apenas a sanção de multa[...]”
(fls. 50/51).
Deu-se ciência aos interessados (fls. 59/61).
Os autos foram encaminhados ao Conselho Superior do
Ministério Público e, após, distribuídos ao Conselheiro Dr. Américo
Bigaton.
Relatado o feito em sessão desta Segunda Turma
Revisora do Conselho Superior do Ministério Público, realizada em 6
de fevereiro do corrente ano, apresentou-se voto pela não
homologação do arquivamento, sob fundamento da impossibilidade
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4. CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
de celebração de TAC com previsão de multa civil por prática de ato
de improbidade, ante a vedação contida no §1º, do art. 17 da Lei n.
8.429/92.
Pedi vista dos autos.
É o relatório.
VOTO-VISTA
Com o devido respeito à posição defendida pelo ilustre
Conselheiro Relator, entendo que a hipótese retratada nos autos
conduz à homologação do arquivamento promovido pelo Promotor de
Justiça que presidiu o procedimento.
De fato, os elementos de convicção coligidos a respeito
do fato investigado indicam tratar-se de ato de improbidade
atentatório aos princípios da administração pública, conforme previsto
pelo art. 11 da Lei de Improbidade Administrativa.
Destarte, considerando todos os fatores envolvidos na
seara da improbidade administrativa, notadamente os derivados da
indisponibilidade do interesse próprio à espécie, poder-se-ia dizer, em
princípio, da impossibilidade de celebração de termo de ajustamento
de conduta convencionando a aplicação de multa civil, com espeque
no §1º, art. 17 da referida lei, e amparado na doutrina e
jurisprudência dominantes.
Todavia, refletindo sobre essas questões, e
considerando os argumentos tecidos em artigo de autoria do
laborioso Promotor de Justiça que subscreve a promoção de
arquivamento em análise, penso ser pertinente lançar mão do
compromisso de ajustamento de condutas no moldes propostos.
E mais, estou convencido de que esta forma de
resolução não se afasta da legalidade instituída, quando se tem por
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pressuposto que as leis constituem um sistema coeso, além de
encontrar amparo na necessidade de efetividade e celeridade na
repressão de certos tipos de atos de improbidade administrativa, cujo
tratamento dispensado por torrencial e remansosa jurisprudência
revela-se consentâneo com a solução ora adotada.
Com efeito, ao contrário do que se vem defendendo,
não se divisa do contido no §1º, do art. 17 da Lei de Improbidade
Administrativa qualquer impedimento à adoção do compromisso de
ajustamento de condutas, mesmo quando se vá além das
providências para reparação do dano, na medida em que a vedação
de transação, acordo ou conciliação somente incide “nas ações de que
trata o caput”.
A rigor, portanto, na forma do artigo citado, pressupõe-
se demanda em curso para a incidência da proibição, de modo que
seu elastecimento para abarcar o momento extraprocessual é que, ao
contrário, não encontra guarida expressa no ordenamento jurídico,
além de consistir em indevida castração à atuação do Ministério
Público, motivo pelo qual deve sua interpretação ser restritiva.
No estado em que a questão se encontra, o pendor,
pensa-se, deve ser pelo prestígio das atribuições desta instituição,
considerando obviamente os contornos traçados pelo constituinte e
pela lei, com atuação direta, combativa e que prima pela efetividade
de resultados.
O dilema aqui imposto, em sua essência, não é novo e
encontra paralelo na celeuma sobre o poder investigatório do
Ministério Público, atualmente sob ameaça do desfecho que será dado
à proposta de emenda constitucional n. 37.
A conquista de tal atribuição representa a luta
incansável que somente rendeu seus virtuosos frutos por meio da
atuação destemida e perseverante dos membros desta instituição,
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enfrentando forte maré contrária, e, tal como na hipótese, sem inicial
respaldo expresso em lei.
Por outro lado, como sabemos, a previsão legal do
compromisso de ajustamento de condutas às exigências legais,
mediante cominações, com eficácia de título executivo extrajudicial, é
expressa no sistema jurídico (Lei n. 7.347/85, art. 5º, §6º), e
consubstancia instrumento cuja efetividade, no que concerne aos
interesses peculiares à ação civil pública, dispensa quaisquer
comentários.
Fruto certamente da sensibilidade do legislador em
mitigar os rigores da indisponibilidade do interesse público no trato
dos interesses transindividuais1, de modo a proporcionar sua
adequada tutela, o ajustamento de condutas passou ao longo dos
anos por muitas provações, o que não impediu seu desenvolvimento
e sua ampla adoção, especialmente no âmbito do Ministério Público, a
fim de salvaguardar notadamente os interesses difusos.
Isso para proteger qualquer interesse difuso, diga-se,
pois não é de se crer que o legislador, desde o longínquo ano de
1990, tenha em vão, ou por mero capricho, acrescentado um inciso
na Lei n. 7.347/85 para dispor que a ação civil pública, e por
consequência o ajustamento de condutas, referem-se à tutela de
“qualquer outro interesse difuso ou coletivo” a par daqueles
especificados pontualmente nos incisos anteriores do art. 1º daquele
diploma.
Assim, constituindo a tutela da moralidade
administrativa um interesse daquela aludida categoria, como negar
peremptoriamente a possibilidade do ajustamento de conduta nestes
casos, inclusive com aplicação de obrigação equiparada ao
pagamento de multa civil, quando, como visto, não o fez
1
Conforme expõe Hugo Mazzilli (A defesa dos interesses difusos em juízo, 22ª edição, 2009, p. 398).
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expressamente o legislador?
Aliás, nessa direção, nota-se na conduta legislativa
cada vez mais a intenção de integrar os institutos da tutela coletiva,
emprestando-lhes tratamento tendente a uma uniformização de seus
aspectos essenciais, o que vai ao encontro do clamor pela
compreensão das leis que se referem ao processo coletivo como
componentes de um microssistema.
Nessa senda, como bem pondera o subscritor da
promoção de arquivamento em análise, ontologicamente inexiste
diferença entre os ilícitos de improbidade administrativa e aqueles
relacionados com o meio ambiente, consumidor, criança e
adolescente e tantos outros nos quais é pacífica a utilização do
ajustamento de condutas, no âmbito de suas possibilidades, dentre
as quais, é bom frisar, não se inclui propriamente uma faculdade de
disposição do direito2.
Agregue-se a este cenário as notórias dificuldades da
subsunção de certas condutas de menor monta à tipologia e
apenação dos atos de improbidade administrativa para fatalmente
concluir-se, não raro, ser inefetiva e de elevado custo a solução
buscada exclusivamente no âmbito judicial para tais hipóteses, além
de caminhar-se assim na contramão da tendência de se dar maior
prestígio às formas extrajudiciais de resolução de conflitos.
Sob outro prisma, ainda dentro da leitura sistemática
ora proposta, não se pode conceber como o mesmo ordenamento
jurídico que, no campo do direito penal (a ultima ratio), permite a
realização da transação em certas hipóteses, poderia ser
completamente infenso à aceitação do ajustamento de condutas,
2
Assevera Mazzilli (obra citada, p. 407/408): “O compromisso de ajustamento de conduta não é um
contrato, a uma, porque seu objeto não são direitos patrimoniais de caráter privado; a duas, porque
o órgão público que o toma não é titular do direito transindividual nele objetivado, e, como não pode
dispor do direito material, não pode fazer concessões quanto ao conteúdo material da lide”.
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8. CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
dentro de alguns parâmetros, com a cominação de obrigações
adequadas para um ilícito civil, tal como na espécie.
Ora, a todo momento esta Turma Revisora se depara
com situações em que o compromisso de ajustamento de condutas é
utilizado para composição de danos ambientais, danos ao consumidor,
danos à saúde pública, por vezes estipulando obrigações de nítido
viés sancionatório, e cujo aperfeiçoamento, quando sopesadas as
situações dos casos concretos a que se referem, revelam resposta
efetiva à proteção do interesse transindividual lesado ou ameaçado,
tanto que devidamente homologados nesta sede.
Por que então, no contexto de atos ímprobos de menor
monta, haveria de ser diferente quando proposta em um termo de
ajustamento de conduta uma obrigação equiparada à sanção de
multa civil, cominada como pressuposto de adequação da conduta do
agente às exigências legais, e que revele compatibilidade com a
jurisprudência torrencial que aplica sanção nos mesmos moldes?
Havendo autorização para o ajustamento de condutas
no campo dos direitos difusos em geral, pensa-se inexistir qualquer
mácula na hipótese.
Ademais, a solução proposta toma em consideração o
parâmetro de controle ditado pelas reiteradas decisões do Poder
Judiciário, de modo que a obrigação cominada é definida com fulcro
também em mais esta fonte do direito, cujos contornos suasórios não
impedem seu cotejo com os demais elementos dignos de ponderação
no caso.
Respeita-se, além de tudo, a indisponibilidade do
interesse tutelado quando, na verdade, de nada se dispôs
considerando o desfecho provável, se de outro modo tratada a
questão.
Certamente, as sanções previstas na lei de improbidade
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9. CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
atrelam-se a um juízo de gravidade da conduta analisada para
conduzir à sua adequada imposição.
E quem primeiro exerce tal juízo senão quem
futuramente formulará a pretensão a ser veiculada na demanda de
improbidade e que, necessariamente contrastando a conduta com as
balizas da proporcionalidade e razoabilidade, define os contornos do
pedido, e pede a aplicação de determinadas sanções com base em tal
valoração?
Por isso, é impróprio falar-se em usurpação da
competência do magistrado para imposição das reprimendas
previstas no art. 12 da Lei n. 8.429/92, afinal, enquanto não exercido
o direito de ação por meio da demanda de improbidade, e
considerando que o exercício da jurisdição é, via de regra, adstrito à
sua provocação pelo interessado, não se pode ter por ofendida a
previsão contida no parágrafo único do referido dispositivo legal.
É adequada, portanto, a solução adotada, quando,
aceitando o desvalor da conduta de pequena monta praticada, o
agente acaba por submeter-se à composição do dano, além de
aceitar que pese sobre si a obrigação de pagamento de valor
equiparado à eventual multa civil, sem que para isso seja necessária
a dispendiosa deflagração de processo judicial.
Por todas essas razões, essencialmente, não se pode
compactuar com o entendimento reinante na doutrina de um
conformismo exacerbado ao simplesmente lançar ao vento a
característica de indisponibilidade do interesse tutelado para declarar,
sem maiores delongas, a total e inexorável impossibilidade de
celebrar ajustamento de condutas com previsão além da convenção
sobre a reparação de dano em atos ímprobos.
Falta certa coragem porque, se de um lado se assevera
a dita impossibilidade estribando-se no ilusório conforto de que uma
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solução satisfatória sempre advirá da demanda própria, por outro
viés não se demonstra qualquer constrangimento em se afirmar como
seria mais prática, rápida, efetiva e adequada a possibilidade de se
admitir inclusive a transação em alguns tipos de atos de improbidade
administrativa, notadamente os de menor lesividade3.
Claro que não se está aqui a advogar a irrestrita adoção
do termo de ajustamento de condutas descurando-se dos parâmetros
próprios da indisponibilidade própria a qualquer direito difuso.
No entanto, partindo do pressuposto de que a previsão
do compromisso de ajustamento nasceu da mitigação da dita
indisponibilidade, deve-se buscar soluções para os casos de atos de
improbidade que já são tidos por algumas cortes como bagatelares,
de forma a proporcionar a reparação da eiva sem que o avanço
proporcionado pela Lei n. 8.429/92 sucumba definitivamente à tese
de que certas condutas sequer constituiriam mínima lesividade a bem
jurídico, a atrair a intervenção do Poder Judiciário.
Nesse passo, revestindo-se na posição de um Ministério
Público resolutivo, como se vem defendendo, não podemos nos furtar
de reconhecer que o desfecho ora proposto conforma-se
perfeitamente ao sistema normativo, sem necessidade de que se
aguarde solução de lege ferenda.
Destarte, devemos sim, arrimados nas lições da
experiência passada, ainda que sem comando expresso e específico,
buscar sempre a solução efetiva e menos dispendiosa visando a
reparação ou a cessação da ameaça aos direitos para os quais o
Ministério Público encontra-se vocacionado, de modo que só assim se
estará dando plena aplicação à eficiência colimada pelo constituinte.
Dessa forma se estará buscando a aplicação da lei com
3
Nesse sentido posicionam-se, por exemplo, Emerson Garcia e Rogério Pacheco Alves (Improbidade
Administrativa, Lumen Juris, 2011, p. 739), e Carlos Frederico Brito dos Santos (Improbidade
Administrativa: Reflexões sobre a Lei nº 8.429/92, Forense, 2002, p. 145).
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11. CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
observância dos fins sociais a que ela se dirige e atentando-se às
exigências do bem comum, conforme preconiza o art. 5º da Lei de
Introdução às Normas do Direito Brasileiro.
Logo, ainda que se cogitasse daquela imprópria
proibição implícita antes refutada, deve-se ter em mente que o apego
a dogmas instituídos encontra o limite de sua função na necessidade
de harmonia e efetividade na aplicação do direito.
Quando se põe em risco a coesão do sistema
normativo, isto é, quando a adoção dos instrumentos
tradicionalmente previstos são incompatíveis com a tutela visada, é
preciso repensar a atuação.
Não é por outro motivo que o desenvolvimento da
teoria da aplicação dos princípios encontra-se em estágio tão evoluído
a ponto de terem estes alcançado inquestionável força normativa
direta e operante.
Não é também por outra razão que a sistemática das
obrigações de fazer evoluiu da insuficiente solução da conversão em
perdas e danos para o atual modelo da tutela específica das
obrigações ou, ao menos, como aqui se propõe, para alcançar
resultado prático equivalente (461 do Código de Processo Civil).
Portanto, pensa-se ser estéril simplesmente fechar-se à
possibilidade ora discutida com supedâneo na singela literalidade de
um dispositivo que nada diz sobre proibição do ajustamento de
condutas na esfera da improbidade administrativa, quando a
aplicação da lei, bem o sabemos, muitas vezes escapa das raias do
insuficiente processo lógico de subsunção, como também nas
ocasiões em que o apego à forma não conduz à realização da
substância que lhe empresta, ao fim, a legitimidade.
Bem vistas e pesadas essas questões, não parece
correto conformar-se com eventual temor de como o Poder Judiciário
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12. CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
eventualmente se comportará diante da adoção do entendimento aqui
defendido.
Por conseguinte, acaso se revele concretizada eventual
tese de nulidade do termo de ajustamento de conduta por imposição
que vá além da simples reparação do dano, cabe buscar pela via
recursal ou recorrendo aos demais meios de atuação institucional
para que a questão seja amplamente debatida por todos os atores
envolvidos no tratamento da chaga da improbidade administrativa.
Também no que tange à aplicação da hipótese de
inelegibilidade prevista na chamada lei da ficha limpa, não há
qualquer empecilho à adoção do entendimento aqui adotado, desde
que o ato ímprobo de que se trata não seja passível de tipificação
como conduta dolosa que importe lesão a patrimônio público e
enriquecimento ilícito, como previsto pelo referido diploma.
Do mesmo modo, é de bom alvitre destacar que
sempre caberá a este Conselho Superior, no exercício pleno de suas
atribuições, verificar a legítima utilização do recurso ao termo de
ajustamento de condutas nos moldes ora propostos, de modo que
não se tem por significativa qualquer chance de sua malversação.
De outro vértice, obviamente, como parâmetro de
interpretação para casos futuros, deve-se considerar que, recusada a
eventual proposta de ajustamento de conduta no que tange à pratica
de atos de improbidade, e sem levar em conta valores ou mesmo a
pequena monta da conduta, a ação correspondente deverá ser
proposta, se for o caso.
Por fim, não se poderia deixar de referir a conformidade
da presente proposta aos objetivos do Plano geral de atuação para o
ano de 2013 desta instituição, cujo objetivo, na área da moralidade
administrativa, é “criar métodos direcionados à análise, tramitação e
condução dos procedimentos administrativos e judiciais, objetivando
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13. CONSELHO SUPERIOR DO MINISTÉRIO PÚBLICO
uma solução eficiente na tutela do patrimônio público e da
moralidade administrativa”.
Compreendem-se nas ações a serem desenvolvidas a
“definição de estratégias para recuperar recursos públicos desviados
e executar sanções”, assim como “detectar e estimular as
experiências bem sucedidas na área da moralidade administrativa”,
esta última aqui prestigiada.
Por derradeiro, ressalvando que a aplicação do
entendimento defendido revela-se consentânea com os atos de
menor repercussão lesiva e que não possam, minimamente, render
ensejo à aplicação da hipótese de inelegibilidade prevista na lei da
ficha limpa, bem como quando não se divise campo fértil para
aplicação das demais reprimendas previstas na lei de improbidade,
conclui-se por adequada a solução empreendida.
Diante dessas razões, afigura-se de rigor a
homologação da promoção de arquivamento, ora submetida à análise
desta Turma.
DECISÃO
Nos termos do Voto-Vista, a Egrégia Segunda Turma
Revisora do Conselho Superior do Ministério Público decidiu pela
homologação da promoção de arquivamento de fls. 50/51, formulada
pelo Promotor de Justiça Doutor Eduardo Sens dos Santos.
Florianópolis, 20 de fevereiro de 2013.
JACSON CORRÊA
Conselheiro Presidente da 2ª Turma Revisora
ALEXANDRE HERCULANO ABREU
Conselheiro Relator
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