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Portos e transportes
marítimos
Professor do IST e Membro da
Comissão Executiva da PSA Sines
Jorge P. d’Almeida
É hoje um lugar comum dizer-se que a globalização não seria possível sem o fenómeno da contentorização. De
facto, foi a redução drástica dos custos de transporte, beneficiando da eficiência portuária associada ao transporte
de carga contentorizada, que potenciou o desenvolvimento de cadeias logísticas à escala mundial, condição sine
qua non da globalização. Este processo alterou substancialmente a geografia portuária, penalizando portos
historicamente importantes como Nova Iorque e Liverpool e favorecendo portos distantes dos grandes centros
populacionais como Felixtowe em Inglaterra, Gioia Tauro em Itália e Laem Chabang na Tailândia. Neste artigo
procura-se desenvolver uma perspectiva histórica do transporte contentorizado, com especial enfoque na operação
portuária, e daí tirar ilações para o desenvolvimento sustentado do sector marítimo europeu.
34
Today it is commonplace to say that globalisation would not be possible without the phenomenon of contain-
erisation. In fact, it was the drastic reduction in transport costs, benefiting from the port efficiency associated
with the transport of containerised cargo, which made the development of logistical chains on a world scale a
condition sine qua non of globalisation. This process has substantially altered port geography, penalising
historically important ports such as New York and Liverpool and favouring ports distant from the major
populational centres like Felixstowe in England, Gioia Tauro in Italy and Laem Chabang in Thailand. This
article seeks to develop an historic perspective of containerised transport, with special focus on port operation,
and to draw conclusions from this to the sustained development of the European maritime sector.
35
1. A caixa que mudou o mundo
Foi há 50 anos, mais precisamente a 26 de
Abril de 1956, que o navio Ideal X, o primeiro
navio porta-contentores, convertido de um pe-
troleiro da Segunda Guerra Mundial, largou de
Newark para Houston com 58 contentores de
alumínio no convés, dando início a uma verda-
deira revolução no transporte de mercadorias.
Mercê do engenho, persistência e tenacidade do
Sr. Malcom McLean, um empresário de camio-
nagem sem conhecimentos de marinha, a ideia
da contentorização tornou-se, assim, realidade.
O argumento económico do Ideal X era imbatí-
vel: o custo de estiva de um navio de carga geral
fraccionada em 1956 era de US$ 5.83 por tonela-
da, enquanto que o custo de estiva do Ideal X
era de US$ 0.16, i.e. 1/36 do primeiro. Contu-
do, foi a guerra do Vietname que veio demons-
trar de forma inequívoca o mérito da contento-
rização, mais de 10 anos após a viagem inaugu-
ral do Ideal X (ver Levinson [2006]).
Como seria de esperar, a oposição mais feroz
à contentorização partiu dos sindicatos da esti-
va. Teddy Gleason, o famoso líder sindicalista
de Nova Iorque, desencadeou uma guerra feroz
contra Malcom McLean porque, dizia ele, a con-
tentorização iria eliminar 30% dos estivadores
em Nova Iorque. Perdeu a luta e falhou na pre-
visão pois, entre 1963 e 1976, a mão-de-obra no
porto de Nova Iorque foi reduzida em 75%.
O crescimento do mercado de contentores tem
sido acompanhado por um aumento progressi-
vo da capacidade dos navios na procura incessan-
te de economias de escala (ver Figura 1). O Emma
Maersk, com uma capacidade de 12 mil TEU,
(contentores equivalentes de 20 pés) foi lançado
ao mar em 2006, ano em que serão movimenta-
dos mais de 400 milhões de TEU, sendo a China
responsável por 26% desse volume.
Figura 1. Evolução dos porta-contentores
A contentorização veio alterar substancial-
mente a geografia portuária. Cidades que eram
grandes centros de comércio marítimo, como
Nova Iorque e Liverpool, perderam esse esta-
tuto a favor de pequenas cidades distantes dos
grandes centros populacionais, como Felixto-
we nos arredores de Londres, Gioia Tauro na
Sicília e Laem Chabang a sul de Banguecoque,
tirando partido de fácil acesso marítimo e ter-
restre e menores custos de investimento e de
exploração. A mesma lógica imparável está em
marcha em Portugal, onde as vantagens do
porto de Sines acabarão por se impor no mer-
cado, permitindo ao porto de Lisboa libertar a
sua zona ribeirinha para fins com maior valor
económico, social e ambiental.
À medida que os portos se afastam dos gran-
des centros populacionais, o transporte multi-
modal assume importância acrescida, sendo que
a combinação marítimo-ferroviária deve ser pri-
36
vilegiada por razões económicas e ambientais
para distâncias superiores a 100-150 km. Infe-
lizmente, a quota de mercado da ferrovia no
transporte de mercadorias na Europa tem vin-
do a diminuir, desde 21% em 1970 para 8% em
2005, o que revela uma grave debilidade da rede
europeia de transportes.
É inquestionável que a redução do frete ma-
rítimo é um factor fundamental no desenvol-
vimento da economia global (ver Krugman
[1995]). A contentorização não só reduz dras-
ticamente o frete marítimo como reduz de for-
ma igualmente drástica o tempo de trânsito e
aumenta a segurança do transporte, factor par-
ticularmente importante no comércio com paí-
ses menos desenvolvidos. A redução do tem-
po de trânsito traduz-se em menores custos de
inventário, tornando possível a produção “just-
-in-time” em que as mercadorias só são produ-
zidas como e quando o cliente necessita. Esta
eficiência, inimaginável antes da contentoriza-
ção, permite cadeias de abastecimento cada vez
mais longas, encorajando fabricantes, distribui-
dores e retalhistas a procurar as soluções mais
competitivas sem barreiras geográficas. A glo-
balização, i.e., a difusão das actividades econó-
micas sem fronteiras nacionais é o resultado
lógico deste processo.
2. A estrutura do frete marítimo
É sabido que há uma relação directa entre os
custos de transporte e o desenvolvimento eco-
nómico. Limao e Venables (2000) argumen-
tam que um aumento de 10% nos custos de
transporte reduz o volume de comércio em
mais de 20% e acrescentam que os custos as-
sociados a infra-estruturas portuárias defi-
cientes podem representar mais de 40% dos
custos de transporte.
Clark, Dollar e Micco (2001) desenvolveram
um modelo econométrico para o Banco Mun-
dial, em que são identificados os factores de-
terminantes do frete marítimo e a sua impor-
tância relativa. Este modelo, baseado em mais
de 300 000 observações por ano, tem a seguinte
expressão:
Frete/ton = k.Da
.Vb
.Fc
.Td
.Ee
.Rf
(1)
Onde:
D = distância
V = valor da carga
F = factor de contentorização
T = volume de tráfego (efeito de escala)
E = eficiência portuária
R = restrições à liberdade de comércio
Os exponentes (coeficientes de elasticidade)
calculados para o comércio marítimo dos Esta-
dos Unidos da América têm os seguintes valo-
res aproximados:
a = 0.20; b = 0.50; c = -0.04;
d = -0.02; e = -0.05; f = 0.06
É razoável admitir que estes valores são re-
presentativos dos coeficientes de elasticidade
noutras zonas do globo, nomeadamente na
Europa. Tomando por exemplo o coeficiente
0.2 relativo à distância, depreende-se que o fre-
te aumentará 20% quando a distância duplica,
o que constitui um resultado razoável.
Sem entrar nos pormenores do modelo eco-
nométrico, é útil destacar o efeito de duas va-
riáveis com especial significado para o comércio
marítimo europeu, em geral, e para o caso por-
tuguês em particular: o volume de tráfego e a
eficiência portuária.
2.1. Efeito de escala
O coeficiente de elasticidade do volume de
tráfego, “d”, leva à conclusão de que um au-
mento de 100% do tráfego resulta numa redu-
ção do frete de apenas 2%. Esta relação traduz
o efeito de um presumível aumento de concor-
rência mas não será válida se o aumento de trá-
fego resultar no aumento significativo da capa-
cidade dos navios utilizados nesse tráfego.
Como se mostra na Figura 1, o custo de trans-
porte de um navio de última geração de 12 mil
TEU é cerca de 60% menor que o custo de um
navio de 2 mil TEU.
A importância do efeito de escala pode en-
tender-se facilmente tendo em conta os seguin-
tes factores:
– Os custos de tripulação, principal compo-
nente dos custos de armamento, são pra-
ticamente insensíveis ao porte do navio.
O maior porta-contentores do mundo, o
37
N/M Emma Maersk, pode operar com ape-
nas 13 tripulantes;
– Os custos de combustível, principal com-
ponente dos custos de viagem, têm uma
relação exponencial com o porte do navio,
com um coeficiente de 0.67;
– Os custos de construção têm uma relação
exponencial com o porte do navio, com
um coeficiente de 0.7 a 0.9.
Quando se considera o impacto do tamanho
do navio nos custos de transporte torna-se evi-
dente a importância de ter portos capazes de
receber os maiores navios-mãe. Até ao apareci-
mento do Terminal XXI de Sines, Portugal não
tinha essa capacidade, enquanto Espanha já dis-
punha de quatro portos sem restrições de aces-
so marítimo: Barcelona, Valência, Algeciras e
Bilbau. A utilização do porto de Sines como
porta marítima para o comércio de carga con-
tentorizada, potencia uma redução drástica dos
custos de transporte para os importadores e
exportadores nacionais.
2.2. Eficiência portuária
O modelo econométrico do Banco Mundial
quantifica a eficiência portuária numa escala lo-
garítmica de 1 a 7, com base em dados publica-
dos no Global Competitiveness Report. Os seguin-
tes dados são relativos a 1999:
Tabela 1. Eficiência portuária
A eficiência portuária é calculada com base
num conjunto de factores que determinam a
qualidade da operação portuária, entre os quais
se inclui o tempo médio de despacho da carga
como se mostra na Tabela 1. Esta tabela con-
firma as conhecidas insuficiências dos portos
portugueses. É interessante notar que se os
portos portugueses melhorarem a sua eficiên-
cia para o nível dos portos do Norte da Euro-
pa, os custos de transporte serão reduzidos
em cerca de 14%.
3. A economia do transhipment
Em 1980 Malcom McLean iniciou uma segun-
da revolução no transporte marítimo de merca-
dorias com o lançamento do primeiro serviço
global, utilizando 12 navios-mãe (“jumbo
econships”) que circulavam o globo em 12 se-
manas no sentido Oeste-Este, oferecendo as-
sim um serviço semanal. Os navios-mãe escala-
vam um número reduzido de portos (“hubs”)
onde a carga era transferida de e para navios mais
pequenos, numa operação de transhipment.
De uma forma geral, a questão do tranship-
ment coloca-se quando uma carga de um porto
de origem (“Po”) para um porto de destino
(“Pd”) não pode ser transportada pelo navio-
-mãe (“Nm”) seja por razões operacionais (e.g.
limitação de calado) ou por razões comerciais
(e.g. tráfego insuficiente em Pd).
Nestas circunstâncias o transportador tem
duas opções: 1) Utiliza um navio mais peque-
no (“Np”) para o transporte directo entre Po e
Pd ou 2) Utiliza um navio feeder (“Nf ”) para o
transporte entre um porto de transhipment
(“Pt”) e Pd, sendo a carga transportada por Nm
entre Po e Pt.
Figura 2. Factores do transhipment
38
É fácil perceber-se que a economia do transhi-
pment depende de dois factores principais:
1) Distância relativa entre os três portos em
questão. Quanto maior for a diferença
d = d1 – d3 mais atraente se torna o transhi-
pment. Se o porto de transhipment não for
também um porto de escala comercial do
navio-mãe, torna-se necessário considerar
o desvio da rota na determinação dos cus-
tos de transhipment.
2) Diferença dos custos unitários de transporte
de Nm, Nf e Np. Tipicamente Nf e Np têm
custos iguais ou semelhantes, enquanto Nm
terá um custo substancialmente menor, be-
neficiando do efeito de escala atrás referido.
O efeito combinado dos dois factores é repre-
sentado graficamente de forma simplificada na
figura seguinte, onde Cm e Cp representam res-
pectivamente os custos unitários do navio-mãe
e dos navios pequenos.
Figura 3. Economia do transhipment.
Na prática, os custos da operação adicional
de estiva no porto de transhipment raramente
permitem que o transhipment puro (i.e. sem car-
ga local) seja viável. Salvo raras excepções, como
Singapura e Gioia Tauro, é a carga local que pre-
cede e justifica o transhipment.
O Terminal XXI em Sines é um exemplo pa-
radigmático da economia do transhipment. A pe-
quena dimensão da economia portuguesa não
justifica a escala de navios-mãe e, por outro lado,
os custos portuários portugueses não são com-
petitivos para atrair o transhipment puro. Contu-
do a combinação do transhipment com carga co-
mercial local tem permitido atrair novos serviços
a Portugal, com inegáveis vantagens para os im-
portadores e exportadores nacionais.
4. Considerações estratégicas
Nos últimos anos tem-se assistido a uma
mudança dramática no mercado internacional
de carga contentorizada.
O notável crescimento do comércio entre a
Europa e a Ásia levou ao aparecimento de por-
ta-contentores cada vez maiores. Há apenas cin-
co anos atrás, os maiores porta-contentores que
operavam nesta rota tinham uma capacidade
de cerca de 5 mil TEU enquanto hoje têm capa-
cidades superiores a 9 mil TEU, tendo a Maer-
sk iniciado este ano a operação de navios com
cerca de 12 mil TEU.
Com navios de maiores dimensões, as li-
nhas de navegação abriram novos serviços que
escalam um número reduzido de portos, co-
nhecidos por hubs, que se situam ou nas rotas
principais ou muito perto destas. Estes por-
tos oferecem grandes áreas para a movimen-
tação de contentores, possuem um grande nú-
mero de equipamentos de movimentação e
é-lhes exigido um elevado grau de eficiência
de modo a promover uma troca rápida de con-
tentores de navios-mãe de grandes dimensões
para navios-mãe mais pequenos (“relay
transhipment”) ou para navios vaivém deno-
minados navios feeder (“hub-and-spoke
transhipment”).
Com os desafios que os novos porta-con-
tentores gigantes colocam às cidades portuá-
rias tradicionais, os países do Mediterrâneo
39
encetaram uma corrida para a construção de
novos terminais com o objectivo de oferece-
rem alternativas mais competitivas. Em 1995,
um hub no sul de Itália entrou em cena e alte-
rou dramaticamente o padrão do comércio no
Mediterrâneo: Gioia Tauro. Tirando partido
de um contrato de concessão com condições
excepcionalmente favoráveis, a Contship Itá-
lia conseguiu atingir uma movimentação de 3
milhões TEU anuais em dez anos, ultrapas-
sando Algeciras como o principal porto no
mediterrâneo.
Desde então, novos hubs entraram no merca-
do do transhipment (Cagliari, Taranto, Port Said,
Suez, Las Palmas), tornando-o extremamente
competitivo. Mais recentemente foram conces-
sionados dois terminais de transhipment em
Tânger, ainda em construção.
Note-se que o transhipment é um custo inter-
no para as linhas de navegação, que cria pouca
mais-valia para a economia local onde o porto
está situado. Além disso, dada a sua volatilida-
de, o transhipment pode ser transferido muito
facilmente de um porto para outro, razão por
que é importante evitar depender exclusiva-
mente deste tipo de tráfego.
5. A política marítima
europeia
Em Junho de 2006, a Comissão Europeia
apresentou o Livre Verde para uma futura polí-
tica marítima da União. É uma iniciativa notá-
vel em que pela primeira vez se efectua uma
análise integrada de todas as actividades maríti-
mas na perspectiva de uma acção coordenada.
O processo de consulta pública que está em
marcha e que terminará a 30 de Junho de 2007,
resultará numa proposta da Comissão para o
caminho a seguir. Deste processo também re-
sultará, presumivelmente, uma maior cons-
ciencialização dos Europeus sobre a importân-
cia dos oceanos no seu futuro.
O Livro Verde baseia-se nas políticas e nas
iniciativas da União Europeia existentes e inse-
re-se no contexto da Estratégia de Lisboa, pro-
curando estabelecer o justo equilíbrio entre as
dimensões económica, social e ambiental do
desenvolvimento sustentável.
No que respeita aos transportes marítimos
e portos, o Livro Verde reconhece que eles
constituem elos-chave das cadeias logísticas,
cuja eficiência e dinamismo são fundamentais
para a competitividade europeia num mundo
cada vez mais global. Correntemente 90% do
comércio externo da União Europeia e mais
de 40% do seu comércio interno é efectuado
por via marítima, dando emprego a cerca de
350 000 trabalhadores nos portos e nos servi-
ços associados, que, no seu conjunto, geram
um valor acrescentado anual de 20 mil milhões
de euros.
Com base na consulta pública e nas avalia-
ções que se seguirão, serão validadas e afinadas
as acções propostas no âmbito do Livro Bran-
co da Comissão Europeia sobre os transpor-
tes, nomeadamente:
– Desenvolvimento de uma política portuá-
ria europeia global;
– Desenvolvimento de acções para reduzir
as emissões poluentes dos transportes por
via marítima;
– Promoção do transporte marítimo de cur-
ta distância e das auto-estradas do mar,
com especial enfoque nas ligações com o
hinterland.
Em relação à última é importante referir que,
por razões geográficas e históricas, o transpor-
te ferroviário de mercadorias é muito mais re-
duzido na Europa do que, por exemplo, nos
EUA. No seu estado actual a ferrovia é um fac-
tor limitativo do desenvolvimento do sector
marítimo-portuário europeu, particularmente
em regiões como a Península Ibérica em que os
sistemas ferroviários nacionais ainda não estão
harmonizados entre si.
A Comissão propõe acelerar os esforços para
a eliminação dos entraves técnicos e operacio-
nais às actividades internacionais de transporte
ferroviário e lançar um programa para a pro-
moção do transporte ferroviário de mercado-
rias, no âmbito de uma política mais vasta de
logística de transportes, que permita competir
com o transporte rodoviário num serviço por-
ta-a-porta respeitador do ambiente. A liberali-
zação progressiva da operação ferroviária de
mercadorias, que teve início em 2003 e será con-
cluída em 2008, poderá contribuir decisivamen-
te para esse objectivo.
40
6. Conclusões e
recomendações
A importância crucial do sector marítimo-
-portuário para o desenvolvimento económico
e social da comunidade europeia e para a pro-
tecção ambiental do espaço europeu é hoje uni-
versalmente reconhecida. É também consensual
que a solução deve passar pela integração de
todos os modos de transporte numa rede trans-
europeia que favoreça o desenvolvimento da
multimodalidade e co-modalidade focalizadas
no transporte porta-a-porta.
Já foram efectuados inúmeros estudos a ní-
vel local, regional, nacional e europeu para iden-
tificar os problemas e oportunidades do sec-
tor marítimo-portuário, dando origem a um
universo muito vasto e complexo, talvez mes-
mo demasiado vasto e complexo, de medidas
a tomar. Em relação a Portugal, a Comissão
Estratégica dos Oceanos apresentou em Mar-
ço de 2004 um relatório inédito e notável em
que se propõe uma visão integrada da impor-
tância dos oceanos para Portugal e se definem
objectivos estratégicos e medidas a tomar para
concretizar essa visão. Mais recentemente, a
Estrutura de Missão para os Assuntos do Mar
(EMAM), constituída no âmbito do Ministé-
rio da Defesa Nacional, propôs um conjunto
de oito Acções Estratégicas que servirão de
base para uma futura Estratégia Nacional para
o Mar, dando seguimento, de certo modo, às
propostas da Comissão Estratégica dos Ocea-
nos. Receia-se que mais estudos, estratégias e
planos de acção se seguirão, com poucos re-
sultados práticos.
Parafraseando Daniel Boorstin, pode afirmar-
-se que o inimigo da sabedoria não é a ignorân-
cia mas sim a ilusão do conhecimento. Por isso
de nada servirão as estratégias e os planos de
acção, por mais brilhantes que sejam, se não
houver pessoas altamente qualificadas para as
implementar. Assim, de todos os desafios so-
bejamente diagnosticados, o mais importante,
sem dúvida, é conseguir atrair recursos huma-
nos de alta qualidade para o sector marítimo-
-portuário, que se possam arvorar como verda-
deiros agentes da mudança. Esta necessidade é
reconhecida no Livro Verde da Comissão, onde
se apontam várias causas para o desinteresse
dos jovens pela actividade marítimo-portuária,
designadamente o condicionalismo da carreira,
o insuficiente potencial de remuneração e o fra-
co prestígio profissional.
Em Portugal, a importância da educação e da
formação no desenvolvimento de uma estraté-
gia nacional é amplamente reconhecida nos re-
latórios da Comissão Estratégica dos Oceanos
e da EMAM. Entre as oito acções estratégicas
propostas por esta última, destacam-se duas:
– Sensibilização e mobilização da sociedade
para a importância do mar;
– Promoção do ensino e divulgação nas es-
colas das actividades ligadas ao mar.
O sucesso destas acções determinará, em larga
medida, o futuro do sector marítimo nacional.
Referências
Clark, X.; Dollar, D. e Micco (2001), “Mariti-
me Costs and Port Efficiency”, The World Bank
Policy Research Working Paper Series nº 2781.
Comissão Estratégica dos Oceanos (2004),
“O Oceano: Um Desígnio Nacional para o Sé-
culo XXI”, Presidência do Conselho de Minis-
tros, Lisboa.
Comissão Europeia, COM (2006) 275, “Li-
vro Verde – Para uma futura política marítima
da União: Uma visão europeia para os oceanos
e os mares”.
Comissão Europeia, COM (2006) 314, “Re-
visão intercalar do Livro Branco da Comissão
de 2001 sobre os Transportes”.
EMAM (2006), “Estratégia Nacional para o
Mar”, Ministério da Defesa Nacional, Lisboa.
Kugman, P., “Growing World Trade: Causes
and Consequences,” Brookings Papers in Econo-
mic Activity nº 1/1995: 341.
Levinson, M., (2006), “The Box – How the
Shipping Container Made the World Smaller
and the World Economy Bigger”, Princeton
University Press.
Limão, N. e Venables, A.J. (1999), “Infras-
tructure, Geographical Disadvantage and Trans-
port Costs”, The World Bank Policy Research
Working Paper Series nº 2257.
UNCTAD secretariad (2005), “Review of
Maritime Transport 2005”, United Nations,
Geneva.

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Portos e transportes marítimos: a revolução da contentorização

  • 1. 33 Portos e transportes marítimos Professor do IST e Membro da Comissão Executiva da PSA Sines Jorge P. d’Almeida É hoje um lugar comum dizer-se que a globalização não seria possível sem o fenómeno da contentorização. De facto, foi a redução drástica dos custos de transporte, beneficiando da eficiência portuária associada ao transporte de carga contentorizada, que potenciou o desenvolvimento de cadeias logísticas à escala mundial, condição sine qua non da globalização. Este processo alterou substancialmente a geografia portuária, penalizando portos historicamente importantes como Nova Iorque e Liverpool e favorecendo portos distantes dos grandes centros populacionais como Felixtowe em Inglaterra, Gioia Tauro em Itália e Laem Chabang na Tailândia. Neste artigo procura-se desenvolver uma perspectiva histórica do transporte contentorizado, com especial enfoque na operação portuária, e daí tirar ilações para o desenvolvimento sustentado do sector marítimo europeu.
  • 2. 34 Today it is commonplace to say that globalisation would not be possible without the phenomenon of contain- erisation. In fact, it was the drastic reduction in transport costs, benefiting from the port efficiency associated with the transport of containerised cargo, which made the development of logistical chains on a world scale a condition sine qua non of globalisation. This process has substantially altered port geography, penalising historically important ports such as New York and Liverpool and favouring ports distant from the major populational centres like Felixstowe in England, Gioia Tauro in Italy and Laem Chabang in Thailand. This article seeks to develop an historic perspective of containerised transport, with special focus on port operation, and to draw conclusions from this to the sustained development of the European maritime sector.
  • 3. 35 1. A caixa que mudou o mundo Foi há 50 anos, mais precisamente a 26 de Abril de 1956, que o navio Ideal X, o primeiro navio porta-contentores, convertido de um pe- troleiro da Segunda Guerra Mundial, largou de Newark para Houston com 58 contentores de alumínio no convés, dando início a uma verda- deira revolução no transporte de mercadorias. Mercê do engenho, persistência e tenacidade do Sr. Malcom McLean, um empresário de camio- nagem sem conhecimentos de marinha, a ideia da contentorização tornou-se, assim, realidade. O argumento económico do Ideal X era imbatí- vel: o custo de estiva de um navio de carga geral fraccionada em 1956 era de US$ 5.83 por tonela- da, enquanto que o custo de estiva do Ideal X era de US$ 0.16, i.e. 1/36 do primeiro. Contu- do, foi a guerra do Vietname que veio demons- trar de forma inequívoca o mérito da contento- rização, mais de 10 anos após a viagem inaugu- ral do Ideal X (ver Levinson [2006]). Como seria de esperar, a oposição mais feroz à contentorização partiu dos sindicatos da esti- va. Teddy Gleason, o famoso líder sindicalista de Nova Iorque, desencadeou uma guerra feroz contra Malcom McLean porque, dizia ele, a con- tentorização iria eliminar 30% dos estivadores em Nova Iorque. Perdeu a luta e falhou na pre- visão pois, entre 1963 e 1976, a mão-de-obra no porto de Nova Iorque foi reduzida em 75%. O crescimento do mercado de contentores tem sido acompanhado por um aumento progressi- vo da capacidade dos navios na procura incessan- te de economias de escala (ver Figura 1). O Emma Maersk, com uma capacidade de 12 mil TEU, (contentores equivalentes de 20 pés) foi lançado ao mar em 2006, ano em que serão movimenta- dos mais de 400 milhões de TEU, sendo a China responsável por 26% desse volume. Figura 1. Evolução dos porta-contentores A contentorização veio alterar substancial- mente a geografia portuária. Cidades que eram grandes centros de comércio marítimo, como Nova Iorque e Liverpool, perderam esse esta- tuto a favor de pequenas cidades distantes dos grandes centros populacionais, como Felixto- we nos arredores de Londres, Gioia Tauro na Sicília e Laem Chabang a sul de Banguecoque, tirando partido de fácil acesso marítimo e ter- restre e menores custos de investimento e de exploração. A mesma lógica imparável está em marcha em Portugal, onde as vantagens do porto de Sines acabarão por se impor no mer- cado, permitindo ao porto de Lisboa libertar a sua zona ribeirinha para fins com maior valor económico, social e ambiental. À medida que os portos se afastam dos gran- des centros populacionais, o transporte multi- modal assume importância acrescida, sendo que a combinação marítimo-ferroviária deve ser pri-
  • 4. 36 vilegiada por razões económicas e ambientais para distâncias superiores a 100-150 km. Infe- lizmente, a quota de mercado da ferrovia no transporte de mercadorias na Europa tem vin- do a diminuir, desde 21% em 1970 para 8% em 2005, o que revela uma grave debilidade da rede europeia de transportes. É inquestionável que a redução do frete ma- rítimo é um factor fundamental no desenvol- vimento da economia global (ver Krugman [1995]). A contentorização não só reduz dras- ticamente o frete marítimo como reduz de for- ma igualmente drástica o tempo de trânsito e aumenta a segurança do transporte, factor par- ticularmente importante no comércio com paí- ses menos desenvolvidos. A redução do tem- po de trânsito traduz-se em menores custos de inventário, tornando possível a produção “just- -in-time” em que as mercadorias só são produ- zidas como e quando o cliente necessita. Esta eficiência, inimaginável antes da contentoriza- ção, permite cadeias de abastecimento cada vez mais longas, encorajando fabricantes, distribui- dores e retalhistas a procurar as soluções mais competitivas sem barreiras geográficas. A glo- balização, i.e., a difusão das actividades econó- micas sem fronteiras nacionais é o resultado lógico deste processo. 2. A estrutura do frete marítimo É sabido que há uma relação directa entre os custos de transporte e o desenvolvimento eco- nómico. Limao e Venables (2000) argumen- tam que um aumento de 10% nos custos de transporte reduz o volume de comércio em mais de 20% e acrescentam que os custos as- sociados a infra-estruturas portuárias defi- cientes podem representar mais de 40% dos custos de transporte. Clark, Dollar e Micco (2001) desenvolveram um modelo econométrico para o Banco Mun- dial, em que são identificados os factores de- terminantes do frete marítimo e a sua impor- tância relativa. Este modelo, baseado em mais de 300 000 observações por ano, tem a seguinte expressão: Frete/ton = k.Da .Vb .Fc .Td .Ee .Rf (1) Onde: D = distância V = valor da carga F = factor de contentorização T = volume de tráfego (efeito de escala) E = eficiência portuária R = restrições à liberdade de comércio Os exponentes (coeficientes de elasticidade) calculados para o comércio marítimo dos Esta- dos Unidos da América têm os seguintes valo- res aproximados: a = 0.20; b = 0.50; c = -0.04; d = -0.02; e = -0.05; f = 0.06 É razoável admitir que estes valores são re- presentativos dos coeficientes de elasticidade noutras zonas do globo, nomeadamente na Europa. Tomando por exemplo o coeficiente 0.2 relativo à distância, depreende-se que o fre- te aumentará 20% quando a distância duplica, o que constitui um resultado razoável. Sem entrar nos pormenores do modelo eco- nométrico, é útil destacar o efeito de duas va- riáveis com especial significado para o comércio marítimo europeu, em geral, e para o caso por- tuguês em particular: o volume de tráfego e a eficiência portuária. 2.1. Efeito de escala O coeficiente de elasticidade do volume de tráfego, “d”, leva à conclusão de que um au- mento de 100% do tráfego resulta numa redu- ção do frete de apenas 2%. Esta relação traduz o efeito de um presumível aumento de concor- rência mas não será válida se o aumento de trá- fego resultar no aumento significativo da capa- cidade dos navios utilizados nesse tráfego. Como se mostra na Figura 1, o custo de trans- porte de um navio de última geração de 12 mil TEU é cerca de 60% menor que o custo de um navio de 2 mil TEU. A importância do efeito de escala pode en- tender-se facilmente tendo em conta os seguin- tes factores: – Os custos de tripulação, principal compo- nente dos custos de armamento, são pra- ticamente insensíveis ao porte do navio. O maior porta-contentores do mundo, o
  • 5. 37 N/M Emma Maersk, pode operar com ape- nas 13 tripulantes; – Os custos de combustível, principal com- ponente dos custos de viagem, têm uma relação exponencial com o porte do navio, com um coeficiente de 0.67; – Os custos de construção têm uma relação exponencial com o porte do navio, com um coeficiente de 0.7 a 0.9. Quando se considera o impacto do tamanho do navio nos custos de transporte torna-se evi- dente a importância de ter portos capazes de receber os maiores navios-mãe. Até ao apareci- mento do Terminal XXI de Sines, Portugal não tinha essa capacidade, enquanto Espanha já dis- punha de quatro portos sem restrições de aces- so marítimo: Barcelona, Valência, Algeciras e Bilbau. A utilização do porto de Sines como porta marítima para o comércio de carga con- tentorizada, potencia uma redução drástica dos custos de transporte para os importadores e exportadores nacionais. 2.2. Eficiência portuária O modelo econométrico do Banco Mundial quantifica a eficiência portuária numa escala lo- garítmica de 1 a 7, com base em dados publica- dos no Global Competitiveness Report. Os seguin- tes dados são relativos a 1999: Tabela 1. Eficiência portuária A eficiência portuária é calculada com base num conjunto de factores que determinam a qualidade da operação portuária, entre os quais se inclui o tempo médio de despacho da carga como se mostra na Tabela 1. Esta tabela con- firma as conhecidas insuficiências dos portos portugueses. É interessante notar que se os portos portugueses melhorarem a sua eficiên- cia para o nível dos portos do Norte da Euro- pa, os custos de transporte serão reduzidos em cerca de 14%. 3. A economia do transhipment Em 1980 Malcom McLean iniciou uma segun- da revolução no transporte marítimo de merca- dorias com o lançamento do primeiro serviço global, utilizando 12 navios-mãe (“jumbo econships”) que circulavam o globo em 12 se- manas no sentido Oeste-Este, oferecendo as- sim um serviço semanal. Os navios-mãe escala- vam um número reduzido de portos (“hubs”) onde a carga era transferida de e para navios mais pequenos, numa operação de transhipment. De uma forma geral, a questão do tranship- ment coloca-se quando uma carga de um porto de origem (“Po”) para um porto de destino (“Pd”) não pode ser transportada pelo navio- -mãe (“Nm”) seja por razões operacionais (e.g. limitação de calado) ou por razões comerciais (e.g. tráfego insuficiente em Pd). Nestas circunstâncias o transportador tem duas opções: 1) Utiliza um navio mais peque- no (“Np”) para o transporte directo entre Po e Pd ou 2) Utiliza um navio feeder (“Nf ”) para o transporte entre um porto de transhipment (“Pt”) e Pd, sendo a carga transportada por Nm entre Po e Pt. Figura 2. Factores do transhipment
  • 6. 38 É fácil perceber-se que a economia do transhi- pment depende de dois factores principais: 1) Distância relativa entre os três portos em questão. Quanto maior for a diferença d = d1 – d3 mais atraente se torna o transhi- pment. Se o porto de transhipment não for também um porto de escala comercial do navio-mãe, torna-se necessário considerar o desvio da rota na determinação dos cus- tos de transhipment. 2) Diferença dos custos unitários de transporte de Nm, Nf e Np. Tipicamente Nf e Np têm custos iguais ou semelhantes, enquanto Nm terá um custo substancialmente menor, be- neficiando do efeito de escala atrás referido. O efeito combinado dos dois factores é repre- sentado graficamente de forma simplificada na figura seguinte, onde Cm e Cp representam res- pectivamente os custos unitários do navio-mãe e dos navios pequenos. Figura 3. Economia do transhipment. Na prática, os custos da operação adicional de estiva no porto de transhipment raramente permitem que o transhipment puro (i.e. sem car- ga local) seja viável. Salvo raras excepções, como Singapura e Gioia Tauro, é a carga local que pre- cede e justifica o transhipment. O Terminal XXI em Sines é um exemplo pa- radigmático da economia do transhipment. A pe- quena dimensão da economia portuguesa não justifica a escala de navios-mãe e, por outro lado, os custos portuários portugueses não são com- petitivos para atrair o transhipment puro. Contu- do a combinação do transhipment com carga co- mercial local tem permitido atrair novos serviços a Portugal, com inegáveis vantagens para os im- portadores e exportadores nacionais. 4. Considerações estratégicas Nos últimos anos tem-se assistido a uma mudança dramática no mercado internacional de carga contentorizada. O notável crescimento do comércio entre a Europa e a Ásia levou ao aparecimento de por- ta-contentores cada vez maiores. Há apenas cin- co anos atrás, os maiores porta-contentores que operavam nesta rota tinham uma capacidade de cerca de 5 mil TEU enquanto hoje têm capa- cidades superiores a 9 mil TEU, tendo a Maer- sk iniciado este ano a operação de navios com cerca de 12 mil TEU. Com navios de maiores dimensões, as li- nhas de navegação abriram novos serviços que escalam um número reduzido de portos, co- nhecidos por hubs, que se situam ou nas rotas principais ou muito perto destas. Estes por- tos oferecem grandes áreas para a movimen- tação de contentores, possuem um grande nú- mero de equipamentos de movimentação e é-lhes exigido um elevado grau de eficiência de modo a promover uma troca rápida de con- tentores de navios-mãe de grandes dimensões para navios-mãe mais pequenos (“relay transhipment”) ou para navios vaivém deno- minados navios feeder (“hub-and-spoke transhipment”). Com os desafios que os novos porta-con- tentores gigantes colocam às cidades portuá- rias tradicionais, os países do Mediterrâneo
  • 7. 39 encetaram uma corrida para a construção de novos terminais com o objectivo de oferece- rem alternativas mais competitivas. Em 1995, um hub no sul de Itália entrou em cena e alte- rou dramaticamente o padrão do comércio no Mediterrâneo: Gioia Tauro. Tirando partido de um contrato de concessão com condições excepcionalmente favoráveis, a Contship Itá- lia conseguiu atingir uma movimentação de 3 milhões TEU anuais em dez anos, ultrapas- sando Algeciras como o principal porto no mediterrâneo. Desde então, novos hubs entraram no merca- do do transhipment (Cagliari, Taranto, Port Said, Suez, Las Palmas), tornando-o extremamente competitivo. Mais recentemente foram conces- sionados dois terminais de transhipment em Tânger, ainda em construção. Note-se que o transhipment é um custo inter- no para as linhas de navegação, que cria pouca mais-valia para a economia local onde o porto está situado. Além disso, dada a sua volatilida- de, o transhipment pode ser transferido muito facilmente de um porto para outro, razão por que é importante evitar depender exclusiva- mente deste tipo de tráfego. 5. A política marítima europeia Em Junho de 2006, a Comissão Europeia apresentou o Livre Verde para uma futura polí- tica marítima da União. É uma iniciativa notá- vel em que pela primeira vez se efectua uma análise integrada de todas as actividades maríti- mas na perspectiva de uma acção coordenada. O processo de consulta pública que está em marcha e que terminará a 30 de Junho de 2007, resultará numa proposta da Comissão para o caminho a seguir. Deste processo também re- sultará, presumivelmente, uma maior cons- ciencialização dos Europeus sobre a importân- cia dos oceanos no seu futuro. O Livro Verde baseia-se nas políticas e nas iniciativas da União Europeia existentes e inse- re-se no contexto da Estratégia de Lisboa, pro- curando estabelecer o justo equilíbrio entre as dimensões económica, social e ambiental do desenvolvimento sustentável. No que respeita aos transportes marítimos e portos, o Livro Verde reconhece que eles constituem elos-chave das cadeias logísticas, cuja eficiência e dinamismo são fundamentais para a competitividade europeia num mundo cada vez mais global. Correntemente 90% do comércio externo da União Europeia e mais de 40% do seu comércio interno é efectuado por via marítima, dando emprego a cerca de 350 000 trabalhadores nos portos e nos servi- ços associados, que, no seu conjunto, geram um valor acrescentado anual de 20 mil milhões de euros. Com base na consulta pública e nas avalia- ções que se seguirão, serão validadas e afinadas as acções propostas no âmbito do Livro Bran- co da Comissão Europeia sobre os transpor- tes, nomeadamente: – Desenvolvimento de uma política portuá- ria europeia global; – Desenvolvimento de acções para reduzir as emissões poluentes dos transportes por via marítima; – Promoção do transporte marítimo de cur- ta distância e das auto-estradas do mar, com especial enfoque nas ligações com o hinterland. Em relação à última é importante referir que, por razões geográficas e históricas, o transpor- te ferroviário de mercadorias é muito mais re- duzido na Europa do que, por exemplo, nos EUA. No seu estado actual a ferrovia é um fac- tor limitativo do desenvolvimento do sector marítimo-portuário europeu, particularmente em regiões como a Península Ibérica em que os sistemas ferroviários nacionais ainda não estão harmonizados entre si. A Comissão propõe acelerar os esforços para a eliminação dos entraves técnicos e operacio- nais às actividades internacionais de transporte ferroviário e lançar um programa para a pro- moção do transporte ferroviário de mercado- rias, no âmbito de uma política mais vasta de logística de transportes, que permita competir com o transporte rodoviário num serviço por- ta-a-porta respeitador do ambiente. A liberali- zação progressiva da operação ferroviária de mercadorias, que teve início em 2003 e será con- cluída em 2008, poderá contribuir decisivamen- te para esse objectivo.
  • 8. 40 6. Conclusões e recomendações A importância crucial do sector marítimo- -portuário para o desenvolvimento económico e social da comunidade europeia e para a pro- tecção ambiental do espaço europeu é hoje uni- versalmente reconhecida. É também consensual que a solução deve passar pela integração de todos os modos de transporte numa rede trans- europeia que favoreça o desenvolvimento da multimodalidade e co-modalidade focalizadas no transporte porta-a-porta. Já foram efectuados inúmeros estudos a ní- vel local, regional, nacional e europeu para iden- tificar os problemas e oportunidades do sec- tor marítimo-portuário, dando origem a um universo muito vasto e complexo, talvez mes- mo demasiado vasto e complexo, de medidas a tomar. Em relação a Portugal, a Comissão Estratégica dos Oceanos apresentou em Mar- ço de 2004 um relatório inédito e notável em que se propõe uma visão integrada da impor- tância dos oceanos para Portugal e se definem objectivos estratégicos e medidas a tomar para concretizar essa visão. Mais recentemente, a Estrutura de Missão para os Assuntos do Mar (EMAM), constituída no âmbito do Ministé- rio da Defesa Nacional, propôs um conjunto de oito Acções Estratégicas que servirão de base para uma futura Estratégia Nacional para o Mar, dando seguimento, de certo modo, às propostas da Comissão Estratégica dos Ocea- nos. Receia-se que mais estudos, estratégias e planos de acção se seguirão, com poucos re- sultados práticos. Parafraseando Daniel Boorstin, pode afirmar- -se que o inimigo da sabedoria não é a ignorân- cia mas sim a ilusão do conhecimento. Por isso de nada servirão as estratégias e os planos de acção, por mais brilhantes que sejam, se não houver pessoas altamente qualificadas para as implementar. Assim, de todos os desafios so- bejamente diagnosticados, o mais importante, sem dúvida, é conseguir atrair recursos huma- nos de alta qualidade para o sector marítimo- -portuário, que se possam arvorar como verda- deiros agentes da mudança. Esta necessidade é reconhecida no Livro Verde da Comissão, onde se apontam várias causas para o desinteresse dos jovens pela actividade marítimo-portuária, designadamente o condicionalismo da carreira, o insuficiente potencial de remuneração e o fra- co prestígio profissional. Em Portugal, a importância da educação e da formação no desenvolvimento de uma estraté- gia nacional é amplamente reconhecida nos re- latórios da Comissão Estratégica dos Oceanos e da EMAM. Entre as oito acções estratégicas propostas por esta última, destacam-se duas: – Sensibilização e mobilização da sociedade para a importância do mar; – Promoção do ensino e divulgação nas es- colas das actividades ligadas ao mar. O sucesso destas acções determinará, em larga medida, o futuro do sector marítimo nacional. Referências Clark, X.; Dollar, D. e Micco (2001), “Mariti- me Costs and Port Efficiency”, The World Bank Policy Research Working Paper Series nº 2781. Comissão Estratégica dos Oceanos (2004), “O Oceano: Um Desígnio Nacional para o Sé- culo XXI”, Presidência do Conselho de Minis- tros, Lisboa. Comissão Europeia, COM (2006) 275, “Li- vro Verde – Para uma futura política marítima da União: Uma visão europeia para os oceanos e os mares”. Comissão Europeia, COM (2006) 314, “Re- visão intercalar do Livro Branco da Comissão de 2001 sobre os Transportes”. EMAM (2006), “Estratégia Nacional para o Mar”, Ministério da Defesa Nacional, Lisboa. Kugman, P., “Growing World Trade: Causes and Consequences,” Brookings Papers in Econo- mic Activity nº 1/1995: 341. Levinson, M., (2006), “The Box – How the Shipping Container Made the World Smaller and the World Economy Bigger”, Princeton University Press. Limão, N. e Venables, A.J. (1999), “Infras- tructure, Geographical Disadvantage and Trans- port Costs”, The World Bank Policy Research Working Paper Series nº 2257. UNCTAD secretariad (2005), “Review of Maritime Transport 2005”, United Nations, Geneva.