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SALAM, A. HEISENBERG, W. DIRAC, P.A.M. A Unificação das Forças
Fundamentais: O grande desafio da física contemporânea. Rio de Janeiro: Jorge Zahar,
1993.
Resumo por: Carlos Jorge Burke – www.cburke.com.br
OBS: Se desejar, solicitar arquivo pelo blog.

“Introdução, nota 5. F.J. Dyson, no belo livro que acaba de lançar, Infinito em todas as
direções: do gene à conquista do Universo [São Paulo, Best Seller, 1989], diz o
seguinte sobre a segunda idéia de Dirac: “Hoje podemos dizer que, em geral, os maiores
cientistas em todas as disciplinas são unificadores. Isto especialmente verdadeiro na
física. Newton e Einstein foram insuperáveis como unificadores. Os grandes triunfos da
física foram triunfos de unificação. Chegamos quase a considerar ponto pacífico que o
caminho do progresso na física será uma unificação cada vez mais ampla, que
introduzirá um número crescente de fenômenos no âmbito de uns poucos princípios
fundamentais. Einstein tinha tal confiança na correção dessa rota que no fim da vida,
não manifestava quase nenhum interesse pelas descobertas experimentais que
começavam então a tornar o mundo da física mais complicado. É difícil encontrar entre
físicos oposições sérias à unificação”.” (pág. 55s).

“A terceira pessoa a mencionar neste contexto é Isaac Newton. Por volta de 1680, ele
afirmou que a força da gravidade "terrestre" (que faz as maçãs caírem no chão, e que na
visão de Newton era uma força universal) era a mesma coisa que a gravidade "celeste"
(a força que mantém os planetas em movimento em volta do Sol). É uma força de
grande alcance. Seus efeitos podem ser sentidos a qualquer distância, embora atenuados
pelo quadrado da distância entre os dois objetos “gravitantes” em questão.
Newton introduziu uma nova constante fundamental da natureza, G, que caracteriza a
intensidade da força gravitacional A constante G tem uma magnitude muito pequena.
A gravidade é sempre atrativa, ao contrário de outras forças da natureza que, como
veremos, podem ser tanto repulsivas quanto atrativas. Isto lhe confere a vantagem de ser
uma força que sempre soma.” (pág. 14s).

“A unificação de forças fundamentais seguinte foi proposta cerca de 150 anos depois.
Quero evocar Faraday e Ampêre no contexto do eletromagnetismo - a “força da vida"
(assim chamada porque toda ligação química é de origem eletromagnética, o que se
aplica a todos os fenômenos de impulsos nervosos).
Antes da década de 1820, a eletricidade e o magnetismo eram considerados duas forças
distintas. Faraday e Ampêre, na maior unificação dos tempos modernos, foram os
primeiros a mostrar que ambos não passavam de dois aspectos de uma única força - o
eletro-magnetismo. Se considerarmos um objeto eletricamente carregado, um elétron,
por exemplo, poderemos detectar (pondo um outro elétron perto dele) uma força elétrica
de repulsão. Mas, assim que o primeiro elétron se movimenta, vamos encontrar também
uma força magnética que não estava ali antes. Essa força pode ser detectada por seu
efeito sobre uma agulha magnética posta perto do elétron que se move.
O que distingue a eletricidade do magnetismo é portanto uma questão de ponto de vista
- a saber, o fato de a carga elétrica estar em movimento ou não. Esta é a essência da
unificação da eletricidade e do magnetismo. (Antecipando, quero dizer que
encontraremos um fator ambiental similar, a temperatura do universo primitivo, no
contexto de uma outra unificação - a do eletromagnetismo com a força nuclear fraca.)
A unificação das duas forças fundamentais antes dissociadas da eletricidade e do
magnetismo foi a base da tecnologia da corrente elétrica do século XIX, que usava, para
gerar correntes elétricas, a rotação de uma bobina entre os dois pólos de um magneto.
Esta foi a base dos motores elétricos e dos dínamos elétricos que levaram às usinas de
energia elétrica. Estas foram tornadas possíveis pela notável união de duas das forças
diversas da natureza. Não me parece que com tentativas improvisadas teria sido jamais
possível gerar a base quantitativa desse desenvolvimento.” (pág. 15s).

“O eletromagnetismo clássico chegou a seu ápice 50 anos mais tarde no trabalho de
Maxwell, que mostrou que, se uma carga elétrica fosse acelerada (isto é, se houvesse
uma mudança em sua velocidade), emitiria energia na forma de radiação
eletromagnética (ondas de rádio, ondas de calor, raios luminosos, raios X e raios gama,
que só diferem uns dos outros em seus comprimentos de onda). Essa unificação
maravilhosa foi a base da tecnologia do século XX, com o rádio, a televisão e os raios X
dominando nossas vidas.
Maxwell unificou a óptica com o eletromagnetismo. O que há de mais notável nessa
unificação, do ponto de vista teórico, é que ele tinha apenas um número para guiá-lo.
Usando uma aparelhagem bastante rudimentar, verificou que a velocidade da luz podia
ser expressa em termos de duas constantes conhecidas (que expressavam propriedades
elétricas e magnéticas do vácuo), tal como fora previsto por sua teoria. Esta era uma
confirmação "indireta" de suas idéias. Infelizmente ele morreu com apenas 48 anos, não
tendo vivido o bastante para ver a radiação eletromagnética produzida por cargas
elétricas aceleradas - o que foi demonstrado por Hertz na Alemanha, cerca de dez anos
após sua morte.” (pág. 16).

“Finalmente, isto nos conduz a Einstein, que foi responsável por várias idéias
unificadoras de grande alcance. Sua teoria da relatividade especial (1905) situa o espaço
e o tempo em pé de igualdade. Uma conseqüência desse trabalho foi a fórmula da
dilatação do tempo, segundo a qual quanto mais depressa um corpo se move, mais longa
é sua vida - do ponto de vista de um observador estacionário. Este fenômeno particular
pode ser observado todos os dias, com a maior precisão possível, no CERN: em
Genebra, onde uma partícula como o múon, com um tempo de vida definido (tal como
medido por qualquer observador que se movimente com a partícula), parece a nós,
observadores estacionários, viver cada vez mais tempo, à medida que sua velocidade se
aproxima da velocidade da luz. O segredo da longevidade, portanto, é permanecer em
movimento!
Outra conseqüência da teoria especial da relatividade de Einstein é uma bem conhecida
relação entre massa e energia, expressa na famosa equação E=mc², onde c é a
velocidade da luz, m é a massa da partícula em movimento e E é sua energia.” (pág.
16s).

“Einstein foi ainda mais longe em sua teoria da relatividade geral (1915). Realizou uma
geometrização da física no sentido de que, em sua teoria, a curvatura do espaço e tempo
determinava a gravitação. Curvatura é uma noção geométrica, ao passo que a gravitação
é uma das forças fundamentais da natureza. Por um golpe de gênio, Einstein identificou
as duas, levando assim a cabo a geometrização da física.
Esta era uma idéia nova para a maioria das pessoas na época de Einstein, mas seu
pensamento não deixava de ter algum precedente. Cerca de cem anos antes, Gauss
também pensara que o espaço talvez fosse curvo. Chegou a fazer experimentos para
testar isso: instalou estações de observação no alto de três montanhas, distantes algumas
milhas entre si. Mediu os ângulos feitos por raios de luz refletidos de uma estação para a
outra de modo a formar um triângulo. Se os ângulos do triângulo somassem menos (ou
mais) de 1800, teria provado que o espaço era curvo.
Encontrou um resultado nulo - a soma dos ângulos que mediu era 180°. Hoje sabemos
que isso aconteceu porque Gauss estava trabalhando com distâncias de apenas algumas
milhas, não com as distâncias estelares em que a curvatura do espaço-tempo se
manifesta.” (pág. 17s).

“A teoria da gravidade de Einstein fez reviver a idéia de que espaço e tempo eram
curvos. Os passos subseqüentes foram dados pelo astro físico russo Friedmann, que
considerou a estrutura total do universo e descobriu que um universo em expansão
podia aparecer como uma solução das equações de Einstein. Isto foi experimentalmente
confirmado por Hubble, que verificou que galáxias distantes estão se afastando de nós,
precisamente de acordo com essas idéias.
Em 1965, Penzias e Wilson descobriram, por acaso, uma radiação de fundo com
temperatura de 3°Kelvin (-270°C), que aparentemente permeia a totalidade do espaço.
Isso foi interpretado como uma radiação surgida 2 x 10 (elevado a 5) anos (= 10
(elevado a 13) segundos) depois do início da vida do universo. A expansão do universo
teria resfriado a radiação, entre o momento em que fora gerada e o de sua detecção, na
atualidade (10 (elevado a 10) anos depois do início do “tempo”).
Extrapolando para trás, a partir dos 2 x 10 (elevado a 5) anos, chegaríamos
(especulativamente) ao momento em que o universo teve início, o momento do
chamado Hot Bang (ou Big Bang).” (pág. 18).

“Depois dos êxitos da teoria da relatividade geral e do modo como explica a gravitação,
em termos de espaço e tempo, Einstein começou a conjecturar se haveria uma ligação
entre a gravidade e o eletromagnetismo em particular, indagava ele, seria possível ver
também o eletromagnetismo como uma propriedade geométrica do espaço-tempo, o que
uniria as duas forças da natureza'? Essas duas forças obedecem à mesma lei do inverso
do quadrado, embora suas intensidades, a distâncias comparáveis, sejam imensamente
diferentes.
Alguns anos antes, Faraday realizara experimentos para tentar encontrar uma unidade
entre a eletricidade e a gravidade (newtoniana). Usando pesos, que supunha serem
suficientemente grandes, em queda livre, esperava detectar uma corrente elétrica que
seria revelada por um galvanômetro próximo.
Faraday não encontrou efeito algum. Escreveu em seu diário:

Aqui terminam minhas tentativas, por ora. Os resultados são negativos. Eles não abalam minha forte
crença na existência de uma relação entre gravidade e eletricidade, embora não forneçam prova alguma
de que tal relação existe.

Sendo um experimentador extremamente meticuloso, Faraday registrou os resultados
que obteve, sem se deixar influenciar por suas tendenciosidades teóricas. Atualmente,
pensa-se que o efeito que Faraday buscava devia existir, e talvez já tenha até sido visto,
mas que se manifestaria mais convincentemente em experimentos cosmológicos, em
que os pesos a serem lançados em queda livre seriam de tamanhos estelares.
Essa unificação da relatividade geral e do eletromagnetismo foi o sonho que Einstein
alimentou e no qual trabalhou durante boa parte de sua maturidade. Dedicou 35 anos a
esse problema, e acreditamos que, ao fim, não teve êxito. Isto talvez explique por que
Dirac, em 1968, fez uma avaliação negativa sobre a possibilidade da unificação das
forças fundamentais.” (pág. 20s).
“Uma tentativa nessa direção, entretanto, merece ser mencionada. Trata-se da que foi
feita por Kaluza e elaborada mais tarde por Klein. Kaluza enviou a Einstein um artigo -
em 1919, creio - em que dava o passo audacioso de propor que, para efeitos de uma
unificação (geométrica) do eletromagnetismo com a gravitação, era preciso considerar
um espaço-tempo com cinco dimensões. Kaluza verificou que a curvatura
correspondente à dimensão extra (a quinta) origina a força eletromagnética, assim
como, nas três dimensões comuns do espaço, a curvatura mais o tempo dão origem à
gravidade.
Que são cinco dimensões'? Imagine-se olhando para um lápis de uma distância bem
grande. Dessa distância, o lápis parece uma linha fina - unidimensional - e não se
percebe que é de fato um pequeno cilindro, com uma superfície bidimensional. Da
mesma maneira, cinco dimensões podem parecer apenas quatro, se a quinta for
minúscula. (Klein, na verdade, propôs que a dimensão extra devia estar enroscada num
comprimento de cerca de 10 (elevado a -33) cm (o comprimento de Planck), de tal
modo que a curvatura correspondente à quinta dimensão devesse corresponder à
magnitude ·”correta” de carga elétrica (isto é, a unidade de carga do próton).
Kaluza enviou seu artigo para Einstein, incumbindo-o de encaminhar para publicação.
Einstein (embora a princípio tenha gostado da idéia de uma dimensão extra, não
percebida) teve dúvidas. O resultado foi que, por causa dele, a publicação do texto
acabou sendo adiada por dois anos. Kaluza sentiu-se tão infeliz que abandonou a física
fundamental e, ao que parece, começou a trabalhar na teoria da natação. A moral desta
história, a meu ver, é: quando tiver uma idéia razoável, não a envie a um grande
homem; publique-a você mesmo.
Antecipando observações que farei mais tarde, quero mencionar que está havendo um
retorno, em nossos dias, às idéias de Kaluza-Klein e que isto é decisivo para nossa
possível Teoria de Tudo. Na teoria das supercordas, por exemplo, começamos
pressupondo dez dimensões. Dessas dez, quatro são as dimensões conhecidas do
espaço-tempo, enquanto as outras estão compactadas em pequenos tamanhos de Planck
de 10(elevado a -33) cm, de modo a acomodar tanto o eletromagnetismo quanto as
forças nucleares. Deste modo, todas estas forças poderiam se combinar com a
gravitação em uma força fundamental.” (pág. 20s).

“Até o momento, falei sobretudo sobre a gravidade e o eletromagnetismo, as únicas
forças físicas conhecidas até a primeira parte deste século.
Agora devo falar das outras forças, as duas forças nucleares - que foram descobertas
neste século e que Einstein (e, sob este aspecto, Dirac) ignorou sistematicamente.
As forças nucleares são de dois tipos, as chamadas “fracas” e as “fortes”. Antes de
discuti-las, será preciso saber alguma coisa sobre as entidades elementares que
interagem através dessas forças.
O conceito de elementaridade da matéria é algo que evoluiu com o passar do tempo.
Das quatro entidades “elementares” dos gregos, três (terra, água e ar) poderiam ser
chamadas de entidades “elementares” da matéria, ao passo que a quarta (fogo)
representava uma força. Se estivéssemos trabalhando, digamos, em 1888,
conceberíamos os átomos como as partículas fundamentais, e a química seria, na época,
a ciência das partículas elementares.
(...).
Há um fato decisivo relacionado com essas forças nucleares fortes øi seu pequeno
alcance. Se prótons e nêutrons estiverem separados por uma distância de mais de 10,13
em, a força nuclear forte é essencialmente zero. A distâncias maiores, resta apenas a
força eletromagnética (entre prótons), além, é claro, da força universal da gravidade.”
(pág. 22).

“Pesquisas posteriores (feitas por Hofstadter por volta de 1956) mostraram que era
plausível que os prótons e os nêutrons, eles mesmos, não fossem partículas pontuais
elementares, mas tivessem um tamanho finito, sendo portanto compostos. Hoje, graças
às descobertas feitas no SLAC (Stanford Linear Accelerator Centre) acreditamos que
são feitos de objetos ainda menores, chamados quarks, que talvez sejam, eles próprios,
elementares e pontuais - idéia introduzida em 1963 por Gell-Mann e Zweig.” (pág. 23s).

“Isto nos traz à famosa equação de Dirac. formulada pela primeira vez em 1927. para
elétrons. Essa equação pode igualmente descrever entidades elementares como elétrons
livres ou quarks livres, ou até mesmo entidades compostas livres como prótons e
nêutrons (livres, quando não estão interagindo com objetos similares).
O primeiro ponto importante sobre a equação é que, embora tenha sido formulada com
base unicamente na teoria especial da relatividade de Einstein e na mecânica quântica,
ela foi capaz de descrever tanto o "spin intrínseco correto" como a “helicidade” (ou
“quiralidade”) dos elétrons.
Na mecânica quântica, o “spin intrínseco", ou simplesmente spin, é um conceito de
grande importância. Significa que cada porção de matéria (ou de energia) se comporta
como um pião girando, possuindo portanto um spin intrínseco.
Em seguida, a helicidade (helicity ou handedness) é definida com relação à direção de
movimento de uma partícula, como a componente do spin que tem essa mesma direção
ou a oposta.
(...).
De onde vem o spin ? A resposta de Dirac foi: da união da relatividade especial de
Einstein com a mecânica quântica!
(...).
O segundo ponto a ressaltar na equação de Dirac é que ela prevê que cada partícula tem
uma antipartícula - com massa e spin iguais, mas carga elétrica oposta (se tiver alguma).
Além disso, uma partícula carregada e sua antipartícula podem se destruir uma à outra;
o excedente de energia vai então para a produção de fótons (y's).
Como disse, Dirac chegou a essa equação na tentativa de unificar a mecânica quântica e
a relatividade especial. Descobriu que sua equação, assim como descrevia partículas de
energia positiva, descrevia também objetos com energia “negativa”.
Ora, ninguém jamais vira tais objetos com energia negativa.· Seu comportamento seria o
das mulas proverbiais: quando os puxamos para a frente, andam para trás! Na teoria
quântica, não havia como se livrar, por decreto, desses objetos com energia negativa.
Era preciso encontrar uma nova explicação para eles.
(...).
Que reinterpretação propôs Dirac para que as soluções de energia negativa fizessem
sentido? Seu passo decisivo foi considerar o estado mais baixo possível de energia -
aquele em que todos os estados de energia negativa estão preenchidos com elétrons -
como sendo o estado em que nenhuma partícula é observada (o chamado estado de
“vácuo”). A partir disso, podia interpretar qualquer buraco não preenchido em estados
de energia negativa como positivo - o que chamou de anti elétrons (ou pósitrons).
Tudo nesta interpretação é coerente - mesmo no caso em que um campo elétrico externo
está presente. Não é difícil ver que, nesta reinterpretação, o antielétron (isto é, um
buraco negativamente carregado de energia negativa) expressaria um “pósitron” de
carga elétrica positiva e energia positiva.
Foi por esta razão que Dirac pôde prever a existência de uma nova partícula, o pósitron
- a antipartícula do elétron. Esta foi efetivamente descoberta um ano depois que sua
existência foi postulada por Dirac. Fo um grande triunfo, mas triunfo experimental
ainda maior foi a produção de antiprótons, por Segrê e Chamberlain, em 1956, e a
produção posterior de antidêuterons (compostos) por Zichichi e seus colaboradores, em
1965.” (pág. 24ss).

“A equação de Dirac e sua bem-sucedida reinterpretação foi um dos maiores feitos da
física do século XX. Isto deu lugar a uma exaltação sem limites desse físico, que a
história que contarei a seguir vai ilustrar (foi algo que testemunhei pessoalmente, na
conferência Solvay de 1961). A história envolve Feynman - o maior físico de minha
geração -, que, segundo creio, fez a primeira das conferências Dirac.
Aqueles dos senhores que freqüentaram as antigas conferências Solvay hão de se
lembrar que, naquelas ocasiões, as pessoas se sentavam ao longo de mesas compridas.
arrumadas como para uma oração. Como numa assembléia quaker, não havia agenda
fixa; a expectativa - raras vezes frustrada - era a de que alguém se sentiria impelido a
dar início à discussão, espontaneamente. Na conferência Solvay de 1961, eu estava
sentado ao lado de Dirac, esperando que a sessão começasse, quando Feynman chegou e
sentou-se em frente. Estendeu a mão e disse: “Sou Feynman”. Dirac estendeu a sua e
disse: "Sou Dirac". (Ao que parece, era a primeira vez que se apresentavam
formalmente, pelo menos durante aquela conferência.) Fez-se um silêncio, o que. da
parte de Feynman, era algo de bastante inusitado. Finalmente este último, como um
menino de escola diante de um professor, disse a Dirac: “Deve ter sido bom ter
inventado aquela equação”; - “Mas isso foi há muito tempo", Dirac respondeu. Novo
silêncio. Para quebrá-lo, Dirac - logo quem - perguntou a Feynman: "E o senhor, em
que está trabalhando?". Resposta de Feynman: "Teoria do méson". E Dirac: "Está
tentando inventar uma equação similar?". "Isso seria muito difícil", respondeu
Feynman, diante do que Dirac observou, com uma voz ansiosa: "Mas é preciso tentar".
A essa altura a conversa acabou, porque a reunião tinha começado.
Esta foi, portanto, uma das grandes contribuições de Dirac para a teoria das partículas
elementares: sua famosa equação, capaz de descrever os spins e as helicidades das
entidades elementares como os elétrons, os quarks e suas antipartículas e também dos
prótons e nêutrons livres (e das antipartículas destes).” (pág. 27s).

“Como disse antes, a força nuclear "forte" atua apenas entre os membros do dubleto
(p+, nº). A força nuclear "forte" tem um alcance de cerca de 10(elevado a -13) cm. É ela
a força responsável pela fissâo nuclear e pela fusão nuclear (a fonte de energia das
estrelas).
(...).
A força nuclear fraca é a força responsável pela chamada radioatividade beta,
descoberta por Madame Curie. Ela desempenha um papel decisivo da produção de
energia pelo sol. A força nuclear fraca é universal, mas não tão universal quanto a
gravidade. (...).
A força nuclear “fraca” é assim chamada porque (a distâncias comparáveis) tem
10(elevado a -5) vezes a intensidade da força eletromagnética. O alcance da força fraca
não passa de 10(elevado a -16) cm (o que é menor, por um fator de 1.000, que o alcance
da força nuclear forte).” (pág. 29s).

“Em resumo, consideramos partículas de spin h/2. Estas se distribuem em duas
categorias - os seis componentes leptônicos com helicidade esquerrda que exibem a
força nuclear fraca de um alcance da ordem de 10(elevado a -16) cm, e os seis quarks,
que mantêm interações fortes entre si e compõem os prótons e os nêutrons além de
outras partículas nucleares. Estes interagem por meio de uma força nuclear forte cujo
alcance também é pequeno (10(elevado a -13) cm). Além das duas forças nucleares
(fraca e forte), há, é claro, a força eletromagnética entre os prótons e os elétrons
eletricamente carregados, e ainda a força universal da gravidade, que somam, juntas, as
quatro forças fundamentais da natureza.” (pág. 30).

CAPITULO 5 - A FORÇA NUCLEAR FORTE COMO FORÇA DE GAUGE E O
MODELO PADRÃO

Nota 5. “As descobertas das últimas décadas na física de partículas nos conduziram a
dar uma grande ênfase ao conceito de simetria quebrada. O desenvolvimento do
universo a partir de seus primórdios mais remotos é visto como uma sucessão de
quebras de simetria. Tal como emerge no momento de sua criação, no Big Bang, o
universo é completamente simétrico e desprovido de características. À medida que
esfria e passa a temperaturas cada vez mais baixas, as simetrias vão se quebrando, uma
após outra, permitindo o surgimento de uma diversidade cada vez maior. O fenômeno
da vida também se encaixa naturalmente neste quadro. Também a vida é uma quebra de
simetria." (F.J. Dyson, lnfinite in All Directions Harper and Row, Cornelia and Michael
Bessie books, 1988.).” (pág. 60).

“Há um nível adicional de unificação, após aquela implicada pelo Modele Padrão. Nele,
tentamos unir a força nuclear forte com a força "eletrofraca" Esta idéia é uma
decorrência direta da unificação eletrofraca - com seu: novos mensageiros de gauge e
suas novas partículas de Higgs, não de gauge. Essa teoria é geralmente conhecida como
Teoria da Grande Unificação (GUT, de Grand Unified Theory) (nota 1. A teoria foi proposta
em 1972 (e, numa versão diferente, em 1974). Jogesh Pati e eu chamamos a nova força de gauge de
“força eletronuclear”. Esta consistiria de eletromagnetismo + a força nuclear fraca + a força nuclear forte.
Uma combinação de forças como esta foi chamada de “força da grande unificação” - este “grande nome”
foi cunhado por Sheldon Glashow e Howard Georgi; a meu ver, ele seria mais apropriado para designar a
teoria final (a Teoria de Tudo), em que a gravitação também estaria unificada com as forças
eletronucleares. Mas...)
Uma previsão das teorias desse tipo é que o próton acabaria necessariamente por sofrer
um decaimento, o que é desejável do ponto de vista da cosmologia dos primórdios do
universo. Se o decaimento do próton de fato ocorresse (ainda que muito lentamente, já
que tem um tempo de vida previsto em 10(elevado a 32) anos), juntamente com a
violação da simetria temporal, chegaríamos a uma compreensão do porquê da grande
escassez de antiprótons no universo.
Experimentos conduzidos em cavernas profundas, na Terra, ainda não forneceram
provas conclusivas do decaimento do próton. Talvez experimentos futuros tenham de
ser realizados na Lua, para eliminar os problemas causados na Terra pela radiação de
neutrinos.” (pág. 45s).

“Mencionei antes o papel da tecnologia dos aceleradores na verificação da teoria
eletrofraca unificada. Desde que comecei a fazer pesquisas em física de partículas, o
tamanho e o custo dos experimentos cresceu enormemente. Isto nos trouxe a um
patamar em que, se não tivermos cuidado, pode se tornar impossível levar adiante os
testes de nossas teorias.
Na época do Old Cavendish, aqui em Cambridge, o trabalho experimental era no estilo
"barbante e cera". Não é mais assim. No CERN, o anel SppS tem seis quilômetros de
circunferência, ao passo que o anel LEP (Large Electron Positron Collider) tem 27 km.
O SSC (Superconduction Super Collider) pode vir a ter uma circunferência de cerca de
93.” (pág. 46).

“Em primeiro lugar, há quatro aceleradores que serão ativados em breve (antes de
1999), e dos quais ouviremos falar muito mais nos próximos anos. Esses aceleradores
podem descobrir as partículas de Higgs, a supersimetria, as forças fracas "esquerdas",
ou estabelecer se os quarks são elementares, ou não. Isto depende da energia utilizável
do acelerador e do limiar de energia previsto para o processo a ser observado.
Em seguida, há os aceleradores pp, que no momento ainda são sonhos acalentados pelos
físicos. Há o Large Hadron Collider, grande anel de colisão de partículas próton-próton
(LHC LEP III), que pode ser superposto ao túnel LEP (ê + e) de 27 km no CERN, em
Genebra. Há o SSC, um anel de colisão próton-próton, que o Departamento de Energia
dos Estados Unidos pretende construir no Texas. As verbas requeridas para os cinco
anos de sua construção são da ordem de cinco bilhões de dólares. Cabe comparar isto
com o inútil SDI (programa de Iniciativa de Defesa Estratégica), que já gastou 12,7
bilhões de dólares. Há também a proposta de construir o Eloisatron, o maior dos anéis
de colisão próton-próton, com 200 km de circunferência, na Sicília.
Numa categoria diferente, há os aceleradores lineares elétron-pósitron (antielétrons): (I)
o CUC, que é a proposta (e+ e-) do CERN; (2) o VLLP. um acelerador similar na
URRS. As máquinas elétron-pósitron (e + e-) têm a grande vantagem de que toda a
energia das partículas em colisão fica disponível para a experimentação, ao passo que
numa máquina próton-próton - como o SSC - apenas cerca de 1/6 a 1/3 da energia total
das partículas em colisão pode ter emprego útil. Isto ocorre porque cada próton é feito
de três quarks, e apenas dois destes, um de cada próton interage de fato, de modo que a
energia extra nas partículas que não interagem é simplesmente perdida.
No momento, os aceleradores circulares (elétron-pósitron) estão limitados pela força
dos ímãs flexores, que devem curvar as partículas colocando-as em seus trajetos
circulares. Há agora a perspectiva de usar a tecnologia da supercondutividade. que
fornecerá ímãs mais poderosos e de produção mais barata. Há, contudo, uma limitação
que não pode ser contornada: a que decorre da radiação síncrotron emitida por toda
partícula carregada quando se move em seu trajeto circular. A energia necessária (de
acordo com as idéias de Maxwell) aumenta com a energia do acelerador elevada à
quarta potência. Nenhum gerador de energia elétrica poderia fazer face às demandas de
energia desses aceleradores circulares.
A segunda variedade é a dos aceleradores lineares. Estes não sofrem dos mesmos
problemas que prejudicam os aceleradores circulares, como a radiação síncrotron, mas
são limitados pelo gradiente do campo elétrico disponível, usado para acelerar elétrons
(ou prótons). No momento, os melhores campos elétricos que podem ser ativados não
têm mais que um gigavolt por metro. É possível que, em vinte anos, ocorra uma
melhoria de mil vezes, com a tecnologia do acelerador "beat-wave laser-plasma"
(tecnologia de aceleradores de plasma a laser pulsante). Mesmo nesse caso, porém, a
energia máxima de Planck, de 10(elevado a 20) massas do próton, exigiria um
acelerador com dez anos luz de comprimento! Isto desperta em nós a visão de dinastias
de físicos de partículas a viajar ao longo do acelerador, a bordo de uma espaçonave
especial!” (pág. 46ss).

“Outra área em que a física de partículas nos forneceu importantes subsídios é a da
cosmologia do surgimento do universo, a tal ponto que esse tema tomou-se sinônimo de
física das partículas. Isto ocorre porque as transições de fase, que separam uma era
cosmológica de outra, são também os mecanismos pelos quais a força unificada final é
convertida em duas (gravitacional + eletronuclear), em três (eletrofraca + nuclear forte +
gravitacional), e finalmente nas quatro forças (eletromagnética + nuclear forte + nuclear
fraca + gravitacional), à medida que a temperatura global do universo vai declinando. O
fato de essas transições ocorrerem a altas temperaturas (que vão de 300 a l0(elevado a
20) massas do próton), sendo improvável que temperaturas superiores a 106 massas do
próton possam  jamais vir a ser obtidas em aceleradores produzidos pelo homem, torna
o universo primitivo e sua cosmologia atraentes para o físico experimental de partículas,
uma vez que fornecem o único laboratório em que, pelo menos indiretamente, será
possível testar nossas teorias (por meio da detecção de vestígios de eras passadas, de
temperaturas mais elevadas, que ainda possam ser encontrados hoje).
Podemos distinguir três eras cósmicas:
(a) A era mais recente, que começou por volta de 1012 segundos 10(elevado a 12)
segundos (10(elevado a 5) anos) após o Hot Bang, com a radiação de Penzias-Wilson, e
continua até hoje, passados 10(elevado a 18) segundos após o Hot Bang. Esta é a Era da
Matéria de Grande Escala, em que as galáxias e os superaglomerados se desenvolveram.
Conhecemos a física desta era, mas a astrofísica ainda é obscura.
(b) A segunda, chamada Era Eletrofraca começou com a transição de fase que
correspondeu à quebra espontânea da simetria eletrofraca, a uma temperatura por volta
de 300 massas do próton - o que, segundo os cálculos, ocorreu por volta de 10(elevado a
-12) segundos - e prolongou-se até a emissão da radiação de Penzias- Wilson.
(c) A terceira e mais remota é a Era Especulativa, que teria se estendido de 10(elevado a
-43) após o Hot Bang e perdurado até 10(elevado a -12) segundos. Durante este longo
período, é possível que "cordas" bidimensionais (ver adiante) tenham dado origem ao
espaço-tempo de quatro dimensões que hoje conhecemos.
Entre as zonas problemáticas dessa última era estão os problemas colocados pela
constante cosmológica e o da não-observação de monopolos magnéticos.
A constante cosmológica foi introduzida por Einstein na relatividade geral com a
finalidade de prover uma força repulsiva (em acréscimo à força gravitacional, atrativa),
de modo a tornar o universo estático. Então Hubble descobriu que, de fato, o universo
estava em expansão. Já não havia nenhuma necessidade da constante cosmológica.
(Segundo Einstein, a introdução dessa constante foi a maior tolice da sua vida.)
Acreditamos que, em qualquer teoria natural de física microscópica teríamos boas
razões para fazer essa constante igual a zero. Uma razão assim foi invocada muito
recentemente na teoria dos "buracos de verme" (wormholes), que podem conectar nosso
universo com outro, um universo bebê. Isto poderia ser parte da Era Especulativa,
10(elevado a -43) após o Bang.
Também estaria incluída nessa era a fase inflacionária especulativa da expansão do
universo, que garantiria a diluição da densidade dos monopolos magnéticos nos limites
hoje observados, dada a rápida expansão implicada por essa inflação. (Dirac introduziu
esses monopolos antes, para assegurar uma simetria completa entre eletricidade e
magnetismo. Hoje isto faz parte de qualquer Teoria da Grande Unificação que se
respeite.)” (pág. 48ss).

“Muitos dilemas na física de partículas e na cosmologia requerem· uma experimentação
que não usa aceleradores, como as oscilações dos neutrinos. Será, por exemplo, que Ve,
Vu e Vr se transformam uns nos outros, e a que distâncias? A matéria escura - que é
eletromagneticamente invisível aos nossos telescópios, e só manifesta sua presença
através da força fraca. ou gravitacionalmente, e que, na concepção dos cosmologistas
contemporâneos, pode constituir nada menos que 90% de toda a matéria no universo -
existe de fato? Poderiam os ubíquos neutrinos ser afinal de contas, a matéria escura?”
(pág. 50).

“E agora passamos à última etapa de nossa busca de unificação. Poderá a gravidade ser
também unificada com as outras forças proporcionando a realização final do sonho de
Faraday e Einstein? Neste ponto eu retorno ao critério básico de Dirac. O que impediu
que esta teoria fosse sequer cogitada até hoje foi o temor de considerar os infinitos que a
teoria da gravitação engendra assim que é usada em cálculos de ordem mais elevada.
(Alguns desses infinitos, mas infelizmente não todos, foram reduzidos por meio do uso
de idéias de supergravidade.)
Esse problema de Dirac foi aparentemente sanado pouco tempo atrás pela hipótese de
que as entidades fundamentais da física não são partículas pontuais, mas cordas, que
fazem laços de tamanho finito, em comprimento de Planck. Essas cordas vibram à
maneira das cordas de um violino (...).
A física mudaria novamente de paradigma, com as entidades fundamentais aparecendo
agora como minúsculas cordas, não mais como partículas pontuais. A matemática
necessária é a matemática das superfícies bidimensionais de Riemann: espaço e tempo
quadridimensionais surgem como conceitos secundários.
Uma teoria de cordas deve atender a algumas exigências físicas:
(a) Todas as partículas fontes (quarks e léptons), mais os mensageiros (como glúons,
fótons, W¹, Zº), mais as partículas de Higgs do Modelo Padrão devem estar
compreendidos nesse quadro;
(b) Deve ser uma teoria geométrica, uma vez que deve conter, como uma parte sua, a
teoria einsteiniana da gravitação;
(c) Deve descrever a gravidade sem nenhuma quantidade infinita. Satisfazer a essas três
condições seria um milagre, mas, ao que parece, esse milagre está acontecendo, pelo
menos num espaço-tempo de dez dimensões em que, a partir do trabalho de Green e
Schwarz, parece ter emergido, no outono de 1984, uma teoria de supercordas única. O
aspecto importante é que a teoria da gravidade de Einstein emerge como uma
subunidade especial da teoria de cordas. Isto justifica o desenho da serpente de Glashow
(ver Fig. 8), que engole a própria cauda - isto é, o encontro da microfísica na escala de
Planck (10(elevado a -33) cm) com a macrofísica descrita pela teoria da gravidade de
Einstein, que tem a extensão do universo (10(elevado a 28) cm). Esta é, a meu ver, a
unificação final.
(...).
Poderiam as cordas ser realmente a Teoria de Tudo, combinando todas as partículas
fontes conhecidas, os quarks e os léptons, além dos mensageiros que conhecemos e das
partículas de Higgs e das interações entre todos eles? Nesse caso, representariam elas a
culminação de nossos esforços para unificar as forças fundamentais da natureza? Estas
são perguntas que só o tempo irá resolver.” (pág. 50ss).

TEORIA, CRÍTICA E UMA FILOSIFIA – Werner Heisenberg

“Após dois anos de estudo, no verão de 1922, Sommerfeld perguntou-me se estava
disposto a acompanhá-lo a um encontro em Gõttingen, em que Bohr iria apresentar sua
teoria. Hoje, sempre nos referimos àqueles dias em Gõttingen como o "festival Bohr".
Ali, pela primeira vez, aprendi como um homem como Bohr trabalhava com problemas
de física atômica. Uma vez, depois que ele fizera sua segunda conferência, ousei tomar
a palavra num debate, para expressar algumas críticas. Mencionei apenas algumas
dúvidas sobre a possibilidade de as fórmulas de Kramers, que ele escrevera no quadro-
negro, serem exatas. Sabia, a partir de nossas discussões em Munique, que as fórmulas
que obtemos são sempre semi-exatas, em parte corretas e em parte não, de modo que me
parecia que aquilo nunca era muito seguro. Bohr foi muito gentil e, embora eu fosse
estudante muito jovem, convidou-me para um longo passeio no Hainberg perto de
Gõttingen, para discutir o problema. Acho que foi naquele momento que senti estar
realmente aprendendo o que significa estar num campo inteiramente novo da física
teórica. A primeira descoberta para mim absolutamente chocante, foi a de que Bohr não
tinha calculado coisa alguma. Simplesmente adivinhara seus resultados. Conhecia a
situação experimental em química, conhecia as valências dos vários átomos e sabia que
sua idéia da quantização das órbitas, ou melhor, sua idéia de explicar a estabilidade do
átomo pelo fenômeno da quantização, correspondia de algum modo à situação
experimental em química. Com nisso, apenas adivinhara o que depois nos apresentara
como seus resultados. Perguntei-lhe se realmente acreditava que seria possível derivar
aqueles resultados mediante cálculos baseados na mecânica clássica. A resposta foi:
"Bem, penso que essas representações clássicas dos átomos que desenho são tão boas
quanto uma representação clássica pode ser. Explicou isso da seguinte maneira:
"Estamos agora num novo campo da física, em que sabemos que os velhos conceitos
provavelmente não funcionam. Vemos que não funcionam, pois do contrário os átomos
seriam estáveis. Por outro lado, quando queremos falar sobre átomos temos de usar
palavras, e estas só podem ser tomadas dos velhos conceitos, da velha linguagem.
Assim, estamos num beco sem saída, somos como marinheiros que chegam a país muito
distante. Não conhecem o país e encontram pessoas cuja língua nunca ouviram, de
modo que não sabem como se comunicar. Assim, na medida em que conceitos clássicos
podem funcionar, isto é, na medida em que pode falar sobre o movimento de elétrons,
sobre sua velocidade, sua energia, etc., penso que minhas representações estão corretas,
ou pelo menos espero que estejam, mas ninguém sabe até onde essa linguagem pode ir”.
Essa era uma maneira de pensar inteiramente nova para mim, e mudou toda a minha
atitude em relação à física. No instituto Sommerfeld, sempre parecera óbvio que era
preciso calcular as coisas e que somente por meio do cálculo rigoroso era possível
chegar a resultados.
Retornando agora à questão das teorias fenomenológicas, a conversa com Bohr deixou-
me a impressão de que era preciso afastar-se de todos aqueles conceitos clássicos, de
que não se devia falar da órbita de um elétron. Embora fosse possível ver uma trajetória
do elétron na câmara de condensação, não se devia falar sobre sua velocidade ou
posição e assim por diante. Mas é claro que, abandonando essas palavras, fica-se sem
saber o que fazer. Era, portanto, um dilema estranhíssimo, uma situação extremamente
interessante. A pergunta era: “Que podemos fazer numa situação como essa?”
Pouco tempo depois dessa conversa com Bohr, creio que uns seis meses mais tarde, fui
para Copenhague. Trabalhei com Kramers sobre a teoria da dispersão e mais uma vez
nos vimos numa situação absurda: as fórmulas que podiam ser derivadas da teoria de
Bohr eram quase corretas, mas não realmente corretas. Aos poucos, tínhamos adquirido
certa prática no manejo dessas fórmulas, na tradução da física clássica para essas
fórmulas fenomenológicas. Já tínhamos a impressão de que, em última análise, devia
haver algum tipo de mecânica quântica que substituiria a mecânica clássica. A mecânica
quântica poderia não ser muito diferente da mecânica clássica, mas ainda assim deveria
usar conceitos muito diferentes.
Ora, nesse tipo de situação, diz-se muitas vezes que um passo na direção correta é
introduzir na teoria apenas quantidades que possam ser observadas. De fato, esta era
uma idéia muito natural nesse contexto, porque se constatava que havia freqüências e
amplitudes e, na teoria clássica, essas freqüências e amplitudes podiam de certo modo
substituir a órbita do elétron. Toda uma série delas significa uma série de Fourier, e uma
série de Fourier descreve uma órbita. Assim, era natural pensar que era preciso usar
esses conjuntos de amplitudes e freqüências em vez da órbita.
Quando voltei de Copenhague para Gõttingen, decidi que devia mais uma vez tentar
algum tipo de adivinhação, a saber, adivinhar as intensidades do espectro do hidrogênio.
A teoria de Bohr não funcionava bem para essas intensidades. Mas por que não seria
possível adivinhá-las? Isso foi no início do verão de 1925, e eu fracassei redondamente.
As fórmulas ficaram complicadas demais e não havia esperança de extrair coisa alguma
delas. Ao mesmo tempo, eu pensava também que, se o sistema mecânico pudesse ser,
mais simples, seria possível fazer exatamente a mesma coisa que Kramers e eu tínhamos
feito em Copenhague, e adivinhar as amplitudes. Assim sendo, passei do átomo de
hidrogênio para o oscilador anarmônico, que era um modelo muito simples. Exatamente
nessa altura, fiquei doente e fui me recuperar na ilha de Heligoland. Ali tinha tempo à
vontade para fazer meus cálculos. Na verdade, revelou-se muito fácil traduzir mecânica
clássica em mecânica quântica. Devo mencionar, porém, um ponto importante: não era
tão simples assim dizer "vamos tomar algumas freqüências e amplitudes para substituir
quantidades orbitais" e então usar algum tipo de cálculo que já tínhamos usado em
Copenhague, e que mais tarde mostrou ser equivalente à multiplicação matricial.
Era bastante claro que, fazendo isso, se obteria um esquema muito mais aberto que a
teoria clássica. Evidentemente, a teoria clássica estaria incluída nele, e a teoria quântica
também, mas o esquema era excessivamente indefinido e era preciso adicionar-lhe
condições extras.
Acabei por constatar que era possível substituir as condições quânticas da teoria de
Bohr por uma fórmula que, essencialmente, era equivalente à regra da soma de Thomas
e Kuhn. Acrescentando tal condição chegava-se, subitamente, a um esquema
congruente. Podia-se ver que esse conjunto de conjecturas funcionava, podia-se ver que
a energia era constante e assim por diante. Eu não era capaz, contudo, de extrair dele um
esquema matemático apropriado. Muito pouco tempo depois, Born e Jordan, em
Gõttingen, e também Dirac, em Cambridge, conseguiram inventar um esquema
matemático perfeitamente fechado; Dirac usou métodos novos e muito engenhosos, com
os números q. enquanto Born e Jordan usaram métodos matriciais, mais convencionais.”
(pág. 73ss).

“Não quero entrar em detalhes agora, mas falar sobre a interpretação dos detalhes no
seguinte sentido: "Que tipo de filosofia teve o papel mais importante neste
desenvolvimento?" De início, eu pensava que era provavelmente a idéia de introduzir
apenas quantidades observáveis. Em 1926, porém, numa ocasião em que tive de fazer
uma palestra sobre mecânica quântica em Berlim, Einstein compareceu e corrigiu essa
visão.
Pediu que fosse a seu apartamento para discutirmos essas questões. A primeira coisa
que me perguntou foi: "Qual é a filosofia subjacente a seu estranho tipo de teoria? A
teoria parece bastante boa, mas o que você estava querendo dizer por 'apenas
quantidades observáveis'?" Disse que não acreditava mais em órbitas de elétrons, apesar
das trajetórias numa câmara de condensação. Sentia que era preciso voltar àquelas
quantidades que podem realmente ser observadas e tinha a impressão que era
exatamente esse tipo de filosofia que ele próprio usara na relatividade; porque ele
também tinha abandonado o tempo absoluto e introduzido somente o tempo do sistema
especial de coordenadas, e assim por diante. Ouvindo isso, Einstein riu e disse: "Mas
você tem que entender que isso está completamente errado. "Retruquei: "Mas por quê?
Não é verdade que usou esta filosofia?" E Einstein respondeu: "Sem dúvida posso tê-la
usado, mas isso não impede que seja absurda!"
Einstein explicou-me que o que acontecia na verdade era exatamente o oposto. Disse
ele: "A possibilidade que se tem de observar ou não uma coisa depende da teoria que se
usa. É a teoria que decide o que pode ser observado." Justificou isto nos seguintes
termos: "A observação significa que construímos algum vínculo entre um fenômeno e
nossa compreensão do fenômeno. Há alguma coisa acontecendo no átomo, a luz é
emitida, ela atinge a placa fotográfica, vemos a placa fotográfica, e assim por diante.
Em toda essa seqüência de eventos que tem lugar entre o átomo, nosso olho e nossa
consciência, devemos presumir que tudo funciona como na velha física. Alterando-se a
teoria referente a essa seqüência de eventos é evidente que a observação seria alterada."
Assim, ele insistiu em que a .teoria que decide sobre o que pode ser observado. Esta
observação de Einstein foi muito importante para mim mais tarde, quando Bohr e eu
tentamos discutir a interpretação da teoria quântica, e voltarei a este ponto adiante.
Mais algumas palavras sobre minha discussão com Einstein. Ele frisou que era
realmente um perigo dizer que só se deveria falar sobre quantidades observáveis. Toda
teoria adequada fornecerá, além de todas as coisas que podem ser imediatamente
observadas, também.a possibilidade de observar outras coisas, de maneira mais indireta.
Por exemplo, o próprio Mach acreditara que o conceito de átomo era apenas uma
questão de conveniência, de economia de pensamento - ele não acreditava realidade dos
átomos. Hoje, todo mundo diria que isso é absurdo, que é bastante evidente que os
átomos realmente existem. Penso também que não se tem nada a ganhar afirmando que
os átomos são uma mera conveniência de nosso Pensamento - embora isso possa ser
logicamente possível. Estes foram os pontos que Einstein levantou. Na teoria quântica,
isso significava, por exemplo, que, quando se tem mecânica quântica, pode-se observar
não apenas freqüências e amplitudes, mas também, entre outras coisas, amplitudes de
probabilidades, ondas de probabilidades, e assim por diante, e estes são, obviamente,
objetos muito diferentes.
Devo acrescentar ainda que, uma vez que se inventa um novo esquema referente a
certas quantidades observáveis, a questão decisiva passa a ser: quais dos velhos
conceitos podem realmente ser abandonados? No caso da teoria quântica, era mais ou
menos claro que se podia abandonar a idéia de uma órbita do elétron.” (pág. 76ss).

“Penso que agora estão compreendendo porque sou sempre um tanto cético com relação
aos métodos matemáticos rigorosos. Talvez deva apresentar uma razão mais séria para
isso. Quando buscamos métodos matemáticos rigorosos com demasiado empenho,
fixamos nossa atenção naqueles pontos que não são importantes do ponto de vista físico
e, com isso, nos afastamos da situação experimental. Quando tentamos resolver um
problema com uma matemática mais grosseira, como fiz na maioria das vezes, somos
sempre obrigados a pensar na situação experimental. E, seja qual for a fórmula que
criamos, tentamos compará-la com a realidade; com isso, de algum modo, nos
aproximamos mais dessa realidade do que ao buscar métodos rigorosos. Mas pode ser, é
claro, que isso seja diferente para diferentes pessoas.
Voltemos agora à mecânica quântica, e àquela parte do desenvolvimento de uma nova
teoria que sempre me pareceu a mais fascinante. Quando penetramos num campo novo
como esse, o problema é que, com os métodos fenomenológicos, somos sempre
obrigados a usar os velhos conceitos, já que não temos outros, e, nesse caso, fazer
relações teóricas significa aplicar velhos métodos a essa situação nova. Portanto, o
passo decisivo é sempre um passo bastante descontínuo. Nunca podemos ter esperança
de nos aproximar da teoria real pouco a pouco, por pequenos passos - em determinado
ponto, é preciso dar um salto. É preciso realmente abandonar os velhos conceitos e
tentar algo de novo, e depois verificar se somos capazes de nadar, de tomar pé, ou
qualquer outra coisa.
Mas, seja como for, não podemos conservar os velhos conceitos. Isso aconteceu na
mecânica quântica do seguinte modo: primeiro tínhamos o esquema matemático,
depois, é claro, devíamos tentar usar uma linguaggem razoável com relação a ele.
Finalmente, podíamos perguntar: que conceitos esse esquema matemático implica e
como devemos descrever a natureza?
A parte mais difícil nesta etapa do desenvolvimento é o abandono de alguns conceitos
antigos importantes. Todo bom físico se dispõe a adquirir novos conceitos, mas até os
melhores mostram-se por vezes muito pouco dispostos a abrir mão de alguns dos
conceitos velhos e aparentemente seguros. Esse sentimento de não poder abandonar os
velhos conceitos foi também muito forte no desenvolvimento da mecânica quântica.
Sabemos que isso aconteceu também no desenvolvimento da relatividade, e até hoje
publicam-se, aqui e ali, artigos de pessoas que simplesmente se recusam a compreender
a teoria da relatividade especial. Não conseguem compreendê-la porque não são capazes
de abrir mão do velho conceito de "eventos simultâneos". Na teoria quântica, aconteceu
até certo ponto a mesma coisa, nas discussões sobre a mecânica ondulatória de
Schrõdinger e a mecânica quântica. Lembro-me de uma conferência de Schrõdinger e
do debate subseqüente, no verão de 1926. Talvez deva mencionar isso, certamente não
para criticar Schrõdinger, que era um físico de primeira linha, mas apenas para mostrar
como é extremamente difícil livrar-se de velhos conceitos. Schrõdinger fizera uma
conferência sobre mecânica ondulatória, a convite de Sommerfeld, e lá estava também
Wilhelm Wien, um físico experimental. Nessa época, a teoria de Bohr estava longe de
ser reconhecida em geral como boa teoria. Os físicos experimentais de Munique, por
exemplo, não gostavam nada de todo aquele jogo de termos quânticos e saltos
quânticos, chamavam isso de "atomística" - isto é, mística do átomo - e consideravam
que aquilo era tão diferente da física clássica que não era fato para ser levado a sério.
Assim, Wilhelm Wien ficou muito satisfeito ao ouvir de Schrõdinger sua nova
interpretação.
Como sabem, Schrõdinger acreditou por algum tempo que podia usar a mecânica
ondulatória com o mesmo tipo de conceito da teoria de Maxwell. Partia do pressuposto
de que ondas da matéria eram simplesmente ondas tridimensionais no espaço e tempo,
como ondas eletromagnéticas; portanto, o autovalor de uma energia era realmente o
autovalor de uma vibração, e não uma energia. Assim, ele acreditava poder evitar todos
os tipos de saltos quânticos e todo o resto, que chamava de misticismo. Após a
conferência de Schrõdinger, participei do debate e afirmei que me parecia que, com
aquela interpretação, não se poderia nem sequer entender a lei de Planck. Porque, afinal
de contas, a lei de Planck era baseada na verdadeira teoria quântica, nas mudanças
descontínuas de energia e assim por diante. Wien ficou tão irritado com essa observação
que disse: "Bem, meu rapaz, compreendemos que esteja triste porque agora a mecânica
quântica e os saltos quânticos e todo o resto devem ser esquecidos, mas verá que logo
Schrõdinger resolverá todos esses problemas.”
Só mencionei este episódio para mostrar como podem ser fortes os sentimentos entre os
físicos sobre essas questões. Evidentemente, fraca sei por completo na tentativa de
convencer seja Wien, seja Schrõdinger. O resultado, porém, foi que Bohr convidou
Schrõdinger para ir a Copenhague. Em setembro de 1926, Schrõdinger foi a
Copenhague. Bohr, um homem muito delicado, correto, da maior amabilidade em todos
os sentidos, era capaz às vezes de ser quase fanático. Lembro que, por onde Schrõdinger
fosse, lá estava Bohr ao seu lado, dizendo: "Mas Schrõdinger, você tem de entender,
você realmente tem." Ao fim de dois dias Schrõdinger caiu doente e teve de ficar de
cama. A sra. Bohr levava-lhe chá com bolinhos e dali a pouco lá estava Bohr, sentado
ao seu lado: "Mas Schrõdinger, você tem de entender...” Depois disso, Schrõdinger
entendeu pelo menos que a interpretação da teoria quântica era mais difícil do que
pensara.
Também em Copenhague, não estávamos ainda muito satisfeitos com a interpretação.
Sentíamos que, no caso do átomo, parecia muito bem abandonar o conceito de uma
órbita eletrônica. Mas e a câmara de condensação? Numa câmara de condensação, vê-se
o elétron movendo-s ao longo da trajetória - seria isso uma órbita eletrônica ou não?
Bohr e eu discutimos esses problemas durante muitas e muitas noites, chegávamos
freqüentemente a um estado de desespero. Bohr tentava mais na direção da dualidade
entre ondas e partículas; eu preferia começar di formalismo matemático e buscar uma
interpretação congruente. Por fim Bobr partiu para a Noruega, para pensar sozinho no
problema, e eu fique em Copenhague. Então lembrei-me da observação de Einstein em
nossa discussão. Lembrei que dissera: "É a teoria que decide o que pode se observado."
A partir disso, era fácil inverter nossa questão e, em vez de perguntar: "como posso
representar em mecânica quântica esta órbita de um elétron numa câmara de
condensação?", fazer a seguinte pergunta: "seria verdade que só podem acontecer na
natureza, mesmo numa câmara de condensação, aquelas situações experimentais que
podem ser descritas pelo formalismo matemático da mecânica quântica?" Com essa
inversão tinha de investigar o que podia ser descrito por esse formalismo; nesse caso,
era muito fácil ver - especialmente usando as novas descobertas matemáticas de Dirac e
Jordan sobre teoria da transformação - que não era possível descrever ao mesmo tempo
a posição exata e a velocidade exata de um elétron; tínhamos então as relações de
incerteza. Deste modo, as coisas ficavam claras. Ao voltar para Copenhague, Bohr
trazia uma interpretação equivalente, com seu conceito de complementaridade. Assim,
finalmente todos concordamos em que tínhamos por fim entendido a teoria quântica.”
(pág. 80ss).

“Voltamos a encontrar uma situação difícil em 1927, quando Einstein e Bohr discutiram
essas questões na Conferência Solvay. Quase todo dia a mesma seqüência de eventos se
repetia. Estávamos todos hospedados no mesmo hotel. No café da manhã, Einstein
aparecia e contava para Bohr um novo experimento fictício, com o qual podia refutar as
relações de incerteza e, portanto, nossa interpretação da teoria quântica. Bohr, Pauli e eu
ficávamos então muito preocupados. Acompanhávamos Bohr e Einstein à conferência e
passávamos o dia inteiro discutindo a questão. À noite, porém, na hora do jantar, em
geral Bohr já tinha resolvido o problema e dava a resposta a Einstein. Ficávamos muito
satisfeitos e Einstein, um pouco acabrunhado, dizia que ia pensar no assunto. Na manhã
seguinte, lá vinha ele com um novo experimento fictício, tínhamos de discuti-lo etc.
Isso se prolongou por vários dias e, ao final da conferência, os físicos de Copenhague
saíram com a impressão de que tinham ganho a batalha e de que Einstein de fato não era
capaz de fazer nenhuma objeção real. A meu ver, o mais esplêndido dos argumentos de
Bohr foi um em que usou a teoria da relatividade geral para refutar Einstein. Este
inventara um experimento em que o peso de certo maquinário devia ser determinado
pela gravitação, e assim Bohr teve de invocar a teoria da relatividade geral para mostrar
que as relações de incerteza eram corretas. Bohr conseguiu, e Einstein não foi capaz de
fazer nenhuma objeção.” (pág. 84).

“Chego agora a desenvolvimentos mais recentes. Talvez, antes de passar à teoria
quântica relativista, deva dizer algumas palavras sobre física nuclear. O único ponto em
que quero insistir de novo aqui é que é muito mais fácil aceitar novos conceitos que
abandonar os velhos. De fato quando o nêutron foi descoberto por Chadwick - em 1932,
creio -, era quase banal dizer que o núcleo consiste de prótons e nêutrons, mas não era
tão banal assim dizer que não há elétrons no núcleo. O ponto central dos artigos que
escrevi sobre a estrutura do núcleo não era a afirmação de que o núcleo consistia de
prótons e nêutrons, mas a de que, em aparente contradição com os experimentos, não
havia elétrons no núcleo. Até aquele momento, todos presumiam que devia haver
elétrons no núcleo porque por vezes eles escapam, e seria muito estranho dizer que já
não estavam lá antes. É claro que a idéia era que forças de curto alcance entre nêutron e
próton podiam de alguma maneira ter que criar elétrons no núcleo. De qualquer modo,
parecia ser uma boa aproximação supor que essas partículas leves não podem existir no
núcleo. Lembro que fui fortemente criticado por essa conjectura, por físicos do mais
alto nível. Recebi uma carta que dizia ser realmente um escândalo supor que não havia
elétrons no núcleo quando era perfeitamente possível vê-los saindo dele; eu estava
introduzindo uma completa confusão na física com aquelas hipóteses absurdas e não
podiam entender minha atitude. Mencionei esse pequeno episódio apenas para mostrar
como é realmente difícil abrir mão de alguma coisa que parece tão natural e tão óbvia
que sempre foi aceita por todos. A meu ver, no desenvolvimento da física teórica, esses
pontos em que é preciso abandonar velhos conceitos são sempre os que exigem maior
esforço.” (pag. 86s).

“Permitam-me agora voltar ao problema das partículas elementares. Penso que
realmente a descoberta mais decisiva com relação às propriedades ou à natureza das
partículas elementares foi a da antimatéria, feita por Dirac. Era uma característica
inteiramente nova, aparentemente relacionada com a relatividade, com a substituição do
grupo de Galileu pelo de Lorentz. Acredito que essa descoberta das partículas e·
antipartículas descobertas por Dirac mudou por completo toda a nossa maneira de
pensar na física atômica. Não sei se essa mudança foi percebida de imediato na época, é
provável que só tenha sido aceita gradualmente. Gostaria de explicar por que a
considero tão fundamental.
A partir da teoria quântica, sabemos que, por exemplo, uma molécula de hidrogênio
pode consistir de dois átomos de hidrogênio ou de um íon positivo de hidrogênio e de
um íon negativo de hidrogênio. Em geral, podemos dizer que cada estado consiste
virtualmente de todas as configurações possíveis pelas quais podemos realizar o mesmo
tipo de simetria. Ora, tão logo sabemos que é possível criar pares segundo a teoria de
Dirac, passamos a ter de considerar uma partícula elementar como um sistema
composto. Isto porque, virtualmente, ela poderia ser essa partícula mais um par dessa
partícula, mais dois pares e assim por diante, de tal modo que, de um momento para
outro, toda a idéia de partícula elementar é transformada. Até aquela época, acho que
todo físico pensava nas partículas elementares na linha da filosofia de Demócrito, a
saber, considerando-as como unidades imutáveis, simplesmente dadas na natureza e
sempre as mesmas: nunca mudam, nunca podem ser transmutadas em alguma outra
coisa. Não seriam sistemas dinâmicos; simplesmente existiriam em si mesmas.
Depois da descoberta de Dirac, tudo assumiu um aspecto diferente. Agora podíamos
perguntar: "por que um próton deve ser apenas um próton? por que um próton não pode
ser de vez em quando um próton mais um par de um elétron e um pósitron?", e assim
por diante. Essa nova concepção da partícula elementar, como um sistema composto, a
princípio me pareceu um grande desafio. Quando mais tarde trabalhei com Pauli em
eletrodinâmica quântica, sempre mantive esse problema em minha mente.
O passo seguinte nessa direção foi a idéia da múltipla produção de partículas. Se duas
partículas colidem, podem ser gerados pares; nesse caso, não há razão para que seja
apenas um par; por que não dois pares?
Basta que a energia seja suficientemente elevada para que se possa, ao final, gerar
qualquer número de partículas através de um evento desse tipo, desde que o
acoplamento seja bastante forte. Assim, todo o problema da divisão da matéria passou a
ser visto sob uma luz inteiramente nova. Até então, acreditara-se que havia apenas duas
possibilidades: ou a matéria podia ser dividida vezes sucessivas, em partes cada vez
menores infinitamente, ou não era possível dividir a matéria infinitamente, e assim se
chegava à existência de partículas que seriam as menores possíveis. Então, de um
momento para outro, percebemos uma terceira possibilidade: a matéria pode ser
dividida sucessivas vezes, mas nunca chegamos às partículas menores, porque, graças
ao mecanismo de criação de pares, a energia permite criar partículas indefinidamente.
Assim, era natural, ainda que paradoxal, pensar a partícula elementar como um sistema
composto de partículas elementares. É evidente que então surgiu o problema: "Que tipo
de esquema matemático pode descrever uma situação como essa?"” (pág. 86s).

“A personalidade de Pauli era diferente da minha em tudo. Ele era muito mais crítico e
tentava fazer duas coisas ao mesmo tempo, coisa que a me ver é difícil demais, mesmo
para o melhor dos físicos. Antes de mais nada tentava inspirar-se em experimentos e
verificar, de certa forma intuitiva como as coisas se ligavam. Ao mesmo tempo,
procurava racionalizar suas intuições e encontrar um esquema matemático rigoroso, que
lhe permitisse realmente provar tudo que dissera. A meu ver, porém, isto é
simplesmente demais, e o resultado é que Pauli, em toda a sua vida, publicou muito
menos do que teria podido, se tivesse abandonado um desses dois caminhos. Bohr
ousara publicar artigos que não tinha condições de provar e que, afinal, tinham se
mostrado corretos; outros fizeram muita coisa usando métodos racionais e boa
matemática. Juntar as duas coisas, porém, é algo que me parece excessivo para qualquer
pessoa. Pauli ficou completamente desapontado quando percebeu as dificuldades, e
assim acabou por desistir, de uma maneira lamentável. Disse-me que sentia que todo o
seu pensamento já não estava suficientemente forte, e que não estava nada bem.
Incentivou-me, contudo, mesmo depois de retirar sua aprovação para a publicação. Eu
devia prosseguir, disse, mas ele próprio não tinha condições e, como sabem,
infelizmente faleceu um ano depois. Este foi um triste fim para minha longa amizade
com Pauli e só posso dizer que até hoje lamento não ter aquele seu vigoroso espírito
crítico, que tantas vezes me ajudou em minha vida na física.” (pág. 89s).

“Pode ser tentador acrescentar uma prescrição sobre como deveríamos trabalhar em
física teórica. Isto seria, entretanto, muito perigoso, porque a prescrição deve ser
diferente para diferentes físicos. Assim, posso falar apenas sobre a prescrição que
sempre adotei para meu próprio uso. Foi a de que não convém prender-se demais a um
grupo especial de experimentos; ao contrário, devemos tentar nos manter a par de todos
os desenvolvimentos em todos os experimentos relevantes, de modo a poder ter sempre
em mente a visão geral do quadro, antes de tentar estabelecer uma teoria em linguagem
matemática ou outras.
Talvez eu possa explicar essa filosofia geral contando duas histórias bem diferentes.
Quando eu era menino, meu avô, que era um artesão sabia fazer coisas práticas,
encontrou-me uma vez pregando uma tampa numa caixa de madeira com livros ou coisa
parecida. Viu que eu tinha pegado a tampa, um prego, e estava tentando martelar esse
único prego até a cabeça. “Mas isso que você está fazendo aí está completamente
errado", disse meu avô, “ninguém pode fazer isso desse jeito; é um escândalo ver uma
coisa dessa." Não entendi qual era o escândalo, mas ele continuou: “Vou lhe mostrar
como poderia fazer isso." Pegou a tampa e um prego, encaixou-o só um pouco através
da tampa até tocar a caixa, depois encaixou um segundo prego enfiando-o um
pouquinho, um terceiro, e assim por diante, até que todos os pregos estivessem no lugar.
Só quando tudo estava bem disposto, quando se podia ver que os pregos seriam
adequados, começou a pregá-los realmente na caixa. Penso que esta é uma boa
descrição de como se deve proceder em física teórica.
A outra história está ligada às discussões que Dirac e eu tivemos. Dirac costumava dizer
com freqüência - e sempre senti que havia nisso um ligeira crítica - que só se pode
resolver uma dificuldade de cada vez. Isso pode estar certo, mas não era assim que eu
encarava os problemas. Então lembrei-me que Niels Bohr costumava dizer: “Quando se
tem um formulação correta, o oposto dela é, evidentemente, uma formulação errada.
Mas quando se tem uma verdade profunda, então seu oposto pode ser igualmente uma
verdade profunda." Assim, parece-me que a afirmação de que “só se pode resolver uma
dificuldade de cada vez” talvez não seja a única verdade profunda - a afirmação de que
“nunca se pode resolver uma única dificuldade de cada vez, é preciso resolve sempre
muitas dificuldades ao mesmo. tempo" pode ser, também ela, uma verdade profunda. E
talvez com esta observação eu deva encerra minha fala.” (pág. 90s).

MÉTODOS EM FÍSICA TEÓRICA – Paul Adrien Maurice Dirac

Vou procurar dar-lhes uma idéia de como um físico teórico trabalha - como enfrenta a
tentativa de obter uma melhor compreensão das leis da natureza.
Podemos olhar, em retrospectiva, para o trabalho que foi feito no passado. Ao fazê-lo,
temos no fundo a esperança de poder encontrar algumas pistas ou de aprender algumas
lições que possam ser valiosas no manejo dos problemas atuais. Os problemas que
tivemos de considerar no passado tinham, fundamentalmente, muito em comum com os
de hoje, e a revisão dos métodos bem-sucedidos do passado pode nos dar alguma ajuda
no presente.
Podemos distinguir entre dois procedimentos principais para um físico teórico. Um
deles consiste em trabalhar a partir da base experimental. Para isso, é preciso manter-se
em contato com os físicos experimentais. Lemos sobre todos os resultados que obtêm e
tentamos inseri-los num esquema abrangente e satisfatório.
O outro procedimento é trabalhar a partir da base matemática. Examinamos e criticamos
a teoria existente. Tentamos detectar as falhas nela presentes e em seguida procuramos
removê-las. A dificuldade neste caso é eliminar as falhas sem destruir os próprios
grandes sucessos da teoria existente.
Existem esses dois procedimentos, mas é claro que a distinção entre eles não é rígida.
Há todo tipo de gradação entre esses dois extremos.
O procedimento que se adota depende em grande parte do assunto em estudo. Para um
assunto sobre o qual se sabe muito pouco, em que estamos inaugurando um novo
terreno, somos praticamente obrigados a seguir o procedimento baseado no
experimento. No início, em se tratando de um assunto novo, apenas coletamos
resultados experimentais e os classificamos.
Como exemplo, recapitulemos o modo como se construiu, no século passado, nosso
conhecimento do sistema periódico para os átomos. Inicialmente, apenas se coletavam
fatos experimentais e buscava-se organizá-los. A medida que o sistema ia sendo
construído, começou-se gradualmente a confiar nele, até que, por fim, quando ele estava
quase completo, já se tinha suficiente confiança nele para poder prever que, onde havia
uma lacuna, seria mais tarde descoberto um novo átomo, que a preencheria. Todas essas
previsões se confirmaram.
Nos últimos tempos, houve uma situação muito parecida no tocante às novas partículas
da física das altas energias. Elas foram inseridas num sistema em que temos tanta
confiança que, ali onde se detecta uma lacuna, podemos prever que será encontrada uma
partícula que a preencherá.
Em qualquer região da física em que se saiba muito pouco, somos obrigados a nos
prender à base experimental, sob pena de mergulharmos em especulações extravagantes,
que quase certamente estarão erradas. Não desejo condenar por completo a especulação.
Ela pode ser divertida e indiretamente útil, mesmo que acabe por se mostrar errônea.
Deveríamos manter sempre a mente aberta para novas idéias, e, portanto, não
poderíamos nos opor por completo à especulação, mas é preciso tomar cuidado para não
se deixar envolver demais por ela.” (pág. 95s).

“Um campo de trabalho em que houve excesso de especulação é a cosmologia. Há
muito poucos fatos comprovados disponíveis, mas os teóricos têm se ocupado em
construir vários modelos para o universo, com base em quaisquer suposições que lhes
ocorram. Esses modelos são provavelmente todos errados. Neles se admite, em geral,
que as leis da natureza foram sempre tal como são agora. Não há justificação para isso.
As leis podem estar mudando e, em particular, as quantidades que são tomadas como
constantes da natureza podem estar variando com o tempo cosmológico. Tais variações
deixariam os construtores de modelos completamente perturbados.
Com um maior conhecimento sobre um assunto, quando temos uma base considerável
sobre a qual trabalhar, podemos nos voltar cada vez mais para o procedimento
matemático. A motivação subjacente passa a ser, então, a busca da beleza matemática.
Os físicos teóricos aceitam a necessidade da beleza matemática como um artigo de fé.
Não há uma razão imperiosa para esse objetivo, mas ele se provou muito proveitoso no
passado. Por exemplo, a principal razão por que a teoria da relatividade goza de uma
aceitação tão universal é sua beleza matemática.
Com o procedimento matemático, podem-se seguir dois método principais: (i) eliminar
incongruências e (ii) unir teorias previamente dissociadas.
Há muitos exemplos em que a adoção do método (i) levou a brilhante: sucessos. A
investigação que Maxwell fez de uma incongruência nas equações eletromagnéticas de
seu tempo conduziu-o a introduzir a corrente de deslocamento, que resultou na teoria
das ondas eletromagnéticas O estudo que Planck realizou das dificuldades na teoria da
radiação do corpo negro levou-o a introduzir o quantum. Einstein, tendo percebido uma
dificuldade na teoria de um átomo em equilíbrio na radiação de corpo negro, foi
conduzido a introduzir a emissão estimulada, que acabou dando lugar aos lasers atuais.
O exemplo máximo, porém, foi a descoberta, por Einstein, de sua lei da gravitação, que
surgiu a partir da necessidade de compatibilizar a gravitação newtoniana com a
relatividade especial.
Na prática, o método (ii) não se provou muito fecundo. Poderíamos pensar que os
campos gravitacional e eletromagnético, ou dois campos de longo alcance conhecidos
em física, deveriam ser estreitamente ligados, mas Einstein passou muitos anos tentando
uni-los, sem sucesso. Parece que uma tentativa direta de unificar teorias desvinculadas,
em que não há nenhuma incongruência definida a partir da qual trabalhar, é em geral
excessivamente difícil e, quando o sucesso é finalmente alcançado, ele sobrevém por via
indireta.
A adoção do procedimento experimental ou matemático depende em grande parte do
assunto em estudo, mas não inteiramente. Depende também da pessoa. Isto é ilustrado
pela descoberta da mecânica quântica. Dois homens estavam envolvidos: Heisenberg e
Schrõdinger. Heisenberg estava trabalhando a partir da base experimental, usando os
resultados da espectroscopia, que por volta de 1925 tinha acumulado um enorme
volume de dados. Muitos desses dados não tinham utilidade, mas alguns tinham, como,
por exemplo, as intensidades relativas das linhas de um multipleto. A genialidade de
Heisenberg foi ser capaz de discernir as coisas importantes em meio a grande
abundância de informação e de organizá-las num esquema natural. Foi isto que o
conduziu às matrizes.
A abordagem de Schrõdinger era muito diferente. Ele trabalhava a partir da base
matemática. Ao contrário de Heisenberg, não estava bem informado sobre os últimos
resultados espectroscópicos, mas alimentava a crença de que freqüências espectrais
poderiam ser estabelecidas por equações de autovalor, algo semelhante àquelas que
fixam as freqüências de sistemas de molas em vibração. Alimentou essa idéia por muito
tempo e acabou conseguindo encontrar a equação correta, de maneira indireta.” (pág.
96ss).

“Para entender a atmosfera em que os físicos teóricos trabalhavam nessa época, é
preciso avaliar a enorme influência da relatividade. A teoria irrompera no mundo do
pensamento científico com enorme impacto, e no fim de uma guerra longa e difícil.
Todos queriam escapar à tensão da guerra e aderiram avidamente ao novo modo de
pensar e à nova filosofia. Foi um entusiasmo sem precedentes na história da ciência.
Contra esse pano de fundo de entusiasmo, os físicos estavam tentando compreender o
mistério da estabilidade dos átomos. Schrõdinger, como todos os demais, foi tomado
pelas novas idéias e também tentou construir uma mecânica quântica no quadro da
relatividade. Tudo tinha de ser expresso em termos de vetores e tensores no espaço-
tempo. Foi uma pena, porque os tempos ainda não estavam maduros para uma mecânica
quântica relativista, o que adiou a descoberta de Schrõdinger.
Schrõdinger trabalhava a partir de uma bela idéia de Louis de Broglie, que associava
ondas e partículas de um modo relativista. A idéia de de Broglie aplicava-se apenas a
partículas livres, e Schrõdinnger tentou generalizá-la para um elétron preso num átomo.
Acabou por conseguir, mantendo-se no quadro relativista. Quando aplicou sua teoria ao
átomo de hidrogênio, porém, descobriu que ela não estava de acordo com o
experimento. A discrepância se devia ao fato de não ter levado em conta o spin do
elétron. Ele não era conhecido na época. Mais tarde, Schrõdinger percebeu que sua
teoria estava correta na aproximação não-relativista e teve de se conformar em publicar
essa versão degradada de seu trabalho o que fez após um intervalo de alguns meses.
A moral desta história é que não devemos tentar fazer demais de uma só vez. Em física,
devemos, tanto quanto possível, separar as dificuldades umas das outras, e depois
eliminá-las uma a uma.
Heisenberg e Schrõdinger nos deram duas formas de mecânica quântica, que logo se
constatou serem equivalentes. Forneceram-nos duas representações, vinculadas por uma
certa transformação matemática.
Participei dos trabalhos iniciais com a mecânica quântica, seguindo o procedimento
baseado na matemática e com um ponto de vista muito abstrato. Usei a álgebra não-
comutativa, que as matrizes de Heisenberg sugeriam ser a principal característica para
uma nova dinâmica, e examinei de que modo a dinâmica clássica podia ser adaptada
para se adequar a ela. Outras pessoas estavam trabalhando nesse tema, a partir de vários
pontos de vista, e todos nós obtivemos resultados equivalentes, mais ou menos ao
mesmo tempo.” (pág. 98s).
“Gostaria de mencionar que descobri que as melhores idéias em geral ocorrem não
quando as buscamos ativamente, mas quando estamos mais relaxados. O professor
Bethe contou-nos como tinha idéias ao viajar de trem e como, muitas vezes, as
elaborava antes que a viagem acabasse. Comigo também era assim. Costumava fazer
longas caminhadas solitárias aos domingos durante as quais tendia a rever a situação
atual, de um modo tranqüilo. Essa prática mostrou-se muitas vezes proveitosa, ainda
que (ou talvez porque) o objetivo básico da caminhada fosse relaxar e não pesquisar.
Foi numa dessas ocasiões que me ocorreu a possibilidade de uma vinculação entre
comutadores e colchetes de Poisson. Como eu não sabia muito bem o que era um
colchete de Poisson, estava muito incerto sobre essa ligação. Ao chegar em casa,
verifiquei que não tinha nenhum livro que explicasse os colchetes de Poisson, de modo
que tive de esperar impacientemente, que as livrarias abrissem, na manhã seguinte, para
finalmente confirmar a idéia.” (pág. 99).

“A introdução dos espinores, além de proporcionar uma teoria relativista em
consonância com os princípios gerais da mecânica quântica, forneceu uma explicação
para o spin do elétron, embora essa não fosse a intenção original do trabalho. Mas
surgiu então um novo problema, o das energias negativas. A teoria fornece simetria
entre energias positiva e negativa, ao passo que na natureza só podem ocorrer energias
positivas.
Como acontece freqüentemente com o procedimento matemático em pesquisa, a
solução de uma dificuldade conduz a outra. Pode-se pensar que, nesse caso, não se fez
nenhum progresso, mas não é assim, porque a segunda dificuldade é mais remota que a
primeira. Pode ser que ela já estivesse ali todo o tempo, e apenas tenha vindo à tona
com a remoção da primeira.
Este foi o caso com a dificuldade da energia negativa. Todas as teorias relativistas dão
simetria entre energias positiva e negativa, mas anteriormente essa dificuldade fora
camuflada por imperfeições mais grosseiras na teoria.
A dificuldade é removida pelo pressuposto de que, no vácuo, todos os estados de
energia negativa estão preenchidos. Somos levados então a uma teoria de pósitrons
juntamente com elétrons. Com isto, nosso conhecimento transpõe uma etapa, mas uma
nova dificuldade volta a aparecer, desta vez ligada à interação entre um elétron e o
campo eletromagnético.
Quando escrevemos as equações que supostamente descrevem de modo preciso essa
interação e tentamos resolvê-las, obtemos integrais divergentes para quantidades que
deveriam ser finitas. Mais uma vez, essa dificuldade estava de fato presente o tempo
todo na teoria, adormecida ali, e só nesse momento se torna dominante.” (pág. 101).

“A meta final é obter equações iniciais adequadas, a partir das quais toda a física
atômica possa ser deduzida. Ainda estamos longe disso. Uma maneira de avançar nessa
direção é, em primeiro lugar, aperfeiçoar a teoria da física das baixas energias, que é a
eletrodinâmica-quântica, e depois ampliá-la para energias cada vez mais altas.
Entretanto, a eletrodinâmica-quântica atual não corresponde ao elevado padrão de
beleza matemática que seria de esperar de uma teoria física fundamental, o que nos leva
a suspeitar que uma alteração drástica das idéias básicas ainda pode ser necessária.”
(pág. 104s).

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SALAM, HEISENBERG, DIRAC - A Unificação das Forças Fundamentais

  • 1. SALAM, A. HEISENBERG, W. DIRAC, P.A.M. A Unificação das Forças Fundamentais: O grande desafio da física contemporânea. Rio de Janeiro: Jorge Zahar, 1993. Resumo por: Carlos Jorge Burke – www.cburke.com.br OBS: Se desejar, solicitar arquivo pelo blog. “Introdução, nota 5. F.J. Dyson, no belo livro que acaba de lançar, Infinito em todas as direções: do gene à conquista do Universo [São Paulo, Best Seller, 1989], diz o seguinte sobre a segunda idéia de Dirac: “Hoje podemos dizer que, em geral, os maiores cientistas em todas as disciplinas são unificadores. Isto especialmente verdadeiro na física. Newton e Einstein foram insuperáveis como unificadores. Os grandes triunfos da física foram triunfos de unificação. Chegamos quase a considerar ponto pacífico que o caminho do progresso na física será uma unificação cada vez mais ampla, que introduzirá um número crescente de fenômenos no âmbito de uns poucos princípios fundamentais. Einstein tinha tal confiança na correção dessa rota que no fim da vida, não manifestava quase nenhum interesse pelas descobertas experimentais que começavam então a tornar o mundo da física mais complicado. É difícil encontrar entre físicos oposições sérias à unificação”.” (pág. 55s). “A terceira pessoa a mencionar neste contexto é Isaac Newton. Por volta de 1680, ele afirmou que a força da gravidade "terrestre" (que faz as maçãs caírem no chão, e que na visão de Newton era uma força universal) era a mesma coisa que a gravidade "celeste" (a força que mantém os planetas em movimento em volta do Sol). É uma força de grande alcance. Seus efeitos podem ser sentidos a qualquer distância, embora atenuados pelo quadrado da distância entre os dois objetos “gravitantes” em questão. Newton introduziu uma nova constante fundamental da natureza, G, que caracteriza a intensidade da força gravitacional A constante G tem uma magnitude muito pequena. A gravidade é sempre atrativa, ao contrário de outras forças da natureza que, como veremos, podem ser tanto repulsivas quanto atrativas. Isto lhe confere a vantagem de ser uma força que sempre soma.” (pág. 14s). “A unificação de forças fundamentais seguinte foi proposta cerca de 150 anos depois. Quero evocar Faraday e Ampêre no contexto do eletromagnetismo - a “força da vida" (assim chamada porque toda ligação química é de origem eletromagnética, o que se aplica a todos os fenômenos de impulsos nervosos). Antes da década de 1820, a eletricidade e o magnetismo eram considerados duas forças distintas. Faraday e Ampêre, na maior unificação dos tempos modernos, foram os primeiros a mostrar que ambos não passavam de dois aspectos de uma única força - o eletro-magnetismo. Se considerarmos um objeto eletricamente carregado, um elétron, por exemplo, poderemos detectar (pondo um outro elétron perto dele) uma força elétrica de repulsão. Mas, assim que o primeiro elétron se movimenta, vamos encontrar também uma força magnética que não estava ali antes. Essa força pode ser detectada por seu efeito sobre uma agulha magnética posta perto do elétron que se move. O que distingue a eletricidade do magnetismo é portanto uma questão de ponto de vista - a saber, o fato de a carga elétrica estar em movimento ou não. Esta é a essência da unificação da eletricidade e do magnetismo. (Antecipando, quero dizer que encontraremos um fator ambiental similar, a temperatura do universo primitivo, no contexto de uma outra unificação - a do eletromagnetismo com a força nuclear fraca.) A unificação das duas forças fundamentais antes dissociadas da eletricidade e do magnetismo foi a base da tecnologia da corrente elétrica do século XIX, que usava, para
  • 2. gerar correntes elétricas, a rotação de uma bobina entre os dois pólos de um magneto. Esta foi a base dos motores elétricos e dos dínamos elétricos que levaram às usinas de energia elétrica. Estas foram tornadas possíveis pela notável união de duas das forças diversas da natureza. Não me parece que com tentativas improvisadas teria sido jamais possível gerar a base quantitativa desse desenvolvimento.” (pág. 15s). “O eletromagnetismo clássico chegou a seu ápice 50 anos mais tarde no trabalho de Maxwell, que mostrou que, se uma carga elétrica fosse acelerada (isto é, se houvesse uma mudança em sua velocidade), emitiria energia na forma de radiação eletromagnética (ondas de rádio, ondas de calor, raios luminosos, raios X e raios gama, que só diferem uns dos outros em seus comprimentos de onda). Essa unificação maravilhosa foi a base da tecnologia do século XX, com o rádio, a televisão e os raios X dominando nossas vidas. Maxwell unificou a óptica com o eletromagnetismo. O que há de mais notável nessa unificação, do ponto de vista teórico, é que ele tinha apenas um número para guiá-lo. Usando uma aparelhagem bastante rudimentar, verificou que a velocidade da luz podia ser expressa em termos de duas constantes conhecidas (que expressavam propriedades elétricas e magnéticas do vácuo), tal como fora previsto por sua teoria. Esta era uma confirmação "indireta" de suas idéias. Infelizmente ele morreu com apenas 48 anos, não tendo vivido o bastante para ver a radiação eletromagnética produzida por cargas elétricas aceleradas - o que foi demonstrado por Hertz na Alemanha, cerca de dez anos após sua morte.” (pág. 16). “Finalmente, isto nos conduz a Einstein, que foi responsável por várias idéias unificadoras de grande alcance. Sua teoria da relatividade especial (1905) situa o espaço e o tempo em pé de igualdade. Uma conseqüência desse trabalho foi a fórmula da dilatação do tempo, segundo a qual quanto mais depressa um corpo se move, mais longa é sua vida - do ponto de vista de um observador estacionário. Este fenômeno particular pode ser observado todos os dias, com a maior precisão possível, no CERN: em Genebra, onde uma partícula como o múon, com um tempo de vida definido (tal como medido por qualquer observador que se movimente com a partícula), parece a nós, observadores estacionários, viver cada vez mais tempo, à medida que sua velocidade se aproxima da velocidade da luz. O segredo da longevidade, portanto, é permanecer em movimento! Outra conseqüência da teoria especial da relatividade de Einstein é uma bem conhecida relação entre massa e energia, expressa na famosa equação E=mc², onde c é a velocidade da luz, m é a massa da partícula em movimento e E é sua energia.” (pág. 16s). “Einstein foi ainda mais longe em sua teoria da relatividade geral (1915). Realizou uma geometrização da física no sentido de que, em sua teoria, a curvatura do espaço e tempo determinava a gravitação. Curvatura é uma noção geométrica, ao passo que a gravitação é uma das forças fundamentais da natureza. Por um golpe de gênio, Einstein identificou as duas, levando assim a cabo a geometrização da física. Esta era uma idéia nova para a maioria das pessoas na época de Einstein, mas seu pensamento não deixava de ter algum precedente. Cerca de cem anos antes, Gauss também pensara que o espaço talvez fosse curvo. Chegou a fazer experimentos para testar isso: instalou estações de observação no alto de três montanhas, distantes algumas milhas entre si. Mediu os ângulos feitos por raios de luz refletidos de uma estação para a
  • 3. outra de modo a formar um triângulo. Se os ângulos do triângulo somassem menos (ou mais) de 1800, teria provado que o espaço era curvo. Encontrou um resultado nulo - a soma dos ângulos que mediu era 180°. Hoje sabemos que isso aconteceu porque Gauss estava trabalhando com distâncias de apenas algumas milhas, não com as distâncias estelares em que a curvatura do espaço-tempo se manifesta.” (pág. 17s). “A teoria da gravidade de Einstein fez reviver a idéia de que espaço e tempo eram curvos. Os passos subseqüentes foram dados pelo astro físico russo Friedmann, que considerou a estrutura total do universo e descobriu que um universo em expansão podia aparecer como uma solução das equações de Einstein. Isto foi experimentalmente confirmado por Hubble, que verificou que galáxias distantes estão se afastando de nós, precisamente de acordo com essas idéias. Em 1965, Penzias e Wilson descobriram, por acaso, uma radiação de fundo com temperatura de 3°Kelvin (-270°C), que aparentemente permeia a totalidade do espaço. Isso foi interpretado como uma radiação surgida 2 x 10 (elevado a 5) anos (= 10 (elevado a 13) segundos) depois do início da vida do universo. A expansão do universo teria resfriado a radiação, entre o momento em que fora gerada e o de sua detecção, na atualidade (10 (elevado a 10) anos depois do início do “tempo”). Extrapolando para trás, a partir dos 2 x 10 (elevado a 5) anos, chegaríamos (especulativamente) ao momento em que o universo teve início, o momento do chamado Hot Bang (ou Big Bang).” (pág. 18). “Depois dos êxitos da teoria da relatividade geral e do modo como explica a gravitação, em termos de espaço e tempo, Einstein começou a conjecturar se haveria uma ligação entre a gravidade e o eletromagnetismo em particular, indagava ele, seria possível ver também o eletromagnetismo como uma propriedade geométrica do espaço-tempo, o que uniria as duas forças da natureza'? Essas duas forças obedecem à mesma lei do inverso do quadrado, embora suas intensidades, a distâncias comparáveis, sejam imensamente diferentes. Alguns anos antes, Faraday realizara experimentos para tentar encontrar uma unidade entre a eletricidade e a gravidade (newtoniana). Usando pesos, que supunha serem suficientemente grandes, em queda livre, esperava detectar uma corrente elétrica que seria revelada por um galvanômetro próximo. Faraday não encontrou efeito algum. Escreveu em seu diário: Aqui terminam minhas tentativas, por ora. Os resultados são negativos. Eles não abalam minha forte crença na existência de uma relação entre gravidade e eletricidade, embora não forneçam prova alguma de que tal relação existe. Sendo um experimentador extremamente meticuloso, Faraday registrou os resultados que obteve, sem se deixar influenciar por suas tendenciosidades teóricas. Atualmente, pensa-se que o efeito que Faraday buscava devia existir, e talvez já tenha até sido visto, mas que se manifestaria mais convincentemente em experimentos cosmológicos, em que os pesos a serem lançados em queda livre seriam de tamanhos estelares. Essa unificação da relatividade geral e do eletromagnetismo foi o sonho que Einstein alimentou e no qual trabalhou durante boa parte de sua maturidade. Dedicou 35 anos a esse problema, e acreditamos que, ao fim, não teve êxito. Isto talvez explique por que Dirac, em 1968, fez uma avaliação negativa sobre a possibilidade da unificação das forças fundamentais.” (pág. 20s).
  • 4. “Uma tentativa nessa direção, entretanto, merece ser mencionada. Trata-se da que foi feita por Kaluza e elaborada mais tarde por Klein. Kaluza enviou a Einstein um artigo - em 1919, creio - em que dava o passo audacioso de propor que, para efeitos de uma unificação (geométrica) do eletromagnetismo com a gravitação, era preciso considerar um espaço-tempo com cinco dimensões. Kaluza verificou que a curvatura correspondente à dimensão extra (a quinta) origina a força eletromagnética, assim como, nas três dimensões comuns do espaço, a curvatura mais o tempo dão origem à gravidade. Que são cinco dimensões'? Imagine-se olhando para um lápis de uma distância bem grande. Dessa distância, o lápis parece uma linha fina - unidimensional - e não se percebe que é de fato um pequeno cilindro, com uma superfície bidimensional. Da mesma maneira, cinco dimensões podem parecer apenas quatro, se a quinta for minúscula. (Klein, na verdade, propôs que a dimensão extra devia estar enroscada num comprimento de cerca de 10 (elevado a -33) cm (o comprimento de Planck), de tal modo que a curvatura correspondente à quinta dimensão devesse corresponder à magnitude ·”correta” de carga elétrica (isto é, a unidade de carga do próton). Kaluza enviou seu artigo para Einstein, incumbindo-o de encaminhar para publicação. Einstein (embora a princípio tenha gostado da idéia de uma dimensão extra, não percebida) teve dúvidas. O resultado foi que, por causa dele, a publicação do texto acabou sendo adiada por dois anos. Kaluza sentiu-se tão infeliz que abandonou a física fundamental e, ao que parece, começou a trabalhar na teoria da natação. A moral desta história, a meu ver, é: quando tiver uma idéia razoável, não a envie a um grande homem; publique-a você mesmo. Antecipando observações que farei mais tarde, quero mencionar que está havendo um retorno, em nossos dias, às idéias de Kaluza-Klein e que isto é decisivo para nossa possível Teoria de Tudo. Na teoria das supercordas, por exemplo, começamos pressupondo dez dimensões. Dessas dez, quatro são as dimensões conhecidas do espaço-tempo, enquanto as outras estão compactadas em pequenos tamanhos de Planck de 10(elevado a -33) cm, de modo a acomodar tanto o eletromagnetismo quanto as forças nucleares. Deste modo, todas estas forças poderiam se combinar com a gravitação em uma força fundamental.” (pág. 20s). “Até o momento, falei sobretudo sobre a gravidade e o eletromagnetismo, as únicas forças físicas conhecidas até a primeira parte deste século. Agora devo falar das outras forças, as duas forças nucleares - que foram descobertas neste século e que Einstein (e, sob este aspecto, Dirac) ignorou sistematicamente. As forças nucleares são de dois tipos, as chamadas “fracas” e as “fortes”. Antes de discuti-las, será preciso saber alguma coisa sobre as entidades elementares que interagem através dessas forças. O conceito de elementaridade da matéria é algo que evoluiu com o passar do tempo. Das quatro entidades “elementares” dos gregos, três (terra, água e ar) poderiam ser chamadas de entidades “elementares” da matéria, ao passo que a quarta (fogo) representava uma força. Se estivéssemos trabalhando, digamos, em 1888, conceberíamos os átomos como as partículas fundamentais, e a química seria, na época, a ciência das partículas elementares. (...). Há um fato decisivo relacionado com essas forças nucleares fortes øi seu pequeno alcance. Se prótons e nêutrons estiverem separados por uma distância de mais de 10,13 em, a força nuclear forte é essencialmente zero. A distâncias maiores, resta apenas a
  • 5. força eletromagnética (entre prótons), além, é claro, da força universal da gravidade.” (pág. 22). “Pesquisas posteriores (feitas por Hofstadter por volta de 1956) mostraram que era plausível que os prótons e os nêutrons, eles mesmos, não fossem partículas pontuais elementares, mas tivessem um tamanho finito, sendo portanto compostos. Hoje, graças às descobertas feitas no SLAC (Stanford Linear Accelerator Centre) acreditamos que são feitos de objetos ainda menores, chamados quarks, que talvez sejam, eles próprios, elementares e pontuais - idéia introduzida em 1963 por Gell-Mann e Zweig.” (pág. 23s). “Isto nos traz à famosa equação de Dirac. formulada pela primeira vez em 1927. para elétrons. Essa equação pode igualmente descrever entidades elementares como elétrons livres ou quarks livres, ou até mesmo entidades compostas livres como prótons e nêutrons (livres, quando não estão interagindo com objetos similares). O primeiro ponto importante sobre a equação é que, embora tenha sido formulada com base unicamente na teoria especial da relatividade de Einstein e na mecânica quântica, ela foi capaz de descrever tanto o "spin intrínseco correto" como a “helicidade” (ou “quiralidade”) dos elétrons. Na mecânica quântica, o “spin intrínseco", ou simplesmente spin, é um conceito de grande importância. Significa que cada porção de matéria (ou de energia) se comporta como um pião girando, possuindo portanto um spin intrínseco. Em seguida, a helicidade (helicity ou handedness) é definida com relação à direção de movimento de uma partícula, como a componente do spin que tem essa mesma direção ou a oposta. (...). De onde vem o spin ? A resposta de Dirac foi: da união da relatividade especial de Einstein com a mecânica quântica! (...). O segundo ponto a ressaltar na equação de Dirac é que ela prevê que cada partícula tem uma antipartícula - com massa e spin iguais, mas carga elétrica oposta (se tiver alguma). Além disso, uma partícula carregada e sua antipartícula podem se destruir uma à outra; o excedente de energia vai então para a produção de fótons (y's). Como disse, Dirac chegou a essa equação na tentativa de unificar a mecânica quântica e a relatividade especial. Descobriu que sua equação, assim como descrevia partículas de energia positiva, descrevia também objetos com energia “negativa”. Ora, ninguém jamais vira tais objetos com energia negativa.· Seu comportamento seria o das mulas proverbiais: quando os puxamos para a frente, andam para trás! Na teoria quântica, não havia como se livrar, por decreto, desses objetos com energia negativa. Era preciso encontrar uma nova explicação para eles. (...). Que reinterpretação propôs Dirac para que as soluções de energia negativa fizessem sentido? Seu passo decisivo foi considerar o estado mais baixo possível de energia - aquele em que todos os estados de energia negativa estão preenchidos com elétrons - como sendo o estado em que nenhuma partícula é observada (o chamado estado de “vácuo”). A partir disso, podia interpretar qualquer buraco não preenchido em estados de energia negativa como positivo - o que chamou de anti elétrons (ou pósitrons). Tudo nesta interpretação é coerente - mesmo no caso em que um campo elétrico externo está presente. Não é difícil ver que, nesta reinterpretação, o antielétron (isto é, um buraco negativamente carregado de energia negativa) expressaria um “pósitron” de carga elétrica positiva e energia positiva.
  • 6. Foi por esta razão que Dirac pôde prever a existência de uma nova partícula, o pósitron - a antipartícula do elétron. Esta foi efetivamente descoberta um ano depois que sua existência foi postulada por Dirac. Fo um grande triunfo, mas triunfo experimental ainda maior foi a produção de antiprótons, por Segrê e Chamberlain, em 1956, e a produção posterior de antidêuterons (compostos) por Zichichi e seus colaboradores, em 1965.” (pág. 24ss). “A equação de Dirac e sua bem-sucedida reinterpretação foi um dos maiores feitos da física do século XX. Isto deu lugar a uma exaltação sem limites desse físico, que a história que contarei a seguir vai ilustrar (foi algo que testemunhei pessoalmente, na conferência Solvay de 1961). A história envolve Feynman - o maior físico de minha geração -, que, segundo creio, fez a primeira das conferências Dirac. Aqueles dos senhores que freqüentaram as antigas conferências Solvay hão de se lembrar que, naquelas ocasiões, as pessoas se sentavam ao longo de mesas compridas. arrumadas como para uma oração. Como numa assembléia quaker, não havia agenda fixa; a expectativa - raras vezes frustrada - era a de que alguém se sentiria impelido a dar início à discussão, espontaneamente. Na conferência Solvay de 1961, eu estava sentado ao lado de Dirac, esperando que a sessão começasse, quando Feynman chegou e sentou-se em frente. Estendeu a mão e disse: “Sou Feynman”. Dirac estendeu a sua e disse: "Sou Dirac". (Ao que parece, era a primeira vez que se apresentavam formalmente, pelo menos durante aquela conferência.) Fez-se um silêncio, o que. da parte de Feynman, era algo de bastante inusitado. Finalmente este último, como um menino de escola diante de um professor, disse a Dirac: “Deve ter sido bom ter inventado aquela equação”; - “Mas isso foi há muito tempo", Dirac respondeu. Novo silêncio. Para quebrá-lo, Dirac - logo quem - perguntou a Feynman: "E o senhor, em que está trabalhando?". Resposta de Feynman: "Teoria do méson". E Dirac: "Está tentando inventar uma equação similar?". "Isso seria muito difícil", respondeu Feynman, diante do que Dirac observou, com uma voz ansiosa: "Mas é preciso tentar". A essa altura a conversa acabou, porque a reunião tinha começado. Esta foi, portanto, uma das grandes contribuições de Dirac para a teoria das partículas elementares: sua famosa equação, capaz de descrever os spins e as helicidades das entidades elementares como os elétrons, os quarks e suas antipartículas e também dos prótons e nêutrons livres (e das antipartículas destes).” (pág. 27s). “Como disse antes, a força nuclear "forte" atua apenas entre os membros do dubleto (p+, nº). A força nuclear "forte" tem um alcance de cerca de 10(elevado a -13) cm. É ela a força responsável pela fissâo nuclear e pela fusão nuclear (a fonte de energia das estrelas). (...). A força nuclear fraca é a força responsável pela chamada radioatividade beta, descoberta por Madame Curie. Ela desempenha um papel decisivo da produção de energia pelo sol. A força nuclear fraca é universal, mas não tão universal quanto a gravidade. (...). A força nuclear “fraca” é assim chamada porque (a distâncias comparáveis) tem 10(elevado a -5) vezes a intensidade da força eletromagnética. O alcance da força fraca não passa de 10(elevado a -16) cm (o que é menor, por um fator de 1.000, que o alcance da força nuclear forte).” (pág. 29s). “Em resumo, consideramos partículas de spin h/2. Estas se distribuem em duas categorias - os seis componentes leptônicos com helicidade esquerrda que exibem a
  • 7. força nuclear fraca de um alcance da ordem de 10(elevado a -16) cm, e os seis quarks, que mantêm interações fortes entre si e compõem os prótons e os nêutrons além de outras partículas nucleares. Estes interagem por meio de uma força nuclear forte cujo alcance também é pequeno (10(elevado a -13) cm). Além das duas forças nucleares (fraca e forte), há, é claro, a força eletromagnética entre os prótons e os elétrons eletricamente carregados, e ainda a força universal da gravidade, que somam, juntas, as quatro forças fundamentais da natureza.” (pág. 30). CAPITULO 5 - A FORÇA NUCLEAR FORTE COMO FORÇA DE GAUGE E O MODELO PADRÃO Nota 5. “As descobertas das últimas décadas na física de partículas nos conduziram a dar uma grande ênfase ao conceito de simetria quebrada. O desenvolvimento do universo a partir de seus primórdios mais remotos é visto como uma sucessão de quebras de simetria. Tal como emerge no momento de sua criação, no Big Bang, o universo é completamente simétrico e desprovido de características. À medida que esfria e passa a temperaturas cada vez mais baixas, as simetrias vão se quebrando, uma após outra, permitindo o surgimento de uma diversidade cada vez maior. O fenômeno da vida também se encaixa naturalmente neste quadro. Também a vida é uma quebra de simetria." (F.J. Dyson, lnfinite in All Directions Harper and Row, Cornelia and Michael Bessie books, 1988.).” (pág. 60). “Há um nível adicional de unificação, após aquela implicada pelo Modele Padrão. Nele, tentamos unir a força nuclear forte com a força "eletrofraca" Esta idéia é uma decorrência direta da unificação eletrofraca - com seu: novos mensageiros de gauge e suas novas partículas de Higgs, não de gauge. Essa teoria é geralmente conhecida como Teoria da Grande Unificação (GUT, de Grand Unified Theory) (nota 1. A teoria foi proposta em 1972 (e, numa versão diferente, em 1974). Jogesh Pati e eu chamamos a nova força de gauge de “força eletronuclear”. Esta consistiria de eletromagnetismo + a força nuclear fraca + a força nuclear forte. Uma combinação de forças como esta foi chamada de “força da grande unificação” - este “grande nome” foi cunhado por Sheldon Glashow e Howard Georgi; a meu ver, ele seria mais apropriado para designar a teoria final (a Teoria de Tudo), em que a gravitação também estaria unificada com as forças eletronucleares. Mas...) Uma previsão das teorias desse tipo é que o próton acabaria necessariamente por sofrer um decaimento, o que é desejável do ponto de vista da cosmologia dos primórdios do universo. Se o decaimento do próton de fato ocorresse (ainda que muito lentamente, já que tem um tempo de vida previsto em 10(elevado a 32) anos), juntamente com a violação da simetria temporal, chegaríamos a uma compreensão do porquê da grande escassez de antiprótons no universo. Experimentos conduzidos em cavernas profundas, na Terra, ainda não forneceram provas conclusivas do decaimento do próton. Talvez experimentos futuros tenham de ser realizados na Lua, para eliminar os problemas causados na Terra pela radiação de neutrinos.” (pág. 45s). “Mencionei antes o papel da tecnologia dos aceleradores na verificação da teoria eletrofraca unificada. Desde que comecei a fazer pesquisas em física de partículas, o tamanho e o custo dos experimentos cresceu enormemente. Isto nos trouxe a um patamar em que, se não tivermos cuidado, pode se tornar impossível levar adiante os testes de nossas teorias. Na época do Old Cavendish, aqui em Cambridge, o trabalho experimental era no estilo "barbante e cera". Não é mais assim. No CERN, o anel SppS tem seis quilômetros de
  • 8. circunferência, ao passo que o anel LEP (Large Electron Positron Collider) tem 27 km. O SSC (Superconduction Super Collider) pode vir a ter uma circunferência de cerca de 93.” (pág. 46). “Em primeiro lugar, há quatro aceleradores que serão ativados em breve (antes de 1999), e dos quais ouviremos falar muito mais nos próximos anos. Esses aceleradores podem descobrir as partículas de Higgs, a supersimetria, as forças fracas "esquerdas", ou estabelecer se os quarks são elementares, ou não. Isto depende da energia utilizável do acelerador e do limiar de energia previsto para o processo a ser observado. Em seguida, há os aceleradores pp, que no momento ainda são sonhos acalentados pelos físicos. Há o Large Hadron Collider, grande anel de colisão de partículas próton-próton (LHC LEP III), que pode ser superposto ao túnel LEP (ê + e) de 27 km no CERN, em Genebra. Há o SSC, um anel de colisão próton-próton, que o Departamento de Energia dos Estados Unidos pretende construir no Texas. As verbas requeridas para os cinco anos de sua construção são da ordem de cinco bilhões de dólares. Cabe comparar isto com o inútil SDI (programa de Iniciativa de Defesa Estratégica), que já gastou 12,7 bilhões de dólares. Há também a proposta de construir o Eloisatron, o maior dos anéis de colisão próton-próton, com 200 km de circunferência, na Sicília. Numa categoria diferente, há os aceleradores lineares elétron-pósitron (antielétrons): (I) o CUC, que é a proposta (e+ e-) do CERN; (2) o VLLP. um acelerador similar na URRS. As máquinas elétron-pósitron (e + e-) têm a grande vantagem de que toda a energia das partículas em colisão fica disponível para a experimentação, ao passo que numa máquina próton-próton - como o SSC - apenas cerca de 1/6 a 1/3 da energia total das partículas em colisão pode ter emprego útil. Isto ocorre porque cada próton é feito de três quarks, e apenas dois destes, um de cada próton interage de fato, de modo que a energia extra nas partículas que não interagem é simplesmente perdida. No momento, os aceleradores circulares (elétron-pósitron) estão limitados pela força dos ímãs flexores, que devem curvar as partículas colocando-as em seus trajetos circulares. Há agora a perspectiva de usar a tecnologia da supercondutividade. que fornecerá ímãs mais poderosos e de produção mais barata. Há, contudo, uma limitação que não pode ser contornada: a que decorre da radiação síncrotron emitida por toda partícula carregada quando se move em seu trajeto circular. A energia necessária (de acordo com as idéias de Maxwell) aumenta com a energia do acelerador elevada à quarta potência. Nenhum gerador de energia elétrica poderia fazer face às demandas de energia desses aceleradores circulares. A segunda variedade é a dos aceleradores lineares. Estes não sofrem dos mesmos problemas que prejudicam os aceleradores circulares, como a radiação síncrotron, mas são limitados pelo gradiente do campo elétrico disponível, usado para acelerar elétrons (ou prótons). No momento, os melhores campos elétricos que podem ser ativados não têm mais que um gigavolt por metro. É possível que, em vinte anos, ocorra uma melhoria de mil vezes, com a tecnologia do acelerador "beat-wave laser-plasma" (tecnologia de aceleradores de plasma a laser pulsante). Mesmo nesse caso, porém, a energia máxima de Planck, de 10(elevado a 20) massas do próton, exigiria um acelerador com dez anos luz de comprimento! Isto desperta em nós a visão de dinastias de físicos de partículas a viajar ao longo do acelerador, a bordo de uma espaçonave especial!” (pág. 46ss). “Outra área em que a física de partículas nos forneceu importantes subsídios é a da cosmologia do surgimento do universo, a tal ponto que esse tema tomou-se sinônimo de física das partículas. Isto ocorre porque as transições de fase, que separam uma era
  • 9. cosmológica de outra, são também os mecanismos pelos quais a força unificada final é convertida em duas (gravitacional + eletronuclear), em três (eletrofraca + nuclear forte + gravitacional), e finalmente nas quatro forças (eletromagnética + nuclear forte + nuclear fraca + gravitacional), à medida que a temperatura global do universo vai declinando. O fato de essas transições ocorrerem a altas temperaturas (que vão de 300 a l0(elevado a 20) massas do próton), sendo improvável que temperaturas superiores a 106 massas do próton possam jamais vir a ser obtidas em aceleradores produzidos pelo homem, torna o universo primitivo e sua cosmologia atraentes para o físico experimental de partículas, uma vez que fornecem o único laboratório em que, pelo menos indiretamente, será possível testar nossas teorias (por meio da detecção de vestígios de eras passadas, de temperaturas mais elevadas, que ainda possam ser encontrados hoje). Podemos distinguir três eras cósmicas: (a) A era mais recente, que começou por volta de 1012 segundos 10(elevado a 12) segundos (10(elevado a 5) anos) após o Hot Bang, com a radiação de Penzias-Wilson, e continua até hoje, passados 10(elevado a 18) segundos após o Hot Bang. Esta é a Era da Matéria de Grande Escala, em que as galáxias e os superaglomerados se desenvolveram. Conhecemos a física desta era, mas a astrofísica ainda é obscura. (b) A segunda, chamada Era Eletrofraca começou com a transição de fase que correspondeu à quebra espontânea da simetria eletrofraca, a uma temperatura por volta de 300 massas do próton - o que, segundo os cálculos, ocorreu por volta de 10(elevado a -12) segundos - e prolongou-se até a emissão da radiação de Penzias- Wilson. (c) A terceira e mais remota é a Era Especulativa, que teria se estendido de 10(elevado a -43) após o Hot Bang e perdurado até 10(elevado a -12) segundos. Durante este longo período, é possível que "cordas" bidimensionais (ver adiante) tenham dado origem ao espaço-tempo de quatro dimensões que hoje conhecemos. Entre as zonas problemáticas dessa última era estão os problemas colocados pela constante cosmológica e o da não-observação de monopolos magnéticos. A constante cosmológica foi introduzida por Einstein na relatividade geral com a finalidade de prover uma força repulsiva (em acréscimo à força gravitacional, atrativa), de modo a tornar o universo estático. Então Hubble descobriu que, de fato, o universo estava em expansão. Já não havia nenhuma necessidade da constante cosmológica. (Segundo Einstein, a introdução dessa constante foi a maior tolice da sua vida.) Acreditamos que, em qualquer teoria natural de física microscópica teríamos boas razões para fazer essa constante igual a zero. Uma razão assim foi invocada muito recentemente na teoria dos "buracos de verme" (wormholes), que podem conectar nosso universo com outro, um universo bebê. Isto poderia ser parte da Era Especulativa, 10(elevado a -43) após o Bang. Também estaria incluída nessa era a fase inflacionária especulativa da expansão do universo, que garantiria a diluição da densidade dos monopolos magnéticos nos limites hoje observados, dada a rápida expansão implicada por essa inflação. (Dirac introduziu esses monopolos antes, para assegurar uma simetria completa entre eletricidade e magnetismo. Hoje isto faz parte de qualquer Teoria da Grande Unificação que se respeite.)” (pág. 48ss). “Muitos dilemas na física de partículas e na cosmologia requerem· uma experimentação que não usa aceleradores, como as oscilações dos neutrinos. Será, por exemplo, que Ve, Vu e Vr se transformam uns nos outros, e a que distâncias? A matéria escura - que é eletromagneticamente invisível aos nossos telescópios, e só manifesta sua presença através da força fraca. ou gravitacionalmente, e que, na concepção dos cosmologistas contemporâneos, pode constituir nada menos que 90% de toda a matéria no universo -
  • 10. existe de fato? Poderiam os ubíquos neutrinos ser afinal de contas, a matéria escura?” (pág. 50). “E agora passamos à última etapa de nossa busca de unificação. Poderá a gravidade ser também unificada com as outras forças proporcionando a realização final do sonho de Faraday e Einstein? Neste ponto eu retorno ao critério básico de Dirac. O que impediu que esta teoria fosse sequer cogitada até hoje foi o temor de considerar os infinitos que a teoria da gravitação engendra assim que é usada em cálculos de ordem mais elevada. (Alguns desses infinitos, mas infelizmente não todos, foram reduzidos por meio do uso de idéias de supergravidade.) Esse problema de Dirac foi aparentemente sanado pouco tempo atrás pela hipótese de que as entidades fundamentais da física não são partículas pontuais, mas cordas, que fazem laços de tamanho finito, em comprimento de Planck. Essas cordas vibram à maneira das cordas de um violino (...). A física mudaria novamente de paradigma, com as entidades fundamentais aparecendo agora como minúsculas cordas, não mais como partículas pontuais. A matemática necessária é a matemática das superfícies bidimensionais de Riemann: espaço e tempo quadridimensionais surgem como conceitos secundários. Uma teoria de cordas deve atender a algumas exigências físicas: (a) Todas as partículas fontes (quarks e léptons), mais os mensageiros (como glúons, fótons, W¹, Zº), mais as partículas de Higgs do Modelo Padrão devem estar compreendidos nesse quadro; (b) Deve ser uma teoria geométrica, uma vez que deve conter, como uma parte sua, a teoria einsteiniana da gravitação; (c) Deve descrever a gravidade sem nenhuma quantidade infinita. Satisfazer a essas três condições seria um milagre, mas, ao que parece, esse milagre está acontecendo, pelo menos num espaço-tempo de dez dimensões em que, a partir do trabalho de Green e Schwarz, parece ter emergido, no outono de 1984, uma teoria de supercordas única. O aspecto importante é que a teoria da gravidade de Einstein emerge como uma subunidade especial da teoria de cordas. Isto justifica o desenho da serpente de Glashow (ver Fig. 8), que engole a própria cauda - isto é, o encontro da microfísica na escala de Planck (10(elevado a -33) cm) com a macrofísica descrita pela teoria da gravidade de Einstein, que tem a extensão do universo (10(elevado a 28) cm). Esta é, a meu ver, a unificação final. (...). Poderiam as cordas ser realmente a Teoria de Tudo, combinando todas as partículas fontes conhecidas, os quarks e os léptons, além dos mensageiros que conhecemos e das partículas de Higgs e das interações entre todos eles? Nesse caso, representariam elas a culminação de nossos esforços para unificar as forças fundamentais da natureza? Estas são perguntas que só o tempo irá resolver.” (pág. 50ss). TEORIA, CRÍTICA E UMA FILOSIFIA – Werner Heisenberg “Após dois anos de estudo, no verão de 1922, Sommerfeld perguntou-me se estava disposto a acompanhá-lo a um encontro em Gõttingen, em que Bohr iria apresentar sua teoria. Hoje, sempre nos referimos àqueles dias em Gõttingen como o "festival Bohr". Ali, pela primeira vez, aprendi como um homem como Bohr trabalhava com problemas de física atômica. Uma vez, depois que ele fizera sua segunda conferência, ousei tomar a palavra num debate, para expressar algumas críticas. Mencionei apenas algumas dúvidas sobre a possibilidade de as fórmulas de Kramers, que ele escrevera no quadro-
  • 11. negro, serem exatas. Sabia, a partir de nossas discussões em Munique, que as fórmulas que obtemos são sempre semi-exatas, em parte corretas e em parte não, de modo que me parecia que aquilo nunca era muito seguro. Bohr foi muito gentil e, embora eu fosse estudante muito jovem, convidou-me para um longo passeio no Hainberg perto de Gõttingen, para discutir o problema. Acho que foi naquele momento que senti estar realmente aprendendo o que significa estar num campo inteiramente novo da física teórica. A primeira descoberta para mim absolutamente chocante, foi a de que Bohr não tinha calculado coisa alguma. Simplesmente adivinhara seus resultados. Conhecia a situação experimental em química, conhecia as valências dos vários átomos e sabia que sua idéia da quantização das órbitas, ou melhor, sua idéia de explicar a estabilidade do átomo pelo fenômeno da quantização, correspondia de algum modo à situação experimental em química. Com nisso, apenas adivinhara o que depois nos apresentara como seus resultados. Perguntei-lhe se realmente acreditava que seria possível derivar aqueles resultados mediante cálculos baseados na mecânica clássica. A resposta foi: "Bem, penso que essas representações clássicas dos átomos que desenho são tão boas quanto uma representação clássica pode ser. Explicou isso da seguinte maneira: "Estamos agora num novo campo da física, em que sabemos que os velhos conceitos provavelmente não funcionam. Vemos que não funcionam, pois do contrário os átomos seriam estáveis. Por outro lado, quando queremos falar sobre átomos temos de usar palavras, e estas só podem ser tomadas dos velhos conceitos, da velha linguagem. Assim, estamos num beco sem saída, somos como marinheiros que chegam a país muito distante. Não conhecem o país e encontram pessoas cuja língua nunca ouviram, de modo que não sabem como se comunicar. Assim, na medida em que conceitos clássicos podem funcionar, isto é, na medida em que pode falar sobre o movimento de elétrons, sobre sua velocidade, sua energia, etc., penso que minhas representações estão corretas, ou pelo menos espero que estejam, mas ninguém sabe até onde essa linguagem pode ir”. Essa era uma maneira de pensar inteiramente nova para mim, e mudou toda a minha atitude em relação à física. No instituto Sommerfeld, sempre parecera óbvio que era preciso calcular as coisas e que somente por meio do cálculo rigoroso era possível chegar a resultados. Retornando agora à questão das teorias fenomenológicas, a conversa com Bohr deixou- me a impressão de que era preciso afastar-se de todos aqueles conceitos clássicos, de que não se devia falar da órbita de um elétron. Embora fosse possível ver uma trajetória do elétron na câmara de condensação, não se devia falar sobre sua velocidade ou posição e assim por diante. Mas é claro que, abandonando essas palavras, fica-se sem saber o que fazer. Era, portanto, um dilema estranhíssimo, uma situação extremamente interessante. A pergunta era: “Que podemos fazer numa situação como essa?” Pouco tempo depois dessa conversa com Bohr, creio que uns seis meses mais tarde, fui para Copenhague. Trabalhei com Kramers sobre a teoria da dispersão e mais uma vez nos vimos numa situação absurda: as fórmulas que podiam ser derivadas da teoria de Bohr eram quase corretas, mas não realmente corretas. Aos poucos, tínhamos adquirido certa prática no manejo dessas fórmulas, na tradução da física clássica para essas fórmulas fenomenológicas. Já tínhamos a impressão de que, em última análise, devia haver algum tipo de mecânica quântica que substituiria a mecânica clássica. A mecânica quântica poderia não ser muito diferente da mecânica clássica, mas ainda assim deveria usar conceitos muito diferentes. Ora, nesse tipo de situação, diz-se muitas vezes que um passo na direção correta é introduzir na teoria apenas quantidades que possam ser observadas. De fato, esta era uma idéia muito natural nesse contexto, porque se constatava que havia freqüências e amplitudes e, na teoria clássica, essas freqüências e amplitudes podiam de certo modo
  • 12. substituir a órbita do elétron. Toda uma série delas significa uma série de Fourier, e uma série de Fourier descreve uma órbita. Assim, era natural pensar que era preciso usar esses conjuntos de amplitudes e freqüências em vez da órbita. Quando voltei de Copenhague para Gõttingen, decidi que devia mais uma vez tentar algum tipo de adivinhação, a saber, adivinhar as intensidades do espectro do hidrogênio. A teoria de Bohr não funcionava bem para essas intensidades. Mas por que não seria possível adivinhá-las? Isso foi no início do verão de 1925, e eu fracassei redondamente. As fórmulas ficaram complicadas demais e não havia esperança de extrair coisa alguma delas. Ao mesmo tempo, eu pensava também que, se o sistema mecânico pudesse ser, mais simples, seria possível fazer exatamente a mesma coisa que Kramers e eu tínhamos feito em Copenhague, e adivinhar as amplitudes. Assim sendo, passei do átomo de hidrogênio para o oscilador anarmônico, que era um modelo muito simples. Exatamente nessa altura, fiquei doente e fui me recuperar na ilha de Heligoland. Ali tinha tempo à vontade para fazer meus cálculos. Na verdade, revelou-se muito fácil traduzir mecânica clássica em mecânica quântica. Devo mencionar, porém, um ponto importante: não era tão simples assim dizer "vamos tomar algumas freqüências e amplitudes para substituir quantidades orbitais" e então usar algum tipo de cálculo que já tínhamos usado em Copenhague, e que mais tarde mostrou ser equivalente à multiplicação matricial. Era bastante claro que, fazendo isso, se obteria um esquema muito mais aberto que a teoria clássica. Evidentemente, a teoria clássica estaria incluída nele, e a teoria quântica também, mas o esquema era excessivamente indefinido e era preciso adicionar-lhe condições extras. Acabei por constatar que era possível substituir as condições quânticas da teoria de Bohr por uma fórmula que, essencialmente, era equivalente à regra da soma de Thomas e Kuhn. Acrescentando tal condição chegava-se, subitamente, a um esquema congruente. Podia-se ver que esse conjunto de conjecturas funcionava, podia-se ver que a energia era constante e assim por diante. Eu não era capaz, contudo, de extrair dele um esquema matemático apropriado. Muito pouco tempo depois, Born e Jordan, em Gõttingen, e também Dirac, em Cambridge, conseguiram inventar um esquema matemático perfeitamente fechado; Dirac usou métodos novos e muito engenhosos, com os números q. enquanto Born e Jordan usaram métodos matriciais, mais convencionais.” (pág. 73ss). “Não quero entrar em detalhes agora, mas falar sobre a interpretação dos detalhes no seguinte sentido: "Que tipo de filosofia teve o papel mais importante neste desenvolvimento?" De início, eu pensava que era provavelmente a idéia de introduzir apenas quantidades observáveis. Em 1926, porém, numa ocasião em que tive de fazer uma palestra sobre mecânica quântica em Berlim, Einstein compareceu e corrigiu essa visão. Pediu que fosse a seu apartamento para discutirmos essas questões. A primeira coisa que me perguntou foi: "Qual é a filosofia subjacente a seu estranho tipo de teoria? A teoria parece bastante boa, mas o que você estava querendo dizer por 'apenas quantidades observáveis'?" Disse que não acreditava mais em órbitas de elétrons, apesar das trajetórias numa câmara de condensação. Sentia que era preciso voltar àquelas quantidades que podem realmente ser observadas e tinha a impressão que era exatamente esse tipo de filosofia que ele próprio usara na relatividade; porque ele também tinha abandonado o tempo absoluto e introduzido somente o tempo do sistema especial de coordenadas, e assim por diante. Ouvindo isso, Einstein riu e disse: "Mas você tem que entender que isso está completamente errado. "Retruquei: "Mas por quê?
  • 13. Não é verdade que usou esta filosofia?" E Einstein respondeu: "Sem dúvida posso tê-la usado, mas isso não impede que seja absurda!" Einstein explicou-me que o que acontecia na verdade era exatamente o oposto. Disse ele: "A possibilidade que se tem de observar ou não uma coisa depende da teoria que se usa. É a teoria que decide o que pode ser observado." Justificou isto nos seguintes termos: "A observação significa que construímos algum vínculo entre um fenômeno e nossa compreensão do fenômeno. Há alguma coisa acontecendo no átomo, a luz é emitida, ela atinge a placa fotográfica, vemos a placa fotográfica, e assim por diante. Em toda essa seqüência de eventos que tem lugar entre o átomo, nosso olho e nossa consciência, devemos presumir que tudo funciona como na velha física. Alterando-se a teoria referente a essa seqüência de eventos é evidente que a observação seria alterada." Assim, ele insistiu em que a .teoria que decide sobre o que pode ser observado. Esta observação de Einstein foi muito importante para mim mais tarde, quando Bohr e eu tentamos discutir a interpretação da teoria quântica, e voltarei a este ponto adiante. Mais algumas palavras sobre minha discussão com Einstein. Ele frisou que era realmente um perigo dizer que só se deveria falar sobre quantidades observáveis. Toda teoria adequada fornecerá, além de todas as coisas que podem ser imediatamente observadas, também.a possibilidade de observar outras coisas, de maneira mais indireta. Por exemplo, o próprio Mach acreditara que o conceito de átomo era apenas uma questão de conveniência, de economia de pensamento - ele não acreditava realidade dos átomos. Hoje, todo mundo diria que isso é absurdo, que é bastante evidente que os átomos realmente existem. Penso também que não se tem nada a ganhar afirmando que os átomos são uma mera conveniência de nosso Pensamento - embora isso possa ser logicamente possível. Estes foram os pontos que Einstein levantou. Na teoria quântica, isso significava, por exemplo, que, quando se tem mecânica quântica, pode-se observar não apenas freqüências e amplitudes, mas também, entre outras coisas, amplitudes de probabilidades, ondas de probabilidades, e assim por diante, e estes são, obviamente, objetos muito diferentes. Devo acrescentar ainda que, uma vez que se inventa um novo esquema referente a certas quantidades observáveis, a questão decisiva passa a ser: quais dos velhos conceitos podem realmente ser abandonados? No caso da teoria quântica, era mais ou menos claro que se podia abandonar a idéia de uma órbita do elétron.” (pág. 76ss). “Penso que agora estão compreendendo porque sou sempre um tanto cético com relação aos métodos matemáticos rigorosos. Talvez deva apresentar uma razão mais séria para isso. Quando buscamos métodos matemáticos rigorosos com demasiado empenho, fixamos nossa atenção naqueles pontos que não são importantes do ponto de vista físico e, com isso, nos afastamos da situação experimental. Quando tentamos resolver um problema com uma matemática mais grosseira, como fiz na maioria das vezes, somos sempre obrigados a pensar na situação experimental. E, seja qual for a fórmula que criamos, tentamos compará-la com a realidade; com isso, de algum modo, nos aproximamos mais dessa realidade do que ao buscar métodos rigorosos. Mas pode ser, é claro, que isso seja diferente para diferentes pessoas. Voltemos agora à mecânica quântica, e àquela parte do desenvolvimento de uma nova teoria que sempre me pareceu a mais fascinante. Quando penetramos num campo novo como esse, o problema é que, com os métodos fenomenológicos, somos sempre obrigados a usar os velhos conceitos, já que não temos outros, e, nesse caso, fazer relações teóricas significa aplicar velhos métodos a essa situação nova. Portanto, o passo decisivo é sempre um passo bastante descontínuo. Nunca podemos ter esperança de nos aproximar da teoria real pouco a pouco, por pequenos passos - em determinado
  • 14. ponto, é preciso dar um salto. É preciso realmente abandonar os velhos conceitos e tentar algo de novo, e depois verificar se somos capazes de nadar, de tomar pé, ou qualquer outra coisa. Mas, seja como for, não podemos conservar os velhos conceitos. Isso aconteceu na mecânica quântica do seguinte modo: primeiro tínhamos o esquema matemático, depois, é claro, devíamos tentar usar uma linguaggem razoável com relação a ele. Finalmente, podíamos perguntar: que conceitos esse esquema matemático implica e como devemos descrever a natureza? A parte mais difícil nesta etapa do desenvolvimento é o abandono de alguns conceitos antigos importantes. Todo bom físico se dispõe a adquirir novos conceitos, mas até os melhores mostram-se por vezes muito pouco dispostos a abrir mão de alguns dos conceitos velhos e aparentemente seguros. Esse sentimento de não poder abandonar os velhos conceitos foi também muito forte no desenvolvimento da mecânica quântica. Sabemos que isso aconteceu também no desenvolvimento da relatividade, e até hoje publicam-se, aqui e ali, artigos de pessoas que simplesmente se recusam a compreender a teoria da relatividade especial. Não conseguem compreendê-la porque não são capazes de abrir mão do velho conceito de "eventos simultâneos". Na teoria quântica, aconteceu até certo ponto a mesma coisa, nas discussões sobre a mecânica ondulatória de Schrõdinger e a mecânica quântica. Lembro-me de uma conferência de Schrõdinger e do debate subseqüente, no verão de 1926. Talvez deva mencionar isso, certamente não para criticar Schrõdinger, que era um físico de primeira linha, mas apenas para mostrar como é extremamente difícil livrar-se de velhos conceitos. Schrõdinger fizera uma conferência sobre mecânica ondulatória, a convite de Sommerfeld, e lá estava também Wilhelm Wien, um físico experimental. Nessa época, a teoria de Bohr estava longe de ser reconhecida em geral como boa teoria. Os físicos experimentais de Munique, por exemplo, não gostavam nada de todo aquele jogo de termos quânticos e saltos quânticos, chamavam isso de "atomística" - isto é, mística do átomo - e consideravam que aquilo era tão diferente da física clássica que não era fato para ser levado a sério. Assim, Wilhelm Wien ficou muito satisfeito ao ouvir de Schrõdinger sua nova interpretação. Como sabem, Schrõdinger acreditou por algum tempo que podia usar a mecânica ondulatória com o mesmo tipo de conceito da teoria de Maxwell. Partia do pressuposto de que ondas da matéria eram simplesmente ondas tridimensionais no espaço e tempo, como ondas eletromagnéticas; portanto, o autovalor de uma energia era realmente o autovalor de uma vibração, e não uma energia. Assim, ele acreditava poder evitar todos os tipos de saltos quânticos e todo o resto, que chamava de misticismo. Após a conferência de Schrõdinger, participei do debate e afirmei que me parecia que, com aquela interpretação, não se poderia nem sequer entender a lei de Planck. Porque, afinal de contas, a lei de Planck era baseada na verdadeira teoria quântica, nas mudanças descontínuas de energia e assim por diante. Wien ficou tão irritado com essa observação que disse: "Bem, meu rapaz, compreendemos que esteja triste porque agora a mecânica quântica e os saltos quânticos e todo o resto devem ser esquecidos, mas verá que logo Schrõdinger resolverá todos esses problemas.” Só mencionei este episódio para mostrar como podem ser fortes os sentimentos entre os físicos sobre essas questões. Evidentemente, fraca sei por completo na tentativa de convencer seja Wien, seja Schrõdinger. O resultado, porém, foi que Bohr convidou Schrõdinger para ir a Copenhague. Em setembro de 1926, Schrõdinger foi a Copenhague. Bohr, um homem muito delicado, correto, da maior amabilidade em todos os sentidos, era capaz às vezes de ser quase fanático. Lembro que, por onde Schrõdinger fosse, lá estava Bohr ao seu lado, dizendo: "Mas Schrõdinger, você tem de entender,
  • 15. você realmente tem." Ao fim de dois dias Schrõdinger caiu doente e teve de ficar de cama. A sra. Bohr levava-lhe chá com bolinhos e dali a pouco lá estava Bohr, sentado ao seu lado: "Mas Schrõdinger, você tem de entender...” Depois disso, Schrõdinger entendeu pelo menos que a interpretação da teoria quântica era mais difícil do que pensara. Também em Copenhague, não estávamos ainda muito satisfeitos com a interpretação. Sentíamos que, no caso do átomo, parecia muito bem abandonar o conceito de uma órbita eletrônica. Mas e a câmara de condensação? Numa câmara de condensação, vê-se o elétron movendo-s ao longo da trajetória - seria isso uma órbita eletrônica ou não? Bohr e eu discutimos esses problemas durante muitas e muitas noites, chegávamos freqüentemente a um estado de desespero. Bohr tentava mais na direção da dualidade entre ondas e partículas; eu preferia começar di formalismo matemático e buscar uma interpretação congruente. Por fim Bobr partiu para a Noruega, para pensar sozinho no problema, e eu fique em Copenhague. Então lembrei-me da observação de Einstein em nossa discussão. Lembrei que dissera: "É a teoria que decide o que pode se observado." A partir disso, era fácil inverter nossa questão e, em vez de perguntar: "como posso representar em mecânica quântica esta órbita de um elétron numa câmara de condensação?", fazer a seguinte pergunta: "seria verdade que só podem acontecer na natureza, mesmo numa câmara de condensação, aquelas situações experimentais que podem ser descritas pelo formalismo matemático da mecânica quântica?" Com essa inversão tinha de investigar o que podia ser descrito por esse formalismo; nesse caso, era muito fácil ver - especialmente usando as novas descobertas matemáticas de Dirac e Jordan sobre teoria da transformação - que não era possível descrever ao mesmo tempo a posição exata e a velocidade exata de um elétron; tínhamos então as relações de incerteza. Deste modo, as coisas ficavam claras. Ao voltar para Copenhague, Bohr trazia uma interpretação equivalente, com seu conceito de complementaridade. Assim, finalmente todos concordamos em que tínhamos por fim entendido a teoria quântica.” (pág. 80ss). “Voltamos a encontrar uma situação difícil em 1927, quando Einstein e Bohr discutiram essas questões na Conferência Solvay. Quase todo dia a mesma seqüência de eventos se repetia. Estávamos todos hospedados no mesmo hotel. No café da manhã, Einstein aparecia e contava para Bohr um novo experimento fictício, com o qual podia refutar as relações de incerteza e, portanto, nossa interpretação da teoria quântica. Bohr, Pauli e eu ficávamos então muito preocupados. Acompanhávamos Bohr e Einstein à conferência e passávamos o dia inteiro discutindo a questão. À noite, porém, na hora do jantar, em geral Bohr já tinha resolvido o problema e dava a resposta a Einstein. Ficávamos muito satisfeitos e Einstein, um pouco acabrunhado, dizia que ia pensar no assunto. Na manhã seguinte, lá vinha ele com um novo experimento fictício, tínhamos de discuti-lo etc. Isso se prolongou por vários dias e, ao final da conferência, os físicos de Copenhague saíram com a impressão de que tinham ganho a batalha e de que Einstein de fato não era capaz de fazer nenhuma objeção real. A meu ver, o mais esplêndido dos argumentos de Bohr foi um em que usou a teoria da relatividade geral para refutar Einstein. Este inventara um experimento em que o peso de certo maquinário devia ser determinado pela gravitação, e assim Bohr teve de invocar a teoria da relatividade geral para mostrar que as relações de incerteza eram corretas. Bohr conseguiu, e Einstein não foi capaz de fazer nenhuma objeção.” (pág. 84). “Chego agora a desenvolvimentos mais recentes. Talvez, antes de passar à teoria quântica relativista, deva dizer algumas palavras sobre física nuclear. O único ponto em
  • 16. que quero insistir de novo aqui é que é muito mais fácil aceitar novos conceitos que abandonar os velhos. De fato quando o nêutron foi descoberto por Chadwick - em 1932, creio -, era quase banal dizer que o núcleo consiste de prótons e nêutrons, mas não era tão banal assim dizer que não há elétrons no núcleo. O ponto central dos artigos que escrevi sobre a estrutura do núcleo não era a afirmação de que o núcleo consistia de prótons e nêutrons, mas a de que, em aparente contradição com os experimentos, não havia elétrons no núcleo. Até aquele momento, todos presumiam que devia haver elétrons no núcleo porque por vezes eles escapam, e seria muito estranho dizer que já não estavam lá antes. É claro que a idéia era que forças de curto alcance entre nêutron e próton podiam de alguma maneira ter que criar elétrons no núcleo. De qualquer modo, parecia ser uma boa aproximação supor que essas partículas leves não podem existir no núcleo. Lembro que fui fortemente criticado por essa conjectura, por físicos do mais alto nível. Recebi uma carta que dizia ser realmente um escândalo supor que não havia elétrons no núcleo quando era perfeitamente possível vê-los saindo dele; eu estava introduzindo uma completa confusão na física com aquelas hipóteses absurdas e não podiam entender minha atitude. Mencionei esse pequeno episódio apenas para mostrar como é realmente difícil abrir mão de alguma coisa que parece tão natural e tão óbvia que sempre foi aceita por todos. A meu ver, no desenvolvimento da física teórica, esses pontos em que é preciso abandonar velhos conceitos são sempre os que exigem maior esforço.” (pag. 86s). “Permitam-me agora voltar ao problema das partículas elementares. Penso que realmente a descoberta mais decisiva com relação às propriedades ou à natureza das partículas elementares foi a da antimatéria, feita por Dirac. Era uma característica inteiramente nova, aparentemente relacionada com a relatividade, com a substituição do grupo de Galileu pelo de Lorentz. Acredito que essa descoberta das partículas e· antipartículas descobertas por Dirac mudou por completo toda a nossa maneira de pensar na física atômica. Não sei se essa mudança foi percebida de imediato na época, é provável que só tenha sido aceita gradualmente. Gostaria de explicar por que a considero tão fundamental. A partir da teoria quântica, sabemos que, por exemplo, uma molécula de hidrogênio pode consistir de dois átomos de hidrogênio ou de um íon positivo de hidrogênio e de um íon negativo de hidrogênio. Em geral, podemos dizer que cada estado consiste virtualmente de todas as configurações possíveis pelas quais podemos realizar o mesmo tipo de simetria. Ora, tão logo sabemos que é possível criar pares segundo a teoria de Dirac, passamos a ter de considerar uma partícula elementar como um sistema composto. Isto porque, virtualmente, ela poderia ser essa partícula mais um par dessa partícula, mais dois pares e assim por diante, de tal modo que, de um momento para outro, toda a idéia de partícula elementar é transformada. Até aquela época, acho que todo físico pensava nas partículas elementares na linha da filosofia de Demócrito, a saber, considerando-as como unidades imutáveis, simplesmente dadas na natureza e sempre as mesmas: nunca mudam, nunca podem ser transmutadas em alguma outra coisa. Não seriam sistemas dinâmicos; simplesmente existiriam em si mesmas. Depois da descoberta de Dirac, tudo assumiu um aspecto diferente. Agora podíamos perguntar: "por que um próton deve ser apenas um próton? por que um próton não pode ser de vez em quando um próton mais um par de um elétron e um pósitron?", e assim por diante. Essa nova concepção da partícula elementar, como um sistema composto, a princípio me pareceu um grande desafio. Quando mais tarde trabalhei com Pauli em eletrodinâmica quântica, sempre mantive esse problema em minha mente.
  • 17. O passo seguinte nessa direção foi a idéia da múltipla produção de partículas. Se duas partículas colidem, podem ser gerados pares; nesse caso, não há razão para que seja apenas um par; por que não dois pares? Basta que a energia seja suficientemente elevada para que se possa, ao final, gerar qualquer número de partículas através de um evento desse tipo, desde que o acoplamento seja bastante forte. Assim, todo o problema da divisão da matéria passou a ser visto sob uma luz inteiramente nova. Até então, acreditara-se que havia apenas duas possibilidades: ou a matéria podia ser dividida vezes sucessivas, em partes cada vez menores infinitamente, ou não era possível dividir a matéria infinitamente, e assim se chegava à existência de partículas que seriam as menores possíveis. Então, de um momento para outro, percebemos uma terceira possibilidade: a matéria pode ser dividida sucessivas vezes, mas nunca chegamos às partículas menores, porque, graças ao mecanismo de criação de pares, a energia permite criar partículas indefinidamente. Assim, era natural, ainda que paradoxal, pensar a partícula elementar como um sistema composto de partículas elementares. É evidente que então surgiu o problema: "Que tipo de esquema matemático pode descrever uma situação como essa?"” (pág. 86s). “A personalidade de Pauli era diferente da minha em tudo. Ele era muito mais crítico e tentava fazer duas coisas ao mesmo tempo, coisa que a me ver é difícil demais, mesmo para o melhor dos físicos. Antes de mais nada tentava inspirar-se em experimentos e verificar, de certa forma intuitiva como as coisas se ligavam. Ao mesmo tempo, procurava racionalizar suas intuições e encontrar um esquema matemático rigoroso, que lhe permitisse realmente provar tudo que dissera. A meu ver, porém, isto é simplesmente demais, e o resultado é que Pauli, em toda a sua vida, publicou muito menos do que teria podido, se tivesse abandonado um desses dois caminhos. Bohr ousara publicar artigos que não tinha condições de provar e que, afinal, tinham se mostrado corretos; outros fizeram muita coisa usando métodos racionais e boa matemática. Juntar as duas coisas, porém, é algo que me parece excessivo para qualquer pessoa. Pauli ficou completamente desapontado quando percebeu as dificuldades, e assim acabou por desistir, de uma maneira lamentável. Disse-me que sentia que todo o seu pensamento já não estava suficientemente forte, e que não estava nada bem. Incentivou-me, contudo, mesmo depois de retirar sua aprovação para a publicação. Eu devia prosseguir, disse, mas ele próprio não tinha condições e, como sabem, infelizmente faleceu um ano depois. Este foi um triste fim para minha longa amizade com Pauli e só posso dizer que até hoje lamento não ter aquele seu vigoroso espírito crítico, que tantas vezes me ajudou em minha vida na física.” (pág. 89s). “Pode ser tentador acrescentar uma prescrição sobre como deveríamos trabalhar em física teórica. Isto seria, entretanto, muito perigoso, porque a prescrição deve ser diferente para diferentes físicos. Assim, posso falar apenas sobre a prescrição que sempre adotei para meu próprio uso. Foi a de que não convém prender-se demais a um grupo especial de experimentos; ao contrário, devemos tentar nos manter a par de todos os desenvolvimentos em todos os experimentos relevantes, de modo a poder ter sempre em mente a visão geral do quadro, antes de tentar estabelecer uma teoria em linguagem matemática ou outras. Talvez eu possa explicar essa filosofia geral contando duas histórias bem diferentes. Quando eu era menino, meu avô, que era um artesão sabia fazer coisas práticas, encontrou-me uma vez pregando uma tampa numa caixa de madeira com livros ou coisa parecida. Viu que eu tinha pegado a tampa, um prego, e estava tentando martelar esse único prego até a cabeça. “Mas isso que você está fazendo aí está completamente
  • 18. errado", disse meu avô, “ninguém pode fazer isso desse jeito; é um escândalo ver uma coisa dessa." Não entendi qual era o escândalo, mas ele continuou: “Vou lhe mostrar como poderia fazer isso." Pegou a tampa e um prego, encaixou-o só um pouco através da tampa até tocar a caixa, depois encaixou um segundo prego enfiando-o um pouquinho, um terceiro, e assim por diante, até que todos os pregos estivessem no lugar. Só quando tudo estava bem disposto, quando se podia ver que os pregos seriam adequados, começou a pregá-los realmente na caixa. Penso que esta é uma boa descrição de como se deve proceder em física teórica. A outra história está ligada às discussões que Dirac e eu tivemos. Dirac costumava dizer com freqüência - e sempre senti que havia nisso um ligeira crítica - que só se pode resolver uma dificuldade de cada vez. Isso pode estar certo, mas não era assim que eu encarava os problemas. Então lembrei-me que Niels Bohr costumava dizer: “Quando se tem um formulação correta, o oposto dela é, evidentemente, uma formulação errada. Mas quando se tem uma verdade profunda, então seu oposto pode ser igualmente uma verdade profunda." Assim, parece-me que a afirmação de que “só se pode resolver uma dificuldade de cada vez” talvez não seja a única verdade profunda - a afirmação de que “nunca se pode resolver uma única dificuldade de cada vez, é preciso resolve sempre muitas dificuldades ao mesmo. tempo" pode ser, também ela, uma verdade profunda. E talvez com esta observação eu deva encerra minha fala.” (pág. 90s). MÉTODOS EM FÍSICA TEÓRICA – Paul Adrien Maurice Dirac Vou procurar dar-lhes uma idéia de como um físico teórico trabalha - como enfrenta a tentativa de obter uma melhor compreensão das leis da natureza. Podemos olhar, em retrospectiva, para o trabalho que foi feito no passado. Ao fazê-lo, temos no fundo a esperança de poder encontrar algumas pistas ou de aprender algumas lições que possam ser valiosas no manejo dos problemas atuais. Os problemas que tivemos de considerar no passado tinham, fundamentalmente, muito em comum com os de hoje, e a revisão dos métodos bem-sucedidos do passado pode nos dar alguma ajuda no presente. Podemos distinguir entre dois procedimentos principais para um físico teórico. Um deles consiste em trabalhar a partir da base experimental. Para isso, é preciso manter-se em contato com os físicos experimentais. Lemos sobre todos os resultados que obtêm e tentamos inseri-los num esquema abrangente e satisfatório. O outro procedimento é trabalhar a partir da base matemática. Examinamos e criticamos a teoria existente. Tentamos detectar as falhas nela presentes e em seguida procuramos removê-las. A dificuldade neste caso é eliminar as falhas sem destruir os próprios grandes sucessos da teoria existente. Existem esses dois procedimentos, mas é claro que a distinção entre eles não é rígida. Há todo tipo de gradação entre esses dois extremos. O procedimento que se adota depende em grande parte do assunto em estudo. Para um assunto sobre o qual se sabe muito pouco, em que estamos inaugurando um novo terreno, somos praticamente obrigados a seguir o procedimento baseado no experimento. No início, em se tratando de um assunto novo, apenas coletamos resultados experimentais e os classificamos. Como exemplo, recapitulemos o modo como se construiu, no século passado, nosso conhecimento do sistema periódico para os átomos. Inicialmente, apenas se coletavam fatos experimentais e buscava-se organizá-los. A medida que o sistema ia sendo construído, começou-se gradualmente a confiar nele, até que, por fim, quando ele estava quase completo, já se tinha suficiente confiança nele para poder prever que, onde havia
  • 19. uma lacuna, seria mais tarde descoberto um novo átomo, que a preencheria. Todas essas previsões se confirmaram. Nos últimos tempos, houve uma situação muito parecida no tocante às novas partículas da física das altas energias. Elas foram inseridas num sistema em que temos tanta confiança que, ali onde se detecta uma lacuna, podemos prever que será encontrada uma partícula que a preencherá. Em qualquer região da física em que se saiba muito pouco, somos obrigados a nos prender à base experimental, sob pena de mergulharmos em especulações extravagantes, que quase certamente estarão erradas. Não desejo condenar por completo a especulação. Ela pode ser divertida e indiretamente útil, mesmo que acabe por se mostrar errônea. Deveríamos manter sempre a mente aberta para novas idéias, e, portanto, não poderíamos nos opor por completo à especulação, mas é preciso tomar cuidado para não se deixar envolver demais por ela.” (pág. 95s). “Um campo de trabalho em que houve excesso de especulação é a cosmologia. Há muito poucos fatos comprovados disponíveis, mas os teóricos têm se ocupado em construir vários modelos para o universo, com base em quaisquer suposições que lhes ocorram. Esses modelos são provavelmente todos errados. Neles se admite, em geral, que as leis da natureza foram sempre tal como são agora. Não há justificação para isso. As leis podem estar mudando e, em particular, as quantidades que são tomadas como constantes da natureza podem estar variando com o tempo cosmológico. Tais variações deixariam os construtores de modelos completamente perturbados. Com um maior conhecimento sobre um assunto, quando temos uma base considerável sobre a qual trabalhar, podemos nos voltar cada vez mais para o procedimento matemático. A motivação subjacente passa a ser, então, a busca da beleza matemática. Os físicos teóricos aceitam a necessidade da beleza matemática como um artigo de fé. Não há uma razão imperiosa para esse objetivo, mas ele se provou muito proveitoso no passado. Por exemplo, a principal razão por que a teoria da relatividade goza de uma aceitação tão universal é sua beleza matemática. Com o procedimento matemático, podem-se seguir dois método principais: (i) eliminar incongruências e (ii) unir teorias previamente dissociadas. Há muitos exemplos em que a adoção do método (i) levou a brilhante: sucessos. A investigação que Maxwell fez de uma incongruência nas equações eletromagnéticas de seu tempo conduziu-o a introduzir a corrente de deslocamento, que resultou na teoria das ondas eletromagnéticas O estudo que Planck realizou das dificuldades na teoria da radiação do corpo negro levou-o a introduzir o quantum. Einstein, tendo percebido uma dificuldade na teoria de um átomo em equilíbrio na radiação de corpo negro, foi conduzido a introduzir a emissão estimulada, que acabou dando lugar aos lasers atuais. O exemplo máximo, porém, foi a descoberta, por Einstein, de sua lei da gravitação, que surgiu a partir da necessidade de compatibilizar a gravitação newtoniana com a relatividade especial. Na prática, o método (ii) não se provou muito fecundo. Poderíamos pensar que os campos gravitacional e eletromagnético, ou dois campos de longo alcance conhecidos em física, deveriam ser estreitamente ligados, mas Einstein passou muitos anos tentando uni-los, sem sucesso. Parece que uma tentativa direta de unificar teorias desvinculadas, em que não há nenhuma incongruência definida a partir da qual trabalhar, é em geral excessivamente difícil e, quando o sucesso é finalmente alcançado, ele sobrevém por via indireta. A adoção do procedimento experimental ou matemático depende em grande parte do assunto em estudo, mas não inteiramente. Depende também da pessoa. Isto é ilustrado
  • 20. pela descoberta da mecânica quântica. Dois homens estavam envolvidos: Heisenberg e Schrõdinger. Heisenberg estava trabalhando a partir da base experimental, usando os resultados da espectroscopia, que por volta de 1925 tinha acumulado um enorme volume de dados. Muitos desses dados não tinham utilidade, mas alguns tinham, como, por exemplo, as intensidades relativas das linhas de um multipleto. A genialidade de Heisenberg foi ser capaz de discernir as coisas importantes em meio a grande abundância de informação e de organizá-las num esquema natural. Foi isto que o conduziu às matrizes. A abordagem de Schrõdinger era muito diferente. Ele trabalhava a partir da base matemática. Ao contrário de Heisenberg, não estava bem informado sobre os últimos resultados espectroscópicos, mas alimentava a crença de que freqüências espectrais poderiam ser estabelecidas por equações de autovalor, algo semelhante àquelas que fixam as freqüências de sistemas de molas em vibração. Alimentou essa idéia por muito tempo e acabou conseguindo encontrar a equação correta, de maneira indireta.” (pág. 96ss). “Para entender a atmosfera em que os físicos teóricos trabalhavam nessa época, é preciso avaliar a enorme influência da relatividade. A teoria irrompera no mundo do pensamento científico com enorme impacto, e no fim de uma guerra longa e difícil. Todos queriam escapar à tensão da guerra e aderiram avidamente ao novo modo de pensar e à nova filosofia. Foi um entusiasmo sem precedentes na história da ciência. Contra esse pano de fundo de entusiasmo, os físicos estavam tentando compreender o mistério da estabilidade dos átomos. Schrõdinger, como todos os demais, foi tomado pelas novas idéias e também tentou construir uma mecânica quântica no quadro da relatividade. Tudo tinha de ser expresso em termos de vetores e tensores no espaço- tempo. Foi uma pena, porque os tempos ainda não estavam maduros para uma mecânica quântica relativista, o que adiou a descoberta de Schrõdinger. Schrõdinger trabalhava a partir de uma bela idéia de Louis de Broglie, que associava ondas e partículas de um modo relativista. A idéia de de Broglie aplicava-se apenas a partículas livres, e Schrõdinnger tentou generalizá-la para um elétron preso num átomo. Acabou por conseguir, mantendo-se no quadro relativista. Quando aplicou sua teoria ao átomo de hidrogênio, porém, descobriu que ela não estava de acordo com o experimento. A discrepância se devia ao fato de não ter levado em conta o spin do elétron. Ele não era conhecido na época. Mais tarde, Schrõdinger percebeu que sua teoria estava correta na aproximação não-relativista e teve de se conformar em publicar essa versão degradada de seu trabalho o que fez após um intervalo de alguns meses. A moral desta história é que não devemos tentar fazer demais de uma só vez. Em física, devemos, tanto quanto possível, separar as dificuldades umas das outras, e depois eliminá-las uma a uma. Heisenberg e Schrõdinger nos deram duas formas de mecânica quântica, que logo se constatou serem equivalentes. Forneceram-nos duas representações, vinculadas por uma certa transformação matemática. Participei dos trabalhos iniciais com a mecânica quântica, seguindo o procedimento baseado na matemática e com um ponto de vista muito abstrato. Usei a álgebra não- comutativa, que as matrizes de Heisenberg sugeriam ser a principal característica para uma nova dinâmica, e examinei de que modo a dinâmica clássica podia ser adaptada para se adequar a ela. Outras pessoas estavam trabalhando nesse tema, a partir de vários pontos de vista, e todos nós obtivemos resultados equivalentes, mais ou menos ao mesmo tempo.” (pág. 98s).
  • 21. “Gostaria de mencionar que descobri que as melhores idéias em geral ocorrem não quando as buscamos ativamente, mas quando estamos mais relaxados. O professor Bethe contou-nos como tinha idéias ao viajar de trem e como, muitas vezes, as elaborava antes que a viagem acabasse. Comigo também era assim. Costumava fazer longas caminhadas solitárias aos domingos durante as quais tendia a rever a situação atual, de um modo tranqüilo. Essa prática mostrou-se muitas vezes proveitosa, ainda que (ou talvez porque) o objetivo básico da caminhada fosse relaxar e não pesquisar. Foi numa dessas ocasiões que me ocorreu a possibilidade de uma vinculação entre comutadores e colchetes de Poisson. Como eu não sabia muito bem o que era um colchete de Poisson, estava muito incerto sobre essa ligação. Ao chegar em casa, verifiquei que não tinha nenhum livro que explicasse os colchetes de Poisson, de modo que tive de esperar impacientemente, que as livrarias abrissem, na manhã seguinte, para finalmente confirmar a idéia.” (pág. 99). “A introdução dos espinores, além de proporcionar uma teoria relativista em consonância com os princípios gerais da mecânica quântica, forneceu uma explicação para o spin do elétron, embora essa não fosse a intenção original do trabalho. Mas surgiu então um novo problema, o das energias negativas. A teoria fornece simetria entre energias positiva e negativa, ao passo que na natureza só podem ocorrer energias positivas. Como acontece freqüentemente com o procedimento matemático em pesquisa, a solução de uma dificuldade conduz a outra. Pode-se pensar que, nesse caso, não se fez nenhum progresso, mas não é assim, porque a segunda dificuldade é mais remota que a primeira. Pode ser que ela já estivesse ali todo o tempo, e apenas tenha vindo à tona com a remoção da primeira. Este foi o caso com a dificuldade da energia negativa. Todas as teorias relativistas dão simetria entre energias positiva e negativa, mas anteriormente essa dificuldade fora camuflada por imperfeições mais grosseiras na teoria. A dificuldade é removida pelo pressuposto de que, no vácuo, todos os estados de energia negativa estão preenchidos. Somos levados então a uma teoria de pósitrons juntamente com elétrons. Com isto, nosso conhecimento transpõe uma etapa, mas uma nova dificuldade volta a aparecer, desta vez ligada à interação entre um elétron e o campo eletromagnético. Quando escrevemos as equações que supostamente descrevem de modo preciso essa interação e tentamos resolvê-las, obtemos integrais divergentes para quantidades que deveriam ser finitas. Mais uma vez, essa dificuldade estava de fato presente o tempo todo na teoria, adormecida ali, e só nesse momento se torna dominante.” (pág. 101). “A meta final é obter equações iniciais adequadas, a partir das quais toda a física atômica possa ser deduzida. Ainda estamos longe disso. Uma maneira de avançar nessa direção é, em primeiro lugar, aperfeiçoar a teoria da física das baixas energias, que é a eletrodinâmica-quântica, e depois ampliá-la para energias cada vez mais altas. Entretanto, a eletrodinâmica-quântica atual não corresponde ao elevado padrão de beleza matemática que seria de esperar de uma teoria física fundamental, o que nos leva a suspeitar que uma alteração drástica das idéias básicas ainda pode ser necessária.” (pág. 104s).